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41º Encontro Anual da Anpocs

GT19 O Rural no Brasil contemporâneo:


questões teóricas e novos temas de pesquisa

“Consenso de commodities”:
semeando o conservadorismo político e
des-democratizando o Brasil?

Autores: Débora F. Lerrer (CPDA/UFRRJ) e Miguel Carter (DEMOS)

1
Resumo: Este paper parte da hipótese de que o fortalecimento do agronegocio,
notavelmente a partir da década de 2000, e a expansão do pensamento conservador no
espaço público viabilizou o "golpe parlamentar" de 2016. Este processo foi sustentado
pela decisão política do Partido dos Trabalhadores de fazer uma aliança com a elite
agrária brasileira para assegurar sua governabilidade, depois da eleição presidencial do
Lula, em 2002. Esta parceria com a elite agrária se fez em detrimento de sua histórica
aliança com movimentos sociais do campo. A retomada do crescimento econômico a
partir da exportação de commodities agrícolas robusteceu ainda mais a oligarquia rural
brasileira, que não teve o contrapeso de políticas fundiárias distributivas que favoreciam
o campesinato. Seguindo o argumento traçado por Barrington Moore Jr., esta dinâmica
intensificou mais uma vez um processo de modernização conservadora, que permitiu o
revigoramento político da elite agrária e seus aliados na midia corporativa e no grande
capital, aumentando os obstáculos para o aprofundamento da democracia brasileira.

Introdução

A eleição de Luís Inácio Lula da Silva em 2002 e sua posse em janeiro de 2003
inaugurou uma década em que os mais importantes países do continente latino-
americano foram governados por forças progressistas. Todas estas economias
vivenciaram um significativo crescimento econômico na primeira década do século
XXI, em grande parte devido à demanda chinesa por commodities, tradicional
especialidade latino-americana na divisão internacional do trabalho. O chamado
“consenso das commodities” (Svampa, 2015), ou seja, a aposta numa economia baseada
no agronegócio e na extração mineral, que tem como alicerce a exportação de bens
primários, de baixo valor agregado, em larga escala, como via principal de acumulação,
foi abraçada por governos, chefiados por partidos outrora socialistas, como era o caso
do PT, apelidados pela literatura anglo-saxã de “Pink –tide governements”.
Mesmo Hugo Chaves, que criou o “socialismo bolivariano”, adotado pela
Venezuela, apoiou suas políticas socialmente redistributivas em cima da commodity
petróleo, que já havia destruído a economia agrícola venezuelana o início do século XX,
sem conseguir sucesso na diminuição da dependência da economia deste país deste
produto. Estes tipo de “acumulação rentista de capital” continuou criando distorções
que impediram o país de efetivamente rumar para outra base econômica (Purcell, 2017).
Países como a Argentina, Bolívia, Uruguai e o Equador também aplicaram a receita de
distribuir uma maior parcela do excedente econômico obtido com commodities para as
classes populares de seus países. Todo este receituário econômico, no entanto, que
2
depende, sobretudo da demanda externa, passou a oscilar para baixo, ameaçando a
permanência destas forças no poder. Além disso, assim como ocorreu no Brasil, este
crescimento econômico, baseado no que alguns autores denominaram de “neo-
extrativismo”, veio acompanhado de um aumento significativo de conflitos socio-
ambientais, tendo como principais vítimas camponeses, sem-terras, indígenas e
populações tradicionais. Estes tiveram que lidar com o fato de que os presidentes que
ajudaram a eleger passaram a apoiar grandes atores econômicos que ameaçam sua
permanência e sobrevivência nestes territórios. Ou seja, parafraseando Barrington
Moore Jr, as populações do campo latino-americanas “forneceram a dinamite que
derrubou o edifício antigo”, mas acabaram sendo as primeiras vítimas do “consenso das
commodities” adotados por seus governos progressistas (1966).
Este artigo é uma versão preliminar de uma reflexão que pretende apoiar-se na
atualização da argumentação de Barrington Moore Jr., voltada sobretudo para o Brasil,
mas tendo como pano de fundo a América Latina. Ele parte da hipótese de que ao
optarem pelo consenso das commodities, estes governos acabaram por fortalecer ainda
mais suas elites rurais que constituem uma força historicamente anti-democrática, que
detêm tradicionalmente o controle político, o que favorece a emergência e a hegemonia
de um pensamento conservador.

Capitalismo autoritário

O livro clássico de Barrington Moore Jr. (1966) faz uma análise de classes para
examinar a constituição de regimes democráticos e autocráticos, construindo um fértil
argumento sobre como eles se constituíram e dando especial atenção ao papel do
campesinato e dos latifundiários neste processo. Um dos pontos centrais de seu
argumento é que a classe dos grandes proprietários de terra é a que em termos históricos
se opôs com maior força ao processo de democratização. Uma classe latifundiária forte,
aliada ao Estado e uma burguesia dependente, segundo Moore, cria um padrão de
modernização capitalista sustentado numa coalizão reacionária. Por outro lado, as
possibilidades de democratização política são maiores quando a elite agrária é mais
fraca e desvinculada do uso de instrumentos repressivos para manter seu poder e
controle sobre a força de trabalho rural. Uma variante da tese de Moore foi aplicada à
América Latina no livro organizado por E. Huber e F. Safford, “Agrarian Structure and
Political Power: Landlord & Peasant in the Making of Latin America” (1995) e em D.

