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Cristina Soreanu Pecequilo

VISENTINI, Paulo Fagundes. A projeção internacional do Brasil


1930-2012. Rio de Janeiro: Ed. Campus Elsevier, 2013.

____________. O Grande Oriente Médio- da descolonização à


primavera árabe. Rio de Janeiro: Ed. Campus Elsevier, 2014.
O BRASIL, A AMÉRICA DO SUL
WALTZ, Kenneth. Why Iran should get the bomb. Foreign Affairs,
July/August 2012. E A COOPERAÇÃO SUL-SUL
YORUK, Erdem. O longo verão da Turquia. Novos Estudos CEBRAP,
São Paulo, 97, p. 57-66, novembro de 2013. Walter Antonio Desiderá Neto*

Introdução

A cooperação entre países em desenvolvimento não é uma


novidade da política internacional do século XXI. As primeiras
ocorrências de maior expressão desse tipo de cooperação inter-
nacional ocorreram ainda durante a Guerra Fria, quando os paí-
ses em desenvolvimento promoveram o Movimento dos Não-
Alinhados, no âmbito da Conferência de Bandung (1955) da
Organização das Nações Unidas (ONU)1. A finalidade inicial do
movimento era a adoção de uma posição comum contra o colo-
nialismo que não se alinhasse ideologicamente a nenhum dos
dois polos de poder dominantes à época.
Desde aquela ocasião, dentro de instâncias da ONU e em
negociações no âmbito de diversos regimes internacionais, os
países em desenvolvimento vêm cooperando entre si para tenta-
rem fazer prevalecer seus interesses na formação das regras que
orientam a governança global, tendo o Brasil participado na

* Técnico de Planejamento e Pesquisa da Diretoria de Estudos e Relações


Econômicas e Políticas Internacionais (Dinte) do Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada (Ipea).
¹ Nesse caso específico, o Brasil não participou do movimento, uma vez que
em função do Tratado de Amizade e Consulta de 1953, “o país subordinava
suas posições sobre as colônias portuguesas na África aos interesses de
Portugal” (Saraiva, 1996, p. 55).

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Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

maioria das ocasiões. Destacam-se como exemplos emblemáti- to que podem ser diferenciadas dentro da chamada cooperação
cos a formação do G-77 em 1964 no âmbito da Conferência das internacional de tipo Sul-Sul: i) a coalizão internacional, caracte-
Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) rizada pela formação de grupos de dois ou mais países em desen-
e a proposta conjunta pelos países em desenvolvimento, em volvimento para coordenar posições e atuar conjuntamente em
1974, de uma Nova Ordem Econômica Internacional (Noei) na mecanismos multilaterais de negociação das regras que orientam
Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU). a governança global; ii) e a cooperação para o desenvolvimento
A nomenclatura que tem sido dada para se referir à atuação nas modalidades técnica, financeira, científica ou tecnológica, a
concertada entre países em desenvolvimento na política internacio- qual envolve transferências (predominantemente bilaterais, mas
nal é cooperação Sul-Sul (Lima, 2005; Oliveira; Onuki; Oliveira, também por meio da intermediação de instituições regionais do
2006; Saraiva; 2007; Rodrigues, 2010). Ao mesmo tempo, outros Sul) de recursos financeiros, de informações e de experiências
autores, inclusive algumas publicações institucionais de organiza- entre países em desenvolvimento, com função explícita de pro-
ções internacionais, também têm utilizado esse termo para se refe- mover o desenvolvimento do país receptor.
rir à cooperação para o desenvolvimento técnica, financeira, cien- Essa diferenciação aqui colocada tem a instrumentalidade analí-
tífica ou tecnológica prestada por países emergentes a outros países tica de não intercambiar como iguais relações que têm como obje-
tivo estratégico de política externa a soma de recursos de poder
do Sul (Ecosoc, 2009; Ayllón, 2009; Hirst, 2011; Segib, 2011;
com outros países para aumentar a efetividade da defesa de inte-
Burges, 2012). Entretanto, por se tratarem de expressões diferen-
resses comuns no curto ou médio prazo na política global, caracte-
tes do fenômeno, é importante esmiuçar o conceito de cooperação
rísticas da coalizão internacional, com relações que têm por objeti-
internacional do tipo Sul-Sul a fim de evitar que o mesmo, por
vo, do ponto de vista do doador, promover parcerias duradouras e,
exagerada amplitude, acabe perdendo poder explicativo. Conforme
expondo uma imagem positiva de solidariedade e responsabilidade
comenta Puente (2010, p. 223), referindo-se ao próprio discurso
perante a comunidade internacional, adquirir prestígio interna-
diplomático brasileiro, cional a partir da exportação de práticas bem-sucedidas, típicas da
(...) de fato, verificam-se (...) referências dispersas à expressão cooperação para o desenvolvimento.
“cooperação internacional”, quando, na verdade, o que se pre- Ainda que não seja comum encontrar na realidade relações
tende muitas vezes é aludir a políticas de concertação, diálo- entre dois países em desenvolvimento em que ocorram apenas
go e aproximação com outros países, tanto no nível bilateral expressões isoladas dessas duas faces da cooperação Sul-Sul, sua
como, especialmente, no multilateral. (...) A referência genéri- diferenciação analítica é instrumental para verificar os objetivos
ca à “cooperação Sul-Sul” no discurso diplomático é um pouco que embasam essas iniciativas de política externa. No caso deste
mais frequente. Não está desprovida, no entanto, da abran- artigo, a separação conceitual também é útil para descrever e ana-
gência e dispersão já mencionadas, pois induz muitas vezes a lisar a estratégia de cooperação Sul-Sul da política externa promo-
outros aspectos da política externa, como a busca de aproxima-
vida pelo Brasil, permitindo mapear de que maneira diferentes ini-
ção e concertação com países em desenvolvimento com vistas
ciativas foram empregadas em sua composição.
a objetivos outros que não apenas a cooperação para o desen-
volvimento. De forma a exemplificar, a situação que se pode apontar, no
caso da política externa brasileira, como uma das mais próximas à
Dessa forma, pode-se afirmar que existem duas formas impor- cooperação para o desenvolvimento Sul-Sul são os projetos que o
tantes de expressão da cooperação entre países em desenvolvimen- Brasil empreendeu em países africanos da Comunidade de Países

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maioria das ocasiões. Destacam-se como exemplos emblemáti- to que podem ser diferenciadas dentro da chamada cooperação
cos a formação do G-77 em 1964 no âmbito da Conferência das internacional de tipo Sul-Sul: i) a coalizão internacional, caracte-
Nações Unidas sobre Comércio e Desenvolvimento (UNCTAD) rizada pela formação de grupos de dois ou mais países em desen-
e a proposta conjunta pelos países em desenvolvimento, em volvimento para coordenar posições e atuar conjuntamente em
1974, de uma Nova Ordem Econômica Internacional (Noei) na mecanismos multilaterais de negociação das regras que orientam
Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU). a governança global; ii) e a cooperação para o desenvolvimento
A nomenclatura que tem sido dada para se referir à atuação nas modalidades técnica, financeira, científica ou tecnológica, a
concertada entre países em desenvolvimento na política internacio- qual envolve transferências (predominantemente bilaterais, mas
nal é cooperação Sul-Sul (Lima, 2005; Oliveira; Onuki; Oliveira, também por meio da intermediação de instituições regionais do
2006; Saraiva; 2007; Rodrigues, 2010). Ao mesmo tempo, outros Sul) de recursos financeiros, de informações e de experiências
autores, inclusive algumas publicações institucionais de organiza- entre países em desenvolvimento, com função explícita de pro-
ções internacionais, também têm utilizado esse termo para se refe- mover o desenvolvimento do país receptor.
rir à cooperação para o desenvolvimento técnica, financeira, cien- Essa diferenciação aqui colocada tem a instrumentalidade analí-
tífica ou tecnológica prestada por países emergentes a outros países tica de não intercambiar como iguais relações que têm como obje-
tivo estratégico de política externa a soma de recursos de poder
do Sul (Ecosoc, 2009; Ayllón, 2009; Hirst, 2011; Segib, 2011;
com outros países para aumentar a efetividade da defesa de inte-
Burges, 2012). Entretanto, por se tratarem de expressões diferen-
resses comuns no curto ou médio prazo na política global, caracte-
tes do fenômeno, é importante esmiuçar o conceito de cooperação
rísticas da coalizão internacional, com relações que têm por objeti-
internacional do tipo Sul-Sul a fim de evitar que o mesmo, por
vo, do ponto de vista do doador, promover parcerias duradouras e,
exagerada amplitude, acabe perdendo poder explicativo. Conforme
expondo uma imagem positiva de solidariedade e responsabilidade
comenta Puente (2010, p. 223), referindo-se ao próprio discurso
perante a comunidade internacional, adquirir prestígio interna-
diplomático brasileiro, cional a partir da exportação de práticas bem-sucedidas, típicas da
(...) de fato, verificam-se (...) referências dispersas à expressão cooperação para o desenvolvimento.
“cooperação internacional”, quando, na verdade, o que se pre- Ainda que não seja comum encontrar na realidade relações
tende muitas vezes é aludir a políticas de concertação, diálo- entre dois países em desenvolvimento em que ocorram apenas
go e aproximação com outros países, tanto no nível bilateral expressões isoladas dessas duas faces da cooperação Sul-Sul, sua
como, especialmente, no multilateral. (...) A referência genéri- diferenciação analítica é instrumental para verificar os objetivos
ca à “cooperação Sul-Sul” no discurso diplomático é um pouco que embasam essas iniciativas de política externa. No caso deste
mais frequente. Não está desprovida, no entanto, da abran- artigo, a separação conceitual também é útil para descrever e ana-
gência e dispersão já mencionadas, pois induz muitas vezes a lisar a estratégia de cooperação Sul-Sul da política externa promo-
outros aspectos da política externa, como a busca de aproxima-
vida pelo Brasil, permitindo mapear de que maneira diferentes ini-
ção e concertação com países em desenvolvimento com vistas
ciativas foram empregadas em sua composição.
a objetivos outros que não apenas a cooperação para o desen-
volvimento. De forma a exemplificar, a situação que se pode apontar, no
caso da política externa brasileira, como uma das mais próximas à
Dessa forma, pode-se afirmar que existem duas formas impor- cooperação para o desenvolvimento Sul-Sul são os projetos que o
tantes de expressão da cooperação entre países em desenvolvimen- Brasil empreendeu em países africanos da Comunidade de Países

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Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

de Língua Portuguesa (CPLP) por intermédio de seus organismos a autora, a cooperação Sul-Sul com os países sul-americanos este-
da administração federal e com alguma coordenação da Agência ve relacionada à construção de um projeto de liderança regional
Brasileira de Cooperação (ABC). Por outro lado, o G-20 agríco- brasileiro articulado “à segurança regional, à defesa da democracia,
la formado na Reunião Ministerial de Cancun da Organização aos processos de integração regional e às perspectivas de desenvol-
Mundial do Comércio (OMC) é exemplo de uma das iniciativas vimento nacional” (Saraiva, 2007, p. 48).
caracterizadas como coalizão internacional Sul-Sul. Para tornar-se um ator global e aumentar sua influência na for-
De fato, no governo Lula (2003-2010) a cooperação interna- mação das regras que orientam a governança global, o Brasil buscou
cional com países em desenvolvimento ganhou destaque. Para a concertação também com atores do Sul externos ao continente.
tanto, a política externa brasileira passou por alguns ajustes com Encontram-se nesse grupo de iniciativas o Fórum de Diálogo Ibas
relação à estratégia de inserção internacional do governo anterior. (Índia, Brasil e África do Sul), o ora mencionado G-20 agrícola, as
A diversificação de parceiros tornou-se um importante vetor dessa Cúpulas dos Bric (Brasil, Rússia, Índia, China), além das Cúpulas
política (Vigevani; Cepaluni, 2007), voltando-se principalmente América do Sul – Países Árabes e América do Sul – África.
para a expansão dos vínculos com os países do mundo em desen- Conforme apontam Hirst, Lima e Pinheiro (2010, p. 30),
volvimento. Pecequilo (2008, p. 145) denomina essas parcerias ao
a participação do Brasil nos foros de governança global refle-
Sul de “eixo horizontal” da política externa.
te não apenas uma política pró-ativa de constituição de “coa-
O eixo horizontal é representado pelas parcerias com as nações lizões de geometria variável”, envolvendo algumas nações
emergentes, por suas semelhanças como grandes Estados peri- emergentes, como os limites derivados das carências de recur-
féricos e países em desenvolvimento como Índia, China, África sos de poder que permitam ao país uma carreira “solo” em
do Sul e Rússia (...). A agenda é composta também pelos paí- instâncias globais.
ses menos desenvolvidos da África, Ásia e Oriente Médio, cujo
poder relativo é menor do que o brasileiro. Este eixo represen- Ao mesmo tempo, observou-se ao longo do governo Lula um
ta a dimensão terceiro-mundista da política externa, também crescente empenho brasileiro, paralelamente à concertação política
definida como relações Sul-Sul. Os benefícios potenciais deste com parceiros do Sul, em prestar cooperação técnica, financeira,
eixo são econômicos, estratégicos e políticos. (...) A proximi- científica e tecnológica a um grupo de países de menor desenvol-
dade política entre as nações do Sul refere-se a uma reivindi- vimento relativo. Essa outra expressão da cooperação Sul-Sul apre-
cação permanente desde o fim da Guerra Fria que é a reforma sentou crescente dispêndio financeiro desde 2005 (Ipea; ABC,
das organizações internacionais globais como G-8, [Fundo
2010), tendo como principais destinos determinados países afri-
Monetário Internacional] FMI, Banco Mundial e, principal-
canos de língua portuguesa e alguns países latino-americanos. No
mente, do CSNU.
que concerne à cooperação técnica, as experiências bem-sucedidas
Do ponto de vista das coalizões internacionais, as iniciativas de de políticas públicas que o Brasil buscou levar a seus parceiros se
concertação política com países do Sul que tiveram mais proemi- localizaram, principalmente, nas áreas temáticas de qualificação
nência no governo Lula, segundo Saraiva (2007), podem ser divi- profissional, saúde pública (política de prevenção e combate à epi-
didas entre, de um lado, as que se direcionaram aos demais países demia do HIV/Aids), agricultura (tecnologias de cultivo desenvol-
da América do Sul e, de outro, as que foram realizadas com potên- vidas pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa)
cias médias de grande porte do mundo em desenvolvimento. Para e inclusão social (programas de transferência condicionada de

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de Língua Portuguesa (CPLP) por intermédio de seus organismos a autora, a cooperação Sul-Sul com os países sul-americanos este-
da administração federal e com alguma coordenação da Agência ve relacionada à construção de um projeto de liderança regional
Brasileira de Cooperação (ABC). Por outro lado, o G-20 agríco- brasileiro articulado “à segurança regional, à defesa da democracia,
la formado na Reunião Ministerial de Cancun da Organização aos processos de integração regional e às perspectivas de desenvol-
Mundial do Comércio (OMC) é exemplo de uma das iniciativas vimento nacional” (Saraiva, 2007, p. 48).
caracterizadas como coalizão internacional Sul-Sul. Para tornar-se um ator global e aumentar sua influência na for-
De fato, no governo Lula (2003-2010) a cooperação interna- mação das regras que orientam a governança global, o Brasil buscou
cional com países em desenvolvimento ganhou destaque. Para a concertação também com atores do Sul externos ao continente.
tanto, a política externa brasileira passou por alguns ajustes com Encontram-se nesse grupo de iniciativas o Fórum de Diálogo Ibas
relação à estratégia de inserção internacional do governo anterior. (Índia, Brasil e África do Sul), o ora mencionado G-20 agrícola, as
A diversificação de parceiros tornou-se um importante vetor dessa Cúpulas dos Bric (Brasil, Rússia, Índia, China), além das Cúpulas
política (Vigevani; Cepaluni, 2007), voltando-se principalmente América do Sul – Países Árabes e América do Sul – África.
para a expansão dos vínculos com os países do mundo em desen- Conforme apontam Hirst, Lima e Pinheiro (2010, p. 30),
volvimento. Pecequilo (2008, p. 145) denomina essas parcerias ao
a participação do Brasil nos foros de governança global refle-
Sul de “eixo horizontal” da política externa.
te não apenas uma política pró-ativa de constituição de “coa-
O eixo horizontal é representado pelas parcerias com as nações lizões de geometria variável”, envolvendo algumas nações
emergentes, por suas semelhanças como grandes Estados peri- emergentes, como os limites derivados das carências de recur-
féricos e países em desenvolvimento como Índia, China, África sos de poder que permitam ao país uma carreira “solo” em
do Sul e Rússia (...). A agenda é composta também pelos paí- instâncias globais.
ses menos desenvolvidos da África, Ásia e Oriente Médio, cujo
poder relativo é menor do que o brasileiro. Este eixo represen- Ao mesmo tempo, observou-se ao longo do governo Lula um
ta a dimensão terceiro-mundista da política externa, também crescente empenho brasileiro, paralelamente à concertação política
definida como relações Sul-Sul. Os benefícios potenciais deste com parceiros do Sul, em prestar cooperação técnica, financeira,
eixo são econômicos, estratégicos e políticos. (...) A proximi- científica e tecnológica a um grupo de países de menor desenvol-
dade política entre as nações do Sul refere-se a uma reivindi- vimento relativo. Essa outra expressão da cooperação Sul-Sul apre-
cação permanente desde o fim da Guerra Fria que é a reforma sentou crescente dispêndio financeiro desde 2005 (Ipea; ABC,
das organizações internacionais globais como G-8, [Fundo
2010), tendo como principais destinos determinados países afri-
Monetário Internacional] FMI, Banco Mundial e, principal-
canos de língua portuguesa e alguns países latino-americanos. No
mente, do CSNU.
que concerne à cooperação técnica, as experiências bem-sucedidas
Do ponto de vista das coalizões internacionais, as iniciativas de de políticas públicas que o Brasil buscou levar a seus parceiros se
concertação política com países do Sul que tiveram mais proemi- localizaram, principalmente, nas áreas temáticas de qualificação
nência no governo Lula, segundo Saraiva (2007), podem ser divi- profissional, saúde pública (política de prevenção e combate à epi-
didas entre, de um lado, as que se direcionaram aos demais países demia do HIV/Aids), agricultura (tecnologias de cultivo desenvol-
da América do Sul e, de outro, as que foram realizadas com potên- vidas pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária – Embrapa)
cias médias de grande porte do mundo em desenvolvimento. Para e inclusão social (programas de transferência condicionada de

