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Aprendendo com a Depressão traz uma série de reflexões, orientações de

30 especialistas, como psicólogos, psiquiatras, psicanalistas, filósofos,


sociólogos, entre outros profissionais e 19 depoimentos de quem teve e se
curou da depressão, uma doença que atinge mais de 322 milhões de
pessoas no mundo, segundo dados da OMS (Organização Mundial da
Saúde).
O livro versa sobre diversos assuntos, como a importância da alimentação,
atividades físicas, o uso da arte, a fé, pensamentos positivos, redes sociais, a
aceitação de si próprio, entre outros tópicos, os quais buscam trazer uma
mensagem de esperança, propor reflexões e mostrar que o mais importante
é persistir na luta contra a depressão.
Apresentação
Este livro não tem a pretensão de ser um manual para a cura da depressão.
Jamais. Se eu fizesse isso, estaria propondo algo que não seria verdade. Além
disso, eu sempre desconfio de manuais. São muito quadrados, fechados,
protocolares. A vida não é assim, toda cheia de regrinhas.
Somos humanos, cheios de imperfeições, características únicas e modos de
pensar e viver diferentes. Ainda bem que somos assim! Não somos uma
máquina fria, que apenas segue regras. Por isso, este livro não é um manual
contra esta doença que afeta mais de 322 milhões de pessoas no mundo,
segundo a OMS (Organização Mundial da Saúde).
Neste livro, escrevi uma série de reflexões sobre a depressão. E mais do que
isso: é um livro que traz depoimentos de pessoas que foram acometidas por
essa doença e conseguiram se reestabelecer, além de análises de especialistas.
Também quero ressaltar que cada colaborador é responsável por seu
depoimento. Importante: somente um profissional da saúde está capacitado
para fazer um diagnóstico de quem está com depressão e este livro não serve
como base para qualquer diagnóstico clínico – ele traz apenas reflexões.
Mas afinal, qual o objetivo de um livro assim? Fácil: só quem passou pela
depressão sabe o que realmente é essa “névoa em que os sentimentos somem”.
É preciso sentir na pele para ter a exata noção do que é esta doença invisível aos
olhos, mas que machuca e incapacita. Logo, o objetivo deste livro é trazer uma
mensagem de esperança, além de propor reflexões e mostrar que lutar contra a
depressão é possível.
Não vou dizer que é fácil, rápido, de um dia para o outro. Não existe nenhuma
mágica. Pelo contrário: lutar contra a depressão é um processo diário. Além do
que há vários graus de depressão, como também cada pessoa é única, com sua
genética, sua história, suas limitações e suas possibilidades. Assim, lutar contra
a depressão exige uma série de ações e, inclusive, uma força gigantesca, além de
muito apoio – seja da família, de amigos e, inclusive, de profissionais. Portanto,
buscar apoio é essencial para lidar com esta doença.
Eu falo isso porque tive esta doença. Talvez ela estivesse instalada em mim há
muito tempo e eu não percebia, ou melhor, apenas a camuflava com trabalho,
estudo, sorrisos e brincadeiras. Eu, desde os 11 anos, já me sentia uma criança
melancólica, meio deslocada, como se o mundo não pudesse me abraçar. As
coisas não tinham muito sentido e eu via o mundo, embora sempre com muitos
amigos e junto de minha família, com certa névoa.
O tempo foi passando e aquela sensação me acompanhava, sem que eu
esboçasse algo aparente. Para os outros, eu estava íntegro. Mas por dentro... Por
dentro eu me sentia em pedaços, vazio, desfragmentado. Eu podia estar em
qualquer lugar, mas não me sentia ali. Era como se eu estivesse deslocado ou
não pertencesse (ou pior, não merecesse) existir nesse mundo. Estranho, né?
Mas a sensação era real.
Era tão real que, em novembro de 2015, após iniciar um curso de mestrado –
e ter que parar de trabalhar, por não conseguir conciliar os estudos – peguei-me
a pensar sobre a minha “vida”. Ou melhor, o que eu vislumbrava dela. Eu era um
jovem enérgico, formado em jornalismo e biologia, com especialização em
jornalismo contemporâneo. Era inteligente, querido pelas pessoas, situação
financeira estável, saudável. Mas algo não se encaixava. Eu me olhava no
espelho e não conseguia enxergar o que havia de bom em mim: eu já estava sem
amor-próprio. Tudo foi perdendo o brilho. Ficando opaco, até que, por fim, eu
entendi que o que eu experenciava era algo tenebroso: eu não sentia mais nada.
Não sentia prazer em coisas que gostava de fazer. Inclusive, cheguei a ponto
de perder a fome no ápice da depressão. Em novembro de 2015, em uma
semana, emagreci seis quilos. Acordava chorando, por estar vazio. Não queria
levantar da cama, só ficar dormindo, tentando esquecer que eu existia. Doía
muito sentir tudo aquilo. E o pior: sentir culpa por estar daquele jeito. Sentia-
me extremamente culpado por saber que as pessoas ao me redor não queriam
me ver daquela forma. A culpa me corroía por eu “não ter motivos para ter
depressão”. E aquilo me fazia piorar, a ponto de só pensar em uma única
alternativa: pôr um fim a tudo aquilo. Só pensamentos suicidas transitavam em
mim. Era o único caminho, achava eu. Só o fim poderia colocar um término ao
meu vazio.
Felizmente, algo aconteceu. E cá estou, recuperado da depressão, aprendendo
diariamente a me amar, me cuidar, zelar por mim. Afinal, eu sou a pessoa mais
importante do mundo. Mas, afinal, o que me levou a romper com o ciclo
depressivo? Eu, de certa forma, apeguei-me ao “plano das 24 horas” do
Alcoólicos Anônimos: só por hoje!
E foi aí que eu entendi como eu poderia romper a depressão: eu deveria
pensar no hoje, pois é o único momento que existe e que pode fazer a mudança
ocorrer. O ontem, eu não tinha mais como mudar. O amanhã, bem... O amanhã
não existe. O amanhã é uma invenção que só existe em nossos pensamentos.
Mas o hoje... O hoje é o momento, o aqui e o agora. É no hoje que fazemos a
diferença e podemos mudar o que nos faz infelizes e tentar aceitar o que não
podemos mudar.
Quando compreendi que o importante era o presente, foi o momento em que
comecei a retomar as rédeas da minha vida. Foi o momento que falei: só por
hoje vou me amar, mesmo que eu não sinta nada por mim, odeie a vida, esteja
um lixo, sinta-me um lixo humano, só por hoje vou me permitir me amar. E vou
fazer as coisas, mesmo sem vontade. Vou enfrentar meus medos, minhas dores,
minhas franquezas. Só por hoje vou dar o meu melhor, sem me cobrar tanto
pelos resultados: o importante é tentar, insistir. Cair e levantar, com lágrimas ou
não nos olhos, mas levantar. E seguir em frente. Sempre em frente. Enfrentar
tudo o que aparecer, buscando apoio em tudo o que surgir.
E foi seguindo esse lema - só por hoje -, que fui colocando minha vida, aos
pouquinhos, nos trilhos. E “só por hoje” me permiti voltar a me amar. A olhar no
espelho e ver o cara espetacular que sou e que eu não reconhecia. E “só por
hoje” me permiti entender que, para sair da depressão, o mais importante era
aceitar que eu estava, naquele momento, depressivo e que eu não deveria sentir
culpa por estar doente. E que deveria buscar sim todo tipo de ajuda, além de
mudar minha forma de encarar o mundo. “Só por hoje” eu ia preencher o vazio
que me habitava com algo bom, algo que pudesse me fazer sentir vivo, mesmo
que a vontade não estivesse ali presente. Eu não deveria me imobilizar, mas me
pôr em movimento.
Desta forma, fui me libertando aos poucos de certos fantasmas do passado. Eu
não tinha mais como mudar a história, nem como mudar coisas que não
estavam sob meu poder. Também fui aprendendo a lidar com a sensação do
amanhã, pois ele era apenas algo imaginário, que me fazia sofrer. O amanhã não
existe. Assim, preocupei-me com o hoje. E isso fez toda a diferença.
Nesta caminhada, surgiu então a ideia de partilhar reflexões sobre o que a
depressão me ensinou. Desta forma, nasceu este livro, que tem a proposta de
trazer uma mensagem de esperança para que você, quer tenha ou não
depressão, possa sempre se lembrar de que o hoje representa a possibilidade de
luta. E qual o motivo de trazer depoimentos de quem teve depressão? Simples:
uma das coisas que também me ajudou a sair da depressão foi ouvir quem teve
esta doença. Foi poder conhecer pessoas que me olharam nos olhos e disseram:
“tive depressão, não desejo a ninguém o que senti, mas sei que é possível sair
dela. Lute para se amar, busque todo tipo de ajuda e não desista”.
Este livro também conta com abordagens de diversos especialistas (médicos,
psicólogos, psicanalistas, filósofos, sociólogos, entre outros), os quais
colaboraram com textos que buscam propor reflexões sobre determinados
assuntos.
A luta não é fácil, pois a depressão é uma doença com diversas faces e
intensidades, afetando cada pessoa de uma maneira. Ela atinge diversas áreas
do cérebro e apresenta vários sintomas como ansiedade, angústia, falta de
interesse social, desânimo, humor depreciativo, entre outros, podendo inclusive
apresentar sintomas físicos, como gastrite, diarreia, dores de cabeça e outras
dores sem causa física definida. Por isso, buscar auxílio de um profissional de
saúde (como um psicólogo ou psiquiatra. por exemplo) para diagnóstico é
fundamental, até mesmo para auxiliar no tratamento.
E quando falamos em depressão, temos que lidar com esta doença usando
tudo o que estiver ao nosso redor. É preciso, também, ter esperanças,
lembrando todos os dias que, só por hoje, precisamos sempre olhar o que há de
melhor em nós. Inclusive, a depressão me ensinou que, quando estamos
doentes, é preciso chegar ao fim do dia e comemorar as pequenas vitórias,
mesmo que simples (como ir a um supermercado, ler um bom livro, fazer uma
caminhada, enfim, qualquer ação que lhe pôs em movimento para lhe preencher
com algo bom). São as pequenas ações e a forma como as observamos que
fazem a diferença na luta. Mudar o foco de como se observa o mundo é
essencial.
Espero que as reflexões trazidas aqui possam ajudar as pessoas a ganhar uma
dose de ânimo para lutar contra a depressão. Por mais difícil que seja, jamais
devemos desistir da pessoa mais importante do universo: nós mesmos! Temos
apenas que ter paciência, procurar apoio, ter perseverança, comemorar todas as
pequenas vitórias e agradecer ao dia que nasce, que é mais uma possibilidade
de luta. Boa leitura!

Um forte abraço,
Juliano Schiavo

Uma reflexão sobre nossa sociedade
Somos o que somos por conta de nossa biologia, história, cultura, ambiente e
sociedade. De certa forma, somos uma mescla de tudo e, por conta desta
dinâmica, estamos sempre sendo influenciados, influenciando, modificando-nos
e modificando tudo ao nosso redor. Enquanto construímos algo – imersos na
sociedade – nos construímos também, numa troca. Acredito muito nisso. Nosso
jeito de ser ecoa na sociedade. E a sociedade ecoa em nós.
A humanidade só se tornou o que é por conta de suas relações sociais. O senso
de comunidade, a criação de laços, o viver com os outros nos tornou humanos
como somos. Não somos como as abelhas, que já nascem programadas para
desempenhar uma função na colônia. Somos únicos, uma centelha de vida, com
vontades, desejos e jeito do próprio de ser. A questão é que viver em sociedade
nos torna parte do que somos: desempenhamos papéis sociais, fazemos parte
de grupos, buscamos estar perto dos que nos são, de certa maneira,
semelhantes no pensar e agir.
A questão é que, numa sociedade como a nossa, a individualidade deve estar
acima de tudo e isso nos torna cada vez mais presas fáceis de um sistema
opressor. Segundo a ótica social, para sermos “bem sucedidos” e “felizes”,
devemos ser os melhores em tudo, o destaque na carreira escolhida, o exemplo,
a pessoa que alcança o topo, aquele que é referência. A sociedade não aceita o
perdedor, o fracassado, o que é melancólico. A sociedade nega aqueles que não
atendem seu padrão imposto e os isolam, jogam de escanteio.
Se antigamente havia os leprosários, espaços em que eram encaminhadas as
pessoas com lepra para definhar, hoje a sociedade isola os “diferentes” de seu
padrão de formas mais sutis – e nem por isso menos dolorosas: ela tipifica,
rotula e, desta forma, é preconceituosa. No caso de quem tem depressão, a
sociedade aponta dedos invisíveis aquele que “não rende”, “vive chorando”,
“que quer chamar atenção”. Ela nega a todos os que não se encaixam em seu
padrão produtivo. Vivemos numa conformação social que quer homogeneizar
pessoas diferentes, com jeitos diferentes. Quer transformar todos numa massa
amorfa, padronizada e, com isso, esconder e deixar de lado o que “incomoda”.
Ter depressão, na visão desta sociedade, é assinar uma sentença de que não
demos certo. O problema é que vivemos num mundo doente: substituírem
nossa razão de ser, pela razão de parecer. Você precisa parecer feliz. Não
necessariamente ser. O trabalho, que serviria para dignificar, não tem esse
propósito: ele serve apenas para conseguirmos dinheiro para sobreviver. E o
mais irônico: com a informatização, os trabalhos a serem feitos ficaram mais
rápidos, mas a sobrecarga aumentou e houve uma desvalorização das
profissões. Ou seja, há uma produtividade maior, se comparada há 50 anos,
porém o tempo dedicado ao trabalho não foi diminuído.
Um exemplo é o caso dos jornalistas: se antes havia uma redação incluindo
diversos profissionais hoje em dia se consegue, com um único profissional, ter o
texto que será publicado no site e no jornal impresso, a foto, o vídeo e, inclusive,
o áudio para o rádio. O trabalho de vários acaba sendo de um só. Como não
adoecer num mercado de trabalho que transforma as pessoas em máquinas?
No caso de professores, por exemplo, eles são responsáveis por educar a
nação. Mas estão imersos num ambiente em que devem abraçar o maior
número de classes, trabalhando muitas vezes de manhã, tarde e noite, com
diversas pressões e, muitas vezes, sem estrutura, colocando dinheiro do bolso
para ter o mais básico. Que mundo é esse que exige tarefas inumanas para
seres humanos? Como se dedicar com afinco ao trabalho se o mundo ao redor
parece conspirar contra e, inclusive, menosprezar o trabalho que se
desenvolve?
Este mundo é o que nossa sociedade prega. Ela quer esculpir a humanidade
tal qual entidades divinas, que tudo executam, que não tem o direito de adoecer
e que devem estar sempre felizes, almejando sempre o posto de melhores em
tudo. Aquele que não se encaixa, como o depressivo, nunca será visto com os
mesmos olhos do que aquele que “deu certo”.
A depressão, sob este prisma, pode ser considerada uma forma de reação da
pessoa enquanto indivíduo frente a esta sociedade doente. Como sobreviver
num mundo que sufoca as individualidades e busca a perfeição? Sentir-se
sufocado ante a essa pressão inumana reflete muito em nosso eu. Ser vítima de
bullying, de preconceito, de comentários maldosos, enfim, ser transformado
numa vítima faz ruir qualquer um.
Ante a esta sociedade que rotula, nada melhor do que, aos poucos, permitir-se
entender que cada pessoa é única. Eu sou eu, você é você. Não estamos aqui
para atender as expectativas alheias: somos únicos, com nossas qualidades,
diferenças, propósitos. Temos uma história por trás de nossa existência e só nós
sabemos o que passamos – as pessoas não têm o direito de julgar nossa vida sob
a ótica delas, assim como não temos o direito de julgá-las. Temos apenas o
direito de termos respeito e o dever de respeitar.
É preciso, ante a esta pressão social, que nos rotula e tipifica, aprendermos a
nos reconhecer enquanto pessoas. Digo isto, pois na depressão nos reduzimos a
nada. Deixamo-nos sentir parte de um todo e é como se não pudéssemos nos
encaixar em nenhum lugar. Para tanto, é preciso tentar, todo dia, se reconhecer,
de forma a olhar nossas qualidades, sem dar ouvidos às palavras negativas.
Quando absorvemos aquilo que é um pensamento ruim, muitas vezes, dito por
alguém próximo, sentimos como se fosse a mais pura verdade. Mas não é: não
devemos jamais nos pautar pelos defeitos elencados pelos outros. Devemos sim,
reconhecer que somos humanos, temos falhas e, o que está em nossa
possibilidade de mudar, podemos mudar (e não devemos sentir vergonha de
buscar ajuda). E o que não há como mudar, devemos trabalhar com o tempo a
arte de aceitar aquilo que não temos poder de modificar.
É uma tarefa árdua dizer: tenho depressão. Muitas vezes, escondemos de
todos esta doença, pois existe um imenso preconceito por quem é depressivo.
Ao se declarar que se está com uma doença como a depressão, vivendo numa
sociedade seletiva, é como dizer que se está abandonando o sucesso. Em minha
crise depressiva, por exemplo, poucas pessoas do meu círculo social souberam
que eu estava doente.
Eu me sentia culpado, inferiorizado e, de certa forma, tinha medo de ser
taxado como o “fracassado”, o que “precisava de ajuda”, o “coitado”. As pessoas
observavam meu jeito meio abatido e eu simplesmente falava, com um sorriso
amarelado, que estava cansado, ou com crise de gastrite – quando na verdade,
eu estava enfrentando o monstro da depressão. Existe um autopreconceito, de
certa forma: negamos aquilo que sabemos que, sob o ponto de vista social, não é
bem-vindo.
Estar depressivo não é algo encorajado e nem bem visto. Quem porta esta
marca, a da depressão, parece que traz sobre si uma doença infecciosa, a qual
pode contaminar qualquer um que se aproxima. Esta visão é ocasionada,
justamente, pela sociedade em que vivemos, a qual coloca num canto escuro
todos aqueles que não estão enquadrados conforme seus padrões ilusórios.
O sistema realmente acaba por ser cruel: quando temos depressão, é o
momento em que mais precisamos de apoio e é, justamente, o momento em que
vemos que muitos se afastam por medo de serem tocados pelo “fracasso”, ou
seja, pela mancha da depressão. Viver em sociedade é saber lidar com múltiplas
faces que, na imensa maioria dos casos, utiliza máscaras. Apontam os “defeitos”
alheios, quando na verdade, os defeitos delas são maiores. É a lógica de
culpabilizar o outro para não ser observado: é uma sociedade hipócrita e
doente.
Por isso, uma das coisas mais importantes nessa reconstrução do eu, perante
a sociedade, é buscar sempre um apoio: seja de um familiar, um amigo, um
conhecido, um grupo, um profissional. É preciso ter alguém com quem dialogar,
trocar experiências, buscar algo para se sentir envolvido.
Devemos aceitar nosso jeito de ser, nossas limitações, nossas fraquezas.
Embora a sociedade pressione, não é a sociedade quem vai viver nossa vida,
pagar nossas contas, fazer o que temos que fazer. É preciso aprender a se
valorizar enquanto pessoa, se encarar no espelho e reaprender a se amar. É
interessante se cercar de pessoas com quem possamos contar, ter apoio, sentir-
se acolhido. Inclusive, buscar ajudar outras pessoas que precisam de nosso
apoio, mesmo que seja uma conversa: trata-se de uma ajuda mútua, pois
enquanto ajudamos, somos ajudados.
Se vivemos numa sociedade de aparências, em que parecer é mais importante
que ser, devemos, acima de tudo, buscar romper com este pensamento.
Precisamos ser honestos conosco mesmo: entender que temos nossas
limitações, além do que precisamos romper com a projeção das expectativas
alheias sobre nós. Somos o que somos, não o que os outros querem. Viver uma
vida projetando-se segundo as expectativas alheias é sentir vazio: é uma vida
teatral, feita só para agradar aos outros, enquanto que o verdadeiro ator, que
somos nós mesmos, fica infeliz. Nós merecemos nos amar. É nosso direito.

Para refletir
A depressão pode ser considerada um problema clínico e social. Ela tem sua
gênese ligada a experiências de reconhecimento que articulam desejo,
linguagem e trabalho. A fragilização de vínculos na família e na comunidade
junto com a ascensão de uma cultura do desempenho, a perda do significado
simbólico do amor, da política, do trabalho e da religião e, inclusive, há uma
sensação de aceleração do tempo. Os laços entre as pessoas são objetificados,
perdendo seu valor sentimental e passando a ter um valor “econômico”. Vale
lembrar que os laços sociais estão cada vez mais impessoais.
Assim, ao analisarmos o impacto disso tudo na sociedade, encontramos um
excesso de experiências em que as pessoas não conseguem se identificar, como
os controles, disciplinas, normas, regras etc. Somado a isso, temos um déficit de
experiências em que as pessoas poderiam se identificar: faltam experiências
reais de transformação, do amor, do desejo, entre outras.
Por sua vez, quando falamos que a depressão é também um sintoma social,
queremos dizer que o depressivo, nesta sociedade, é visto como um anti-herói:
não produz como devia, não traz a imagem de felicidade que esperamos
encontrar no outro, não consome como deveria, não está no mesmo tempo dos
outros. Assim, é visto como uma espécie de excluído de nossa sociedade.
E a sociedade, neste âmbito, faz com que o deprimido tenha seu sentimento
de culpa aumentado, principalmente, pela verificação própria ou de outros, de
que “nada lhes falta”. Ou seja: por ele reunir uma lista de bens ou condições, ele
não deveria ser depressivo. Porém esta lista de bens ou condições, em verdade,
é muito pobre para poder definir uma verdadeira vida interessante. Assim, o
depressivo acaba por “individualizar” seu sofrimento: ele se vê como um
fracasso e compartilha convictamente dos ideais pelos quais ele sofre.
Christian Ingo Lenz Dunker, psicanalista, professor titular do Instituto
Psicologia da USP. São Paulo-SP.
Amar a si próprio
Você acorda e, ainda em sua cama, não sente ânimo algum. É como se as horas
de sono – se é que dormiu direito – tivessem passado rápido demais. Você sabe
que o dia está começando e, involuntariamente, conta nos dedos quantas horas
ainda faltam para dormir novamente. Olha ao teto, ajeita-se na cama, os
pensamentos parecem embaralhados. É como se tudo estivesse desmoronado,
destruído, sem perspectivas.
Ainda na cama, acaba por se encolher em si mesmo, tentando se fechar em um
mundo longe dos demais. Você se diminui. Acredita que mais um dia de
tormentos, com aquela sensação eterna de vazio, está começando. Você apenas
existe. Simplesmente sobrevive. Você está apenas lutando por mais um dia,
tentando tirar forças para tentar seguir. Dói. Dói demais estar vazio. Machuca
demais não se reconhecer como pessoa. Fere demais não ter perspectivas do
que fazer, do que sentir, do motivo de existir.
A depressão faz com que percamos o nosso amor próprio. E só quem passa
por essa sensação sabe o que realmente é deixar de se amar. Só quem deixou de
se amar sabe como dói ouvir que “você tem tudo, não há motivo para estar
infeliz. Tem tanta gente sem nada, e você fica desse jeito, sem motivo”. Machuca
quando as pessoas acham que estar vazio é apenas “falta de Deus”, “falta de ter
uma companhia”, “reclamar de barriga cheia”. Estar com depressão é deixar de
se reconhecer enquanto pessoa e, o pior: deixar de se amar.
Acredito que um dos processos mais difíceis para sair da depressão é
reaprender a se amar. É o mais doloroso, o mais trabalhoso e o mais árduo. E
isso por quê? Pois no decorrer de nossa doença – pois a depressão é uma
doença invisível – penso que fazemos o processo contrário ao de lapidar um
diamante. Imagine uma pedra bruta, que esconde uma beleza que necessita
passar por um processo artesanal e trabalhoso para se tornar bela.
Para chegar ao ponto de se tornar uma joia, essa pedra é cortada, raspada,
passa pelo processo de abrilhantamento, até que, por fim, torna-se um
diamante. Com a depressão, o processo se inverte: aos poucos nossa beleza
interior vai sendo riscada, diariamente, até se tornar opaca, sem brilho e, por
fim, se tornar algo que parece não ter valor algum.
É nesse processo que deixamos de nos amar. E nada mais importa. Nada mais
faz sentido. A melancolia, que antes parecia pintar o céu azul de uma tristeza, dá
lugar a pior coisa que existe: a ausência de sentimentos e de vontades.
Perdemos o amor próprio e, com isso, se extingue o pulsar pela vida. É aí que a
depressão se instala e cria raízes.
Quando tive a crise da depressão, sempre pensei que não iria conseguir sair
dela. Não via perspectivas. Acordava chorando, com vontade de não existir.
Apenas pensamentos negativos sussurravam em meus ouvidos. Parecia que não
havia forma de sair daquele aperto no peito que me exauria toda vontade de
existir. E qual foi o estalo que me deu forças para mudar meus pensamentos e
começar a caminhar – lentamente – até sair do fundo do poço? Foi repetir para
mim: só por hoje vou tentar me amar, nem que seja um tiquinho só. Mas vou
tentar, e só vou pensar no hoje.
E como fazemos para voltar a nos amar? Não posso dizer que é um processo
fácil e rápido, feito um milagre, pois comigo não foi. Levei quase um ano inteiro
para reaprender a me valorizar e a me amar. Escorreguei muitas vezes.
Machuquei-me outras tantas. A depressão é uma criança travessa que gosta de
se esconder. Ela desaparece sorrateira, certo dia. Achamos que ela nos
abandonou de vez. Sentimo-nos a melhor pessoa do mundo e que nada mais nos
abalará. Quando não estamos atentos, ela nos dá um susto. E voltamos a decair.
Por isso, o processo de voltar a se amar é muito importante. Serve como uma
prevenção, uma vacina.
Esse processo se dá em etapas. Nada é mais importante do que dar pequenos
– e seguros – passos. Digo seguros, no sentido de fazer coisas que, naquele
momento, conseguimos fazer. Não adianta querer fazer projetos se ainda não
temos ferramentas para lidar com as coisas mais simples. Como construir uma
casa se ainda não temos um terreno? O primeiro passo é batalhar para ter o
terreno.
Voltar a se amar começa do nível mais básico: preparar o terreno para
criamos nossa fundação. Nós já temos o terreno – que é nossa vida. E cada
terreno tem sua história, foi abalado por vários acontecimentos, está
circundado por outros terrenos, sofre com chuva, sol, enfim, tem suas
particularidades únicas. Não há um terreno exatamente igual ao outro. Sempre
há uma pedra a mais ou a menos. Ou às vezes, há muito mato alto. Há terrenos
que sofrem com problema de terrenos ao lado, mas mesmo assim continuam a
ser terrenos.
O importante é que, independente das conformações dele, devemos nos
afeiçoar a ele, mesmo que a princípio seja difícil. É neste espaço que
começaremos a colocar a fundação de nossa construção. É neste terreno, que é a
vida, que vamos começar a modelar a terra e a dar um sentido para a
construção que virá a seguir. Lembrando que casas fortes não se fazem de areia:
é preciso tijolo, aço, cimento, enfim, uma infinidade de materiais. Além disso, a
casa que é construída neste terreno, podemos dar o nome de “nossas escolhas e
nossas possibilidades”. São nossas escolhas que permitirão, dentro de nossas
possibilidades, escolher o melhor naquele momento para nossa casa ser
ajeitada no terreno da vida.
Voltar a se amar é assim: começar pelo mais básico. E também sermos bons
engenheiros, com excelentes pedreiros. Como assim, bons engenheiros e
excelentes pedreiros? Simples: acima de tudo, nós projetamos como será nossa
casa (seremos nossos próprios engenheiros). Fazemos isso com base no terreno
que temos disponível, nas possibilidades e nos nossos gostos. E para
construirmos, temos que entender que, nesta obra de reconstruir o amor
próprio, é preciso sempre termos pessoas em quem podemos confiar ao nosso
lado: eles serão os “pedreiros” que nos ajudarão na árdua jornada.
O que é o mais básico para voltar a se amar? É preciso fazer uma reflexão
honesta, pensar um pouco em nossa vida. Como cada um é único, o que valeu
para mim, pode não valer para você. Mas talvez possamos pensar na teoria do
psicólogo norte-americano Abraham Maslow (1908-1970) 1 , que criou a
Teoria das Necessidades.
Maslow propôs que existe uma hierarquia de necessidades. Quando uma
necessidade satisfeita, ela deixa de ser fonte de motivação. Exemplo:
quando sentimos fome, buscamos comida. Mas quando estamos
satisfeitos, com a barriga cheia de tanto comer, paramos de buscar
comida, pois atendemos a necessidade de comer. E partimos para
satisfazer algo que não foi satisfeito ainda.
Assim, as primeiras necessidades, para Maslow, são as necessidades
mais básicas (as fisiológicas): comer, respirar, tomar água, entre outras,
sem as quais não conseguiríamos sobreviver. Quando atendidas essas
necessidades, passamos para as demais: segurança, amor/pertencimento,
estima e, por último, autorrealização. Para ser sincero, você não precisa
aprender de cor o que é a Teoria das Necessidades de Maslow: você sabe o que
lhe dói. Sabe o que te fere. Sabe o que te falta. O que você então precisa fazer
quando tem depressão? Não há uma resposta simples. Pelo contrário. São várias
frentes e caminhos a seguir. Porém é muito importante voltar a preencher o
vazio que surgiu em você. E isso começa quando você permitir se amar.
No meu caso, quando tive o ápice da crise depressiva (que incluiu alguns
episódios de síndrome de pânico), eu já havia perdido completamente a fome.
Tanto é que, em uma semana, perdi seis quilos. Eu então comecei com o mais
básico: a comer. Eu pegava o prato com comida e chorava. Eu praticamente
temperava a salada com minhas lágrimas. E comia, mesmo sem vontade. O meu
corpo precisava de energia para que eu pudesse começar a reconstruir o meu
amor próprio. O melhor caminho para dar essa energia era me alimentar,
mesmo sem fome. Mas era preciso.
Na minha reconstrução de amor próprio, passei a comemorar cada dia como
uma grande vitória. Cada pequena coisa que eu fazia (leia-se: forçava-me) era
algo imenso, valioso. Podia ser pequeno para os outros, mas para mim era uma
grande vitória. Voltar a me alimentar bem foi uma das primeiras conquistas. Eu
comecei do mais básico. Pode ser que você já se alimente bem, pois não sei sua
história. O que você precisa fazer para voltar a se amar é pensar pequeno: não
são os grandes passos que te levarão longe. Eles podem dar uma torção e te
lesionar por mais tempo. São os pequenos passos que vão permitir você
saborear a paisagem e entender onde estão seus pés.
Por isso, tenha em mente que, para começar a preparar seu terreno, nada
melhor que fazer tudo aos poucos. É preciso comemorar cada pequena vitória,
por mais ínfima que seja. Quando eu acordava, passei logo pela manhã a me
olhar no espelho (com a cara muitas vezes inchada de chorar) e falava: “Meu
nome é Juliano Schiavo Sussi. Eu sou único e eu sou a pessoa mais importante
do mundo. E eu mereço ser feliz”. Eu repetia isso ao longo do dia, como um
mantra.
Pode parecer bobo, mas eu estava alimentando meu amor-próprio com um
pouco de afago. Temos que parar de nos criticar. Não podemos ser nossos
próprios sabotadores. É preciso mudar o pensamento negativo para algo
positivo, mesmo que pareça algo besta. Mas não é. As palavras têm poder e
movimentam o universo. Temos que parar de nos autodepreciar. É preciso se
olhar no espelho, se encarar, abrir um sorriso e dizer o quanto merecemos e
temos direito de estar bem. Somos únicos e temos nossa importância. Não há
ninguém igual a nós. É preciso que reconheçamos isso, todo dia, sempre. É um
mantra diário se elogiar e reconhecer que merecemos esse elogio.
Por isso, cada dia, quando temos depressão, temos que dar pequenos grandes
passos. Podem parecer algo pequeno, como conseguir ir ao supermercado sem
ter uma crise de ansiedade, mas tenha certeza: são as coisas pequenas que, no
fundo, serão as grandes responsáveis por você construir uma casa tão bela, a
ponto de poder ajudar outros com seus conhecimentos adquiridos na
engenharia.
Nós somos engenheiros de nossa vida, nós projetamos a casa que iremos
viver. Se for preciso chorar, chore. E depois enxugue as lágrimas. Se for preciso
gritar, grite. Depois respire fundo e fale calmo consigo próprio. Jamais se culpe
por cair. Agradeça que você caiu, pois há uma nova possibilidade de você se
levantar. A vida é feita de quedas, pois são elas que nos ensinam onde podemos
melhorar. Evolução é isso. É cair, levantar mesmo sem ter vontade nenhuma.
Erguer a cabeça. Agradecer a queda. E seguir sempre em frente.


