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CENTRO DE PÓS-GRADUAÇÃO ANDREW JUMPER

Renato Marinoni dos Santos Prado

REVELAÇÃO NÃO-VERBAL EM ROMANOS 2:12-16

São Paulo, SP

Outubro, 2016
Renato Marinoni dos Santos Prado

REVELAÇÃO NÃO-VERBAL EM ROMANOS 2:12-16

Trabalho apresentado para


avaliação na disciplina Teologia da
Revelação - Prof. Dr. Heber Carlos
Campos, no curso de mestrado em
Divindade, área de Teologia
Sistemática no primeiro semestre de
2016.

São Paulo, SP

Outubro, 2016
Revelação Não Verbal em Romanos 2:12-16

“Todo aquele que pecar sem a lei, sem a lei também perecerá, e todo
aquele que pecar sob a lei, pela lei será julgado. Porque não são os
que ouvem a Lei que são justos aos olhos de Deus; mas os que
obedecem à lei, estes serão declarados justos. ( De fato, quando os
gentios, que não têm a lei, praticam naturalmente o que ela ordena,
tornam-se lei para si mesmos, embora não possuam a lei; pois
mostram que as exigências da lei estão gravadas em seus corações.
Disso dão testemunho também a consciência e os pensamentos
deles, ora acusando-os, ora defendendo-os. ) Isso acontecerá no dia
em que Deus julgar os segredos dos homens, mediante Jesus Cristo,
conforme o declara o meu evangelho. Romanos 2:12-16 (NVI)

1. INTRODUÇÃO

Esse texto acima faz parte de uma argumentação maior do apóstolo


Paulo, que vai do capítulo 1 versículo 18 até o capítulo 3 versículo 20. Nesses
versículos, Paulo irá se dirigir a alguns grupos dentro da raça humana para
mostrar que todos somos indesculpáveis diante de Deus, e que por isso, Deus
seria completamente justo se nos condenasse a todos.

A quais grupos o apóstolo Paulo se dirige? No capítulo 1, Paulo se dirige


a toda humanidade em geral focando principalmente porque a ira de Deus irá
cair sobre os gentios. Agora, no capítulo 2, ele começa a falar a um outro grupo
de pessoas. Existe alguma diferença de opinião entre os vários comentaristas e
estudiosos do texto1, se o apóstolo se refere exclusivamente a judeus ou a
1 Cranfield aponta essa diferença de opinião entre os estudiosos, dizendo que alguns creem
que o apóstolo Paulo começa a focar nos judeus a partir do versículo 17 do capítulo 2, e que no
início deste capítulo ele se dirige para todos os que propendam a julgar seus semelhantes.
(CRANFIELD, C.E.B. Comentário de Romanos – versículo por versículo. São Paulo: Vida
Nova, 2005. p. 55) John Murray aponta que alguns estudiosos creem que no capítulo 2, o
apóstolo Paulo irá focar nos judeus, agora que tratou com os gentios no capítulo 1. Ele aponta
outros estudiosos que creem que no capítulo 2, o apóstolo fala diretamente aos judeus.
(MURRAY, John. Romanos. São José dos Campos, SP: Fiel, 2003. p. 82-83) Esse é o
pensamento de Lloyd Jones, que elenca alguns motivos pelos quais o apóstolo se dirige aos
judeus, principalmente, neste trecho de sua exposição. (LLOYD-JONES, Martin. Romanos.
Exposição sobre os capítulos 2:1 a 3:20. O Justo Juízo de Deus. São Paulo: PES, 1999. p. 12)
Barclay também concorda com essa posição. (BARCLAY, William. Romanos. Comentário Al
Nuevo Testamento Griego. 17 tomos. Barcelona, Espanha: Editorial CLIE.) Sproul também
concorda com essa afirmação baseado na expressão “ó homem”, tipicamente usada para se
referir aos judeus. (SPROUL, R. C. Estudos Bíblicos Expositivos em Romanos. São Paulo:
Cultura Cristã, 2001. p. 51) Já Stott, crê que Paulo não fala exclusivamente aos judeus mas a
todos quantos se acham fora desse grupo que será condenado mencionado pelo apóstolo no
capítulo 1, ou seja, se colocam como críticos moralistas. (STOTT, John. Romanos. São Paulo:
ABU Editora, 2000. p. 89)
críticos moralistas que se colocam fora do grupo mencionado por Paulo no
capítulo 1, fica claro que a intenção do apóstolo é mostrar que não existe
ninguém que fuja da ira de Deus e de sua consequente condenação. Vamos
retomar esse assunto mais à frente, com maior profundidade, portanto, neste
momento, daremos continuação à nossa introdução.

