Rualização e informalidade: frutos do capitalismo
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Rualização e informalidade - Verônica Martins Tiengo
COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO CIÊNCIAS SOCIAIS
Aos meus pais, pelo apoio e incentivo.
Aos professores e amigos que de alguma forma contribuíram com a elaboração do livro.
À população em situação de rua, que, mesmo diante de multifacetadas expressões da questão social, desenvolve diariamente diversas estratégias de sobrevivência.
À memória dos meus avós, Alda Costa Miranda Tiengo e Moacyr Tiengo.
AGRADECIMENTOS
Agradeço a Deus, por ter me dado vida, saúde e força para cursar o mestrado e escrever a dissertação que originou este livro. Afinal, Prepara-se o cavalo para o dia da batalha, mas o Senhor é que dá a vitória
(Provérbios 21:31).
Agradeço aos meus pais, Célio Tiengo e Terezinha Cristo Martins Tiengo, que sempre apoiaram minha dedicação ao estudo, por seus ensinamentos, orações e sua presença constante em todos os momentos da minha vida.
À tia Márcia Regina Martins Silva, à minha avó, Maria de Lourdes e à minha prima Rebeca Martins Silva, por suas orações.
Ao Prof. Dr. Rafael Vieira Teixeira, que está presente na minha trajetória acadêmica desde a graduação, como orientador da monografia, pelas dicas, proposições e disponibilidade para orientações imprescindíveis à elaboração dos projetos para os processos de seleção ao mestrado. Também agradeço à professora Lívia de Cássia Godoi Moraes, pelas contribuições concedidas durante e após o mestrado, tirando dúvidas, sugerindo leituras, debatendo e me incentivando a prosseguir.
A todos os professores do Programa de Pós-Graduação em Política Social da Universidade Federal do Espírito Santo, de forma especial à professora doutora Maria Lúcia Teixeira Garcia, por suas orientações, críticas e sugestões, fundamentais ao processo de pesquisa, e ao meu orientador Prof. Dr. Mauricio de Souza Sabadini, por apoiar minhas ideias, pelas sugestões, orientações e debates que contribuíram imensamente para a construção do trabalho.
Também deixo meu agradecimento aos professores que participaram da banca de defesa: professora doutora Jane Cruz Prates, professora doutora Lívia Moraes, com suas riquíssimas considerações ao trabalho e ao meu orientador, professor doutor Mauricio Sabadini, por sua contribuição incomensurável ao desenvolvimento da pesquisa.
Por fim agradeço à Capes, que ofereceu as condições materiais para a realização da pesquisa que originou a presente obra, por meio da bolsa de mestrado, permitindo dedicação exclusiva.
Música: Relatos de um morador de rua
Compositor: Eddy’Black
Salve família. Eu me chamo Eddy’Black e vim relatar a história de um morador de rua.
Sou um Morador de rua, já tenho 30 anos de idade.
Queria muito fazer a tal da faculdade, mas não tenho nem o Ensino Médio, meu sonho desde criança era ser um médico pra ajudar as pessoas e passar remédios.
Triste é ver e é difícil de entender que muitos de mim têm que se manter morando na rua lutando pra sobreviver com um sonho de poder comprar um AP. Mas o que vamos fazer se nem sabemos ler?
O papelão sempre foi meu colchão quando tem agradeço com as duas mãos, quando não, durmo mesmo no chão, na verdade nem faz muita diferença, mesmo sabendo que depois de dois dias há de vir uma doença, sempre ando nas ruas e peço licença, mas o povo nem nota minha presença. O céu sim é o meu cobertor e mesmo não tendo nada sempre agradeci o Senhor.
Talvez, você não venha me entender, porque você sempre teve o que comer. Muitos como eu lutando pra vencer, querendo ter no prato um pouco de purê a realidade não é fácil todo mundo tá cansado com tanto espaço eles criam estádios isso sim é um pecado o mundo tá todo errado.
Vejo vários aliados, os políticos estão parado e pensam que não tão sendo notado me sinto esquecido foram muitas chibatadas diante dessa sociedade que nos esculacha. Vivo nas calçadas e todo mundo passa as vezes eu penso que sou um bicho vivo procurando algo pra comer olhando o lixo.