Para refletir
Aquela velha frase que diz “para amar o outro precisamos primeiramente nos
amar” soa como clichê, não é? Essa é uma daquelas frases que provavelmente
ouvimos e ao longo da vida vamos repetindo, sem de fato pensar no seu real
significado e colocar em prática.
Precisamos primeiro nos amar não apenas para amar outro alguém, mas
também para viver em sociedade, o amor próprio além de ser essencial nas
relações humanas é também fundamental para nossa saúde física e psíquica.
A pessoa que não se ama, que não busca fazer coisas que lhe proporcione
prazer, não toma decisões buscando o seu bem-estar, não se aceita e se anula
sempre vai viver se colocando em segundo plano. O exercício de nos amar em
primeiro lugar é muito importante, pois nos ajuda também a enfrentar as
dificuldades do dia a dia, já que fortalecidos pelo amor próprio nos sentimos
capazes de lutar pelos nossos objetivos.
O primeiro passo para aumentar nosso amor próprio é a mudança na forma
de enxergarmos nossa existência, entender a nossa importância para o outro,
sentir orgulho e admiração pela pessoa que somos, reconhecer nossos
potenciais, aceitar nossas limitações, ter a consciência de que o erro não nos
torna pior que ninguém.
Somos protagonistas da nossa história, temos o poder de decidir como trilhar
nosso caminho e não podemos nos esquecer de que nos amar em primeiro lugar
não é um ato de egoísmo e sim de amor. Manter e criar vínculos é tão
fundamental para nossa sobrevivência quanto o amor, o amor próprio.
Marielli Soares Martins, psicóloga clínica, com especialização em Clínica
Psicanalítica. Santa Bárbara d’Oeste-SP.

...

- Nossa! Como você tá deprê...
- É, não tô legal. Acho que tô deprê, mesmo.
“Deprê” virou um termo comum, usado no dia a dia das pessoas no lugar do
termo “tristeza”. Parece que, hoje em dia, ficar triste saiu de moda. Se você
estiver “triste”, você está “deprimido”! Essa confusão é preocupante, pois tem
gente tomando remédio para a tristeza, sendo que o único tratamento eficaz
para isso é o tempo. Estar deprimido é diferente de estar triste. A tristeza, por
mais estranha que possa parecer, é saudável, faz-nos crescer; a tristeza cicatriza
espontaneamente. A depressão é um sentimento diferente, é um problema que
pode prejudicar muito a vida; é uma doença. À tristeza normal chamamos luto, a
essa outra “tristeza estranha”: depressão.
Existem muitas diferenças entre o luto e a depressão, e a autoestima é uma
das principais diferenças entre eles. O gostar de si mesmo, o cuidar-se,
preocupar-se consigo, o respeitar-se deveriam manter-se apesar desses
momentos difíceis. Quando não conseguimos, perdemos o amor por nós
mesmos, caímos nesse estado de mente que chamamos depressão. A queda da
nossa autoestima pode nos afetar a ponto de não termos vontade de comer,
trabalhar nem sequer tomar banho. Isso exige tratamento, que pode ser apenas
psicoterápico ou necessitar de medicação.
Portanto, se você estiver “triste” a ponto de se descuidar, de não conseguir
trabalhar, de não ter ânimo nem para escovar os dentes, tente começar por aí.
Tente reencontrar-se e tratar-se bem, recuperar sua autoestima; se não
conseguir, procure ajuda e deixe que o tempo cuide do resto...
Oswaldo Cassilha, médico, psicanalista, ator de teatro e escritor.
Campinas-SP.





Aceitar o que não se pode mudar
Há tantos caminhos que percorremos na história que é a vida. E nesta
passagem, deparamo-nos com paisagens diversas. Algumas delas são campos
férteis não cultivados, os quais podemos preparar para semear sementes. Esses
campos repletos de fertilidade são pedaços do nosso eu, que podemos mudar e
transformar. São paisagens mutáveis, que requerem uns calos na mão, suor no
rosto, e aquela canseira pela lida diária no transformar para colher. São
paisagens que podem ser modificadas: basta nossa atenção e dedicação ali. Ou
seja: podemos mudar, basta nos empenharmos.
Outras paisagens da vida são desertos. São longas, arenosas e solitárias
planícies, que parecem ter um encantamento em nós. Embora nada resida ali,
ficamos a observá-las e, com insistência, queremos semear nossas pequenas
sementes de esperança naquela terra árida. Pegamos a enxada da persistência,
calejamo-nos fazendo canteiros de areia que se movem com o vento e, ali,
semeamos pequenas esperanças. Dali, nada sairá, pois não podemos mudar o
deserto. Está além de nossas possibilidades.
Ficamos a cultivá-las com lágrimas, pois a paisagem é árida e nada pode
oferecer. Não há nuvens de chuva que virão: é uma paisagem estática, um
eterno deserto, em que até mesmo as estrelas não brilham. Há apenas nossa
própria desolação em trabalhar em algo infrutífero e que, por algum motivo,
acreditamos que podemos mudar (ledo engano). Mas não podemos. Está além
de nossas possibilidades e capacidade.
Insistimos e persistimos em cuidar de sementes que jamais brotarão num
deserto: um amor não correspondido; uma “amizade” que nos faz mal; um
emprego que nos deixa infeliz; um casamento que está só em ruínas; uma rotina
que nos faz sentir escravos; uma decisão que podemos tomar, mas não
tomamos; uma verdade para falar, mas que sufocamos; enfim, nos desertos nos
tornamos jardineiros de sementes que são apenas cascas vazias. Elas estão ali,
mas delas nada brotarão. E mesmo sabendo que não podemos mudar, pois
muitas vezes essa mudança está além de nossa capacidade, nós insistimos.
Damos voltas e mais voltas ao redor de nosso canteiro de areia. A qual preço?
Uma das atitudes mais difíceis é aceitar que, nestes desertos, nada podemos
mudar. Podemos semear de várias maneiras nossas esperanças, acreditando
que algo dali vai nascer. Sabotamo-nos, a ponto de achar que o problema reside
em nós, apenas em nós, e não no deserto infrutífero. Culpamo-nos de algo que
está além de nossa capacidade de mudar. Transformamo-nos em seres
encurvados, com dores a corroer nosso eu interior, cheios de culpa. Não
aceitamos que o deserto é nossa limitação, achando que o verdadeiro problema
está na forma como cultivamos as sementes.
Estamos ali, na terra árida e infrutífera, não querendo encarar os fatos: há
coisas que não podemos mudar, pois estão além de nossa capacidade. Então,
agimos como nossos próprios sabotadores. Continuamos a investir energia em
algo que não dará frutos. Tentamos regar com nossas lágrimas sementes que
jamais brotarão. Usamos nossa dor para adubar o solo ressecado. E, por fim,
sabotamo-nos: achamo-nos o pior jardineiro que há no mundo e, por causa
disso, não merecemos viver e acreditamos que o deserto deve ser nossa cova
solitária.
Aprendi, depois da depressão, que somos nossos piores sabotadores.
Sabemos os nossos defeitos, conhecemo-nos de tal forma que podemos elencar,
interiormente, as nossas falhas. Apontamos um dedo acusador todo o dia para
nosso eu mais íntimo e o intimidamos, a todo o momento. Repetimos o quanto
não merecemos ser felizes, questionamo-nos porque vivemos essa vida, qual a
nossa razão. Vemos apenas nosso lado mal. Sentimo-nos sós, mesmo estando,
muitas vezes, com uma multidão ao nosso redor. E isso por causa do nosso eu
sabotador: ele sabe como atacar e mutilar aquilo que é o mais importante. Ele
ataca e fere nossa paz interior.
Uma das coisas mais difíceis é aprender a aceitar que temos esse eu
sabotador. Ele é nosso próprio inquisidor. Aponta, cutuca, machuca. É um
carrasco sem olhos, mas que sabe como nos fazer sentir isolados, incapazes,
atados. O eu sabotador é a maior armadilha interna: ele parece se divertir em
nos transformar numa vítima de nós mesmos.
As cores se tornam esmaecidas, os sabores se dissolvem em sensações que
não despertam a fome, os sons se tornam confusos, feito um rádio sem sintonia,
nosso tato parece perdido e os cheiros tem nuances fétidas: nos
empalidecemos, como se vagássemos mortos em vida.
Esse é o papel do eu sabotador. Ele sabe como nos paralisar. É um
profissional que nos acompanha desde que nos entendemos enquanto pessoas.
O nosso eu sabotador faz com que fiquemos presos em desertos, solitários,
semeando esperanças e acreditando que podemos mudar algo que está além de
nossas possibilidades. Ele nos coloca para baixo, inferioriza-nos, faz-nos repetir
que merecemos e devemos morrer, pois somos o pior jardineiro do deserto.
Mas como aprender a lidar com ele?
Para ser sincero, não sei. Realmente é um aprendizado diário, único, de cada
um. Não existe fórmula mágica para aprender a lidar com o eu sabotador e
mudarmos de paisagem. Talvez, a grande jogada seja tentar, aos poucos, aceitar
o que não podemos mudar. Buscar pessoas que passaram pelas mesmas
situações, trocar experiências, conversar, situarmo-nos no mundo.
Temos a estranha mania de achar que somos únicos a sofrer. Não estou
dizendo que a dor de alguém é menor que a do outro: cada um sente da sua
maneira, com uma intensidade única. Não há dor menor ou maior: há apenas a
dor de cada um, que não sabemos como ela é, pois não estamos na pele da
pessoa para senti-la. E nada melhor do que buscar apoio em quem passou pelas
mesmas aflições, desabafar com alguém de confiança, chorar e insistir, mesmo
sem vontade, em continuar caminhando deserto a frente. Não podemos nos
deixar estagnar no mesmo ponto: nem que seja arrastado, é preciso seguir em
frente.
A vida é uma estrada que revela múltiplas paisagens. Podemos estar presos
num deserto, mas para sair dele precisamos querer abandoná-lo. É preciso
entender que há determinadas coisas que não temos como modificar e,
portanto, não podemos ficar projetando tantas expectativas. Não somos
proprietários da vida alheia e não temos direito de exigir que as pessoas
atendam as nossas expectativas. Devemos exigir apenas que nos tratem com
respeito, da mesma forma como devemos tratá-las.
Não podemos mudar as pessoas, ou determinadas situações que surgem. Mas
podemos encarar nosso eu sabotador e dizer para ele: o problema não sou eu,
mas sim algo externo, além da minha capacidade de mudança. Não podemos
nos culpar por algo ou alguém que não temos como mudar. A tarefa mais árdua
é aceitar. E mesmo que, em alguns momentos, esse aceitar pareça difícil, não
podemos e nem devemos ficar estáticos no deserto.
É preciso continuar a caminhada, tropeçando, mas olhando para frente,
confrontando o eu sabotador e esfregando na cara dele que não somos o
verdadeiro problema e não temos culpa de coisas que não podemos mudar. O
deserto pode ser longo, mas passo após passo, nós ficamos um pouco mais
distantes dele. Aos poucos, com insistência e persistência (às vezes, com muito
choro e um vazio que nos machuca), começamos a ver paisagens diferentes. Um
raminho verde de esperança começa a surgir. Ele é prenúncio de que terras
férteis estão se aproximando e que, nestas novas terras, teremos como mudar o
que podemos mudar.
Passar pelo deserto nos ensina a termos tolerância com nós mesmos. Força-
nos a entender que somos humanos e não controlamos as pessoas e as
situações. Somos, às vezes, meros espectadores. Passar por terras ermas nos
mostra que temos que ter humildade para reconhecer que somos falíveis e que,
mesmo que queiramos com todas as forças mudar algo, só podemos mudar o
que é possível. Não adianta semear onde as sementes não têm onde nascer.

Depoimento
Nasci numa família grande, com oito irmãos, sendo quatro deles mais novos
que eu. Quando criança, eu era muito apegado ao meu pai. Com o nascimento de
meu irmão mais novo, senti que meu pai começou a me tratar de forma
diferente, com certo desprezo. Lembro-me, certas vezes, de que ele chegou com
o bolso cheio de balas e bombons. Eu e meus irmãos fizemos fila, mas fui o único
que não recebeu nenhum doce. Acho que começou aí o meu problema com a
depressão, quando tinha entre 8 e 9 anos.
Na adolescência, o único lugar que eu frequentava era o colégio. Nesta época,
todos os dias, tinha vontade de morrer. A casa de meus pais ficava próxima a
um rio e eu sempre passava perto do rio pensando em me jogar. Mas no fundo,
eu queria era viver. Só não queria que as coisas fossem daquele jeito.
Eu tinha muito medo de falar com as pessoas. Escondia-me delas. Passava
muito tempo trancado em meu quarto e queria dormir o tempo todo, para fugir
da realidade. Foi então que peguei um caderno e comecei a escrever frases
curtas de autoestima. Todos os dias, pela manhã, quando achava necessário, eu
lia aquelas frases, o que me ajudou muito.
Ainda não curado completamente da depressão, sai da casa de meus pais e fui
morar numa cidade grande, tentar vestibular. Foi algo horrível. Tive que morar
na casa de meus parentes e, então, desisti do vestibular. Levei alguns currículos
em empresas e já estava bem melhor.
Até que um dia sofri um acidente de trabalho e, mais uma vez, a depressão
voltou. No acidente, perdi a falange distal e os tendões do dedo da mão direita.
Senti-me inválido. Pensei que nunca mais fosse escrever, pegar uma colher,
fazer as coisas como costumava fazer. Aquilo me afetou muito e fez minha
depressão voltar. Eu estava com 23 anos.
Então comecei a falar comigo, que não podia aceitar aquilo. Quando saia na
rua, para ir fazer fisioterapia, era algo estranho, pois sempre encontrava alguém
com alguma deficiência: eram pessoas sem as pernas, sem os braços, enfim, com
algum problema. Então me encarei e parei de sentir pena de mim. Passei a
aceitar as coisas que não posso mudar. Afinal, não devemos nos prender àquilo
que não temos como mudar.
Estou, sempre que possível, procuro ver vídeos e materiais de motivação.
Também continuo escrevendo frases motivacionais. Hoje me considero curado
da depressão e sempre converso com pessoas que passam por este mesmo
problema.
Ariel Gomes de Araújo, 35 anos, auxiliar de farmácia, reside em Natal-
RN.


Para refletir
Quando falamos em depressão, não é e nunca será um caminho fácil, uma
constante, uma linha ascendente. Haverão momentos ruins, tropeços, recaídas.
Haverão melhoras, evoluções, alegrias.
Os sintomas, medicamentos e tratamentos podem variar muito de pessoa
para pessoa, afinal somos muito diferentes a nível biológico ou psicológico.
Amigos e parentes representam um apoio fundamental, mas apenas os
profissionais de saúde mental poderão te indicar o melhor tratamento.
A medicação e a psicoterapia são as duas pernas de um corpo só. Sem uma
delas será difícil se manter em pé por muito tempo, portanto é essencial que
você não desista caso a primeira tentativa não funcione. Por enquanto não
existem exames laboratoriais ou de imagem para detectar doenças mentais,
nem para indicar o tratamento que não terá efeito colateral algum.
É preciso paciência, persistência, apoio emocional das pessoas que convivem
conosco e respeito dos demais. A psicoterapia pode nos ajudar no
autoconhecimento, na tomada de consciência das nossas falhas e problemas, no
conhecimento das nossas capacidades e limitações, pois essas são as bases para
nossas realizações pessoais.
Algumas coisas não estão em nossas mãos para que possamos mudar, mas no
que pudermos mudar precisamos sempre tentar. O começo de toda revolução é
a mudança interior.
Ainda temos um longo caminho até a aceitação e total respeito pelas doenças
da mente. Mas enquanto isso, saiba que não é algo para se envergonhar,
esconder e mentir. Todos nós temos o direito de adoecer e de receber o devido
cuidado (até psicólogos e psiquiatras adoecem, e isso é completamente normal).
É importante lembrar que, mesmo que a escuridão seja muito intensa nos
momentos ruins, ela vai passar.
É só um dia ruim, não uma vida ruim.
Julia Wagner, psicóloga. Santa Bárbara d’Oeste-SP.

Mudar o que se pode mudar
Eu me olhava várias vezes no espelho e não me reconhecia. Eu era um
fantasma em vida, vagando, sem nada sentir, acorrentado em sensações
desesperadoras que me levavam a ideias obscuras. Até que ponto eu podia
aceitar ficar daquela forma? Até que ponto minhas forças ainda resistiam?
Eu devia mudar. Devia começar pequenos movimentos para retomar meu
amor próprio. O que eu podia modificar que estava mais próximo de minha
realidade e de minhas forças já tão exauridas? Pensei pelo mais básico: minha
alimentação. E o que fez eu sentir que devia mudar isso eram três constatações:
1) eu tinha emagrecido, pois não me alimentava;
2) para fazer algo é preciso energia e, neste caso, eu não estava comendo
direito;
3) eu tive uma crise de choro por não ter conseguido almoçar algo que eu
queria.
No caso da terceira constatação, lembro-me que fui a uma visita a um apiário
modelo, em Araras, construído de forma a buscar um consenso entre uma usina
de cana-de-açúcar e apicultores. Era um projeto pioneiro, que fui conhecer e
acompanhar. Após a palestra, tivemos uma visita técnica e, por fim, iríamos
almoçar. Ao chegar ao restaurante, fiquei maravilhado com as opções ali
disponíveis. Porém, eu não sentia fome. Naquele instante, senti um desespero se
apoderar de mim.
Conversei com as pessoas que estavam comigo e disse que tinha um
compromisso. Sai da mesa, fui ao meu carro. Entrei nele. Ali mesmo comecei a
chorar em desespero. Desespero por ter tanta comida gostosa e eu não sentir
fome. E se tentasse comer ali, teria ânsia. Voltei para minha cidade, chorando de
soluçar. Sentindo-me um perdedor: nem comer eu conseguia. Eu me sentia um
lixo, pois nem para me alimentar eu servia.
Cheguei em casa e chorei. Chorei por não ter tido forças de ter ficado ali. Por
me sentir impotente, fraco e, de certa forma, sem vontade alguma de existir.
Isso porque estava sem fome e não conseguia me alimentar. Então, engoli o
choro e falei comigo mesmo: “Vou me forçar a comer. Sem vontade, mas vou. Eu
preciso”.
Fui até a cozinha e tinha arroz, feijão e bife. Com lágrimas nos olhos, uma
ânsia a se apoderar de mim, e uma vontade tremenda de me esconder na cama,
eu resisti e comecei pelo mais básico: alimentar-me. A partir daquele dia, no
ápice da depressão, eu me obriguei a fazer algo que eu podia mudar – e era
básico: minha alimentação. Durante a semana, foi muito difícil. Eu não sentia
prazer nenhum em comer algo. Tudo parecia sem sabor e não descia goela
abaixo. Porém resisti e me forcei, chorando ou não, eu comia. Foi minha
pequena grande mudança.
A partir dela – que me propiciou a ter energia em meu corpo – comecei a dar
passos mais, digamos, ousados: fazer exercícios com maior frequência, sair com
amigos, me mobilizar para fazer coisas que eu me sentia responsável, como uma
horta, por exemplo. Eram ações pequenas vistas hoje, mas extremamente
importantes naquele momento de me reerguer e lutar contra a depressão.
Com o tempo, aprendi algo que me fez um bem danado: entender que eu tinha
direito de mudar muitas coisas que me deixavam infeliz. Eu apenas precisava
ter paciência para cultivar estas mudanças. Não são os passos rápidos que
fazem a diferença: eles cansam. Mas sim os mais lentos, numa caminhada,
porém insistentes e com convicção.
Desde então, após ter ciência de que havia coisas que eu podia mudar – e só
precisava lutar por isso, como pequenas metas – passei a me encarar como um
grande movimentador do universo ao meu redor. Passei a cultivar em mim uma
semente de criação: eu podia mudar muitas coisas que estavam ao meu alcance.
Sem criar expectativas demasiadas, eu podia modificar hábitos que estavam
me fazendo mal e, inclusive, mudar situações que estavam ao meu alcance. Uma
destas situações foi aprender a dizer não, quando eu costumeiramente dizia sim
só para agradar. Eu assumia responsabilidades que não me competiam, só para
agradar, enquanto que interiormente me sentia péssimo, pois não queria fazer
aquilo.
Eu só fazia para agradar. Mas quem era a pessoa que devia se sentir
valorizada? Quem merecia se reerguer? Era eu. Então, uma das minhas
mudanças foi aprender a falar não para as situações e tentar ser o mais
transparente – sem magoar – a outra pessoa. Era meu direito. E eu não deveria
abrir mão.
Há situações que não podemos mudar: elas dependem de outras pessoas, de
outras situações, ou mesmo são algo que faz parte de nossa essência enquanto
pessoa. Não estão em nossas mãos, mesmo que queiramos mudá-las. Há um
oceano de impossibilidades e tentar drenar esse oceano só gera infelicidade e
nos mergulha numa sensação de completa impotência e falta de amor-próprio.
Porém há situações que podemos mudar desde que passemos a movimentar o
universo para isso. Uma coisa que costumei a repetir aos meus amigos: quando
eu quero algo, eu movimento o universo. Eles encaram com um sorriso no rosto.
E eu encaro minhas palavras com o peso de minhas ações.
A depressão me ensinou a mover o universo: primeiro começamos com o
mais básico e, aos poucos, fazendo as adaptações, tudo vai tomando forma. As
peças vão se juntando da maneira que se podem juntar – lembrando que, às
vezes, os resultados podem não sair exatamente como planejamos à princípio,
mas o importante é movimentar o universo. Na ciência, até mesmo resultados
negativos são resultados importantes: mostram que aquele caminho não é o
melhor. Na vida, só temos certeza que um resultado não foi bom quando o
recebemos. Mesmo assim, quando não é de nosso agrado, devemos levantar a
cabeça, olharmos para frente e voltarmos a movimentar o universo.
Quando vou “movimentar o universo”, sempre me pergunto:
1) o que eu quero mudar será bom para mim?
2) essa mudança vai me levar para frente, sem prejudicar os outros?
3) vou me sentir mais confiante?
4) esta mudança vai trazer algo de bom para as outras pessoas, nem que seja
um aprendizado?
Se estas respostas forem sim, eu não hesito: começo a mover as coisas. Entro
em contato com amigos que podem me ajudar. Pesquiso. Vou atrás. Dou a cara a
tapa.
Mudar o que se pode mudar exige, acima de tudo, aprender que as mudanças
dependem de nós mesmos. E como dói mudar. Como machuca ter que tomar
decisões difíceis. Porém é libertador. Após algum tempo, você observa que, por
mais difícil que foi, você fez a coisa certa por você. Para viver bem, é preciso ter
honestidade consigo próprio.
É preciso entender que a depressão jamais vai embora se formos sabotadores
de nós mesmos, vivendo numa fantasia deixada para o amanhã. “Amanhã eu
faço isso”. O amanhã não existe, é apenas uma projeção. O que existe é o agora.
E é no agora que fazemos nossa mudança acontecer e podemos mudar o que
está ao nosso alcance. A depressão, por mais nefasta que tenha sido, me ensinou
que se eu quero mudar algo, eu não devo esperar. É necessário reunir as
energias disponíveis, certa dose de confiança e seguir de cabeça erguida.
Importe: sempre detestei ler autoajuda, pelo fato deles sempre repetirem a
ideia de que nós podemos mudar tudo o que queremos. Realmente, podemos
mudar. A questão é que, cada um tem sua história e isso deve ser levado em
consideração. Quando falo em movimentar o universo para mudarmos o que
podemos mudar para nos sentirmos em paz, eu me refiro a mudar o que está ao
nosso alcance, dentro de nossas possibilidades. Como disse acima, não em
passos rápidos, mas lentos. Porém, sempre para frente e agradecendo os
resultados.
Por mais difícil que seja, por mais doloroso que possa ser reunir as energias
para as mudanças, por menos esperançoso que pareça que algo surtirá efeito, é
preciso sempre se lembrar de tantas pessoas que, com o mínimo, conseguiram
seguir em frente e fizeram transformações. Grandes árvores não nascem
gigantescas: começam pequenas. Eu quando começava a me sentir sem
esperança quanto a vencer a depressão, me lembrava de amigos que tiveram ela
e se curaram. Era minha pequena meta: se meu amigo conseguiu, eu ia
conseguir. E consegui.
Por isso, mudar o que se pode mudar e aceitar o que não se pode é algo muito
importante para se sentir bem consigo. Mais do que sermos felizes, devemos
buscar estar bem consigo próprio: essa é a grande chave para enfrentar a
depressão. A felicidade é passageira, feito uma brisa numa tarde quente. Mas
estar bem consigo próprio é uma sensação sem explicação. É uma paz que nos
ajuda a passar momentos tristes de uma forma completamente diferente.
Cabe a cada um de nós sempre ficarmos atentos a entender que, muitas vezes,
a melhor forma de lidarmos com um problema, é encara-lo de frente e
movimentarmos o universo para fazer mudanças.

Depoimento
Após algumas perdas iniciei o processo de depressão. Ela não se manifesta do
nada. Você não dorme bem e acorda depressivo. É um processo. No meu caso,
comecei a ter resfriados e crises alérgicas muito constantes, além de sentir
muito cansaço e euforia ao mesmo tempo. Mal descansava, já queria sair, me
encontrar com pessoas, fazer qualquer coisa. Nunca escolhia o que fazer:
sempre me encaixava nos programas escolhidos. Aliás, nem pessoas eu escolhia,
me contentava em ser escolhida.
E foi justamente nessas "escolhas" que entrei em um quadro de depressão
profunda. Eu só queria dormir. Aliás, passava o dia todo na cama, sem coragem
para viver. O toque de mensagem do celular me aterrorizava. Eu me esquecia de
tomar banho e driblava a fome tomando água. Cheguei a um ponto em que
fiquei apática e não conversava.
Minha família nunca me abandonou. Porém alguns amigos chegaram a falar
que, enquanto eu não deixasse de ser lagarta para virar borboleta, nunca seria
melhor. Aliás, é muito comum críticas desse tipo. A depressão dói. Dói a alma e
o físico. Meus pais agendaram um psiquiatra e falaram que eu necessitava de
ajuda. Aceitei prontamente e fui sozinha. O médico era muito consciente e optou
em não me dopar, mas precisou receitar antidepressivo.
Realmente, eu melhorei. Arrumei outro trabalho, mas não contei que tomava
esse medicamento, pois tinha medo de não ser aceita no emprego. De fato,
fiquei sabendo que eu não teria sido aceita se soubessem que eu tomava
medicação contra depressão. Após um ano e meio de uso do antidepressivo,
decidi parar. Fui diminuindo as doses e substituindo por terapias alternativas,
como Reiki, florais e outras. Não é aconselhável fazer isso!
Nesse período eu estava com sobrepeso de 12kg. Então, voltei a fazer
atividades físicas e precisei aceitar que minha resistência não era mais a
mesma: o antidepressivo "rouba forças", mas a depressão não existia mais.
Havia apenas aquelas sequelas que, com o tempo, foram diminuindo.
O mais importante é aprender a respeitar nossa condição física e emocional,
buscar ajuda profissional e NUNCA se sentir vítima, mas sim dono e merecedor
da vida. A depressão me ensinou a ter o direito de escolher o que de fato a gente
quer. Ela me permitiu a falar não em situações que eu realmente queria dizer
não, mas antes não conseguia. E, além disso, ela me ensinou a ter compaixão
pelas pessoas. Hoje eu me amo e vivo muito bem comigo mesma.
Luciana Ruffo, 46 anos, coaching pessoal e terapeuta. Piracicaba-SP.

Para refletir
Mudar é preciso...
“Quando a dor de não estar vivendo for maior que
o medo da mudança, a pessoa muda.”
Sigmund Freud

Mudar dói. Tentamos a todo custo evitar essa dor, porque ela vai nos
incomodar, tirar de uma situação quase letárgica para vislumbrar o que não
conhecemos, o novo. Não nos damos conta que nossa vida é regida pela Lei da
Impermanência, ou seja, estamos sempre mudando, o tempo todo. Quando de
fato introjetarmos isso, a vida torna-se mais leve, menos pesada, porque
sabemos que mudar faz parte de um processo natural.
Mas mudar o quê? Simples, mudar o que se pode mudar, aquilo que nos
incomoda, mudar o que se quer mudar, que nos prende, romper ciclos que vão
nos transformando em indivíduos carregados de dores, tristezas e incertezas
quase que permanentes.
Mudar implica em escolhas e consequências, e se faz necessário o
rompimento de velhas concepções, falsas crenças e formas de pensar, pois estas
nos aprisionam e transformam em cadáveres vivos, agindo somente para
cumprir as regras básicas do viver ou do existir e conforme com as suas
escolhas será que você vive ou apenas existe?
A mudança só se inicia quando tomamos consciência da nossa necessidade de
mudar, saber que não há como antecipar-se, nem adiamento, apenas o tempo
propício de cada um para iniciar seu processo e perceber que não precisamos
eliminar nada do que nos constitui, que vamos afinando e desafinado,
parafraseando Guimarães Rosa, mas que podemos transformar e ressignificar
para melhor o que somos hoje.
Edvaldo Martino, educador e psicanalista, com especialização em Clínica
Psicanalítica. Americana-SP.