3
Rueschemeyer, E. Huber Stephens e J. D. Stephens, “Capitalist Development and
Democracy” (1992). Em ambos os livros é ressaltado o impacto negativo da elite agrária
no processo de modernização capitalista e no fortalecimento da democracia. Nenhum
desses estudos citados oferece uma análise detalhada do caso brasileiro.
Talvez o único autor que tenha procurado aplicar esta argumentação ao Brasil seja
Otávio Velho, em seu livro “Capitalismo autoritário e campesinato”, publicado em
1976. Seu conceito de “capitalismo autoritário” foi cunhado a partir da própria análise
comparativa de Moore, tendo como referência chave, no caso de Velho, o caso russo e
os desdobramentos políticos ocorridos no país que, assim como o Brasil e os Estados
Unidos detinha uma ampla “fronteira” para expansão. Ou seja, áreas não intensamente
ocupadas pela população nacional e que estavam sendo colonizadas por camponeses
oriundos de outras regiões em um determinado período histórico, também caracterizado
pela intensificação das relações capitalistas. Velho também partiu da conhecida tese de
Frederick Turner sobre a importância da fronteira do Oeste para o fortalecimento da
democracia norte-americana para pensar o caso brasileiro, mais especificamente o
avanço da fronteira agrícola que estava ocorrendo no Pará naquele período.
O fato é que, como observou Moore (1966), a ocupação do Oeste norte-americano
por agricultores familiares livres só foi garantida mediante uma sangrenta guerra civil
em que duas partes claramente polarizadas não obtiveram consenso político em torno de
que tipo de exploração agrícola seria dado às terras recém conquistadas do México: ou
mantinha-se as fazendas escravocratas ou se abria a fronteira para famílias de
agricultores independentes.
Já no caso russo, bem descrito por Velho, vemos que se a colonização da Sibéria foi
incentivada em parte pelo regime czarista que, no entanto, já vislumbrava seus efeitos
talvez não necessariamente positivos para a manutenção do regime. De fato, com a
Revolução Russa, os “camponeses-farmers” emigrados para a Sibéria não hesitaram
muito em escolher a força que lhes garantia melhor sua permanência na terra. Velho
descreve que “ao serem confrontados pelo capitalismo autoritário e pelos bolcheviques,
em geral preferiram estes últimos”, formando grupos guerrilheiros que começaram a
atuar contra as tropas de Kolchak e a intervenção estrangeira durante a luta de 1918-22
(Velho, 1976, p.103). O caso russo, justamente por conta da tomada de poder por parte
dos bolcheviques, única força que tinha “estômago suficiente” para distribuir terras aos
camponeses, reforça a tese de Turner de que a fronteira poderia dar frutos mais
democráticos a seus países. Na Russia, até a ascensão de Stalin e seu ataque ao

4
campesinato, isto era uma possibilidade visto a rápida recuperação econômica das
comunidades camponesas após a guerra civil (Shanin, 2012) .
Para Velho, o “capitalismo autoritário” em relação ao “capitalismo burguês” se
caracteriza por “uma dominação particularmente intensa da instância política” (Velho,
1976, p.43) Isto associado a um sistema repressivo de mão-de-obra, ou seja, à coerção
extra-econômica da força de trabalho, típica de sociedades autoritárias, caracteriza a
forma como o capitalismo havia se desenvolvido no Brasil, semelhante, portanto, ao
caso russo. A partir da tese de Turner, de a fronteira teria favorecido a democracia para
os Estados Unidos, Velho tenta vislumbrar a expansão da frente de expansão que vinha
se desenvolvendo na região Norte do país como uma possível possibilidade de se
construir uma expansão capitalista menos autoritária, tendo em vista a própria trajetória
economicamente ascendente destes camponeses oriundos, sobretudo do Nordeste, e o
fato de já estarem de algum modo se articulando com mercado nacional, na época da
pesquisa, através do cultivo de arroz.
No entanto, embora tenha se tornado a região com o maior número de
assentamentos criados no país nas últimas décadas, inclusive com um grande aumento
da presença do Estado, com por exemplo, a criação de uma superintendência regional
do Incra na região do Sudoeste do Pará, a ocupação das terras do Pará segue conflitiva,
legalmente suspeita e violenta, permanecendo como um dos estados onde mais ocorre
assassinatos no campo há décadas, como atestam os Relatórios Anuais da CPT
(Comissão Pastoral da Terra).

Impasses históricos

Desde o lançamento do livro de Otávio Velho, o país passou por uma


redemocratização “lenta e gradual”, assistiu à emergência de novos sujeitos e
movimentos sociais na arena política, ao fortalecimento de um partido resultante deste
cenário, o Partido dos Trabalhadores, cuja principal liderança, oriunda do movimento
sindical, tornou-se presidente da República em 2002.
Mesmo com todos os avanços obtidos pela sociedade civil brasileira, nos últimos
40 anos, e com 13 anos de governos chefiados pelo PT, assiste-se hoje a retrocessos
institucionais e sociais que subvertem a democracia que foi se consolidando, sobretudo
a partir dos direitos que foram cristalizados na Constituição 1988.

5
Como o PT no Brasil foi, talvez, o mais moderado em suas reformas, mas mesmo
assim acabou sendo derrubado por um golpe parlamentar que contou com os votos da
grande maioria do Congresso Nacional, seu caso merece um estudo sobre os
mecanismos fiscais e fundiários que robusteceram o patronato rural, que detém uma
bancada expressiva no parlamento, para procurar atualizar a argumentação de Moore1.
Em seu artigo que analisa a recepção desta obra, nove anos após seu lançamento,
Jonathan M. Wiener (1975) ressalta a possibilidade de estender argumentação de Moore
para estudos de países em desenvolvimento marcados por “modernizações pelo alto”,
que não necessariamente se tornaram fascistas.
A América Latina passou por profundas transformações políticas nas últimas
décadas e é o primeiro continente onde se aplicarm as receitas neoliberais (Vergara-
Camus, Kay, 2017, p.428). O Governo Pinochet, por exemplo, foi o primeiro no mundo
a privatizar totalmente a previdência social. É também uma das primeiras regiões onde
a crise econômica provocada pelas reformas neoliberais criaram crises de legitimidade,
dando espaço tanto para saídas de direita como de esquerda. Como exemplos do
primeiro houve o “populismo neoliberal”, personificado por Menen, na Argentina, e
Fujimori, no Peru. A saída à esquerda ficou conhecida “populismo
neodesenvolvimentista” e foi adotado pelo Brasil, Argentina, Equador, Venezuela
(Ibid.) Após todos estes anos de “pink-tide governments”, há grandes evidências de que
o sentido de suas políticas não alterou o fato de que suas democracias seguem
insuficientes, porque socialmente injustas. As contradições que estes países enfrentam
agora, em particular o Brasil, oferecem uma oportunidade para investigar o papel de
suas elites agrárias na criação dos obstáculos que impedem este aprofundamento
democrático’. Esta elite, na atual fase do capitalismo, trata-se de uma facção da
burguesia detentora de patrimônio fundiário, com interesses coligados com capital tanto
nacional como internacional, com interesses tanto na indústria como com o comércio,
que compõe o setor econômico que mais se destacou e acabou obtendo grande apoio
político e econômico dos governos liderados pelo PT (Ibid.)
Recentemente o Journal of Agrarian Change 2, editado por Leandro Vergara-Camus
e Cristobal Key, abordou as políticas agrárias promovidas pelos governos de liderados
pela esquerda latino-americana na edição “Peasants, Agribusiness, Left-Wing