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renda consolidados pelo Programa Bolsa Família  – Ministério do nismos para a redução das assimetrias e o aumento da cooperação
Desenvolvimento Social) (Ayllón; Leite, 2010). para o desenvolvimento entre os integrantes do bloco.
Ainda que a diplomacia tenha se empenhado em diferenciar a Na prática, ao longo dos pouco mais de sete anos que sucede-
forma de atuação brasileira nessas iniciativas das práticas empre- ram a assinatura do Consenso de Buenos Aires (2003) pelos pre-
endidas historicamente pelos países desenvolvidos (evitando o sidentes dos dois países e a aprovação pelo Conselho do Mercado
termo “país receptor” e optando por “país parceiro”, bem como Comum (CMC) do Programa de Trabalho do Mercosul 2004-
afirmando inexistir condicionalidades de ordem econômica ou 2006, foram criados na estrutura institucional do Mercosul,
política na prestação dessas ações, por exemplo), algumas análises entre outras iniciativas, no lado social, as Cúpulas Sociais do
indicaram uma correlação entre o aumento da cooperação para o Mercosul, o Instituto Social do Mercosul (ISM) e o Instituto de
desenvolvimento e o crescimento das exportações brasileiras em Políticas Públicas em Direitos Humanos do Mercosul (IPPDH)
algumas localidades, em especial no continente africano (Inoue; e, na esfera política, o Parlamento do Mercosul (Parlasul) e o car-
Vaz, 2007, 2012). De toda maneira, uma vez que essas correla- go de Alto-Representante Geral do Mercosul. Do ponto de vis-
ções não ocorreram em função de condicionalidades vinculadas ta econômico, destacou-se a criação do Fundo de Convergência
aos programas realizados pelo Brasil nesses países, do ponto de Estrutural do Mercosul (Focem) em 2004 e do Fundo Mercosul
vista dos objetivos declarados pela política externa, é possí- de Garantias para Micro, Pequenas e Médias Empresas (Fundo
vel apontar apenas a formação de parcerias de longa duração, a Pymes) em 2008, com foco na redução das assimetrias e na pro-
ampliação de vínculos externos e a conquista de prestígio interna- moção da integração produtiva entre os países integrantes do blo-
cional, além da própria solidariedade. co regional, respectivamente.
No que se refere ao lugar que foi destinado ao Mercado Diante desse contexto, o objetivo deste capítulo é examinar o
Comum do Sul (Mercosul)  – principal iniciativa de integração desenvolvimento da cooperação Sul-Sul – prestação de cooperação
regional da qual participa o Brasil  – dentro dessa estratégia em para o desenvolvimento e atuação como coalizão internacional  –
duas frentes paralelas e distintas de cooperação Sul-Sul, cabe ressal- do Brasil com os países da América do Sul no período entre 2003
tar que ele também passou por uma reformulação. Com a crise do e 20122. Ele está organizado em quatro sessões: após esta introdu-
modelo livre-cambista decorrente da desvalorização do real no final ção, a segunda seção trata do funcionamento do Mercosul como
da década de 1990 e das consequentes crises da dívida e política coalizão internacional de 2003 a 2012; a terceira seção, por sua
argentinas que se estenderam até as eleições de 2002, os presidentes vez, examina a prestação de cooperação para o desenvolvimento
Luiz Inácio Lula da Silva e Néstor Kirchner, eleitos com base em do Brasil para os outros parceiros do bloco econômico regional de
projetos políticos críticos às iniciativas liberais da década de 1990, 2003 a 20103; por fim, a última seção busca concluir os argumen-
propuseram em 2003 o relançamento do bloco sob novas bases, tos construídos ao longo do texto.
buscando incrementar seus objetivos econômicos e conferir maior
componente político e social (Ruiz, 2007).
Dessa maneira, também para o Mercosul buscou-se uma 2
Avançando, do ponto de vista da política externa brasileira, sobre os dois
mudança de rumos pela política externa brasileira, recuperando primeiros anos do primeiro governo Dilma (2011-2014).
para sua agenda temas como o diálogo para a adoção de posições 3
Os dados da cooperação para o desenvolvimento para os anos de 2011 e
comuns na política internacional e incluindo a criação de meca- 2012 ainda não foram divulgados.

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Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

renda consolidados pelo Programa Bolsa Família  – Ministério do nismos para a redução das assimetrias e o aumento da cooperação
Desenvolvimento Social) (Ayllón; Leite, 2010). para o desenvolvimento entre os integrantes do bloco.
Ainda que a diplomacia tenha se empenhado em diferenciar a Na prática, ao longo dos pouco mais de sete anos que sucede-
forma de atuação brasileira nessas iniciativas das práticas empre- ram a assinatura do Consenso de Buenos Aires (2003) pelos pre-
endidas historicamente pelos países desenvolvidos (evitando o sidentes dos dois países e a aprovação pelo Conselho do Mercado
termo “país receptor” e optando por “país parceiro”, bem como Comum (CMC) do Programa de Trabalho do Mercosul 2004-
afirmando inexistir condicionalidades de ordem econômica ou 2006, foram criados na estrutura institucional do Mercosul,
política na prestação dessas ações, por exemplo), algumas análises entre outras iniciativas, no lado social, as Cúpulas Sociais do
indicaram uma correlação entre o aumento da cooperação para o Mercosul, o Instituto Social do Mercosul (ISM) e o Instituto de
desenvolvimento e o crescimento das exportações brasileiras em Políticas Públicas em Direitos Humanos do Mercosul (IPPDH)
algumas localidades, em especial no continente africano (Inoue; e, na esfera política, o Parlamento do Mercosul (Parlasul) e o car-
Vaz, 2007, 2012). De toda maneira, uma vez que essas correla- go de Alto-Representante Geral do Mercosul. Do ponto de vis-
ções não ocorreram em função de condicionalidades vinculadas ta econômico, destacou-se a criação do Fundo de Convergência
aos programas realizados pelo Brasil nesses países, do ponto de Estrutural do Mercosul (Focem) em 2004 e do Fundo Mercosul
vista dos objetivos declarados pela política externa, é possí- de Garantias para Micro, Pequenas e Médias Empresas (Fundo
vel apontar apenas a formação de parcerias de longa duração, a Pymes) em 2008, com foco na redução das assimetrias e na pro-
ampliação de vínculos externos e a conquista de prestígio interna- moção da integração produtiva entre os países integrantes do blo-
cional, além da própria solidariedade. co regional, respectivamente.
No que se refere ao lugar que foi destinado ao Mercado Diante desse contexto, o objetivo deste capítulo é examinar o
Comum do Sul (Mercosul)  – principal iniciativa de integração desenvolvimento da cooperação Sul-Sul – prestação de cooperação
regional da qual participa o Brasil  – dentro dessa estratégia em para o desenvolvimento e atuação como coalizão internacional  –
duas frentes paralelas e distintas de cooperação Sul-Sul, cabe ressal- do Brasil com os países da América do Sul no período entre 2003
tar que ele também passou por uma reformulação. Com a crise do e 20122. Ele está organizado em quatro sessões: após esta introdu-
modelo livre-cambista decorrente da desvalorização do real no final ção, a segunda seção trata do funcionamento do Mercosul como
da década de 1990 e das consequentes crises da dívida e política coalizão internacional de 2003 a 2012; a terceira seção, por sua
argentinas que se estenderam até as eleições de 2002, os presidentes vez, examina a prestação de cooperação para o desenvolvimento
Luiz Inácio Lula da Silva e Néstor Kirchner, eleitos com base em do Brasil para os outros parceiros do bloco econômico regional de
projetos políticos críticos às iniciativas liberais da década de 1990, 2003 a 20103; por fim, a última seção busca concluir os argumen-
propuseram em 2003 o relançamento do bloco sob novas bases, tos construídos ao longo do texto.
buscando incrementar seus objetivos econômicos e conferir maior
componente político e social (Ruiz, 2007).
Dessa maneira, também para o Mercosul buscou-se uma 2
Avançando, do ponto de vista da política externa brasileira, sobre os dois
mudança de rumos pela política externa brasileira, recuperando primeiros anos do primeiro governo Dilma (2011-2014).
para sua agenda temas como o diálogo para a adoção de posições 3
Os dados da cooperação para o desenvolvimento para os anos de 2011 e
comuns na política internacional e incluindo a criação de meca- 2012 ainda não foram divulgados.

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O Brasil, a América do Sul e a cooperação Sul-Sul: coali- De acordo com Russel e Tokatlián (2011, tradução nossa, p.
zão internacional 298), a respeito da nova gestão,

De 1991 a 1997, com a eliminação progressiva das barreiras a Argentina pós-crise, fraca, solitária e ensimesmada, reco-
tarifárias intrabloco, a corrente de comércio entre os países do nheceu-se mais latino-americana e viu na sociedade com o
Mercosul havia crescido de forma expressiva, atingindo taxas anu- Brasil o melhor caminho para ganhar autoestima coletiva e
ais de crescimento superiores a 25%. Do ponto de vista dos investi- retornar a um mundo que, em sua grande maioria, havia lhe
mentos, observou-se também aumento e diversificação. Entretanto, dado as costas.
com a crise financeira asiática, seguida da crise russa e do estreme- A eleição de Néstor Kirchner e de Luiz Inácio Lula da Silva
cimento por elas provocado nos mercados ao redor do planeta, esse (daqui em diante, Lula) na Argentina e no Brasil, respectivamen-
processo sofreu um estancamento.
te, em 2003, veio ocorrer em um contexto pós-crise. O clima pre-
Em 1999, diante das dificuldades para seguir financiando o regi-
dominante se caracterizava pela valorização da parceria bilateral e
me de bandas cambiais do real com o dólar decorrentes da retração
pelo questionamento do modelo livre-cambista sobre o qual se
da liquidez internacional4 e da redução do preço internacional das
baseara o Mercosul até então. Dessa forma, em outubro daquele
commodities, o governo brasileiro deixou o câmbio flutuar, condu-
zindo a uma forte desvalorização da moeda. Ao mesmo tempo, uma ano, os dois presidentes, reunidos na capital argentina, propuse-
vez que a Argentina seguiu praticando o regime de câmbio fixo do ram o relançamento do bloco regional. No Consenso de Buenos
peso com a divisa americana, houve uma brusca alteração dos pre- Aires, documento resultante desse encontro, foi proposta a alte-
ços relativos no bloco em favor dos produtos brasileiros. ração das prioridades do Mercosul com vistas a dar mais atenção
Dessa forma, o Brasil passou a apresentar superávits comer- para as dimensões social, política, participativa e distributiva da
ciais com a Argentina nos anos seguintes, gerando alguns atritos integração. Nesse sentido, no lugar da liberalização comercial  –
comerciais no Mercosul, o qual também vinha apresentando maus ainda que ela não tenha sido revertida –, os novos motes nortea-
resultados decorrentes da recessão econômica. Os déficits argenti- dores do processo passaram a ser justiça social (combate à pobre-
nos, por sua vez, vieram se somar às dificuldades fiscais do país, za, à desigualdade, à fome e ao analfabetismo), atuação conjunta
as quais decorriam, entre outros fatores, dos custos em reservas da em espaços multilaterais, participação da sociedade civil e redu-
manutenção da paridade artificial do peso com o dólar e da refor- ção dos desequilíbrios regionais.
ma de seu setor previdenciário. No final de 2001, no auge de uma Em dezembro de 2003, na cúpula semestral de Montevidéu, os
crise política doméstica causada pelo alto desemprego e pelo blo- quatro Estados Partes aprovaram o Programa de Trabalho Mercosul
queio das contas-correntes (o corralito) realizado pelo presiden- 2004-2006, incorporando essa nova perspectiva. Ele identifica-
te Fernando de la Rúa, a Argentina decretou a moratória de sua va uma lista de tarefas a serem cumpridas para que a integração
dívida externa. Após uma turbulência na qual mais três presidentes avançasse em quatro direções: a) econômico-comercial: consolidar
foram nomeados e acabaram renunciando num período de doze a tarifa externa comum, formular o código aduaneiro, promover a
dias, Eduardo Duhalde assumiu a presidência e governou o país integração produtiva, realizar a coordenação macroeconômica, ava-
durante 2002, num mandato que representou a transição do retor- liar as negociações externas, entre outros pontos; b) social: ampliar
no do país ao peronismo. os mecanismos de participação da sociedade civil e investigar sobre
4
Essas dificuldades já se faziam sentir desde a desvalorização mexicana de temas sociais, como trabalho, educação e direitos humanos; c) ins-
1995. titucional: fundar o Parlamento do Mercosul e fortalecer as ins-

218 219
Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

O Brasil, a América do Sul e a cooperação Sul-Sul: coali- De acordo com Russel e Tokatlián (2011, tradução nossa, p.
zão internacional 298), a respeito da nova gestão,

De 1991 a 1997, com a eliminação progressiva das barreiras a Argentina pós-crise, fraca, solitária e ensimesmada, reco-
tarifárias intrabloco, a corrente de comércio entre os países do nheceu-se mais latino-americana e viu na sociedade com o
Mercosul havia crescido de forma expressiva, atingindo taxas anu- Brasil o melhor caminho para ganhar autoestima coletiva e
ais de crescimento superiores a 25%. Do ponto de vista dos investi- retornar a um mundo que, em sua grande maioria, havia lhe
mentos, observou-se também aumento e diversificação. Entretanto, dado as costas.
com a crise financeira asiática, seguida da crise russa e do estreme- A eleição de Néstor Kirchner e de Luiz Inácio Lula da Silva
cimento por elas provocado nos mercados ao redor do planeta, esse (daqui em diante, Lula) na Argentina e no Brasil, respectivamen-
processo sofreu um estancamento.
te, em 2003, veio ocorrer em um contexto pós-crise. O clima pre-
Em 1999, diante das dificuldades para seguir financiando o regi-
dominante se caracterizava pela valorização da parceria bilateral e
me de bandas cambiais do real com o dólar decorrentes da retração
pelo questionamento do modelo livre-cambista sobre o qual se
da liquidez internacional4 e da redução do preço internacional das
baseara o Mercosul até então. Dessa forma, em outubro daquele
commodities, o governo brasileiro deixou o câmbio flutuar, condu-
zindo a uma forte desvalorização da moeda. Ao mesmo tempo, uma ano, os dois presidentes, reunidos na capital argentina, propuse-
vez que a Argentina seguiu praticando o regime de câmbio fixo do ram o relançamento do bloco regional. No Consenso de Buenos
peso com a divisa americana, houve uma brusca alteração dos pre- Aires, documento resultante desse encontro, foi proposta a alte-
ços relativos no bloco em favor dos produtos brasileiros. ração das prioridades do Mercosul com vistas a dar mais atenção
Dessa forma, o Brasil passou a apresentar superávits comer- para as dimensões social, política, participativa e distributiva da
ciais com a Argentina nos anos seguintes, gerando alguns atritos integração. Nesse sentido, no lugar da liberalização comercial  –
comerciais no Mercosul, o qual também vinha apresentando maus ainda que ela não tenha sido revertida –, os novos motes nortea-
resultados decorrentes da recessão econômica. Os déficits argenti- dores do processo passaram a ser justiça social (combate à pobre-
nos, por sua vez, vieram se somar às dificuldades fiscais do país, za, à desigualdade, à fome e ao analfabetismo), atuação conjunta
as quais decorriam, entre outros fatores, dos custos em reservas da em espaços multilaterais, participação da sociedade civil e redu-
manutenção da paridade artificial do peso com o dólar e da refor- ção dos desequilíbrios regionais.
ma de seu setor previdenciário. No final de 2001, no auge de uma Em dezembro de 2003, na cúpula semestral de Montevidéu, os
crise política doméstica causada pelo alto desemprego e pelo blo- quatro Estados Partes aprovaram o Programa de Trabalho Mercosul
queio das contas-correntes (o corralito) realizado pelo presiden- 2004-2006, incorporando essa nova perspectiva. Ele identifica-
te Fernando de la Rúa, a Argentina decretou a moratória de sua va uma lista de tarefas a serem cumpridas para que a integração
dívida externa. Após uma turbulência na qual mais três presidentes avançasse em quatro direções: a) econômico-comercial: consolidar
foram nomeados e acabaram renunciando num período de doze a tarifa externa comum, formular o código aduaneiro, promover a
dias, Eduardo Duhalde assumiu a presidência e governou o país integração produtiva, realizar a coordenação macroeconômica, ava-
durante 2002, num mandato que representou a transição do retor- liar as negociações externas, entre outros pontos; b) social: ampliar
no do país ao peronismo. os mecanismos de participação da sociedade civil e investigar sobre
4
Essas dificuldades já se faziam sentir desde a desvalorização mexicana de temas sociais, como trabalho, educação e direitos humanos; c) ins-
1995. titucional: fundar o Parlamento do Mercosul e fortalecer as ins-

