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ciais
dizer públicas.
que há um O deslocamento
que se quer dizer com
da luta deisso? Seria
classes da mais
esferafácil
da
produção, do chão da fábrica ou das oficinas ou ainda dos
escritórios, para o orçamento do Estado. Mas, não apenas de
fato, mas teoricamente, não é isso que se passa, pois tanto para
que exista o fundo público quanto para que o processo de
publicização das classes sociais se dê, é absolutamente neces
sário que também continue a luta de classe na esfera da pro
dução ou, se quisermos dizer, no confronto imediato e direto
entre empregado e patrão, O fundo público só existe e somente
se sustenta como conseqüência da publicização das classes so
53
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
história, Minha
rodiando interpretação
Habermas, o máximoé que ocorre, de fato,
de publicização que, pa
possível pa
rece privatizar tudo. Mas esta é uma ilusão da aparência, posto
que as classes sociais saíram de seus invólucros anteriores, pri
vados, e não são percebidas como públicas. Mas, quanto mais
parecem desaparecer do campo da visibilidade do confronto
privado, tanto mais são requeridas como atores da regulação
publica. Isto não é um paradoxo, mas a contradição das classes
sociais hodiernas, que é, também, a mesma do fundo público.
As conseqüências ou, dizendo de outro modo, as transfor
mações na mesmo
e efeito do esfera pública e nosão
processo, Estado, ao mesmo
extremamente tempo causa
relevantes. A
esfera pública aqui não é mais uma esfera pública burguesa:
mas, da mesma forma como a entrada da classe trabalhadora
na disputa eleitoral redefiniu a democracia, com o que as an
tigas desconfianças marxistas em relação à democracia perde
ram todo o sentido, também uma esfera pública burguesa,
penetrada por um fundo público que é o espaço do desloca
mento das relações privadas, deixa de ser apenas uma esfera
pública burguesa. Assim, de novo parafraseando Habermas,
no máximo
mente, de intransparência
a esfera é possível
pública, redefinida distinguir,
dessa forma, nitidapri
da esfera
vada. E isso, por exemplo, que torna possível uma campanha
54
A ECON OM IA P OLÍTICA DA SOCLAL -DEMOCRACIA
a forma estatalE em
insubstituível. muitos
o caso casos
mesmo revelou-se
dos imprescindível
países periféricos como eo
Brasil.
Essa revolução no Estado tem enormes conseqüências.
Para citar uma teorização que depende inteiramente dela, aliás
reconhecida por Furtado e Prebisch - e este foi um dos pri
meiros keynesianos da América La tina-, relembremos a teoria
do subdesenvolvimento da CEPAL, a qual partia, precisamen
te, da possibilidade de uma demanda autônoma derivada das
funções do Estado. Ora, a rigor não se trata de “funções” do
Estado, mas de uma revolução posta nas formas do Estado por
ss
A ECONOMIA POLÍTICA DA SOCLAL-DEMOCRACIA
57
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
58
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
como se desde
é tampouco o os
fiminícios dos tempos
da história. ele estivesse
O socialismo inscrito.
aparece Nem
como
necessidade enquanto um sistema que possa resolver as con
tradições do que chamei o modo social-democrata de produ
ção. Nessa medida, ele não é independente da história dos
homens, pois como tratei de expor, a constituição desse modo
social-democrata de produção é, afirmativamente, um produ
to da história dos homens, da luta de classes, travada não ce
gamente, não enquanto as classes são uma espécie de
autômatos robitizados do capital, mas enquanto as classes são
personaede sua própria história. De fato, o modo social-de
mocrata de produção mostrou, pela primeira vez, a virtuali-
dade da desnecessidade da exploração, e isso ainda vai longe.
E está mostrando também que a contradição em que se cons
truiu a forma de superar um capitalismo não auto-regulado
desbloqueou as imensas potencialidades da produção, mas blo
queia as possibilidades da realização. Por isso, seu voraz apetite
por todas as formas de riqueza pública, entre as quais espaços
supra-nacionais aparecem como uma das mais notáveis; mas,
assim mesmo, bloqueado pela forma mercantil, ele concentra
renda, o que aparece como encaredmento do capital constante
- quando na verdade há um barateamento e condena vastas
parcelas da humanidade a serem apenas simulacros de consu
midores. O socialismo aparece nessa fronteira para, por sua
vez, desbloquear esse caminho.
60
A ECONOMIA POLÍTICA DA SOCIAL-DEMOCRACIA
dos Cebrap.
PRZERWORSKI,Adam. Capitalismo e social-democracia.
61
I
àm
POLÍTICAS DO ANTIVALOR, E OUTRAS POLÍTICAS
quer dizer que o que Marx teoriza seja algo que se possa reduzir
à pura experiência empírica, senão não teria ganho o estatuto
e a força explicativa que ganhou a relação entre as classes
tinha muito a aparência de um conflito privado* A partir dos
anos 30, o conflito extrapola os marcos daquilo que se poderia
se nãodetivessem
disse recortes,
forma fácil como
e banal - se- oooperariado
que a sociologia americana
americano fosse
classe média, medido pelos índices de consumo. Na verdade,
é possível continuar a pensar que o conceito de classe é válido,
à condição de fazer esse novo percurso que tentei fazer.
Com o a tecnolo gia entra nesse esquema ? A ciência como fator de
produç ão tem algum estatuto?
constante. O queaquer
e forte em Marx, dizer isso?
burguesia, Segundo
tentando uma
superar posição antiga
continuamente
os limites da exploração da força de trabalho, usa a ciência e
tecnologia para baratear o custo da sua reprodução. Contudo,
a partir dos anos 30, tomando-se em conta os países líderes
do sistema, onde havia uma relativa homogeneização da pre
vidência social, de seguro social, de outros antivalores em ge
ral, o que se viu foi que esse processo, com o fundo público,
havia ganho outra forma, tinha passado a ser relativamente
65
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
66
POLÍTICAS DO ANTIVALOR, E OUTRAS POLÍTICAS
em Fazendo um eu
proporções, balanço,
daria se
60%essas coisas
de peso àspudessem
condiçõesser medidas
internas
dos países que hoje chamamos de desenvolvidos. Acredito mui
to mais num tipo de interpretação marxista que concede muito
valor ao movimento das lutas de classes. Até porque sabemos
historicamente que antecipações desse processo existiram na
Alemanha e na Itália até como tentativa da burguesia de dis
putar a posse dos corações e das mentes da nova classe social.
Tratando dessa forma esquemática, os outros 40% são devidos
à revolução soviética, à medida que havia uma forte sedução
das massas trabalhadoras pela URSS. A Grande Depressão,
que desempregou 30% da força de trabalho, é outro fator que
mobilizava e atualizava a ameaça soviética no interior dos paí
ses ocidentais. Antes mesmo de Keynes tentar teorizar qual
quer coisa, a maioria dos países estava tateando e buscando
formas de sair do nó, por intermédio do que depois veio a ser
sistematizado como medidas de bem-estar social. Em alguns
casos, de forma já bastante sistemática - como foi a Suécia nos
anos 20 - e em outros já premidos pelas circunstâncias, como
foi o caso da França já na grande crise, correndo para descontar
67
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
político,
da a apresentação
sociedade f de propostas de transformação mais radical
ram muito,Quanto
nalmente. a ponto de eu não mais
a experiências como apoiá-la incondicio
a de Cuba, por exem
plo, sempre fui francamente favorável, ainda que deteste a
forma ditatorial que lá se exerce. A débâcle soviética é um
golpe muito forte na moral socialista e é uma derrota de pro-
68
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
para classes
hoje estão sociais públicas,
ocorrendo no sentido da Por
fortes transformações. sua que
reprodução,
se sur
preender com o fato da taxa de sindicalização cair nos países
mais desenvolvidos? Exatamente porque o Estado do bem-es
tar universalizou-se, aquilo que dependia da sua filiação ao
sindicato, de um certo partido que chegava ao poder, não de
pende mais disso. Qual o incentivo para ser sindicalizado hoje?
Há uma erosão pela base naqueles sujeitos que construíram o
próprio Estado do bem-estar, e daí vem parte do seu ocaso.
Mas, em grandes linhas, eu diria que esse ocaso é mais apa
70
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
Dentro dessa lógica, não seria irracional por parte dos países
avançados estar praticando essa desregulamentação , uma vez
que eles próprios estariam promovendo algo que brevemente irá
preju dic á-lo s?
72
POLÍTICAS DO ANTÍVALOR, E OUTRAS POLÍTICAS
que
uma apolítica
melhorsocial
educação não édepende
vigorosa do mercado.
insubstituível Portanto,
como elemento
de distribuição de renda, mesmo quando o salário real está
crescendo. O mercado só realiza muito parcialmente a me
lhoria na distribuição de renda. Nos anos gloriosos mi-do
lagre, quando se pensava que só o crescimento do salário
real era suficiente para redistribuir renda, a classe média
abandonou o ensino público. Quando os salários da classe
média se deterioraram, ela quis voltar para a escola pública,
mas esta estava liquidada. Por isso, eu advogaria uma boa
taxa de crescimento e vigorosas políticas sociais porque é
por aí que passam educação, saúde, lazer e cultura de qua
lidade.
Falando nos seus próprios termos, o salário direto está mais sujeito
ao ciclo dos negócio s enquanto osalário indireto tem uma estabilidade
que se sustenta no tempo e que serve de garantia inclusive para a
cidadania?
Exatamente.