1
Projeto de pesquisa liderado pelos autores que está em fase de captação de recursos.
2
Journal of Agrarian Change, Volume 17, Issue 2 de Janeiro de 2017., que aborda como se deu
este processo na Argentina, Brasil, Uruguai, Venezuela, Paraguai, Bolívia, Equador e Nicarágua
6
Governments & Neo-Developmentalism in Latin America”(2017). Nela, vários autores
analisam estes processos ocorridos na Argentina, Brasil, Uruguai, Venezuela, Paraguai,
Bolívia, Equador e Nicarágua.
Embora alguns autores tenham utilizado conceitos gramscianos como
“transformismo”, “hegemonia” e “revolução passiva” para diagnosticar este processo,
nenhum procurou dar uma atualização na argumentação de Barrington Moore Jr. que, a
meu ver, ajuda a compreender a virada conservadora que estes modelos de crescimento
econômico capitaneado por forças de esquerda ajudaram a promover. É importante
frisar que, como observa a conclusão escrita por Vergara-Camus e Kay, os
organizadores desta edição, todos estes governos, muitos dos quais eleitos com grande
apoio de movimentos camponeses e indígenas, não cumpriram suas promessas de
distribuição de terra. Sua característica comum é que nenhum deles rompeu com o
modelo agrícola dominante, continuando a apoiar o agronegócio, limitando-se a
redirecionar alguns recursos e algumas políticas para a agricultura familiar (Vergara-
Camus, Kay, 2017, p416). Um dos aspectos chaves que eles frisam é justamente que o
poder do agronegócio e das elites fundiárias vinculadas a ele não foram desafiadas em
nenhum destes países, até porque controlam o núcleo da acumulação capitalista, cuja
renda foi em parte transferida para políticas públicas vinculadas à populações pobres,
mas sem a construção de uma hegemonia política que lhes permitisse agregar apoio
popular. “A própria celebração nacional do boom de exportação baseado no petróleo, no
gás, na mineração e na agricultura, certamente tornou mais difícil para os grupos que
resistiam ao extrativismo fazerem suas vozes serem ouvidas” (Tradução Nossa, Ibid. p.
426). No caso do Brasil, esta coalizão reacionária acabou retirando o apoio de Dilma
Roussef e passando o poder para seu vice-presidente, Michel Temer que, se teve algum
apoio popular no início, foi perdendo-o aceleradamente, conforme suas reformas foram
sendo anunciadas, a crise econômica foi se aprofundando e continuou a avalanche
denúncias de corrupção que atingem o próprio presidente e seus aliados políticos.
Vergara-Camus e Kay também se baseiam em Gramsci para explicar a fraca força
política das esquerdas que chegaram ao poder na onda “rosa” dos anos 2000 em
implementar transformações mais profundas nestes países. Para eles, a própria crise de
legitimidade do neoliberalismo na America Latina não constituiu uma crise “orgânica”,
mas sim uma crise “conjuntural”. Ou seja, não houve uma crise hegemônica do
neoliberalismo que colocou todo o modelo de dominação em questão e, portanto, os
líderes das forças de esquerda, para chegar ao poder, tiveram que fazer uma aliança com

7
setores da direita. No caso do Brasil, o setor escolhido foi o agronegócio. Logo,
portanto, muitas das escolhas políticas dos governos de esquerda foram frequentemente
restringidas a partir de sua própria coalizão política. Como o passar dos anos, as forças
da direita, não só presentes internamente neste governo, rapidamente se organizaram
para confrontá-lo como também por fora, quando necessário (Ibid, p. 429). E foi o que
ocorreu no Brasil, sobretudo a partir de 2013, quando se tornou claro para estas forças
que o PT não controlava mais as manifestações populares de rua nem teve habilidade
para contê-las de forma progressista, ou seja, atendendo às demandas pela melhora de
serviços públicos como educação, saúde e transporte, ao invés de injetar recursos nos
“mega-eventos” Copa do Mundo e Olimpíadas a serem sediados no país em 2014 e
2016 respectivamente.
A acusação que motivou a abertura do impeachment da presidente Dilma
Roussef envolveu a chamada “pedalada fiscal”3 para cobrir uma política pública que
paradoxalmente atendia aos interesses do agronegócio: o Plano Safra de 2015, política
pública de financiamento agrícola voltada para a produção de commodities recebeu um
generoso aporte de recursos durantes as gestões petistas depois de ser praticamente
extinto no governo de Fernando Henrique Cardoso. Curiosamente, fora Katia Abreu, a
Ministra da Agricultura de Roussef, os representantes legislativos dos principais
beneficiários desta política não se sentiram instados a apoiar a presidente quando surgiu
o processo de impeachment. Matéria publicada na coluna de Sonia Racy, no jornal
Estado de São Paulo4, sobre a comemoração dos 97 anos da Sociedade Rural Brasileira
(SRB), um mês depois do afastamento da presidente, descreve a forma “decisiva” como
o patronato rural apoiou o impeachment. O então presidente da SRB, Gustavo
Junqueira, afirmou em seu discurso na festividade que “a atuação do agro foi
fundamental” para o afastamento da Dilma, decisão que teriam tomado já em 2014,
depois do discurso “inspirador” de Rubens Ometto5, em um evento em Nova Iorque. A
matéria também descreve que a Frente Parlamentar Agropecuária, o nome oficial da
“Bancada Ruralista”, garantiu 87 dos 92 votos do bloco em favor do impeachment.

3
Atraso de repasses a bancos públicos responsáveis por pagamentos de programas de governo, como o
Plano Safra.
4
Coluna Sonia Racy, 15 de junho de 2016, p, C-2
5
Usineiro de família tradicional do interior de São Paulo. Dono da Cosan, uma das maiores usinas de
álcool do mundo e um dos fundadores da ÚNICA (Associação Brasileira de Indústria da Cana). Hoje tem
negócios diversificados e inclusive uma joint-venture com uma das maiores empresas petrolíferas do
mundo, a Shell, tendo adquirido, por exemplo, o controle da Comgás em 2012, empresa distribuidora de
gás de São Paulo, considerada a maior do país.

8
Diante deste paradoxo e partindo da própria análise de Vargara-Camus e Kay, há
evidências de que a atualização da argumentação de Moore é interessante para se
compreender melhor a conjuntura política conservadora que se aprofundou no país após
13 anos de governos federais liderados pelo PT coligados com setores do agronegócio:
uma política econômica que fortalece a comercialização de bens primários e não
procura de modo algum, a partir de políticas fundiárias progressistas e distributivas,
desafiar o poder das forças políticas vinculadas a este setor, historicamente anti-
democráticas, tende a favorecer a emergência e a hegemonia de um pensamento
conservador com sérias consequências políticas e sociais.