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Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

tituições existentes; d) “nova agenda”: fomentar a cooperação em Na Segunda Cúpula Sul-Americana, realizada em Guayaquil
ciência e tecnologia, bem como a integração física e energética. (Equador) em 2002, o andamento do processo foi avaliado e pra-
Certamente, o avanço no cumprimento de cada um desses obje- ticamente as mesmas disposições foram reafirmadas. Além de ter
tivos ocorreu em ritmos variados, com sucessos e malogros. De todo sido adotada a Declaração sobre a Zona de Paz Sul-Americana,
modo, para os objetivos deste capítulo, é importante apenas assina- também foi destacado nesse encontro a importância da Primeira
lar sua eficiência em i) efetivamente ampliar a agenda da integração Reunião de Ministros de Relações Exteriores do Mercosul, Chile
para novas dimensões e ii) enfatizar o sentido político-estratégico do e da Comunidade Andina, ocorrida no ano anterior, e da criação
Mercosul, para além dos aspectos econômico-comerciais. A conso- do Mecanismo de Diálogo e Concertação Política, como iniciati-
lidação desses novos temas se caracterizou como fator decisivo para vas para fomentar a convergência de visões sobre temas de interesse
o aprofundamento da coordenação de visões de política externa e, comum entre as nações envolvidas.
portanto, do funcionamento do bloco como coalizão internacional. Dando prosseguimento ao processo, em 2004 realizou-se em
Da mesma forma, não se pode deixar de reconhecer também a Cuzco (Peru) a Terceira Cúpula Sul-Americana, na qual foi formal-
mente criada a Comunidade Sul-Americana de Nações (Casa). No
contribuição do processo de integração sul-americano como fator
documento resultante do encontro, a concertação e a coordena-
promotor da convergência de perspectivas entre as nações do con-
ção política e diplomática, vistas como caminho para fortalecer as
tinente de uma forma geral. Inaugurado por iniciativa brasileira5,
capacidades de negociação e projeção internacionais do continente,
a partir da Primeira Cúpula Sul-Americana6, ocorrida em Brasília
aparecem em primeiro lugar na lista de dinâmicas que o novo orga-
no ano 2000, definiu-se como objetivos centrais: i) impulsionar a
nismo seguiria aperfeiçoando e impulsionando7. Em 2005 e 2006,
integração física do continente, para a qual foi criada a Iniciativa
em substituição às Cúpulas Sul-Americanas, ocorreram as duas pri-
para Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana (Iirsa); meiras Reuniões de Chefes de Estado e Chanceleres da Casa (em
ii) iniciar um processo de convergência entre o Mercosul e a Brasília e em Cochabamba, respectivamente), nas quais o entendi-
Comunidade Andina de Nações (CAN), com vistas à conformação mento político é tido como parte da essência da comunidade.
de uma área de livre comércio entre os dois blocos; iii) coordenar Finalmente, em 2008, com a assinatura do Tratado Constitutivo
posições negociadoras no contexto da Área de Livre Comércio das da União de Nações Sul-Americanas (Unasul), essa questão é obje-
Américas (Alca), de forma a assegurar o acesso a mercados para as tivo específico da organização explicitado pelo item “a” do tercei-
exportações provenientes do continente; iv) e, do ponto de vista ro artigo do tratado: “o fortalecimento do diálogo político entre
mais estritamente político, consagrar a região como zona de paz e os Estados Membros que assegure um espaço de concertação para
afirmar o compromisso com a democracia. reforçar a integração sul-americana e a participação da Unasul no
cenário internacional”.
5
Vale destacar, nesse ponto, o fato de a política externa brasileira ter A ênfase reiterada de uma reunião a outra com relação a esse
lançado, com esse processo, o conceito de América do Sul, abandonando ponto se deve em grande medida à liderança brasileira durante
temporariamente a ênfase na ideia de América Latina (presente na Associação
todo o desenvolvimento das principais iniciativas de integração na
Latino-Americana de Integração  – Aladi) e, portanto, excluindo o México das
iniciativas. Além disso, fica claro o objetivo do país de buscar alternativas para o
crescimento na região em um momento em que o Mercosul apresentava sinais 7
Deve-se assinalar que, nesse encontro, a redução das assimetrias
de debilidade. estruturais presentes na região apareceu pela primeira vez como um dos
6
Com a participação dos presidentes dos doze países sul-americanos. objetivos prioritários da integração sul-americana.

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Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

tituições existentes; d) “nova agenda”: fomentar a cooperação em Na Segunda Cúpula Sul-Americana, realizada em Guayaquil
ciência e tecnologia, bem como a integração física e energética. (Equador) em 2002, o andamento do processo foi avaliado e pra-
Certamente, o avanço no cumprimento de cada um desses obje- ticamente as mesmas disposições foram reafirmadas. Além de ter
tivos ocorreu em ritmos variados, com sucessos e malogros. De todo sido adotada a Declaração sobre a Zona de Paz Sul-Americana,
modo, para os objetivos deste capítulo, é importante apenas assina- também foi destacado nesse encontro a importância da Primeira
lar sua eficiência em i) efetivamente ampliar a agenda da integração Reunião de Ministros de Relações Exteriores do Mercosul, Chile
para novas dimensões e ii) enfatizar o sentido político-estratégico do e da Comunidade Andina, ocorrida no ano anterior, e da criação
Mercosul, para além dos aspectos econômico-comerciais. A conso- do Mecanismo de Diálogo e Concertação Política, como iniciati-
lidação desses novos temas se caracterizou como fator decisivo para vas para fomentar a convergência de visões sobre temas de interesse
o aprofundamento da coordenação de visões de política externa e, comum entre as nações envolvidas.
portanto, do funcionamento do bloco como coalizão internacional. Dando prosseguimento ao processo, em 2004 realizou-se em
Da mesma forma, não se pode deixar de reconhecer também a Cuzco (Peru) a Terceira Cúpula Sul-Americana, na qual foi formal-
mente criada a Comunidade Sul-Americana de Nações (Casa). No
contribuição do processo de integração sul-americano como fator
documento resultante do encontro, a concertação e a coordena-
promotor da convergência de perspectivas entre as nações do con-
ção política e diplomática, vistas como caminho para fortalecer as
tinente de uma forma geral. Inaugurado por iniciativa brasileira5,
capacidades de negociação e projeção internacionais do continente,
a partir da Primeira Cúpula Sul-Americana6, ocorrida em Brasília
aparecem em primeiro lugar na lista de dinâmicas que o novo orga-
no ano 2000, definiu-se como objetivos centrais: i) impulsionar a
nismo seguiria aperfeiçoando e impulsionando7. Em 2005 e 2006,
integração física do continente, para a qual foi criada a Iniciativa
em substituição às Cúpulas Sul-Americanas, ocorreram as duas pri-
para Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana (Iirsa); meiras Reuniões de Chefes de Estado e Chanceleres da Casa (em
ii) iniciar um processo de convergência entre o Mercosul e a Brasília e em Cochabamba, respectivamente), nas quais o entendi-
Comunidade Andina de Nações (CAN), com vistas à conformação mento político é tido como parte da essência da comunidade.
de uma área de livre comércio entre os dois blocos; iii) coordenar Finalmente, em 2008, com a assinatura do Tratado Constitutivo
posições negociadoras no contexto da Área de Livre Comércio das da União de Nações Sul-Americanas (Unasul), essa questão é obje-
Américas (Alca), de forma a assegurar o acesso a mercados para as tivo específico da organização explicitado pelo item “a” do tercei-
exportações provenientes do continente; iv) e, do ponto de vista ro artigo do tratado: “o fortalecimento do diálogo político entre
mais estritamente político, consagrar a região como zona de paz e os Estados Membros que assegure um espaço de concertação para
afirmar o compromisso com a democracia. reforçar a integração sul-americana e a participação da Unasul no
cenário internacional”.
5
Vale destacar, nesse ponto, o fato de a política externa brasileira ter A ênfase reiterada de uma reunião a outra com relação a esse
lançado, com esse processo, o conceito de América do Sul, abandonando ponto se deve em grande medida à liderança brasileira durante
temporariamente a ênfase na ideia de América Latina (presente na Associação
todo o desenvolvimento das principais iniciativas de integração na
Latino-Americana de Integração  – Aladi) e, portanto, excluindo o México das
iniciativas. Além disso, fica claro o objetivo do país de buscar alternativas para o
crescimento na região em um momento em que o Mercosul apresentava sinais 7
Deve-se assinalar que, nesse encontro, a redução das assimetrias
de debilidade. estruturais presentes na região apareceu pela primeira vez como um dos
6
Com a participação dos presidentes dos doze países sul-americanos. objetivos prioritários da integração sul-americana.

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Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

América do Sul. A partir de 2003, com a inauguração do gover- um discurso provocativo, contestassem a hegemonia americana e
no Lula, a política externa brasileira sofreu uma inflexão, passan- buscassem aliados para defender o multilateralismo. Isso ganharia
do a apresentar maior assertividade na busca de seus objetivos. ainda mais força no final da década com a crise financeira de 2008,
Conforme analisa Lima (2005, p. 11-13), e com base também nos o avanço econômico chinês e a crise do euro.
apontamentos do então Ministro das Relações Exteriores, Celso Portanto, tendo esse diagnóstico como pano de fundo, o Brasil
Amorim (2010, p. 215), a mudança da estratégia de inserção inter- passou a advogar pela construção de um mundo multipolar base-
nacional ocorreu em função de uma alteração na própria leitura ado nas regras do multilateralismo. A estratégia de cooperação
que o novo governo fazia do cenário internacional. Na gestão ante- Sul-Sul, elemento central do novo projeto, era composta por duas
rior, o país buscava “credibilidade” perante as grandes potências a frentes paralelas e distintas de ações, conforme mencionado ante-
partir da adoção dos padrões do bloco ocidental globalizado, pois riormente: prestação de cooperação para o desenvolvimento Sul-
acreditava que extrairia benefícios de uma inserção entendida como Sul; e formação de coalizões internacionais Sul-Sul.
modernizadora. A partir do governo Lula, o país passou a buscar No Balanço de Governo 2003-2010 produzido pelo governo
“autonomia” por meio da conformação de espaços políticos alter- brasileiro, a inclusão da integração regional no seio dessa estratégia
nativos que de alguma maneira deslegitimassem a ordem unipolar fica muito clara, como se segue:
e promovessem a desconcentração de poder, posto que, ao exami-
O adensamento das relações políticas e econômicas entre os paí-
nar a globalização como um fenômeno gerador de desigualdades8,
ses sul-americanos contribuirá para o desenvolvimento socioe-
instava-se a se tornar um ator global com as devidas capacidades
conômico da América do Sul e a preservação da paz na região; o
para enfrentar os desafios do desenvolvimento. desenvolvimento do mercado interno sul-americano e o aumen-
Para contextualizar, deve-se ter em mente que, do ponto de vis- to da competitividade dos países no mercado internacional; e
ta do ambiente internacional, a Guerra Contra o Terror promovida o fortalecimento da capacidade de atuação do Brasil em outros
pelos Estados Unidos na administração de George W. Bush (2001- foros internacionais. A integração sul-americana se baseia em
2009), em momentos emblemáticos executada de forma unilateral dois pilares: a Unasul e o Mercosul (Brasil, 2010, p. 18).
(Guerras do Afeganistão e do Iraque), abalou em parte a capacida-
de de liderança global da superpotência, em especial com relação à Vale adicionar ainda – como demonstração da inserção do blo-
perda do apoio de determinados parceiros tradicionais da Europa co regional na estratégia maior da política externa brasileira – que,
Ocidental (Buzan, 2007). Além disso, com a condução dessa polí- em três das cinco novas iniciativas de coalizão internacional Sul-
tica em nível global, os Estados Unidos acabaram dando menos Sul promovidas pelo Brasil, os demais países do Mercosul esta-
atenção às relações internacionais da América Latina. Desse modo, vam inseridos: i) o G-20 comercial, no âmbito das negociações da
o cenário dos anos 2000 se mostrou propício para o lançamento de Rodada Doha da OMC, em defesa da eliminação das barreiras ao
iniciativas de países em desenvolvimento que, mesmo sem adotar comércio de bens agrícolas; ii) as cúpulas América do Sul – Países
Árabes (Aspa); iii) e as cúpulas América do Sul – África (ASA)9.
8
Deve-se reconhecer que o descontentamento com a falsa promessa dos
Conforme sintetizou o então Ministro das Relações Exteriores,
frutos positivos da interdependência econômica no mundo  – via liberalização Celso Amorim (2010, p. 231),
comercial e financeira  –, expressado principalmente na ideia de “globalização
assimétrica” defendida pelo então Ministro das Relações Exteriores Celso Lafer 9
As outras duas iniciativas são o Fórum de Diálogo Ibas (Índia, Brasil e África
(2001-2002), começou a conquistar espaço no seio da corporação diplomática do Sul) e as cúpulas anuais dos Bric (Brasil, Rússia, Índia e China), aos quais
ainda no último ano do governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002). veio se somar a África do Sul em 2011.

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Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

América do Sul. A partir de 2003, com a inauguração do gover- um discurso provocativo, contestassem a hegemonia americana e
no Lula, a política externa brasileira sofreu uma inflexão, passan- buscassem aliados para defender o multilateralismo. Isso ganharia
do a apresentar maior assertividade na busca de seus objetivos. ainda mais força no final da década com a crise financeira de 2008,
Conforme analisa Lima (2005, p. 11-13), e com base também nos o avanço econômico chinês e a crise do euro.
apontamentos do então Ministro das Relações Exteriores, Celso Portanto, tendo esse diagnóstico como pano de fundo, o Brasil
Amorim (2010, p. 215), a mudança da estratégia de inserção inter- passou a advogar pela construção de um mundo multipolar base-
nacional ocorreu em função de uma alteração na própria leitura ado nas regras do multilateralismo. A estratégia de cooperação
que o novo governo fazia do cenário internacional. Na gestão ante- Sul-Sul, elemento central do novo projeto, era composta por duas
rior, o país buscava “credibilidade” perante as grandes potências a frentes paralelas e distintas de ações, conforme mencionado ante-
partir da adoção dos padrões do bloco ocidental globalizado, pois riormente: prestação de cooperação para o desenvolvimento Sul-
acreditava que extrairia benefícios de uma inserção entendida como Sul; e formação de coalizões internacionais Sul-Sul.
modernizadora. A partir do governo Lula, o país passou a buscar No Balanço de Governo 2003-2010 produzido pelo governo
“autonomia” por meio da conformação de espaços políticos alter- brasileiro, a inclusão da integração regional no seio dessa estratégia
nativos que de alguma maneira deslegitimassem a ordem unipolar fica muito clara, como se segue:
e promovessem a desconcentração de poder, posto que, ao exami-
O adensamento das relações políticas e econômicas entre os paí-
nar a globalização como um fenômeno gerador de desigualdades8,
ses sul-americanos contribuirá para o desenvolvimento socioe-
instava-se a se tornar um ator global com as devidas capacidades
conômico da América do Sul e a preservação da paz na região; o
para enfrentar os desafios do desenvolvimento. desenvolvimento do mercado interno sul-americano e o aumen-
Para contextualizar, deve-se ter em mente que, do ponto de vis- to da competitividade dos países no mercado internacional; e
ta do ambiente internacional, a Guerra Contra o Terror promovida o fortalecimento da capacidade de atuação do Brasil em outros
pelos Estados Unidos na administração de George W. Bush (2001- foros internacionais. A integração sul-americana se baseia em
2009), em momentos emblemáticos executada de forma unilateral dois pilares: a Unasul e o Mercosul (Brasil, 2010, p. 18).
(Guerras do Afeganistão e do Iraque), abalou em parte a capacida-
de de liderança global da superpotência, em especial com relação à Vale adicionar ainda – como demonstração da inserção do blo-
perda do apoio de determinados parceiros tradicionais da Europa co regional na estratégia maior da política externa brasileira – que,
Ocidental (Buzan, 2007). Além disso, com a condução dessa polí- em três das cinco novas iniciativas de coalizão internacional Sul-
tica em nível global, os Estados Unidos acabaram dando menos Sul promovidas pelo Brasil, os demais países do Mercosul esta-
atenção às relações internacionais da América Latina. Desse modo, vam inseridos: i) o G-20 comercial, no âmbito das negociações da
o cenário dos anos 2000 se mostrou propício para o lançamento de Rodada Doha da OMC, em defesa da eliminação das barreiras ao
iniciativas de países em desenvolvimento que, mesmo sem adotar comércio de bens agrícolas; ii) as cúpulas América do Sul – Países
Árabes (Aspa); iii) e as cúpulas América do Sul – África (ASA)9.
8
Deve-se reconhecer que o descontentamento com a falsa promessa dos
Conforme sintetizou o então Ministro das Relações Exteriores,
frutos positivos da interdependência econômica no mundo  – via liberalização Celso Amorim (2010, p. 231),
comercial e financeira  –, expressado principalmente na ideia de “globalização
assimétrica” defendida pelo então Ministro das Relações Exteriores Celso Lafer 9
As outras duas iniciativas são o Fórum de Diálogo Ibas (Índia, Brasil e África
(2001-2002), começou a conquistar espaço no seio da corporação diplomática do Sul) e as cúpulas anuais dos Bric (Brasil, Rússia, Índia e China), aos quais
ainda no último ano do governo Fernando Henrique Cardoso (1995-2002). veio se somar a África do Sul em 2011.

