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Universidade de Brasília

Programa de Pós-Graduação da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo

Imagens e Símbolos Pág.5


À superação do "cientismo" na filosofia, o renascimento do interesse religioso após a
Primeira Guerra Mundial, as múltiplas experiências poéticas e, sobretudo, as pesquisas
do surrealismo (com a redescoberta do ocultismo, da literatura negra, do absurdo etc.)
chamaram, em níveis diferentes e com resultados desiguais, a atenção do grande público
sobre o símbolo como modo autônomo de conhecimento. A evolução em questão faz
parte da reação contra o racionalismo, o positivismo e o cientismo do século XIX e já
basta para caracterizar o segundo quarto do século XX.

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Nesse sentido, todas as descobertas e vogas sucessivas relacionadas ao irracional, ao
inconsciente, ao simbolismo, às experiências poéticas, às artes exóticas e não-figurativas
etc., serviram indiretamente ao Ocidente, preparando-o para uma compreensão mais viva,
logo, mais profunda dos valores extra-europeus e, definitivamente, para o diálogo com os
povos não-europeus.

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Melhor ainda. Começamos a compreender hoje algo que o século XIX não podia nem
mesmo pressentir: que o símbolo, o mito, as imagens pertencem à substância da vida
espiritual, que podemos camuflá-los, mutilá-los, degradá-los, mas que jamais poderemos
extirpá-los.

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O símbolo revela certos aspectos da realidade — os mais profundos —que desafiam
qualquer outro meio de conhecimento. As imagens, os símbolos e os mitos não são
criações irresponsáveis da psique; elas respondem a uma necessidade e preenchem uma
função: revelar as mais secretas modalidades do ser.

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Cada ser histórico traz em si uma grande parte da humanidade anterior à História.

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Quando um ser historicamente condicionado, por exemplo um ocidental dos dias de hoje,
deixa-se invadir pela sua própria parte não-histórica (o que acontece com muito mais
frequência e bem mais radicalmente do que ele imagina), não é necessariamente para
retroceder ao estado animal da humanidade, para descer às origens mais profundas da
vida orgânica: inúmeras vezes, ele reintegra pelas imagens e símbolos que utiliza um
estado paradisíaco do homem primordial (qualquer que seja a existência concreta deste
último, pois esse "homem primordial" apresenta-se sobretudo como um arquétipo
impossível de "realizar-se" plenamente em uma existência qualquer)

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Ora, como já dissemos e como mostraremos nas páginas seguintes, as Imagens são, por
suas próprias estruturas, multivalentes. Se o espírito utiliza as Imagens para captar a
realidade profunda das coisas, é exatamente porque essa realidade se manifesta de
maneira contraditória, e consequentemente não poderia ser expressada por conceitos.
(Sabemos dos esforços desesperados de diversas teologias e metafísicas, tanto orientais
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como ocidentais, para expressar por conceitos a coincidentia oppositorum, modo de ser
facilmente, e aliás abundantemente, expressado por Imagens e símbolos.) É então a
Imagem em si, enquanto conjunto de significações, que é verdadeira, e não uma única
das suas significações ou um único dos seus inúmeros planos de referências.

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A mais pálida das existências está repleta de símbolos, o homem mais "realista" vive de
imagens. Repetindo, e conforme ficará abundantemente ilustrado pelo que se segue, os
símbolos jamais desaparecem da atualidade psíquica: eles podem mudar de aspecto; sua
função permanece a mesma.

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Ora, as nostalgias são, às vezes, repletas de significações que envolvem a própria situação
do homem; dessa maneira, elas se impõem tanto ao filósofo como ao teólogo

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É esquecer que a vida do homem moderno está cheia de mitos semi-esquecidos, de
hierofanias decadentes, de símbolos abandonados. A dessacralização incessante do
homem moderno alterou o conteúdo da sua vida espiritual; ela não rompeu com as
matrizes da sua imaginação: todo um refugo mitológico sobrevive nas zonas mal
controladas.

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A mais terrível crise histórica do mundo moderno —a Segunda Guerra Mundial e tudo o
que ela desencadeou, com ela e depois dela — mostrou suficientemente que a extirpação
dos mitos e dos símbolos é ilusória. Mesmo na "situação histórica" mais desesperada (nas
trincheiras de Stalingrado, nos campos de concentração nazistas e soviéticos), homens e
mulheres cantaram romanças, escutaram histórias (a ponto de sacrificar uma parte de suas
magras rações para obtê-las); essas histórias apenas substituíam os mitos, essas músicas
estavam repletas de nostalgias. Toda essa porção essencial e imprescritível do homem —
que se chama imaginação — está imersa em pleno simbolismo e continua a viver dos
mitos e das teologias arcaicas.