Históricos obstáculos a uma política fundiária redistributiva

Entre as especificidades históricas do Brasil é importante frisar que, entre os


anos 1960 e 1980, 30 milhões de brasileiros deixaram o campo porque o impasse em
torno da questão agrária brasileira foi resolvido através de um golpe de estado que
favoreceu, com diversos mecanismos fiscais e instrumentos de políticas agrícolas, que a
grande propriedade rural se modernizasse (Carter, 2010). Ao mesmo tempo, o regime
militar concedeu incentivos fiscais para ocupação de terras nas áreas consideradas como
sendo de fronteira agrícola, promovendo a privatização de extensas áreas localizadas em
regiões ainda não atreladas aos circuitos de acumulação capitalista, distantes dos
grandes centros, sem vias de comunicação com as regiões mais dinâmicas do país e
ocupadas quer por povos indígenas, quer por populações camponesas que viviam nelas
como posseiros. Importante considerar que parte significativa dessas terras não tinha
títulos legais de apropriação privada e eram consideradas legalmente como “devolutas”,
ou seja, de propriedade do Estado brasileiro. De certo modo, a busca pela “terra livre” é
talvez uma das mais antigas características do que podemos chamar de campesinato
brasileiro. Todas as fronteiras agrícolas abertas neste país tiveram dinâmicas marcadas
pela chegada primeiro de povoadores, não articulada ou fracamente articuladas com a
acumulação capitalistas, muitos dos quais deslocando os povos indígenas que viviam
ali, mas sendo mais tarde sobreposta pela chegada da “frente pioneira” (Martins, 2012),
que a partir de dinâmicas geralmente viabilizadas pelo Estado, através da construção de
estradas, por exemplo, articulam estas regiões à economia nacional e à acumulação
capitalista em detrimento destes povoadores e povos tradicionais que então viviam
nestas regiões. Muitos destes primeiros “formadores” de fazendas ou são contratados

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para formar as fazendas, muitas vezes reduzidos a relações de trabalho precárias,
análogas à escravidão, ou acabam sendo expulsos por estes novos atores melhor dotados
de capital social e político.
O Golpe de 31 de março de 1964 teve como um dos seus estopins o avanço da
demanda por reforma agrária, tanto é que o Castelo Branco, o general que chefiou o
primeiro governo militar, abriu as discussões no Congresso Nacional sobre o Estatuto
da Terra, já em abril, primeiro mês do regime de exceçã6. No entanto, o direcionamento
que o regime militar promoveu de incentivo à Revolução Verde e à criação de crédito
rural subsidiado para grandes proprietários rurais, sem mudança da estrutura agrária do
país, reforçou uma das tendências políticas mais recorrentes do Brasil, cujo regime
político já foi descrito pelo brazilianista Alfred Montero como uma democracia
ancorada em um “sistema oligárquico de representação”. (2005, p.71).
Esse sistema é o resultado de uma antiga tradição elitista na política brasileira e de
arranjos institucionais criados durante o século XX que solaparam a participação
política dos setores populares, como foi o caso do golpe empresarial-militar de 64. Este,
por sinal, reforçou os privilégios oligárquicos do sistema político brasileiro mesmo
durante a transição para a democracia, a partir de 1984, chefiada por José Sarney, que
fazia parte justamente do partido que deu sustentação à ditadura empresarial-militar por
quase 20 anos. A manutenção destes setores dentro da máquina do Estado, por meio de
diversas práticas, prejudicouo exercício de direitos civis e políticos por parte população
pobre. Enquanto isso, com destacada presença no Congresso, os latifundiários
conseguiram derrotar várias iniciativas progressistas, incluindo medidas cruciais na
Assembléia Constituinte de 1987-1988. Apesar de a propriedade rural passar a ter que
cumprir função social, ou seja, obedecer à legislação trabalhista em vigor, respeitar a
legislação ambiental, então ainda regulada pelo Código Florestal, promulgado em 1965,
e produzir na propriedade de acordo com índices de produtividade acordados em 1975,
o embrião da “Bancada Ruralista”, então conhecida como “Centrão”, conseguiu
introduzir o artigo nº 185, tornando as propriedades produtivas “insuscetíveis para
desapropriação para fins de reforma agrária”, que passou, na prática a se sobrepor
legalmente sobre os demais, abrindo uma brecha de contestação legal que se tornou
bastante utilizado nas decisões judiciais pelo Brasil afora e encarecendo a política de
reforma agrária.

6
Jornal “O Globo”..... abril de 1964,

10
A forte influência política desse setor tem induzido a todos os presidentes recentes a
satisfazer aos grandes proprietários de terras de modo a sustentar as coalizões de
governo no Congresso, reeditando um fórmula cunhada por José de Souza Martins
(1995): o latifundiários não detêm o poder político central, mas não são por ele
contrariados. Esta circunstância se concretizou mesmo quando uma liderança de origem
popular, como o ex-presidente Lula, assumiu o poder outorgando a pasta do Ministério
da Agricultura para uma tradicional liderança do patronato rural brasileiro, Roberto
Rodrigues, um dos grandes porta-vozes do que passou a se convencionar como
“agronegócio” eque estava presidindo a Associação Brasileira do Agrobusiness (Abag)
quando foi indicado para a pasta. Sua nomeação se deve à decisão política do Partido
dos Trabalhadores de fazer uma aliança com a elite agrária brasileira para assegurar sua
governabilidade, depois da eleição presidencial de Luís Inácio Lula da Silva, em 2002,
repetindo o que todos os governos anteriores fizeram: dar a pasta da Agricultura para
um membro proeminente da elite rural ou para um político representante deste setor.
Roberto Rodrigues7, no entanto, não é uma liderança qualquer (Lerrer, 2016). Ele
é uma liderança do patronato rural com passagem por todas as principais instituições de
representação do setor, como a Sociedade Rural Brasileira (SRB), a Organização das
Cooperativas do Brasil (OCB) e ABAG (Associação Brasileira de Agibusiness), tendo
inclusive coordenado a Frente Ampla da Agropecuária Brasileira (FAAB) como intensa
atuação na Constituinte de 1988, inclusive se aliando à UDR na defesa da propriedade
privada e, portanto, na derrota da reforma agrária na carta constituicional.
Ele já havia se manifestado publicamente contra as “invasões de terra”, forma
predominante pela qual alguma reforma agrária foi feita no o Brasil, e vinha se
construindo como uma liderança do setor durante toda a década de 90, sobretudo a
partir de sua atuação na Revista Agroanalysis, publicação vinculada à FGV, onde
passou a ter uma coluna fixa e onde defendia que o setor agropecuário brasileiro tivesse
um posicionamento unificado e propugnava a necessidade de se mudar sua imagem
junto à opinião pública (Ibid.)
Seguindo e aprofundando esta aliança, Dilma Roussef teve como ministra da
Agricultura em sua última gestão a senadora Katia Abreu, integrante atuante da
7
É professor aposentado da Unesp de Jabuticabal, foi secretário da Agricultura do Estado de São
Paulo, é produtor rural com propriedades em seu estado natal e em Balsas, no Maranhão e ajudou a
fundar a ABAG e a lançar o conceito de agronegócio pelo Brasil, conceito pelo qual atuou
incansavelmente durante toda a década de 90. Hoje coordena o FGV Agro, em São Paulo, instituição
vinculada à Fundação Getúlio Vargas.