Expectativas demasiadas
Vivemos em um momento em que o mundo parece ter outra conformação. É
tudo muito fluído, rápido, volátil. Como se as relações que surgem tivessem uma
data de validade para acabar. Ou ainda, que devemos atender certas
expectativas para podermos nos enquadrar a essa sociedade: temos que ser os
melhores em tudo, viver como se estivéssemos num sonho, além do que não
devemos demonstrar nossas fraquezas. Parece que devemos ser forjados de tal
forma a sermos eternamente felizes e que, qualquer tristeza, já nos transforma
em um perdedor. Imagine quem tem depressão?
Neste mundo – doentio, digo eu – nós acabamos por projetar e esperar
demais de circunstâncias que não estão sob nosso poder. Projetamos e criamos
expectativas ilusórias sobre como poderemos ser felizes e como devemos ser
felizes. Idealizamos nossa vida perfeita e lutamos contra qualquer corrente que
surja, batendo de frente para alcançar o objetivo: continuamos num emprego
que ganhamos bem, mas não sentimos prazer; continuamos um curso que não
suportamos, só para termos um diploma; continuamos num relacionamento
que não nos faz sentir vivo só pelo comodismo e o medo de não conseguir outra
pessoa. Tudo isso para continuar atendendo certas expectativas e, o pior,
criadas por quem? Muitas vezes, por nós mesmo. Outras, pela pressão social.
E o que as expectativas têm relação com a depressão? Pegava-me inúmeras
vezes, quando depressivo, criando expectativas sobre circunstâncias que eu não
podia e nem tinha como controlar. Imaginava – sempre de forma negativa e em
suas piores consequências – o que minhas ações refletiriam nos outros.
Logo, eu me negava a mim mesmo. Recolhia-me em meu mundo escuro e
sufocante, só para atender as projeções das outras pessoas. Ao querer projetar a
vida idealizada por elas, para mim, eu me diminuía. Sentia-me impotente,
apenas um mero fantoche seguindo as linhas delimitadas pela pressão alheia.
Sentir-se sufocado pelas expectativas me ajudou, como uma âncora a mais, a
me afundar na depressão. É difícil crescer cercado pela pressão – mesmo que
involuntária – de você ter que ser o melhor em tudo, de ser aquele que sempre
tem que dizer sim. De achar que, por você não atender os anseios das pessoas
que você mais ama, você é menos que os outros.
Que espécie de relação é essa? Que nos sufoca e nos faz sentir reféns de
pensamentos limitantes? Até que ponto a outra pessoa tem direito de projetar o
que ela quer em nossas vidas? Por que temos tanto essa necessidade de atender
as expectativas de quem amamos – sendo que essas expectativas podem não ser
a que sentirmos serem as melhores para o nosso bem-estar?
A depressão transforma todas essas questões numa caixa de ressonância.
Pelo menos para mim. Lembro-me perfeitamente o quanto eu ficava refletindo
sobre o que as pessoas desejavam para minha felicidade e eu sabia, claramente,
que muitas coisas eu não poderia atender. Seja por que não fazia parte de mim,
outras por que não me sentia realizado enquanto pessoa. Isso me fazia sofrer,
me sentir diminuído, fraco, sem reação. Culpava-me o tempo todo, me sentindo
a pior pessoa do mundo. Eu me via querendo atender expectativas que não
eram minhas, mas eu as amplificava – por conta da pressão que havia ali.
Queremos ser sempre aceitos e, ao atender as expectativas, julgamos que isso
seja a melhor coisa a se fazer.
Quantas e quantas vezes dissemos sim, mesmo querendo dizer não? Quantas
e quantas vezes nos anulamos enquanto seres humanos só para deixarmos os
outros felizes, com a sensação de que somos os mais perfeitos possíveis?
Quantas vezes colocamos nosso bem-estar de lado só para atendermos
expectativas que, por incrível que pareçam, de forma alguma vão melhorar
nossa autoestima? Essas expectativas demasiadas nos sugam, transformam-nos
em mortos em vida. Não é justo conosco boicotarmos nossas vontades, desejos
e nossa essência só para atender os desejos alheios.
A depressão me ensinou a me questionar muito sobre minha vida e sobre o
que realmente me faz sentir bem. Não falo em questão de felicidade, que é algo
passageiro, mas falo em me sentir bem e confiante comigo próprio, mesmo
diante das adversidades.
A depressão me ensinou que nem todas as expectativas eu consigo atender e,
felizmente, ela me ensinou que dizer não e dar um basta a situações que me
oprimiam são a melhor coisa a se fazer. Ela me colocou lá no fundo, para
mostrar que se eu não erguesse a cabeça ia perder cada vez mais a respiração
naquele poço lamacento e escuro que ela é.
Com a depressão aprendi que eu também não tenho direito – e nem posso –
de projetar minhas expectativas demais nas outras pessoas. Elas são únicas. Eu
tenho apenas o direito (e elas também) de exigir respeito. Apenas isso. Mas nem
eu, nem elas, temos o direito a projetar nossas expectativas nos outros.
É um abuso querer que alguém faça algo só porque julgamos ser o melhor.
Cada um tem sua história e querer reduzi-las a nossa vontade é como manipular
uma marionete, que está ali só para seguir os movimentos determinados. Não é
justo e nem certo querer que as outras pessoas vivam a vida conforme nosso
olhar. Nem justo e correto vivermos o que elas projetam para nós.
Já dizia Fritz Perls, na oração da Gestalt: “Eu sou eu, você é você. Eu faço as
minhas coisas e você faz as suas coisas. Eu sou eu, você é você. Não estou neste mundo
para viver de acordo com as suas expectativas. E nem você o está para viver de acordo
com as minhas. Eu sou eu, você é você. Se por acaso nos encontrarmos, é lindo. Se não,
não há o que fazer”.
Nós sempre esperamos receber em troca aquilo que oferecemos, mas cada
pessoa é de um jeito, tem sua história, sua forma de lidar com o mundo – é algo
próprio dela, que a torna única. Às vezes, elas acham que o retorno que elas dão
quanto as nossas expectativas já é o suficiente – pelo menos do ponto de vista
dela. Ou ainda, elas não podem oferecer mais do que estão oferecendo – por
conta das circunstâncias que elas vivenciam.
Assim, a oração da Gestalt, por incrível que pareça, traduz uma das coisas que
mais precisamos entender para sairmos da depressão: pararmos de criar tantas
expectativas nas outras pessoas, como também pararmos de projetarmos expectativas
alheias em nós. Caso nossas expectativas caminhem junto com a da outra pessoa, será
lindo. Senão, não há o que fazer, apenas respeitar e entender que cada um é único.

Depoimento
Minha depressão teve início em 2004, quando comecei a sentir um grande
cansaço e, junto das responsabilidades do meu trabalho, cheguei a um quadro
clínico bem desconfortável. Mas a gente só acredita mesmo quando o nosso
físico dá sinais de que a mente e a alma não estão bem.
Meus sentimentos eram tão confusos, que meu estado consciente, em vão,
tentava compreender. Cheguei a nutrir um estado de medo que beirava o pavor
todas as vezes que o celular tocava. Sei que não havia lógica alguma. E esse
estado de irracionalidade me causava ainda mais medo. Esse foi meu primeiro
contato com o pânico. Nesse período, sentia-me confortável apenas na
companhia do meu filho que, na época, tinha apenas 3 anos. Minha única
vontade era de me esconder do mundo, me desligar da realidade e da
convivência social.
O primeiro passo para buscar a melhora foi entender o que é a depressão.
Procurei ajuda profissional, mas foi a filosofia quem mais me ajudou superar
essa fase e resolver essa equação. Descobri as origens de todos meus males, a
começar pela etimologia da palavra Pânico.
Oriunda do deus grego Pan, uma entidade que vivia nas florestas e que tinha
como passatempo tão somente tocar sua flauta e aplicar sustos em quem quer
que fosse. Porém, todo aquele que o conhecesse, jamais se assustaria
novamente. Compreendi, portanto, que meu medo, assim como Pan, era sem
causa aparente: um medo tolo, que pra ser superado, deveria tão somente
encarar seu algoz de frente.
“Identificar” foi o segundo passo para começar o processo de aterro da lacuna
da alma. Assim, listei em uma folha de papel tudo aquilo que me causava
desconforto. Comecei, portanto, o processo de eliminação de todas as causas. No
meu caso, o peso das responsabilidades e os compromissos que o desempenho
profissional gerava diariamente eram as causas de toda fadiga emocional.
Assim, iniciei um processo de purga: onde havia sete funcionários para dar
ordens, pagar encargos, despesas e tributações, mantive apenas um. No lugar
dos fornecedores e linhas de crédito a perder de vista, passei a comprar tudo à
vista e não mais fazer uso do crédito, justamente para evitar desconforto com
fornecedores. Desse modo, fui enfrentando meus medos, um a um e enterrando
de modo firme, seguro e definitivo a lacuna causada na alma.
Resumindo: para sair da depressão, busquei entender os motivos, identificar
as alegrias que foram perdidas, e “preencher” a lacuna surgida pelo desgaste e
pelas intempéries da vida. No lugar que havia um “buraco”, aterrei tudo aquilo
que me causava desconforto e sofrimento, trazendo de volta o contentamento
por uma vida mais simples. Isso foi, para mim, a única forma de aplanar o vazio
na alma e voltar a ter uma vida calma e tranquila, como uma planície verdejante
e florida de primavera.
Eduardo Ferreira Junior, 46 anos, filósofo e teólogo. Americana-SP.

Para refletir
O tempo é o tecido da vida. As alegrias, tristezas, ansiedades surgem e
desaparecem com e no tempo. No mundo contemporâneo encontrar o
equilíbrio para dar conta dos compromissos e viver momentos de plenitude
exige muito mais do que uma agenda organizada. Requer a disciplina e a
coragem de olhar para si e avaliar o que realmente se pode e se quer fazer com
o tempo. Assim, ou se prioriza na vida aquilo que realmente importa ou
continua correndo atrás de tempo para as tarefas e rotina que, na grande
maioria das vezes, não significa a realização pessoal.
O curioso é que o tempo da experiência, da reflexão, da chamada vida
subjetiva está sendo atropelado pelo tempo do trabalho. O trabalho é o
organizador do tempo e da vida das pessoas. Essa desvalorização do tempo,
como tempo de vida, causa muito vazio e angústia. Como diz Antônio Candido:
“O capitalismo se considera senhor do tempo. Essa ideia do ‘tempo é dinheiro’ que
rege a vida moderna é uma brutalidade. O tempo é o tecido da nossa vida”. Então,
se você negocia a matéria-prima da sua vida, valendo dinheiro, a vida se
desvaloriza e perde sentido.
Para acompanhar os valores e a cadência da vida social e familiar somos
orquestrados desde cedo a entrar no ritmo acelerado da vida: escola, tarefas
escolares, esportes, curso de línguas. Os dias da semana são preenchidos com
atividades que nos lançam, diariamente, em uma jornada operária. Atualmente,
somos estimulados dentro e fora de casa por imagens, sons, celular, internet,
redes sociais, trânsito, múltiplas atividades e vários lugares no mesmo dia. Na
Escola, por exemplo, vão dos Persas à Guerra Fria em duas apostilas. Por
melhor que seja o professor, o curto espaço de tempo e quantidade de fatos
históricos determinados pelo material, o impede de mostrar a beleza do
conhecimento.
Para a maioria das pessoas, qual é o “tempo do silêncio”, da observação, da
reflexão de tudo o que foi aprendido na vida?
A vida acelerada e a desvalorização da observação, do silêncio, da
contemplação como elementos significativos da vida, impedem-nos de aprender
a importância de nos conhecermos e conhecermos o nosso meio. Em que
momento aprendemos e observamos a vida como ela realmente é? Ou
deciframos o enigma do tempo ou seremos devorados por ele.
“O silêncio é uma clareira, uma luz sob a qual pode se refletir (daí reflexão)
aquilo que antes vivia nas trevas. Só depois é que sentiremos a necessidade de sair
do silêncio e ir em busca de palavras para comunicar a descoberta”. Dulce Citrelli
Eliana de Gasperi Rodrigues, socióloga, mestre em Educação e
Comunicação, proprietária do Espaço do Saber Oficinas. Araras-SP.



A importância do choro
Acho que uma das coisas mais difíceis, no decorrer do meu processo
depressivo, foi sempre ter que aparentar estar bem para todos. Eu sorria, fazia
piadas, era a pessoa mais engraçada, que todos queriam por perto. Fazia o
ambiente se tornar mais divertido com o meu modo brincalhão, pois eu não
queria deixar transparecer que eu estava me desfragmentando aos poucos.
Eu represava todos meus sentimentos, usando o estudo e o trabalho para
encobrir tudo o que eu sentia. Emendava feriados trabalhando e estudando. Não
me dedicava a nada que permitisse eu me entender enquanto pessoa. Eu vagava
em vida, demonstrando um sorriso sempre no rosto, uma forma acolhedora de
mostrar ao mundo que eu aparentava estar bem. Foram anos e anos vivendo
um teatro, em que eu representava uma pessoa de bem com a vida. Mas que,
por dentro, restava apenas uma estrutura tentando se sustentar.
Até que, por fim, quando bateu a maior crise da depressão, eu já não tive mais
forças para representar que estava vai. Quantas e quantas vezes, ao acordar, a
primeira coisa que fiz foi chorar. Acordava com os olhos já lacrimejando e,
assim que tinha noção de que mais um dia se iniciava, eu começava a soluçar.
Por projetar que seria mais um dia de dor. Mais um dia de vazio. Mais um dia
que eu teria que suportar toda aquela ausência se sentimentos. Eu chorava
copiosamente, por não ter perspectivas do que minha vida estava se
transformando.
Ficava na cama, olhando para o teto, sentindo um vazio a me apertar o
estômago. As lágrimas umidificavam meu travesseiro. Eu me segurava, em
posição fetal, tentando me encolher do mundo. Tinha as crises de choro logo
pela manhã. Sentia-me a pior pessoa do universo, por me estar daquela forma.
Culpava-me por achar que eu não deveria ter depressão, tendo em vista que
minha vida sempre foi boa: nunca passei necessidades. E houve quem me
esfregasse na cara que, realmente, eu não tinha motivos para ter depressão,
“pois tinha tudo o que eu queria ter”. Aquilo me machucava demais. As pessoas
não entendiam que, embora eu tivesse tudo, faltava-me algo. A depressão havia
me ceifado qualquer possibilidade de sentir prazer.
O choro vinha a todo o momento e eu o encarava como algo ruim,
vergonhoso, que me inferiorizava. Eu me sentia fraco, patético, repleto de
vergonha por chorar. Fui então perceber, depois de algum tempo, que eu
deveria utilizá-lo a meu favor. Transformá-lo em um instrumento de limpeza.
Percebi que, após as crises compulsivas de choro (que me deixavam péssimo)
vinha um momento de certa tranquilidade.
Eu não devia mais observar o choro como algo vergonhoso. A questão estava
em encará-lo como um momento de desprendimento de emoções que eu não
conseguia mais represar. A partir do momento que comecei a entender que eu
não devia lutar para suprimi-lo, passei a usá-lo a meu favor: ele se transformou
numa forma de limpar o meu interior.
Inclusive, tornei-me uma pessoa mais sensível, a ponto de me permitir
emocionar com filmes e livros, ou mesmo depoimentos de pessoas. Antes, eu me
segurava, não permitia que uma lágrima sequer saísse. Até mesmo quando
criança, assistindo ao Rei Leão, eu segurei as lágrimas quando o pai do Simba foi
morto. Lembro até hoje, que eu assisti ao filme numa fita VHS e, neste momento
em que o pai de Simba morreu, eu senti um nó na garganta. Um nó tão forte que
significava: você queria chorar, mas você não permitiu.
Quantas e quantas vezes represamos sentimentos? Quantas vezes abolimos o
sentir para se convencionar à frieza desta sociedade que não aceita fraquezas?
Não somos seres mecânicos, sem sentimentos. Apenas psicopatas conseguem
ser frios a ponto de não se emocionar, não se colocar no lugar do outro, não
sentir a dor alheia.
Chorar é um desprendimento de uma série de sentimentos e encarar as
lágrimas como uma forma de se libertar de algo aprisionado é bem-vindo. É um
processo de entender que chorar não é vergonhoso, não é fraqueza, não te faz
inferior. É apenas uma forma de expor a dor ou outro sentimento aprisionado e,
assim, esculpi-lo em lágrimas para serem colocadas para fora. E depois do
choro, nada melhor que enxugar as lágrimas, buscar apoio, levantar a cabeça e
ir, aos poucos, lutando para se reerguer.

Para refletir
O choro é um fenômeno complexo ainda não entendido completamente por
todos aqueles que o estudam. Sabemos que ele pode ter várias funções:
biológicas (ex: proteger os olhos); sociais (ex: comunicação e manipulação) e
psicológicas (ex: extravasar emoções). No caso de pessoas com depressão, uma
regrinha genérica pode ser importante: não reprimir, mas não incentivar.
Não devemos reprimir o choro, pois é evidente que ele pode fazer bem.
Infelizmente, grande parte das culturas do mundo o transformou em tabu. No
entanto, ele é uma maneira genuína de expressar diversos estados, como
tristeza ou raiva, e pode funcionar como uma “válvula de escape”, impedindo
que essas emoções se reprimam e acarretem em sintomas físicos, chamados
sintomas psicossomáticos.
Além disso, o choro ajuda na diminuição da tensão. Ele ativa a liberação de
substâncias como a noradrenalina e a serotonina, envolvidas no processamento
de emoções e na sensação de alívio.
Entretanto, não devemos enxergar o choro constante como remédio para a
tristeza: o famoso “chora que passa”. A depressão vai muito além de uma
simples tristeza ou acúmulo de tensão. Geralmente, as pessoas deprimidas não
conseguem expressar a razão de suas emoções negativas e, nesses casos, o
choro constante pode ocasionar em piora do humor. Além disso, algumas
pesquisas têm demonstrado que o acolhimento do choro por outra pessoa é tão
ou mais importante que o choro em si.
Portanto, evite os extremos: se você conhece alguém com depressão, não diga
frases como “não chore, quero te ver feliz” ou “chore bastante porque faz bem”.
O ideal é que você apenas ofereça uma companhia empática e, quando a crise de
choro passar, sugira algo simples e sutil que possam fazer juntos para melhorar
o humor da pessoa.
Se você tem depressão, lembre-se: choro não é sinal de fraqueza. Quando se
sentir à vontade, expresse suas emoções por meio dele, mas procure permitir
que as pessoas a sua volta o ajudem.
Eduardo G. Moretti, psicólogo clínico na abordagem Cognitivo-
Comportamental. Campinas-SP e Americana-SP.






A importância do sono
Pode parecer bobeira, mas dormir com qualidade pode ser uma ajuda e tanto
na depressão. Segundo estudo², existe uma associação muito íntima entre a
depressão e os transtornos do sono, como insônia, sonolência excessiva e
pesadelos, sendo que 80% das pessoas com depressão apresentam queixas
relacionadas a estes problemas.
Não apenas insônia, mas o ato de dormir demais pode ser um dos sintomas da
depressão. E agir nessa linha de frente, buscando um sono de qualidade, pode
ser uma ferramenta muito interessante. Particularmente, quando tive as crises
de depressão, eu queria apenas dormir. Era uma fuga da realidade. Trancava-
me no quarto e fechava os olhos, como se assim pudesse me desconectar do
mundo real.
À noite, por ter dormido de dia, não sentia sono. Demorava, portanto, para
conseguir relaxar e me desligar completamente. E quando conseguia, por fim,
adormecer, era um sono intranquilo. Muitas vezes acordava com dores no
corpo, cabeça pesada, uma sensação de fadiga. Não era um repouso
revitalizador, como deve ser o sono. Era como se eu estivesse apenas levemente
desligado, com o corpo e a mente sem realmente descansarem.
Percebi que se continuasse a agir daquela forma, não conseguiria
restabelecer-me de nada. Dormir, com qualidade, é algo essencial e eu estava
completamente desiquilibrado, o que afetava, inclusive, ainda mais minha
depressão. É no sono, por exemplo, que são secretados hormônios, como a
melatonina. Este hormônio é produzido quando há ausência de luz e sua função,
principalmente, é regular o relógio biológico. Assim, num ambiente escuro e
calmo, os níveis deste hormônio aumentam, causando o sono. É daí a
importância de manter um quarto sem fontes de luz.
Assim, passei a fazer pequenas alterações, inclusive, a encostar a porta do
quarto para que não entrasse nenhuma fonte de luz e, inclusive, virar meu
rádio-relógio (que brilha no escuro) para outro lado. Também me proibi de
dormir à tarde, pois sabia que isso influenciava no meu sono noturno.
Também tentei diminuir o uso de aparelhos eletrônicos antes de dormir. E
nisso me baseei em algumas pesquisas para tentar ver o que eu podia melhorar
em minha vida, de forma a lutar contra a depressão. Numa de minhas leituras, vi
algumas abordagens que relacionavam a qualidade de sono e o uso de
aparelhos eletrônicos (celulares, tablets, notebook).
Um estudo³ com adolescentes mostra que o uso diurno e prologando de
dispositivos eletrônicos tem influência na qualidade do sono. Quanto mais
tempo em frente às telas, maior a perturbação e menor a duração do sono.
Passei então a evitar, pelo menos um tempo antes de dormir, o uso destes
aparelhos.
Outra atitude tomada: cortei, antes de dormir, alimentos com cafeína (como
chocolate, por exemplo, que é estimulante) e investi em exercícios, porém com
praticados umas 3 ou 4 horas antes de dormir. O motivo? Exercícios pesados
feitos muito próximos ao horário de dormir dificultam ainda mais “fechar os
olhos”, pois nos deixam agitados4, 5.
Lógico: foi todo um processo, pois precisei ir me readaptando e me
reeducando. Não se trata de mágica, mas sim de uma boa dose de persistência.
E a depressão, nesse ponto, me ajudou a mudar alguns hábitos para melhor.
Como exemplo, antes de dormir passei a meditar. Fechar os olhos, buscar
limpar a mente, prestando atenção na respiração: aprendi. Inclusive, a me
acalmar desta forma. E passei também a agradecer tudo: inclusive o que
aconteceu de ruim, pois mesmo o que é ruim, torna-se um aprendizado. Foram
pequenas coisas, mas que me ajudaram substancialmente a dormir melhor.
Lembrando que cada pessoa é única e, inclusive, em alguns casos, quando os
distúrbios de sono afetam a saúde, é necessário buscar ajuda médica. Todo
suporte e orientação de especialistas são fundamentais para ajudar no processo
de reestabelecimento do bem-estar.

Para refletir
Você pode estar em repouso enquanto dorme, mas sem que você perceba, há
profundas mudanças no funcionamento do cérebro e do corpo nesse período,
dependendo da fase do sono em que você se encontra: fase dos sonhos, sono
leve ou sono profundo.
O sono é consequente a uma fase ativa do encéfalo, que apresenta mudanças
nos neurotransmissores e na circuitaria, ou conexões entre os neurônios. E tudo
isso acarreta mudanças na fisiologia corporal.
Durante o sono, entre os processos que ocorrem, podemos citar a alteração
na temperatura corporal. Ela tende a variar um pouco durante o dia, porém
durante o sono ela chega a cair até 2ºC. E isso proporciona um sono melhor.
Outras alterações que ocorrem estão relacionadas ao ritmo cardíaco, pressão
arterial e fluxo sanguíneo. Desta forma, quando dormimos, o ritmo cardíaco e a
pressão arterial diferem de quando estamos acordados. Vale lembrar que,
inclusive, o fluxo sanguíneo causa, por exemplo, respostas sexuais. No caso dos
homens, ele causa ereções. Já em mulheres, o clitóris sofre um ingurgitamento
sanguíneo, ou seja, ele se “incha” de sangue.
Também é interessante ressaltar a atividade encefálica, ou seja, o que ocorre
em nosso cérebro. Durante o sono REM (Rapid Eye Movement), ou seja, a fase
em que ocorrem os sonhos mais vívidos, a atividade cerebral é até mais
acentuada quando comparada à vigília, com redução dos movimentos corporais
e da comunicação com o meio externo.
E quando falamos em respiração, durante a maior parte do sono respiramos
de modo regular e mais vagarosamente, havendo tendência a um relaxamento
da musculatura e, consequentemente, da musculatura da garganta – e isso
facilita os prejudiciais roncos.
Essas mudanças fisiológicas durante o sono criam condições para o corpo
reparar células danificadas e para que nossas experiências diárias sejam
organizadas, consolidando a memória e possibilitando-nos entender melhor o
que se passa em nossa vida, fundamental para a saúde mental e para o controle
de estados depressivos.
Para dormir melhor, deite-se para dormir e deixe para o sono cuidar da
solução de seus problemas ou aceitação dos fatos, cuidando para que haja um
ambiente agradável em termos de luz, ventilação e temperatura e,
principalmente: respire bem e livremente, porque senão o acúmulo de CO2 no
corpo vai estimular o Encéfalo e você não vai dormir bem – aumentando o risco
de obesidade, diabetes, acidente vascular encefálico e demência.
Nestor Truite Jr., médico neurologista e membro titular da Academia
Brasileira de Neurologia. Americana-SP.
A importância da família
Parte do que somos, devemos à nossa família. E por família não digo apenas
aqueles que dividem conosco nossos genes, mas sim os que nos acompanham
no decorrer da vida. São todos aqueles que, de alguma maneira, se conectam a
nós por algum elo sentimental mais forte. O que é a vida, se não uma grande
conexão?
No processo depressivo, o apoio familiar é essencial. Ainda mais quando nos
isolamos do mundo, por simplesmente já estarmos exauridos. Assim, a presença
de alguém que nos seja íntimo faz toda a diferença. Seja pelo apoio, seja pela
palavra de conforto, seja simplesmente por segurar nossas mãos e nos dizer
palavras de incentivo. Um abraço faz toda a diferença quando nos sentimos
completamente sós. E alguém que podemos chamar de família pode ser peça
essencial na luta contra a depressão.
É confortador ter alguém que nos olhe e entenda que estamos doentes ao ter
depressão. Não é charme, não queremos chamar atenção e, muito menos,
estamos depressivos porque queremos. É um processo se recuperar desta
doença, que envolve diversas linhas de frente e muita luta interior para lidar
com o vazio existencial. É uma doença em que precisamos preencher nosso
vazio com coisas boas, mesmo que não haja vontade nenhuma.
Ter alguém íntimo, que nos conheça e nos apoie, faz a diferença nesta batalha
em que, sozinhos, sofremos a ponto de não sentirmos mais nem vontade de
viver. Quando estamos desistindo de lutar, ter uma pessoa que nos lembre o
quanto somos importantes para elas, como fazemos a diferença no mundo e
como somos especiais, de certa forma, faz-nos resgatar um pingo do amor
próprio que, quando temos depressão, já nem nos lembramos que existe.
A família, neste aspecto, pode ser a maior aliada da pessoa com depressão. E,
para tanto, ter alguém com paciência, neste processo, é essencial. Não se
escolhe ter depressão. Caímos nela sem que percebamos, pois vamos, com o
tempo, permitindo nosso esvaziamento frente a esse mundo que é líquido e
completamente doente, com seus valores humanos esvaziados. Somos como
joias que, com o tempo, por conta de uma série de fatores, vão escurecendo e
perdendo o brilho. O que antes era uma reluzente joia de ouro, com a depressão,
passa a ser tomada por uma camada escurecida, que ofusca o verdadeiro brilho.
E quem pode ajudar neste aspecto são aqueles que podemos chamar de
família e, principalmente, aqueles que nos sentimos confortados. São os mais
próximos que podem auxiliar no processo de polimento de nossa vida. E tudo
vai aos pouquinhos: uma palavra de conforto, um ouvido destinado a nos ouvir,
um aperto para que nos alimentemos bem, a preocupação em dar um conselho,
enfim, pequenas atitudes que, podem parecer bobas, mas nos ajudam, quando
estamos com depressão, a ver um pinguinho de luz. Inclusive, levar-nos em
busca de tratamento.
Ter algum familiar nos ajudando no processo depressivo é a mesma coisa que
termos uma fagulha numa caverna. Pode parecer pouco, mas faz toda a
diferença para caminharmos em meio a um labirinto repleto de falsas saídas.
Essa fagulha, chamada amor, faz com que sintamos que há alguém que se
importa conosco – mesmo que nós, por conta da depressão, não nos sintamos
mais especiais.
É esse amor, do outro, que pode vir a nos ajudar preencher, ao longo do
tempo, com um pouco de amor próprio. De gotinha em gotinha, os passos se
tornam mais fortalecidos para continuarmos na caminhada dentro do labirinto
até que consigamos achar a saída. Portanto, buscar apoio daqueles que somos
íntimos pode ser uma grande diferencial nesta luta contra a depressão. A partir
dessa ajuda podemos ter um pouco mais de forças para enfrentar essa doença
que torna nossos dias cinzentos.

Depoimento
A depressão me acompanhou por longos dois anos da minha vida. Foi um
período de muito sofrimento, muita mistura de sentimentos e nenhum deles era
bom. Não acredito que alguém em estado de depressão tenha força para buscar
ajuda sozinho e então a busca pela minha cura não partiu de mim.
Depois de muito tempo vivendo dependente de remédios controlados e
trancada no escuro do meu quarto, minha mãe tomou as rédeas da minha vida e
me levou para o tratamento totalmente contra a minha vontade. Um tratamento
completamente desconhecido por mim, o qual foi sugerido por um amigo que
fazia acompanhamento com o filho hiperativo.
A minha cura veio desse tratamento, dessa ajuda. Foi aplicado em mim o
Reiki, que é a cura pela troca de energia entre reikiano e paciente e os cuidados
com seus chakras. Também fiz acupuntura, a qual conta com a aplicação de
agulhas nos pontos de necessidade de cura e, também, a meditação, que
trabalha o autoconhecimento e a cura interior.
Todo esse processo, hoje amado e admirado por mim, me ajudou a me
conhecer, me entender e principalmente a ter controle com meus impulsos e
emoções. É um processo longo, um trabalho e busca para toda uma vida. Não é
fácil quando realmente nos conhecemos e conseguimos nos enxergar com olhos
de outras pessoas, mas é muito compensador, pois nos dá a chance de estarmos
sempre buscando o crescimento e aperfeiçoamento como ser humano. Hoje sou
grata por tudo o que me aconteceu pois me transformou em uma pessoa muito
melhor.
Débora Donanzan, 35 anos, autônoma. Santa Bárbara d'Oeste-SP.