Muitos comentaristas apontam que esse texto merece um cuidado


especial para ser corretamente entendido. Os versículos 14 e 15 do capítulo 2,
na verdade, seriam um parêntesis na argumentação do apóstolo Paulo, e
portanto, a leitura correta, sem interrupção seria da seguinte forma: versículos
12, 13 e 16. E os versículos 14 e 15 visam elucidar determinado ponto do
apóstolo.2 A própria tradução NVI em português, já traz esse parêntesis no
texto, para ficar mais claro ao leitor.

Muitas coisas poderiam ser ditas sobre esta passagem do capítulo 2 de


Romanos, mas visto que o nosso tema como este texto pode nos ajudar a
elucidar a revelação não verbal, nosso foco ficará restrito a esse assunto,
evitando abordar outras importantes questões que são trabalhadas pelo
apóstolo Paulo neste trecho da carta aos Romanos.

Esse trecho tem sido mal utilizado e mal interpretado por isso devemos
buscar entender o que o autor apostólico está dizendo aos seus leitores e a
nós nesse trecho de sua carta.

2. O JULGAMENTO DE DEUS ABRANGERÁ TODA A HUMANIDADE

“Todo aquele que pecar sem a lei, sem a lei também perecerá, e todo
aquele que pecar sob a lei, pela lei será julgado. (v. 12)

2 O Rev. Augustus Nicodemus reforça esse ponto em um sermão seu sobre essa passagem,
que pode ser encontrado no endereço https://www.youtube.com/watch?v=7E3jBIcspYs ,
acessado em Setembro de 2016. Lloyd Jones concorda com essa afirmação, contudo, baseado
na Versão Autorizada (inglesa), ele amplia esse parêntesis também para o versículo 13.
(LLOYD-JONES, Martin. Romanos. Exposição sobre os capítulos 2:1 a 3:20. O Justo Juízo de
Deus. São Paulo: PES, 1999. p. 131) Barclay também concorda com essa forma de entender
os versículos 14 e 15 como um grande parêntesis, e defende que o texto é melhor entendido se
formos do versículo 13 direto pro 16 e depois retornando para os versos 14 e 15. (Esse
comentário de Barclay pode ser encontrado em:
http://www.studylight.org/commentaries/dsb/romans-2.html, acessado em Outubro de 2016.)
A argumentação do apóstolo Paulo, vem caminhando para mostrar que
diante de Deus, ninguém é justo, a não ser pela fé e pela graça que vêm de
Deus. Em nossas próprias forças, ninguém pode ser considerado justo.

No capítulo 1, ele faz uma grande abertura do assunto dizendo que


todos os homens são indesculpáveis, pois Deus se revela através de Sua
criação. (v. 18) Na Teologia, chamamos essa revelação de revelação geral, e
sabemos que ela não é suficiente para salvação, mas ela se torna suficiente
para condenação. Iremos retomar esse ponto com mais profundidade à frente,
mas neste momento é importante entendermos que o apóstolo está falando, e
de forma geral, ele está falando dos gentios.

Ao começar o capítulo 2, o apóstolo começa a falar para aqueles que se


colocam fora desse grupo que merece a condenação de Deus mencionado no
capítulo 1. Sejam eles judeus ou gentios que se acham moralmente superiores,
a argumentação do apóstolo no capítulo 2 prossegue de modo a mostrar que o
juízo de Deus é sempre justo e verdadeiro (v. 2), pois Deus não julga pela
aparência ou superficialmente, mas Deus conhece os segredos dos corações
dos homens. (v. 6)

E agora, nos versículos 9, 10 e 11, ele começa a dizer que esse juízo
atingirá gentios mas também aos judeus. A salvação será para o que pratica o
bem e condenação para todos os que praticam o mal. (v. 9- 10) E ele conclui
dizendo que em Deus não há parcialidade. (v. 11)

Aqui existe muita gente que interpreta erroneamente o que o apóstolo


está dizendo, como se ele estivesse se contradizendo e agora estivesse
defendendo a salvação por obras. Não. O ponto de Paulo em Romanos é
justamente o contrário. Ele sempre defenderá que a salvação é por fé e por
meio da graça de Deus.