11
chamada Bancada Ruralista, do Congresso Nacional e presidente da Confederação
Nacional da Agricultura (CNA). Em dezembro de 2010, a senadora foi premiada pelo
Greenpeace com a “Motoserra de Ouro”, por sua “luta incansável pelo esfacelamento da
lei que protege as florestas do país”, referindo-se à proposta do novo Código Florestal,
que foi efetivamente aprovada na primeira gestão de Roussef, abrindo grandes
concessões a desmatadores8. Importante frisar que esta parceria dos governos petistas
com a elite agrária se fez em detrimento de sua histórica aliança com movimentos
sociais do campo, com o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra), cujas
mobilizações perderam grande parte da visibilidade pública que haviam conquistado
durante a década de 90, silenciados junto com a marginalização política da bandeira da
“reforma agrária”.
Os obstáculos à reforma agrária e outras políticas de redistribuição no Brasil se
devem a diversas complicações institucionais devido inclusive à fragmentação e
politização da administração pública. Como salienta Kurt Weyland (1996), essas
condições têm facilitado a “infiltração” e “captura” de muitos órgãos públicos por
determinados grupos de interesse, o que explica, por exemplo, a afinidade histórica
entre o Ministério de Agricultura e as principais entidades ruralistas do país. Tais
condições vem facilitando o bloqueio institucional às tentativas de reformas
progressistas, como a agrária, pois tornam o Estado muito mais vulnerável aos
interesses das elites, favorecendo ao que Montero define como “a capacidade dos
interesses minoritários em impedir mudanças institucionais”, uma das características
mais duras e resistentes da política contemporânea brasileira (2005, p.51). Com forte
influência sobre o Estado brasileiro, a elite agrária vem conseguindo se reproduzir,
preservando o modelo de desenvolvimento rural agro-explortador, sustentado em
amplos subsídios públicos, na aplicação frouxa das leis agrárias, no baixo imposto sobre
a propriedade rural e em generosos financiamentos públicos às entidades ruralistas,
criando grandes obstáculos à implementação de uma reforma agrária progressista
Assim, como ocorreu com MST, houve uma significativa perda de capacidade de
mobilização de outros movimentos camponeses e indígenas latino-americanos durante
os anos destes governos de esquerda, “contrastando marcadamente com a forma
compacta, coligada e organizada que as classes agrárias dominantes tomaram neste
período” (Tradução Nossa) (Vergara-Camus e Kay, 416, 2017).

8
http://sustentabilidade.estadao.com.br/noticias/geral,senadora-katia-abreu-dem-to-recebe-premio-
motosserra-de-ouro-do-greenpeace,651241. Consultado dia 12 de agosto de 2017

12
No caso brasileiro, a retomada do crescimento econômico a partir da exportação de
commodities agrícolas robusteceu ainda mais sua oligarquia rural e sua representação
organizada no Congresso Nacional conhecida como “Bancada Ruralista”, que junto com
a “Bancada Evangélica”, de representantes de diversas igrejas neopentecostais, e da
“Bancada da Bala”, vinculada à industria de armas, compõem o triunvirato conservador
com o qual todos os presidentes brasileiros tiveram que negociar nas últimas décadas.
A Bancada Ruralista não só defendeu os interesses do setor de forma organizada,
obtendo significativas vitórias políticas durante todo este período, como a aprovação do
cultivo de trangênicos e a mudança do Código Florestal, como tiveram a capacidade de
deslanchar ofensivas de criminalização dos movimentos sociais do campo a partir do
Congresso Nacional. Foram pelo menos três CPI criadas que tiveram como objetivo
investigar o MST. A CPI da Terra, concluída em 2005, que classificou as ocupações de
terra como “crime hediondo” e “ato terrorista”, a CPI das ONGs, em 2007, e uma CPI
“para investigar o MST”, em 2009. Estas CPIs, além de criminalizarem a tática de luta
que efetivamente garantiu a destinação de terra para as classes pobres do campo nas
últimas décadas, deslegitimaram a destinação de recursos públicos para estes grupos,
bem como tornaram ainda mais difícil a implantação de políticas públicas voltadas para
a base de apoio destes movimentos sociais. Além disso drenaram substancialmente a
energia de suas lideranças que tiveram que se concentrar na sua defesa (Sauer e
Mezáros, 2017, p.409). Por outro lado, é importante observar que muitos dos ativistas
destes grupos foram ocupar postos-chave no governo ou foram deslocados para o
acompanhamento de políticas públicas viabilizadas por ele, como é o caso do Pronera
(Programa Nacional de Eduação na Reforma Agrária).
Criado ainda durante o Governo Fernando Henrique Cardoso, em 1998, no auge das
mobilizações pela reforma agrária no país, o Pronera recebeu um aumento considerável
de recursos durante os governos petistas. De acordo com dados divulgados pelo
Ministério do Desenvolvimento Fundiário, o Pronera beneficiou cerca de 450 mil
jovens e adultos que vivem no meio rural, sendo a maioria deles (346.629, ou seja,
76%), no período de 2003 a 2010, quando foram investidos cerca de R$ 201,7 milhões,
viabilizando a criação de cursos em parcerias com universidades públicas voltadas tanto
para ensino básico, educação de jovens e adultos, graduação e especialização. Este
programa, que tinha como uma de suas marcas formativas a parceira na gestão entre
movimentos sociais e instituições de ensino, na maioria delas universidades públicas,
também foi objeto de investigação do TCU (Tribunal de Contas da União), o que