7S
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
76
i
PARTE II
A Q U A S E -H E G E M O N IA
,l Publicado emN ovo s E studos, São Paulo, Cebrap, n. 27, julho de 1990, p. 67-91.
Este texto sintetiza oelatóri
r o da pesquisa Estrutura
“ dePoder no Nordeste Pós-Su-
dene”, encomendada pela diretoria de Programação Global-DPG, da Superintendên
cia do Desenvolvimento do Nordeste-Sudene, ao Centro Brasileiro de Análise e
Planejamento - Cebrap.
nador), os seguintes Participaram
auxiliares da pe
squisa,
de pesquisa: além
Carlos do autor
Alberto doetexto
Beijo Silva,(coorde
Elson Luciano
Silva Pires, Hélio Francisco Corrêa Lino e Marcelo César Gouvêa. O principal objetivo
da pesquisa foi oferecer um quadro de referências atualizado para marcar as possibi
lidades e os limites do planejamento regional. Neste sentido, o estudo das estruturas
de poder engendradas e/ou reforçadas pelas transformações econômico-sociais em
curso desde a criação da Sudene passa a ser o ponto focal para avaliação daquelas
possibilidades. As fontesestatísticas ut
ilizadas na pesq
uisa foram publicações de órgãos
públicos (BNDES, FIBGE, Sudene etc.), de entidades sindicais de trabalhadores (DIEE-
SE) ou patronais (FIESl^ Febraban) e publicações econômicas especializadas
(Visão,
G uia Interinvest).
79
OS DIREITOS DO ANTÍVALOR
HO
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
ruptosaté
biam de 1crescimento econômico,
2 - são 57%
salário mínimo* dos empregados
inequívocos resultadosrece
da
ausência de uma esfera pública, e exatamente ao contrário do
que apregoam os neoliberais, da ausência do poder regulador do
Estado sobre os mecanismos do mercado; ou, especificando me
lhor, o público se privatiza apenas numa direção, na direção da
substituição dos fundos da acumulação privada pelos estatais,
mas não há contrapartida no sentido de corrigir o mercado em
termos de salários, distribuição de renda etc.
Os mecanismos financeiros que presidem à expansão ca
pitalista no Nordeste configuram o novo papel dos fundos
públicos nos processos de constituição do capitalismo contem
porâneo. Poderíam ser listados como estando na vanguarda,
precoce, deum capita l financeiro em geral, que se arma a partir
dos fundos públicos, se concretiza e se torna capital privado
na órbita da produção, se traveja na mordernidade de uma
nova relação capital-trabalho, irriga o bem-estar na forma dos
gastos sociais públicos, escanteia o acaso e o aleatório dos
processos da reprodução econômica e social até o limite do
possível em contextos históricos determinados, e potência, de
82
A METAMORFOSE DA ARRIBAÇÃ
tico e investimentos
relação estatais. Mas, exatamente
fundos públicos/acumulaçao privada, onoCongresso
núcleo da
castrado do regime autoritário não atuava, impedido de le
gislar sobre orçamento e de interferir nas empresas estatais.
1Dc acordo com Tabela G.l, p. 141, do relatório “Avaliação dos Incentivos
Fiscais Regidos pelo Decreto-Lei 1376”, IPEA, 1986.
83
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
efeitos de aferição
podem aspirar, comodorecursos
montante de recursos
próprios; desta “do Finor a ope
inocente” que
ração de ajuste e medição decorre a já mencionada desvalori
zação dos certificados de investimento do Finor, que dá lugar
ao “mercado de capitais cativo” dos investidores do Finor.
Em 1985, os recursos financeiros via Finor e BNDES re
presentaram 2 ,8 1% do PIB regional6, enquanto a formação
bruta de capital fixo (FBCF) total alcançou em 1983 (último
ano para o qual há dados disponíveis) 2 1,9 9 % 7 . A primeira
6Idem, p. 62.
7 VideProduto e formação bruta de capital - Nordeste do BrasiLRecife,
Sudene, 1987.
86
A METAMORFOSE DA ARRIBAÇÀ
tos
mentedasouestatais produtivas,
por empréstimos que se ou
externos, financiam
ainda viaou autonoma-
subscrições
acionarias do BNDES, que não se incluem nos empréstimos.
O Finor financiou apenas 1 0 % do capital total dos grupos
estatais que atuam no Nordeste.
A face mais impactante do Finor se revela pelo lado de sua
participação no capital total das 1.300 maiores empresas do
Nordeste, que alcançou em 1985 a porcentagem de 35% para
o setor industrial, e da ordem de 65% para o setor agropecuá
rio8. A distribuição setorial dos recursos do Finor confirma
sua importância como mecanismo financeiro da acumulação
de que
os capitais, pois sãoaos
absorveram seis parte
maior gêneros
dosindustriais mais dinâmicos
recursos daquele fundo
(excetuando-se as empresas estatais de serviços públicos, que
se financiam diretamente junto aos tesouros, federal e esta
duais, e em parte junto ao BNH).
O sistema Finor não funciona como instrumento financei
ro ao alcance de médios e pequenos capitais, senão de maneira
marginal. Ele se revela como financiador e potenciador de uma
acumulação concentrada, quase oligopolista, pois os cinqüenta
grupos econômicos mais importantes do Nordeste repre
sentam cerca da metade do capital total das 1.300 maiores
empresas
do e absorveram
Finor em também a metade
19859. Se desglosadas dos recursos
as empresas totais
e seus grupos
por srcem/propriedade dos capitais, a análise revela que os
grupos estatais absorveram recursos do Finor da ordem de
10% de seus patrimônios totais (uma vez mais, com exceção
87
A METAM ORFOSE DA ARRIBAÇA
fontes,
os mas em de
empréstimos todoinstituições
caso dependentes do governo
internacionais federal. E
são avalizados
pelo governo federal, que, assim fazendo, assume o risco de
câmbio implícito na operação, quando de sua quitação.
Todas essas fontes têm em comum seu caráter altamente
subsidiado, e, nos casos especiais do PIS/Pasep e FGTS, cons
tituem uma verdadeira expropriação sobre seus proprietários
nominais, os assalariados em geral e os funcionários públicos.
O BNDES e o BNFI remuneravam esses fundos historicamente
a taxas de 3% ao ano, mais correção monetária. Ora, essas
taxas não alcançam sequer a remuneração das cadernetas de
poupança, que é de 6% ao ano mais correção monetária. O
BNDES empresta a taxas maiores, apropriando-se da diferen ça
entre o que paga e o que cobra, que reverte para seus próprios
fundos. Este é um dos aspectos da “regulação autoritária”. Os
proprietários desses fundos não têm qualquer ingerência nas
suas aplicações. Ademais, a ação do BNDES e dos bancos es
tatais de fomento, BN B e aqueles de propriedade dos governos
estaduais, nãoé especificamente nordestina. Tanto a forma das
aplicações quanto a natureza das fontes são fenômeno geral
na atuação do principal banco de investimento nacional em
todo o país; e os bancos estaduais de Estados fora da região
Nordeste também atuam da mesma maneira e socorrem-se das
mesmas fontes.
A soma de aplicações do Finor e do BNDES, que já se
indicou, alcançou quase 3% do PIB regional em 19 85 e trouxe
uma qualidade nova ao processo de expansão econômica nos
quadros da “ regulação autoritária” . Genericamente, eles são
parte da crescente interação entre Estado e economia, carac
terística do capitalismo contemporâneo, em que os fundos
públicos constituem um pressuposto de processo de acumula-
89
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
fato, produtiva
base as deduçõesque fiscais
gerou odesligam-se momentaneamente
imposto de renda, da
para só se liga
rem outra vez à mesma no interior de cada capital em parti
cular. A essa função própria do capital financeiro junta-se outra
que é peculiar aos fundos públicos, e que somente eles podem
cumprir: não estão sujeitos aos movimentos da taxa de lucro
de qualquer setor em particular,amarração esta que ainda pre
side o capital financeiro stricto sensu. Esta última condição
revelou-se absolutamente necessária para romper a inércia da
economia regional anteriormente regulada pela sua própria
produção
não dependeude excedente: a taxa
de sua base de investimento
produtiva, do geração
isto é, da Nordestede
lucros interna, pois se verifica que o coeficiente de inversão
regional sobre o produto é bem superior ao da economia bra
sileira, tendo alcançado cerca de 22 % em 19 8132.1
A primeira razão é a já indicada: elevar o coeficiente de
inversões acima da capacidade gerada pela própria economia,
A segunda razão é romper com a inércia de capitais que se
movimentavam em torno das taxas de lucro existentes nos
90
A METAMORFOSE DA ARRIBAÇA
recente do
equação Nordeste
cujo primeiroétermo
insubstituível e forma
são os fundos o outro
públicos do par da
Finor
e do BNDES. Esta qualidade vai muito além de seu significado
quantitativo, cuja importância foi demonstrada nos parágrafos
anteriores, e pode-se dizer que, sem a somatória Finor/BNDES
mais estatais, não teria ocorrido a expansão recente, nem se
quer como mera decorrênciaespacial do forte crescimento
nacional desde o pós-guerra.
Em primeiro lugar, as empresas estatais no Nordeste de
sempenham o mesmo papel que tiveram na industrialização
nacional desde o segundo pós-guerra. Um papel paradigmático
de proto-indústria,
sentido não
de prévia e pio no :ésentido
ne ira de pré-indústria,
um desempenho afirmadomas no
quase
trinta anos depois da arrancada industrial t^ue se deu nos anos
50, com Siderúrgica Nacional, Petrobrás, Alcalis, Vale do Rio
Doce, em escala nacional.