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Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

(...) a cooperação Sul-Sul é um instrumento diplomático que Tabela 1: Temas de política internacional abordados em
surge de um desejo autêntico por prestar solidariedade aos paí- cúpulas do Mercosul e países associados (2003-2012)
ses mais pobres. Ao mesmo tempo, ela ajuda a expandir a par- Tema Abordagem
ticipação do Brasil nas relações internacionais. A cooperação Alca Necessidade de que os temas agrícolas, em
entre iguais em questões de comércio, investimentos, ciência especial as distorções provocadas pelos subsídios,
e tecnologia e outros campos reforça nossa estatura e fortalece sejam matéria de discussão do projeto, com vistas
nossa posição nas negociações de comércio, investimentos e do a alcançar o equilíbrio nas negociações
clima. Por fim, construir coalizões com países em desenvolvi- Armas de destruição Compromisso com o desarmamento, a não proli-
mento é também uma forma de se empenhar na reforma da em massa feração e o uso pacífico da energia nuclear, com
apoio à resolução 1540/2004¹² do CSNU, bem
governança global, de forma a tornar as instituições internacio-
como ao Tratado de Não Proliferação Nuclear
nais mais justas e mais democráticas.
Crise financeira de Responsabilização dos países desenvolvidos pelo
2008 estopim da crise, com enfoque na necessidade
Com esse contexto de iniciativas em mente, torna-se mais sim- de reforma, de fortalecimento da legitimidade,
ples compreender os motivos pelos quais, em 2004, o Mercosul de capitalização e de aumento de recursos das
instituições financeiras internacionais
e a CAN assinaram acordo comercial e, em seguida, Colômbia,
Cuba Repúdio ao bloqueio econômico, comercial e
Equador, Peru e Venezuela vieram se somar à lista de países associa- financeiro, por entender que é contrário aos prin-
dos do bloco do Cone Sul10 – passando a participar de suas cúpu- cípios da Carta das Nações Unidas e contravém as
las semestrais. Em 2012 foi a vez de Guiana e Suriname também regras do direito internacional
se associarem ao Mercosul, perfazendo no bloco regional os mes- Direitos humanos Nesse caso, costumam aparecer nos comunicados
mos membros da Unasul. Afinal, trata-se de partes de um mesmo como valores e princípios a serem respeitados
e promovidos. De uma forma mais específica, a
projeto, voltado a aumentar a participação e marcar as posições do questão apareceu em certas ocasiões relacionada
continente nos mecanismos multilaterais em que são negociadas as às ditaduras militares que vigoraram na região no
regras da governança global. passado recente, voltada aos direitos à memória e
à verdade
Nesse sentido, ao examinar os comunicados conjuntos emiti-
Malvinas Respaldo aos legítimos direitos da Argentina na
dos semestralmente por esses países nas cúpulas presidenciais do disputa de soberania relativa à questão das Ilhas
Mercosul entre 2003 e 2012, percebe-se ter ocorrido ampliação na Malvinas. Rechaço à pretensão de considerar
quantidade de temas convergentes e aprofundamento no tratamen- as ilhas como países e territórios aos quais se
possam aplicar a Quarta Parte do Tratado de
to e na abordagem conferida a cada um deles. Num esforço de sín-
Funcionamento da União Europeia e as Decisões
tese, a tabela 1 abaixo traz uma lista dessas questões. de Associação de Ultramar da União Europeia

Proíbe, entre outras medidas, países de apoiarem atores não estatais que
11

A Venezuela, particularmente, acabou iniciando um processo de adesão


10
busquem desenvolver, adquirir, industrializar, possuir, transportar, transferir ou
plena ao bloco em 2006, o qual se concretizou em 2012, na ocasião da usar armas nucleares, químicas ou biológicas e seus meios de entrega, em
suspensão temporária do Paraguai. particular para objetivos terroristas.

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Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

(...) a cooperação Sul-Sul é um instrumento diplomático que Tabela 1: Temas de política internacional abordados em
surge de um desejo autêntico por prestar solidariedade aos paí- cúpulas do Mercosul e países associados (2003-2012)
ses mais pobres. Ao mesmo tempo, ela ajuda a expandir a par- Tema Abordagem
ticipação do Brasil nas relações internacionais. A cooperação Alca Necessidade de que os temas agrícolas, em
entre iguais em questões de comércio, investimentos, ciência especial as distorções provocadas pelos subsídios,
e tecnologia e outros campos reforça nossa estatura e fortalece sejam matéria de discussão do projeto, com vistas
nossa posição nas negociações de comércio, investimentos e do a alcançar o equilíbrio nas negociações
clima. Por fim, construir coalizões com países em desenvolvi- Armas de destruição Compromisso com o desarmamento, a não proli-
mento é também uma forma de se empenhar na reforma da em massa feração e o uso pacífico da energia nuclear, com
apoio à resolução 1540/2004¹² do CSNU, bem
governança global, de forma a tornar as instituições internacio-
como ao Tratado de Não Proliferação Nuclear
nais mais justas e mais democráticas.
Crise financeira de Responsabilização dos países desenvolvidos pelo
2008 estopim da crise, com enfoque na necessidade
Com esse contexto de iniciativas em mente, torna-se mais sim- de reforma, de fortalecimento da legitimidade,
ples compreender os motivos pelos quais, em 2004, o Mercosul de capitalização e de aumento de recursos das
instituições financeiras internacionais
e a CAN assinaram acordo comercial e, em seguida, Colômbia,
Cuba Repúdio ao bloqueio econômico, comercial e
Equador, Peru e Venezuela vieram se somar à lista de países associa- financeiro, por entender que é contrário aos prin-
dos do bloco do Cone Sul10 – passando a participar de suas cúpu- cípios da Carta das Nações Unidas e contravém as
las semestrais. Em 2012 foi a vez de Guiana e Suriname também regras do direito internacional
se associarem ao Mercosul, perfazendo no bloco regional os mes- Direitos humanos Nesse caso, costumam aparecer nos comunicados
mos membros da Unasul. Afinal, trata-se de partes de um mesmo como valores e princípios a serem respeitados
e promovidos. De uma forma mais específica, a
projeto, voltado a aumentar a participação e marcar as posições do questão apareceu em certas ocasiões relacionada
continente nos mecanismos multilaterais em que são negociadas as às ditaduras militares que vigoraram na região no
regras da governança global. passado recente, voltada aos direitos à memória e
à verdade
Nesse sentido, ao examinar os comunicados conjuntos emiti-
Malvinas Respaldo aos legítimos direitos da Argentina na
dos semestralmente por esses países nas cúpulas presidenciais do disputa de soberania relativa à questão das Ilhas
Mercosul entre 2003 e 2012, percebe-se ter ocorrido ampliação na Malvinas. Rechaço à pretensão de considerar
quantidade de temas convergentes e aprofundamento no tratamen- as ilhas como países e territórios aos quais se
possam aplicar a Quarta Parte do Tratado de
to e na abordagem conferida a cada um deles. Num esforço de sín-
Funcionamento da União Europeia e as Decisões
tese, a tabela 1 abaixo traz uma lista dessas questões. de Associação de Ultramar da União Europeia

Proíbe, entre outras medidas, países de apoiarem atores não estatais que
11

A Venezuela, particularmente, acabou iniciando um processo de adesão


10
busquem desenvolver, adquirir, industrializar, possuir, transportar, transferir ou
plena ao bloco em 2006, o qual se concretizou em 2012, na ocasião da usar armas nucleares, químicas ou biológicas e seus meios de entrega, em
suspensão temporária do Paraguai. particular para objetivos terroristas.

224 225
Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

Migrantes Visão não discriminatória, independente da Terrorismo O combate a esse flagelo deve se desenvolver em
condição do migrante e de sua família, na busca conformidade com o direito interno e as normas
da garantia, do respeito e da promoção de seus do direito internacional, com pleno respeito à
direitos humanos soberania e à integridade territorial dos Estados,
Mudanças climáticas Abordagem inserida no contexto da Convenção o direito internacional humanitário, o direito
Marco das Nações Unidas sobre Mudança internacional dos refugiados e os direitos huma-
Climática (CMNUMC) e do Protocolo de Quioto, nos, bem como os compromissos emanados dos
com respeito ao princípio das responsabilida- convênios e instrumentos internacionais sobre a
des comuns, porém diferenciadas e respectivas matéria
capacidades Fonte: comunicados conjuntos resultantes de cúpulas semestrais do
Objetivos de Para que sejam alcançados, enfoque na necessi- Mercosul e países associados.
Desenvolvimento do dade de contar com projetos e recursos regulares Elaboração do autor.
Milênio e previsíveis de cooperação por parte dos países
desenvolvidos, de maior acesso de seus produtos
No que se refere às votações de resoluções da AGNU12, os dados
de exportação aos mercados internacionais, bem
como da criação de mecanismos inovadores de presentes na tabela 2 abaixo, representados em termos percentuais
financiamento pelo gráfico 1, confirmam haver uma tendência mais ou menos con-
Palestina Apoio ao direito do povo palestino de constituir tínua e estável de convergência13 entre os quatro Estados Partes ori-
um Estado, com base nas linhas de 1967, vivendo ginais do Mercosul – subindo de 74% em 2003 para 87% em 2012.
lado a lado com o Estado de Israel
Problema mundial das Enfoque integral e dentro do princípio da respon-
drogas sabilidade comum e compartilhada (regional e
global), com respeito ao direito internacional
12
A AGNU é um órgão plural, constituído por todos os países membros da
ONU. Desde 1945, quando foi aberta sua primeira sessão, diferentes questões
Propriedade intelectual Visão incorporada ao desenvolvimento e às
relativas à paz e à segurança internacionais têm sido discutidas em seu
políticas públicas, tendo preocupação com relação
âmbito, conforme está previsto no art. 11 da Carta das Nações Unidas. Além
a direitos sobre recursos biológicos e/ou conheci-
disso, a AGNU também tem promovido estudos e recomendações com vistas a
mentos tradicionais a eles vinculados
fomentar a cooperação internacional no plano político e no domínio econômico,
Reforma da ONU Compromisso com uma reforma ampla, integral social, cultural, educacional e da saúde, em conformidade com o art. 13
e urgente, que permita a democratização das ins- da Carta. Nesse fórum, a cada país cabe um voto com mesmo peso. Dessa
tâncias decisórias internacionais. Importância de maneira, em toda sessão anual da AGNU são aprovadas algumas centenas
continuar envidando esforços no sentido de pro- de resoluções  – em média, três quartos delas sem votação, as demais por
mover a necessária reforma do CSNU, tornando-o maioria absoluta – sobre os mais variados temas da política internacional. Em
mais democrático, representativo e transparente função dessa amplitude temática, geográfica e temporal, a análise do padrão
Rodada Doha Enfoque vinculado ao desenvolvimento. de votação dos países em resoluções da AGNU se caracteriza como um bom
Condenação de barreiras tarifárias, de apoio indicador do perfil de inserção política internacional dos países. Para o objetivo
doméstico e de subsídios à exportação por parte deste capítulo, serve ainda como indicador da convergência ou da afinidade
dos países desenvolvidos a produtos agrícolas, de posições e preferências políticas entre nações pertencentes a coalizões ou
os quais distorcem o comércio internacional e processos de integração regional no sistema internacional.
impedem o avanço do sistema multilateral 13
Considerou-se como “convergente” todos os votos iguais para uma
resolução (sim, não ou abstenção), enquanto “divergente” a existência de
pelo menos o voto de um país diferente dos demais para a resolução. Existem
casos em que, por diversas razões, os diplomatas que representam o país se

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Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

Migrantes Visão não discriminatória, independente da Terrorismo O combate a esse flagelo deve se desenvolver em
condição do migrante e de sua família, na busca conformidade com o direito interno e as normas
da garantia, do respeito e da promoção de seus do direito internacional, com pleno respeito à
direitos humanos soberania e à integridade territorial dos Estados,
Mudanças climáticas Abordagem inserida no contexto da Convenção o direito internacional humanitário, o direito
Marco das Nações Unidas sobre Mudança internacional dos refugiados e os direitos huma-
Climática (CMNUMC) e do Protocolo de Quioto, nos, bem como os compromissos emanados dos
com respeito ao princípio das responsabilida- convênios e instrumentos internacionais sobre a
des comuns, porém diferenciadas e respectivas matéria
capacidades Fonte: comunicados conjuntos resultantes de cúpulas semestrais do
Objetivos de Para que sejam alcançados, enfoque na necessi- Mercosul e países associados.
Desenvolvimento do dade de contar com projetos e recursos regulares Elaboração do autor.
Milênio e previsíveis de cooperação por parte dos países
desenvolvidos, de maior acesso de seus produtos
No que se refere às votações de resoluções da AGNU12, os dados
de exportação aos mercados internacionais, bem
como da criação de mecanismos inovadores de presentes na tabela 2 abaixo, representados em termos percentuais
financiamento pelo gráfico 1, confirmam haver uma tendência mais ou menos con-
Palestina Apoio ao direito do povo palestino de constituir tínua e estável de convergência13 entre os quatro Estados Partes ori-
um Estado, com base nas linhas de 1967, vivendo ginais do Mercosul – subindo de 74% em 2003 para 87% em 2012.
lado a lado com o Estado de Israel
Problema mundial das Enfoque integral e dentro do princípio da respon-
drogas sabilidade comum e compartilhada (regional e
global), com respeito ao direito internacional
12
A AGNU é um órgão plural, constituído por todos os países membros da
ONU. Desde 1945, quando foi aberta sua primeira sessão, diferentes questões
Propriedade intelectual Visão incorporada ao desenvolvimento e às
relativas à paz e à segurança internacionais têm sido discutidas em seu
políticas públicas, tendo preocupação com relação
âmbito, conforme está previsto no art. 11 da Carta das Nações Unidas. Além
a direitos sobre recursos biológicos e/ou conheci-
disso, a AGNU também tem promovido estudos e recomendações com vistas a
mentos tradicionais a eles vinculados
fomentar a cooperação internacional no plano político e no domínio econômico,
Reforma da ONU Compromisso com uma reforma ampla, integral social, cultural, educacional e da saúde, em conformidade com o art. 13
e urgente, que permita a democratização das ins- da Carta. Nesse fórum, a cada país cabe um voto com mesmo peso. Dessa
tâncias decisórias internacionais. Importância de maneira, em toda sessão anual da AGNU são aprovadas algumas centenas
continuar envidando esforços no sentido de pro- de resoluções  – em média, três quartos delas sem votação, as demais por
mover a necessária reforma do CSNU, tornando-o maioria absoluta – sobre os mais variados temas da política internacional. Em
mais democrático, representativo e transparente função dessa amplitude temática, geográfica e temporal, a análise do padrão
Rodada Doha Enfoque vinculado ao desenvolvimento. de votação dos países em resoluções da AGNU se caracteriza como um bom
Condenação de barreiras tarifárias, de apoio indicador do perfil de inserção política internacional dos países. Para o objetivo
doméstico e de subsídios à exportação por parte deste capítulo, serve ainda como indicador da convergência ou da afinidade
dos países desenvolvidos a produtos agrícolas, de posições e preferências políticas entre nações pertencentes a coalizões ou
os quais distorcem o comércio internacional e processos de integração regional no sistema internacional.
impedem o avanço do sistema multilateral 13
Considerou-se como “convergente” todos os votos iguais para uma
resolução (sim, não ou abstenção), enquanto “divergente” a existência de
pelo menos o voto de um país diferente dos demais para a resolução. Existem
casos em que, por diversas razões, os diplomatas que representam o país se

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Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

Tabela 2: Comportamento dos votos dos países As viradas mais acentuadas no gráfico entre 2003 e 2005 são
do Mercosul na AGNU (2003-2012) explicadas: a) no decréscimo inicial na ordem de 6% na conver-
Ano Convergente Divergente Total gência entre 2003 e 2004, pela agenda do contexto internacional,
2003 56 20 76 na qual, apesar da eliminação de divergências em duas resoluções,
2004 50 22 72 surgiram seis desacordos em questões conjunturais sobre temas
2005 61 13 74 variados; b) no aumento posterior de 69% para 82% de 2004
2006 75 12 87
para 2005, em parte pela eliminação daquelas questões conjuntu-
rais, em parte pela convergência em alguns casos, destacando-se o
2007 65 12 77
entendimento sobre o caso do Golã Sírio.
2008 61 12 73
A tabela 3 abaixo, na qual se encontram as ocorrências em que
2009 58 11 69
cada país do bloco é o responsável pela divergência14, apresen-
2010 53 9 62
ta uma mudança importante nesse período com relação aos anos
2011 56 9 65
1991-2002: redução da participação argentina de 53% para 36%
2012 59 9 68 dos casos, tornando a distribuição entre os países menos desigual.
2003-2012 594 129 723 Dessa forma, nota-se que, de fato, a Argentina pós-crise, a partir
Fonte: Strezhnev e Voeten (2013). dos governos de Néstor Kirchner e Cristina Fernández de Kirchner,
Elaborada pelo autor. experimentou um giro em sua política externa que se traduziu em
maior aproximação com os parceiros regionais em suas perspecti-
Gráfico 1: Percentual de convergência em votações vas. Isso se deve, em grande medida, aos desentendimentos dessa
na AGNU – Mercosul (2003-2012) administração com o Fundo Monetário Internacional (FMI), que
levaram o país a se afastar consideravelmente dos Estados Unidos –
rompendo as “relações carnais” com a superpotência outrora pro-
postas no governo Menem.

Tabela 3: Quantidade de casos em que cada país do


Mercosul é responsável pela divergência no bloco
em votações na AGNU (2003-2012)
País Casos %
Argentina 46 36%
Brasil 34 26%
Uruguai 18 14%
Paraguai 9 7%
Fonte: Strezhnev e Voeten (2013).
Elaborado pelo autor.
Em outras palavras, esses dados se referem à quantidade de casos em que
14

ausentam no momento da votação e o país não vota para a resolução (voto determinado país foi o único a votar de maneira diferente dos demais naquele
ausente). Essas ausências não foram consideradas como divergências. período.

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Tabela 2: Comportamento dos votos dos países As viradas mais acentuadas no gráfico entre 2003 e 2005 são
do Mercosul na AGNU (2003-2012) explicadas: a) no decréscimo inicial na ordem de 6% na conver-
Ano Convergente Divergente Total gência entre 2003 e 2004, pela agenda do contexto internacional,
2003 56 20 76 na qual, apesar da eliminação de divergências em duas resoluções,
2004 50 22 72 surgiram seis desacordos em questões conjunturais sobre temas
2005 61 13 74 variados; b) no aumento posterior de 69% para 82% de 2004
2006 75 12 87
para 2005, em parte pela eliminação daquelas questões conjuntu-
rais, em parte pela convergência em alguns casos, destacando-se o
2007 65 12 77
entendimento sobre o caso do Golã Sírio.
2008 61 12 73
A tabela 3 abaixo, na qual se encontram as ocorrências em que
2009 58 11 69
cada país do bloco é o responsável pela divergência14, apresen-
2010 53 9 62
ta uma mudança importante nesse período com relação aos anos
2011 56 9 65
1991-2002: redução da participação argentina de 53% para 36%
2012 59 9 68 dos casos, tornando a distribuição entre os países menos desigual.
2003-2012 594 129 723 Dessa forma, nota-se que, de fato, a Argentina pós-crise, a partir
Fonte: Strezhnev e Voeten (2013). dos governos de Néstor Kirchner e Cristina Fernández de Kirchner,
Elaborada pelo autor. experimentou um giro em sua política externa que se traduziu em
maior aproximação com os parceiros regionais em suas perspecti-
Gráfico 1: Percentual de convergência em votações vas. Isso se deve, em grande medida, aos desentendimentos dessa
na AGNU – Mercosul (2003-2012) administração com o Fundo Monetário Internacional (FMI), que
levaram o país a se afastar consideravelmente dos Estados Unidos –
rompendo as “relações carnais” com a superpotência outrora pro-
postas no governo Menem.