Para refletir
A temática que envolve o assunto depressão é rodeada de tabus, tais como:
“isso é coisa da sua cabeça”; “você só precisa se ocupar”; “levanta dessa cama e
vai fazer alguma coisa”. Ao contrário do que muitos pensam, a pessoa que sofre
de depressão não se encontra neste estado porque quer, a depressão envolve
aspectos psicológicos e emocionais que causam sofrimento e incapacidade, por
exemplo, para realizar atividades que antes eram prazerosas. Diante disso, não
poderia deixar de mencionar a importância do apoio familiar no tratamento de
pacientes depressivos.
A compreensão familiar nestes casos é essencial, pois a depressão é uma
doença que precisa de acompanhamento com psiquiatra e psicólogo para que a
medicação aliada à psicoterapia possa trazer resultados positivos. É sempre
muito importante que a família busque informações a respeito da depressão
para que assim possam compreender que isto não é frescura e por meio da rede
de apoio dos profissionais possam aprender também formas de auxiliar seus
entes queridos, além disso, quando há resistência do paciente em buscar
atendimento, as pessoas de seu convívio são peças fundamentais para que a
procura ocorra, pois devido aos estigmas a pessoa chega a pensar que ela pode
resolver tudo sozinha. Quando na verdade o apoio pode colaborar para que a
pessoa perceba que a depressão é passível de tratamento.
O envolvimento familiar durante o tratamento além de permitir ao paciente
se sentir acolhido em seu sofrimento, também é importante para que haja
comunicação com os profissionais caso alguma mudança de comportamento
repentino seja notada.
Outro aspecto que deve ser levado em consideração é: o fato de ter um
familiar com depressão não significa deixá-lo de convidar para fazer atividades,
mas sim saber respeitá-lo caso haja a recusa.
Sabemos que os reflexos da depressão podem afetar também os familiares,
tornando-os irritadiços e distantes das pessoas que amam, muitas vezes por
não saberem como agir diante das situações, porém conforme dito
anteriormente, informem-se, pois a informação sobre aquilo que
desconhecemos é sempre o melhor caminho.
Laura Caroline Muller, psicóloga com especialização em andamento em
Terapia-Cognitivo-Comportamental pelo UNISAL; secretária da Revista
Sul-Americana de Psicologia- UNISAL e membro do Comitê de Ética em
Pesquisa da presente instituição. Americana-SP.



A importância da fé
Sempre tive dificuldade de acreditar em algo maior, uma entidade criadora de
tudo. Pode parecer estranho, pois fui criado numa família católica e desde cedo
me falavam sobre um Deus. Lembro que certa vez, quando criança e morando
numa casa de dois cômodos, apareceu uma borboleta azul, que voava em nossa
cozinha. Tenho fragmentos desse dia e, tempo depois, encontrei a mesma
borboleta morta atrás da pia. Eu perguntei ao meu pai se ela tinha alma e iria
para o céu. Ele me disse que não era da mesma forma como a nossa alma.
Daquele dia em diante, eu passei a duvidar sobre a existência de uma
entidade que tudo comanda. Com o tempo, aos 10, 11 anos, fui fazer catecismo e
ali, em meios aos ensinamentos, eu me sentia perdido. Era muita coisa que, para
mim, nunca fazia sentido. Era como se tudo estivesse envolto em pecado, em
restrições, em culpas. Eu me perguntava: que Deus era aquele? Que Deus era
aquele que permitia tantas coisas ruins acontecerem, assim como tanta
injustiça? Que Deus era aquele que me fazia sentir diferente de todos, me
permitia ficar deslocado? Por que já naquela idade eu me sentia tão
desamparado e já pedia para não existir?
Tentei seguir com minha fé. Eu rezava e pedia com fervor para sentir algo,
alguma sensação que me despertasse uma fé calorosa e me fizesse sentir bem.
Por fim, lutando contra meus próprios fantasma, isso com 11 anos, desisti de
acreditar em instituições religiosas. Não me via representado por uma religião.
Sentia-me sozinho, desamparado e sem fé em algo maior. E fui me apegando
apenas ao que meu sexto sentido dizia: você não precisa de religião, você
precisa apenas ser uma pessoa honesta e boa. Foi ao que me apeguei.
Inclusive uma pesquisa6 que avaliou cerca 1.600 pessoas nos EUA apontou
que pessoas menos religiosas são mais generosas com estranhos do que
pessoas extremamente fervorosas. Além disso, pessoas menos religiosas foram
apontadas como mais caridosas, além de doarem valores maiores para ajudar
alguém. Ou seja: ter uma fé fervorosa não significa necessariamente que você
seja uma pessoa boa. O que te transforma numa pessoa melhor é quando você,
mesmo não aceitando certas situações por conta de convicções religiosas,
respeita aquele que lhe é diferente.
E o que observamos, muitas vezes, é um preconceito ao se dizer que não tem
religião. Algumas pessoas parecem cravar uma sentença, sem ao menos
conhecer e entender quem realmente é a outra pessoa. Baseiam-se pela falta de
religião (ou fé) e não pelas ações. Vi a hipocrisia de pessoas extremamente
religiosas, que pregavam o amor acima de tudo, mas apenas pelas palavras. Que
deus era aquele a quem elas serviam? Deus de amor não era. E aquilo me fazia
ficar cada vez mais convicto de que as religiões, para mim, não me serviam
como anteparo para fé. E eu perdi minha fé por conta da religião. Não podia
compactuar com algo que, em meu coração, dizia ser errado.
Hoje, depois de ter tido depressão, sei que não ter fé pode ter sido algo que
me fez ruir de alguma forma. Não ter no que me amparar e segurar foi algo que
me fez sentir fraco, sem apoio, cambaleante numa corda de incertezas. Qual o
sentido de existir? Por que eu deveria sentir aquele vazio enorme? Qual o meu
propósito de estar naquele momento sentindo aquela sensação de desolação, de
não merecer viver? Por que, se havia um Deus tão bom, ele permitia que eu me
sentisse tão só e isolado, como se eu não fizesse parte do mundo? Ou pior: como
se eu não merecesse existir? Por que Deus me permita viver uma vida que, na
verdade, era tão vazia? Eram questionamentos que percorriam minha cabeça a
todo o momento. Eu estava morto para a vida. Estava sem fé. Sem fé em mim,
principalmente.
E por incrível que pareça, foi a depressão quem me fez voltar a ter fé. Não
numa religião. Mas em algo maior: passei a ter fé numa energia que tudo
conecta. Uma energia que envolve toda a existência da vida, algo universal, que
não foi criação humana. Passei a acreditar no que é inexplicável. A depressão, ao
me sufocar e fazer perder toda a vontade de viver, me deixando vazio, permitiu
que eu repensasse meus passos. Vazio completo, com o que me preencheria?
Comecei a alimentar aos poucos minha fé em algo que, racionalmente, eu
poderia encarar de uma forma melhor meus problemas. Talvez tudo o que eu
estava passando, não fosse necessariamente algo ruim. Eu deveria tirar algo
dali. Existia um motivo, algo a me ensinar. A depressão, meu abismo sem luz, foi
o que me jogou num pântano de areia movediça. Quanto mais eu me mexia,
mais me sentia preso e sufocado. O momento em que comecei a sair deste
pântano foi quando vi uma pequena corda. Frágil, mas era algo que estava ali
para eu agarrar: a fé. A fé que, talvez, nada fosse por acaso. Que o destino,
embora tivéssemos livre arbítrio, colocaria as coisas de alguma maneira em
nosso caminho para sermos melhores, evoluirmos. Incluindo a depressão.
Tinha um quê da teoria da evolução nesta forma de pensar. Eram as
adversidades que permitiam ir para frente, não a calmaria. Mar sereno não forja
exímios marinheiros, já dizia o ditado. Era verdade. E só pude entender isso
quando passei pela depressão: ela me ensinou que eu devia acreditar em algo.
Esse algo era acreditar que, dentro de mim, e em tudo, havia uma energia que
tudo conectava.
Não era em ter religião que eu deveria importar. O que eu deveria importar
era acreditar nesta energia e que, meus pensamentos, podiam vibrar e ajudar a
modificar a realidade que tanto me sufocava. Era a fé de que tudo tinha um
desígnio e que eu deveria ser forte e me sustentar na caminhada, mesmo que
parecesse que não conseguiria.
E isso me ajudou. Fez-me agradecer a todos os momentos em que a escuridão
começava a se alastrar e me dava forças para dizer: só por hoje vou agradecer a
isso e tentar ver o lado bom dessa sensação ruim. Isso me fez bem e faz ainda. E
que fique bem claro: pode não servir para você, pois cada um tem sua forma de
pensar, de sentir, de acreditar (ou não) em algo. Não nos devemos pautar pela
forma como os outros enxergam o mundo, isso só causa dor.
Confesso que, quando tive depressão, uma das coisas que mais me machucava
era ouvir: isso é falta de Deus. Aquilo parecia um tapa na minha cara. Doía-me
quando alguém me encarava e dizia que o problema era eu não ter Deus. Não.
Não era esse o problema. O verdadeiro problema era eu não ter fé: fé que eu
podia sair daquela sensação.
Eu não tinha fé na pessoa mais importante: em mim. Estava desacreditado
que eu conseguiria sair da depressão. Não era falta de Deus. O deus que essas
pessoas jogavam e esfregavam em minha cara era um deus que, para ele, tudo
era pecado, que me obrigava amá-lo, sem me sentir amado. Era um deus cruel.
Como eu poderia amar algo que eu não acreditava e, acima de tudo, amar algo
sem que eu me amasse? Só consegui me conectar a ideia de uma energia. Ela
não era boa, nem ruim. Era neutra. O que a fazia diferente era a forma como eu a
passei encarar, por meio de minha fé: tudo o que eu passava tinha um motivo
que me faria crescer e evoluir. Eu me agarrei a isso. Essa foi minha fé.
Não tive fé no deus das pessoas que apontavam o dedo em minha cara para
dizer que eu precisava de deus. Minha fé passou a ser no meu amor próprio, nos
pensamentos de que eu venceria a depressão e que, tudo o que eu passava tinha
um desígnio. E isso me confortou. Fez-me sentir forte, mesmo estando
desvalido.
Eu passei a acreditar na energia do universo, que tudo conecta, tudo ecoa,
tudo vibra. E isso, para mim, exclusivamente para mim, que fique bem claro, fez
diferença. Por que eu sou único. E cada um é único, a sua maneira. E temos que
respeitar as diferenças: cada um tem o direito de acreditar ou não em algo. E
ninguém tem o direito de apontar os dedos na fé (ou falta da fé) alheia. Cada
pessoa tem o seu caminho e sua forma de pensar e sentir aquilo que a circunda.
Eu achei a minha e me agarrei a ela, com minha fé.
Não quero aqui decretar que a fé vai fazer mudanças em sua vida. Jamais.
Quem sou eu para dizer isso? Não faço aquilo que fizeram comigo: apontar o
dedo e dizer que a depressão é falta de Deus. É muito raso. É desumano. É cruel.
Isso vem de pessoas que nunca passaram pela depressão e não compreendem o
que esta doença é. O que posso aconselhar (se é que posso chamar de conselho)
é tentar se agarrar a qualquer esperança que surgir.
A depressão é um oceano banhado pela escuridão de um eclipse total. Um
oceano solitário, em que a luz não se aproxima. Estamos jogados em alto mar,
sem nada ao que se agarrar. Qualquer pedaço de esperança que passe boiando,
devemos segurar com todas as forças para não se afundar. É preciso juntar
essas pequenas esperanças que surgem. E, quando vemos, sem perceber,
estamos construindo um porto seguro. Algo sólido a nos segurar. A fé pode ser
parte deste porto seguro.
Inclusive algumas pesquisas têm demonstrado o papel da fé na recuperação
das pessoas com depressão. Um estudo7 feito com 136 adultos diagnosticados
com depressão, apontou que as pessoas que acreditam em um Deus que se
preocupa com elas tem um desempenho melhor no tratamento contra a
depressão. Também se verificou num trabalho8 com 177 holandeses idosos que,
aqueles mais religiosos, tinham uma melhoria na depressão.
Outra pesquisa9, feita com 103 indivíduos, verificou que pessoas com
religiosidade maior apresentavam um córtex cerebral mais espesso – o que
representava um risco menor de depressão. Porém o estudo não apontou se a
religiosidade deixava o córtex mais espesso ou se, ao ter o córtex cerebral mais
espesso, a pessoa era mais religiosa.
Ou seja: as pesquisas indicam que acreditar em algo pode trazer melhoras
substanciais na luta pela depressão. Porém, como disse acima, a fé é algo único e
que cada um deve cultivar a sua maneira. Não adianta ninguém vir e exigir que
se tenha fé: trata-se de uma construção interna pelo qual a pessoa
simplesmente sente ou não. É um processo silencioso de se entender e meditar
sobre aquilo em que se acredita e deposita certas esperanças.
Eu, por exemplo, passei a acreditar numa energia que tudo conecta, regida
pela lei da ação e reação: o que eu fizer, em algum momento volta. Além disso,
passei a encarar o que me acontecia – inclusive a depressão – como uma forma
de melhorar aspectos que antes eu negligenciava. A minha fé, nesta forma de
encarar o mundo, permitiu que eu me tornasse com uma visão mais positiva
acerca de todos os acontecimentos. Fez-me bem. Somado a tantas outras coisas
que me ajudaram a sair da depressão, a construção de minha fé me ajudou a
preencher parte do vazio existencial que me assomava. E isso valeu muito a
pena, pois me fortaleceu. Vale a pena tentar construir ou reconstruir a fé, de
forma a lutar contra depressão.


Depoimento
Fiquei depressiva aos nove anos, quando meu pai faleceu num acidente de
carro. A depressão foi corrosiva, sendo que meu único pensamento era morrer
para acabar com todo sofrimento. Mas eu também experimentava momentos de
lucidez e esperança. Tive uma vida destrutiva até que, aos 30 anos, conheci o
Budismo Nichiren.
Iniciei minha prática budista em fevereiro de 1997. Quatro meses depois, já
não dependia mais de medicamentos nem para dormir e segui uma vida
tranquila, que foi se equilibrando gradativamente. Mas o pior aconteceu em
julho de 2011, quando meu marido faleceu de infarto fulminante. Na ocasião,
manifestei síndrome do pânico seguida de depressão. Minha motivação para
seguir em frente e vencer por completo essa doença foram as orientações do
meu mestre Dr. Daisaku Ikeda e o desejo de ser feliz junto com minha amada
família e as pessoas que amo.
Minha vitória se deve à prática do Nam Myoho Renge Kyo (oração) diante do
Gohonzon (objeto de devoção), pois é dessa maneira que a vida se nutre de
energia vital e sabedoria para manter o foco na vitória, sobre todas as
circunstâncias da vida diária. A frase das escrituras de Nichiren Daishonin que
me motivava a vencer é: “Sofra o que tiver que sofrer. Desfrute o que existe para
ser desfrutado. Considere tanto o sofrimento como a alegria, como fatos da vida,
e continue orando Nam Myoho Renge Kyo, não obstante o que aconteça. Então,
experimentará a infinita alegria da lei.”
Hoje me sinto revigorada e feliz, pois em um ano e meio venci a síndrome do
pânico e a depressão, sem calmantes e antidepressivos, apenas me dedicando às
atividades da BSGI - Brasil Soka Gakkai Internacional, da qual sou membro
atuante em prol da felicidade individual e das outras pessoas. Desde outubro de
2016 também faço terapia com uma psicóloga e um psiquiatra, somente para
equilibrar minha química cerebral e ressignificar alguns sofrimentos do
passado. Já estou quase liberada do tratamento. Finalmente estou
experimentando a felicidade que tanto busquei em toda a minha vida.
Angela Teresa Gallo, 50 anos, depiladora. Reside em Americana – SP.

...

Para refletir
A depressão é um distúrbio da afetividade que, por envolver outros
distúrbios, é entendida como uma síndrome, na qual se detecta alterações nas
reações químicas do cérebro, sobretudo em relação às chamadas substâncias
neurotransmissoras, necessárias ao funcionamento adequado das células
neurológicas.
Por se tratar de uma síndrome, a atenção ao deprimido envolve cuidados
relacionados à medicação, à psicoterapia, à nutrição, a exercícios físicos entre
outros.
O apoio espiritual, proveniente da prece, da prática do bem e do exercício da
fé tem se revelado de grande valia. A saúde e a espiritualidade, mais do que
nunca, são instrumentos importantes na prevenção e cura da depressão.
A fé tem o poder de criar defesas mentais e espirituais, assim como o corpo
físico possui anticorpos que lhe garante defesa a uma série de enfermidades.
Marta Antunes Moura, coordenadora das Comissões Regionais na área
da Mediunidade da Federação Espírita Brasileira (FEB), Vice-presidente
da FEB

...

Numa situação de depressão nos perguntamos onde está Deus. Como
exemplo bíblico, temos o Livro de Jó que relata uma depressão profunda que Jó
vivencia em sua vida. Principalmente quando ele perdeu todos os seus bens –
era um homem mais rico do oriente – e todos os seus filhos em um único dia (Jó
1.13-22).
É no diálogo da fé e da realidade da depressão que leva ao conhecimento de
Deus. É Ele que tem a iniciativa; isto é, é o primeiro que ama, oferecendo a sua
amizade e admitindo-nos no círculo aberto do seu amor trinitário para fazer-
nos seus filhos e filhas por amor.
Sendo assim, em meio a essa depressão, devemos buscar uma espiritualidade
para manter a fé e a esperança em Deus. O Deus dos Cristãos, o Deus da
revelação, o Deus das Escrituras é uma pessoa que ama, que se apaixona, que
enxerga e enxuga lágrimas, que ouve e responde à oração que se compadece da
fraqueza humana e perdoa pecados, que compreende o ser humano e o trata
com bondade e paciência, que gosta de ser chamado de Pai Nosso.
Padre Jeferson Luis Leme da Silva (Psicanalista Clinico). Pároco da
Paróquia Nossa Senhora Auxiliadora. Americana-SP.

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Quando falamos da importância da fé no processo de cura da depressão, a
primeira coisa que precisamos entender é que a fé não nos isenta da depressão.
Digo isto porque é muito comum no meio religioso a ideia de que quem tem fé
não tem depressão. Não é bem assim. Os grandes heróis da fé, segundo as
Escrituras, enfrentaram momentos de depressão. Então, é importante ter em
mente que a fé não nos isenta desta doença que assola inúmeras pessoas. A fé
não nos torna super-homens ou supermulheres. A fé não nos desnaturaliza.
A segunda coisa, é tratar a depressão como uma doença. Doença curável.
Tratável. Aí, a fé sempre será um elemento que permeará todo o tratamento. Fé
é confiança. Fé é esperança. Fé é certeza. Os sentimentos oriundos da fé
auxiliam na cura de todo tipo de doença, inclusive a depressão. A fé inteligente
não abandona o tratamento que vem da medicina. Um auxilia e orienta o outro.
Não se excluem. Neste sentido, a fé atuará no depressivo como elemento que
produzirá alternativas para suplantar a doença. É importante entender que no
enfrentamento contra qualquer doença não podemos abrir mão da fé. A própria
medicina tem reconhecido isto sobejamente. Um velho pastor sempre
dizia: “Oração e caldo de galinha não fazem mal a ninguém”. É isto: “Fé e caldo
de galinha não fazem mal a ninguém”. “Andar com fé eu vou, a fé não costuma
falhar”, diria o grande Gilberto Gil.
Ailton Gonçalves Dias Filho - Pastor Presbiteriano. Americana–SP.

...

Antes de iniciar, gostaria de salientar que as pessoas com depressão devem
sim buscar ajuda médica, uma vez que, depressão é uma doença.
Na visão umbandista, tudo é energia. Quando a energia flui bem, gera
equilíbrio e bem estar para a pessoa. Por outro lado, quando não flui bem gera
desequilíbrio e mal estar, podendo inclusive, causar doenças.
Acreditamos que a fé tem o poder de fazer com que as energias que nos
rodeiam, fluam ordenadamente, fazendo com que os pensamentos das pessoas
fiquem mais elevados, gerando autoconfiança, trazendo esperança e,
consequentemente, aliviando os sintomas da depressão.
Pai Patric Guerra, dirigente espiritual da Tenda de Umbanda Pai
Jerônimo – Caboclo Caçador. Americana-SP.





A importância das atividades físicas
Já me peguei várias vezes pensando como seria a vida na época das cavernas.
Era um mundo repleto de perigos selvagens, com expectativa de vida muito
baixa e uma imensa necessidade de buscar o alimento, se defender e sobreviver.
O ser humano ainda não havia descoberto a agricultura e, portanto, era
nômade: tinha que vagar em busca de frutas, verduras, legumes, como também
caçar e pescar para sobreviver. Com certeza, não era uma vida fácil e, muito
menos, cômoda.
Basicamente havia a necessidade de se movimentar o tempo todo em busca
da sobrevivência. Foi só a partir da descoberta da agricultura e a domesticação
de animais, que o ser humano foi abandonando a vida nômade e, com isso,
começou a se estabelecer em comunidades fixas.
Num salto de milhares de anos, chegamos ao nosso mundo atual: podemos,
inclusive, comprar comida pela internet, sem sair de casa. Inclusive, já tive
experiências em que ouvi de crianças que o leite, por exemplo, vinha de uma
caixinha: não precisamos produzir nosso alimento, muito menos caçá-lo: nós o
compramos. Se antes era necessário andar quilômetros, a vida moderna
facilitou tudo e, com isso, o sedentarismo se tornou uma grave ameaça à saúde
pública: trouxe diversos problemas, como diabetes, doenças do coração,
obesidade, entre outras. Inclusive, o modo de vida moderno se tornou uma
grave ameaça para o bem-estar emocional.
E o que tudo isso tem relação com a depressão? Um estudo10 apontou que os
exercícios, como os aeróbicos, auxiliam no processo de recuperação da
depressão. Testes11 feitos com voluntários idosos apontaram que os exercícios
promovem mudanças favoráveis na diminuição de indicativos de depressão e
ansiedade, melhorando a qualidade de vida.
E isso ocorre, principalmente, por que os exercícios acabam por influenciar na
produção de hormônios. Um estudo12 feito com adolescentes verificou que,
após os exercícios físicos, houve uma melhoria do estado depressivo, resposta
hormonal ao estresse e melhor aptidão fisiológica dos adolescentes com
sintomas depressivos.
É lógico: quando a crise da depressão bate de uma vez, ficamos paralisados.
Ela age como mãos invisíveis, que nos seguram e nos impedem de fazer
qualquer coisa. Ela retira, de uma vez, qualquer tipo de prazer. A depressão é
uma aranha silenciosa que, ao nos picar, destila um veneno que destrói nosso
eu. E depois de destruir nosso eu, ela suga toda a essência, deixando-nos feito
uma casca vazia.
Em minhas crises, perdi toda a vontade de sair de casa. Queria dormir o
tempo todo, de forma a esquecer de que eu existia. Sentia uma necessidade
enorme de me esconder do mundo, ficar isolado de qualquer contato ou olhar,
pois era um fardo muito grande ter que encarar as outras pessoas, não me
sentindo bem comigo próprio. E mesmo diante de toda a sensação de
impotência, me sentindo péssimo, vazio, persisti em fazer exercícios.
Ia à academia, mesmo ficando 15 minutos e, em crises de choro que surgiam
do nada (e eu saia sem ninguém perceber), eu insistia. Não podia me
desconectar dos exercícios. Eu também me pegava, muitas vezes, indo correr e
caminhar sozinho. E embora, às vezes, eu fosse chorando – caminhei muitas
vezes limpando os olhos e abaixando a cabeça para que ninguém visse que eu
chorava – eu seguia. Seguia em frente, andando, respirando, insistindo. E
mesmo vazio, sentia uma euforia pequena a soltar fagulhas em meu corpo.
No finalzinho de 2015, comecei a fazer muay thai. Sempre avesso a qualquer
tipo de luta, por não gostar, além de usar óculos – não me acostumei com lentes
de contato e tenho receio de operar a miopia e astigmatismo – eu fui. Ali, nas
aulas, eu comecei a me sentir revigorado: eu esquecia que eu estava vazio e me
preenchia de risadas.
Nas aulas de muay, meu foco era fazer os movimentos de forma correta. Por
aqueles momentos, eu esquecia que estava depressivo. Também já me
aconteceu em algumas aulas eu ter uma crise de ansiedade. Começava a faltar ar
e eu queria chorar. Porém eu respirava fundo e focava no pensamento: “vamos,
você vai continuar, você consegue”. E insistindo, me forçando, eu me sentia
outra pessoa: bem mais leve.
Os exercícios me ajudaram, naqueles momentos de vazio, a me sentir vivo. Os
movimentos, o transpirar do corpo, o bater do coração, a força executada, a
atenção direcionada no exercício, enfim, eu precisava me focar em pequenas
metas: fazer a série da academia, dar cinco voltas na pista de caminhada do
Jardim Botânico de Americana, conseguir executar os exercícios do muay thai.
Eram metas bobas, mas que, momentaneamente, me entusiasmavam a ponto
de me fazer continuar. E confesso que não era fácil: eu queria abandonar tudo e
me trancafiar num quarto escuro. Chorar, fechar os olhos, me agarrar no
travesseiro e soluçar. Eu queria apenas dormir e ter a sensação de que nada
mais existia. Mas minhas pequenas metas nos exercícios me faziam ter uma
rotina e, de certa forma, eu ansiava por eles. Principalmente o pós-exercício,
pois sempre havia uma pequena euforia e eu conseguia descansar melhor
durante a noite.
Cada pessoa é única e tem um gosto. Sei que exercícios podem não parecer as
coisas mais legais do mundo, principalmente para quem não gosta. Eu só
gostaria de frisar que eles são essenciais para a qualidade de vida. E não sou eu
quem diz. Os estudos apontam que os exercícios são aliados não só contra a
obesidade, diabetes, osteoporose, mas também atuam na melhoria da
depressão e ansiedade.
Mais do que se exercitar, muitas vezes o ato de praticar esportes nos coloca
em sintonia com outras pessoas. Algumas atividades coletivas podem fazer com
que esqueçamos momentaneamente nossos problemas e foquemos apenas no
divertimento de competir, de maneira saudável, contra outro time, seja no
futebol, no vôlei, handebol, basquetebol, enfim, qualquer esporte, ou algo que
nos coloque em movimento, como a dança, por exemplo.
Outras atividades, como a caminhada, também podem ser feitas de forma
coletiva – e quando vamos com pessoas que nos sentimos bem, a caminhada flui
mais rápido, pois vamos conversando. Lembro que, certa vez, ao caminhar no
Bosque das Nascentes, em Americana, vi uma mulher que corria. Confesso que
fiquei com certa inveja, pelo fôlego e disposição que ela demonstrava. Mesmo
dando trotinhos rápidos, ela parecia não se cansar.
Fui tomar água que brotava de uma nascente e, ao subir a estrada para ir
embora, a moça veio ao meu encontro, caminhando. Não lembro bem ao certo o
que falamos, mas ela comentou, com um sorriso, algo que ficou em minha
cabeça: “correr me fez esquecer da depressão”. Conversamos bem rapidamente
e ela me explicou que também teve síndrome do pânico. E o que realmente
funcionou, no caso dela, foi se entregar à corrida.
Não duvido que os exercícios tenham papel fundamental na recuperação ou
estabilização da depressão – vários estudos apontam isso. A grande questão é
nos permitirmos utilizar deles a nosso favor. Muitas vezes, como já disse, não
tinha ânimo algum. Mas então eu costumava dizer, para mim mesmo: “vou fazer
o que é possível para tentar me sentir melhor, nem que faça sem vontade, mas
vou”. Assim, fazer e manter as atividades físicas me deram essa força para
continuar lutando contra aquela sensação de vazio que me assolava. Vale a pena
tentar investir em alguma atividade física e colocar o corpo em movimento.

Depoimento
Minha relação com a depressão começou em 2008, logo após o falecimento do
meu pai. Minha mãe teve um AVC e eu fiquei sem chão. Com isso a depressão
veio me fazer companhia e junto ela trouxe bons quilos, me fazendo chegar aos
111 kg e um quadro de obesidade aos 18 anos.
Sabe quando você se vê no limite? Pois bem, eu estava com aval para fazer a
bariátrica e decidi que minha vida precisava mudar. O esporte, que sempre
esteve presente na minha vida recebeu um papel diferente: o de salvação!
Comecei a correr e me descobri apaixonada por isso. Fui emagrecendo, até
eliminar 53 kg, a força aumentou, a paz interior e junto com a descoberta de um
potencial - virei atleta de corridas - a depressão foi eliminada da minha vida!
Hoje a corrida é minha meditação, o meu refúgio e o que me salvou!
Vanessa Haas, 28, jornalista, social media e estudante de educação
física. Reside em Piracicaba-SP.