As grandesholdings federais sãocapital financeiro po r ex -
celência, pois no seu interior elas fundem a função produtiva
c a função creditícia (quase bancária). Financiadas basicamente
por fundos públicos de extração fiscal, seus recursos desligam-
sc momentaneamente do movimento da taxa de lucro (ou de
juros), e, aplicados produtivamente, perfazem uma equação
inteiramente
nal. Quando inovadora
associadasem meio ao privados,
a capitais primitivo circuito regio ori
de qualquer
gem e natureza, exponenciam sua qualidade de capital
financeiro sui generis, pois os capitais que se lhes associam
passam, também, a gozar da prerrogativa de escapar às deter
minações da taxa de lucro, em que viviam circunscritos en
quanto permanecessem em suas formas srcinárias.1
93
OS DIREITOS DO ANTÍVALOR
A dinâmica
fundos públicoseconômica promovida
e fundos privados pela nova
inscreve armaçãodeci
o Nordeste, de
sivamente, no processo mais geral de acumulação de capital
no país. Disso dão testemunho as inusitadas taxas de cresci
mento do PIB regional entre 1970 e 198318. Neste sentido,
apesar da pequena descentralização regional do PIB (Nordeste
x Brasil)19, é inegável a ampla incorporação do Nordeste à
lógica dos processos econômicos de âmbito nacional. O em
prego nos setores da indústria e de serviços cresceu ao ponto
94
A METAMORFOSE DA ARRIBAÇÃ
95
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
em nívelodo
ficação, emprego,
que a aparência
consta, aliás, é de quase
reiteradamente, dasnenhuma modi-
queixas regio-
nais sobre o recente desenvolvimento. Mas é na análise em
nível desglosado dos serviços que se observa, de forma pe-
remptória, o caráter capitalista das novas atividades e da nova
dinâmica econômica. De fato, a intermediação financeira,
componente dos serviços, passou de 5% do PIB em 1970 para
22 Idem,tabela AI-lc
23 Ver Francisco de Oliveira.
Elegia para uma re(li)gião.Rio de Janeiro, Paz
e Terra, 3.ed., 1981.
24 De 33,0% em 1950 para 27,5 % em 1985. Ver “Estruturas de poder. ....”,
op.cit., tabela AI:le.
96
A METAMORFOSE DA ARRIBAÇA
mente exigente
rias, através do do pontobancário.
crédito de vista da circulação de mercado
Adicione-se a isso o crescimento das rendas e salários e
dos lucros industriais, e ter-se-á uma resposta parcial para um
incremento da intermediação financeira, a qual se relaciona
com o mercado de poupanças, um incipiente mercado de ca
pitais e mesmo com a circulação dos recursos públicos do Fi
no r, BNDES, Banco do Nordeste e estatais. É evidente também
que o subperíodo 1980-83 é aquele no qual as taxas de juros
começaram a crescer, sistematicamente, na economia brasilei
ra, coincidindo com a chamada “crise das dívidas externa e
interna” , ono
financeira que poderia
PIB contribuir
nordestino. para inflar
Entretanto, a intermediação
os estudos nacionais
a respeito anotaram que apenas em breves períodos conjun
turais a taxa de juros foi real e positiva, tendo sido, na maior
parte do longo período analisado, negativa. Essa anotação re
força a possibilidade de que o crescimento da intermediação
financeira no PIB nordestino reflita, de fato,
crescimento real,
devido às modificações da base produtiva e em geral ao caráter
nssumidamente capitalista da nova dinâmica regional.
O crescimento dos serviços poderia, de outro lado, ser
atribuído ao crescimento do chamado setor informal da eco
nomia.
cimentoIsto é, aliás, uma
do Nordeste, constante
mesmo nasaparelhadas
nas mais análises sobre o cres
conceituai
e estatisticamente. Impressionisticamente, a paisagem das
principais cidades do Nordeste reforça essa interpretação:
qualquer grande cidade do Nordeste parece-se, hoje, mais com
um mercado persa do que com uma cidade ocidental. As es
tatísticas daP NAD reforçam essa impressão: em 19 85, * do total
97
OS DIREITOS DO ANTFVALOR
98
A METAMORFOSE DA ARRIBAÇA
latifúndio-minifúndio.
Entretanto, percebe-se o peso ainda grandemente deter
minante do setor agropecuário no Nordeste - se não do ponto
de vista da antiga expressão do latifúndio, do poder econômico
tio coronelato - mas de outro ângulo: na feitura do mercado
de força de trabalho, na estrutura da distribuição de renda e,
o que talvez seja ainda seu grande triunfo e ao mesmo tempo
99
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
as velhas
quais oligarquias
renovam-se continuam nos
longevamente produzindo deputados,
mandatos, os
quase à seme
lhança da açucarocracia pernambucana, de longe a mais lon-
geva classe dominante do Brasil, que sem dúvida pode disputar
esse duvidoso labéu em concurso mundial.
E no setor industrial que os deslocamentos e a metamor
fose se mostram mais importantes e decisivos. Como já foi
salientado, o pequeno aumento da participação da indústria
de transformação no PIB regional esconde, mais do que mos
tra, as mudanças que se quer assinalar. Sem nenhuma dúvida,
a indústria foi, na expansão recente do Nordeste, como de
10 0
A METAMORFOSE DA ARRIBAÇÃ
A importância
dustrial da região édaainda
indústria
mais química para
acentuada seaconsiderarmos
dinâmica in os
gêneros que dela dependem diretamente - como matérias plás-
i icas, borracha, produtos farmacêuticos e veterinários -, que
apresentaram taxas de crescimento reais superiores à média
do Nordeste. Juntamente com o setor mineral, representam
47% do faturamento total da industria. De outro lado, os gê-
101
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
10 2
A METAMORFOSE DA ARRIBAÇÃ
10 3
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
entre esses vinte gêneros estão três dos cinco maiores gêneros
industriais regionais - produtos alimentares, têxtil e metalur
gia. Eles, os capitais regionais, se associam pouco, repre
104
A METAMORFOSE DA ARRIBAÇA
regional”,
deste, istoque
é, aera a marcapraticamente
presença da antiga industrialização do Nor
exclusiva de empresas
de capital estritamente regional. A esse respeito, não fazia parte
da história industrial regional a presença de empresas de ca
pitais do resto do Brasil na propriedade industrial, salvo um
ou outro caso muito raro. Quanto ao capital estrangeiro, este
participou da estrutura econômica do Nordeste ao modo e à
semelhança de sua participação na estrutura econômica nacio
nal antes da industrialização, isto é, com empresas e proprie
dades nos gêneros de energia elétrica, transportes urbanos
(bondes) e ferroviários, telefonia e gás (neste caso, Pernambuco
sendo o único, ao que consta); o setor bancário assinalou tam
bém, antes da II Guerra Mundial, a presença de clássicos ban
cos estrangeiros: ingleses, franco-italianos, holandeses,
portugueses e norte-americanos.
Depois da II Guerra, a intensa nacionalização dos bancos
comerciais privados (nada a ver com estatização) reduziu a
presença dos bancos estrangeiros no Nordeste, e mesmo os
bancos de países aliados na II Guerra Mundial reduziram sua
presença na região a quase nada. Somente agora, tal como
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
umaAnovidade:
composição da estrutura
os capitais de capitais
nacionais estão mostra, portanto,
na atividade indus
trial, o mesmo acontecendo com os capitais estrangeiros, atra
vés de filiais ou de empresas novas que, às vezes, nada têm a
ver com os perfis das matrizes. Essa nova matriz é, em si mesma,
um resultado dos processos de integração, e demonstra, por
seu lado, uma descentralização que é simultaneamente nacio
nalização territorialmente concreta dos amplos interesses de
classe. A formação de empresas associadas oferece, por outro
lado, um novo ângulo para se pensar a gênese dos novos in
teresses burgueses: trata-se de interesses articulados, que, não
excluindo a competição, formam, entretanto, um novo e com
pacto bloco de interesses privados.
1 06
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
o poder deéclasse
centração daspelos
pautada novaspróprios
estruturas econômicas.
mecanismos Essa con
financeiros
que presidiram a acumulação: em primeiro lugar, as empresas
estatais são, em si mesmas, poderosas expressões da concen
tração de capitais. Em segundo lugar, o tipo de mecanismo
Finor, uma dedução do imposto de renda, desde que a opção
de investimento é das próprias empresas que praticam a de
dução, é concentracionista: deduz mais quem paga mais im
posto de renda. Em terceiro lugar, como os mecanismos têm
vigência
a expansãodevido à dinâmica
de empresas deeconômica das regiões
fora do Nordeste faz-se,mais ricas,
na região,
sob os mesmos moldes concentrados e organizacionais das re
giões líderes. Dessa forma, simultaneamente os maiores grupos
têm mais acesso aos recursos do Finor e os menores grupos
ou empresas desfrutam menos o benefício fiscal32. Não há per
versidadeout , maquiavélica, ou discriminaçãoadhoc (embora
a corrupção também funcione, não alterando, entretanto, sig
nificativamente, os dados da questão); a perversidade é m,
disso, os pequenos
necessária ao sistema
capitais
estruturante
têm uma dos
enorme
fundos
defasagem
públicos.técnica
Além
e financeira - referente à concentração e à centralização de
capitais - com respeito aos grandes capitais. Isto, em presença
de um sistema de custo de oportunidade igual a zero, leva
necessariamente à escolha de métodos capital-intensivos, des
locando ainda mais a capacidade de competição dos pequenos
e médios capitais. Mas o sistema não tende, nunca, para uma
concentração absoluta, uma espécie de tendência assintótica
inexorável. Como acontece, âdemais, em todo o sistema capi
talista, a própria concentração de capitais freqüentemente ba
rateia o capital constante, dando lugar a toda uma trama onde
têm lugar os pequenos e médios capitais.