Tabela 3: Quantidade de casos em que cada país do


Mercosul é responsável pela divergência no bloco
em votações na AGNU (2003-2012)
País Casos %
Argentina 46 36%
Brasil 34 26%
Uruguai 18 14%
Paraguai 9 7%
Fonte: Strezhnev e Voeten (2013).
Elaborado pelo autor.
Em outras palavras, esses dados se referem à quantidade de casos em que
14

ausentam no momento da votação e o país não vota para a resolução (voto determinado país foi o único a votar de maneira diferente dos demais naquele
ausente). Essas ausências não foram consideradas como divergências. período.

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Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

Pares de países 22 17% Gráfico 2: Quantidade de casos por tema em que cada
país do Mercosul é responsável pela divergência no
TOTAL 129 100%
bloco em votações na AGNU (2003-2012)
Fonte: Strezhnev e Voeten (2013).
Elaborada pelo autor.

O gráfico 2 abaixo separa por temas15 os casos em que cada país


é responsável pela divergência. Enquanto a Argentina se absteve em
determinadas resoluções sobre desarmamento nuclear (enquanto os
demais países votaram a favor), houve uma redução de casos sobre
Palestina/Oriente Médio em comparação com o período anterior16.
O principal tema de discordância do Brasil, por sua vez, foram direi-
tos humanos. Metade dos casos se refere à reedição anual de uma
resolução em que é afirmado o impacto da globalização sobre a com-
pleta fruição dos direitos humanos; e a outra metade se deve a reso- Fonte: Strezhnev e Voeten (2013).
luções em que países são acusados de desrespeitá-los (Turcomenistão, Elaborada pelo autor.
Congo, Irã, Bielorrússia, Coreia do Norte e Mianmar)17. Por fim,
quase todos os casos sobre Palestina/Oriente Médio em que o A tabela 4 abaixo contém a distribuição por temas de todos os
Uruguai responde pela divergência no bloco regional se referem a casos divergentes de 2003 a 2012. Em razão de um número consi-
resoluções reeditadas anualmente em que são abordadas as atividades derável de resoluções sobre direitos humanos e questão nuclear em
do Comitê para os Exercícios Inalienáveis do Povo Palestino18. que o Brasil e a Argentina divergem dos demais, esses dois temas
juntos respondem por mais da metade das discordâncias, seguidos
O tema “Sistema ONU” se refere a questões ou assuntos que se relacionam
15 de Palestina/Oriente Médio, em boa parte decorrente dos casos
com a criação ou modificação dos poderes e funções de qualquer um dos uruguaios.
órgãos da ONU. A AGNU tem prerrogativa para fazê-lo, segundo o art. 10 da
Carta das Nações Unidas. O tema “Questão nuclear”, por sua vez, envolve Tabela 4: Quantidade de casos por tema em que há divergência
desarmamento, não-proliferação e uso pacífico da tecnologia nuclear. entre os países do Mercosul em votações na AGNU (2003-2012)
16
De 1991-2002, dos casos em que a Argentina era responsável pela
Tema Casos Parcela correspondente
divergência no bloco, 27% se concentravam em resoluções que versavam
sobre Palestina/Oriente Médio, o que é explicado pelo seu alinhamento Direitos Humanos 42 33%
automático com os Estados Unidos nessas questões. Ressalte-se ainda, para Questão nuclear 34 26%
o reforço dessas posições, a influência do ataque à Embaixada de Israel em Palestina / Oriente 25 19%
Buenos Aires de 1992 e do carro-bomba que destruiu a sede da associação Médio
israelita Amia na mesma cidade em 1994.
Desenvolvimento 13 10%
O Brasil se absteve e os demais votaram a favor. A diplomacia brasileira evita
17

assinar resoluções nas quais países sejam acusados de desrespeitar direitos Controle de arma- 7 5%
humanos, apontando que os países desenvolvidos têm duplo comportamento mentos
nessa matéria – acusam os demais, mas têm problemas domésticos. Sistema ONU 5 4%
18
Uruguai se abstém, os demais votam a favor.

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Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

Pares de países 22 17% Gráfico 2: Quantidade de casos por tema em que cada
país do Mercosul é responsável pela divergência no
TOTAL 129 100%
bloco em votações na AGNU (2003-2012)
Fonte: Strezhnev e Voeten (2013).
Elaborada pelo autor.

O gráfico 2 abaixo separa por temas15 os casos em que cada país


é responsável pela divergência. Enquanto a Argentina se absteve em
determinadas resoluções sobre desarmamento nuclear (enquanto os
demais países votaram a favor), houve uma redução de casos sobre
Palestina/Oriente Médio em comparação com o período anterior16.
O principal tema de discordância do Brasil, por sua vez, foram direi-
tos humanos. Metade dos casos se refere à reedição anual de uma
resolução em que é afirmado o impacto da globalização sobre a com-
pleta fruição dos direitos humanos; e a outra metade se deve a reso- Fonte: Strezhnev e Voeten (2013).
luções em que países são acusados de desrespeitá-los (Turcomenistão, Elaborada pelo autor.
Congo, Irã, Bielorrússia, Coreia do Norte e Mianmar)17. Por fim,
quase todos os casos sobre Palestina/Oriente Médio em que o A tabela 4 abaixo contém a distribuição por temas de todos os
Uruguai responde pela divergência no bloco regional se referem a casos divergentes de 2003 a 2012. Em razão de um número consi-
resoluções reeditadas anualmente em que são abordadas as atividades derável de resoluções sobre direitos humanos e questão nuclear em
do Comitê para os Exercícios Inalienáveis do Povo Palestino18. que o Brasil e a Argentina divergem dos demais, esses dois temas
juntos respondem por mais da metade das discordâncias, seguidos
O tema “Sistema ONU” se refere a questões ou assuntos que se relacionam
15 de Palestina/Oriente Médio, em boa parte decorrente dos casos
com a criação ou modificação dos poderes e funções de qualquer um dos uruguaios.
órgãos da ONU. A AGNU tem prerrogativa para fazê-lo, segundo o art. 10 da
Carta das Nações Unidas. O tema “Questão nuclear”, por sua vez, envolve Tabela 4: Quantidade de casos por tema em que há divergência
desarmamento, não-proliferação e uso pacífico da tecnologia nuclear. entre os países do Mercosul em votações na AGNU (2003-2012)
16
De 1991-2002, dos casos em que a Argentina era responsável pela
Tema Casos Parcela correspondente
divergência no bloco, 27% se concentravam em resoluções que versavam
sobre Palestina/Oriente Médio, o que é explicado pelo seu alinhamento Direitos Humanos 42 33%
automático com os Estados Unidos nessas questões. Ressalte-se ainda, para Questão nuclear 34 26%
o reforço dessas posições, a influência do ataque à Embaixada de Israel em Palestina / Oriente 25 19%
Buenos Aires de 1992 e do carro-bomba que destruiu a sede da associação Médio
israelita Amia na mesma cidade em 1994.
Desenvolvimento 13 10%
O Brasil se absteve e os demais votaram a favor. A diplomacia brasileira evita
17

assinar resoluções nas quais países sejam acusados de desrespeitar direitos Controle de arma- 7 5%
humanos, apontando que os países desenvolvidos têm duplo comportamento mentos
nessa matéria – acusam os demais, mas têm problemas domésticos. Sistema ONU 5 4%
18
Uruguai se abstém, os demais votam a favor.

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Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

Segurança 3 2% Por fim, um dado adicional é merecedor de nota no exame do


Meio ambiente 0 0% desempenho do Mercosul como coalizão internacional nesse perío-
TOTAL 129 100% do: a conquista de dois cargos importantes em organizações inter-
nacionais. Em 2011, José Graziano da Silva foi eleito diretor-geral
Fonte: Strezhnev e Voeten (2013).
Elaborada pelo autor. da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação
(FAO, sigla em inglês). Posteriormente, em 2013, o embaixador
A tabela 5 abaixo apresenta a divergência dentro de cada tema brasileiro Roberto Azevêdo foi eleito diretor-geral da OMC. Em
para os países do Mercosul. Sua função é verificar se a distribuição ambos os casos, foi a primeira vez que um latino-americano con-
dos temas na tabela 4 apenas reflete a composição das frequências seguiu conquistar o posto. Contribuíram para as duas conquistas:
temáticas de todas as resoluções colocadas para votação ou se real- a liderança brasileira no processo de integração sul-americana19;
mente a divergência é mais frequente nos primeiros temas da lista. a visibilidade da campanha mundial contra a fome lançada pela
De uma forma geral, as posições dos temas nas duas tabelas não diplomacia presidencial do governo Lula; e a importância da atu-
apresentam grandes alterações, salvo o caso das resoluções sobre o ação do Brasil, ao lado da Índia, frente ao G-20 comercial e às
sistema ONU, que aparecem em terceiro lugar na tabela 5. De toda demandas pela liberalização dos setores agrícolas. Afinal, são frutos
forma, por se tratarem de questões administrativas em que posições concretos da estratégia de cooperação Sul-Sul e, portanto, da con-
mais gerais de política externa não estão em jogo – composição do certação política entre os países do Mercosul.
pessoal do Escritório do Alto Comissário das Nações Unidas para
os Direitos Humanos, por exemplo –, a análise realizada até aqui O Brasil, a América do Sul e a cooperação Sul-Sul: coope-
não é prejudicada. ração para o desenvolvimento
Tabela 5: Percentual de divergência dentro de cada tema entre Nesta seção, optou-se por confrontar a cooperação para o desen-
os países do Mercosul em votações na AGNU (2003-2012) volvimento prestada pelo Brasil aos Estados Partes do Mercosul
com as iniciativas globais nesse campo empreendidas pelo país
Tema Percentual durante o governo Lula – de maneira a revelar semelhanças e espe-
Direitos Humanos 28% cificidades entre os contextos, bem como dimensionar a impor-
Questão nuclear 26% tância relativa conferida ao entorno regional. Dessa forma, na pri-
Sistema ONU 17% meira subseção a comparação do contexto regional é realizada com
Palestina / Oriente Médio 14% os projetos de cooperação técnica empreendidos nos três maiores
Segurança 14% países africanos da Comunidade de Países de Língua Portuguesa
Desenvolvimento 13% (CPLP): Angola, Guiné-Bissau e Moçambique. O objeto de inves-
Controle de armamentos 8% tigação são as grandes áreas temáticas que abrangeram os projetos.
Meio ambiente 0% No tocante aos dispêndios financeiros, a segunda subseção se
dedica a comparar a contribuição brasileira apenas ao Focem com
Fonte: Strezhnev e Voeten (2013).
Elaborada pelo autor.
Ressalte-se que o concorrente de Roberto Azevêdo era mexicano, mas os
19

países sul-americanos votaram no candidato brasileiro.

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Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

Segurança 3 2% Por fim, um dado adicional é merecedor de nota no exame do


Meio ambiente 0 0% desempenho do Mercosul como coalizão internacional nesse perío-
TOTAL 129 100% do: a conquista de dois cargos importantes em organizações inter-
nacionais. Em 2011, José Graziano da Silva foi eleito diretor-geral
Fonte: Strezhnev e Voeten (2013).
Elaborada pelo autor. da Organização das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação
(FAO, sigla em inglês). Posteriormente, em 2013, o embaixador
A tabela 5 abaixo apresenta a divergência dentro de cada tema brasileiro Roberto Azevêdo foi eleito diretor-geral da OMC. Em
para os países do Mercosul. Sua função é verificar se a distribuição ambos os casos, foi a primeira vez que um latino-americano con-
dos temas na tabela 4 apenas reflete a composição das frequências seguiu conquistar o posto. Contribuíram para as duas conquistas:
temáticas de todas as resoluções colocadas para votação ou se real- a liderança brasileira no processo de integração sul-americana19;
mente a divergência é mais frequente nos primeiros temas da lista. a visibilidade da campanha mundial contra a fome lançada pela
De uma forma geral, as posições dos temas nas duas tabelas não diplomacia presidencial do governo Lula; e a importância da atu-
apresentam grandes alterações, salvo o caso das resoluções sobre o ação do Brasil, ao lado da Índia, frente ao G-20 comercial e às
sistema ONU, que aparecem em terceiro lugar na tabela 5. De toda demandas pela liberalização dos setores agrícolas. Afinal, são frutos
forma, por se tratarem de questões administrativas em que posições concretos da estratégia de cooperação Sul-Sul e, portanto, da con-
mais gerais de política externa não estão em jogo – composição do certação política entre os países do Mercosul.
pessoal do Escritório do Alto Comissário das Nações Unidas para
os Direitos Humanos, por exemplo –, a análise realizada até aqui O Brasil, a América do Sul e a cooperação Sul-Sul: coope-
não é prejudicada. ração para o desenvolvimento
Tabela 5: Percentual de divergência dentro de cada tema entre Nesta seção, optou-se por confrontar a cooperação para o desen-
os países do Mercosul em votações na AGNU (2003-2012) volvimento prestada pelo Brasil aos Estados Partes do Mercosul
com as iniciativas globais nesse campo empreendidas pelo país
Tema Percentual durante o governo Lula – de maneira a revelar semelhanças e espe-
Direitos Humanos 28% cificidades entre os contextos, bem como dimensionar a impor-
Questão nuclear 26% tância relativa conferida ao entorno regional. Dessa forma, na pri-
Sistema ONU 17% meira subseção a comparação do contexto regional é realizada com
Palestina / Oriente Médio 14% os projetos de cooperação técnica empreendidos nos três maiores
Segurança 14% países africanos da Comunidade de Países de Língua Portuguesa
Desenvolvimento 13% (CPLP): Angola, Guiné-Bissau e Moçambique. O objeto de inves-
Controle de armamentos 8% tigação são as grandes áreas temáticas que abrangeram os projetos.
Meio ambiente 0% No tocante aos dispêndios financeiros, a segunda subseção se
dedica a comparar a contribuição brasileira apenas ao Focem com
Fonte: Strezhnev e Voeten (2013).
Elaborada pelo autor.
Ressalte-se que o concorrente de Roberto Azevêdo era mexicano, mas os
19

países sul-americanos votaram no candidato brasileiro.

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Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

o valor da assistência que os parceiros do Mercosul receberam das Brasil no combate a doenças tropicais, como a dengue e a malária.
nações desenvolvidas, estas com base em dados do próprio Focem Com os parceiros regionais, observou-se nos três casos a instala-
e da OCDE. Apenas para o ano de 2010, em função da disponibi- ção, pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), de Bancos de Leite
lidade dos dados, também se comparou a presença dos recursos da Humano em hospitais. Ademais, com o Uruguai e também com
cooperação brasileira para o desenvolvimento no Mercosul e nos Moçambique, o Brasil empreendeu capacitações relacionadas ao
três maiores países africanos da CPLP com a prestada pelos paí- combate à epidemia HIV/Aids, por exemplo.
ses da OCDE às mesmas nações, utilizando dados disponibilizados Com relação à capacitação profissional, o Brasil, por meio do
pelo Ipea e pela ABC (2013), além dos dados da OCDE. Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), desenvol-
veu em parceria com estes países centros binacionais de forma-
Cooperação técnica com países do Mercosul e com os três maiores ção profissional e de ensino técnico. O objetivo desses centros foi
países africanos da CPLP transferir capacidades brasileiras desenvolvidas para a especializa-
Com base em dois catálogos publicados pela ABC (2010, ção da mão-de-obra local em alguns setores da economia, como
2010a), foram comparados os projetos bilaterais de cooperação téc- turismo e alimentos.
nica para o desenvolvimento empreendidos pelo Brasil nos países Os projetos de cooperação em agropecuária, executados por
do Mercosul com os colocados em prática nos três maiores países intermédio principalmente da Embrapa, caracterizaram-se pela
africanos da CPLP  – tendo como critério as áreas temáticas que assistência técnica nas áreas do agronegócio e de biocombustíveis.
abrangem. Cumpre salientar que esses catálogos versam sobre os A similaridade geográfica entre esses países, por se encontrarem em
projetos em negociação, em execução ou executados no período regiões tropicais e subtropicais, a depender dos casos, fez aumentar
entre 2006 e 2010. Ainda que esses projetos sejam um recorte do a lista de contribuições a oferecer pelo Brasil.
universo da cooperação técnica, eles podem ser considerados uma Por fim, os casos de apoio ao governo local variaram de acordo
amostra representativa para o governo Lula (2003-2010) como com as necessidades dos parceiros, contando com a participação de
um todo, uma vez que os catálogos foram organizados pela pró- uma diversidade maior de instituições públicas brasileiras. São exem-
pria agência brasileira, traduzidos em quatro idiomas, com objetivo plos: fortalecimento da gestão do patrimônio cultural em Angola;
publicitário de expor as principais áreas de atuação do país no cam- interoperabilidade de governo eletrônico na Argentina; fortalecimen-
po da cooperação para o desenvolvimento no período em relevo. to da Assembleia Popular Nacional de Guiné-Bissau; apoio à insta-
Afinal, a análise dos projetos presentes nos catálogos revela que, lação do Sistema Nacional de Arquivos do Estado de Moçambique;
seja de um lado, com Argentina, Paraguai e Uruguai, seja de outro modelagem de política postal no Paraguai; e fortalecimento da capa-
lado, com Angola, Guiné-Bissau e Moçambique, mais de dois ter- cidade institucional em vigilância sanitária no Uruguai.
ços das iniciativas corresponderam em ambos os grupos às áreas de Do ponto de vista bilateral, portanto, apesar de haver diferenças
saúde, capacitação profissional, agropecuária e apoio ao governo. nos projetos de cooperação técnica de acordo com as necessidades
Portanto, considerando as iniciativas bilaterais, não houve diferen- locais das contrapartes, o Brasil baseou suas iniciativas na qualidade
ças significativas nos âmbitos sul-americano e africano quanto às de suas próprias capacidades domésticas. Valendo-se de similarida-
áreas temáticas abrangidas pelos projetos. des geográficas e culturais, exportou suas práticas mais bem-suce-
No caso dos projetos bilaterais de cooperação em saúde, didas para manter parcerias duradouras com os sócios do Mercosul
entre outras iniciativas, em ambos os contextos geográficos hou- e com os maiores países africanos da CPLP. Dessa forma, buscou
ve exportação de políticas públicas do Ministério da Saúde do ainda, de forma solidária, conquistar prestígio internacional.