Para refletir
A prática de atividades físicas ou exercícios físicos tem grande importância no
tratamento da depressão sem o uso de medicamentos. É bom lembrar que
existe diferença entre atividade física e exercício físico. Por atividade física,
entende-se os movimentos corporais, que são produzidos pelas contrações
musculares, aumentando o gasto de energia. Por exemplo, as ações diárias,
como caminhadas ao banco ou supermercado, subir escadas, levantar ou
arrastar algum objeto etc, podem ser consideradas atividades físicas.
Já os exercícios físicos são movimentos repetitivos, planejados e orientados
por um profissional de educação física. O objetivo dos exercícios é a melhoria do
estado de saúde, por meio de sessões de alongamento, fortalecimento e
resistência cardiopulmonar.
Tanto a atividade, quando o exercício físico, quando realizados
continuamente, podem promover o combate à depressão, pois atuam
diretamente na diminuição dos sintomas clássicos da doença, como tristeza,
autoimagem negativa, problemas na libido, sono, ânimo, estresse, ansiedade e
estado de humor.
Vale lembrar que a prática regular de exercícios aumenta a secreção de
endorfinas, que são neuro-hormônios, que provocam um estado natural de
euforia. Assim, essa produção de endorfinas auxilia no alívio dos sintomas da
depressão. Os exercícios também podem regular a neurotransmissão da
noradrenalina e serotonina, dois hormônios ligados a manutenção das funções
fisiológicas corporais.
É importante ressaltar que os exercícios físicos têm uma relação direta com a
melhoria da autoestima, modificando a imagem corporal do depressivo, que
passa a sentir satisfeito com o cuidado do corpo e mente, apropriando-se de
hábitos positivos para a saúde e ganhando autonomia para lidar com os fatores
desencadeadores da doença.
Tiago Volpi Braz, mestre em Educação Física e professor universitário.
Americana – SP.
A importância da amizade
Qual a importância da amizade? Pego-me muitas vezes analisando esta
pergunta. E quando vejo profundamente o que ela quer dizer, não me vem
palavras. Apenas lembranças. São pelas amizades que acabamos por construir
um mundo de sentimentos que, sozinhos, não somos capazes. Nenhuma pessoa
é uma ilha. Ter conexões é essencial para trilhar esta caminhada de uma forma
em que nos sintamos mais fortes e amparados.
Na depressão, parte do meu conforto, enquanto ser humano, veio dos amigos.
Daqueles que, nos momentos em que eu perdia toda a esperança, apenas faziam
algo simples: me lembravam o quão maravilhoso eu era e não conseguia
enxergar. Eles me colocavam para cima. Frisavam o quanto eu tinha feito e o
quanto eu ainda faria. Foram as amizades, com suas peculiaridades, que me
ajudaram a ganhar mais força para lidar com minha depressão. Sozinho, seria
mais difícil e muito mais doloroso.
Li frases que amigos são a família que escolhemos. De certa forma, sim. E
devemos saber escolher aquelas pessoas que nos cercam. Dividimos momentos,
histórias, risos, choros. Amigos são parte de nós: nos ajudam a enxergar pontos
positivos e fraquezas. Colocam-nos a par de nossa própria essência.
Sempre fui uma pessoa sociável, mesmo sendo tímido (embora muitos digam
que não). Desde criança, lembro exatamente que reunia muitos amigos ao meu
redor. Era uma criança extremamente sociável. Divertia-me demais e chegava
ao ponto de, quando já cansado de brincar, e querendo ter o meu momento só
para mim (sempre gostei de ter o meu momento, o horário de desconectar de
tudo), eu muitas vezes pedia a minha mãe dizer que eu estava de castigo. Mas
passado o meu “retiro”, eu voltava a brincar.
Carreguei comigo essa facilidade de conhecer as pessoas. De saber, pelo olhar,
se estão tristes ou alegres. É algo subliminar, que sinto, sem que me digam. E
isso só percebo por que aprendi a me colocar no lugar delas. É a tal da empatia.
A empatia é algo transformador: ajuda-nos a aprender a respeitar o outro, por
nos colocarmos no lugar dele. Amizades são assim: você olha a outra pessoa, vê
o quão diferente ela é e a aceita. Divide momentos. Divide histórias. E isso é
maravilhoso, pois nos faz crescer enquanto seres humanos.
Só nos tornamos humanos como somos por conta dos laços sociais que
criamos. Ao criarmos nossas comunidades, passamos a criar interações. Dessas
interações, aprendemos a viver e a descobrir o mundo a partir de outros olhos,
além dos nossos. Aí reside toda a beleza da amizade.
E na depressão, ter algum apoio, como um amigo, é essencial. É necessário
unir todas as forças, juntar todas as energias, respirar fundo e, mesmo que não
se sinta vontade alguma de ver as pessoas, tentar se aproximar dos amigos. Nas
fases em que fui tomado pela total desilusão da vida, me vi inteiramente só. Não
conseguia mais lembrar o quanto de pessoas que passaram por minha vida e me
estimavam. Eu só via “meus defeitos”, “minhas fraquezas”, “meu jeito errado de
ser”. Eu me julgava indigno de viver, um fraco, alguém sem sentido algum. Por
que continuar a viver? Qual o motivo de continuar tamanho vazio existencial?
Eram questões que em todo momento martelavam em minha cabeça.
Foi então que passei a me forçar a retomar contato com as pessoas que eu sei
que me faziam bem, mesmo que eu tivesse vontade de sair do meu quarto. Foi
então que retomei uma parte de mim que estava esquecida. E isso se deu pelas
conversas que tive, pelo ânimo alheio injetado em mim, pelas palavras de
estímulo e pelo chocalhão que esses meus amigos me deram (lembrando o quão
importante eu era e que eu não deveria desistir jamais).
Neste meio de tempo, também aprendi que, ao me colocar para ouvir o outro,
tentar ajudar, mesmo que fosse em ouvi-lo, eu me sentia importante. Eu estava
sendo útil alguém, mesmo que fosse de uma forma ínfima. Mas aquele ínfimo,
somado a todos pequenos momentos, ia amalgamando em minha essência um
pouco de amor-próprio. Além de ser ajudado, contando meus problemas,
falando de minhas dores, do meu vazio, eu me colocava a ouvidos: era uma mão
dupla. Sendo ajudado, eu ajudava. Ao ajudar o outro, ouvindo-o e tentando dar
conselhos (ou mesmo, apenas ficando quieto, deixando a outra pessoa
simplesmente por para fora tudo o que a afligia), eu também me ajudava.
Somos uma espécie social, que necessita de interações. Não nascemos
sozinhos: estamos unidos em nossas mães. Ao nascermos, precisamos do afeto
de outros, do carinho, do zelo, do cuidado. Quem diz que nascemos sozinhos,
está errado. Estamos o tempo todo nos conectando a alguém, mesmo que
indiretamente. A vida é uma grande conexão. Um imenso aprendizado. Uma
maravilhosa e linda troca de experiências. É preciso se permitir criar laços
sociais, pois isso nos engrandece enquanto pessoas e cria alicerces para que
possamos caminhar seguros.
E, nesta sociedade, criar lanços sociais é de grande importância. O problema é
que, no mundo pós-moderno, vivemos, segundo o sociólogo Zygmunt Bauman
(1925-2017)13 relações que, cada vez mais, se tornam líquidas. Se antes as
pessoas criavam raízes, hoje, as relações acabaram por se tornar mais
superficiais.
Para Bauman, a sociedade pós-moderna não tem um projeto de longo prazo: é
imediatista. Antes, havia uma concepção que o mundo precisava ser mudado e
as relações sociais eram fortes para engajar as pessoas e, assim, movimentar as
nações para que as mudanças pudessem ocorrer. Hoje, segundo Bauman, não
existe esta constatação que o mundo precisa ser mudado e não há um
engajamento, pois vivemos numa sociedade desordenada. E isso já começa por
conta das próprias relações humanas, que se tornaram superficiais. Não há
raízes, há apenas sensações fluídas. Como exemplo, temos as redes sociais:
“amizades” são feitas e desfeitas por um simples clique. Basta que alguém pense
“diferente”, que a amizade é desfeita num simples clique. Estamos ficando
intolerantes demais.
E ao se falar em depressão, tenho cá comigo que parte da força desta doença
reside justamente nesta nossa sociedade doente, corrompida e hipócrita. Ela
acaba por minar nosso eu, querendo nos enquadrar em padrões. A sociedade
quer ditar o que é o sucesso. Demorei para entender que sucesso não significa
necessariamente você ter uma posição de destaque no mercado, ter as melhores
notas, ser a referência no que faz, ter o carro do ano, uma casa decorada, enfim:
o sucesso não está em condecorações e bens materiais. Eles podem auxiliar em
muitas coisas. Porém o verdadeiro sucesso reside quando aprendemos, ante a
este sociedade doente, enxergar aquilo que é o mais belo: nós mesmos.
Estamos cada vez mais esquecidos de olhar para dentro de nós, despidos de
preconceitos introjetados pela sociedade e, assim, questionarmo-nos como
podemos ficar bem conosco. Não são os bens materiais que vão nos fazer sentir
bem, com paz de espírito. Pelo contrário: quanto mais dinheiro temos, dá a
impressão que mais coisas nos falta. Lembro que em meu primeiro emprego eu
ganhava muito pouco, pois era estagiário. E conseguia fazer muitas coisas.
Conforme avancei em minha carreira, passei a ganhar melhor. Mas aquilo não
me satisfazia: parecia que o dinheiro não dava. E o pior: eu vivia um vazio – e
parte dele era por causa de uma melancolia que eu fingia não existir, mas a
sentia. O mundo tinha uma tonalidade acinzentada, mesmo nos momentos mais
felizes.
Inclusive uma pesquisa14 demonstrou que as experiências (como uma
viagem, por exemplo) tornam as pessoas mais felizes do que os bens materiais.
Guardamos em nossas recordações as experiências que tivemos, enquanto que
os bens materiais, muitas vezes, nem lembramos que os tivemos. Se
observamos sob este olhar, o mundo materialista pode ser encarado como
apenas um cadafalso para sustentar nossas sensações. Dão uma falsa sensação
de segurança, que nada verdade não existe.
Os bens materiais apenas nos ludibriam com uma falsa felicidade, que o
tempo todo tem que ser estimulada. Está aí a cerne do consumismo. Nós nos
preocupamos em ter, sem necessariamente sentir. Ou seja: posses podem ser
palpáveis, mas sensações produzem momentos mais marcantes. Amizades,
nesta ótica, são importantes por permitirem termos momentos especiais,
experiências, trocas e crescimento pessoal.
Assim, o que vai auxiliar nessa reconstrução de nosso bem-estar é, primeiro,
valorizarmo-nos. Segundo: estar em sintonia com as pessoas, buscando
construir laços. Ter apoio, mesmo que para uma conversa, uma boa risada, ou
mesmo um ombro amigo nos faz sentir seguros nesta caminhada. Algumas
pesquisas, inclusive, apontam o valor da amizade na depressão. Um estudo15
sugere que ter amigos suficientes com humor saudável pode diminuir a metade
da probabilidade de desenvolvermos depressão, ou ainda, duplica a
probabilidade de nos recuperarmos da depressão. Afinal, não somos uma ilha.
Somos seres sociais e, portanto, necessitamos interagir para nos sentirmos
parte de algo.


Para refletir
Vivemos numa sociedade em que o turbilhão de informações, o excesso de
afazeres nas esferas pessoal e profissional, a conexão constante e a rotina
acelerada levam os indivíduos a sofrerem diversas patologias neuronais.
Estamos inseridos num modelo social que exige o máximo de nossa
potencialidade, um desempenho contínuo, ininterrupto. Entretanto, na condição
de seres humanos, temos limites. Responder constantemente aos estímulos e
exigências aos quais estamos expostos nos conduz a um esgotamento psíquico
intenso, gerando uma grande sensação de impotência, uma autoacusação
destrutiva. Uma guerra interna é travada e a depressão surge nesse cenário com
uma força avassaladora.
Mas nem tudo está perdido. Se o princípio fundamental de formação da
sociedade é a convivência com o outro, estar próximo de pessoas que nos amam
e de amigos verdadeiros é muito eficaz para evitar ou ajudar alguém que tenha
depressão. A amizade é indispensável para sentir-se apoiado, respeitado e
querido: sentimentos que causam bem-estar a qualquer pessoa. Muitas vezes,
quem sofre de depressão pode ter vergonha ou até mesmo negar a existência da
doença, por isso a confiança é uma peça fundamental nesse processo para que
seja possível compartilhar as alegrias e, sobretudo, os pesos da existência.
Oferecer companhia, compreender, saber ouvir e incentivar o deprimido a
buscar ajuda médica é uma demonstração inestimável de amizade e
aprofundam-se os vínculos afetivos. Inclusive, novas perspectivas de mundo
podem ser criadas ao proporcionar momentos alegres, risos e focar em coisas
positivas.
Permanecer mentalmente saudável nos dias de hoje é desafiador.
Infelizmente, atingimos a capacidade de nos conectarmos com o mundo todo de
forma superficial e acabamos nos desconectando de nós mesmos e dos que
estão mais próximos de modo significativo. Reverter este quadro é muito
importante porque o apoio social, aquele cujos laços não sejam frouxos, é
imprescindível para vivermos bem. Somente os elos mais profundos são
capazes de nos oferecer o efeito protetor de que precisamos para nos
mantermos mais equilibrados e dispostos a enfrentar as adversidades impostas
pela vida.
Raquel Cristina Abdalla Chiaradia, socióloga. Araras - SP.
A importância da alimentação
Nosso corpo, para manter o metabolismo, necessita de carboidratos, lipídios,
proteínas, além de vitaminas, sais minerais, entre outros compostos, os quais
são obtidos pela alimentação. Porém, se alimentar pode representar algo a
mais: pode influenciar em muitos aspectos de nossa qualidade de vida.
A depressão, por conta de suas características, reflete, inclusive, em nossa
fome. Pode extingui-la ou, ainda, pode fazer com que comamos
compulsivamente, como que para suprimir a ansiedade. Cada pessoa tem uma
forma de reagir – no meu caso, eu perdi completamente a fome e o prazer em
comer. O que fiz? Forcei-me a me alimentar, como também inclui alguns
alimentos, priorizando uma alimentação um pouco mais saudável. Isso por que
busquei referências sobre a importância dos alimentos na depressão, o que me
ajudou a entender que, o que comemos, reflete muito no que somos.
Alguns estudos têm apontado que nossa microbiota intestinal (os
microrganismos que vivem em nosso intestino) podem influenciar em nossa
qualidade de vida. É importante ressaltar que estes microrganismos, dentro de
nosso organismo, formam um ecossistema simbiótico conosco. Ou seja: esses
seres microscópicos formam uma parceria essencial. Enquanto oferecemos
abrigo e alimento, eles auxiliam na digestão, reprimem o crescimento de seres
nocivos, auxiliam nosso sistema imunológico a agir apenas contra patógenos,
entre outras funções.
Inclusive, um estudo16 apontou que a microbiota intestinal também se
comunica com o sistema nervoso central por meio de caminhos neurais,
endócrinos e imunes e, assim, influencia a função e o comportamento do
cérebro. Ou seja: os microrganismos estão, de alguma forma, influenciando-nos.
Outro estudo foi até mais longe17: ele propõe que nós, enquanto seres
humanos, não somos um único indivíduo. Cada um de nós é, na verdade, um
superorganismo. Assim, nossas emoções, cognição, comportamento, saúde
mental são, de certa forma, influenciados por uma série de entidades “egoístas”
que residem em nosso corpo. Cada uma delas tem seus interesses que podem
não ser necessariamente os nossos interesses. Mas como nos transformamos
neste superorganismo e quem são estas entidades?
Segundo a teoria do superorganismo, nosso corpo acaba por ser um mosaico
formado por genes vindos de nossos pais, além de micróbios, como bactérias
intestinais e parasitas cerebrais, como também vírus que são ingeridos ou
inalados. Podemos ainda, potencialmente, ser formado por outros seres
humanos, principalmente se formos gêmeos: na ocasião da nossa formação,
pode haver troca de células de um corpo com outro.
Inclusive, há casos “quimeras humanas”, ou seja, pessoas que contam com
células “alienígenas” absorvidas de irmãos gêmeos. E tudo isso, essa mistura
total, que forma nosso superorganismo, é capaz de influenciar em nosso jeito
de ser. Ou seja: nossa forma de ser é alterada pelas muitas entidades diferentes
(incluindo milhares de outras espécies) que estão, em vários graus, integradas
em nosso corpo.
Assim, ao falarmos de uma das partes deste superorganismo, não podemos
esquecer de destacar os microrganismos que vivem em nosso intestino. O
equilíbrio da flora intestinal pode ser alterado por algumas condições, como a
etnia, a geografia e, inclusive, nossa alimentação. Portanto, vale a pena dar
atenção especial ao que comemos, pois podemos aumentar ou diminuir
determinados tipos de bactérias que vivem em nosso organismo.
Inclusive, um estudo18 avaliou como determinados tipos de bactérias
poderiam influenciar na percepção das pessoas. Foi feita uma análise da
composição das fezes de 40 mulheres. Assim, elas foram divididas em dois
grupos: as que tinham mais bactérias do gênero Bacteroides e, outro grupo, do
gênero Prevotella. Estas voluntárias passaram por um exame de ressonância
magnética, tendo sido expostas a imagens com teor positivo, neutro ou
negativo.
A pesquisa verificou que o grupo de mulheres que tinham mais bactérias do
gênero Bacteroides eram menos reativas a imagens negativas. Já o outro grupo,
com Prevotella, tinha uma reação mais impactante quando expostas a imagens
negativas. Ou seja: as bactérias que temos em nossa flora intestinal podem ter
influências na forma de perceber o mundo.
Tanto é que, num outro trabalho científico19, ratos receberam um transplante
da microbiota fecal de pessoas deprimidas e de pessoas sem depressão.
Verificou-se que, os ratinhos que receberam a microbiota fecal de pessoas com
depressão foram induzidos a características comportamentais e fisiológicas da
depressão: tiveram anedonia (perda da capacidade de sentir prazer), como
também comportamentos ansiosos e alterações no metabolismo do triptofano
(um aminoácido que ajuda a sintetizar serotonina, o "hormônio do prazer").
Assim, o estudo aponta que determinados tipos de microrganismos presentes
na microbiota fecal podem influenciar no desenvolvimento de características
depressivas.
Detalhe: a alteração na alimentação pode influenciar no tipo de
microrganismo que vai melhor se desenvolver em nossa microbiota intestinal.
Um estudo20 verificou que, por exemplo, o consumo (a curso prazo) de dietas
inteiramente de produtos animais ou vegetais altera a estrutura da comunidade
microbiana. A pesquisa sugere que a a flora intestinal pode responder
rapidamente a uma alteração da dieta. Mudando o que se come, se altera
determinados tipos de microrganismos presentes.
Não sou especialista da área nutricional, mas acredito sim que tudo o que comemos a
Então, refletindo sobre alguns pontos, baseados nos estudos, podemos inferir
que: as bactérias de nossa flora intestinal podem influenciar em nosso humor e
a mudança na alimentação pode alterar as bactérias de nossa microbiota.
Portanto, ao adotarmos uma dieta mais equilibrada, buscando alimentos que
sejam mais saudáveis do ponto de vista nutricional, podemos ter benefícios que
refletem, inclusive, na luta contra a depressão.

Para refletir
A depressão é um transtorno mental muito comum atualmente. De acordo
com a Organização Mundial da Saúde (OMS) a depressão atingia, em 2015, cerca
de 322 milhões de pessoas no mundo.
A alimentação balanceada e equilibrada pode minimizar ou auxiliar no
tratamento de diversas patologias. Alguns estudos mostram que uma dieta com
mais carboidratos refinados (refrigerantes, doces, guloseimas) que são
alimentos mais inflamatórios ao nosso corpo, podem aumentar em até 41% o
risco de depressão.
Neste transtorno, é importantíssimo a produção de um neurotransmissor
chamado serotonina. Ele quem passa o sinal ao nosso cérebro da sensação de
bem-estar, regula nosso humor, controla apetite, sono, funções intelectuais,
entre outros.
Uma boa alimentação pode facilitar este processo. Existem matérias-primas
fundamentais para sua síntese, como por exemplo, o triptofano (aminoácido),
vitamina B6, ácido fólico (vitaminas), magnésio, cálcio (minerais), ômega 3
(ácido graxo). E onde encontra-los? Em alguns alimentos como, castanhas,
abacate, leite e derivados, vegetais verde-escuro, semente de abóbora, aveia,
ovos e peixes.
Portanto, mudar hábitos alimentares, buscando alimentos mais saudáveis,
pode influenciar positivamente no tratamento da depressão.
Danilo Piva, nutricionista, com cursos na área de Nutrição Esportiva,
Nutrição em Estética, Fitoterápicos e Nutrição Eficiente. Americana-SP.

A importância das artes
Lembro-me perfeitamente como era observar e sentir o mundo com o olhar
depressivo. As cores, os sons, os cheiros, as sensações táteis, os sentidos, ou
seja, praticamente quase tudo parecia amortecido. Eu estava completamente
vazio, feito uma exúvia, que nada mais portava. Era uma sensação de apenas
vagar, esperando o tempo passar, pois nada mais me preenchia. O que me
ajudou no processo de reconstrução do meu eu? Foi me forçar a me preencher
com coisa, incluindo a arte.
Nossa vida é muito semelhante a um jardim. Você encontra diversas plantas,
desde flores a ervas daninhas neste espaço que é apenas nosso. A depressão,
neste ponto de vista, é um herbicida que é aplicado diretamente sobre todas a
plantas. Ele mata todas, exceto as ervas daninhas que, conseguem sobreviver e,
então, se desenvolvem.
Estas ervas daninhas são os pensamentos negativos, que começam a tomar
forma na terra desolada do jardim. Nasce a culpa. Brota o negativismo.
Desenvolve-se a baixa estima. Com o passar dos ponteiros, estas ervas daninhas
se tornam cada vez maiores e ocupam todos os lugares do jardim.
Transformam-se, assim, em um ambiente sufocante e que só nos direciona a um
caminho. Aquele caminho sem volta.
Somos os jardineiros deste jardim. E se permitimos que as ervas daninhas
continuem a se desenvolver, chegará o momento que o nosso papel de deixar o
jardim bonito não terá mais sentido. Para resgatar o sentido deste jardim, cabe
então, mesmo a muito custo (e sem vontade), começar a arrancar as plantas
mais daninhas. E, em seus lugares, começar a preencher com sementes de
plantas que trarão flores atraentes.
Uma das sementes que me trouxe flores e me ajudou a eliminar as ervas
daninhas do jardim de minha vida foi a arte. Foi com o ajuda dela que comecei a
preencher minha vida vazia com a sensação de que eu era um jardineiro de
minha própria existência. Lembro-me que, quando criança, falava a minha mãe
que queria ser um jardineiro. Naquela época, era porque não gostava muito de
estudar, além de gostar muito de plantas. Hoje, a depressão me ensinou que eu
realmente devo ser um jardineiro. Mas um jardineiro da minha vida.
Então, comecei a projetar meu jardim “terapêutico”, usando a arte para me
auxiliar no meu preenchimento de sementes de flores boas. Tanto é que me
aventurei a fazer teatro, amador, com três objetivos: 1) me preencher com
alguma atividade artística; 2) me forçar a ter uma responsabilidade enquanto
“artista” para com o grupo teatral; 3) me sentir envolvido com o processo de
dar vida a algo por causa da arte, no caso do teatro, aos personagens.
Também voltei a me agarrar ao meu sonho de publicar um livro de forma
impressa e me apeguei a esta meta: batalhar para que meu projeto de
publicação e distribuição do meu livro conseguisse ir para frente e se tornasse
realidade. Confesso que comprei um violão, mas percebi que tentar aprender a
tocá-lo não saiu como planejado e eu desisti (espero um dia aprender tocar
violão).
Porém, segui firme com o teatro amador e com a ideia de publicar meu livro.
Tanto é que, em 2016, participei de duas peças teatrais, feitas por alunos do
curso livre de teatro do Fábrica das Artes: Navio Negreiro (fui um capataz) e
Romeu e Julieta – Não é uma história de amor (fui o Senhor Capuleto). Quanto
ao meu livro, fui atrás para que se tornasse realidade e, no dia 17 de dezembro
de 2016, fiz o lançamento em Americana do livro O Balanço Vazio, reunindo
diversos artistas para exporem no dia, com público de 200 pessoas. Ou seja:
abracei e cultivei as sementes do meu jardim e segui com elas como metas para
me preencher com coisas boas.
Disso tudo, aprendi na pele que se envolver com a arte faz diferença na
depressão. Pelo menos para mim. Aprendi que a arte transforma, pois consegue
tocar nosso interior de uma forma que acabamos por nos descobrirmos melhor.
É uma forma de imersão em nossos pensamentos, em ideias que estavam
represadas, em sensações que suprimimos. A arte surge para nos conectar a
uma sensação que transcende o banal, o rotineiro, o costumeiro: usamos nossa
capacidade criativa para dar origem a sensações.
Ao criar, nós nos sentimos vivos. É como se uma fagulha surgisse. Quando
escrevo, por exemplo, sinto que crio algo que vai além de mim. Vivencio um
momento de doar meu eu para algo que me faz sentir bem: usar a criatividade.
Isso me torna mais seguro e me auxilia a criar e semear sensações.
No meu caso, escrever me coloca na pele de personagens ou pensamentos
que, se eu não me forçasse a fazer este tipo de arte, jamais vivenciaria. A mesma
sensação tive quando precisei construir os personagens que interpretei no
teatro: eu tive que pensar e agir como agiria um personagem, completamente
diferente de mim. Também me aventurei a fazer algumas aulas de dança: é
maravilhoso (mesmo eu sendo completamente travado, confesso que dançar
me fez rir de uma forma mais leve).
Devo muito a ter tido depressão: ela me fez me forçar a me preencher com
arte. Seja produzindo algo, como um texto, um personagem, uma dança, ou
idealizando algum projeto cultural, ou mesmo, me fazendo nutrir com a arte de
outras pessoas: passei a enxergar as produções artísticas não com a frieza de
um mero expectador, mas com a sensibilidade daquele que se projeta na
história de um livro, de uma peça teatro, de um filme. Passei a encarar a arte
como um sentido para nossa atribulada vida.
Alguns estudos apontam o papel da cultura no auxílio da depressão.
Pesquisadores22 avaliaram 50 mil adultos noruegueses e verificaram que,
pessoas que participavam de atividades culturais, como visita a museus,
exposições, concertos, teatro, cinema e evento esportivos, apresentam menores
índices de depressão. Assim, ter contato com as artes, teatro ou música, seja
como participante ou espectador, oferece benefícios quanto à percepção
individual de bem-estar e saúde.
Outra pesquisa23, envolvendo 8200 adolescentes também verificou que
aqueles que participavam frequentemene de atividades culturais tinham
melhores resultados relacionada à saúde e bem-estar, quando comparados a
adolecentes inativos.
Portanto, na depressão, mais do que se preencher de sensações ruins, é
preciso buscar elementos que toquem nossa essência. Se a depressão nos
esvazia, é importante preencher este espaço com algo que acrescente
significações e que nos ajudem a embelezar nosso jardim da vida. Viver sem
arte é se entregar aos poucos a um obscurantismo que nos leva a engessar
aquilo que também nos faz humanos: a criatividade.


Depoimento
Aos 13 anos fui diagnosticada com depressão profunda. Na época, ninguém
entendia bem o que era isso e nem mesmo os motivos que me deixaram assim.
Talvez nem eu mesma saiba, apesar de associar o ocorrido ao fato de eu estar
em uma fase de transição “infância-adolescência”, sentindo e absorvendo o peso
das inexistentes preocupações de uma futura vida adulta.
Aliado a isso, veio uma boba desilusão amorosa. Típico da “aborrescência”.
Reflexões posteriores me fizeram acreditar na possibilidade de uma causa
orgânica, talvez genética, dado o número de pessoas com variados e
semelhantes distúrbios no histórico da minha numerosa família. Mais por parte
de mãe, porém também por parte de pai.
Em um ano e meio dentro de uma redoma, como se tudo ao redor não
passasse de um sonho esquisito, perdi a noção de muitas coisas ao meu redor,
inclusive a noção de fome, saúde e perigo. Um longo período de inanição me
levou a viver em estado cadavérico, gerando preconceito e comentários
maldosos de muitas pessoas ao redor. E pena também.
No entanto, o mais tocante foi a solidariedade de muitos, inclusive daqueles
que a gente menos espera. Cada um tinha um palpite, uma sugestão, uma
indicação, um conhecido, um grupo de orações, um benzimento, uma
abordagem, um medicamento, uma vitamina e tudo mais que fosse possível só
para me ajudar a sair daquele estado que, cedo ou tarde, me levaria ao túmulo.
As pessoas evitavam me filmar ou me fotografar naquela época, mas em uma
das gravações de aniversário de uma prima, todos ali na sala assistindo, me
deparei assustada com aquela figura estranha e esquelética na tela. Aquilo ali
sou eu? Como assim? E o estalo me levou a não apenas procurar ajuda, como
também a aceitar a que estava tentando penetrar minha redoma há tempos,
mas que eu duramente e inconscientemente rejeitava.
E a ajuda mais eficaz veio por meio da arte. Eu tinha um vasto material de
desenho ao meu dispor; minha tia fazia massinhas de biscuit para eu criar o que
eu quisesse; eu tinha papel e caneta à vontade para expressar meus
pensamentos por meio de poemas; eu tinha uma porção de livros ao meu redor
para ler; meu tio comprava sempre caderninhos de palavras cruzadas para eu
fazer... E por último, mas não menos importante, comecei a me envolver mais no
teatro, que hoje é uma das minhas principais atividades, minha profissão, minha
cura.
Sou cantora e escritora também. Duas coisas que combinam perfeitamente,
pois a música é poesia cantada e, da mesma forma, libertadora. Para mim, nada
é mais eficaz e curativo do que estar no palco, seja cantando, seja atuando, seja
dançando.
Depressão não é algo que vai embora para sempre. Ela ameniza, se
transforma, adormece, mas pode ressurgir a qualquer momento. Saber lidar
com isso e descobrir como mantê-la longe é a chave para viver bem.
É uma batalha constante. Há os que lutam e há os que esperam que lutem por
eles, usando isso para se tornarem os eternos coitadinhos que precisam de
atenção. Está em cada um decidir qual prefere ser.
Elaine Thrash, atriz, cantora, dançarina e escritora. Autora dos livros
"Da depressão à criação" e "Como ser um Bom Marido". Guarulhos-SP.

Para refletir
A utilização de recursos artísticos nos cuidados da saúde mental traz a
possibilidade de fortalecer o processo criativo existente em cada um de nós,
permitindo assim uma reconciliação com as dores emocionais e com a própria
história de vida, como também facilitar a compreensão de si e potencializando o
desenvolvimento pessoal.
A construção artística, seja ela por meio de pinturas, desenhos, poemas,
colagens, música, dança entre outras, imprime visualmente o que habita dentro
do ser humano da forma mais pura, bruta e verdadeira. O sofrimento emocional
é colocado externamente, podendo ser olhado e cuidado a fim de que sejam
elaboradas novas possibilidades, ou seja, trazer novas formas de olhar para si.
Digo que é como entrar em uma sala de espelhos: você se vê de diferentes
ângulos, de diferentes formas.
Quando se enfrenta um quadro depressivo, utilizar-se apenas da fala no
processo de cuidado, por muitas vezes se torna difícil e áspero. A falta de
disposição e desejo fazem com que ferramentas que usamos no nosso cotidiano
fiquem escondidas embaixo de camadas e mais camadas de pensamentos e
sentimentos negativos. A arte dentro do ambiente terapêutico possibilita um
caminho para fora dessas amarras que prendem, que sufocam e que acabam
tirando a liberdade de viver de maneira mais harmoniosa e equilibrada.
A Arteterapia possibilita não somente a liberdade de expressão, mas sustenta
sua autonomia criativa, amplia o seu conhecimento sobre o mundo e
proporciona seu desenvolvimento emocional e social.
Karina Nuevo, psicóloga e arteterapeuta. Americana-SP.