Precisamos começar a entender que neste trecho o apóstolo não está


falando se salvação e sim de condenação e juízo. A salvação é sempre pela fé,
mas a condenação é pelas obras.3

3 John Stott concorda com essa afirmação: “O que ele esta afirmando e que, embora a
justificação seja de fato pela fé, o julgamento será de acordo com as obras. A explicação para
Vemos que o apóstolo Paulo divide toda a humanidade em dois grupos:
os judeus, que tinham recebido a lei, uma revelação verbal de Deus, na aliança
mosaica do Sinai; e os gentios, que não tinham recebido a revelação verbal,
mas que receberam a revelação não verbal, também chamada de revelação
geral ou natural.

Com isso, ele está dizendo que toda a humanidade está sujeita ao
julgamento de Deus, gentios, mas os judeus também não escaparão.

3. O JULGAMENTO DE DEUS OCORRERÁ COM BASE NA


REVELAÇÃO DE DEUS: TANTO VERBAL QUANTO NÃO-VERBAL

Precisamos relembrar que o apóstolo não está falando de salvação


ainda nesse ponto de sua epístola aos romanos. Ele ainda o fará. Mas
primeiro, ele precisa mostrar porque precisamos de salvação. Por uma simples
razão: todos somos culpados diante de Deus.

3.1 NÃO EXISTE UM JUSTO SEQUER” – A CONDENAÇÃO PELA


REVELAÇÃO VERBAL

Porque não são os que ouvem a Lei que são justos aos olhos de Deus;
mas os que obedecem à lei, estes serão declarados justos. (v 13)

O que o apóstolo Paulo está fazendo neste ponto do capítulo 2, é


mostrar que os gentios são culpados diante de Deus, sim, mas os judeus (ou
gentios que se achavam moralmente superiores) também seriam declarados
culpados, pois não houve um só justo que tenha cumprido toda a lei de Deus.

Os judeus se achavam justos simplesmente por terem recebido a lei de


Deus através de Moisés. E o que o apóstolo está dizendo é que a justificação

isso não e difícil de encontrar. E que o dia do juízo será um acontecimento público. Terá como
proposito muito maior anunciar e justificar o juízo de Deus, e não determina-lo. O julgamento
divino, que e um processo de peneira e separação, vem se dando em secreto o tempo todo, na
medida em que as pessoas vão se posicionando contra ou a favor de Cristo; no dia final,
porém, os seus resultados se tornarão públicos.” (STOTT, John. A Bíblia Fala Hoje – Romanos.
São Paulo: ABU Editora, 2000. p. 92-93 )
não vem por somente conhecer (ouvir) a Lei, mas por obedecê-la. E no capítulo
3, na continuação de seu raciocínio que estamos abordando, ele diz:

“Sabemos que tudo o que a lei diz, o diz àqueles que estão debaixo
dela, para que toda boca se cale e todo o mundo esteja sob o juízo
de Deus. Portanto, ninguém será declarado justo diante dele
baseando-se na obediência à lei, pois é mediante a lei que nos
tornamos plenamente conscientes do pecado. (Romanos 3:19,20)

Ou seja, a argumentação dele é de que ninguém jamais foi justificado


pela lei. Pelo contrário. A lei, a revelação verbal de Deus ao povo de Israel, é
instrumento de condenação para Israel.

Os judeus haviam se autodeclarados justos, tornando isso um ídolo. 4


Eles se situavam num plano acima do resto da humanidade por terem acesso à
revelação verbal do Deus de Israel. 5 Lloyd Jones (1999) resume bem essa
postura dos judeus ao afirmar:

“os judeus pensavam que o apóstolo estava expondo a ira de Deus


sobre os gentios apenas porque eram gentios, e não por causa do
modo como viviam. E exatamente da mesma maneira, eles achavam
que nada disso se aplicava a eles, simplesmente porque eram judeus,
independentemente de como eles vivessem ou não vivessem.” 6

Então, o apóstolo está gastando um tempo em sua carta para mostrar a


eles que, sim, eles eram tão pecadores quanto os gentios. E a Lei seria o
instrumento de condenação para eles. O apóstolo em vários momentos se
preocupa em dizer que não existe nada errado com a Lei em si, mas com a
inclinação pecaminosa do homem que fica atestada diante da Lei, da revelação
verbal de Deus.