10 8
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
realmente
sa pagaria arrecadado
(na base dee calculando-se
uma alíquota osobre
ICM que cada empre
o faturamento),
chega-se à conclusão de que as referidas dez maiores empresas
de cada Estadoseriam responsáveis por 40% da arrecadação
de ICM na Bahia, até o máximo de 86% no Piauí, sendo que,
na média regional, as dez maiores empresasseriam responsá-
1979. (Thèse
nagement du pour le Doctorat
Territoire en Economie
- Université Publique,
de Paris). Planification et do
Idem. “Industrialização Ame-
Nordeste - Intenções e resultados”,m: Seminário Internacional sobre Dis
paridade Regional, Recife, 1981 - Anais, Recife, Fórum Nordeste/Sudeste,
1982, p. 292-301.
110
A MET AMOR FOSE DA ARRIBAÇA
111
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
próprios
criação dafatores determinantes
Sudene, da regionalização.
a regionalização do Nordeste éAnão
partir da
apenas
reconhecida, mas, sobretudo, tornada a substância de uma es
tratégia visando sua anulação. Não sem antes proceder-se, tal
vez, à última am pliação da região, fincada desta vez no
parâmetro do subdesenvolvimento em relação ao Sul/Sudeste:
incorporam-se o Maranhão e a Bahia e, para efeitos fiscais, o
Nordeste de Minas.
A partir da efetiva entrada em funcionamento dos me
canismos
plantação fiscais-financeiros
dos projetos das sob a égide
grandes da Sudene,
empresas e da im
estatais, no
período que vai de 1959 a 1985, e, para efeitos deste artigo,
de 1970 a 1985, os programas de desenvolvimento regional
baseados nos mecanismos e nos projetos já assinalados an
teriormente estão produzindo resultados que redefinem a
“questão nordestina” .
Em primeiro lugar, pela força dos processos analisados, e
sobretudo pela sua ligação aos processos de acumulação de
capital em do
à do resto escala nacional,
Brasil. o Nordeste
A tal ponto que, a integrou
rigor, nãosua
se economia
pode falar
em “economia do Nordeste”, mas numa divisão regional do
trabalho no Brasil com atividades regionalmente localizadas.
As taxas de desenvolvimento nordestino não dependem da
taxa de acumulação (ou de poupança e investimento) do Nor
deste; se assim fosse, o ritmo e os níveis da expansão econômica
alcançados teriam sido inviáveis. O rompimento da inércia e
do ensimesmamento regional já foram suficientemente descri
tos e analisados.
cipação de capitaisA de
constituição doso novos
fora da área, interesses,
deslocamento a parti
radical de
ancilares interesses fincados no complexo latifúndio-minifún-
dio, são parte e sujeitos desses processos.
Tudo isso se resume no resultado de que a política de de
senvolvimento regional levou à desregionalização da econo
11 2
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
industriaisburguesias
algumas aliando-semetamorfosearem-se
a outros poderosos grupos
em empreendedores
estatais e bur
gueses extra-regionais, indicam um movimento centrífugo no
sentido de desfazer a relativa homogeneidade e a unanimidade
em que se reconheciam “ nordestinos” .
Tal é o caso mais flagrante da Bahia, onde antigos e pode
rosos grupos financeiros deram o passo no sentido de se trans
formarem em empresários, como o grupo do antigo Banco da
Bahia (os Mariani Bittencourt) e o grupo do Banco Econômico
(Calmon de Sá). Ao lado deles e capitaneada por eles, uma
nova safra de empresários, articulados basicamente no Pólo
Petroquímico de Camaçari, joga sua estratégia com o olho
voltado para a Petroquisa, enlaçando-se através da holding
Norquisa, por exemplo, com os mais variados capitais, inclu
sive estrangeiros, e projetando-se para além de seus ramos de
negócios tradicionais. Daí surgiram grupos co mo o Odebrecht
- hoje entre os maiores da construção civil pesada em termos
nacionais-, com estratégia de dominação para além da simples
extração do excedente: este grupo possui uma fundação, que
financia estudos, monografias sobre o próprio Nordeste, dis
tribui prêmios culturais, entra em relação com os grupos ne
gros; o grupo Paes Mendonça, nos supermercados, é também
um grupo baiano de projeção nacional. Em suma, estes grupos
destacam-se nitidamente do empresariado de outros Estados,
114
A METAMORFOSE DA ARRIBAÇA
geneidade dos
gravitação regional manifesta-se
interesses aí das
em torno no sentido
estatais,da forte com
fazendo
que reivindicações “nordestinas” passem, no limite, a segundo
plano se colidirem com as articulações e demandas junto às
estatais. Mas também revelam a fraqueza desses Estados, cujas
burguesias não têm o porte sequer para aliarem-se com as
empresas estatais e seus sócios nacionais e estrangeiros.
Há um movimento em sentido contrário ao da desregio-
nalização da economia, um movimento centrípeto que é, dia-
leticamente, o fautor da desregionalização. Trata-se do “ capital
115
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
deste, obscurece
expansão, as diferenças
as clivagens entre ose Estados,
de interesses os ritmos
de classes, de
buscando
manter os referidos mecanismos fiscais-financeiros. E certo
que os empreendimentos estatais escapam, pela fonte de seus
recursos e pela amplitude de suas articulações, a essas deter
minações, mas no interior das alianças ou do magma argamas-
sado pelos empreendimentos estatais, os mecanismos
fiscais-financeiros continuam a valer para os processos parti
culares de empresas e grupos. No interior e como resultado
desses processos, a “ questão nordestina” se recoloca e se refaz,
em primeiro lugar, do ponto de vista daquela reificação. E
especificamente, por algumas peculiaridades a mais. A primei
ra delas é que persiste, como marca registrada do Nordeste,
uma questão agrária irresoluta. Os dados já apresentados mos
tram uma acentuada perda de poder econômico dos grupos
latifundiários, na queda da participação das atividades agro
pecuárias na formação do produto regional. Mas uma grande
parcela da população e da força de trabalho continua amarrada
às atividades rurais, o que distingue o Nordeste, notavelmente,
de outras regiões brasileiras.
Em segundo lugar, o Nordeste se diferencia também sen
sivelmente das outras regiões pelas características de seu mer
cado de força de trabalho, composição da população ocupada,
níveis de renda e de salários, existência de um marcante exér
1 16
A METAMORFOSE DA ARRIBAÇA
uma concentração
sileira, o que não édasurpreendente,
renda ainda mais
se sedesigual
levam do
os que a bra
dados em
consideração.
Do ponto de vista do mercado de trabalho, a expansão
recente também integrou o Nordeste ao padrão dominante no
Centro-Sul, pois os empregados já são (1985) mais de metade
da população ocupada, enquanto os trabalhadores por conta
própria perfazem apenas um terço, invertendo as proporções
prevalecentes no início dos anos 7 038*. Mas os empregados
urbanos saltaram apenas de 65% em 19 70 para 69% em 19853í>
(apesar de a população ocupada de base urbana como um todo
ter crescido
te, de relação
à elevada 37% para 53% do total), dos
capital-trabalho devido, provavelmen
capitais altamente
concentrados que passaram a operar na região, implicando
um pequeno aumento líquido do emprego; e, em segundo
lugar e principalmente, devido à escassa mudança nas formas
técnicas da produção no campo, apesar da expansão do assa-
lariamento na agricultura.
A estrutura de salários reflete esses processos: em 19 85,
85% da média dos empregados ganhavam menos do que
três salários mínimos e 52 %, até um salário mínimo. Parece
haver uma acentuada relação entre esses níveis salariais e a
formalização das relações de trabalho, pois os trabalhadores
sem carteira assinada representavam 60% do total de em
pregados em 1985, e nestes apenas 24% ganhavam acima
de um salário mínimo40.
117
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
11 8
A METAMORFOSE DA ARRIBAÇA
largamentee insuficiente,
ferências das velhas baralhou as cartas
estratégias. das velhas
Para todos re
os lados,
para todas as classes. A novidade agora é que a “questão
nordestina” é a de níveis de miséria produzidos pela pró
pria expansão econômica. Bela e feia novidade.
A rápida expansão econômica destruiu todos os mitos e
todas as saídas fáceis, muitas das quais repousaram, na maior
parte dos casos, sobre a própria tragédia dos que migravam,
ao custo de poderosos processos de desenraizamento, perdas
pessoais, angústia da grande cidade, discriminação antibaiana,
guetos nordestinos. Um rico processo social deu a volta por
119
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
destina
forçar ostocou paraotodos,
termos, novo éexecutantes,
a “ questão maestro,
brasileira”ouvintes.
. Sem
120
Crise e concentração
Quem é quem na indústria paulista
Apresentação
este texto
bertas procura que
empíricas tornar públicas de
aparecem algumas
formadas idéias e em
minuciosa desco-
um
relatório de pesquisa elaborado pela equipe1. Além de bastante
sintético, o artigo tenta também aliviar o leitor, sempre que
possível, dos transtornos comuns à maioria dos relatórios, em
geral maçantes pelo jargão característico e pela profusão de
tabelas e dados. *1
121
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
1 22
CRISE E CONCENTRAÇÃO
A concentração em processo
127
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
Gráfico 1
Dez maiores empresas como proporção total da amostra (%)
Gráfico 2
Cem maiores empresas como proporção total da amostra (%)
128
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
nos serviços
básico industriais
e transportes. de telefonia,
Aparecem eletricidade,
também algumas saneamento
empresas es
tatais ligadas diretamente à indústria, como Ultrafértil, Ma-
fersa (privatizadas no governo Collor) e Embraer.