A cura pela natureza
Quando criança, não me aventurava pela leitura. Não tinha paciência, nem
vontade de ler. Mas lembro que, na estante da casa da minha tia, havia alguns
livros, cujos nomes sempre me chamavam atenção. Um deles era A Diabetes.
Esse título me chamava atenção porque eu, na minha inocência, sempre que via
aquele nome, pensava que Diabetes eram as “dançarinas do diabo”. Eu achava
engraçado e, por isso, me lembro deste livro. Mas ele não vem ao caso neste
momento.
Outro livro que me chamava atenção era o “A cura pela natureza”. Era um
livro de capa dura, vermelha bordô, com as letras da capa escritas em dourado.
No livro, havia fotos de plantas e o que elas ajudavam a curar. Eu ficava
folheando as páginas só para ver as fotos, mas nunca soube reconhecer aquelas
plantas. Porém o nome “A cura pela natureza” começou a me fazer mais sentido
depois que tive depressão.
Uma das coisas que me ajudou a controlar a ansiedade foi ampliar meu
contato com a natureza. Ir caminhar no meio das árvores, buscar espaços
verdes, respirar ar fresco e com cheio de terra molhada. Pode parecer algo
bobo, mas não é. Inclusive existem algumas teorias24, como a da biofilia, criada
por um dos biólogos que mais admiro, Edward Osborne Wilson, em 1984.
A teoria da biofilia diz que nós, seres humanos, somos atraídos pela natureza
e somos programados para amar tudo que é vivo. Ou seja: nós temos
necessidade biológica de estarmos conectados com o mundo natural, com as
plantas e animais. E isso afeta nosso bem-estar, nossos relacionamentos e nossa
forma de viver.
Para o psicólogo ambiental espanhol, Jose Antonio Corraliza25, nosso sistema
nervoso ainda não se adaptou à vida em cidades. Tanto é que ele criou o termo
Transtorno de Déficit de Natureza, que é uma doença que se manifesta por
estarmos desconectados do ambiente natural. Ou seja: somos animais
(racionais, embora há atitudes que contradizem isso) e nosso organismo ainda
não está adaptado a uma vida em lugares artificiais, como as cidades.
Cada vez mais não temos necessidade de sair de casa. Assim, ficamos isolados
em espaços fechados, acabando por ter um estilo de vida sedentário. Desta
forma, surge o Transtorno do Déficit de Natureza, que causa uma série de
problemas: obesidade, falta de vitamina D (por não tomarmos sol numa
quantidade adequada), asma, transtorno de déficit de atenção, hiperatividade,
entre outros.
Estar em contato com áreas verdes pode fazer grandes mudanças em nossa
vida. Falo por experiência própria. Muitas vezes ia caminhar sozinho no Jardim
Botânico de Americana – SP e ali, em meio às arvores, ao ar puro e ao som dos
pássaros e cigarras, me sentia conectado com outro mundo. Também já me
peguei “abraçando” diversas vezes uma árvore. É algo meio “bicho grilo”, bem
alternativo. Mas perdido como eu estava, por que não? Eu pedia licença para a
árvore, a abraçava e falava interiormente: “Por favor, tire essa energia negativa
de mim”. E o engraçado: eu saia mais leve. As pessoas podiam me achar “doido”,
mas quem é normal, se olhado bem de perto? O importante era sair com a
sensação de bem-estar.
Inclusive, procurando algumas notícias pela internet, encontrei matérias
sobre o livro “Blinded by Science”, de Matthew Silverstone26. Embora não se
comprove cientificamente, o livro fala que, ao se abraçar uma árvore, haveria
uma espécie de vibração energética, que afetaria nosso sistema biológico. E isso
ajudaria a melhorar a saúde, inclusive a depressão.
Outra atividade interessante é fazer jardinagem, ou mesmo cuidar de uma
horta. Eu desde criança gostei de plantas e, na época em que a depressão me
consumiu, me vi perdendo toda a paixão que tinha pela natureza. Então, mesmo
sem vontade alguma, me pus a mexer na terra e a fazer uma hortinha. Não ficou
muito bonita, afinal, eu confesso que era meio preguiçoso e não tinha tanta
habilidade com o manejo das verduras e ervas aromáticas.
Além disso, todo dia eu travava uma batalha contra os caramujos-africanos,
uma espécie exótica de caramujo, que foi introduzida no Brasil na década de
1970, com uma alternativa ao escargot. Como ninguém gostou do sabor dos
caramujos-africanos, eles foram soltos e, desde então viraram uma praga.
Assim, me sentia o pequeno príncipe, protegendo a rosa que ele tanto amava.
No meu caso, eu protegia minha hortinha. Também vi surgir lagartas em meus
pés de couve, mas não tive coragem de matá-las, pois eram bonitas, de uma
coloração verde clara. Porém, depois de falar para minha mãe, ela tratou de
esmagar todas elas, sem eu saber. Só fui descobrir no outro dia, quando as
lagartas não estavam mais ali.
Alguns estudos, inclusive27, apontam que o contato com a terra, por exemplo,
é benéfico à saúde por conta da presença de algumas bactérias, como a
Mycobacterium vaccae. Este ser microscópico pode agir como um
“antidepressivo”. Ou seja: uma vez que esta bactéria entra com o organismo, ela
ajudaria a melhorar o humor, por conta de interações químicas que ocorreriam,
auxiliando no aumento da serotonina.
Também há pesquisas28 que indicam que a jardinagem tem efeito benéfico
em pessoas depressivas. Inclusive, há estudos29 que apontam o uso da
jardinagem para melhorar a saúde física, psicológica e social, pois ela pode, há
longo prazo, prevenir vários problemas de saúde na sociedade.
Logo, o contato com a natureza é uma alternativa bastante interessante. Um
estudo feito por cientistas britânicos30 , que analisou 10 mil pessoas, sugeriu
que viver em uma área urbana, com espaços verdes, tem impactos positivos no
bem-estar das pessoas. Inclusive, esses efeitos benéficos seriam mais duradoros
do que, por exemplo, um aumento de salário. E tudo isso por quê? Por que se
verificou que pessoas que viviam em áreas com maior contato com áreas verdes
tinham menos problemas com depressão e ansiedade. Outro teste31 sugeriu que
pessoas que caminharam em florestas tiveram aumento de células de defesa,
além de induzir a produção de proteínas intracelulares anticancer.
Um outro trabalho científico32 avaliou 38 adultos saudáveis, que moravam
em cidade. Eles tiveram que responder um questionário para determinar o nível
de ruminação mórbida (ou seja, pensamentos repetitivos sobre coisas ruins ou
preocupantes), além de terem a atividade cerebral da área subgenual do córtex
pré-frontal avaliada (quanto maior o fluxo sanguíneo, maior a atividade nesta
região cerebral, que está relacionada a pensamentos mórbidos ruminantes).
Feito isso, metade dos voluntários caminhou numa área verde e calma
(semelhante a um parque) e a outra metade perto de uma estrada larga,
barulhenta e movimentada. Após reaplicarem os testes e as análises da
atividade cerebral, verificou-se que aqueles que caminharam em áreas verdes e
calmas, apresentaram melhoras significativas na saúde mental, segundo os
questionários. Outro fator positivo: o fluxo sanguíneo diminuiu na região
responsável pelos pensamentos de ruminação mórbida, o que significa que esta
parte estava mais “tranquila”. O que este trabalho sugeriu? Simples: o contato
com a natureza pode melhorar o bem-estar mental.
Por isso, não descarte a possibilidade de abraçar uma árvore, caminhar num
bosque, mexer na terra, zelar por uma planta, enfim, se envolver de corpo e
alma com a natureza. Talvez muito de nossos problemas sejam exatamente por
perdermos o contato com o verde: evoluímos, enquanto animais que somos,
junto à natureza. E ela faz parte de nós. Querer negar isso é querer se
desconectar de algo que conecta tudo. E para lutar contra a depressão, devemos
tentar de tudo. Até mesmo sair abraçando árvores.



Depoimento
Em 2015, eu fiquei muito mal. Se eu fosse falar como vivia na época, eu estava
apenas existindo. Não estava nem sobrevivendo, apenas existindo. Então, tive
acompanhamento de psicólogo e psiquiatra. Fui medicado e fiz terapia. No
terceiro mês, quando fui pegar a receita para a medicação, o psiquiatra falou:
"Por que você não começa a cuidar de uma planta? Você disse que é movido a
paixões, então por que não começa a cuidar de uma planta?”. Então, fui ao
supermercado e comprei uma orquídea. Hoje, tenho 500. Isso resgatou um
pedaço de mim que, há época, eu não tinha mais, pois havia perdido. Eu voltei a
gostar da natureza, dos animais, das plantas. Eu tinha um rancho e, desde então,
parece que eu renasci. A natureza e as orquídeas me tiraram da depressão”.
Fernando Caputti, 27 anos, gastrônomo. São Paulo-SP.



O auxílio dos animais
Quantas e quantas vezes, em momentos de em que o vazio me visitava, eu tive
a ajuda de alguns aliados de quatro patas para me dar ao menos um conforto.
Embora eu estivesse ali, vazio, eles me acolhiam com um amor que eu não
consigo explicar com palavras. É preciso sentir. E mesmo sem perspectivas por
conta da doença que pairava em mim, havia um conforto tão grande em ser
acolhido por meus cachorros. Eles não me faziam sentir culpado por estar
daquele jeito. Apenas aceitavam que eu não estava bem e, com seus olhares
sempre ternos, me faziam brotar um singelo sorriso.
Gisele, minha vira-lata sem noção, é um exemplo de cachorra alto astral, que
muito colaborou para minha recuperação. Com suas pernas esguias e
compridas – tal qual uma modelo – ela parece uma fã histérica, que grita e
treme quando me vê. Fica tão eufórica, que pula e me morde (a ponto de deixar
marcas). E isso muito me surpreende, tendo em vista que quem dá comida a ela
é minha mãe e meu pai. Porém, ela me escolheu como o grande amor da vida
dela: parece que, se não me vê, fica triste e emburrada. E ela sempre soube me
fazer sorrir, mesmo quando estou triste.
Tive muitos outros cachorros que permearam minha infância e adolescência.
Pitanga, o vira-lata que corria atrás das corujas. Barão, o pintcher que me
defendia e vivia a caçar passarinhos e insetos. Trícia, uma cachorra que não me
suportava – tinha ciúmes de mim. Quita, uma bobalhona, sem expressão.
Chanty, o adorador de chocolate, bravo e ao mesmo tempo carinhoso com
minha mãe. Talanta, mãe de Chanty, adoradora de pedaços de coco e nacos
congelados de carne moída. Roque, o coração de manteiga de olhar abobalhada,
boa praça e que vivia atrás de cachorras (era um tremendo de um conquistador
barato)
Também havia a Rúbia, a enfezada mais carinhosa que conheci. E, por fim,
Zequinha, meu eterno “cão-baleia”, obeso, estufado, que me deixou muita
saudade. Adorava passear de coleira e comer castanhas-do-pará. E, em 2017,
quem nos abandonou foi Godofredo, nosso vira-lata peludo e que amava comer
o tempo todo. Eles ficaram nas lembranças, levados pelos incansáveis ponteiros
do tempo. Foram os cachorros que passaram por minha vida.
Hoje, em minha casa, temos a Gisele e a irmã da Gisele (minha mãe a chama
de Serena, mas ela parece não entender quando a chamamos). Também temos o
Dieguinho, um pinscher que se acha no direito de sempre ganhar presentes e a
Juca, uma vira-lata que se parece com uma cabra. Além dos gatos que não citei
(tratamos os bichanos da rua). Mas afinal, o que os animais têm a ver com tudo
isso? De que forma eles me ajudaram a me sentir mais completo enquanto ser
humano?
Eles, de alguma forma, fizeram um grande diferencial para mim em
momentos em que me sentia completamente vazio. Eles preenchiam algo ali,
com um amor incondicional. E vários estudos comprovam que ter animais de
estimação trazem uma série de benefícios para a saúde.
Um estudo33 feito com quase 6 mil australianos avaliou que os proprietários de anim
Não contente com isso? Pesquisadores norte-americanos35 avaliaram 424 pacientes
Mas afinal, de que forma os animais poderiam nos auxiliar na luta contra a depressão
E isso parece muito interessante, tendo em vista que, ao cuidar de alguém, doamos n


Depoimento
Lembro-me que, aos 12 anos comecei a fumar cigarros, além de ter um
comportamento agressivo e depressivo. Aos 19 anos, tive meu primeiro
namorado que, com muito esforço, me auxiliou a deixar o vício. Consegui parar
de fumar aos 22 anos, porém a tristeza, a ansiedade e o peso corporal dobrou.
De 60 kg, em quatro meses, fui para 103 kg.
Foi neste ponto que tudo foi piorando e, inclusive, eu tinha um conhecido que
conseguia ilegalmente ansiolítico faixa preta. Todos os dias, às 18h, eu o tomava
o remédio para dormir e fugir da realidade, acordando apenas no dia seguinte
para trabalhar.
Cada vez mais engordava e me entristecia, com os pensamentos ruins
aumentando. Com 24 anos, meu namorado na época, rompeu o relacionamento.
Fiquei desesperada em ver o que tinha feito com meu corpo.
Desta forma, busquei auxílio de um endocrinologista, que me receitou vários
remédios para auxiliar no emagrecimento. Após duas semanas de tratamento,
tive um início de ataque cardíaco, que me deixou por dois dias internada.
Lembro-me até hoje que foi no quarto do hospital que um médico (com idade
bem avançada) passou para me ver e disse seriamente "Carolina, você não
precisa tomar remédios para emagrecer ou vencer a tristeza, você precisa de
ajuda terapêutica, fazer atividades físicas e mudar sua visão do mundo”.
A partir daquele dia decidi procurar ajuda. Então, aos 28 anos, dei início ao
meu tratamento terapêutico. Com seis meses de terapia, minha terapeuta me
recomendou que eu entrasse para uma ONG (Organização Não Governamental)
de Animais como voluntária. Como sempre amei os animais, aceitei, mas com
muito medo: sabia que teria grandes responsabilidades e teria que interagir
com as pessoas.
Foi então onde tudo começou de fato evoluir: eu comecei a notar o quanto
meus problemas eram menores comparados ao sofrimento daqueles pobres
animais abandonados. Foi ali que encontrei fôlego para querer cada vez mais
ajudá-los. Porém, na verdade, quem estava sendo ajudada era eu: por amor a
eles, reaprendi a interagir com as pessoas e a ter paciência com as diferenças.
Meu tratamento terapêutico evoluiu, pois os animais me mostraram o
verdadeiro amor incondicional, sem julgamentos e sem restrições. A cada
conquista que eu conseguia para ONG, eu me alegrava mais e mais. Quando vi,
estava 40 kg mais magra, praticando atividades físicas e amando
incondicionalmente. Praticamente eu me tornei uma nova pessoa.
Carol Huppert, 31 anos, técnica de segurança no trabalho. Americana-
SP.

Para refletir
Quando a pessoa tem depressão ou síndrome do pânico, o tratamento
terapêutico é de grande importância. E, somado ao tratamento, uma ferramenta
interessante para auxiliar na recuperação é a pessoa tirar o foco do problema
dela. Qualquer trabalho voluntário, por exemplo, ajuda neste processo, pois a
pessoa passa a ver o problema do outro.
No caso de trabalho voluntário com animais, o retorno é muito positivo. Em
casos de depressão que são originadas por uma perda, o contato com os animais
pode auxiliar neste processo, pois eles ocupam parte desta perda.
É cientificamente comprovado que ter um animal de estimação aumenta os
níveis de serotonina, um neurotransmissor envolvido na melhoria do humor.
Logo, uma coisa leva a outra: quando a pessoa com depressão vai a um abrigo
de animais, por exemplo, ela se depara com uma realidade que não é a dela e
pode acabar por se envolver com a causa.
Ela começa cuidando de um animal e, quando percebe, já está envolvida com
uma feira de adoção, um bazar para levantar fundos, enfim, se sente parte da
causa. Isso faz com que ela sinta mais vontade de ir e acaba motivando outras
pessoas que passaram pelo mesmo problema.
Além disso, existe a questão simbólica por trás. Quando alguém foi rejeitado,
esta pessoa acaba por se identificar, por exemplo, com um animal que também
foi rejeitado. Existe toda essa simbologia da identificação envolvida.
Lucia Paschinelli, psicóloga e presidente da ONG Animais Têm Voz.
Americana – SP.


Medicamentos
Vivemos numa sociedade que gesta as próprias doenças: é estigmatizadora,
preconceituosa e cria o ideal de pessoas perfeitas. Acima disso, coloca uma tarja
indicando aqueles que não se encaixam em seu molde. Para esta sociedade, só
lhe serve quem se encaixar em seus padrões utópicos.
Temos como isso as próprias crianças, tendo seu próprio jeito de ser
modificado quimicamente por meio de remédios. Aquelas que tem “déficit de
atenção”, recebem medicamentos para serem menos hiperativas. Tanto é que
no Brasil38, no ano de 2000, foram vendidas 70.000 caixas de metilfenidato. Já
em 2010, houve um salto para 2 milhões de caixas. Isso colocou o Brasil como o
segundo maior mercado consumidor do mundo de metilfenidato (remédio para
hiperatividade), perdendo apenas para os Estados Unidos da América.
A questão que fica: é realmente necessário medicar as crianças, que não
conseguem se adequar a um sistema educacional ultrapassado, privando-as de
seu próprio jeito de ser, ou é necessário reformular as bases educacionais,
trazendo a escola do século XIX para os tempos contemporâneos? Só quem é
professor sabe como a realidade escolar continua ultrapassada, engessada em
velhos modelos que não dão espaço para respirar.
A educação do século XIX, que é atual, tem prezado apenas ainda por decorar
fórmulas, nomes, datas bem como atingir médias de avaliações que, se
analisarmos bem, nada representam. A educação atual, que exclui a realidade
do aluno, deseja que esteja seja apático, mero reprodutor, que se adeque ao seu
sistema. Por isso, a medicalização para as crianças teve este salto. Não se muda
o sistema, que é arcaico. Opta-se por medicar as crianças e as privarem de sua
energia natural.
O mesmo se pode dizer da depressão: ela é um sintoma desta sociedade cada
vez mais opressora, que deseja a todos sendo felizes o tempo todo, não aceita
quem é diferente, quem não se enquadra, tem ojeriza ao “perdedor”, ao
“fracassado”. Muito do que vivemos hoje em dia, em termos de depressão, se
deve a forma de vivermos numa sociedade que não vê o indivíduo como ser
humano, mas como uma peça, totalmente substituível.
Logo, a medicalização, até mesmo por uma questão de pressão farmacêutica,
surge neste cenário. É mais fácil ter a “pílula da felicidade”, do que fazer com
que a sociedade mude. Caso vivêssemos num ambiente acolhedor, menos
individualista e mais humanitário, muitos dos casos de depressão jamais teriam
acontecido.
Porém, a realidade é outra. E quem sofre é cada pessoa, que se vê
desfragmentada e isolada, mesmo estando ao redor de uma multidão. É a
sensação de não pertencer a nenhum lugar ou momento, como se estivéssemos
pairando numa correnteza sem rumo. Como se sentir parte de algo, se essa
sociedade preza apenas o eu?
Não quero aqui dizer que o uso de medicamentos seja algo condenável. Pelo
contrário: em muitos casos o medicamento se torna uma ferramenta muito
importante para a pessoa se reestabelecer e conseguir sair do estado
depressivo. Trata-se de um problema de desequilíbrio químico que, em alguns
casos, o medicamente, desde que prescrito por um médico especialista, é
essencial. A questão é que medicalizar é pouco: você não elimina ervas daninhas
cortando apenas suas folhas. É preciso cavar fundo e arrancar suas raízes.
Inclusive, o relator especial da Organização das Nações Unidas (ONU) sobre o
direito à saúde, Dainius Pūras39, ressalta que o tratamento da depressão não
deve confiar apenas no uso de medicamentos. Para ele, os países devem mudar
o foco dos “desiquilíbrios químicos” para os “desiquilíbrios de poder” na
sociedade. Ou seja: deve-se combater abusos e desigualdades sociais, como:
situação de pobreza e exclusão, questões de gênero, violência, entre outras
questões que fazem parte do ambiente emocional de uma pessoa. Desta forma,
quando se fala em depressão, os remédios, em determinados casos, são apenas
uma fórmula química para reestabelecer o ciclo normal dos
neurotransmissores. Tratam-se os sintomas, mas não a causa. A primeira e a
mais essencial reside na própria sociedade.
É o mesmo que ocorre com as crianças com “déficit de atenção”. São
medicalizadas para se adequar a um sistema educacional falido. Sua essência de
criança, natural por querer viver a vida com olhos sonhadores, é envolta por
uma névoa medicamentosa – e a cerne do problema continua a mesma, se
repetindo ano a ano, com uma nova leva de crianças que necessita ser medicada
para se portarem apaticamente e seguirem o sistema educacional.
Quando se fala na depressão e no uso de medicamentos, existe ainda toda
uma pressão farmacêutica por trás. Há um mercado sendo movimentado, que
gera milhares de empregos diretos e indiretos, como também bilhões de dólares
em lucro. Portanto, existe um lobby pesado por trás do uso de medicamentos.
Além disso, é importante realçar que a sociedade atual é a sociedade dos
contrassensos. Ela prega por indivíduos que atendam aos seus padrões, estando
sempre felizes e dispostos para tudo. Porém estigmatiza como fraco aquele que
usa de medicamentos contra depressão e, em muitos casos de seleção de
emprego, por exemplo, caso alguém fale que use antidepressivos, já é eliminado.
Esta sociedade transforma as pessoas em doentes e não permite que elas se
tratem abertamente (é um tratamento velado, a pessoa tem que esconder que
se trata da depressão): quando isso acontece, por meio de medicalização, elas já
recebem um rótulo de fracas ou incapazes. O que é uma inverdade, pois há
casos que a medicação pode ser aliada e é de fundamental importância.
Como cada pessoa é única, o uso de medicamentos, em determinadas
situações, pode ser uma alternativa viável para ajudar a pessoa sair das fases
mais nefastas da depressão. E lógico: isso desde que haja um acompanhamento
médico, que poderá acompanhar o quadro clínico e avaliar a real necessidade
do uso e quantidade do medicamento. Portanto, ninguém deve se sentir inferior
por ter que utilizar um medicamento para ajudar na depressão. É essencial
buscar referências de um bom médico, com uma visão humanística, ou seja,
aquele profissional que te enxerga como ser humano e não como cliente e, caso
seja necessário (e indicado pelo médico), fazer uso do medicamento.
É imprescindível lembrar também que, muitas vezes, um tipo de remédio
também não faz o mesmo efeito que fez em outra pessoa. Por isso é preciso ter
um profissional médico por trás deste auxílio medicamentoso. Ademais, vale
realçar que qualquer auxílio contra a depressão é essencial: muitas vezes o uso
do medicamento pode ser por alguns meses, apenas para tirar a pessoa dos
sintomas mais profundos da depressão. A partir dessa “reestabelecida”, ela se
sente mais fortalecida para atacar as causas desta doença, reaprendendo a se
amar, mudar a forma de encarar o mundo, se aceitar e a entender que há coisas
que ela pode e deve mudar e outras que não se tem como mudar e, portanto,
deve aceitar.

Depoimento
Desde os meus 6 anos sabia que aquela tristeza que eu sentia não era algo
normal, mas não sabia explicar o que era aquilo. Até os 41 anos eu vivia dentro
de uma bolha escura e triste. Esta tristeza persistia mesmo nos momentos que
aconteciam coisas lindas, como o nascimento dos meus filhos.
Mas a dor de sentir tristeza era tanta que tive que aceitar que alegria não era
um mérito ou uma punição. Depois de muito relutar, fui a um psiquiatra. A
resistência em relação ao médico tinha sentido, pois cresci vendo alguns
parentes por parte de pai entrando e saindo de manicômios, como eram
chamados antigamente. Até hoje tenho primas que passam por internações
constantes. Meu medo era começar a tomar remédios de uso controlado e ficar
abobada, lenta e incapaz.
Então fui ao médico e, com cinco dias após o uso de antidepressivo, comecei a
ver uma luz no fundo do túnel. Nunca tinha sentido aquela sensação de paz e de
alegria. Nem mesmo quando passei por momentos bons em minha vida.
Foi aí que descobri que muitas pessoas fazem uso de medicamentos e não
comentam com os outros, talvez pelo medo do preconceito. No meu caso, a
medicação faz muito bem. Eu nunca tive efeito colateral e nem precisei mudar
para uma dose maior.
Comecei o tratamento há 12 anos e sei que é paro resto da vida. Já tentei
parar, porém quando fico sem o remédio, sinto a tristeza voltar, além de querer
dormir para sempre, para não sentir mais nada.
Além do antidepressivo, o que me ajudou também foi fazer atividade física,
que traz um bem-estar muito bom. Também tenho outro “medicamento” que
tomo diariamente: FÉ! Sem ela, o caminho fica muito mais difícil!
Marcia Moretto, 53 anos, casada, mãe de dois filhos e avó da Clara.
Americana-SP.

...

Descobri que tinha depressão em meados do ano 2000, mas os sintomas
tinham começado há pelo menos um ano atrás. Ela sempre chega discreta, com
uma coisinha aqui que você desanima, outra ali que perdeu a graça e quando
você percebe não tem mais qualquer capacidade de sentir prazer.
E sem prazer, sem alegria, sem beleza, nenhum esforço parece fazer sentido.
Tudo que resta são as tristezas, dores, pessimismo, que a gente tenta sanar com
as poucas coisas que ainda dão algum prazer. Coisas que você não
experimentou ainda. Algo que você ainda não comeu, não comprou, alguém com
quem você não transou.
E quando essas coisas também perdem a graça, você perde a coragem de
tentar conseguir mais dinheiro, porque sabe que não há mais nada que vá lhe
trazer alegria. Você só quer dormir sem sonhar. E quando está acordado, não
tem ânimo para sair da cama, exceto para pegar uma das facas sujas na pilha de
louça da pia e abrir os pulsos. Foi a vontade de morrer que me abriu os olhos.
Afinal, a mesma coisa que acelerou minha depressão foi a que me permitiu
entender o que estava acontecendo.
Medicina era um curso que eu nunca deveria ter começado. Entrei pela
promessa de grana, mas também para ajudar minha mãe, que tem transtorno
bipolar. Sim, sempre gostei de ajudar as pessoas, mas nunca gostei de
memorizar as enormes quantidades de informação necessárias para se tornar
um médico. Sempre fui um cara extremamente criativo e isso sempre me
definiu, sempre foi o que sou melhor em fazer, sempre foi o que mais me deu
prazer, sempre foi onde me reencontrei.
Não foi na igreja, nem na bíblia, nem na religião austera em que cresci.
Reconhecer minha deficiência genética e minha necessidade de medicação para
compensá-la foi o primeiro passo para ser um humano completo de novo.
Tomando a medicação, não tenho mais crises depressivas. Tenho, em alguns
momentos mais pesados, uma tristeza que talvez seja um pouco maior do que
aquela que eu deveria sentir se tivesse uma genética normal, mas não considero
esses episódios como crises depressivas.
O outro ponto positivo da depressão em minha vida foi reconhecer minha
verdadeira vocação, além da liberdade criativa e religiosa de que eu precisava.
Sem a depressão, provavelmente eu seria, hoje, um médico frustrado, fazendo
mal a mim mesmo e aos outros. Seria um fanático religioso lutando contra mim
mesmo, enterrando meus verdadeiros talentos para satisfazer minha família e
minha igreja. A depressão me fez sofrer, sem dúvida, e volta e meia ainda faz.
Porém também é um constante lembrete de meu corpo de que preciso cuidar de
mim mesmo, de me apegar àquilo que realmente é importante para mim.
Osíris Reis, 37 anos, escritor e profissional de audiovisual. Brasília-DF.
Site: osirisreis.com.br

Para refletir
Partindo do pressuposto que alguns estudiosos consideram que a saúde
mental completa estabelece-se quando o indivíduo alcança uma satisfação
diária com a vida, bem-estar social e psicológico, livre de ansiedade, de
pensamentos suicidas e do abuso de substâncias por pelo menos um ano,
podemos observar o quão difícil é chegar nesse patamar de plenitude. Diante
disso, levando em conta todos os percalços da pós-modernidade, o que se
vivencia hoje nos consultórios médicos é um aumento significativo dos
transtornos mentais; sobretudo a depressão que é, de fato, um problema de
saúde pública que merece total atenção.
Com isso, vale ressaltar a fundamental importância da assistência médica a
estes indivíduos. Cabe ao médico, ao menor sinal de suspeição de um quadro
depressivo, considerar uma nova aba de tratamento e oferecer alternativas que
contribuam na recuperação desses pacientes. Tais medidas englobam o uso de
terapias alternativas (acupuntura, ioga, entre outras), terapia analítico-
cognitiva, acompanhamento especializado de um profissional psicólogo e/ou
psiquiatra quando se fizer necessário e, até mesmo, o uso de medicamentos que
possam auxiliar na recuperação.
Particularmente, percebo que há certo padrão naqueles pacientes que
apresentam uma recuperação mais significativa e rápida do quadro depressivo.
Fatores como um relacionamento saudável, tratamento de dores físicas, pratica
regular de exercícios físicos e não abuso de substâncias psicotrópicas,
contribuem diretamente para a recuperação mais eficaz desses pacientes. Em
contrapartida, pessoas com traumas de infância, em relacionamentos abusivos,
com limitações físicas, que sofrem algum tipo de preconceito cotidiano e em uso
exacerbado de substâncias psicotrópicas tendem a ter uma recuperação mais
lenta e trabalhosa.
Com isso, concluo que o papel do médico frente a este cenário é fundamental.
Lançando um primeiro olhar clínico sobre a vulnerabilidade deste indivíduo.
Diagnosticando. Servindo como porta de entrada ao tratamento profissional de
fato, utilizando-se de todas as alternativas e intervenções que possui, até
alcançar a recuperação efetiva desse paciente e seu posterior seguimento.
Murilo Caetano de Jesus, médico clínico geral. Atua na Atenção Básica
nos municípios de Nova Odessa e Santa Bárbara d’Oeste-SP.