3.2 “TORNAM-SE LEI PARA SI MESMOS” – A CONDENAÇÃO PELA


REVELAÇÃO NÃO-VERBAL

4 HENDRIKSEN, William. Comentário do Novo Testamento. Romanos. São Paulo: Cultura


Cristã, 2001. p. 117
5 ALLEN, Leslie C in BRUCE, F. F. (org) Comentário Bíblico NVI – Antigo e Novo Testamentos.
São Paulo: Vida, 2008. p. 1829
6 LLOYD-JONES, Martin. Romanos. Exposição sobre os capítulos 2:1 a 3:20. O Justo Juízo de
Deus. São Paulo: PES, 1999. p. 15
Embora não sendo objeto de nosso estudo neste momento, é necessário
que voltemos um pouco no que Paulo trabalha no capítulo 1 de Romanos. Ali,
ele explica melhor como os gentios podem ser julgados por Deus mesmo sem
nunca ter conhecido a lei e mesmo assim Deus ser considerado justo.

Até mesmo em nossos dias, existe essa percepção de que Deus seria
injusto por punir e condenar pessoas que nunca tiveram a oportunidade de
ouvir o Evangelho ou a Lei (no caso da argumentação de Paulo). Mas a esse
falso argumento, o apóstolo Paulo começa a responder no capítulo 1 e termina
no capítulo 2, no trecho que é objeto de nosso estudo.

No capítulo 1, o apóstolo diz:

“Portanto, a ira de Deus é revelada do céu contra toda impiedade e


injustiça dos homens que suprimem a verdade pela injustiça, pois o
que de Deus se pode conhecer é manifesto entre eles, porque Deus
lhes manifestou. Pois desde a criação do mundo os atributos
invisíveis de Deus, seu eterno poder e sua natureza divina, têm sido
vistos claramente, sendo compreendidos por meio das coisas criadas,
de forma que tais homens são indesculpáveis; porque, tendo
conhecido a Deus, não o glorificaram como Deus, nem lhe renderam
graças, mas os seus pensamentos tornaram-se fúteis e os seus
corações insensatos se obscureceram. Dizendo-se sábios, tornaram-
se loucos e trocaram a glória do Deus imortal por imagens feitas
segundo a semelhança do homem mortal, bem como de pássaros,
quadrúpedes e répteis.” (Romanos 1:18-23)

Aqui está a primeira definição da chamada revelação não-verbal, ou


revelação geral ou natural. A natureza é uma forma de revelação de Deus a
todas as pessoas da terra. A natureza se torna uma testemunha da existência
de Deus.

Calvino definia a essa revelação não-verbal como “Que existe na mente


humana, e na verdade por disposição natural, certo senso da divindade,
consideramos como além de qualquer dúvida... Deus mesmo infundiu em todos
certa noção de sua divina realidade.” 7 Depois ele vai dizer que nem nos povos
mais pagãos encontraremos algum exemplo de povo que diria que Deus não
existe.8

7 CALVINO, João. As Institutas. Edição Clássica. São Paulo: Cultura Cristã, 1985 . p. 53 (Livro
I, Capítulo 3, parágrafo 1)
8 Idem. (Livro I, Capítulo 3, parágrafo 2)
Para Calvino, Deus colocou no coração de cada ser humano o sensus
divinitatis , que é justamente esse conhecimento, ainda que imperfeito, com o
qual todo ser humano nasce. Ele declara que Deus “pôs o conhecimento de Si
mesmo na mente de todos os homens.” 9

Sproul faz essa distinção também e nos ajuda entende-la um pouco


melhor. Ele classifica dois tipos de revelação geral: a mediata e a imediata. 10 A
mediata é a que acontece através de um mediador, no caso a própria criação.
É sobre essa revelação geral mediata que o apóstolo trata no capítulo 1. Mas
Sproul aponta também a revelação natural imediata, que acontece sem
nenhum tipo de mediação. É sobre isso que Calvino fala, que o apóstolo Paulo
chama de “exigência da lei gravada nos corações”. (v 14)