234 235
Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

o valor da assistência que os parceiros do Mercosul receberam das Brasil no combate a doenças tropicais, como a dengue e a malária.
nações desenvolvidas, estas com base em dados do próprio Focem Com os parceiros regionais, observou-se nos três casos a instala-
e da OCDE. Apenas para o ano de 2010, em função da disponibi- ção, pela Fundação Oswaldo Cruz (Fiocruz), de Bancos de Leite
lidade dos dados, também se comparou a presença dos recursos da Humano em hospitais. Ademais, com o Uruguai e também com
cooperação brasileira para o desenvolvimento no Mercosul e nos Moçambique, o Brasil empreendeu capacitações relacionadas ao
três maiores países africanos da CPLP com a prestada pelos paí- combate à epidemia HIV/Aids, por exemplo.
ses da OCDE às mesmas nações, utilizando dados disponibilizados Com relação à capacitação profissional, o Brasil, por meio do
pelo Ipea e pela ABC (2013), além dos dados da OCDE. Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai), desenvol-
veu em parceria com estes países centros binacionais de forma-
Cooperação técnica com países do Mercosul e com os três maiores ção profissional e de ensino técnico. O objetivo desses centros foi
países africanos da CPLP transferir capacidades brasileiras desenvolvidas para a especializa-
Com base em dois catálogos publicados pela ABC (2010, ção da mão-de-obra local em alguns setores da economia, como
2010a), foram comparados os projetos bilaterais de cooperação téc- turismo e alimentos.
nica para o desenvolvimento empreendidos pelo Brasil nos países Os projetos de cooperação em agropecuária, executados por
do Mercosul com os colocados em prática nos três maiores países intermédio principalmente da Embrapa, caracterizaram-se pela
africanos da CPLP  – tendo como critério as áreas temáticas que assistência técnica nas áreas do agronegócio e de biocombustíveis.
abrangem. Cumpre salientar que esses catálogos versam sobre os A similaridade geográfica entre esses países, por se encontrarem em
projetos em negociação, em execução ou executados no período regiões tropicais e subtropicais, a depender dos casos, fez aumentar
entre 2006 e 2010. Ainda que esses projetos sejam um recorte do a lista de contribuições a oferecer pelo Brasil.
universo da cooperação técnica, eles podem ser considerados uma Por fim, os casos de apoio ao governo local variaram de acordo
amostra representativa para o governo Lula (2003-2010) como com as necessidades dos parceiros, contando com a participação de
um todo, uma vez que os catálogos foram organizados pela pró- uma diversidade maior de instituições públicas brasileiras. São exem-
pria agência brasileira, traduzidos em quatro idiomas, com objetivo plos: fortalecimento da gestão do patrimônio cultural em Angola;
publicitário de expor as principais áreas de atuação do país no cam- interoperabilidade de governo eletrônico na Argentina; fortalecimen-
po da cooperação para o desenvolvimento no período em relevo. to da Assembleia Popular Nacional de Guiné-Bissau; apoio à insta-
Afinal, a análise dos projetos presentes nos catálogos revela que, lação do Sistema Nacional de Arquivos do Estado de Moçambique;
seja de um lado, com Argentina, Paraguai e Uruguai, seja de outro modelagem de política postal no Paraguai; e fortalecimento da capa-
lado, com Angola, Guiné-Bissau e Moçambique, mais de dois ter- cidade institucional em vigilância sanitária no Uruguai.
ços das iniciativas corresponderam em ambos os grupos às áreas de Do ponto de vista bilateral, portanto, apesar de haver diferenças
saúde, capacitação profissional, agropecuária e apoio ao governo. nos projetos de cooperação técnica de acordo com as necessidades
Portanto, considerando as iniciativas bilaterais, não houve diferen- locais das contrapartes, o Brasil baseou suas iniciativas na qualidade
ças significativas nos âmbitos sul-americano e africano quanto às de suas próprias capacidades domésticas. Valendo-se de similarida-
áreas temáticas abrangidas pelos projetos. des geográficas e culturais, exportou suas práticas mais bem-suce-
No caso dos projetos bilaterais de cooperação em saúde, didas para manter parcerias duradouras com os sócios do Mercosul
entre outras iniciativas, em ambos os contextos geográficos hou- e com os maiores países africanos da CPLP. Dessa forma, buscou
ve exportação de políticas públicas do Ministério da Saúde do ainda, de forma solidária, conquistar prestígio internacional.

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Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

Contudo, apesar das semelhanças, houve uma importante dife- do Processo de Integração: projetos que atendam à melhoria das
rença entre os dois contextos que não pode ser perdida de vista. instituições do Mercosul e seu eventual desenvolvimento.
Enquanto com estes países africanos os projetos de cooperação para A composição financeira anual do Focem foi estabelecida no
o desenvolvimento foram realizados essencialmente pela via bila- valor de US$ 100 milhões de dólares, integralizados a fundo per-
teral, com os parceiros do bloco regional houve outra via funda- dido pelos Estados Partes na seguinte proporção: Argentina, 27%;
mental de relacionamento: os projetos financiados pelo Focem. Por Brasil, 70%; Paraguai, 1%; e Uruguai, 2%. Por outro lado, a dis-
isso, esse tema receberá atenção mais detalhada na seção seguinte. tribuição dos recursos, os quais devem ser utilizados pelos Estados
Partes em projetos vinculados aos programas I, II ou III20, ocor-
Projetos e gastos anuais com o Focem re na seguinte proporção: Argentina, 10%; Brasil, 10%; Paraguai,
Em julho de 2004, o Conselho do Mercado Comum (CMC) 48%; Uruguai, 32%. Dessa maneira, ficou clara a decisão de trans-
criou um grupo de alto nível com a função de propor fórmulas de ferir recursos dos sócios maiores para as economias menores, com o
financiamento para a realização de iniciativas e programas que pro- objetivo de reduzir as assimetrias no bloco por meio da cooperação
movessem a competitividade e a convergência estrutural das econo- regional para o desenvolvimento.
mias dos Estados Partes do Mercosul. Como resultado do trabalho Em dezembro de 2005, foi aprovado o regimento do fundo, no
desse grupo, em dezembro de 2004 foi estabelecido o Fundo para a qual foram determinadas, essencialmente, as regras de cunho técni-
Convergência Estrutural do Mercosul (Focem). co para a submissão dos projetos. Ao longo de 2006, essa decisão
Em junho de 2005, as regras de funcionamento do Focem foi internalizada pelos parlamentos nacionais dos Estados Partes até
foram pontuadas. Com o objetivo de estabelecer critérios para a que, finalmente, em 2007, foi aprovado para o Paraguai o primeiro
projeto financiado pelo Focem.
seleção dos projetos que seriam financiados, quatro programas
Compilando os dados presentes nos projetos aprovados pelo
foram criados no interior do fundo: I) Programa de Convergência
Focem, calcula-se que entre 2007 e 2010, a média de utilização
Estrutural: projetos que contribuam para o desenvolvimento das
anual do fundo pelos países parceiros do Brasil ocorreu da seguin-
economias menores e regiões menos desenvolvidas, incluindo o
te forma: Argentina, US$ 4,72 milhões; Paraguai US$ 47,81
aprimoramento dos sistemas de integração fronteiriça e dos siste-
milhões21; e Uruguai, US$ 24,2 milhões. Considerando o conjun-
mas de comunicação em geral; II) Programa de Desenvolvimento to dos três sócios22, a distribuição dos recursos entre os programas
da Competitividade: projetos que contribuam com a produtivida- do fundo ocorreu da seguinte maneira nesse período: 85% para
de no Mercosul, incluindo processos de reconversão produtiva e o Programa de Convergência Estrutural, 5% para o Programa de
trabalhista que facilitem a criação de comércio e projetos de inte-
gração de cadeias produtivas ou de fortalecimento da institucio- 20
Apenas 0,5% dos recursos do Focem se destinam ao programa IV.
nalidade pública e privada nos aspectos vinculados à qualidade da Essa média foi calculada sem contar o projeto 03/10, “Construção da Linha
21

produção, bem como pesquisa e desenvolvimento de novos produ- de Transmissão 500 kV Itaipú  – Villa Hayes, da Subestação Villa Hayes e da
tos e processos produtivos; III) Programa de Coesão Social: proje- ampliação da Subestação Margem Direita Itaipu”, o qual foi feito em regime
tos que contribuam para o desenvolvimento social, em particular especial, com aporte extraordinário brasileiro de US$ 300 milhões em 2010.

em zonas de fronteira, podendo incluir projetos de interesse comu- Para os objetivos deste capítulo, não faz sentido incluir nessa listagem os
22

projetos em que o Brasil se posiciona como receptor dos recursos do Focem,


nitário nas áreas de saúde pública, redução da pobreza e desempre- uma vez que a análise está interessada em avaliar o desempenho do país
go; IV) Programa de Fortalecimento da Estrutura Institucional e como doador da cooperação para o desenvolvimento no bloco regional.

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Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

Contudo, apesar das semelhanças, houve uma importante dife- do Processo de Integração: projetos que atendam à melhoria das
rença entre os dois contextos que não pode ser perdida de vista. instituições do Mercosul e seu eventual desenvolvimento.
Enquanto com estes países africanos os projetos de cooperação para A composição financeira anual do Focem foi estabelecida no
o desenvolvimento foram realizados essencialmente pela via bila- valor de US$ 100 milhões de dólares, integralizados a fundo per-
teral, com os parceiros do bloco regional houve outra via funda- dido pelos Estados Partes na seguinte proporção: Argentina, 27%;
mental de relacionamento: os projetos financiados pelo Focem. Por Brasil, 70%; Paraguai, 1%; e Uruguai, 2%. Por outro lado, a dis-
isso, esse tema receberá atenção mais detalhada na seção seguinte. tribuição dos recursos, os quais devem ser utilizados pelos Estados
Partes em projetos vinculados aos programas I, II ou III20, ocor-
Projetos e gastos anuais com o Focem re na seguinte proporção: Argentina, 10%; Brasil, 10%; Paraguai,
Em julho de 2004, o Conselho do Mercado Comum (CMC) 48%; Uruguai, 32%. Dessa maneira, ficou clara a decisão de trans-
criou um grupo de alto nível com a função de propor fórmulas de ferir recursos dos sócios maiores para as economias menores, com o
financiamento para a realização de iniciativas e programas que pro- objetivo de reduzir as assimetrias no bloco por meio da cooperação
movessem a competitividade e a convergência estrutural das econo- regional para o desenvolvimento.
mias dos Estados Partes do Mercosul. Como resultado do trabalho Em dezembro de 2005, foi aprovado o regimento do fundo, no
desse grupo, em dezembro de 2004 foi estabelecido o Fundo para a qual foram determinadas, essencialmente, as regras de cunho técni-
Convergência Estrutural do Mercosul (Focem). co para a submissão dos projetos. Ao longo de 2006, essa decisão
Em junho de 2005, as regras de funcionamento do Focem foi internalizada pelos parlamentos nacionais dos Estados Partes até
foram pontuadas. Com o objetivo de estabelecer critérios para a que, finalmente, em 2007, foi aprovado para o Paraguai o primeiro
projeto financiado pelo Focem.
seleção dos projetos que seriam financiados, quatro programas
Compilando os dados presentes nos projetos aprovados pelo
foram criados no interior do fundo: I) Programa de Convergência
Focem, calcula-se que entre 2007 e 2010, a média de utilização
Estrutural: projetos que contribuam para o desenvolvimento das
anual do fundo pelos países parceiros do Brasil ocorreu da seguin-
economias menores e regiões menos desenvolvidas, incluindo o
te forma: Argentina, US$ 4,72 milhões; Paraguai US$ 47,81
aprimoramento dos sistemas de integração fronteiriça e dos siste-
milhões21; e Uruguai, US$ 24,2 milhões. Considerando o conjun-
mas de comunicação em geral; II) Programa de Desenvolvimento to dos três sócios22, a distribuição dos recursos entre os programas
da Competitividade: projetos que contribuam com a produtivida- do fundo ocorreu da seguinte maneira nesse período: 85% para
de no Mercosul, incluindo processos de reconversão produtiva e o Programa de Convergência Estrutural, 5% para o Programa de
trabalhista que facilitem a criação de comércio e projetos de inte-
gração de cadeias produtivas ou de fortalecimento da institucio- 20
Apenas 0,5% dos recursos do Focem se destinam ao programa IV.
nalidade pública e privada nos aspectos vinculados à qualidade da Essa média foi calculada sem contar o projeto 03/10, “Construção da Linha
21

produção, bem como pesquisa e desenvolvimento de novos produ- de Transmissão 500 kV Itaipú  – Villa Hayes, da Subestação Villa Hayes e da
tos e processos produtivos; III) Programa de Coesão Social: proje- ampliação da Subestação Margem Direita Itaipu”, o qual foi feito em regime
tos que contribuam para o desenvolvimento social, em particular especial, com aporte extraordinário brasileiro de US$ 300 milhões em 2010.

em zonas de fronteira, podendo incluir projetos de interesse comu- Para os objetivos deste capítulo, não faz sentido incluir nessa listagem os
22

projetos em que o Brasil se posiciona como receptor dos recursos do Focem,


nitário nas áreas de saúde pública, redução da pobreza e desempre- uma vez que a análise está interessada em avaliar o desempenho do país
go; IV) Programa de Fortalecimento da Estrutura Institucional e como doador da cooperação para o desenvolvimento no bloco regional.

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Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

Desenvolvimento da Competitividade e 10% para o Programa Tabela 9: Principais países doadores da assistência ofi-
de Coesão Social. Dessa forma, observa-se que, enquanto o cial para o desenvolvimento recebida por Argentina, Paraguai
e Uruguai (2007-2010) – Em milhões de US$ correntes
Paraguai utilizou os recursos de acordo com seu limite, Argentina
e Uruguai subutilizaram suas cotas no período 2007-2010. Argentina
Ademais, como era de se esperar, o tema da convergência estru- 2007 2008 2009 2010
tural recebeu destaque, uma vez que essa foi a principal demanda País Valor País Valor País Valor País Valor
que conduziu à criação do fundo. Espanha 21,63 Espanha 29,67 Espanha 24,14 Japão 40,33
No Paraguai, o país mais pobre do Mercosul, predominaram França 16,80 Alemanha 22,12 Alemanha 22,70 Espanha 22,96
projetos de infraestrutura, como pavimentação de ruas e estra- Japão 15,09 França 12,75 França 12,27 Alemanha 21,93
das e construção de estruturas de saneamento básico em zonas Paraguai
2007 2008 2009 2010
urbanas. Outros projetos se dedicaram à construção de casas em
País Valor País Valor País Valor País Valor
regiões afetadas pela pobreza extrema, enquanto alguns se vol- Japão 28,90 Japão 30,85 Espanha 38,89 EUA 28,00
taram a prestar capacitação profissional a comunidades caren- EUA 24,90 EUA 29,67 Japão 37,31 Espanha 21,84
tes. Em 2010, com aporte extraordinário brasileiro de US$ 300 Coreia do
Espanha 13,26 Espanha 23,03 EUA 26,52 11,63
milhões, aprovou-se o projeto 03/1023, “Construção da Linha de Sul
Transmissão 500 kV Itaipú  – Villa Hayes, da Subestação Villa Uruguai
Hayes e da ampliação da Subestação Margem Direita Itaipu”. 2007 2008 2009 2010
País Valor País Valor País Valor País Valor
Essa obra objetiva transportar a energia de Itaipu até a zona
Espanha 12,65 Espanha 9,36 Itália 13,34 Japão 11,36
metropolitana de Assunção, oferecendo assim as condições para França 2,88 França 1,36 Espanha 12,23 Itália 8,61
que lá se desenvolva um polo industrial baseado em mão de obra Japão 2,59 Canadá 1,06 Japão 2,43 Espanha 8,41
e energia baratas integrado com as cadeias produtivas brasileiras. Fonte: OCDE.
No caso do Uruguai, aprovaram-se também dois projetos de
Elaborada pelo autor.
reabilitação de estradas e um projeto de interconexão elétrica com
o Brasil. Os projetos sociais voltaram-se para o campo do desen- À exceção do caso argentino, que pela própria filosofia do
volvimento sustentável e os de capacitação se concentraram em
fundo tem recepção menor dos recursos, o Focem se caracterizou
política industrial. A Argentina, por sua vez, também efetuou um
como o principal provedor da cooperação internacional para o
projeto de interligação de infraestrutura elétrica com o Uruguai.
desenvolvimento recebida por Paraguai e Uruguai em todos os anos
Seus outros projetos preocuparam-se com o acesso de populações
considerados. Tomando apenas a parte que é financiada pelo Brasil
vulneráveis à educação e com a capacitação de exportadores.
De maneira a dimensionar a importância dos recursos investi- (70%)24, por intermédio somente do Focem (sem contar projetos
dos nesses projetos, os quais são em sua maioria provenientes do bilaterais) o país foi o maior provedor de cooperação internacio-
Brasil (70%), a tabela 9 abaixo apresenta os dispêndios dos princi- nal para o desenvolvimento do Paraguai e do Uruguai em todos os
pais doadores da AOD recebida por Argentina, Paraguai e Uruguai anos analisados (2007-2010)25.
entre 2007 e 2010.
Valores: US$ 3,30 milhões (Argentina), US$ 33,46 milhões (Paraguai) e US$
24

23
Apenas para não enviesar o resultado e tornar os valores muito discrepantes, 16,94 milhões (Uruguai).
esse projeto não foi incluído no cálculo da média de utilizações de recursos do Para 2009, no caso paraguaio, o valor da cooperação espanhola é maior do
25

fundo por cada país. que o da média calculada da contribuição brasileira. Entretanto, nesse caso,