Terapias alternativas
Há coisas que ficam marcadas em nossas memórias. Lembro que, quando
criança, minha mãe me levava, às vezes, para benzer. Embora eu não me lembre
dos mínimos detalhes, algumas coisas ficaram como sensações. Eu me sentava
numa cadeira, ficava quieto e a Dona Noêmia, que era uma vizinha minha, me
benzia. Ela fazia o sinal da cruz em mim e rezava. É como se ela cochichasse a
oração. Eu ficava atento, prestando atenção nos detalhes. Logo em seguida, ela
acendia palitos de fósforo, deixando-os queimar. Depois disso, quebrava-os na
beirada de um copo cheio de água. Dependendo da forma como reagiam os
palitos (se afundavam ou não) eu tinha “quebranto”.
Na imensa maioria das vezes, eu tinha “quebranto”, que nada mais é do que
um mau olhado. Após ser benzido, eu tomava goles de água que a Dona Noêmia
me oferecia. Lembro que a água tinha o gosto do filtro de barro, era leve e com
certo tipo de frescor. Ela tinha um sabor diferente da água que eu tomava em
casa e, por incrível que pareça, eu me sentia bem depois.
Com o tempo, já crescido, comecei a olhar tudo isso com certo ceticismo.
Passei a acreditar no “efeito placebo”, que nada mais é do que um efeito
terapêutico devido aos efeitos psicológicos da crença da pessoa que está sendo
tratada. Ou seja: por acreditar que aquilo vai dar certo, ela sente os resultados. E
assim, o ceticismo quanto a qualquer coisa “alternativa” foi se instaurando em
mim.
A depressão me ensinou a reverter meu ceticismo. Ela me ensinou que o
“não” nós já temos e que tudo o que vier para poder ajudar, temos que tentar.
Ela me mostrou que temos que recorrer a tudo para combatê-la e, se dermos
qualquer brecha, ela continua ali, enraizada, esperando o momento para voltar.
Foi então que comecei a ler coisas relacionadas a trocas de energia, chakras, e
tudo mais que transita neste universo. Embora a ciência, muitas vezes, não
consiga comprovar, passei a me permitir dar crédito de que há muitas coisas
que não tem explicação lógica. Estão além da compreensão: é preciso se
permitir extrair o que há de melhor.
O que não agrega, podemos descartar. É necessário sempre se preencher de
coisas boas, para que as ruins não se apossem do que somos. Não que o meu
ceticismo tenha sumido de vez (tenho um lado muito racional): a questão é que
eu passei a me permitir a permitir. Ou seja: não olho tudo com o olhar clínico e
frio, mas com uma forma de tentar entender que, talvez, haja mais coisas além
do palpável e material. Afinal, o não nós já temos.
Assim, passei a tentar captar o melhor de qualquer terapia ou ajuda
alternativa. Vale lembrar que, por terapia alternativa, podemos entender uma
espécie de tratamento que foca cada um de forma global. Ou seja: é levado em
consideração o aspecto físico, mental, emocional e espiritual, além do meio em
que a pessoa está inserida.
Ao invés de focar somente na doença e sua cura, a terapia alternativa busca
envolver todos os aspectos, pois compreende o ser humano como um todo. Só
nesta visão, esta forma de entender as pessoas me convence muito, pois, para
mim, somos frutos de uma união de diversos fatores, como nossa história,
cultura, sociedade, ambiente, entre outros. E por que não, as energias que
emanam de nós e de tudo a nossa volta não podem, inclusive, ter influências?
Alguns trabalhos científicos, inclusive, mostram que as terapias alternativas
podem somar como um complemento às outras ações para se combater algum
problema. No caso do Reiki40, que é uma técnica oriental de imposição de mãos,
apontam que a técnica ajudou a reduzir a intensidade da dor, a ansiedade, o
número de analgésicos em mulheres que foram submetidas à cesárea. Também
houve trabalhos41 que relacionaram o Reiki a bem-estar, relaxamento, alívio da
dor, qualidade do sono e redução da ansiedade em pessoas com câncer. Até
mesmo estudo42 feito com ratinhos mostram que, com o Reiki, houve uma
redução significativa da frequência cardíaca em ratos estressados.
Já com a técnica da ioga, que se utiliza de práticas envolvendo exercícios e
meditação, um estudo43 dividiu mulheres em dois grupos. Um deles (34
pessoas) participou de aulas de ioga duas vezes por semana, com 90 minutos de
duração, por dois meses. O outro grupo (31 pessoas) não fez ioga. Os resultados
apontaram que a prática da ioga pode levar a uma redução significativa nos
níveis de ansiedade.
No caso da acupuntura, que é um ramo da medicina chinesa tradicional que
consiste em introduzir agulhas metálicas em pontos precisos do corpo, há
estudos que apontam melhorias em pessoas com depressão44. Outro trabalho45,
inclusive, sugere que a acupuntura pode ser uma terapia alternativa para
auxiliar no tratamento da insônia relacionada à depressão.
Se levarmos em consideração uma série de estudos, podemos verificar que há
trabalhos apontando que as terapias alternativas podem ser uma forma muito
interessante de auxiliar na luta contra certa doenças. Mas vale lembrar também
que há inúmeros trabalhos refutando o uso destas terapias. É a mesma história
do café: vira e mexe ele se torna de mocinho a vilão.
Por via das dúvidas, é sempre preciso buscar o melhor que podemos. Quando
já temos o não, qualquer possibilidade é uma esperança e devemos se agarrar a
tudo, desde que isso não comprometa ainda mais nossa saúde. Além disso, é
interessante, sempre buscar um acompanhamento profissional, de forma a ter
um direcionamento e, inclusive, continuar os tratamentos. Quanto às terapias
alternativas, tudo o que vier a somar tem que ser encarado como um ganho
para o bem-estar. Afinal, o que mais importa na vida é estarmos bem e, acima de
tudo, lutarmos diariamente por isso.

Depoimento
Tenho 22 anos e há aproximadamente um ano consegui sair de uma
depressão profunda. Começou em 2009, motivada por bullying e rejeição de
terceiros. Minha vida se resumia em ficar trancado em um quarto e me odiar o
máximo possível. Músicas que falavam de solidão, melancolia e tristeza eram as
únicas presentes nas minhas playlists.
Eu fazia acompanhamento com duas psicólogas, mas, segundo elas, a
intervenção de um psiquiatra seria necessária visto que medicamentos seriam
essenciais para minha cura. Recusei-me. Eu tinha medo de viciar e ter que
depender deles para sempre. Mesmo com pensamentos suicidas, não os quis.
Em 2015 pensei que as coisas iriam mudar, pois mudei de cidade para entrar
na faculdade. Confesso que, no primeiro mês, até fiquei feliz com a mudança,
mas depois tudo caiu na mesmice e a pressão da faculdade foi sufocante o
suficiente para me jogar para baixo. Voltei a me odiar. Não tinha forças para
levantar da cama, faltei várias aulas. Bebia, algumas noites, até passar mal e não
saber o que estava fazendo.
Entrei em um grupo de auxílio, mas saí, pois nem ânimo para ir nele eu tinha.
E então eu conheci o meu namorado, Guilherme, que me mostrou a física
quântica. Que me levou a conhecer o espiritismo, e por meio dele, a umbanda. E
minha vida mudou. Estudar a física quântica me fez ver sentido em tudo. Os
princípios da umbanda me fizeram ter fé em pessoas do bem.
Seguindo o gancho, conheci as terapias holísticas, comecei estudar
aromoterapia, fiz um curso de florais e cromoterapia. Foi uma mudança lenta e
progressiva. Depois que eu entrei nesse caminho, minha vida foi melhorando,
minha forma de pensar mudou, minhas crises diminuíram e viver ganhou
significado.
Para meu grupo de amigos, foi um choque. Eu parei de reclamar, conseguia
pensar positivo e comecei a sorrir. Comecei, ainda, a ler sobre o hinduísmo,
budismo, a cabala, mecânica quântica, chakras, Reiki, medicina chinesa e: tudo
fala a mesma coisa! Essa interconexão me fez gritar “Eureka! A vida é real!”.
Passei a cuidar de mim, me alimentar bem, ouvir músicas alegres. Quando eu
paro para analisar, não acredito que consegui curar uma depressão tão densa
com coisas que antes eu julgava bobas. Hoje minha vida é leve. Agradeço por
estar vivo. Eu amo viver. Sou grato por tudo, inclusive pela depressão, pois
aprendi uma lição essencial: seguir em frente é um poder que está em mim e em
todos.
Yago Rodrigues, 22 anos, estudante de odontologia. Vitória- SP.

Para refletir
Ao lançar um olhar para a questão da depressão, necessito buscar
compreensões em todo o conteúdo sobre o qual me debrucei. Iniciei meus
estudos sobre subjetividade, saúde e comportamento humano em 2006, quando
ingressei no curso de Psicologia. Continuei nesta linha de interesse ao fazer
mestrado. Paralelamente, iniciei o atendimento clínico e investi em uma
formação complementar, buscando uma visão holística do ser humano.

Alguns cursos nesta área me apresentaram uma nova perspectiva clínica.


Inclusive, como se trata das ciências humanas, para conteúdos pessoais. Esta
construção plural de um olhar para demandas terapêuticas, como a depressão,
me possibilitam hoje considerar que esses fenômenos se constituem, também,
de uma forma não singular.

Assim, ao pensar na manifestação de sintomas depressivos, considero ser


significativo levarmos em conta as interações entre múltiplos fatores que, em
maior ou menor grau, podem atuar em casos e pessoas diferentes. A meu ver, a
depressão pode ter uma origem genética, mas a interação com o meio social e
vivências pessoais possibilitam alterações químicas cerebrais.

Esses dois fatores são reconhecidos e estudados pela Psicologia como ciência
e profissão, porém, pela minha formação holística, reconheço que um terceiro
fator – ainda pouco explorado – pode se tornar um diferencial no tratamento de
manifestações como a depressão: a questão energética e transpessoal.

É importante ressaltar que existe um embate envolvendo os Conselhos de


Psicologia a respeito da linha mais transpessoal, a qual bebe muito na fonte da
medicina oriental. A visão transpessoal é aquela que transpõe, ou seja, vai além
do psicológico e do biológico. Para ela, há algo além. Se seguirmos a linha
ocidental, não é dada muita atenção a este lado energético, como o alinhamento
de chakras. Porém, com a visão oriental, a constituição do ser humano acaba
por compreender três pontos: o psicológico, o biológico e o energético. E, nesta
visão, seguindo uma linha transpessoal, para se trabalhar a depressão seria
interessante envolver estes três aspectos, encarando a pessoa de uma forma
holística.

Larissa Bergamo Zanardo, psicóloga, mestre em Psicologia e


Acupunturista Auricular pela Medicina Tradicional Chinesa. Rio Claro-SP.
As redes sociais e a internet
Vivemos em uma era em que o estar perto não é mais físico: a internet
favorece a aproximação, conecta e dá a sensação de estarmos participando da
vida de alguém que mora, muitas vezes, quilômetros de nós. É um mundo
fantástico, em que nos colocamos em contato com o outro em segundos,
resolvemos problemas com alguns cliques, compramos produtos e pesquisamos
o preço mais baixo, votamos e assinamos petições on-line. É um ambiente de
facilidades e conexões: está tudo disponível, basta saber o que, como e porque
acessar determinado material.
Eu cheguei a pegar a transição. Lembro que, quando criança, ia até a
biblioteca pesquisar matérias de escola. Certa vez, eu precisava fazer uma
pesquisa sobre as diferenças entre os relevos, como planalto, planícies e
depressão (não a depressão tema deste livro, mas a depressão do relevo). Fui
com meu pai até a biblioteca e pedi à moça da recepção livros sobre o assunto.
Ela trouxe alguns materiais e, com meu pai, sentamos na mesa da biblioteca e
ficamos um bom tempo até eu copiar o trecho do texto numa folha de almaço.
Para se ter ideia, o xerox ainda não estava disponível, era preciso fazer tudo a
mão.
Hoje, se eu quiser relembrar a definição do que é planície, planalto e
depressão, é só entrar em um site de buscas e, em segundos, tenho uma
infinidade de páginas. Não preciso sair de casa. Não preciso ir com meu pai até a
biblioteca. Não tenho necessidade de pedir auxílio à bibliotecária. Fico só em
minha casa, sem essa necessidade de contato. A facilidade versus a não
necessidade de contato com o mundo real.
Não quero aqui dizer que prefiro retroceder. Pelo contrário: a internet
facilitou demais a vida. A questão é que, embora tudo seja facilitado, passamos a
depender de tal forma dela que, inclusive, mudamos nossa maneira de se
relacionar. Na era dos cliques, os botões de adicionar amigos são tão simples
quanto os de eliminar amizades.
Em questão de segundos, fazemos e desfazemos “amigos virtuais”. Alguém
não fala algo que não gostamos, excluímos. A pessoa pensa diferente – e isso nos
incomoda – deixamos de segui-la. Não que isso não seja interessante: por que
continuar a seguir alguém que, de alguma forma, incomoda-nos com
determinado tipo de pensamento ou só quer gerar barulho nas redes sociais?
A questão é: até que ponto nos permitimos viver uma vida calcada no virtual?
Até que ponto optamos por deixar de viver uma vida real, com seus dissabores,
olho no olho, com seus problemas? Estamos, parece, cada vez mais sendo
forjados para vermos um mundo colorido, varrendo para baixo do tapete
(virtual) qualquer pequeno abalo que surge. Qualquer dissabor, apagamos o
amigo. Mas o mundo não é assim. O mundo real é feito de pessoas: eu, você,
nossa sociedade.
Inclusive, pesquisas apontam que o uso de redes sociais podem ser um
gatilho na formação de autoimagens negativas e, inclusive, agravar a depressão.
Um estudo46 verificou que pessoas com baixo nível de bem-estar são mais
vulneráveis a se comparar socialmente com as outras no Facebook.
Já outra pesquisa47 avaliou 1.787 pessoas entre 19 e 32 anos e verificou que,
quanto mais tempo de uso nas redes sociais, maior a relação com a depressão.
Porém é válido realçar que o estudo pode ter dupla interpretação: pessoas que
usam mais redes sociais têm chances maiores de serem depressivas ou, ainda,
pessoas mais propensas a depressão usam mais as redes sociais.
É importante ressaltar que as redes sociais são grandes edições de nossa vida:
colocamos o que julgamos ser interessante e que nos mostra fazendo sempre
algo diferente. Uma comida exótica, uma viagem, um passeio, um encontro de
amigos, uma peça teatral, um encontro inesperado com uma celebridade.
Vivemos a era do selfie desenfreado: para existirmos, precisamos registrar tudo
por meio de fotos.
As redes sociais sempre me deram essa sensação de um grande espetáculo.
Quando analisamos as postagens, o que temos a impressão é que muitas
pessoas, de forma geral, têm uma vida cor de rosa. É uma eterna novela virtual,
em busca de aprovação: alimentamos as redes com fotos, mensagens, materiais,
de forma a conseguir curtidas, comentários, aprovações. Dá-se a impressão de
uma maior preocupação em registrar um evento do que o curtir ele na vida real.
Seria uma inversão de valores, em que o virtual merece mais dedicação do que o
sentir no real?
Quando tive depressão, entrar em redes sociais me preenchia de uma
sensação de impotência. Ficava algum tempo vendo as outras pessoas, sempre
sorridentes, bem sucedidas, com seus projetos sempre dando certo. E eu ali, no
meu quarto, chorando, angustiado, melancólico, querendo me esconder do
mundo. Por que apenas eu sentia aquele vazio?
Na época, muitas vezes postei fotos em eventos que fui, forçando um sorriso,
mas por dentro estava em pedaços. Só eu sabia o peso do meu sorriso: era um
pedido de socorro, tentando me resgatar daquela sensação de vazio que me
consumia. As curtidas, os comentários, a movimentação virtual, embora me
desse a sensação de que as pessoas estavam ali observando meus passos – e
portanto, de alguma forma, se importando comigo – no final me deixavam pior:
de que adiantava ter curtidas se eu não estava bem comigo mesmo? De que
adiantava as curtidas se eu sabia que elas não passavam de algo virtual, ou
muitas eram clique repletos de vazios (curtiam por curtir)?
Tentei, então, me restringir ao uso das redes sociais. Entrava
esporadicamente, para visualizar algumas mensagens, mas não ficava preso ali.
Tentava evitar o máximo que podia: ela me fazia sentir diminuído, pequeno,
alguém que não tinha dado certo e se sentia um impostor de si mesmo. E o pior:
eu sabia que as coisas que as pessoas colocavam eram hipérboles. Amplificavam
o valor de suas postagens: a melhor foto de comida, a viagem mais divertida, os
encontros com os amigos mais legais. Era a criação de um mundo fantasioso.
Você não via o cotidiano, a rotina, a repetição de atividades entediantes. O que
aparecia era só o atraente, o fantástico, o fabuloso, como se a vida fosse o tempo
todo uma grande e eterna festa ou sucessão de viagens sem fim.
Quem já não se deparou numa roda de amigos em que todos ficam no celular
e nem se olham nos olhos? Aquela sensação de ter que falar com alguém, ao
lado, mostrando um meme porque não tem assunto? Uma das regras que me
coloquei na depressão: desligar a internet móvel quando saia. E aquilo foi a
melhor coisa que fiz. Desconectei-me do mundo virtual e viver o real. Tentar
ouvir o que o outro tinha a dizer e conversar. Isso me ajudou muito. Entender
que o virtual deve ter seus momentos restritos. E que nada vale fotografar um
evento se você realmente não senti-lo. A energia não está no registro, mas na
vivência.
É importante também realçar o lado bom da internet. Assim como um
remédio se diferencia de um veneno pela dose, o mesmo acontece com as redes
sociais que, inclusive, também têm seu lado positivo. Elas podem favorecer, por
exemplo, a conexão de pessoas, bem como a criação de grupos de apoio on-line.
Em rápidas pesquisas, é possível encontrar grupos de discussão e ajuda, com
foco, por exemplo, na depressão. Tudo depende da forma como utilizamos as
redes sociais.
Buscar apoio de outras pessoas que passam ou passaram pela depressão,
mesmo que seja uma troca virtual, é uma ferramenta interessante. Quando
conversamos a respeito do que sentimos e nos abrimos para ouvir a história de
vida do outro, temos a possibilidade de ajudar numa via de mão dupla:
enquanto somos ajudados, ajudamos. Pode ser uma troca virtual, mas é um
começo. E quando estamos com depressão, qualquer tentativa é válida para
lutar contra ela.
Inclusive, um estudo feito nos EUA com 200 perfis de estudantes48, sugere
que as pessoas que recebem um apoio on-line dos amigos, tem mais facilidade
em discutir seus sintomas depressivos na rede social. E isso pode colaborar a
combater o estigma da condição da saúde mental. Além disso, o estudo sugere
que as redes sociais podem ser uma ferramenta (para pais e amigos) para
identificar quem tem risco de depressão. Ao identificar isso, eles podem ajudar
e apoiar a pessoa.
Em grupos on-line de depressão é comum observar as pessoas partilhando
suas sensações. Uma das coisas que mais me chamou atenção é que, mesmo
distantes, outros tentam ajudar com palavras de conforto. Às vezes, só
precisamos ser ouvidos, mesmo que a outra pessoa esteja a quilômetros de nós.
Colocar para fora o que se sente é algo libertador: conversei com muitas
pessoas, virtualmente, sobre o que eu sentia. Muitas das quais, também tinham
problemas com depressão. Era confortador saber que alguém me ouvia e me
entendia. Não me acusavam de frescura, nem de fraqueza. Apenas
compreendiam que eu estava com depressão. Nada mais, nada menos. E a
internet pode favorecer essa conexão.

Depoimento
Eu nunca fui uma menina dentro do padrão, e, apesar de passar todas as fases
que as adolescentes que tinham a minha idade passavam, eu tinha algo que me
distanciava de todas: eu era gorda.
Fui magrinha na infância, mas a adolescência veio e, cruel como é, trouxe
junto alguns quilos que jamais consegui perder. Consegui seguir a vida
normalmente, sem nem me dar conta dessa diferença, até chegar no temido
Ensino Médio. Escola particular, nenhuma menina gorda além de mim, e muitas
piadinhas veladas sobre a forma do meu corpo.
Veladas por pouco tempo. Em um dia, sem que eu nada tivesse feito, comecei
a ser alvo de uma perseguição injusta, motivada pura e simplesmente por
preconceito: para eles, eu não era como as outras meninas, por isso, não
merecia o mesmo respeito, tão pouco empatia. Minha sentença? Um bullying
que durou terríveis três anos.
Era xingava, eu era exposta e virei alvo de chacota constante de um grupinho
fixo. Eu não podia andar, não podia levantar, não podia rir, não podia comer...
comer! Como o fato de ser gorda anulasse a fome que eu sentia, normal de todo
ser humano.
Fui entrando em um buraco cada vez mais fundo. Eu, antes extrovertida, virei
tímida, acanhada, quase que nula. Meu objetivo era não ser percebida nos
lugares. Desenvolvi uma depressão grave, bulimia nervosa e uma sensação de
perseguição que me assombra até hoje.
Durante esse período, encontrei refúgio em livros e na internet. Eu havia
acabado de ganhar um notebook com internet a cabo e passava horas e horas a
fio lendo, conhecendo e conversando com estranhos do outro lado do País. Eles
me distraiam, me escutavam e me davam forças para aguentar o calvário que eu
estava passando. Não tenho dúvidas de que foi a ajuda desses estranhos, ainda
hoje meus amigos, que me tirou do buraco do qual eu havia entrado.
A internet possibilita encontros jamais imaginados, e eu tive a sorte de
encontrar, durante essa minha caminhada virtual, inúmeras pessoas incríveis
que me ajudaram, e ainda ajudam, a vencer todos meus medos e obstáculos. São
pessoas que, assim como eu, conseguiram dar a volta por cima e tirar de cada
situação o melhor que a vida tem a oferecer.
Hoje, o meu papel é outro. Depois de conseguir entender, respirar e seguir em
frente, consigo ajudar outras pessoas com problemas de autoestima e
autoaceitação. Hoje eu aprendi, finalmente, a ser feliz.
Isabela de Oliveira, 26 anos. Americana-SP.

Para refletir
Com a internet, a oportunidade de expressar ideias e sentimentos, de
intensificar contatos com pessoas, de conexão e compartilhamento de
interesses similares despertam afinidades entre os indivíduos. No entanto,
também surgem novos paradigmas: a interatividade também distancia os
indivíduos. O acesso a um grande número de informação disponível pode
influenciar outras maneiras de pensar, como também fazer a pessoa querer ser
alguém que não é.
O que se observa, então, é o redesenho da sociedade. A sociedade passa, com
a internet, a ter um novo espaço, uma nova escala e uma nova dimensão de
tempo. Assim, ela amplia suas ações e molda novas atitudes, revelando novos
comportamentos, como por exemplo, a “militância narcisística do sujeito pós-
moderno”, ou seja, aquelas pessoas que têm paixão por si mesma.
Estar na rede significa estar vivo e presente na vida das pessoas. Facebook,
WhatsApp, YouTube, Instagram, e outras redes que surgem a cada dia exibem o
“cara de sucesso”, do sempre feliz, do muito viajado, de bem com a vida, do
corpo perfeito. Enfim, na internet, você existe e se deu bem.
Quanto mais curtidas e compartilhamentos, melhor. Entretanto, nem sempre
reflete, de fato, o indivíduo no espelho. Na realidade, o que existe é uma
fragilidade de ego, pois a pessoa faz de tudo para demonstrar o oposto: quer
parecer o que não é, pois com a aprovação do outro, esta pessoa ameniza sua
insegurança.
Os números demonstram que mais de cinquenta por cento dos usuários da
rede concordam que os comentários na rede são influenciáveis. Nem todos,
porém, se comportam de forma narcisística, mas o meio digital abre essa
possibilidade. É certo que as redes sociais fortalecem o individualismo em
detrimento do coletivo.
Assim, com o avanço tecnológico e a participação constante de usuários, as
redes sociais ganham força e amplificam os egos. Logo, a influência das redes
sociais entre os usuários é cada vez maior e evidente.
Adriana Pessatte Azzolino, socióloga e doutora em Comunicação.
Limeira-SP.



Manter a agenda
Uma das coisas mais difíceis da depressão é manter a vontade de fazer algo.
Ela nos derruba, tira-nos toda a força para seguirmos com atividades outrora
tão simples e, que ao serem pintadas com o tom da depressão, se tornam um
fardo. A mente parece embaralhada e não consegue focar em nada. Olhamos o
ponteiro do relógio e as horas parecem eternizadas. Sentimos,
involuntariamente, como se não pertencêssemos a nenhum lugar: apenas o
sono parece reconfortar tudo, pois buscamos fugir da realidade.
É uma sensação tão ruim, sentir-se inoperante, desconexo com a realidade,
como se estivéssemos numa estrada, envolta por uma neblina tão densa, que
nada parece ter forma diante de nossos olhos. Tudo é esfumaçado, indefinido. É
preciso chegar muito próximo para ver a realidade. A depressão faz isso: torna-
nos, sob certo aspecto, inoperantes. Faz-nos sentir sem vontade alguma de ter
responsabilidades, desde lavar um copo, a ter que correr atrás de algum
documento para renová-lo. Dói demais essa sensação. É como se todas nossas
energias e prazeres tivessem sido surrupiados de uma vez.
Vazios, partimos por nos preencher de pensamos ruins, que ficam ruminando
e ruminando. Focamos neles e nos esquecemos aos poucos de que, embora
estes pensamentos estejam ali para nos mostrar que devemos mudar algumas
coisas e aceitar outras, devemos buscar nos preencher. Preencher com boas
coisas. Preencher, inclusive, com pequenas responsabilidades ou, ao menos,
reassumir outras que deixamos passar pela depressão.
Foi com a depressão que aprendi, no meu caso, que era necessário criar uma
agenda para que eu me reestabelecesse. Sem trabalhar por conta dos estudos,
ficando o dia todo praticamente em casa, me sentindo cada vez mais suprimido
de mim mesmo, comecei a criar a minha agenda, de forma a ter sempre algo
para se fazer. Pesquisei algumas atividades e, entre elas, resolvi assumi-las ou
reassumi-las.
Em minha agenda, decretei: vou continuar fazendo academia. Mas só isso, é
muito pouco. Acrescentei ainda, num dia da semana, meditação. Após algum
tempo, busquei um horário para refletir sobre a vida e procurei um centro
espírita (no meu caso, me chamou atenção a doutrina baseada na ciência,
filosofia e religião). Também investi numa luta (muay thai), em curso de teatro
amador e, inclusive, surgiu um curso de italiano gratuito. Também precisava
focar em minha dissertação de mestrado, pois precisava me formar.
Coloquei, ainda, sob minha responsabilidade, pelo menos nos períodos mais
críticos, lavar as louças. Eu, às vezes, sentia alguma crise de ansiedade e, para
tentar liberar aquilo que me oprimia, lavava os pratos, talheres e panelas.
Focava minha atenção na limpeza e, pode parecer algo besta, me dava certo
alívio. Outra obrigação de minha agenda: cuidar da minha hortinha, eliminando
as ervas daninhas e os caramujos africanos que lá surgiam. Mesmo sem vontade
alguma de fazer as coisas, eu me decretei: “Vou fazer. Vou seguir minha agenda.
Vou chorando, querendo desistir, mas vou continuar firme”.
Essa agenda nada mais era do que uma obrigação comigo mesmo de não
desistir da vida. Enquanto eu me apegasse a estas atividades, eu me sentia
seguro por não pensar em fazer alguma besteira. As obrigações que eu me
colocava me faziam seguir em frente, cambaleando, trôpego, mas seguindo
adiante. Eu me obrigava a fazer tudo para me sentir, de alguma forma, vivo.
Mesmo não querendo, me colocava em contato com pessoas muito diferentes de
mim, tanto da forma de agir, quanto pensar. Isso também tinha seu lado bom:
eu passava a ver que eu não era o único a me sentir vazio e, também, que havia
muitas pessoas que haviam passado pela depressão e conseguiram sair dela.
Isso muito me estimulou a continuar firme com minha agenda. Era a agenda do
meu reestabelecimento.
Ao fazer e manter a agenda, sempre é bom levar em consideração a adoção de
metas muito claras: é interessante sermos realistas de nossas potencialidades
(antes da depressão) e, com base nelas, traçar nossas prioridades. Isso facilita
com que foquemos em atividades que podemos dar conta. Temos que manter
uma agenda, de forma que ela não nos sufoque também.
No meu caso, as atividades que adotei tinham dois objetivos: me ocupar para
que eu evitasse pensar em coisas ruins e fazer com que eu me sentisse
responsável por algo. Eu tinha tempo. Só não tinha vontade. Deveria então focar
na vontade (que era o mais difícil). Escolhi, portanto, atividades que sei que, de
alguma forma, também me despertariam de certo comodismo: tinha problemas
com minha flexibilidade e isso era algo que me atrapalhava um pouco na luta;
guardar textos na cabeça e interpretar, para o teatro, também era algo bem
complicado; meditar? Não conseguia ficar parado. Mas eram atividades que,
embora eu soubesse que me tiravam do meu comodismo, não deixavam de ser
alcançáveis. Eu não estava projetando expectativas gigantes: estava apenas
dando passos um pouco mais ousados e que me fariam ter a responsabilidade
de focar em algo.
Neste processo de criar a agenda, também é importante fazer tudo por partes.
Dividir as atividades de forma que elas também não virem uma imensa bola de
neve ou acabem por nos sufocar. Não é para abraçar o mundo. Jamais. São
apenas atividades que servem para que possamos nos reprojetar enquanto
seres humanos: se a depressão nos imobiliza, temos que voltar a nos mexer.
Conversar com amigos, ouvir seus conselhos, buscar manter o contato com
pessoas que confiamos também é essencial nesta retomada de nossa agenda. O
contato social, o diálogo, a amizade e, inclusive, o fazer novas amizades, são um
diferencial nesta caminhada. Fazer uma atividade em grupo, por exemplo, faz
com que involuntariamente conheçamos pessoas diferentes de nosso círculo
social. Isso nos torna mais perto de outras realidades e nos faz entender que,
muitas vezes, nosso problema não é tão grande assim.
E o mais importante: jamais se depreciar durante a retomada de uma rotina.
Nesta caminhada de reconstrução do eu, temos uma grande tendência a
enxergar muitos defeitos que apenas nós vemos. Amplificamos tudo o que não
nos agrada e acabamos por esquecer das nossas qualidades. A depressão faz
isso: torna-nos sabotadores de nós mesmos. Ficamos insatisfeitos e até mesmo
não valorizamos, por estarmos cegos pela depressão, o corpo, o que temos,
enfim, desvalorizamos tudo o que está a nossa disposição.
Esquecemos de usar, desta forma, um olhar construtivo do nosso eu. Vemos
de forma depreciativa, o que muitos veem como algo que desejam. A culpa disto
tudo é da depressão. Logo, ter uma agenda de certas atividades auxilia neste
processo de reconstrução do eu. Passamos, ao ter certas responsabilidades, a
nos analisar de uma forma diferente, pois retomamos aos poucos aquilo que
depressão nos faz perder: nossa confiança em nós mesmos.


