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de-alice-no-pais-das-maravilhas
Em julho de 2015, Alice no País das Maravilhas completa 150 anos de publicação.
Professor de matemática, gago e tímido, o autor Lewis Carroll deixou uma obra de
difícil definição, que conquistou um lugar privilegiado no imaginário de várias
gerações, com a fantasia e o nonsense como suas principais marcas. Alice, em
particular, apesar de um século e meio de idade, continua uma menina. É um
símbolo importante de nossos tempos, objeto de inúmeros estudos, adaptações
literárias e, mais recentemente, versões para o cinema.
Carroll tinha talento para contar histórias, mas, introvertido, sentia-se mais à
vontade com as crianças. Declarou, certa vez, numa fórmula bem carrolliana:
“Gosto de crianças, exceto meninos”. Escreveu Alice durante uma viagem de
barco pelo Tâmisa, entre Oxford e a aldeia de Godstow, em 1862. Faziam parte da
comitiva o reverendo Robinson Duckworth e as três filhas do seu amigo (e diretor
da faculdade Christ Church) Harry Liddell: Edith (8 anos), Alice (10 anos) e Lorina
(13 anos). Para entreter as meninas durante a viagem, Carroll inventou um mundo
de fantasia cheio de personagens excepcionais e nomeou sua protagonista de
Alice. A menina Alice teria gostado tanto da história que pediu a Carroll que a
colocasse no papel e, assim, surgiu o manuscrito de As Aventuras Subterrâneas
de Alice (Alice’s Adventures Under Ground).
Alice no País das Maravilhas não é propriamente um conto de fadas, os quais têm
origem na tradição oral e, geralmente, carregam um conteúdo moral. Tampouco é
uma obra surrealista, pois o absurdo lida com valores humanos. O livro de Carroll
se situa no campo da lógica. Mas o problema lógico do raciocínio em Carroll
muitas vezes se subordina ao problema semântico. Carroll questionava
poeticamente, por meio do nonsense, os jogos de palavra e sentido, assim como
os paradoxos.
Para entrar no País das Maravilhas, Alice precisa mudar de tamanho. O problema
do tamanho é uma constante em Alice: ela cresce e diminui diversas vezes ao
longo do livro, seja porque tomou de uma garrafinha, comeu um pedaço de bolo ou
de cogumelo. E parece nunca ter o tamanho apropriado: quando precisa passar
pela porta está grande demais, quando necessita alcançar a chave em cima da
mesa, está muito pequena. No meio da história, Alice tem acesso ao cogumelo da
Lagarta, que de um lado faz crescer e do outro, diminuir. E, assim, passa a
controlar seu tamanho como lhe convém.
“Eu... eu... nem eu mesma sei, senhora, nesse momento... eu... enfim, sei quem eu
era, quando me levantei hoje de manhã, mas acho que já me transformei várias
vezes desde então.”
Esta é outra questão que se repete ao longo do livro: a identidade de Alice. Tantas
coisas estranhas acontecem a sua volta que a menina passa a duvidar de si
mesma e se pergunta: será que o mundo mudou, ou fui eu? E, para ter certeza de
que continua a mesma, Alice tenta se lembrar do que costumava saber: a tabuada,
as capitais... mas não acerta em nada. Ao recitar um poema conhecido de cor,
para seu espanto, as palavras saídas de sua boca recitam outra poesia. Em outro
momento, a Pomba confunde uma Alice muito comprida com uma serpente,
porque, além disso, Alice gosta de comer ovos, e todas as serpentes comem ovos.
Segundo Gilles Deleuze, filósofo francês, a perda do nome próprio é a aventura
que se repete em todas as aventuras de Alice. A incerteza sobre si mesmo está
ligada aos acontecimentos exteriores e o que se passa.
“Atrevo-me a dizer que você nunca chegou a falar com o Tempo!”, disse o
Chapeleiro. “Por exemplo, suponha que fossem nove horas da manhã, hora de
estudar as lições; bastaria um cochicho com o Tempo, e o relógio giraria num
piscar de olhos! Uma e meia, hora do almoço!”
“Seria formidável, sem dúvida”, disse Alice, pensativa. “Mas nesse caso eu não
estaria com fome, não é?”
“Não a princípio, talvez”, disse o Chapeleiro; “mas você poderia mantê-lo em uma
e meia até quando quisesse.”
(Alice no País das Maravilhas, de Lewis Carroll, 2013, pág. 57)
O Gato de Cheshire afirma que todos ali são loucos, inclusive Alice. O que significa
ser louco? Somos todos loucos? Só no País das Maravilhas, ou no nosso mundo
também? O Grifo diz a Alice, com todas as letras, que tudo ali não passa de
fantasia, inclusive os sentimentos, como a tristeza que abate a Falsa Tartaruga.
Saiba Mais
A obra de Lewis Carroll foi objeto de inúmeras releituras e adaptações. É
importante escolher uma que seja compatível com a faixa etária dos alunos.
Livros
Alice – Aventuras de Alice no país das maravilhas & Através do espelho, de Lewis
Carroll. Edição comentada e ilustrada: Martin Gardner; ilustrações originais: John
Tenniel; tradução: Maria Luiza X. de A. Borges, Zahar, 2013.
Alice – Aventuras de Alice no país das maravilhas & Através do espelho, de Lewis
Carroll. Edição integral ilustrada, de Nicolau Sevcenko; ilustrações: Luiz Zerbini.
Cosac Naify, 2009.
Alice no país das Maravilhas, de Lewis Caroll. Versão integral para crianças.
Tradução de Ana Maria Machado. Ática, 1997
Filmes