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pela sessão. Dizer também que considero a tarefa tão difícil quanto interessante. E que
aproveitei a chamada do encontro “Sessão Livre” para compor uma fala despreocupada
aqui - muito também porque creio que não seja difícil reconhece-los.
Assim como eu a entendi, a questão que nos anima a pensar hoje é a mudança do oikos
antropológico provocada, nos últimos anos, pela entrada contínua de novos praticantes da
disciplina, sujeitos que, por suas feições e “origens”, tiveram um papel específico e
ecológica da universidade tem sido colocado e pensado de variadas maneiras. Uma das
formas menos interessantes de lidar com o fato é justamente aquela que desloca até os
nativo, operando-a não como uma ferramenta heurística (aquela que a ciência cria para
produz como um de seus efeitos, primeiro, a expectativa de que esses novos sujeitos irão
demais com a própria vida para que possam pensar (mal!) em outras coisas que não em
transformar, em alguma medida, em antropólogos, não na mesma medida que eles, claro.
Para além de seu equívoco lógico, essa maneira de colocar a questão é a mim
vez, desse encerramento. E muito me alegra que hoje nós estejamos pensando nisso aqui,
coletivamente e em voz alta. Os mais fortes entre nós vêm dando o grito de indignação
desde sempre e graças a eles eu posso hoje transformar meu incômodo em algo mais do
aqui sabem, tenho toda uma dificuldade em englobar-me nos limites do subgrupo
ter uma cara, um cabelo e uma cor diferente da maioria daqueles que assim se denominam
etnólogos americanistas poderia ser suficiente para justificar esse meu sentimento de não
pertencer ao grupo, mas o fato de não existir entre eles muitos como eu, infelizmente, não
minha diferença figura como espécie de determinante ou limite daquilo que posso vir a
busca de um outro, a tal busca elementar da etnologia, é preciso estar na proa do navio,
ou nas fileiras de uma expedição, ou entre aqueles que podem andar livremente pela
cidade, para desde essa posição poder tirar as consequências intelectuais do trajeto, da
estada e da volta. Eu, que vim no subterrâneo dos negreiros, habitei os recônditos das
florestas, sertões e ilhas, e, agora, tenho que me preocupar pelas ruas por onde passo e a
que horas, se posso fruir a experiência, dizem, que seja só para dela dar notícias, para
dizer de mim e dos meus, das nossas mazelas e malemolências. O outro é artigo caro,
sujeito raro, assunto deles. Então, quando eu, mulher, algo negra, algo índia, filha de
própria àqueles sem rosto, sem corpo e sem identidade, sou, educadamente interpelada,
acerca de minhas motivações existenciais, essenciais e políticas como se o fato de eu
Sendo franca, eu não saberia muito bem dizer, o que é próprio ou específico da
antropologia praticada por pessoas como eu. Mas certamente nossas diferenças se
estendem para além do fato de termos menos poder e valor na economia da disciplina. Se
o caso é de tentar definir um pouco arrisco dizer que nossa prática é infletida por um
acontecimento que não cessa de se atualizar. Estou falando certamente dos genocídios
que fundaram o ocidente moderno e suas ciências, cujos sentidos e efeitos não se
encontram, para nós, na ordem da história, mas, mais propriamente, do mito. A partir dali,
todos os dias precisamos saber segurar as outras camadas do céu para que elas não
desabem em nossas cabeças. Os mundos estão acabando todos os dias. E não nos demos
conta disso ontem. Aquela preocupação dos antropólogos com o fim de algumas culturas
não era equivocada somente porque, como se mostrou, tudo se recria, mas também porque
não inclui na sentença o próprio mundo do antropólogo, o incontornável fato de que ele
também está acabando. Essa memória, que se atualiza em nós em alguma intuição e muita
dor, nos confere um sentido de urgência que nos possibilita outra disposição diante da
De saída, pelo menos para mim, é impensável conceber a antropologia enquanto uma
prática sem riscos e sem consequências que se realiza pelo gosto da aventura e na medida
dos próprios talentos, tolerância e boa vontade. Também é um tanto impensável crer que
submetê-las a uma identidade torna-nos mais capazes de manter nosso pensamento ativo
e nos possibilita criar e recriar, com alegria, novas possibilidades para a vida. E também
disciplina antropológica espero que seja esse o de desativar de vez nossas máquinas
sobrecodificadoras, que possamos compreender de vez que passamos bem sem elas.
Outro efeito que pode ser divisado é que na antropologia possa vir a ser tornar uma
constante nosso senso de urgência, e que se torne cada vez mais impossível viver de renda
em nosso meio, por meio da compra de ações de certos autores lucrativos e do gozo de
seus dividendos. Assim como pão, nos ensina o corre corre da vida, a antropologia deve
E se o caso é também pensar nas obrigações e exigências que se impõem a nossas outras
antropologias diria que, por um lado, precisamos querer herdar alguma questão
Não basta denunciar suas incoerências e limites, é preciso praticá-la para transformá-la.
E nesse ponto sou otimista. A antropologia já deu provas que fez muitas outras coisas
diante de seu destino. Outra obrigação é aquela que estejamos atentos para conjurar todas
universais. Para fazer boa antropologia não é o caso de nos tornarmos menos marcados,
mas o de agir para que se torne cada vez mais explícito o quanto eles são tão marcados
quanto nós. Que façamos da antropologia um solo onde não fique de pé esses seres
polivalentes que se arrogam o direito de pensar desde nowhere. Não podemos escapar
também de fazer antropologia na presença do outro. E não se trata aqui de compor uma
etnografia que possa ser compreendida por não especialistas ou de se empenhar em algum
projeto de interesse do grupo com o qual se faz pesquisa, mas de fazer que a presença
Por fim, o que as outras antropologias coloca como obrigação ao antropólogos de direito
é que eles passem a proceder sem se dar ao direito de pôr em jogo o grande divisor do
reservando a nós à tarefa de especular sobre as identidades. Eu diria até mais, e de forma
mais contundente: sem se dar ao direito de dizer qualquer coisa sobre o que nos é
ninguém está isento de lidar com suas tensões constitutivas, ninguém pode fazê-la sem
passar por suas dificuldades inerentes, e não existe entre nós, nenhum grupo social que
esteja ou seja intelectualmente melhor adaptado a lidar com elas. Se eles têm privilégios,
sim, têm, de muitas naturezas, mas nada além disso, eles têm de vantagem. Que, como
nós, se empenhem e se envergonhem e não saiam por aí achando que tal posição ou
Como canta Dona Ivone Lara, foram nos chamar, nós estamos aqui, o que que há? Eu
vim de lá, eu vim de lá pequeninho, mas eu vim de lá pequeninho, alguém me avisou pra
pisar nesse chão devagarinho, alguém me avisou pra pisar nesse chão devagarinho. O
chamado aqui é ao cuidado que aprendemos ter e que é toda a nossa potência.
de um exercício bastante árduo pois exige colocar em perspectiva práticas e axiomas
antropologias.
Ecologia das práticas: o praticante não pode se mover livrando-se dos pertencimentos.
Restrição limita o que você pode fazer/tem que fazer mas não determina o que você fará.
Espaço cosmopolítico afirmação coletiva dos seres sem princípio unificador, sem