238 239
Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

Desenvolvimento da Competitividade e 10% para o Programa Tabela 9: Principais países doadores da assistência ofi-
de Coesão Social. Dessa forma, observa-se que, enquanto o cial para o desenvolvimento recebida por Argentina, Paraguai
e Uruguai (2007-2010) – Em milhões de US$ correntes
Paraguai utilizou os recursos de acordo com seu limite, Argentina
e Uruguai subutilizaram suas cotas no período 2007-2010. Argentina
Ademais, como era de se esperar, o tema da convergência estru- 2007 2008 2009 2010
tural recebeu destaque, uma vez que essa foi a principal demanda País Valor País Valor País Valor País Valor
que conduziu à criação do fundo. Espanha 21,63 Espanha 29,67 Espanha 24,14 Japão 40,33
No Paraguai, o país mais pobre do Mercosul, predominaram França 16,80 Alemanha 22,12 Alemanha 22,70 Espanha 22,96
projetos de infraestrutura, como pavimentação de ruas e estra- Japão 15,09 França 12,75 França 12,27 Alemanha 21,93
das e construção de estruturas de saneamento básico em zonas Paraguai
2007 2008 2009 2010
urbanas. Outros projetos se dedicaram à construção de casas em
País Valor País Valor País Valor País Valor
regiões afetadas pela pobreza extrema, enquanto alguns se vol- Japão 28,90 Japão 30,85 Espanha 38,89 EUA 28,00
taram a prestar capacitação profissional a comunidades caren- EUA 24,90 EUA 29,67 Japão 37,31 Espanha 21,84
tes. Em 2010, com aporte extraordinário brasileiro de US$ 300 Coreia do
Espanha 13,26 Espanha 23,03 EUA 26,52 11,63
milhões, aprovou-se o projeto 03/1023, “Construção da Linha de Sul
Transmissão 500 kV Itaipú  – Villa Hayes, da Subestação Villa Uruguai
Hayes e da ampliação da Subestação Margem Direita Itaipu”. 2007 2008 2009 2010
País Valor País Valor País Valor País Valor
Essa obra objetiva transportar a energia de Itaipu até a zona
Espanha 12,65 Espanha 9,36 Itália 13,34 Japão 11,36
metropolitana de Assunção, oferecendo assim as condições para França 2,88 França 1,36 Espanha 12,23 Itália 8,61
que lá se desenvolva um polo industrial baseado em mão de obra Japão 2,59 Canadá 1,06 Japão 2,43 Espanha 8,41
e energia baratas integrado com as cadeias produtivas brasileiras. Fonte: OCDE.
No caso do Uruguai, aprovaram-se também dois projetos de
Elaborada pelo autor.
reabilitação de estradas e um projeto de interconexão elétrica com
o Brasil. Os projetos sociais voltaram-se para o campo do desen- À exceção do caso argentino, que pela própria filosofia do
volvimento sustentável e os de capacitação se concentraram em
fundo tem recepção menor dos recursos, o Focem se caracterizou
política industrial. A Argentina, por sua vez, também efetuou um
como o principal provedor da cooperação internacional para o
projeto de interligação de infraestrutura elétrica com o Uruguai.
desenvolvimento recebida por Paraguai e Uruguai em todos os anos
Seus outros projetos preocuparam-se com o acesso de populações
considerados. Tomando apenas a parte que é financiada pelo Brasil
vulneráveis à educação e com a capacitação de exportadores.
De maneira a dimensionar a importância dos recursos investi- (70%)24, por intermédio somente do Focem (sem contar projetos
dos nesses projetos, os quais são em sua maioria provenientes do bilaterais) o país foi o maior provedor de cooperação internacio-
Brasil (70%), a tabela 9 abaixo apresenta os dispêndios dos princi- nal para o desenvolvimento do Paraguai e do Uruguai em todos os
pais doadores da AOD recebida por Argentina, Paraguai e Uruguai anos analisados (2007-2010)25.
entre 2007 e 2010.
Valores: US$ 3,30 milhões (Argentina), US$ 33,46 milhões (Paraguai) e US$
24

23
Apenas para não enviesar o resultado e tornar os valores muito discrepantes, 16,94 milhões (Uruguai).
esse projeto não foi incluído no cálculo da média de utilizações de recursos do Para 2009, no caso paraguaio, o valor da cooperação espanhola é maior do
25

fundo por cada país. que o da média calculada da contribuição brasileira. Entretanto, nesse caso,

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Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

A tabela 10 abaixo, por seu turno, contém dados da cooperação Tabela 11: Principais países doadores da assistência oficial
internacional para o desenvolvimento prestada pelo Brasil no ano para o desenvolvimento recebida por Angola, Guiné-Bissau
de 2010 para Argentina, Paraguai e Uruguai, seja bilateral, seja por e Moçambique em 2010 – Em milhões de US$
meio do Focem. A tabela 11 seguinte, por sua vez, apresenta os Angola Guiné-Bissau Moçambique
principais doadores da AOD recebida por Angola, Guiné-Bissau e País Valor País Valor País Valor
Moçambique em 2010. A cooperação brasileira prestada a esses três EUA 54,82 Japão 16,11 EUA 277,91
países em 2010 somou US$ 2,6 milhões, US$ 7,8 milhões e US$
Japão 37,62 Portugal 15,72 Portugal 112,62
4,9 milhões, respectivamente, de acordo com os dados levantados
pelo Ipea e pela ABC (2013). Coreia do Sul 18,83 Espanha 8,29 Reino Unido 104,42
Comparando os dados das duas tabelas, infere-se que o Brasil, Fonte: OCDE.
em função essencialmente da criação do Focem e por intermédio Elaborada pelo autor.
dele, ocupou o primeiro lugar entre os financiadores da coopera-
ção para o desenvolvimento do Paraguai e do Uruguai também em Afinal, por mais que US$ 100 milhões anuais possam parecer
2010. Ao mesmo tempo, apesar de importantes esforços, o país ficou um montante diminuto para um fundo com as grandes pretensões
longe de conquistar essa posição com, de um lado, a Argentina, que do Focem, deve-se ter em mente que os dados apresentados dimen-
não era o principal destino dos recursos do Focem e tem assimetria sionam seu verdadeiro tamanho se examinado em comparação com
estrutural relativamente menor com o Brasil e, de outro lado, com a AOD que os sócios menores do Mercosul recebem das nações
os três maiores países africanos da CPLP, onde já existe vasta pre- desenvolvidas. Dessa maneira, a avaliação desses valores deixa claro
sença histórica de recursos das potências tradicionais do Comitê de como a cooperação para o desenvolvimento e a redução das assime-
Assistência para o Desenvolvimento (CAD) da OCDE. trias com os sócios menores do bloco regional se tornou uma preo-
cupação importante da política externa brasileira no tratamento do
Tabela 10: Cooperação internacional para o
desenvolvimento prestada pelo Brasil a Argentina, Mercosul a partir da criação do Focem.
Paraguai e Uruguai em 2010 – em milhões de US$ Portanto, se na estratégia brasileira de cooperação Sul-Sul a explo-
País ração de áreas para promoção da cooperação para o desenvolvimen-
Modalidade Argentina Paraguai Uruguai to se apresentou recorrentemente como um objetivo paralelo ao da
Técnica 1,18 1,10 0,60 coordenação de posições para a atuação conjunta na política inter-
Científica e tecnológica 5,31 0,15 0,27 nacional, na América do Sul os rumos perseguidos não se mostraram
Outras* 2,97 2,70 1,96 de forma alguma diferentes. Com efeito, no caso do bloco econômi-
Focem 3,30** 33,46** 16,94** co regional, a prestação de cooperação para o desenvolvimento tam-
TOTAL 12,76 37,41 19,77 bém foi empreendida, priorizada e institucionalizada  – de maneira
* Pode envolver cooperação educacional e assistência humanitária. inédita. Com as dimensões que ela adquiriu, o Brasil se posicionou
** 70% da média anual de utilização do país no período 2007-2010. desde 2007 como o principal parceiro mundial dos dois sócios
Fonte: Ipea; ABC, 2013; Focem (www.mercosur.int/focem). menores do bloco nesse campo, à frente mesmo de todas as grandes
Elaborada pelo autor. potências – situação que não logrou conquistar com nenhum outro
parceiro com quem tenha cooperado no mesmo período em outra
para que a comparação seja justa, o projeto 03/10 deve entrar na média.
parte do mundo, com destaque para a África lusófona.

240 241
Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

A tabela 10 abaixo, por seu turno, contém dados da cooperação Tabela 11: Principais países doadores da assistência oficial
internacional para o desenvolvimento prestada pelo Brasil no ano para o desenvolvimento recebida por Angola, Guiné-Bissau
de 2010 para Argentina, Paraguai e Uruguai, seja bilateral, seja por e Moçambique em 2010 – Em milhões de US$
meio do Focem. A tabela 11 seguinte, por sua vez, apresenta os Angola Guiné-Bissau Moçambique
principais doadores da AOD recebida por Angola, Guiné-Bissau e País Valor País Valor País Valor
Moçambique em 2010. A cooperação brasileira prestada a esses três EUA 54,82 Japão 16,11 EUA 277,91
países em 2010 somou US$ 2,6 milhões, US$ 7,8 milhões e US$
Japão 37,62 Portugal 15,72 Portugal 112,62
4,9 milhões, respectivamente, de acordo com os dados levantados
pelo Ipea e pela ABC (2013). Coreia do Sul 18,83 Espanha 8,29 Reino Unido 104,42
Comparando os dados das duas tabelas, infere-se que o Brasil, Fonte: OCDE.
em função essencialmente da criação do Focem e por intermédio Elaborada pelo autor.
dele, ocupou o primeiro lugar entre os financiadores da coopera-
ção para o desenvolvimento do Paraguai e do Uruguai também em Afinal, por mais que US$ 100 milhões anuais possam parecer
2010. Ao mesmo tempo, apesar de importantes esforços, o país ficou um montante diminuto para um fundo com as grandes pretensões
longe de conquistar essa posição com, de um lado, a Argentina, que do Focem, deve-se ter em mente que os dados apresentados dimen-
não era o principal destino dos recursos do Focem e tem assimetria sionam seu verdadeiro tamanho se examinado em comparação com
estrutural relativamente menor com o Brasil e, de outro lado, com a AOD que os sócios menores do Mercosul recebem das nações
os três maiores países africanos da CPLP, onde já existe vasta pre- desenvolvidas. Dessa maneira, a avaliação desses valores deixa claro
sença histórica de recursos das potências tradicionais do Comitê de como a cooperação para o desenvolvimento e a redução das assime-
Assistência para o Desenvolvimento (CAD) da OCDE. trias com os sócios menores do bloco regional se tornou uma preo-
cupação importante da política externa brasileira no tratamento do
Tabela 10: Cooperação internacional para o
desenvolvimento prestada pelo Brasil a Argentina, Mercosul a partir da criação do Focem.
Paraguai e Uruguai em 2010 – em milhões de US$ Portanto, se na estratégia brasileira de cooperação Sul-Sul a explo-
País ração de áreas para promoção da cooperação para o desenvolvimen-
Modalidade to se apresentou recorrentemente como um objetivo paralelo ao da
Argentina Paraguai Uruguai
Técnica 1,18 1,10 0,60 coordenação de posições para a atuação conjunta na política inter-
Científica e tecnológica 5,31 0,15 0,27 nacional, na América do Sul os rumos perseguidos não se mostraram
Outras* 2,97 2,70 1,96 de forma alguma diferentes. Com efeito, no caso do bloco econômi-
Focem 3,30** 33,46** 16,94** co regional, a prestação de cooperação para o desenvolvimento tam-
TOTAL 12,76 37,41 19,77 bém foi empreendida, priorizada e institucionalizada  – de maneira
* Pode envolver cooperação educacional e assistência humanitária. inédita. Com as dimensões que ela adquiriu, o Brasil se posicionou
** 70% da média anual de utilização do país no período 2007-2010. desde 2007 como o principal parceiro mundial dos dois sócios
Fonte: Ipea; ABC, 2013; Focem (www.mercosur.int/focem). menores do bloco nesse campo, à frente mesmo de todas as grandes
Elaborada pelo autor. potências – situação que não logrou conquistar com nenhum outro
parceiro com quem tenha cooperado no mesmo período em outra
para que a comparação seja justa, o projeto 03/10 deve entrar na média.
parte do mundo, com destaque para a África lusófona.

240 241
Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

Conclusão A crise política doméstica permitiu que a tradição formulado-


ra em política externa do corpo diplomático brasileiro atenuasse a
Desde a aproximação brasileira com a Argentina promovida no maneira como esse paradigma viesse se expressar nos anos seguin-
governo Sarney em 1985 até a construção da Unasul no final da tes na política externa. Assim, preocupado com as investidas ame-
gestão do governo Lula em 2008, o sentido estratégico conferido ricanas, o governo Itamar propôs a criação da ALCSA, insistindo
pelo Brasil à integração regional passou por importantes mudan- em um ainda maior sentido estratégico de coalizão internacional
ças. Ainda que essas alterações tenham ocorrido sucessivamente para a integração regional. Para o Mercosul, imprimiu um relativo
conforme as diferentes estratégias de projeção externa foram efeti- retorno ao gradualismo no processo de convergência econômica,
vadas pelos governos que chegaram ao poder, deve-se sublinhar que buscando resguardar a autonomia de ação do país.
a integração não perdeu em momento algum seu caráter de grande Com a chegada do governo Cardoso, a participação nos regi-
prioridade entre os objetivos nacionais. mes internacionais, entendida como uma forma de elevar a credi-
Nesse sentido, na visão da diplomacia do governo Sarney, em bilidade externa do país, passou a ser o eixo central da ação exter-
que predominava ainda o paradigma globalista26 de inserção inter- na, buscando assim seguir abandonando a clivagem Norte-Sul na
nacional, a aproximação proposta com os argentinos deveria ser inserção internacional. Para o bloco econômico, diante das nego-
realizada gradualmente e com a intervenção estatal na economia. ciações da Alca e da pressão doméstica contra esse projeto, con-
Politicamente, ela servia essencialmente ao objetivo de pacifi- solidou-se a visão de que o Mercosul contribuía estrategicamen-
car as relações bilaterais, deixando para trás desconfianças que se te para reforçar a autonomia do país nas relações internacionais,
baseavam no nacionalismo dos regimes militares. Dessa maneira, pois representava, ao mesmo tempo, fonte de fluxos econômicos
demonstrava também o compromisso mútuo com suas consolida- e coalizão internacional contra o avanço do processo hemisféri-
ções democráticas, melhorando sua imagem externa. co. Contudo, esse sentido econômico do bloco acabou ficando
A partir do governo Collor de Mello, no qual ganhou espa- em suspenso por ocasião da crise que perdurou de 1998 a 2002.
ço o paradigma americanista, preconizou-se a adoção dos padrões Como tentativas de renová-lo, destacam-se o lançamento da Iirsa
ocidentais capitalistas e a aliança especial com os Estados Unidos e a retomada da ideia de América do Sul – que, com alterações,
como formas de modernizar o país. Ao Mercosul, instituído sob resultaria na formação da Unasul.
a filosofia do regionalismo aberto, coube duas funções: constituir Paralelamente, o Mercosul desenvolveu ao longo do gover-
um espaço de liberalização de fluxos econômicos a partir do qual no Cardoso a institucionalização do sentido estratégico de ordem
os setores produtivos nacionais se preparariam para a posterior política que o bloco exibia desde os contatos Sarney-Alfonsín.
abertura à competição global; e, como atesta o Acordo 4+1, agre- Entres as iniciativas efetuadas  – com a participação de Bolívia e
gar capacidades para a negociação de uma eventual área de livre Chile  – estão o mecanismo de defesa da estabilidade democráti-
comércio hemisférica. ca regional (Protocolo de Ushuaia), a declaração da região como
zona de paz (que inclui o estímulo da cooperação militar e da ins-
26
Esse paradigma tem três características: 1) crítica nacionalista à matriz tituição de medidas de fomento da confiança), além do estímulo
americanista da política externa brasileira tradicional; 2) visão das relações da atuação global dos membros em coalizão (Fórum de Consulta e
econômicas internacionais sob o prisma centro-periferia; 3) concepção teórica
Concertação Política do Mercosul – FCCP). Localiza-se no gover-
realista das relações políticas internacionais, em que se entende que o sistema
internacional é anárquico e os países têm o dever de defender seus interesses
no Cardoso, assim, o embrião para a conformação do bloco como
nacionais (Lima, 1994, p. 35). espaço de governança regional. Mais do que isso, considerando que

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Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