13
acabou paralisando-o por algum tempo e alterando seu Manual de Operações (Diniz,
2016). De qualquer modo, a partir destes ajustes, os cursos viabilizados pelo programa
continuaram a ocorrer e sua implementação sempre dependeu do engajamento ativo dos
militantes destas organizações que, portanto, foram deslocados de atividades mais
voltadas para viabilização de novos acampamentos e mobilizações públicas de luta pela
reforma agrária em favor da administração, junto a universidades, dos cursos que
conseguiram negociar para atender sua base social, refletindo uma mudança talvez de
fundo geracional e cultural dos militantes mais ativos do MST hoje em dia.
Para Sauer e Mezaros (2017)9, a conclusão da CPI da Terra coincidiu com a queda
tanto nas ocupações de terra, como das intervenções positivas do governo em favor dos
sem-terra acampados. Além disso, atribuem a queda da demanda por reforma agrária à
sustentada expansão do setor do agronegócio brasileiro que fez o preço da terra crescer
227% em 10 anos (Sauer e Leite, 2012) e à políticas promovidas pelo próprio governo
do PT, como Bolsa Família, o aumento real do salário mínimo e de postos formais de
trabalho, sobretudo na construção civil, setor estimulado pelos grandes eventos sediados
no Brasil, como a Copa do Mundo e os Jogos Olímpicos, bem como o programa de
habitação “Minha casa, Minha vida” (Sauer e Mezaros, 2017,p 407).
A questão da alta do valor da terra nua deve ter inibido as políticas agrárias
distributivas porque, dada a brecha que existe para o questionamento legal das
desapropriações e a capacidade de disputa jurídica dos donos de terra, os processos
tendem a se tornar muito lentos. Assim, o governo do PT acabou optando pela compra
de terras. Além disso, a MP. e a Medida Provisória 2.027-38, editada em maio de
200010, que impede a desapropriação e vistoria de propriedades rurais ocupadas por
movimentos sociais, ainda no Governo FHC, não foi revogada pelo Governo Lula. É a
partir desta MP que se assiste a uma queda das ocupações de terra sobretudo a partir de
2001 que, no entanto, voltam a crescer no início do Governo do PT (Grafico 1).

Gráfico 1

9
No artigo sobre o caso brasileiro presente na edição do Journal of Agrarian Change com o
qual este paper dialoga.
10
Esta MP foi substituída em agosto de 2001 pela MP 2.183-56 -, que além de determinar que "o imóvel
rural objeto de invasão motivada por conflito agrário não será vistoriado, avaliado ou desapropriado nos
dois anos seguintes à sua desocupação", ainda exclui do Programa de Reforma Agrária do Governo
Federal "quem for identificado como participante direto ou indireto em conflito fundiário que se
caracterize por invasão de imóvel rural". http://www.comciencia.br/reportagens/agraria/agr04.shtml
(Consultado no dia 6 de julho de 2014).

14
Neste contexto, os movimentos sociais envolvidos na luta pela terra passam a optar
por formar acampamentos predominantemente em estradas de rodagem, ao lado das
áreas visadas para desapropriação. Por sinal, a opção pela compra de terras ao invés de
desapropriação, tomada em 2004 foi bastante festejada pelo patronato rural11.
No entanto, o impacto do Programa Bolsa Família (PBF) na diminuição da demanda
por terra tem que ser bastante relativizado. Trabalho de Ceneviva e Araújo, (2016) que
teve por objetivo verificar se o PBF era uma variável importante na diminuição das
ocupações de terra, confirma a hipótese de que o Programa afeta negativamente as
ocupações, já que “os gastos per capita do PBF possuem uma associação negativa com
as ocupações de terra”. No entanto, os autores ponderam que como os dados estão
agregados no nível municipal:

“não nos permitem afirmar que as famílias beneficiárias do PBF


foram as que deixaram de se engajar nas ocupações. Para fazer este
tipo de afirmação, seria necessário contar com dados desagregados,
pelo menos, no nível familiar. Desta maneira, não podemos sustentar
que o PBF gerou certa acomodação em grupos sociais potencialmente
interessados em participar de ocupações, como afirmou Gilmar Mauro
(ARRUDA, 2011); nem que o PBF tirou a combatividade das pessoas

11
Em um artigo de agosto de 2004 na Revista Agroanalysis, o especialista em direito agrário Luiz
Augusto Germani “festeja o instrumento de compra de terra, que viria a ser adotado pelo governo” por
estar, segundo ele, adequado à realidade do país onde era “cada vez mais difícil encontrar imóvel rural
improdutivo para fazer assentamentos” (Agroanalysis, agosto, 2004, p.48 ). Esta revista, editada
Fundação Getúlio Vargas dá suporte técnico na forma de estudos técnicos sobre, por exemplo, oscilação
de mercado e suas tendências e o impactos de medidas regulatórias para o setor. É considerada uma das
referências mais conhecidas para o setor, junto com o periódico “Conjuntura Econômica”. Durante os
anos 90, ela se tornou um espaço de organização e reunião de determinados intelectuais que
compartilhavam entre si uma determinada visão do setor agropecuário brasileiro, liderados por Roberto
Rodrigues, então ativo colaborador e uma espécie de “mecenas” da revista (Lerrer, 2016)

15
para lutar pela reforma agrária, como supôs Plínio de Arruda Sampaio
(FOLHA DE S. PAULO, 2007). Mas podemos garantir, com certo
nível de segurança, que, com o aumento dos gastos per capita do PBF,
espera-se que haja uma redução no número de ocupações de terra no
Brasil (Ceneviva e Araújo, 2016).