Esse conhecimento de Deus através da revelação geral mediata e


imediata é imperfeito e inadequado. Mas é suficiente para nossa condenação.
Ele afirma: “Porém, não somos tão cegos que possamos alegar ignorância sem
estar convictos de perversidade.” 11 Ou seja, no dia do juízo, que é o tema do
apóstolo Paulo no trecho ao qual estamos nos dedicando, Calvino diz que
todos os homens terão “total incapacidade de apresentar qualquer defesa que
os impeça de serem justamente acusados diante do tribunal divino.” 12

Todos os seres humanos nascem com uma bússula moral, que aponta
para Deus e para Sua lei. O pecado não apaga o referencial moral da nossa
consciência. Essa norma moral do coração que todo ser humano possui, se
torna um tipo de lei suficiente para condenação.

No grande parêntesis do texto, nos versículos 14 e 15, é justamente isso


que Paulo está dizendo: que embora não tenham recebido a Lei revelada,
como os judeus, todos que não receberam a revelação verbal, serão
condenados por outro tipo de lei, a revelação não-verbal.

Paulo talvez seja o primeiro a usar o termo consciência (do grego,


syneídēsis) no sentido de uma testemunha independente dentro de nós, que

9 CALVINO, João. Romanos. São Paulo: Cultura Cristã, 2014. p. 75


10 SPROUL, R. C. Estudos Bíblicos Expositivos em Romanos. São Paulo: Cultura Cristã, 2001.
p. 57
11 Idem. p. 74
12 Ibidem.
examina e julga a nossa conduta.13 Essa consciência pode variar de
sensibilidade, é claro, como o próprio apóstolo mostra no capítulo 1, podendo
se tornar cada vez mais insensível para a Lei de Deus. No caso dos cristãos, a
vida em santidade deve permitir que essa consciência esteja cada mais
sensível devido ao trabalho do Espírito Santo. (Rm. 9:1)

John Piper diz: “Em outras palavras, Paulo está nos dizendo algo
fundamental aqui sobre a natureza humana. Isso que significa ser humano – ter
a lei de Deus impressa ou estampada ou escrita em nossos corações.” 14 Vamos
dar uma olhada melhor no que isso significa.

4. A REVELAÇÃO NÃO-VERBAL PERMITE QUE OS HOMENS


ESPELHEM A LEI DE DEUS, MESMO SEM CONHECÊ-LA
FORMALMENTE

De fato, quando os gentios, que não têm a lei, praticam naturalmente


o que ela ordena, tornam-se lei para si mesmos, embora não
possuam a lei; pois mostram que as exigências da lei estão gravadas
em seus corações. Disso dão testemunho também a consciência e os
pensamentos deles, ora acusando-os, ora defendendo-os. (v. 14 e
15)

Em certos momentos, graças a essa bússula moral, os gentios podem


agir de acordo com a Lei (revelação não verbal), mesmo sem conhecer a Lei
(revelação verbal). Todos sabem o que é certo e o que é errado. E podem
escolher obedecer a essa lei interna do coração ou não, de acordo com a
consciência, que ora os aprova e ora os acusa. Demonstramos as exigências
da Lei que está escrita em nossos corações pois a nossa própria consciência
testemunha contra nós.

No seu parêntesis, o apóstolo Paulo responde a algumas objeções que


poderiam ser levantadas contra sua argumentação. E ele as antecipa e já as
responde e explica o que ele não está dizendo. Ele não está dizendo que os

13 Quem aponta isso é F. F. Bruce, no seu comentário sobre o texto que estamos estudando e
que pode ser encontrado no portal Precept Austin, no endereço:
http://www.preceptaustin.org/romans_213-16, acessado em Outubro de 2016.
14 Essa afirmação de John Piper faz parte de seu sermão “There is No Partiality in God”,
pregado em 27 de Dezembro de 1998, e sua transcrição pode ser encontrada em:
http://www.soundofgrace.com/piper98/12-27-98.htm , acessado em Setembro de 2016.
(tradução do autor)
gentios possuem uma lei em seus corações. Escrever a lei de Deus nos
corações é obra do Espírito Santo no coração dos regenerados, numa
promessa para a Nova Aliança.(Jr. 31:33)15 O que o apóstolo está dizendo é
que os gentios que não conhecem a lei de Deus, possuem as exigências da lei
no seu coração.