Esta seção das 100 maiores da pirâmide industrial revela
muito a respeito da hierarquia dos capitais na indústria brasi
leira. Nela encontramos 43 empresas nacionais privadas (33
de São Paulo e 10 de outros Estados da federação), 39 empresas
multinacionais e 15 empresas públicas* 7. Por fim, existem 4
empresas que designamos como sendo de controle comparti
lhado, isto é, cujo controle acionário é exercido por dois ou
mais sócios (sempre de elevada estatura econômica) de forma
conjunta. Estas empresas não são nem públicas nem privadas,
nacionais ou estrangeiras, mas resultam da confluência destas
forças naquilo que Peter Evans chamou de tríplice alianças.
Mais do que isto, é possível constatar uma certa divisão
de funções no interior da estrutura produtiva. As empresas
estatais certamente predominam nos setores de serviços pú
7 Sobre estas convém frisar que ocupam o topo da pirâmide: das 10 maiores,
7 são públicas, em geral ligadas aos serviços públicos,
K Evans, Peter.A tríplice aliança (As multinacionais, as estatais e o capital
nacional no desenvolvimento dependente brasileiro). 2a ed. Rio de Janeiro:
Zahar Editores, 1982.
13 0
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
Esta topografia
econômico complexa,
concentrado que mapeia
juntamente com asa latitudes
altitude do
dapoder
estru
tura industrial, se completa com uma análise mais detida no
plano setorial. Para não sobrecarregar o leitor com cifras e
nomes, nos limitaremos a alguns setores-chave, sem reproduzir
a análise mais detalhada já realizada (RFP 72) para os 56 setores
da Quem é quem.
Seguindo a tradição dos estudos de OI, calculamos a evo
lução ao longo da década de 1980 da participação no total do
faturamento
tores. dos 4mostra
Este índice maiores integrantes
que não só a de cada um destes
concentração se
nos mer
cados é espantosamente alta, mas que ela cresce vertigino
samente ao longo do período.
Apenas para se ter uma idéia, em 19 80, 40 setores apre
sentavam mais de 50% de seu faturamento concentrado em
suas quatro maiores empresas (RFP 118 / 119 ). Esses dados tor
nam-se mais expressivos quando se verifica que, para esse mes
mo ano, em 19 setores as 4 maiores empresas abocanhavam
mais de 80% do faturamento e, em 15, mais de 90%! Em
1989, esses números aumentam sensivelmente em relação a
19 80, com 44 setores acima dos 50 % , 24 acima dos 80% e 18
acima dos 90%.
Nos estratos superiores do tecido industrial, isto é, nos
oligopólios concentrados de bens de consumo durável, bens
de capital e bens intermediários, a imagem de uma economia
de muito poucos concorrentes aparece nitidamente. Em certos
segmentos, a ampliação da concentração é insignificante, pos
to que o ponto de partida já estava, em 1980, colocado em
níveis extremamente elevados. Os melhores exemplos provêm
do segmento de material de transporte (veículos automotores,
construção naval, material ferroviário e aviões), ápice da evo
lução do complexo metalmecânico, todos oscilando entre 90%
13 2
CRISE E CONCENTRAÇÃO
se
rosos),
mantém
ou mesmo
ou até sofre
80%, alguma
são comuns.
ampliação.
Nestes, ou bem o nível
A estes se poderiam agregar os “ monopólios institucio
nais” representados pelas empresas estatais em setores indus
triais básicos: siderurgia (concentração em torno de 65% , com
tendência de alta), refino de petróleo (80%, em alta) e gás
natural (cerca de 95%, estável). Juntamente com os “mono
pólios naturais”, nos serviços públicos, todos com concentra
ção próxima de 100%, compõem o segmento público do
grande capital oligopolizado da indústria brasileira.
Os dados destes setores refletem, para o conjunto, uma
relativa estabilidade da concentração. No entanto, outros oli
gopólios mostram que houve, setorialmente, uma ampliação
considerável do poder de poucas empresas sobre importantes
mercados. Talvez o exemplo mais impressionante seja do setor
de produtos farmacêuticos, medicinais e veterinários, onde em
1980 as 4 maiores empresas detiveram 32,36% do faturamen
to e, em 1989, aumentaram esta participação para 63,53%.
A especificidade brasileira, de um desenvolvimento fecha
do, dominado por um punhado de grandes conglomerados,
se evidencia também em outros setores, fora do circuito pri
vilegiado dos oligopólios diferenciados, voltados para o con
sumo durável, ou dos oligopólios homogêneos, de bens
intermediários, nos quais a concentração crescente é uma regra
geral. Mesmo em setores tradicionais, ligados à agricultura,
não necessariamente intensivos em tecnologia e/ou escala, a
133
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
134
CRISE E CONCENTRAÇÃO
135
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OS DIREITOS DO ANTIVALOR
Tabela 1
Participação dos principais grupos na produção de bens de consu
mo selecionados, Brasil, 1993, (%)
“ OsPor
50 ora,
maiores grupos econômicos”
gostaríamos .
apenas de frisar o seguinte: a intensa
concentração econômica verificada no âmbito das variáveis
138
CRISE E CONCENTRAÇÃO
13 9
CRISE E CONCENTRAÇÃO
14 1
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
capital é norte-americana,
patrimônio líquido ao longo denota-se o declínio
nove anos. de 45,4%
Em termos no
de par
ticipação percentual no total da amostra, nota-se também uma
diminuição em todos os indicadores. No caso das empresas
alemãs (na época, pertencentes à República Federal da Alema
nha), nota-se uma razoável estabilidade da participação em
todos os indicadores, em torno de 20% do total do capital
internacional, embora elas sejam apenas cerca de 15 % do nú
mero de empresas deste tipo.
Em resumo, pode-se afirmar que, durante a década de
1980, ocorreu na economia sediada em São Paulo uma ascen
são da participação do capital japonês e um declínio da parti
cipação do capital norte-americano, mantendo-se o capital
alemão num honroso segundo posto. Em outras palavras, a
economia paulista e, por extensão, a brasileira, dados seus
elevados níveis de integração produtiva com as principais po
tências capitalistas16, refletem, a seu modo, as mudanças na
correlação de forças que ocorrem no âmbito mundial.
14 2
CRISE E CONCENTRAÇÃO
ricaEanálise.
possívelMencionaremos
perceber uma razoável
alguns traços
permanência
essenciais.
do padrão
de distribuição do capital segundo sua srcem entre os gêneros
industriais.
No caso das empresas estatais, como era de se esperar, sua
atuação se dá basicamente nos serviços públicos, onde seu pre-
domínio é quase absoluto17.
Para o capital estrangeiro, temos um padrão de especiali
zação bastante definido, como também seria de se esperar, e
que se mantém praticamente inalterado em todo o período.
o Brasil (32% ) só perde para a Venezuela (35 ,9% ) entre os 8 principais países
latino-americanos. Confrontado com outros 7 países em desenvolvimento
da Ásia, o Brasil só perde pa ra Cin gapura (6 2,9%) e Malás ia (44%). A Coréia,
tida e havida como modelo de desenvolvimento aberto, possuía apenas
19,3% de sua produção controlada por empresas estrangeiras.
17 Há que se observar, no entanto, que este padrão extremamente especia
lizado de atuação não existia em 1980. Ele foi sendo gestado ao longo da
década mediante a redução da participação propriamente industrial do setor
público. Em 1980, as estatais, refletindo a estratégia de desenvolvimento do
II Plano Nacional de Desenvolvimento, obtinham quase 40% de suas receitas
nos gêneros de química e metalúrgica, em proporções iguais entre os dois.
Em 1985, o patamar em cada um dos 2 ramos cai para menos de 15%, e
para menos de 10 % em 19 89 . Há que acrescentar que, a partir do governo
Collor (1990), este padrão de especialização se acentua, com a privatização
de segmentos quase inteiros do setor público, na siderurgia, petroquímica e
fertilizantes, entre outros. Dado que a pesquisa sc encerra em 1989, este
assunto está além dos limites deste trabalho. N o entanto, pode-se acrescentar,
de passagem, que o processo de privatização, do modo como está sendo
executado, está ensejando a formação de poderosos oligopólios privados nas
áreas críticas de insumos intermediários. Um estudo mais detalhado sobre
isto é necessário para que a sociedade brasileira possa, no mínimo, repensar
o modelo de desestatização, agora que ele ameaça avançar para segmentos
ainda mais sensíveis da economia, como telecomunicações e energia. Para
uma sinopse do Programa Nacio nal de Desestatização, ver IESP,
Indicadores
n. 26, março de 1994, p. 8-10.
14 3
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
pequenas incursões
de construção civil), em
que,São
no Paulo (com
entanto, nãodestaque para o setor
alteram essencial
mente a fraca posição destes capitais no pólo mais dinâmico
da economia brasileira.