Refrão:
Somos Filhos de Deus, temos Coração, seria muito bom se eu tivesse uma casa de papelão, eu sou um homem eu durmo no chão. Nação, população não nos esqueça não! (2x)
É difícil, as pessoas passa e me ignora e logo na frente agente chora fui perguntar as horas mas o polícia pensou que eu ia roubar o celular da senhora, é muita injustiça nem adianta ir, já vi que é assim, sou um ser humano sem valor, pode crer que sim, isso dói demais em mim temos que conviver sempre sujo dormindo com os rato e caramujo.
Com todo dinheiro que existe, poderia acabar com essa vergonhice, mas cadê quem vai fazer? Mas cadê quem vai se comprometer? Mas só pensam na vaidade, são vitímas de um sistema covarde eu não tive pai a minha mãe faleceu e infelizmente só restou eu sem família, sem ninguém quem vai fazer o bem? É triste, os parentes nunca ligaram para mim. Eu corro risco nas ruas e tenho que dormir, sim com medo, de jogarem álcool em mim sempre vou dormir receoso com medo de tacarem fogo vejo todo mundo disposto queria tá lá, mas o mundo não dá oportunidade,
Talvez eu já não tenha mais idade.
Refrão:
Somos Filhos de Deus, temos Coração seria muito bom se eu tivesse uma casa de papelão eu sou um homem eu durmo no chão Nação, população não nos esqueça não! (2x)
Somos seres humanos será que ninguém ver isso? (não) ou será que eles pensam que catar papelão consequentemente eu irei comprar uma mansão? (haha)
Muitos passam por mim e não estão nem aí, vivem com um olhar de pena e é centenas de vezes que vejo essa cena passam desconfiado muitas vezes acompanhado e em mim nem estão interessados.
Às vezes eu penso que sou um bicho, desprezado, desamparado sou um ser humano mas a sociedade me esqueceu agora olha eu, quem sou eu? percebeu? sei que Deus não me esqueceu. É difícil demais continuar, mas não posso me matar se eu estou aqui é que minha missão, tenho que terminar, eu oro e sei que Jesus há de me salvar!
Só queria saber onde tá o direito a moradia, é muita covardia porque tanta mentira? Se eu tivesse um barraco eu agradeceria.
Somos Filhos de Deus, temos Coração seria muito bom se eu tivesse uma casa de papelão eu sou um homem eu durmo no chão (2x)
Nação, população não nos esqueça não!
Nação, população não nos esqueça não!
Nação, população não nos esqueça não!
Sou apenas um ser humano que a sociedade ignora ou faz de conta que não vê.
PREFÁCIO
Rualização e informalidade: frutos do capitalismo, de Verônica Martins Tiengo, agora publicado no formato de livro, resultou de pesquisa de mestrado, tendo sido a centésima dissertação defendida no Programa de Pós-Graduação em Política Social da Universidade Federal do Espírito Santo. Apenas por esse mencionado motivo, já foi um marco na história do PPGPS/Ufes. Mas não somente. A qualidade da pesquisa e a relevância sócio-histórica do tema fazem deste livro, uma imprescindível leitura aos(às) assistentes sociais, pesquisadores(as) da área de Política Social e todos e todas que estiverem interessados em melhor compreender como a população em situação de rua situa-se na produção e na reprodução do capitalismo contemporâneo.
Para responder a respeito de qual o papel que o trabalho da população em situação de rua cumpre na acumulação capitalista, Verônica Tiengo, primeiramente, teve que desmistificar o discurso, próprio do senso comum, de que essas pessoas são vagabundas
, preguiçosas
e que só estão na rua porque não querem trabalhar
. Elas trabalham! Foi essa a primeira conclusão a que a autora chegou na pesquisa documental realizada, com foco especial no jornal O Trecheiro – Notícias do Povo de Rua, cujas publicações têm a população em situação de rua como sujeitos.
A partir da constatação de que pessoas em situação de rua, no Brasil, trabalham, Tiengo passou a investigar, com base em uma análise materialista histórico dialética, que tipo de trabalho executavam e como compunham a classe trabalhadora brasileira.