Assim sendo, Paulo está dizendo que os gentios, por mais ignorantes da
lei de Deus que possam ser, mostram com clareza, em algumas atitudes e
decisões, que possuem a obra da lei nos seus corações e agem segunda ela.
Eles instintivamente fazem (através da revelação não-verbal imediata, que
trabalharemos mais à frente) o que ela ordena (como revelação verbal dada a
Moisés no Sinai). Esse instintivamente é traduzido pelo NVI corretamente como
naturalmente, do grego, phýsis.16

Francis Schaeffer nos diz: “Realmente, admite Paulo, podemos


encontrar muitos gentios (pessoas sem a Bíblia), que vivem bem melhor do que
as pessoas como a Bíblia. Ele não está dizendo que estes incrédulos possam
viver vidas perfeitas. Nenhum ser humano vive uma vida perfeita. Tudo o que
ele está dizendo é que os exemplos relativamente bons destes incrédulos
condenam aqueles que tem a Bíblia.” 17 Ou seja, os que possuem a revelação
não-verbal além de serem condenados por ela, ainda servem como
testemunhas de acusação contra os que possuem a revelação verbal.

Nas diversas civilizações humanas, nós encontramos exemplos de


bondade, de justiça, de fidelidade, amor, honestidade e verdade. Nem todos
são depravados moralmente. Como isso pode se dar em lugares onde a lei de

15 Ao comentar esse ponto, Stott diz: “Paulo esta se referindo, não a regeneração, mas a
criação, ao fato de que "a obra da lei" (no sentido literal), as suas "exigências" (NVI), as suas
"normas" (ARA), "a Lei" (BLH), suas "implicacoes"21 foram escritas nos corações de todos os
seres humanos pelo Criador. O fato de Deus ter gravado a sua lei em nossos corações através
da criação significa que nós temos algum conhecimento dela. Quando, ao fazer de cada um de
nós uma nova criatura, ele escreve a sua lei em nosso coração, dá-nos também amor por ela e
condições para obedece-la.” (STOTT, John. A Bíblia Fala Hoje – Romanos. São Paulo: ABU
Editora, 2000. p. 96-97 )

16 A Concordância Strong define phýsis como a natureza das coisas, a força, leis, ordens da
natureza. (Essa definição pode ser encontrada em
http://www.studylight.org/lexicons/greek/gwview.cgi?n=5449, acessado em Outubro de 2016,
tradução do autor)
17 SCHAEFFER, Francis A. A Obra Consumada de Cristo. A verdade de Romanos 1-8. Um
desafio para mentes inquiridoras que desejam ver a Bíblia aplicada à sua vida e à sua época.
São Paulo: Cultura Cristã, 2003. p. 53
Deus (revelação verbal) não é conhecida? Através da revelação não-verbal, a
exigência da lei nos corações de cada ser humano. Deus criou o ser humano
como um ser moral. Todo ser humano possui um sendo do que é certo e
errado, do bem e do mal. E mesmo vivendo em uma sociedade desumana,
cruel, com princípios distorcidos, ela pode praticar ações que reflitam o que é
bom e a lei de Deus.

Aqui, o apóstolo Paulo não está comparando essa lei moral da


consciência que os gentios que não conhecem a lei de Deus possuem com a
lei dada por Deus no Sinai. O que ele está dizendo é que tanto a revelação
verbal e não-verbal trazem responsabilidades para o ser humano, e são
suficientes para condenação, que é o que temos estudado.

5. A REVELAÇÃO NÃO-VERBAL TEM O PROPÓSITO DE TORNAR O


JULGAMENTO DE DEUS JUSTO PARA TODA A HUMANIDADE

É claro que a consciência pode se cauterizar, e perder essa


sensibilidade, cada vez mais, e o apóstolo Paulo trata sobre isso no final do
seu capítulo 1. Mas, como vimos, nenhum ser humano poderá afirmar que
estava tão cauterizado ao ponto de alegar inocência no tribunal do último Dia,
diante do juiz Jesus Cristo.