De forma bastante sintética, foi possível constatar na pes
quisa algumas mudanças nas relações de força e no padrão de
ocupação de espaços econômicos na economia sediada em São
Paulo. A predominância dos capitais locais se manteve, tendo
inclusive se ampliado em alguns setores antes dominados pelo
capital estrangeiro. Este, ainda que cedendo terreno em alguns
ramos, permanece soberano em vários dos principais mercados
oligopolizados da economia: a economia interna espelha um
padrão altamente concentrado de controle econômico que se
formou e se reproduz continuamente no âmbito do capitalismo
global. Espelha também as alterações entre capitalismos na
cionais que ocorrem neste âmbito, a saber, a ascensão do ca
pital japonês.
144
CRISE E CONCENTRAÇÃO
financeiro, disperso
malmente de penetração de mercado,
entre diversas tecnológico
empresas etc. - forin
juridicamente
dependentes.
No curso da pesquisa, procuramos agregar as empresas
da amostra nestas unidades mais amplas, procurando enxer
gar não mais o movimento das partes, mas sim do conjunto.
Numa tentativa prel iminar, criamos vários grupos p ela agre
gação simples de empresas a eles pertencentes (maioria do
controle acionário), isolamos os 50 maiores dentre eles e
comparamos suaperformance com o restante da amostra20.
Seguem-se algumas das principais conclusões daí derivadas,
tendo como
até aqui foco as variáveis
(patrimônio com as quaislucro
líquido, faturamento, vimos operando
líquido),
acrescidas do indicador número de empregados, para os 50
maiores grupos, discriminados tão-somente segundo sua
srcem de capital.
Um primeiro nível de análise, ainda sem individualizar os
grupos, diz respeito à relação entre os maiores grupos listados
e o conjunto da amostra. Ela nos dá uma outra radiografia do
grau de concentração da economia sediada em São Paulo.
Pode-se observar que o patrimônio líquido dos maiores grupos
como percentagem do total da amostra passa de 63,5% em
247
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
pouco
mento mais de 130%
e quase 5% dodo emprego.
patrimônioEm
líquido,
1989,2 2
a ,1% do fatura se
desproporção
acentua figeiramente, com o patrimônio líquido subindo um pou
co e o percentual do emprego atingindo praticamente o patamar
de um terço22. Estas cifras, por oposição àquelas dos maiores
grupos, indicam claramente um padrão de organização da pro
dução intensivo em mão-de-obra e de baixa capitalização.
Outro aspecto importante quanto ao papel ocupado por
esta miríade de empresas de menor porte diz respeito à parcela
dos lucros por elas obtida em relação aos grupos. Calculando
a proporção dos lucros desta empresas no conjunto dos maio
res grupos, percebe-se que esta relação, que era de 25% em
1980, passa para cerca de 20% em 1989. Ou seja, um dos
efeitos da crise econômica foi o de deslocar parcelas expres
14 8
CRISE E CONCENTRAÇÃO
não é a de
em novas uma simples
unidades. multiplicação
Os grupos da empresadeindividual
são a centralização entidades
já caracterizadas pelo grande porte, pela penetração em setores
mais oligopolizados e pelo poder financeiro; não são a soma
de quaisquer empresas. Neste sentido, o deslocamento de lu
cros das empresas individuais para os grupos é mais uma di
mensão da concentração de excedente nos estratos superiores
da hierarquia empresarial.
Segundo, os grupos econômicos representam mais do que
agregação de unidades entre si homogêneas. Ao combinar fra
ções diferentes do capital - comercial, produtivo e financeiro
-centrar
passam a se movimentar
recursos líquidos de por uma
várias lógica diferente.
unidades Aoem
diferentes, con
se
tores diversos, asholdings que controlam os grupos passam a
desempenhar funções financeiras que estão muito além das
possibilidades econômicas dos empreendimentos isolados; os
grupos podem assim se dirigir ao mercado financeiro de modo
privilegiado e compor uma equação capital produtivo/capital-
dinheiro muito mais eficaz. Dado o peso da acumulação fi
nanceira no conjunto da reprodução do capital que carac
terizou os anos 80, isto faz toda a diferença.
Ademais, os grupos econômicos, em muitos casos, são eles
149
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
da seguinte
paulistas. Há forma: 2 são que
que ressaltar estatais, 10 são
os grupos estrangeiros
brasileiros e 15
não figu
ram neste rol seleto, o que sugere, por um novo ângulo, a
pequena integração dos grupos de outros Estados à economia
paulista23. Convém mencionar cada um destes grupos.
Comecemos pelos grupos não-privados. Sob o comando
do Executivo federal encontram-se 3 grandes estatais: Petro-
brás, Siderbrás e Telebrás, elas próprias 3 grandes holdings ,
que, neste sentido, poderiam, numa análise mais detida, ser
enfocadas como 3 grupos independentes, devido à relativa
autonomia operacional e financeira de que dispõem. A pre
sença destas empresas gigantes indica o peso do setor público
estatal nas atividades de apoio industrial (energia e telecomu
nicações) e na indústria de base (siderurgia) no Estado mais
industrializado do país.
O outro grupo do setor público é o Estado de São Paulo,
que aparece em todos os anos como o primeiro do ranking.
Sua participação no patrimônio líquido do conjunto dos 50
grupos não é nunca inferior a 20%. Isto significa, efetuando
IS O
CRISE E CONCENTRAÇÃO
trobrás
presas (CESI? CPFL e do
de transportes Eletropaulo),
país (Cia. algumas das maiores
do Metropolitano de em
São
Paulo e Fepasa) e outros serviços públicos (Sabesp e Comgás).
A composição setorial do grupo explica seu peso na economia
sediada em São Paulo: reproduz no plano estadual a comple
mentaridade entre indústria e serviços industriais; e as con
centrações regionais de ambos se condicionam mutuamente.
O peso das empresas do governo paulista no faturamento
e no número de empregados, por outro lado, não atinge nunca
o patamar de 7% do total dos 50 grupos em ambos os indica
dores. Para completar o quadro, resta dizer que o setor pro
dutivo
ilustrampaulista
o papelédeste
deficitário em todos
segmento os público
do setor anos. Estas
para acifras
acu
mulação industrial no Estado: alta intensidade de capital (tanto
em relação ao fator trabalho quanto ao produto) e rentabili
dade negativa. A primeira característica se explica pela con
centração em setores onde prevalecem grandes aportes de
capital e longos prazos de maturação do investimento. A pés
sima rentabilidade, para além das questões vinculadas à efi
ciência operacional, está fortemente associada às injunções da
política econômica e à eterna “vocação” do setor público de
subsidiar o setor privado, sobretudo pela contenção de pre-
ços/tarifas.
Em resumo, percebe-se uma peculiar inserção do capital
público na economia paulista. Em seu estrato superior, figura
uma holding pública que, em seu conjunto, transfere recursos
para o resto da economia; somada às três holdings federais
acima mencionadas (no conjunto lucrativas, mas numa pro
porção irrisória para seu patrimônio e faturamento) compõe
um quadro que diz muito a respeito da importância e da fun
cionalidade do capital público no capitalismo brasileiro. Quase
sempre impedidas de exercer seu poder oligopóhco (ou mo-
15 1
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
grupo americano
dado. Vale entre que
mencionar o subconjunto
em alguns de 29 figuram
anos grupos6 ora estu
grupos
dos EUA28. Ainda mais curiosa é a quase completa ausência de
grupos japoneses. O único a aparecer, e apenas em 1989, é o
Fuji Bank Ltd., braço brasileiro de um dos maiores conglome
rados japoneses.
24 A respeito
empresas das ver
estatais contradições queEmpresa
Dain, Sulamis. envolvem a acumulação
estatal de capital
e capitalismo contem-das
porâneo. Tese de doutoramento. Campinas, Unicamp, 1980. Sobre a vincu-
lação entre dívida externa e desajuste das empresas estatais, ver Cruz, Paulo
Davidoff. Dívida externa e política econômica (A experiência brasileira nos
anos setenta).São Paulo, Brasiliense, 1984, especialmente p. 173-4.
25 A saber, Daimler Benz, Hoechst c Siemens.
2(l Respectivamente, Saint Gobain, Pirelli, Nestlé, Alcan e Solvay. Aparece
também o grupo Uniiever, que resulta de uma associação entre o capital
inglês e o holandês.
17Trata-se do grupo Bunge y Born (mais conhecido pelo nome de Santista),
de nacionalidade argentina, há muito tempo instalado no Brasil e atuando
nos setores de alimentos e têxtil.
28A saber, D ow Química, C argill, Caterpillar, C hampio n Inth, Ford e General
Mo tors. Esta última, maior “ empresa” do mundo, saiu da amostra em 19 89 .
Motivo: deixou de ser uma empresa de capital aberto e parou de divulgar
seus dados contábeis.
15 2
CRISE E CONCENTRAÇÃO
Severino
na Pereira (com
agroindústria da Silva. Há outrospara
diversificação comosforte participação
setores de bens
de capital conexos ou não), como Cutrale, Dedini, Biagi e
Ometto. Completam a lista uma grande construtora, a Camar
go Corrêa, e um grande conglomerado financeiro, o Grupo
Itaú.
Estes grupos, atuando nos mais diversos setores da econo
mia - com destaque para os conglomerados altamente diver
sificados: Votorantim, o maior grupo privado nacional, e
Matarazzo, que já ocupou este posto no passado29 repre
sentam metade do núcleo duro de grupos da economia paulista
e espelham a pujança do capital local, em contraste com a
parca penetração do capital de outros Estados, e mantendo
uma posição de liderança mesmo frente aos enormes grupos
estrangeiros citados que, em boa medida, permanecem encas
telados nos oligopólios que dominam no plano mundial.