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"Ter imaginação" é gozar de uma riqueza interior, de um fluxo ininterrupto e espontâneo
de imagens. Porém, espontaneidade não quer dizer invenção arbitrária.
Etimologicamente, "imaginação" está ligada a imago, "representação", "imitação", a
imitor, "imitar, reproduzir". Excepcionalmente, a etimologia responde tanto às realidades
psicológicas como à verdade espiritual. A imaginação imita modelos exemplares — as
Imagens —, reproduzindo-os, reatualizando- os, repetindo-os infinitamente. Ter
imaginação é ver o mundo na sua totalidade; pois as Imagens têm o poder e a missão de
mostrar tudo o que permanece refratário ao conceito. Isso explica a desgraça e a ruína do
homem a quem "falta imaginação": ele é cortado da realidade profunda da vida e de sua
própria alma.
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O problema central e mais árduo continua sendo, evidentemente, o da interpretação. Em
princípio, podemos sempre nos perguntar sobre a validade da hermenêutica. Através de
verificações múltiplas, por meio de afirmações claras (textos, ritos, monumentos
figurados) e de alusões meio veladas, podemos demonstrar através de exemplos o que
"quer dizer" tal ou tal símbolo. Podemos também colocar o problema de uma outra
maneira: os que utilizam os símbolos estarão cientes de todas as implicações teóricas?
Quando, por exemplo, estudando o simbolismo da Árvore cósmica, dizemos que essa
Árvore se encontra no "Centro do Mundo", todos os indivíduos que pertencem às
sociedades que conhecem essas Árvores cósmicas estarão igualmente conscientes do
simbolismo integral do "Centro"? No entanto, a validade do símbolo enquanto forma de
conhecimento não depende do grau de compreensão de tal ou tal indivíduo. Textos e
monumentos figurados nos provam abundantemente que, pelo menos para certos
indivíduos de uma sociedade arcaica, o simbolismo do "Centro" era transparente na sua
totalidade. O resto da sociedade contentava- se em "participar" do simbolismo. E, aliás, é
difícil precisar os limites de tal participação: ela varia em função
de um número indeterminado de fatores. Tudo o que podemos dizer é que a atualização
de um símbolo não é mecânica: ela está relacionada às tensões e às mudanças da vida
social, e em último lugar aos ritmos cósmicos.

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Aliás, essa controvérsia em torno dos limites legítimos da hermenêutica dos simbolismos
é inútil. Vimos que os mitos se degradam e os símbolos se secularizam, mas eles nunca
desaparecem, mesmo na mais positivista das civilizações, a do século XIX. Os símbolos
e os mitos vêm de longe: eles fazem parte do ser humano, e é impossível não os
reencontrar em qualquer situação existencial do homem no Cosmos.

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Muitos historiadores das religiões são tão absorvidos por sua própria especialidade que
não conhecem muito mais sobre os mitos gregos ou egípcios, sobre a mensagem do Buda
ou sobre as técnicas taoístas ou xamanistas do que um amador que soube orientar suas
leituras.

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O que é concreto é o fenômeno religioso manifestado na história e através da história. E,
pelo simples fato de estar manifestado na história, ele é limitado, é condicionado pela
história. Que sentido poderia ter então na história das religiões uma fórmula como, por
exemplo, a abordagem ritual da imortalidade? É preciso definir imediatamente de qual
imortalidade se trata. Pois não temos certeza, a priori, de que a humanidade como um
todo tenha tido espontaneamente a intuição ou mesmo o desejo de imortalidade.

Imagens e Símbolos Pág.27


Deveríamos, isto sim, começar por nos perguntar: em que cultura e depois de que
acontecimentos históricos se cristalizou a noção religiosa do "Centro" ou a da
imortalidade? Como se integram e se justificam essas noções no sistema orgânico de tal
ou tal cultura? Como se espalharam, e através de que povos? Após ter respondido a todas
essas questões preliminares, teremos o direito de generalizar e de sistematizar, de falar,
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em geral, dos ritos de imortalidade ou de símbolos do "Centro". Senão você está fazendo
psicologia ou filosofia, até mesmo teologia — mas não história das religiões.