Mas o julgamento de Deus é sempre justo, pois ele julga as obras, e


também os segredos dos homens. É nesse momento que nossos pensamentos
nos aprovarão ou nos acusarão diante de Cristo Jesus.

Já vimos que diante de Deus todos seremos considerados culpados,


mas precisamos salientar que como o julgamento de Deus é perfeitamente
justo, por se basear nas nossas obras e nos segredos dos nossos corações,
cada um de nós será julgado segundo à medida de revelação que recebeu.

Nesse ponto é importante fazermos uma distinção entre a revelação


verbal e a revelação não-verbal. A revelação verbal implica em maior rigor no
julgamento. A revelação não-verbal implica em menor rigor, embora redunde
em condenação da mesma forma.
É sobre essa verdade que o próprio Jesus ensina em Lucas 12:48, “a
quem muito foi dado, muito será exigido; e a quem muito foi confiado, muito
mais será pedido.”

Os judeus serão julgados com base na lei escrita (revelação verbal) e os


gentios com base na lei moral colocada nos seus corações , a lei de suas
consciências. (revelação não-verbal).18 Nesse sentido, todos nós que já
ouvimos o Evangelho de Cristo Jesus seremos julgados ainda com maior rigor
do que os judeus, pois o Evangelho possui mais revelação de Deus, se
levarmos em conta a revelação progressiva. Portanto, no Último Dia, no juízo
perfeito de Deus, todos serão julgados de acordo com o conhecimento que
possuem. A grande questão será: “Quanto da Minha revelação você possuía?
Você viveu de acordo com ela? Você a obedeceu?”

E a revelação não-verbal desempenha um papel imprescindível ao se


tornar uma testemunha de acusação para toda a humanidade que não teve
acesso à Lei de Deus dada a Moisés ou à mensagem do Evangelho.

6. O RESULTADO DO JULGAMENTO DE DEUS SERÁ O MESMO


TANTO PARA OS QUE PECARAM DEBAIXO DA REVELAÇÃO
VERBAL QUANTO PARA OS QUE PECARAM DEBAIXO DA
REVELAÇÃO NÃO-VERBAL

Pronto! Aqui está a resposta para todos os que defendem o


Universalismo ao dizerem que Deus seria injusto em condenar os que não
puderam ouvir alguma coisa sobre a Lei ou o Evangelho.

Sim, Deus condenará a todos os que não forem justificados pela fé


através da crença em Cristo Jesus. Não, Deus não é injusto de forma alguma.
Seu juízo é perfeitamente verdadeiro e justo. A revelação não-verbal e verbal
são testemunhas que atestam isso.

Não ouvir a Lei de Moisés não condenará ninguém da mesma forma que
ouví-la não significa salvação. Ou seja, embora sejam diferentes em suas
18 LOPES, Hernandes Dias. Romanos. O Evangelho segundo Paulo São Paulo: Hagnos, 2010.
p. 113
naturezas e impliquem em maior ou menor rigor, respectivamente, a revelação
verbal e a não-verbal produzirão o mesmo resultado: todos serão condenados.
Por que? Porque é pecado da mesma forma e o apóstolo Paulo nos ensina, na
mesma carta de Romanos, que o resultado do pecado é a morte (Rm 6:23) e
em Apocalipse aprendemos que é a segunda morte, a morte eterna, na
condenação do lago de fogo.

No seu comentário sobre os oito primeiros capítulos de Romanos,


Francis Schaeffer intitula o capítulo onde trabalha a argumentação do apóstolo
Paulo do capítulo 1:18 ao 2:16, “A pessoa sem a Biblia: Culpada” e a outra
seção, do capítulo 2:17 ao 3:8, “A pessoa com a Bíblia: Culpada”. Ou seja, em
ambos os casos, com a revelação não-verbal ou com a revelação verbal, o
ponto de Paulo é que essa pessoa é culpada e, consequentemente, será
condenada.

É importante salientarmos isso, pois ao afirmarmos que os que tiveram a


revelação não-verbal serão julgados com menor rigor, não queremos dar a
falsa impressão de que sofrerão uma pena mais branda. Na verdade, é
interessante notar que, inclusive, suas boas ações, que são reflexo da
exigência da Lei que eles possuem escrita nos corações será uma testemunha
contra eles. Ou seja, sem a graça salvadora de Cristo Jesus, até mesmo as
boas ações que estão de acordo com a Lei servem para condenação.