153
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
objeto eaqui
ceira) são as relações
apropriação (privadadeoupropriedade (acionária
estatal, individual e finan
ou grupai)
que, variantes ao longo do tempo e variáveis segundo os di
versos contextos nacionais, regulam, constrangem, possibili
tam o desenvolvimento daquela divisão técnica do trabalho
acima referida. A montagem de ramos da produção (petróleo,
automóveis, petroquímica) é simultaneamente a construção
de agentes econômicos e sociais (grupo estatal, grupo multi
nacional), tripé que os tornam possíveis30.
1 54
CRISE E CONCENTRAÇÃO
155
A quase-hegemonia*
1 59
A QUASE-HEGEMONIA
são eles.
O PF L impede FH C de real izar seu projeto?
é tentando
nos preparaque se constrói,
surpresas todoseosa dias.
história
O é aberta,
projeto felizmente
hegemônico
pode ser desafiado em terrenos circunscritos, derrotado em
eleições para prefeituras e até Estados. O grupo que ganha
trata de destruir os recursos políticos do outro. E o que Fer-
nando Henrique está fazendo. Ele vai salgar a terra para que
nenhum grupo alternativo tenha chance tão cedo.
Como?
161
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
Existe alguém boje que expresse tão bem esse projeto hegemônico
quanto E H C f
conjunto de classes
essencialmente pelas criar uma liderança
qualidades de FHC,desse porte. Não
mas porque um
longo processo foi forjado e FHC saltou à cabeça dele no
momento certo. Além disso, ele faz o trabalho cotidiano da
aranha, tecendo articulações e destruindo outras. Não é à
toa que a presidência do Senado é do PFL, e a da Câmara,
do PMDB. Isso ajuda porque demarca terrenos, corta am
bições, circunscreve capacidades. E um método político de
mestre.
162
III PARTE
SUAVE É O TERROR
cial por
tes e ambiência social
si mesmas, conservadora.
para economizar As
umaprimeiras são evidenno
longa descrição:
campo social, a depredação do Estado, em conjunção com
uma crise que se arrasta, com oscilações, desde o começo dos
oitenta, produziu uma devastação nos principais serviços pú
blicos que se expressa nos indicadores sociais. O já precário
Estado do bem-estar nacional foi atingido em cheio: as refor
mas do “caçador de marajás” terminaram por dar-lhe o golpe
de misericórdia. A incapacidade do Estado de exercer o con
trole, ainda que mínimo, da situação social, se necessitasse de
maior explicitação, encontra, no recurso - uma “última ins
bate ao ànarcotráfico
tância” la Marx - da utilização
dos das Forças
morros cariocas, suaArmadas
definitivanoe com
cabal
demonstração.
Não é que, no percurso, vários recursos não fossem utili
zados e experimentados para melhorar a assistência social es
tatal. Reformas descentralizadoras, como a do Sistema
Unificado de Saúde, foram tentadas: de novo, em “última ins
tância” , a descentralização não funcionou porque a diíapida-
165
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
“viram”públicos
pitais em meia dúzia de empregos
depredados, cenas d epara sobreviver,
“ pátio hos ,
dos milagres”
onde são os parentes dos pacientes que literalmente tentam
ajudar a precária estrutura a funcionar, filas de doentes cujos
semblantes nada ficam a dever aos dos milhares que acorrem
aos milagres do Padre Cícero: mas eles não estão no Nor
deste, senão que nos corredores do Hospital de Clínicas da
USI? do Hospital Universitário da USP e do Hospital-Escola
da Paulista de Medicina, os de caráter público que, em São
Paulo, ainda resistem ao naufrágio geral; nos demais, não
faltam apenas médicos: o simples esparadrapo já é artigo de
boutique. Os hospitais privados são boutiques mesmo : ali a
sofisticação atinge as raias do impensável, para aplicar as
pirinas e “ asp ira r” os recursos es tatais,
Weberianamente, o Estado perdeu o monopólio exclusivo
da violência; marxisticamente, o Estado foi privatizado numa
escala impensável em qualquer país radicalmente liberal. Essa
tendência já vinha desde o autoritarismo, mas, perversamente,
o Estado democrático a agravou. Depois de Sarney, que pra
166
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
transformou-se
sintomático: na bíblia
a bíblia, dos empresários,
composta ou o mais
que
é retirada
por privatização, do
Estado da economia, desregulamentação de alto a baixo, ata
que aos direitos sociais e humanos, desregulamentação do mer-
QUEM TEM MEDO DA GOVERNABILIDADE?
passou ea do
guesia sercandidato.
o livro comum, transcendental, da grande bur
Tudo isto não se passa apenas num plano simbólico, de
discursos, planos e apoios ostensivos; ainda se fosse pouco, o
episódio num clube paulista em que empresários promoviam
um evento para “alavancar” a candidatura Fernando Henrique
Cardoso revelaria o processo por inteiro: ali distribuiu-se uma
“ficha de inscrição” no PT, quando Luiz Ignácio Lula da Silva
ainda pairava em altas estratosferas nas pesquisas, que resumia
todo o ódio de classe contra largas parcelas das classes domi
nadas que haviam criado um movimento político que há mais
de uma década
ticos-garrafa, queacuava a grande
se amoldam burguesia
a cada e os partidos
governante polí-
de plantão.
As condições para pedir inscrição no PT eram: ser nordestino,
analfabeto, preto, mulher, prostituta, homossexual, catador
de lixo etc. Isto é, os estigmas da própria discriminação de
classe, de cor, de etnia, de preferência sexual, que habitam o
inconsciente coletivo da sociedade, manejados pela própria
classe dominante! O partido do presidente apenas declarou
que não era responsável pela “ficha”, sem condená-la; tam
pouco se ouviu ou se leu nenhuma declaração da intelectuali
dade tucana, incluindo-se aí o próprio candidato, contra
semelhante
Os sinaisatentado à democracia.
da intolerância da grande burguesia contra or
ganizações sociais do assalariado, e mais especificamente de
certas categorias operárias, já não se dão a público travestidos
em apelos à cooperação; agora, eles ganharam em desinibição
e hostilidade agressiva. O presidente da GM, em entrevista
recente àFolha de S. Paulo , declarou em alto e bom som que
a empresa pensava em localizar a terceira fábrica fora do eixo
sob influência dos sindicatos, e em seguida ameaçou o governo
quando este baixou a alíquota de importação de automóveis,
1 75
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
176
QUEM TEM MEDO DA GOVERNABILIDADE?
intelectuais-empresários-altos executivos
emblema por excelência) produzidos (Bresser
pelas Pereira
grandes é seu
transfor
mações do regime autoritário. Em poucas palavras, embora
contradições existam, Fernando Henrique Cardoso e seu
PSDB não são “estranhos no ninho” das grandes corporações.
Mais rigorosamente , a tecnoburocracia qu e o próprio Bresser
Pereira teorizou no primeiro período de sua produção acadê
mica (nas pistas do John Kenneth Galbraith, de Onovo Estado
industrial ), essas novas classes médias são estruturais no capi
talismo contemporâneo, e por isso são herdeiras diretas das
transformações econômicas e na estrutura social promovidas
pelo autoritarismo8. Por essas razões, o projeto conduzido por
FHC é duradouro: não se está em presença de um estouro
riormente
Vieira fogeligado
um pouco
ao grupo
ao figurino:
Unibancoeste
e hoje
é banqueiro
ele mesmo
mesmo,
banqueiro;
e ao que
Andrade
se saiba,
não perpetrou, até agora, nenhuma obra intelectual; Paulo Renato Souza
converteu-se de especialista em emprego a reitor da Unicamp, passando pelo
secretariado de Montoro até encaixar-se na gerência geral de operações do
BID, o segundo cargo mais importante na estrutura de decisões do Banco,
tradicionalmente ocupada por um brasileiro desde os tempos de Ewaldo
Correia Lima; Dorothéa Werneck, economista dos quadros do IPEA que,
depois de passagem pelo Ministério do Trabalho de Sarney e Secretaria de
Política Econômica de Collor (onde, aliás, teve profícua atuação), transitou
também pela iniciativa privada no ramo da consultoria; Clóvis Carvalho,
egresso do grupo Villares. Em oito sobre quinze ministros civis revelam-se
177
*
QUEM TEM MEDO DA GOVERNABILIDADE?
dos Frente,
capitaispois,
que aos processos de
a globalização concentração
expressa, e centralização
o Estado nacional no
Brasil e na América Latina em geral perdeu a capacidade de
arbitrar o conflito interburguês. O neoliberalismo aparece
pois, não como uma exigência frente ao intervencionismo
estatal, que não permite o funcionamento dos mercados: o
neoliberalismo é, antes, a confissão da impotência do Estado
burguês frente a esses processos. E a dolarização direta, via
conversibilidade, ou disfarçada, via âncora cambial, é sim
plesmente a confissão de que o Estado nacional da periferia
do capitalismo não tem mais a capacidade de possu ir moeda.
Nos termos de Aglietta e Orléans, que redefinem Weber, o
Estado nacional não tem mais o monopólio exclusivo da
violência, já que a moeda é o conversor público de todas
violências privadas18.