Imagens e Símbolos Pág.27 e 28


Sei muito bem que estamos lidando com fenômenos religiosos e que, pelo simples fato
de serem fenômenos, ou seja, de se manifestarem, de se revelarem a nós, são cunhados
como uma medalha pelo momento histórico que os viu nascer. Não existe fato religioso
"puro", fora da história, fora do tempo. A mais nobre mensagem religiosa, a mais
universal experiência mística, o mais comum dos comportamentos humanos — como por
exemplo o temor religioso, o rito, a prece — singularizam-se e delimitam-se à medida
que se manifestam. Quando o Filho de Deus se encarnou e se tornou o Cristo, teve de
falar o aramaico; ele só podia se comportar como um hebreu do seu tempo.

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O homem integral conhece outras situações além da sua condição histórica. Conhece, por
exemplo, o estado de sonho, ou de devaneio, ou o da melancolia ou do desprendimento,
ou da contemplação estética, ou da evasão etc. — e todos esses estados não são
"históricos", embora sejam, para a existência humana, tão autênticos e importantes quanto
a sua situação histórica.

Imagens e Símbolos Pág.29


Concluiu-se depressa demais que a autenticidade de uma existência depende unicamente
da consciência de sua própria historicidade. Essa consciência histórica tem um papel bem
modesto na consciência humana, sem falar das zonas do inconsciente que pertencem
também ao ser humano integral

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Sabemos hoje que certos mitos e símbolos circularam pelo mundo, propagados por certos
tipos de cultura — ou seja, que esses mitos e símbolos não são descobertas espontâneas
do homem arcaico, mas criações de um complexo cultural bem delimitado, elaborado e
veiculado por certas sociedades humanas. Tais criações foram difundidas muito longe do
seu núcleo original e foram assimiladas por povos e sociedades que de outra forma não
as teriam conhecido.

Imagens e Símbolos Pág.30


Uma vez aceitos e integrados os resultados da etnologia, o historiador das religiões deve
se colocar outros problemas: por que tal mito ou tal símbolo puderam ser transmitidos?
O que eles revelavam? Por que certos detalhes — mesmo muito importantes — se
perderam durante essa difusão, enquanto outros sobreviveram? Afinal, a que respondem
esses mitos e símbolos para terem uma tal difusão?

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Difundidos ou descobertos espontaneamente, os símbolos, os mitos e os ritos revelam
sempre uma situação limite do homem, e não apenas uma situação histórica. Por situação-
limite entendemos aquela que o homem descobre tomando consciência do seu lugar no
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Encarando o estudo do homem não apenas enquanto ser histórico, mas também enquanto
símbolo vivo, a história das religiões poderia tornar-se, que nos perdoem o termo, uma
metapsicanálise. Pois ela nos conduziria a um despertar e a uma retomada de consciência
dos símbolos e dos arquétipos arcaicos, vivos ou fossilizados nas tradições religiosas da
humanidade inteira. Arriscamos o termo metapsicanálise, uma vez que se trata de uma
técnica mais espiritual, utilizada principalmente para esclarecer o conteúdo teórico dos
símbolos e dos arquétipos, para tornar transparente e coerente que é "alusivo", secreto ou
fragmentário. Falaríamos também de uma nova maiêutica;

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Essa maiêutica, realizada com a ajuda do simbolismo religioso, contribuiria também para
desvencilhar o homem moderno do seu provincialismo cultural e sobretudo do
relativismo historicista e existencialista, pois, como veremos, o homem se opõe à história
mesmo quando se empenha em fazê-la e mesmo quando afirma não ser outra coisa que
não "história".

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O cristianismo herdou uma tradição religiosa muito antiga e complexa, cujas estruturas
sobreviveram dentro da Igreja, embora os valores espirituais e a orientação teológica
tenham mudado. De qualquer maneira, nada daquilo que através do Cosmos manifesta a
Glória — para falarmos em termos cristãos — pode deixar um crente indiferente. Enfim,
o estudo racional das religiões revelará um fato que não foi suficientemente assinalado
até hoje: existe uma lógica do símbolo, ou seja, certos grupos de símbolos se mostram
coerentes, logicamente encadeados entre si — em suma, podemos formulá-los
sistematicamente, traduzi-los em termos racionais.

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As sociedades arcaicas e tradicionais concebem o mundo que as cerca como um
microcosmo. Nos limites desse mundo fechado começa o domínio do desconhecido, do
não-formado. De um lado, existe um espaço cosmicizado, uma vez que habitado e
organizado. Do outro lado, fora desse espaço familiar, existe a região desconhecida e
temível dos demônios, das larvas, dos mortos, dos estranhos — ou seja, o caos, a morte,
a noite. Esta imagem de um microcosmo-mundo habitado, cercado de regiões desérticas
identificadas ao caos e ao reino dos mortos, sobreviveu mesmo nas civilizações muito
evoluídas, como as da China, da Mesopotâmia ou do Egito.