7. A REVELAÇÃO NÃO-VERBAL É SUFICIENTE PARA CONDENAR


MAS É INSUFICIENTE PARA SALVAR

Para encerrar nosso estudo sobre revelação não-verbal neste trecho tão
rico do início da carta de Paulo aos Romanos, não poderíamos deixar de
destacar algo muito importante dentro de nosso tema, ainda que brevemente.

Como temos dito por todo nosso estudo, Paulo não está trabalhando
salvação neste trecho, e sim, condenação. Logo, não existe base nenhuma
neste texto para dizer que o apóstolo Paulo defende aqui algum tipo de salvação
pelas obras. Isso é fazer uma interpretação completamente incorreta do texto e
do todo da carta aos Romanos.
Em vários momentos, o apóstolo irá defender que a salvação é somente
pela graça de Cristo Jesus, nosso Senhor (Rm. 3:24; 28; 4:2-3; 5:1; 9, são
apenas alguns exemplos disso)

Calvino ao comentar Romanos 2:15, diz que: ““Não há qualquer base


para deduzir-se dessa passagem o poder da vontade, como se Paulo dissesse
que a observância da lei é algo que se acha em nosso poder, visto que ele não
está falando de nosso poder de cumprir a lei, e, sim, de nosso conhecimento
dela”.19

Na argumentação do apóstolo, a Lei existe somente para que nossa


transgressão seja ressaltada. (Rm 5:20), sendo assim, não existe nenhuma base
na teologia paulina ou em toda a Escritura para afirmarmos que certas pessoas
poderão ser salvas pela revelação não-verbal, seja ela mediata ou imediata.

Qualquer tipo de conhecimento de Deus que possa existir na revelação


geral não-verbal, seja pela criação, seja pela consciência interior, é insuficiente
para solucionar a total depravação do ser humano. O homem caído tem
inimizade para com Deus e para com as coisas de Deus.

O sensus divinitatis que mencionamos antes, que está englobado pela


revelação não-verbal, não tem caráter redentivo, tamanho dano o pecado
causou no ser humano, levando, inclusive, à idolatria.

Qualquer que defenda a salvação por outro meio, que não


exclusivamente pela graça de Deus, prega outra mensagem que não o
Evangelho bíblico ensinado por Jesus e pregado pelo apóstolo Paulo.

Sendo assim, ninguém será absolvido no dia do Juízo Final por algum
conhecimento de Deus recebido através da revelação geral não verbal mediata
e/ou imediata. A salvação não vem por conhecer, mas somente por obedecer à
lei de Deus. E esse poder de obedecer e amar a Deus só vem pela graça,
através da regeneração operada pelo Espírito no coração dos eleitos.

8. CONCLUSÃO
19 CALVINO, João. Romanos. São Paulo: Cultura Cristã, 2014. p. 90
Diante de tudo que vimos aqui neste estudo, fica claro a importância da
revelação não-verbal na argumentação do apóstolo Paulo em Romanos 2:12-16,
conectada à tudo mais que ele desenvolveu no capítulo 1, e desenvolverá nos
capítulos posteriores.

Sendo a humanidade dividida em dois grupos de pessoas, judeus e


gentios, a revelação não-verbal tem o propósito de ser uma testemunha de
condenação do segundo grupo, tornando o julgamento de Deus um julgamento
justo.

Com esse estudo, respondemos às perguntas de muitas pessoas de


nossos dias que classificam Deus como um Ser injusto por condenar pessoas
que nunca ouviram a mensagem do Evangelho. Esse tipo de pensamento não
encontra respaldo bíblico na argumentação de Paulo.

Sendo assim, os dois grupos, judeus e gentios serão condenados, se


não houver a intervenção da graça, através da fé, na vida de indivíduos eleitos
por Cristo.

O estudo dessas coisas deve, enquanto cristãos regenerados, nos


maravilhar e nos manter humildes, por sabermos que fomos alcançados pela
graça salvífica de Cristo Jesus, que nos escolheu, sendo nós ainda pecadores
destinados à condenação eterna.
BIBLIOGRAFIA

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Novo Testamentos. São Paulo: Vida, 2008.
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2000.

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