No caso brasileiro, onde um grande setor estatal produtivo
tomou a própria forma do Estado, substituiu o Estado ou re
presenta o Estado, com empresas do porte da Petrobrás ou da
Vale do Rio Doce, com a privatização que se processa, quem
representará o Estado ali, em Carajás, no complexo mineiro-
ferroviário-portuário entre Minas e Espírito Santo, no orde
namento do conflito entre indígenas e companhias de
mineração? A moeda brasileira, que deixará de existir? As so
ciedades que estão se entregando tão totalmente, tão estupi
damente e tão ilusoriamente a essa utopia perversa, já estão
pagando caro: transformaram-se em bazares persas comanda
dos por máfias como nem a Itália, seu berço, nem os EUA da
década de trinta, sua “modernizadora” , conheceram. Tal ilusãoIS
195
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
196
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
“setor
o “setorinformal”,
informal”não nega
é uma o caráter
“forma” capitalista:
específica ao contrário,
das próprias con
tradições da acumulação de capital, particularmente da simul
tânea e contraditória concentração de renda e liquidação das
formas arcaicas de emprego, renda e acesso ao consumo de
mercadorias. E mais: o processo em curso da flexibilização das
relações de trabalho tende a reduzir o espaço e o tamanho das
relações formalizadas, inaugurando o que pode vir a ser a for
ma específica do “setor informal” no capitalismo global.
A ampliação da dominação de classe do ponto de vista da
acumulação de capital e da divisão social do trabalho implicou
na fundação de classes sociais nacionais. Isto é, do antigo ar
quipélago de dominações regionais, o processo da expansão
integrou as diversas regiões, não apenas a uma dinâmica de
conjunto, mas o que é mais importante, a propriedade do ca
pital concentrou-se sob o comando dos mesmos proprietários.
E a isto que corresponde a expansão das empresas nacionais
e internacionais desde o núcleo dinâmico do Sudeste, e parti
cularmente de São Paulo, para o Nordeste e o Norte, através
dos incentivos fiscais, para o Oeste, através de mecanismos
mistos de mercado e incentivos fiscais (implícitos na política
de juros para a agricultura e a pecuária), e mesmo para regiões
como o Sul, que se caracterizava pela existência de sólidas
empresas regionais. Em suma, há uma burguesia, hoje nacio
198
ALÉM DA HEGEMONIA, AQUÉM DA DEMOCRACIA
199
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
200
A VANGUARDA DO ATRASO E O ATRASO DA VANGUARDA
madas neoliberais,
qualificada: pois oleit émotiv
a exclusão, Essa exclusão
dos argumentos tem éque
neoliberais que ser
as políticas dos simulacros de Welfare, entre nós, mais excluí
ram do que incluíram. Nisso, copiam os argumentos conser
vadores, desde Hayek e Friedman. A inflação, por exemplo,
resultado - na fórmula reducionista neoliberal - de expansão
dos gastos sociais sem receita que os avalizasse, exclui, pela
permanente corrosão dos salários, os grupos sociais pobres do
consumo moderno. Além disso, a inflação penaliza fortemente
os mais pobres pelo chamado “ imposto inflacionário” . Em
suma, o Welfare exclui exatamente pela prática de políticas
supostamente
pelos integradoras.
resultados A neoliberais,
das políticas evidência fornecida aténão
entretanto, agora
são
muito favoráveis aos seus argumentos: o México já é hoje um
caso clássico de rigidez excludente; ninguém seriamente apos
ta que qualquer revitalização da economia mexicana possa
repor a imensa massa de subempregados que em qualquer cal
çada mexicana estão vendendo - suprema ironia - garrafinhas
da água mineral de elite, a Perrier francesa. Na Argentina,
cinco anos de estrondoso sucesso do Cavallo que caiu do cavalo
(isto é, Menem) produziu uma massa de desemprego que teima
em permanecer em irredutíveis 1 7/18 % , fenômeno único na
história argentina, que sempre se caracterizou por pleno em
prego, desde os dias da grande entrada do país austral como
fornecedor de alimentos no mercado mundial. Em todos os
outros, o registro é do mesmo tipo. O Brasil apresenta a sau
dável taxa de desemprego de 6% da PEA, com um incremento
de 1,5 2% entre maio de 96 e maio de 97 (Carta IBGE, ano
III, n.37, ago/97), mas os resultados para sua capital econô
mica, toda a Grande São Paulo, medidos pelo convênio SEA-
DE/D IEESE elevam-se ao patamar de 15 ,7 % , em julho de 97
21 1
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
política social,
cialismo mesmo
do Estado aquelas que copiam
desenvolvimentista, o velho assisten-
a confracção latino-
americana do Estado do bem-estar. Precisamente porque a
política monetária, permanentemente amarrada - e ancorada -
no dólar, perdeu toda sua autonomia, que é o oposto do que
dizem tanto o governo quanto a mídia; a ancoragem exige que
212
OS DIREITOS DO ANT1VALOR
lavando carros
finanças na rua, ealcançou
não-bancárias) a intermediação
a marca,financeira (bancos
recorde para o mune
do capitalista, de uns 13 % do PIB nacional; além disso, o que
não é desimportante, as antigas fraturas regionais, que no pas
sado deram lugar às revoltas e revoluções, a última das quais
foi a própria Revolução de 30, foram substituídas por uma
burguesia (com todos os seus ramos e frações) unificada na
226
DOMINANTES E DOMINADOS NA PERSPECTIVA DO MILÊNIO
saram de uma
sabilização do interpretação
capital e dos de falha humana
empresários pelopara a respon
recorde de
acidentes do qual o Brasil é detentor dessa iníqua taça desse
maligno campeonato mundial. Com o “ princípio da realidade ”
tudo isso tende a voltar a explicações ou transcendentais ou
àquelas que procuram contemporizar apelando para condições
especiais de competitividade da mão-de-obra. Tal como um
conhecido ex-ministro do Planejamento da ditadura militar
foi a Estocolmo, ainda no auge do “milagre brasileiro”, na
primeira grande reunião mundial sobre meio ambiente, dizer
que o Brasil recebería de braços abertos as indústrias poluido-
ras, pois o essencial era a geração de emprego e renda, e depois
se podería combater a poluição! A devastação da Amazônia e
22 8
DOMINANTES E DOMINADOS NA PERSPECTIVA DO MILÊNIO
Este,
voluçãoqueFrancesa
está na base da racionalidade
- a edição do Código burguesa desdeé asua
de Napoleão Re
marca por excelência, ele mesmo uma espécie de regressão da
Declaração dos Direitos do Homem e do Cidadão - foi gra
dativamente revelando-se insuficiente até a complexidade da
própria sociedade capitalista; sobretudo a “inventividade de
mocrática” (Castoriadis) deslocou o contrato mercantil e co
locou no seu lugar os direitos, civis, políticos, e por último os
chamados direitos sociais. Contemporaneamente, o avanço
dos direitos já está no plano dos chamados “direitos difusos”,
isto é, sem sujeitos, que não é a prova da “implosão do sujeito”
foucaultiana, mas contorna esse falso problema, situa-se para
além dessa discussão, é uma espécie de estatuto transcendental
do direito, que não precisa subjetivar-se. Isto é, não pode mais
ser negado: é uma afirmação, no nível mais alto, das conquistas
humanas, uma espécie de “cláusula pétrea” .
O Conservadorismo e a Reação como princípios legitima-
dores e estruturadores das novas relações sociais, da sociabi
lidade e do imaginário, na sociedade brasileira, regressam ao
contrato mercantil como princípio regulador. Destroem direi-
t tos, e não se detêm mesmo diante de uma interpretação tão
consagrada mundialmente como a dos direitos adquiridos. Ela
trabalha ao modo nazi-fascista e Stalinista de permanente pre-
sentificação do passado, isto é, o passado não existe, e portanto
não existe história propriamente. E isto o que significa os sta-
linistas eliminando Trotsky da história russa e já soviética; é
isto o que significava Hitler e Goebbels mandando queimar
livros que nunca deveríam ter sido escritos: mas o tinham sido!
E isto o que significam no Brasil as “reformas constitucionais”
do Presidente Cardoso e de sua maioria parlamentar, quando
desfazem os direitos de funcionários públicos, de trabalhado
res, de aposentados, quando reabrem as demarcações das re
229
OS DIREITOS DO ANTIVALOR
mercantil,
são. Assiste-se,
a violência
então,
termina
à violência
por serexplícita
a parteira
como
dessa
moeda
regresde
troca nas relações sociais, até no cotidiano: a violência é o
novo código da sociabilidade. Não à toa, o Instituto de Pes
quisas Econômicas Aplicadas do Ministério do Planejamento
e Orçamento divulgou, na última reunião anual da Associação
Brasileira de Estudos Populacionais - ABEP - em outubro de
1996, em Caxambu, Minas Gerais, estudo que constatava a
elevação proporcional dos assassinatos, suicídios e acidentes
de trânsito, que hoje são 70% da mortalidade na faixa etária
da população masculina de 15 a 29 anos, detendo a queda
histórica da taxa naquela faixa. A violência “fria” e não explí
cita passa~se no mundo do trabalho: o desemprego aumenta,
apesar da descarada manipulação que o governo e o IBGE
fazem da matéria, os trabalhadores e principalmente as mu
lheres trabalhadoras “somem” das planilhas e das estatísticas
através da terceirização, da flexibilização, do trabalho em tem
po parcial e do trabalho a domicílio, agora também categori
zado como “flexível”.
Uma sociedade com tais desigualdades presidida por um
consenso conservador, tendo como norte a Reação, nada tem
de bom a esperar. O enigma imediato pode ser decifrado sem
dificuldades: o mais imediato, que é a perspectiva para o pró
ximo milênio, exige uma reflexão urgente, sobre o padrão
civilizador que conduzirá a sociedade pelo menos na próxima
230
' DOMINANTES E DOMINADOS NA PERSPECTIVA DO MILÊNIO
231
Aà EDITORA
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