Imagens e Símbolos Pág.34


A destruição de uma ordem estabelecida, a abolição de uma imagem arquetípica equivalia
a uma regressão ao caos, ao pré-formal, ao estado não diferenciado que precedia a
cosmogonia. Notemos que as mesmas imagens ainda são utilizadas atualmente quando se
trata de definir os perigos que ameaçam um determinado tipo de civilização: falamos,
particularmente, do "caos", da "desordem", das "trevas", que afundarão "nosso mundo".
Vê-se bem que todas estas expressões significam a abolição de uma ordem, de um
Cosmos, de uma estrutura, e a reimersão em um estado fluido, amorfo, enfim, caótico.
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Imagens e Símbolos Pág.35


O que queremos esclarecer é que, para o mundo arcaico em geral, os inimigos que
ameaçavam o microcosmo eram perigosos não tanto enquanto seres humanos (em si),
mas porque encarnavam as forças hostis e destruidoras. É bem provável que as defesas
dos lugares habitados e das cidades tenham começado como defesas mágicas; isto porque
essas defesas — fossos, labirintos, muralhas etc. — eram dispostas para impedir muito
mais a invasão dos maus espíritos do que o ataque dos humanos'. Até mais tarde na
história, na Idade Média por exemplo, os muros das cidades eram consagrados
ritualmente como uma defesa contra o Demônio, a doença e a morte. Aliás, o simbolismo
arcaico não encontra nenhuma dificuldade em identificar o inimigo humano ao Demônio
ou à Morte. Afinal, o resultado desses ataques, sejam eles demoníacos ou militares, é
sempre o mesmo: a ruína, a desintegração, a morte.

Imagens e Símbolos Pág.35 e 36


Todo microcosmo, toda região habitada, tem o que poderíamos chamar um "Centro", ou
seja, um lugar sagrado por excelência. É nesse "Centro" que o sagrado se manifesta
totalmente seja sob a forma de hierofanias elementares — como no caso dos "primitivos"
(os centros totêmicos, por exemplo, as cavernas onde se enterram os tchuringas etc.) —,
seja sob a forma mais evoluída de epifanias diretas dos deuses, como nas civilizações
tradicionais. Mas não se deve considerar este simbolismo do Centro com as implicações
geométricas do espírito científico ocidental. Para cada um desses microcosmos podem
existir vários "centros". Como não tardaremos a ver, todas as civilizações orientais —
Mesopotâmia, Índia, China etc. — conhecem um número ilimitado de "Centros". Mais
ainda: cada um desses "Centros" é considerado e mesmo literalmente denominado
"Centro do Mundo". Como se trata de um espaço sagrado, que é dado por uma hierofania
ou construído ritualmente, e não de um espaço profano, homogêneo, geométrico, a
pluralidade dos "Centros da Terra" dentro de uma única região habitada não cria nenhuma
dificuldade'. Estamos em presença de uma geografia sagrada e mítica, a única
efetivamente real, e não de uma geografia profana, "objetiva", de certa forma abstrata e
não essencial, construção teórica de um espaço e de um mundo que não é habitado e que
é por isso desconhecido. Na geografia mítica, o espaço sagrado é o espaço real por
excelência, pois, como se demonstrou recentemente', para o mundo arcaico o mito é real
porque ele relata as manifestações da verdadeira realidade: o sagrado. É num tal espaço
que tocamos diretamente o sagrado — quer seja ele materializado em certos objetos
(tchuringas, representações da divindade etc.), ou manifestados nos símbolos
hierocósmicos (Pilastra do Mundo, Árvore Cósmica etc.). Nas culturas que conhecem a
concepção das três regiões cósmicas — Céu, Terra, Inferno — o "centro" constitui o ponto
de intersecção dessas regiões.

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Todas essas cidades, templos ou palácios considerados como Centros do Mundo não
passam de réplicas, multiplicadas à vontade, de uma imagem arcaica: a Montanha
Cósmica, a Árvore do Mundo ou o Pilar Central que sustentam os níveis cósmicos. O
símbolo de uma Montanha, de uma Árvore ou de um Pilar situados no Centro do Mundo
é extremamente difundido.
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Imagens e Símbolos Pág. 40e 41


O que nos interessa é o seu papel nos "ritos do centro". Em geral, podemos dizer que a
maioria das árvores sagradas e rituais que encontramos na história das religiões não
passam de réplicas, de cópias imperfeitas deste arquétipo exemplar: a Árvore do Mundo.
Ou seja, todas as árvores sagradas deveriam encontrar-se no Centro do Mundo e todas as
árvores rituais ou troncos que são consagrados antes ou durante uma cerimônia religiosa
qualquer são projetadas magicamente no Centro do Mundo.