A primeira comprovação da pesquisadora foi a de que se tratava de trabalho informal, sem qualquer estabilidade ou garantia de direitos trabalhistas. Eles e elas precisam sobreviver e se submetem a trabalhar nas condições que lhe parecem possíveis e acessíveis ao cotidiano. Entre elas, estão: catadores(as) de materiais recicláveis, flanelinhas, trabalhos na construção civil, carregadores(as), estivadores(as) e trabalhadores(as) de limpeza.
Se a população em situação de rua brasileira trabalha, em condição de informalidade, como compõe a classe trabalhadora? Essa pergunta derivou do avanço da análise. A resposta comum, entre estudiosos de base marxista, seria dizer que esse agrupamento da classe trabalhadora compõe o lumpemproletariado, para o qual, em geral, designam-se os vagabundos
, desvalidos, prostitutas, delinquentes etc. Porém o rigor teórico de Tiengo, com o estudo aprofundado de O Capital, de Karl Marx, mais especificamente do capítulo 23, A lei geral da acumulação capitalista
, fez com que ela chegasse à conclusão de que a população trabalhadora em situação de rua compõe, em grande parte, a superpopulação relativa, a qual pode expressar-se de formas diversas, segundo a produção marxiana: flutuante, latente e estagnada.
A qualidade da análise da autora explicita-se no fato de que, em sendo uma pesquisa de base teórica marxista, ela observa claramente que não há fixidez na condição da população em situação de rua. Ao contrário, ela se movimenta na História, sob as necessidades dadas pela sobrevivência e pelos ditames do capital, de tal forma que, em determinadas situações, apresenta-se como estagnada; em outras, como flutuante; em alguns momentos, como latente; e, em outros casos, como lumpemproletariado.
No capítulo supracitado, o 23 de O Capital, Marx afirma que o modo de produção capitalista traz uma forte contradição na sua forma de ser: ao produzir riqueza, produz também desigualdade. Tendo desenvolvido as forças produtivas de forma acelerada após a Revolução Industrial, iniciada na Inglaterra há mais de três séculos, com condições de não mais gerar escassez, reproduz e produz incessantemente miséria, material e espiritual, em escala planetária. A população em situação de rua é expressão dessa desigualdade e da necessidade derivada da própria natureza do modo de produção capitalista.
O que a estudiosa inova em apresentar é o fato de que essa população miserável, que parece ser um peso social ao Estado, que sofre o desprezo das classes mais abastadas materialmente, contribui, ou melhor, é parte constituinte do processo de acumulação capitalista.
Tiengo chama a atenção para o fato de que compor a população em situação de rua não é uma escolha pessoal, nem resulta da falta de esforço
individual. A condição estrutural do modo de produção capitalista é que as coloca na condição em que se encontram. Mesmo que o que mova essas pessoas ao trabalho informal seja a necessidade de sobrevivência, esse trabalho responde de forma funcional e subordinada ao capital. Essa superpopulação relativa exerce, sem ter consciência disso, pressão para o aumento da produtividade, da intensificação do uso da força de trabalho e até do rebaixamento de salários de quem está empregado formalmente.
Cabe destacar o quão cuidadosa foi a pesquisadora em seus procedimentos metodológicos, caracterizando-se por ser uma análise de conteúdo de base documental. Categorizou e analisou os achados de pesquisa com a crítica necessária às Ciências Sociais, que se pretendem como instrumentos de mudança social.
Tendo sido membro da banca de defesa da dissertação de mestrado, agora livro, sob o título Rualização e Informalidade: Frutos do Capitalismo, junto ao seu orientador, Prof. Dr. Mauricio Sabadini, da Universidade Federal do Espírito Santo, e à professora doutora Jane Cruz Prates, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul, um momento especial e muito gratificante para o Programa de Pós-Graduação em Política Social da Ufes, faço a recomendação desta obra, fundamental para pensar quem é a classe trabalhadora hoje, em toda a sua heterogeneidade.
Verônica Tiengo apresenta, neste livro, o ser
da população em situação de rua, demonstrando o caráter ontológico da análise, e localiza essa população na História, como fruto do modo de produção capitalista e também como necessidade permanente para sua acumulação. Material empírico e base