Conclusão A crise política doméstica permitiu que a tradição formulado-


ra em política externa do corpo diplomático brasileiro atenuasse a
Desde a aproximação brasileira com a Argentina promovida no maneira como esse paradigma viesse se expressar nos anos seguin-
governo Sarney em 1985 até a construção da Unasul no final da tes na política externa. Assim, preocupado com as investidas ame-
gestão do governo Lula em 2008, o sentido estratégico conferido ricanas, o governo Itamar propôs a criação da ALCSA, insistindo
pelo Brasil à integração regional passou por importantes mudan- em um ainda maior sentido estratégico de coalizão internacional
ças. Ainda que essas alterações tenham ocorrido sucessivamente para a integração regional. Para o Mercosul, imprimiu um relativo
conforme as diferentes estratégias de projeção externa foram efeti- retorno ao gradualismo no processo de convergência econômica,
vadas pelos governos que chegaram ao poder, deve-se sublinhar que buscando resguardar a autonomia de ação do país.
a integração não perdeu em momento algum seu caráter de grande Com a chegada do governo Cardoso, a participação nos regi-
prioridade entre os objetivos nacionais. mes internacionais, entendida como uma forma de elevar a credi-
Nesse sentido, na visão da diplomacia do governo Sarney, em bilidade externa do país, passou a ser o eixo central da ação exter-
que predominava ainda o paradigma globalista26 de inserção inter- na, buscando assim seguir abandonando a clivagem Norte-Sul na
nacional, a aproximação proposta com os argentinos deveria ser inserção internacional. Para o bloco econômico, diante das nego-
realizada gradualmente e com a intervenção estatal na economia. ciações da Alca e da pressão doméstica contra esse projeto, con-
Politicamente, ela servia essencialmente ao objetivo de pacifi- solidou-se a visão de que o Mercosul contribuía estrategicamen-
car as relações bilaterais, deixando para trás desconfianças que se te para reforçar a autonomia do país nas relações internacionais,
baseavam no nacionalismo dos regimes militares. Dessa maneira, pois representava, ao mesmo tempo, fonte de fluxos econômicos
demonstrava também o compromisso mútuo com suas consolida- e coalizão internacional contra o avanço do processo hemisféri-
ções democráticas, melhorando sua imagem externa. co. Contudo, esse sentido econômico do bloco acabou ficando
A partir do governo Collor de Mello, no qual ganhou espa- em suspenso por ocasião da crise que perdurou de 1998 a 2002.
ço o paradigma americanista, preconizou-se a adoção dos padrões Como tentativas de renová-lo, destacam-se o lançamento da Iirsa
ocidentais capitalistas e a aliança especial com os Estados Unidos e a retomada da ideia de América do Sul – que, com alterações,
como formas de modernizar o país. Ao Mercosul, instituído sob resultaria na formação da Unasul.
a filosofia do regionalismo aberto, coube duas funções: constituir Paralelamente, o Mercosul desenvolveu ao longo do gover-
um espaço de liberalização de fluxos econômicos a partir do qual no Cardoso a institucionalização do sentido estratégico de ordem
os setores produtivos nacionais se preparariam para a posterior política que o bloco exibia desde os contatos Sarney-Alfonsín.
abertura à competição global; e, como atesta o Acordo 4+1, agre- Entres as iniciativas efetuadas  – com a participação de Bolívia e
gar capacidades para a negociação de uma eventual área de livre Chile  – estão o mecanismo de defesa da estabilidade democráti-
comércio hemisférica. ca regional (Protocolo de Ushuaia), a declaração da região como
zona de paz (que inclui o estímulo da cooperação militar e da ins-
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Esse paradigma tem três características: 1) crítica nacionalista à matriz tituição de medidas de fomento da confiança), além do estímulo
americanista da política externa brasileira tradicional; 2) visão das relações da atuação global dos membros em coalizão (Fórum de Consulta e
econômicas internacionais sob o prisma centro-periferia; 3) concepção teórica
Concertação Política do Mercosul – FCCP). Localiza-se no gover-
realista das relações políticas internacionais, em que se entende que o sistema
internacional é anárquico e os países têm o dever de defender seus interesses
no Cardoso, assim, o embrião para a conformação do bloco como
nacionais (Lima, 1994, p. 35). espaço de governança regional. Mais do que isso, considerando que

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Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

posteriormente os demais países andinos vieram se somar a esses e capacidades para estimular a multipolaridade e para defender seus
outros instrumentos do Mercosul na condição de associados, essas interesses numa ordem baseada no multilateralismo – conforman-
experiências revelam que, em larga medida, na prática as principais do aquele que seria o mundo ideal (multi-multi) para o país defen-
atividades propostas para a Unasul já existiam antes da assinatura der seus interesses e seguir seu caminho rumo ao desenvolvimento.
do seu tratado constitutivo. De fato, a diversificação de parceiros proporcionada pela estra-
Retomando a análise histórica, após a crise de múltiplas dimen- tégia de cooperação Sul-Sul, acompanhada pelo excelente desem-
sões enfrentada pelo Mercosul na virada do milênio, a chegada ao penho de alguns indicadores econômicos e sociais conquistados
poder do governo Lula em 2003, proferindo pela voz da carismáti- pelo país (crescimento econômico, controle da inflação, redução da
ca diplomacia presidencial um discurso crítico sobre as desigualda- pobreza e da desigualdade social, aumento das reservas internacio-
des sociais e internacionais produzidas pela globalização, e ao mes- nais), foi capaz de alterar o perfil do país e projetá-lo no sistema
mo tempo liderando uma assertiva campanha mundial de combate internacional como potência emergente e ator global.
à fome e à pobreza extrema, provocou diversas inflexões na política O país impulsionou várias coalizões com diferentes parceiros
externa brasileira, algumas mais acentuadas que outras. do mundo em desenvolvimento. Estão na lista o G-20 agrícola na
Fundamentalmente, a nova proposta de inserção internacional OMC o Fórum de Diálogo Ibas, a Cúpula Aspa, a Cúpula ASA e a
se diferenciou das anteriores por se basear em uma estratégia de Cúpula Brics. Na ocasião desses encontros, também se exploraram
cooperação Sul-Sul. Com efeito, a execução dessa estratégia, a par- domínios nos quais a cooperação para o desenvolvimento pudesse
tir da qual se diversificaram os parceiros do Brasil em direção aos ser introduzida posteriormente pela via bilateral. Embora cada uma
países do Sul, não se caracterizava como um fim em si mesmo. O tenha apresentado seu enfoque diferenciado de agenda, o protago-
objetivo último certamente era o desenvolvimento do país, confor- nismo brasileiro na idealização do conjunto dessas coalizões pro-
me tradicionalmente a corporação diplomática logrou manter ao porcionou ao país uma ampliação significativa na diversidade de
longo dos anos como o princípio basilar de qualquer concepção de parcerias concretizadas ao redor do planeta.
projeção internacional que tenha sido proposta por algum governo. No que concerne ao entorno regional, deve ser lembrado que
A estratégia, assim, constituiu-se num meio que, apesar de apre- o sentido estratégico conferido ao Mercosul como coalizão inter-
sentar objetivos próprios, devia servir ao desígnio basilar que guia a nacional, em primeiro lugar, esteve presente nas visões de todos os
ação externa brasileira. governos brasileiros que estiveram à frente do país desde que o blo-
O governo Lula, que vivenciou uma crise cambial pelo temor co surgiu. No entanto, a investigação dos comunicados conjuntos
do mercado de que medidas econômicas heterodoxas fossem toma- demonstra a ocorrência de coordenação de visões para temas que
das com sua eleição, reconhecia a potencialidade do setor externo vão além da agenda econômico-comercial. Os dados dos votos na
tanto para contribuir como para constranger o desempenho do país AGNU – baixa divergência, concentrada em poucos temas – tam-
na superação de seus desafios sociais e econômicos. Os formulado- bém referendam esse argumento.
res da política externa consideravam que, de um lado, diante dos Uma possível explicação para essa ocorrência se encontra
reveses sofridos pelo multilateralismo com a instauração da Guerra no relançamento do Mercosul efetuado a partir do Consenso de
Contra o Terror e, de outro lado, com o aumento da competição Buenos Aires. A expansão da agenda da integração em direção às
econômica global, a qual intensificou a desigualdade Norte-Sul no dimensões social e política, procurando trazer as sociedades para
planeta, o Brasil precisava engajar-se diplomaticamente para se tor- dentro do processo, exibia também no conjunto de suas metas a
nar um ator global relevante e influente. Com isso, possuiria mais ampliação do diálogo a respeito de temas de interesse comum da

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Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

posteriormente os demais países andinos vieram se somar a esses e capacidades para estimular a multipolaridade e para defender seus
outros instrumentos do Mercosul na condição de associados, essas interesses numa ordem baseada no multilateralismo – conforman-
experiências revelam que, em larga medida, na prática as principais do aquele que seria o mundo ideal (multi-multi) para o país defen-
atividades propostas para a Unasul já existiam antes da assinatura der seus interesses e seguir seu caminho rumo ao desenvolvimento.
do seu tratado constitutivo. De fato, a diversificação de parceiros proporcionada pela estra-
Retomando a análise histórica, após a crise de múltiplas dimen- tégia de cooperação Sul-Sul, acompanhada pelo excelente desem-
sões enfrentada pelo Mercosul na virada do milênio, a chegada ao penho de alguns indicadores econômicos e sociais conquistados
poder do governo Lula em 2003, proferindo pela voz da carismáti- pelo país (crescimento econômico, controle da inflação, redução da
ca diplomacia presidencial um discurso crítico sobre as desigualda- pobreza e da desigualdade social, aumento das reservas internacio-
des sociais e internacionais produzidas pela globalização, e ao mes- nais), foi capaz de alterar o perfil do país e projetá-lo no sistema
mo tempo liderando uma assertiva campanha mundial de combate internacional como potência emergente e ator global.
à fome e à pobreza extrema, provocou diversas inflexões na política O país impulsionou várias coalizões com diferentes parceiros
externa brasileira, algumas mais acentuadas que outras. do mundo em desenvolvimento. Estão na lista o G-20 agrícola na
Fundamentalmente, a nova proposta de inserção internacional OMC o Fórum de Diálogo Ibas, a Cúpula Aspa, a Cúpula ASA e a
se diferenciou das anteriores por se basear em uma estratégia de Cúpula Brics. Na ocasião desses encontros, também se exploraram
cooperação Sul-Sul. Com efeito, a execução dessa estratégia, a par- domínios nos quais a cooperação para o desenvolvimento pudesse
tir da qual se diversificaram os parceiros do Brasil em direção aos ser introduzida posteriormente pela via bilateral. Embora cada uma
países do Sul, não se caracterizava como um fim em si mesmo. O tenha apresentado seu enfoque diferenciado de agenda, o protago-
objetivo último certamente era o desenvolvimento do país, confor- nismo brasileiro na idealização do conjunto dessas coalizões pro-
me tradicionalmente a corporação diplomática logrou manter ao porcionou ao país uma ampliação significativa na diversidade de
longo dos anos como o princípio basilar de qualquer concepção de parcerias concretizadas ao redor do planeta.
projeção internacional que tenha sido proposta por algum governo. No que concerne ao entorno regional, deve ser lembrado que
A estratégia, assim, constituiu-se num meio que, apesar de apre- o sentido estratégico conferido ao Mercosul como coalizão inter-
sentar objetivos próprios, devia servir ao desígnio basilar que guia a nacional, em primeiro lugar, esteve presente nas visões de todos os
ação externa brasileira. governos brasileiros que estiveram à frente do país desde que o blo-
O governo Lula, que vivenciou uma crise cambial pelo temor co surgiu. No entanto, a investigação dos comunicados conjuntos
do mercado de que medidas econômicas heterodoxas fossem toma- demonstra a ocorrência de coordenação de visões para temas que
das com sua eleição, reconhecia a potencialidade do setor externo vão além da agenda econômico-comercial. Os dados dos votos na
tanto para contribuir como para constranger o desempenho do país AGNU – baixa divergência, concentrada em poucos temas – tam-
na superação de seus desafios sociais e econômicos. Os formulado- bém referendam esse argumento.
res da política externa consideravam que, de um lado, diante dos Uma possível explicação para essa ocorrência se encontra
reveses sofridos pelo multilateralismo com a instauração da Guerra no relançamento do Mercosul efetuado a partir do Consenso de
Contra o Terror e, de outro lado, com o aumento da competição Buenos Aires. A expansão da agenda da integração em direção às
econômica global, a qual intensificou a desigualdade Norte-Sul no dimensões social e política, procurando trazer as sociedades para
planeta, o Brasil precisava engajar-se diplomaticamente para se tor- dentro do processo, exibia também no conjunto de suas metas a
nar um ator global relevante e influente. Com isso, possuiria mais ampliação do diálogo a respeito de temas de interesse comum da

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agenda política global, de forma a coordenar as posições de polí- AYLLÓN, B. El eje Sur-Sur en política exterior del gobierno Lula:
tica externa. Não se pode deixar de mencionar como fator expli- cooperación e intereses. 2009. Disponível em: < http://www.
cativo, adicionalmente, a convergência de visões político-ideoló- infolatam.com/2009/12/23/el-eje-sur-sur-en-la-politica-exterior-del-
gicas dos governos no poder dos Estados Partes desde as eleições gobierno-lula-cooperacion-e-intereses/>. Acesso em: 25 fev. 2013.
de Luiz Inácio Lula da Silva no Brasil (2003), Néstor Kirchner na AYLLÓN, B.; LEITE, I. C. La cooperación Sur-Sur de Brasil:
Argentina (2003), Tabaré Vázquez no Uruguai (2005) e, um pouco ¿instrumento de política exterior y/o manifestación de solidaridad
mais tarde, Fernando Lugo no Paraguai (2008). internacional? Mural internacional, ano 1, n. 1, jan./jun. 2010.
O tratamento do bloco como destino da cooperação para
o desenvolvimento, por sua vez, é inédito na história da política BRASIL. Balanço de governo 2003-2010. 2010. Disponível em:
externa brasileira para o Mercosul. A partir da criação do Focem, <http://www.balancodegoverno.presidencia.gov.br/>. Acesso em:
18 set. 2013.
quando foi instituído o compromisso brasileiro de contribuir anu-
almente com US$ 70 milhões para o financiamento de projetos BURGES, S. Developing from the South: South-South cooperation in
para a redução das assimetrias no bloco, alterou-se significativa- the global development game. Austral, v.1, n. 2, p. 225-49, 2012.
mente a concepção que vinha sendo atribuída ao processo regional.
Em outras palavras, o Mercosul deixou de ser idealizado apenas BUZAN, B. A leader without followers? The United States in world
politics after Bush. The Global Policy Institute, 2007 (Policy Paper
como um ambiente no qual as empresas brasileiras se prepara-
n. 2).
vam para a competição global, para se transformar também num
espaço em que o Brasil, ao contribuir com o desenvolvimento dos ECOSOC. South-South and triangular cooperation: improving
sócios menores, passaria a construir parcerias duradouras – visando information and data. 2009. Disponível em: < http://www.
integrar cadeias produtivas, por exemplo  – e conquistar prestígio aidtransparency.net/wp-content/uploads/2011/08/Analytical-Study-
internacional. Em decorrência, serviria de insumo para o reconhe- SSC-November-2009.pdf>. Acesso em: 4 fev. 2013.
cimento como potência emergente que cumpre com suas responsa-
HIRST, M. Brazil’s renewed responsibilities in cooperation for
bilidades regionais.
development and international security. Center on international
cooperation, New York University, 2011.
Referências bibliográficas
HIRST, M.; LIMA, M. R. S.; PINHEIRO, L. A política externa
ABC. A cooperação técnica do Brasil para a África. Brasília: ABC, brasileira em tempos de novos horizontes e desafios. Revista Nueva
Sociedad, Especial em português, p. 22-41, 2010.
PNUD, 2010.
INOUE, C.; VAZ, A. Emerging donors in international development
_________. Cooperação técnica entre o Brasil e os países da América
assistance: the Brazil case. 2007. Disponível em: < http://www.idrc.
do Sul. Brasília: ABC, PNUD, 2010a.
ca/EN/Documents/Case-of-Brazil.pdf>. Acesso em: 4 jul. 2013.
AMORIM, C. Brazilian foreign policy under President Lula (2003- _________. Brazil as “Southern donor”: beyond hierarchy and
2010): an overview. Revista brasileira de política internacional, national interests in development cooperation? Cambridge review
Brasília, v. 53, edição especial, p. 214-40, 2010. of international affairs, v. 25, n. 4, p. 507-34, dez.2012.

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Walter Antonio Desiderá Neto O Brasil, a América do Sul e a Cooperação Sul-Sul

agenda política global, de forma a coordenar as posições de polí- AYLLÓN, B. El eje Sur-Sur en política exterior del gobierno Lula:
tica externa. Não se pode deixar de mencionar como fator expli- cooperación e intereses. 2009. Disponível em: < http://www.
cativo, adicionalmente, a convergência de visões político-ideoló- infolatam.com/2009/12/23/el-eje-sur-sur-en-la-politica-exterior-del-
gicas dos governos no poder dos Estados Partes desde as eleições gobierno-lula-cooperacion-e-intereses/>. Acesso em: 25 fev. 2013.
de Luiz Inácio Lula da Silva no Brasil (2003), Néstor Kirchner na AYLLÓN, B.; LEITE, I. C. La cooperación Sur-Sur de Brasil:
Argentina (2003), Tabaré Vázquez no Uruguai (2005) e, um pouco ¿instrumento de política exterior y/o manifestación de solidaridad
mais tarde, Fernando Lugo no Paraguai (2008). internacional? Mural internacional, ano 1, n. 1, jan./jun. 2010.
O tratamento do bloco como destino da cooperação para
o desenvolvimento, por sua vez, é inédito na história da política BRASIL. Balanço de governo 2003-2010. 2010. Disponível em:
externa brasileira para o Mercosul. A partir da criação do Focem, <http://www.balancodegoverno.presidencia.gov.br/>. Acesso em:
18 set. 2013.
quando foi instituído o compromisso brasileiro de contribuir anu-
almente com US$ 70 milhões para o financiamento de projetos BURGES, S. Developing from the South: South-South cooperation in
para a redução das assimetrias no bloco, alterou-se significativa- the global development game. Austral, v.1, n. 2, p. 225-49, 2012.
mente a concepção que vinha sendo atribuída ao processo regional.
Em outras palavras, o Mercosul deixou de ser idealizado apenas BUZAN, B. A leader without followers? The United States in world
politics after Bush. The Global Policy Institute, 2007 (Policy Paper
como um ambiente no qual as empresas brasileiras se prepara-
n. 2).
vam para a competição global, para se transformar também num
espaço em que o Brasil, ao contribuir com o desenvolvimento dos ECOSOC. South-South and triangular cooperation: improving
sócios menores, passaria a construir parcerias duradouras – visando information and data. 2009. Disponível em: < http://www.
integrar cadeias produtivas, por exemplo  – e conquistar prestígio aidtransparency.net/wp-content/uploads/2011/08/Analytical-Study-
internacional. Em decorrência, serviria de insumo para o reconhe- SSC-November-2009.pdf>. Acesso em: 4 fev. 2013.
cimento como potência emergente que cumpre com suas responsa-
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2010): an overview. Revista brasileira de política internacional, national interests in development cooperation? Cambridge review
Brasília, v. 53, edição especial, p. 214-40, 2010. of international affairs, v. 25, n. 4, p. 507-34, dez.2012.

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Aires: Catálogos, p. 281-311, 2011.
Cooperao_Brasileira.pdf>. Acesso em: 4 fev. 2013.
SARAIVA, J. F. S. O lugar da África. Brasília: Editora da UnB, 1996.
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da política externa brasileira de 1993 a 2007. Revista Brasileira de
LIMA, M. R. S. Ejes analíticos y conflictos de paradigmas en la
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