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A instalação e a consagração do tronco sacrificial constituem
um rito do Centro. Identificado à Arvore do Mundo, o tronco torna-se, por sua vez, o eixo
que une as três regiões cósmicas. A comunicação entre o Céu e a Terra torna-se possível
por intermédio desse sustentáculo. E, efetivamente, o sacrificador sobe ao céu, só ou com
sua esposa, através desse tronco, transformado ritualmente em Eixo do Mundo.

Imagens e Símbolos Pág.45


A morte — iniciática ou não — é a ruptura de nível por excelência. É por isso que ela é
simbolizada por uma escalada, e inúmeras vezes os rituais funerários utilizam escadas ou
escadarias. A alma do morto percorre os caminhos de uma montanha ou sobe uma árvore,
ou um cipó, até os céus. Esta concepção é encontrada quase no mundo inteiro, do Egito
antigo à Austrália.

Imagens e Símbolos Pág.46


Como acabamos de ver, a escada contém um simbolismo extremamente rico, sem deixar
de ser perfeitamente coerente: ela representa plasticamente a ruptura de nível que torna
possível a passagem de um modo de ser a um outro; ou, colocando-nos sob o plano
cosmológico, que torna possível a comunicação entre Céu, Terra e Inferno. É por isso
que a escada e a escalada desempenham um papel considerável tanto nos ritos e mitos de
iniciação como nos ritos funerários, sem falar nos ritos de entronização real ou sacerdotal,
ou nos ritos do casamento

Imagens e Símbolos Pág.48


Vimos que não só os templos supostamente se encontravam no "Centro do Mundo", mas
que todo lugar sagrado, todo lugar que manifestava uma inserção do sagrado no espaço
profano, era também considerado como um "centro". Esses espaços sagrados também
podiam ser construídos. Mas sua construção era, de certa forma, uma cosmogonia, uma
criação do mundo; até aí, nada de anormal, pois, como vimos, o mundo foi criado a partir
de um embrião, de um "centro". Assim, por exemplo, a construção do altar védico do
fogo reproduzia a criação do mundo, e o altar era em si um microcosmo, uma imago
mundi.

Imagens e Símbolos Pág.49


Qualquer templo indiano é, como a mandala, ao mesmo tempo um microcosmo e um
panteão. Por que construir então uma mandala? Por que essa necessidade de um novo
"Centro do Mundo"? Simplesmente porque, para certos devotos, que sentiam a
necessidade de uma experiência religiosa mais autêntica e mais profunda, o ritual
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tradicional se achava fossilizado: a construção de um altar do fogo ou a ascensão dos


terraços de um templo não mais lhes permitia reencontrar seu "Centro".

Imagens e Símbolos Pág.50


Como acabamos de ver, a mandala pode ser ao mesmo tempo, ou sucessivamente, o
suporte de um ritual concreto, ou de uma concentração espiritual, ou ainda de uma técnica
de fisiologia mística.

Imagens e Símbolos Pág.50 e 51


Mas não há aqui uma certa contradição? Todo um conjunto de mitos, de símbolos e de
rituais estão de acordo quanto à dificuldade que existe em penetrar em um centro; e, por
outro lado, ao contrário, uma série de outros mitos e ritos estabelecem que esse Centro é
acessível. Por exemplo, a peregrinação aos Lugares Santos é dificil, mas qualquer visita
a uma igreja é uma peregrinação. A Árvore Cósmica é, por um lado, inacessível, mas, por
outro lado, ela pode ser encontrada em toda iurta.

Imagens e Símbolos Pág.51


Tudo isso parece mostrar que o homem só pode viver em um espaço sagrado, no "Centro".
Observa-se que um conjunto de tradições confirma o desejo do homem de se encontrar
sem esforço no "Centro do Mundo", enquanto que um outro grupo insiste na dificuldade
e em seguida no mérito que existe em poder ter ali penetrado. Não nos interessa aqui
estabelecer a história de cada uma dessas tradições. O fato de que a primeira entre elas —
a que permite a construção do "Centro" na própria casa do homem, a da "facilidade" —
encontra-se em quase todo lugar, convida-nos a considerá-la como a mais significativa.
Ela coloca em evidência certa situação humana que poderíamos chamar nostalgia do
paraíso. Compreendemos por isso o desejo de se encontrar sempre e sem esforço no
Centro do Mundo, no coração da realidade, e, enfim, de ultrapassar de uma maneira
natural a condição humana e de reencontrar a condição divina.

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