A meu ver, este trabalho de Ceneviva e Araújo é fundamental por procurar verificar
estatisticamente se estas disposições políticas e sociais se confirmam. Evidencia-se uma
certa influência, até porque se tornou presente inclusive no discurso de lideranças dos
movimentos sociais voltados para a luta pela reforma agrária. No entanto, a análise
estatística, a meu ver, não é adequada para verificar de fato as disposições que se
movem tanto em indivíduos como em grupos de acordo com possibilidades que se
abrem e se fecham em seu horizonte social. A pesquisa sobre os impactos das manchas
de assentamentos rurais criados no país (Leite et.al 2003) e trabalhos como os de Loeira
(2006) e Sigaud, Rosa et Macedo (2008) explicam as dinâmicas que produziram o
grande número de ocupações de terra no país a partir de 1994. Todo novo acampamento
de sem-terras que se forma é composto por parentes, amigos e ou vizinhos de
contemplados por projetos de assentamento. Os novos candidatos decidem integrar os
novos acampamentos que se formam porque vislumbram que esta “linguagem” política
está sendo “escutada” pelo Estado que reconhece que aqueles que participam das
ocupações são credenciados para obter um lote de reforma agrária (Ibid.). Quando a
terra esta “saindo” em algum lugar, a notícia se espalha e atrai novos candidatos para
novas ocupações, criando a tal “espiral de ocupações”. Logo, é mais provável que o que
efetivamente diminuiu o número de candidatos a obter um lote de reforma agrária foi a
diminuição do número de terras efetivamente distribuídas entre os sem-terra a partir de
2007(Gráfico 3 e 4). No ano de 2005, foram criados 876 assentamentos, a maior marca
atingida até então desde quando esta política começou a ser medida, que é 1985. Em
2006, foram criados 718 assentamentos. Mas a partir de 2007, este número caiu
praticamente para a metade, 389 assentamentos criados, nunca mais ultrapassando esta
marca até 2016, ano do impeachment de Dilma Roussef, quando foram criados 81
assentamentos. Por sinal, os 592 assentamentos criados nos cinco anos do governo de
Dilma só são maiores do que 505 assentamentos criados nos cinco anos de Governo
José Sarney, demonstrando que reforma agrária estava fora de suas preocupações
políticas e sociais.

16
Como já demonstrou Fernandes, cerca de 85% dos assentamentos no Brasil foram
criados a partir de ocupações de terra desde a década de 80 (2010). Como vários
trabalhos sobre o campesinato brasileiro demonstram, estas populações combinam
diversas estratégias de sobrevivência e reprodução social a partir de seu maior ou menor
acesso à terra. Muitos migram uma parte do ano para trabalhar em outra regiões do país
ou vendem sua mão de obra para patrões de sua própria região em determinadas fases
do ano. Outros vão tentar a sorte na cidade e se engajam geralmente na construção civil
ou em serviços domésticos, mas quando há notícias em sua região ou por parte de

17
familiares que “está saindo terra”, esta opção relativamente “perigosa” entra em suas
estratégias de reprodução social, sobretudo se há visibilidade social destas lutas e
conquista de terra, como ocorreu em meados da década de 90 e no início da primeira
gestão de Lula com as mobilizações chamadas de “Abril Vermelho” construídos
nacionalmente pelo MST. Se a terra demora para sair, como é o caso de vários
acampamentos criados nos anos 2000, a tendência é que menos pessoas se engajem
nestas formas de luta, avaliando que não vale a pena correr o risco de permanecer vários
anos acampados embaixo de lonas pretas, em locais insalubres e à mercê de vários tipos
de violência. No Rio de Janeiro, há vários acampamentos formados há mais de uma
década, cujas fazendas demandadas já tem decretada sua desapropriação, mas que não
se tornaram assentamento por vários tipos de obstrução legal. É o caso do
Acampamento Goytacazes, localizado em Campos. Ele existe desde 2002 e as terras
demandadas por eles tem decreto de desapropriação desde 2002. Há também o
Acampamento Paulo Freire formado em 2005, em Conceição do Macabu, que visa a
Fazenda Morro do Pilar, cujo decreto de desapropriação é de 200712. Recentemente
saiu o Assentamento Paracambi. As famílias que estão sendo lá instaladas estavam
acampados desde 2002. O assentamento foi criado em agosto de 2015 na então Fazenda
Ribanda, cujo decreto só saiu em 2011.
Agora, se as terras são destinadas aos acampados com uma certa rapidez, é mais
provável que novos candidatos, mesmo vinculados a trabalhos precários ou não nas
cidades, tendam a optar por acampar em vista do enorme benefício absolutamente
improvável para pessoas desta classe social de obter terra, constituindo a partir daí a
“espiral de ocupações” bem retratada no Grafico 1. É em parte porque esta população
nutria a esperança de que Lula ia fazer a reforma agrária “com uma canetada”, como ele
afirmou nos anos 90, que diversas famílias afluíram para acampamentos,
voluntariamente, segundo lideranças do MST, no primeiro ano do Governo Lula. A
“forma acampamento” já era uma linguagem então instituída e vinha viabilizando frente
ao Estado a demanda por terra, sendo por ele reconhecida e tornada fato através da
criação de assentamentos rurais (Sigaud, Rosa e Macedo, 2008).
Desta forma, com a diminuição do ritmo e da intensidade da reforma agrária que
vinha sendo feita até então, a elite agrária brasileira não teve lidar com o contrapeso de
políticas fundiárias distributivas que favoreciam o campesinato, ao contrário do

12
Informações obtidas com Teo de Almeida, ex-advogado da Fetag, que acompanha os casos. Entrevista
realizada no Rio de Janeiro, 20 de setembro de 2017

18
contexto que viveu durante a década de 90, quando muitos membros de instituições de
representação deste setor se sentiram seriamente ameaçados13 pela visibilidade obtida
pelas ocupações de terra e mobilizações pela reforma agrária. Estas lutas vinham
obtendo uma crescente visibilidade midiática, traduzidas em uma expressiva
distribuição de terras e um crescimento do número de ocupações que tiveram como pico
o ano de 1999. Este ritmo de distribuição de terras havia crescido novamente no início
do Governo Lula, mas começou a diminuir a partir de seus o segundo mandato, iniciado
em 2007 e praticamente voltou ao nível dos anos da chamada “Nova República”,
chefiada por Sarney, durante os governos de Dilma Roussef.

Conclusão

A agricultura na América Latina vem sendo crescentemente dominada pelo


agronegócio e pelo capital corporativo de grandes conglomerados transnacionais. Há,
portanto, muito capital estrangeiro com fortes interesses no “consenso das
commodities”. Este processo é capitaneado por uma “burguesia coligada”, conceito da
Marx, utilizado em seu 18 do Brumário, que se refere ao momento em que os laços que
ligam as diferentes frações da burguesia e da elite rural alcançam um nível em que as
distinções entre eles são abolidas (Tradução Nossa. Vergara-Camus, Kay, 2017,p. 431).
A acumulação destes grupos depende de uma espécie de “rentismo da economia”, não
apenas baseado na financeirização, mas também no acesso ao monopólio de terra ou de
recursos naturais que é garantido pelo Estado. Logo, o poder de acessar o Estado é
determinante para a estratégia destes diversos atores capitalistas (Ibid, p. 432). Seus
interesses econômicos, no entanto, dependem da capacidade de formar consensos
políticos para obterem do Estado as políticas públicas que lhes favorecem. Estes atores,
já eram economicamente e politicamente dominantes quando ocorreu a ascensão dos
recentes governos de esquerda latino-americanos que, em tese, passaram a ter o poder
de dirigir estes países. Com a coalisão política realizada com estes grupos, até então
“inimigos” políticos, estes setores passaram a desfrutar de maior meios de influenciar os
novos dirigentes, conseguindo atraí-los para suas pautas políticas, já credenciados pelo
aporte econômico trazido pela alta demanda chinesa de commodities.

13
Ver em Lerrer (2003), entrevista de João Almeida Sampaio, então presidente da Sociedade Rural
Brasileira.

19
No caso do Brasil, fato que os 13 anos de governo do Partido dos Trabalhadores
promoveram diversas políticas públicas para incentivar a agricultura familiar, inclusive
tornando-a uma categoria específica com questões próprias no Censo Agropecuário
realizado em 2006. Ou seja, o termo “agricultura familiar” que saiu do ambiente
acadêmico e foi incorporado por movimentos sociais e pelo Estado na década de 90 teve
sua visibilidade bastante aprofundada durante as gestões petistas. Embora o Ministério
do Desenvolvimento Agrário, extinto nas primeiras horas do Governo Temer, tenha
permanecido frágil em termos de recursos, infra-estrutura e pessoal - principalmente se
tomamos como comparação o Ministério da Agricultura -, ele existia e conformava
uma “mesa de negociação” e escuta para os movimentos sociais do campo (Medeiros,
2010).
Além disso, os governos Lula e Dilma aumentaram o valor do crédito específico
para a agricultura familiar, o Pronaf, os investimentos em educação do campo, através
do Pronera e criaram programas de compras institucionais que incluíram produtos
oriundos da agricultura familiar, como o PNAE (Programa Nacional de Alimentação
Escolar) e o PAA (Programa de Aquisição de Alimentos).
No entanto, ao mesmo tempo, reduziram muito a intensidade de uma política
redistributiva do ativo fundiário em meio a um processo de aumento significativo do
financiamento para a grande produção agrícola e obras de infra-estrutura como estradas
e barragens hidrelétricas. Este tipo de expansão econômica, no caso do Brasil, dada a
sua “frouxa” política de regulação fundiária (Delgado, 2010), significa, por um lado, o
aumento da ameaça de perda de terras para populações tradicionais e, por outro, um
incremento significativo do valor da terra nua, o que inviabiliza relativamente as
políticas de desapropriação e/ ou compras de terra para assentar os acampados.
Importante friscar que as desapropriações de imóveis rurais já vinham sendo
prejudicadas pelo fato de os governos do PT nunca terem atualizado os índices de
produtividade da terra que permanecem nos patamares da década de 70, mesmo após
todas as mudanças tecnológicas ocorridas desde então.
Contudo, muito mais do que não fazer uma ampla política de distribuição
fundiária, os governos petistas optaram, na prática, por invisibilizar o debate sobre a
reforma agrária, preferindo investir na expressão “agricultura familiar” e nas políticas
destinadas a fortalecê-la, sem reconhecer que a própria reprodução deste tipo de
campesinato depende muito da existência de uma política agrária distributiva.

20
Com o relançamento do “pacto do agronegócio”, a partir da desvalorização da
moeda brasileira em 1999, fortaleceu-se politicamente as elites agrárias e seus aliados,
particularmente durante os governos de Lula e Dilma. As contradições inerentes a este
tipo de acumulação capitalista, que reúne o rentismo financeiro e fundiário, favoreceram
que a insatisfação social se canalizasse por um discurso do tipo reacionario, nos termos
de Hirschman (1991). Barrington Moore Jr havia observado que modernizações
promovidas pelo alto tendiam a promover o fascismo. No caso brasileiro, uma
sociedade, a primeira vista, modernizada pode parecer um racioncínio equivocado. Mas
subsistem nesta sociedade temporalidades e modos de vida não intensamente articuladas
com a acumulação capitalista. E como esta acumulação se dá em cima de recursos
naturais: terra, minérios, barragens hidrelétricas cuja exploração depende de regulações
estatais, as principais vítimas destes processos acabaram sendo as populações que
vivem no campo, já enfraquecidas politicamente por conta do claro interesse
governamental em apoiar este tipo de expansão econômica.
Aqui, portanto, a questão não reside propriamente na modernização, mas sim na
base do surto de crescimento econômico vivido pelo país nos anos 2000, onde o próprio
Estado voltou a atuar de maneira mais intensiva no investimento econômico, como foi o
caso do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), gerando novas contradições,
com grupos que antes formavam a base social do PT. Por não haver nenhuma política
de distribuição de ativos fundiários operando ativamente, que funciona como uma
espécie de válvula de escape progressista, estes grupos foram tendo sua força política
diminuída, abrindo espaço para que emergisse um pensamento conservador, e mesmo
com traços fascistas, cujo principal expoente é o deputado federal Jair Bolsonaro que
deve disputar a presidência da República em 2018. Enquanto isso, os governos do PT
continuaram oferecendo subsídios diretos e indiretos aos setores dominantes do campo,
sem tocar na medula espinhal da oligarquia rural – tradicional e moderna – e
robustecendo ainda mais esta que é a classe social menos democrática e mais
conservadora do país.
O perfil de crescimento econômico adotado pelos governos liderados pelo PT
aprofundou mecanismos da modernização conservadora que já haviam sido aplicados
pelos governos militares. Ao invés de aprofundar uma política agrária distributiva,
optaram por aplacar as demandas dos movimentos sociais do campo com maiores
verbas para educação, crédito e infra-estrutura para os assentamentos de reforma
agrária. Dessa forma se criou um contexto onde os conflitos agrários passaram a ter

21
cada vez menos visibilidade no espaço público e, na prática, menos urgência para
receber atenção política por parte dos governos Lula e Dilma. Não se pode afirmar que a
demanda por terras diminuiu se o contexto político que favorecia estas lutas mudou.
Neste sentido, o fato de haver cada vez menos desapropriação de terras e mesmo
políticas de regulações fundiárias com o objetivo de assentar sem-terra fez com que as
próprias bases sociais acampadas destes movimentos sociais diminuíssem. Embora os
governos petistas tenham distribuído uma maior parcela do excedente econômico para
as classes populares, há fortes evidências que os setores dominantes da economia
acumularam muito mais ativo financeiro e fundiário. Isso permitiu a maior concentração
do seu poder político e favoreceu o surgimento de um ambiente político conservador.
E este processo tende a se reproduzir em torno dos demais países latino-americanos que
experimentaram “governos da maré rosa” em meio ao boom de preços e demandas de
commodities.

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