Depoimento
Cai em depressão quando meu casamento de 12 anos terminou. Nesta época
eu estava desempregada, não trabalhava, não estudava, só ficava em casa
limpando e cozinhando. Estava obesa, sem brilho e só tinha roupas sem graça
no guarda-roupas. Não me sentia bonita.
Tentei salvar meu casamento, mas não deu certo. Por conta de problemas no
relacionamento, tentei me matar para ver se acabava de vez com meu
sofrimento. Então, certo dia, limpei tudo, separei a roupa que gostaria de ser
enterrada e tomei vários comprimidos.
Por pouco eu não fui a óbito, pois me encontraram antes que o pior
acontecesse. Por um período, eu não tinha como me manter financeiramente.
Eu só chorava, sem vontade de sair da cama, já não arrumava mais a casa, não
saía para nada, e nem mesmo banho eu tomava. A casa fedia, eu estava um
trapo, precisava pedir dinheiro para minha mãe, pois só com o dinheiro que
recebia de minha ex não dava para tudo.
Certo dia, estava inclusive sem dinheiro para o papel higiênico. Então, resolvi
dar um basta! Liguei para minha mãe, falei com minha filha, disse que não dava
mais para continuar nesta situação. Minha filha me emprestou a moto dela e no
dia seguinte eu já estava trabalhando de moto táxi. Comecei a pagar as minhas
contas, comprei roupas novas, comecei a fazer exercícios físicos, entrei de dieta.
Emagreci 12 quilos e voltei a fazer uma segunda faculdade.
Precisei, durante este processo, da ajuda de uma psicóloga. Eu também
troquei meu guarda-roupa, comecei a sair com os amigos e fui me reerguendo.
Hoje estou muito bem, consegui vencer a depressão e, inclusive, estou em um
novo relacionamento.
A vida nunca será perfeita, sem problemas, mas já não me deixo abater tanto.
Lido com eles, às vezes tico triste sim, acontecem coisas que me magoam, mas
isso faz parte da vida. Cabe a cada um de nós escolhermos como viver e,
inclusive, se algo estiver muito ruim, sugiro ajuda profissional.
Marjorie Simmelman, 38 anos, Motogirl. Limeira-SP.


Para refletir
A depressão é considerada uma das condições psiquiátricas mais prevalente
na população em geral e, atualmente, é vista como um problema de ordem
pública, tendo em vista que causa comprometimento das atividades laborativas.
Na presença dos sintomas depressivos, o diagnóstico deve ser feito de forma
precoce, com tratamento adequado. A cronificação da doença compromete a
qualidade de vida e tem chances de haver recidivas ao longo da vida.
O tratamento não medicamentoso é forte aliado do tratamento e pesquisas
científicas têm considerado a eficácia clínica. Em algumas universidades e
centros de pesquisa já existem ambulatórios voltados para práticas de
relaxamento, atividades físicas, meditação e ioga para complementar o
tratamento da depressão.
A prática da meditação, por exemplo, favorece mudanças sistêmicas no
âmbito do sistema nervoso central. Há melhora na atenção e concentração,
auxilia no sistema imunológico, auxilia na insônia e estresse, melhora o
funcionamento cardiovascular e reduz o cortisol, que é o hormônio do estresse.
Já a ioga, por sua vez, favorece melhora pelas técnicas respiratórias,
relaxamento muscular com mudanças no âmbito do sistema nervoso central e
liberação de endorfinas, que são substâncias que favorecem o bem-estar e
prazer.
Outro benefício na luta contra a depressão se dá pelas atividades físicas, que
promovem uma melhora no condicionamento físico, na autoestima,
autocontrole das emoções e sensação de competência social. As atividades
físicas promovem, ainda, mudanças a nível fisiológico, com a liberação de
endorfinas, que podem auxiliar na oxigenação sanguínea, relaxar a musculatura
e, em geral, promover sensação de bem-estar físico. Esta mudança está aliada à
mudança psíquica, pela qual mente e corpo estão envolvidos simultaneamente.
Vale lembrar que, nos casos depressivos mais leves, sugere-se que a pessoa
não se afaste das atividades laborativas, pois o trabalho auxilia na organização e
flexibilidade mental e preserva a sociabilidade. Exceto nos casos em que a perda
de ânimo comprometa as funções executivas, ou o uso de psicofármacos possa
interferir no raciocínio e atividade motora.
É importante que a família seja assistida pela equipe envolvida no tratamento,
no sentido de melhor compreensão sobre a doença. Desta forma, ela pode
ajudar a proporcionar à pessoa com depressão atividades que, antes da
instalação da doença, eram prazerosas. A família pode incentivar, assim, o
paciente em participar de tarefas simples no cotidiano, tais como deambular
pela área externa da moradia, auxiliar no preparo das refeições, manter contato
com pessoas prazerosas para o paciente.
Assim, as técnicas não medicamentosas e a inclusão da pessoa com depressão
em atividades que a façam sentir envolvidas são ferramentas para auxiliar no
tratamento da depressão.
Lia Mara Mendes Biason, psiquiatra da Infância e da Adolescência.
Americana-SP.



Ver a beleza nas pequenas coisas
Quando você está destituído de tudo, de seus sonhos, seus desejos, seus
prazeres, a única coisa que reside dentro de nós é o vazio. A sensação de
impotência, de pequenez ante tudo. A culpa a nos corroer a todo o momento:
pela sensação de não conseguir sair daquele estado de depressão ou pelos
problemas mais simples que nos circundam e não conseguimos resolver.
Passamos a ver o mundo com outro olhar, que vê tudo desfragmentado, sem
sentido, sem nenhum prazer.
Inclusive, há um estudo49 que mostra que as pessoas com depressão
realmente se tornam menos sensíveis aos contrastes de cor. Os testes foram
feitos com 40 pessoas depressivas e 40 pessoas sem depressão. Os resultados
apontaram que havia uma diferença significativa na forma das pessoas
depressivas enxergarem os contrastes de cor – o que leva a inferência que a
depressão realmente faz com que vejamos o mundo de uma forma diferente.
Lembro-me exatamente que quando fui acometido pelos momentos mais
obscuros desta doença de nossa essência, nada mais me chamava atenção. Tudo
parecia desconectado, sem vínculo, perdido. Era como se as coisas vagassem
num espaço-tempo e não tinham a menor importância para mim. Eu apenas
existia, como alguém morto em vida – uma exúvia, sendo apenas uma casca sem
preenchimento: minha essência havia se dissipado sem eu perceber. A única
coisa que vinha em minha cabeça: eu jamais conseguiria me preencher, o que
me amedrontava e me fazia chorar por ser uma sensação de desolação sem
igual.
Uma das coisas que me ajudou, no meu processo de retomada de minha
essência, foi tentar observar pequenos detalhes que me circundavam. Mesmo
sem vontade alguma, eu me forçava. Tentava observar, interpretar e sentir as
coisas ao meu redor, como se pudesse, por meio de uma osmose, ir me
preenchendo. Pegava meu celular e, ao caminhar, focava em detalhes que antes
eu passava despercebido: uma flor sozinha no meio de um caminho, um arco
íris que adornava a janela após uma chuva passageira, um campo repleto de
crotalárias em flor, enfim, pequenos detalhes que, usando meu celular, eu
registrava.
Comecei a entender que a essência de tudo está nos pequenos detalhes, nas
cenas diárias que passamos com pressa e não nos atemos para contemplar: uma
árvore com flores, um beija-flor a se alimentar, uma criança correndo feliz, o sol
se pondo e tingindo o céu de uma tonalidade dourada, a lua surgindo de
mansinho. Demorei certo tempo – talvez um ano inteiro após a crise mais forte
da depressão – a passar enxergar com outros olhos o mundo que se desdobrava
diante de mim.
Fiquei mais perceptivo, mais aberto a observar o mundo não buscando o que
não me agrada (para apontar o dedo e reclamar), mas aquilo que está escondido
e revela, quando observado com os olhos de quem se permite ver, a essência da
beleza. Não é necessária simetria, nem formas elaboradas para encontrarmos o
belo: basta apenas se permitir fluir, tentar captar pequenos detalhes com os
sentimentos e não com a frieza de um olhar racional.
Demorei muito tempo para entender e depois compreender que o mundo
adquire a cor que permitimos enxergá-lo. Se o observamos com olhos de quem
vê tudo pintado de cinza, sem cor, frio, apático, nós veremos tudo desta forma.
Mas se nos permitirmos a observá-lo como um mosaico de surpresas,
embevecermo-nos com a essência do que nos circunda e nos permitirmos
perceber que é nas pequenas revelações da vida que encontramos a beleza,
enxergamos o mundo de uma forma mais acolhedora.
No meu processo de reconstrução, parei de ler notícias de morte, violência, ou
assuntos que me faziam mal, por desacreditar na essência humana. Passei, nas
redes sociais, a parar de seguir quem só compartilhava vídeos ou fotos de
tragédias ou situações deprimentes. Eu não precisava (e nem preciso) me
alimentar de informações que me fazem mal do ponto de vista emocional. Não
que eu tenha me fechado ao mundo. Acompanho as notícias, sei o que acontece
na medida do possível. Mas quando o assunto envolve tragédias e desgraças, eu
não entro em detalhes.
A vida precisa ser colorida com boas referências e ter pensamentos positivos
incluem excluir aquilo que é tóxico, selecionando o que ingerimos com nossa
essência. Qual o motivo de ficamos lendo ou assistindo o tempo todo sobre
tragédias, deixando passar, às vezes do nosso lado, momentos repletos de
beleza?
É preciso beber na fonte de águas límpidas. O mundo, por conta de sua
conformação e sua injustiça, é demasiado pesado se o observarmos com um
olhar severo. Porém ele reserva belezas, basta apreciá-lo como uma criança o
observaria: certa ingenuidade, permitindo admirar a vida com olhos que não
estão adestrados para ver a maldade em tudo. É necessário incorporar, mesmo
que seja difícil, a forma de observar a vida com o olhar infantil, vendo a beleza
nos pequenos acontecimentos.
Portanto, o primeiro passo é se permitir. O segundo, é realmente o mais
difícil: tentar romper certos vícios na forma de se observar tudo ao redor.
Tentar enxergar o lado bom, mesmo ante as adversidades. Aos poucos, vamos
treinando nosso olhar para enxergar aquilo que nos traz boas sensações. É algo
que merecemos, pois somos únicos no mundo e, muitas vezes, a beleza está
escondida nos detalhes.

Para refletir

O melhor pra você

Há beleza até na simplicidade
e tem gente que não vê
temos de verdade
o que não dá pra perder
não se trata de ganhar
ou de crescer
e sim de ser
o melhor pra você

Começo com esses versos da canção de minha autoria pela maneira como
resume meus pensamentos sobre a simplicidade. Foram muitos os filósofos que
em um momento ou outro esbarraram no tema. Recordo com mais vivacidade
de um grego antigo que buscava modos de ser feliz em suas máximas.
Para Epicuro de Samos (341 a.C.-271 a.C.), os exageros cometidos em relação
à preocupação com a política, as posses, alimentos etc., poderiam atentar contra
o sujeito impedindo sua felicidade. Já a amizade e a posse apenas do necessário,
causariam mais prazer que dor, fazendo com que a vida fosse aproveitada da
melhor maneira possível.
Como a filosofia faz sentido quando reflete nas ações, o leitor pode entender
Epicuro de acordo com sua própria realidade e pensar antes de decidir: “essa
atitude causará (em mim e nos outros) mais prazer que dor?”; “ela não pode
gerar uma dor futura maior que o prazer momentâneo?” Se as respostas forem
sim, chegará a um caminho simples para uma vida mais gostosa. Ser tão simples
não é fácil, mas é prazeroso. Boa sorte nessa jornada.
Felipe Gabriel Piscioneri, filósofo e artista. Americana-SP.

Agradecer aos problemas
Certos encontros que marcam nossa vida surgem quando menos esperamos.
Às vezes, uma frase que ouvimos, perdida num lugar, faz com que passemos a
pensar de uma forma diferente. A conexão com as outras pessoas, cada uma
com sua história de vida, é uma grande partilha de conhecimentos: cada um, a
sua maneira, é único. Portanto, traz dentro de si algo especial.
Nestes encontros e desencontros que é a vida, lembro-me que, no desfile de
sete de setembro de 2016, eu estava com meu pai, junto da multidão que se
aglomerava na Avenida Brasil, em Americana, para acompanhar quem desfilava
pela rua. Eu estava ao lado de uma árvore, se não me engano, uma sibipiruna.
Meu pai, como sempre falante, encontrou um conhecido. Era um senhor de
cabelos alvos, com fala pausada, sereno. Ele começou a conversar e, certo
momento da conversa, ele me perguntou: “Você sabe o sentido da vida?”.
Fiquei ali por algum tempo tentando pensar em alguma resposta lógica –
estamos sendo querendo ser racionais. Ele então, com um sorriso, completou:
“Uma vez me disseram que o sentido da vida era ter problemas”. Eu olhei com
descrédito, então o senhor completou: “Enquanto estamos resolvendo
problemas, mesmo que pequenos, estamos vivos”.
Aquilo ali, naquele momento, me fez ficar pensativo durante toda a semana. Já
tinha ouvido diversas pessoas falando isso, lido textos, enfim, aquela ideia já
havia cruzado em algum momento minha vida. Mas nunca parei para pensar a
respeito dela: que os problemas nos davam um sentido, o sentido de resolvê-
los. A vida é uma eterna resolução de pequenos “problemas”: a frente fria que
chega inesperadamente e estamos sem nenhuma blusa, a resistência do
chuveiro que queima, o gás que acaba, o fermento que acaba justamente quando
você mais precisa, enfim, pequenas coisas que temos como irritantes.
A questão é passar a encarar estes “problemas” de uma forma diferente. E a
frase daquele senhor, dizendo que os problemas eram o sentido da vida, me
fizeram tentar colocar em prática algo que me fez sentir melhor comigo mesmo:
agradecer tudo o que surge inesperadamente. Lógico, no momento em que algo
que me atrapalha, eu confesso que brado e falo alguns palavrões. Por que ainda,
no momento que escrevo este texto (22/06/2017) ainda estou aprendendo
lidar com muitos aspectos, incluindo não ser tão enérgico demais. Porém,
passado o fervor inicial, e principalmente quando vou dormir, momentos antes
de apagar no sono, eu repenso tudo o que me aconteceu.
Faço um levantamento rápido dos meus “problemas” diários e agradeço a
todos eles. Cada um, a sua maneira, me colocou em movimento para resolvê-lo.
São eles que me fazem sentir a necessidade de agir, ao invés de ficar estático.
Somos seres que devemos estar em constante movimento – não digo físico
apenas, mas de essência. Acredito que está em nosso cerne essa necessidade de
estarmos sempre nos conectando com outras possibilidades, desde que nos
permitamos assim. São os problemas, muitas vezes, que nos mostram que
temos a capacidade de resolvê-los. Eles surgem para nos testar e mostrar que,
diante da adversidade, temos que agir para resolvê-los.
Também não posso esquecer de mencionar que, muitas vezes, temos a
tendência de acreditar que nosso problema é o maior do universo. Lógico, cada
um sabe a dor que sente e não devemos e nem temos direito de julgar como
cada um sente um problema: é algo da essência da pessoa. A questão é que,
muitas vezes, somos privilegiados e não nos damos conta disso: reclamamos de
tudo, tendo tudo, ao invés de agradecer.
Reclamamos do preço da gasolina, que aumentou. Mas sob certo ponto de
vista, só reclamamos disso, pois temos um carro – e talvez outra pessoa não
tenha sequer uma bicicleta para se locomover. Reclamamos de comer todo dia o
arroz e feijão – e muitos sequer têm um pedaço de pão. Vemos nossos
problemas de uma forma egóica, como se eles fossem o maior do universo.
A depressão me ajudou neste ponto: ela me tornou mais empático. Passei a
me colocar no lugar do outro, por meio de conversas com pessoas que nem
sequer eu sabia o nome. Acredito que me permitir ter contato a história de vida
alheia me ensinou a encarar meus problemas sobre outra visão. Muitas vezes,
minhas lamúrias, eram tão insignificantes perto dos problemas dos outros. Isso
fez com que eu mudasse minha forma de encarar os fatos que se sucediam: ao
invés de reclamar, passei a mudar minha vibração (deixar de ver o negativo e
focar no positivo). Eu passei a agradecer as coisas que aconteciam, pois algo de
bom podia porvir dela, mesmo que fosse um ensinamento.
Foi igual ao que me aconteceu no dia 14 de março 2017. Eu voltava, com
minha mãe, de Araras-SP, pois tinha tido uma reunião com minha orientadora
do mestrado. Já na cidade de Limeira-SP, logo após ter passado no shopping
para comprar algo para comer, estava uma chuva muito forte, mas decidimos
continuar. Continuei dirigindo e, de repente, o caminhão da frente parou. Parei
longe dele, a uma boa distância, mas meu carro então começou a "andar
sozinho".
Olhei para o retrovisor e vi um caminhão branco empurrando a gente. E só
ouvia minha mãe falar: "Juliano, para o carro". Eu calmamente só falei: "Mãe,
não sou eu. Tem um caminhão empurrando a gente". Como que por câmera
lenta, nosso carro começou a ser prensado. Até falei para ela, de forma serena:
“Mãe, vamos morrer”. E ela repetia: “levanta a perna, levanta aperna senão vai
amassar junto”. Eu nada fiz. Continuei sereno.
Felizmente, o carro parou de ser prensado. A primeira coisa que ela fez ao sair
foi salvar o celular dela. Eu, por outro lado, só pensava em uma única coisa
naquele momento: no lanche que estava parte de trás do veículo, pois estava
com muita fome (talvez pelo nervoso). Moral da história: o carro deu perda
total. Mas o bem valioso, que é nossa vida, foi protegido.
E lógico: eu comemorei no mesmo instante, comendo o lanche (que
felizmente estava intacto). Também agradeci, interiormente, por estar vivo e
podendo resolver aquele problema. Se fosse em outro momento, com certeza,
eu estaria esbravejando, culpando as pessoas pelo acidente. Mas por estar
tentando ver o lado bom de tudo que acontecia, vi ali a oportunidade de me
sentir vivo novamente, quando para todas as expectativas – ser prensado entre
dois caminhões, um com material corrosivo e outro com 40 mil litros de
combustível – era para termos morrido.
Enxergar os problemas com outro olhar me permitiu entender que, talvez, a
vida não teria nenhuma história caso não tivéssemos esses “desarranjos da
normalidade cotidiana”. Os problemas, por mais duros que sejam, surgem para
nos manter em movimento, impulsionarmo-nos. Quando são demasiadamente
pesados, não devemos ter vergonha de recorrer a alguém para nos ajudar.
A vida é uma grande conexão e pedir por auxílio é muito importante,
principalmente quando estamos fragilizados. Não devemos jamais nos sentir
culpados quando não conseguimos carregar um fardo que surge: haverá um
momento em que ele estará mais leve. Depois desse momento, este fardo
poderá ser visto como um presente.
A vida nos dá diversos “presentes”, e nós podemos pegar eles ou, muitas
vezes, somos forçados a pegá-los. A questão é encarar cada “presente” como um
aprendizado. Assim a caminhada ficará muito mais leve, além do que permitirá,
depois de resolvermos certas questões, contarmos as histórias pelas quais
pensávamos jamais conseguir superar. Por isso, sempre é bom agradecer aos
problemas, pois eles nos fazem seguir em frente.

Depoimento
Após certo tempo com sintomas como tristeza profunda, pensamentos
suicidas e angústia fui a um médico que me diagnosticou depressão. Iniciei o
tratamento em 2002. Neste período estava com problema financeiros e com
uma empresa. Muitos me diziam que eu não sabia me submeter à autoridade.
Seguiu-se o tratamento com medicação e terapias, mas era insuportável
levantar da cama para ouvir as mesmas coisas.
Então busquei ajuda em vários lugares, inclusive na igreja. Eu vivia numa
montanha russa de sentimentos. Inclusive, o tratamento hora ia e voltava. Foi
então que fui demitida e minha filha saiu de casa, me levando a dar a guarda
para a avó. Eu tinha um filho pequeno e meu marido trabalhava fora. Eu o via a
cada 15 dias e não aguentei.
Procurei outras formas de me livrar dessa tristeza. Comecei a estudar sobre
tudo, pois queria ouvir outra coisa além da minha própria vida. Como não
queria ter contato com ninguém, estudava pela internet. Das várias experiências
sobre empreendedorismo, alguns textos pareciam me dizer algo como uma luz
no fim do túnel.
Na igreja encontrei apoio para me tratar com um psicanalista. No começo
achei estranho, pois não me sentia confortável e ficava ansiosa por me expor. Ao
longo das conversas, percebi que muitas de minhas questões estavam na forma
como eu via as coisas. Passei então a fazer um exercício mental: o pensamento
positivo. Passei a pensar positivamente sobre as situações e refletia mais sobre
tudo.
Voltei a fazer cursos por hobby. Depois de um tempo, comecei a trabalhar e
meus amigos me incentivaram a entrar na faculdade. Até este ponto estava tudo
aparentemente controlado. Porém, com a pressão acadêmica, além da perda de
pessoas próximas e de minha mãe, senti que ia surtar.
Voltei para terapia, porém sem medicação. O que me ajudou foi o contato com
as ideias de grandes pensadores, com professores, amigos, além da oração,
família, o trabalho terapêutico e a leitura sobre o assunto. Isso fez com que eu
visse as situações de forma mais claras. Não foi assim tão simples. Foram dias e
momentos difíceis.
Inclusive, tive que pedir a conta de um estágio maravilhoso. Mas o caminho
tinha que ser percorrido. Eu queria honrar a memória da minha mãe e eu passei
a depender das sessões. Então minha terapeuta me avaliou e disse que eu havia
conquistado uma maturidade para lidar com a dor e que ela estaria lá caso eu
precisasse.
Em 2015 tive alta. Desde então, não vivo sem problemas e sem momentos de
tristeza. A questão é que busco, como uma lagarta, superar os obstáculos e faço
os preparativos para entrar no casulo e vir a ser borboleta. Se hoje vejo alguém
que está na mesma situação, me esforço para lhe indicar dentro de sua
realidade um porto seguro. Resumindo: eu creio que a resposta está dentro de
nós, no quanto queremos erguer a cabeça para ver o que está à frente, mesmo
em meio à tempestade. Hoje, graças aos gatilhos mentais e as sinapses
trabalhadas, vejo os “problemas” de forma diferente. Aprendi a elaborar as
ideias, trazendo insights.
Waldinéia Baseio, 40 anos, professora. Santa Bárbara d’Oeste-SP.


Para refletir
Diante do enfrentamento da pergunta sobre qual é o sentido da existência
nos deparamos com a condição própria do existir. Essa condição nos oferece
como, por ironia, a angústia da incerteza constante de um sentido verdadeiro.
Este movimento ocorre simultaneamente a tudo aquilo que pensamos, vivemos
e sentimos. Enquanto estou planejando minha vida, ela está acontecendo. Como
encontrar a resposta a tempo? Como saber ao certo qual o próximo passo?
Como saber lidar com o próximo acontecimento? Ou seja, como viver a vida?
A idade moderna trouxe consigo uma confiança quase absoluta na razão, as
luzes haveriam de clarear toda e qualquer dúvida, e assim passamos pela idade
da ciência moderna com essa certeza, e todas as áreas de conhecimento
queriam ser reconhecidas como tal. Ledo engano. Criamos uma sociedade que
concentrou seus esforços em amenizar todo e qualquer sofrimento, e assim
sofremos, pois nos foi oferecida a ilusão da possibilidade do não sofrer.
O olhar pessimista diante do sofrer apenas nos tornou mais frágeis e a crença
de uma cura artificial para o existir nos fez supor que o sofrimento era algo
indesejável e evitável. Que possamos entender que o sofrimento é inerente a
existência e que é ele justamente, que nos oferece a melhor oportunidade de
crescimento.
A arte de viver consiste na compreensão do sofrer como algo positivo, e mais
que isso, necessário para nos tornarmos completamente humanos. Agradecer
ao sofrimento é agradecer a própria existência, afinal como diria Nietzsche
aquilo que não me mata só me fortalece.
Álvaro H. Ribeiro, filósofo e mestre em Filosofia da Educação. Santa
Bárbara d’Oeste-SP.


A importância dos pensamentos positivos
Nossas palavras têm poder. Demorei para entender isso e hoje tento sempre
olhar o lado bom da vida. É um processo diário de autocontrole, ainda mais
quando estamos habituados a reclamar de tudo: da comida, da chuva, do sol, do
canto dos passarinhos, enfim, de qualquer coisa que, por algum motivo,
olhamos de forma negativa.
Podemos fazer um simples experimento, em que é preciso, por um minuto,
apenas mentalizar um limão. Imagine um limão, com sua casca brilhando e com
o aroma cítrico se desprendendo pelo ar. Você pega este limão, coloca numa
mesa e, com uma faca, corta-o ao meio. Então você pega esta metade do limão,
leva-o a sua boca. De uma forma generosa, morde o limão. Sente o sumo azedo
correr sua língua. Mentalize e crie esta cena em sua cabeça: cortando o limão,
mordendo-o, e sentindo o sabor azedo. Caso tenha imaginado, sem que perceba,
poderá notar que sua boca salivou. E qual o motivo disto?
Você utilizou o pensamento para criar uma imagem mental e, com isso,
estimulou seu cérebro a acreditar que o limão era real. Desta forma, ele acionou
as glândulas salivares, que acabaram por produzir saliva. É algo bobo. Mas
imagine quando começamos a usar essas projeções mentais para nos vermos de
forma distorcida?
Quando tive depressão, basicamente eu ficava com pensamentos ruminantes:
“eu não mereço viver”, “nunca serei feliz”, “nunca sairei da depressão, existem
pessoas que conseguem, menos eu”... Eu ficava involuntariamente repetindo
essas frases, me observando o tempo todo de forma diminuída.
Por mais que as pessoas me dissessem que eu era um jovem, bonito,
inteligente, capaz de realizar proezas, querido por todos, enfim, com uma série
de pontos positivos, eu não conseguia reconhecer nenhum. Estava tão
fragmentado, que a única coisa que fazia sentido eram os pensamentos de que
eu não era nada, não merecia ser feliz e que meu sofrimento só teria fim quando
eu não mais existisse. Eram projeções negativas da minha pessoa. Eram
projeções irreais, que se repetiam a todo o momento e me davam a sensação de
serem reais. Não eram. Nunca foram. Mas a forma negativa me fez pensar que
eram.
Os pensamentos negativos são sabotadores: ficam esperando o momento
certo para surgirem e nos desestabilizarem. É um processo que leva tempo
mudar a forma como lidar com eles. Certa vez derrubei um pouco de leite e a
primeira coisa que falei, com lágrimas já brotando nos olhos: “Vida desgraçada!
Eu mereço morrer!”. Morrer por que derrubei um copo de leite? Não! Jamais!
Hoje eu percebo realmente que não vale a pena chorar por leite derramado.
Literalmente.
Pensamentos positivos podem começar de forma simples, desde que
estejamos nos patrulhando e nos habituando aos poucos. Antes de ter uma crise
depressiva, eu vivia melancólico e sempre reclamava de tudo. Nada estava
realmente bom. Um amigo comentou comigo, certa vez, sobre a uma técnica de
ficar 21 dias sem reclamar, pois caso conseguisse ficar este período sem
reclamar de nada, eu mudaria este hábito. Foi então que tive a ideia de grudar,
em minha mesa de serviço um papel escrito: “Estou há ____ dias sem reclamar”.
Caso reclamasse, teria que recomeçar. Fiquei no máximo cinco dias. Desisti.
Aquele papel vivia escrito: “Estou há 0 dias sem reclamar”. Acho que o
verdadeiro problema que eu não havia entendido era: não adiantava não
verbalizar a reclamação, eu devia pensar coisas positivas. De nada adiantava
não reclamar, era preciso mudar meus pensamentos.
Após a crise de depressão, quando decidi que ia fazer o que tinha que fazer
para melhorar, comecei, logo pela manhã, a agradecer por ter acordado e dizia
para mim mesmo: “Eu sou único no mundo e mereço ser feliz. E hoje vou fazer o
meu melhor”. No decorrer do dia, quando algo “ruim” acontecesse, eu tentava
me policiar. Ao invés de bravejar, ou me lamuriar, eu falava: “calma, darei um
jeito na melhor hora possível”. Aos poucos, e foi bem devagar, não de um dia
para o outro, fui mudando minha forma de ver a vida. Os problemas deixaram
de ser problemas e se tornaram apenas um estímulo para eu seguir em frente.
Caso eu percebesse que deles não sairia nada, eu agradecia: tentava aceitar o
que não podia mudar e trabalhava para mudar aquilo que podia.
Tanto é que, em março de 2017, quando voltava da faculdade, meu veículo
(praticamente zero quilômetro) foi prensado entre dois caminhões. Deu perda
total. Eu poderia simplesmente chorar, esbravejar, gritar, sentir ódio, raiva,
enfim, ter qualquer sentimento que me perturbasse. Eu apenas agradeci ao
universo por estar vivo. E pensei: que bom que estou vivo. Agora vou fazer as
coisas para resolver os problemas.
Talvez observar os problemas sobre outro ângulo – aquele positivo – seja o
diferencial de estarmos bem ou não. Sobre certa forma, enquanto estamos
resolvendo os problemas, mesmo que pequenos, estamos vivos, pois são os
problemas que fazem a gente sempre estar em movimento. São eles que fazem
com que nos sintamos incomodados e, por isso, buscamos mudanças. E tentar
encarar eles de maneira positiva, vendo o lado bom, possa fazer a grande
diferença.
Sei que na época em que estava afundado na depressão eu tive muita
dificuldade de ver algo bom, pois não sentia mais prazer em nada. O jeito foi me
forçar a fazer coisas que sabia que antes eu gostava, mais havia perdido o
interesse. Precisava reaprender a me encantar com coisas que antigamente me
encantavam. E lógico: focar no positivo.
Algumas pesquisas têm apontado que o pensamento positivo pode fazer
mudanças. Num estudo50 foi verificado como os pensamentos positivos
poderiam modificar a formação de cristais de gelo. Pesquisadores pegaram
garrafas de água e as separaram em dois grupos: um grupo receberia orações e
o outro não. Essas garrafas foram colocadas dentro de câmaras blindadas
eletromagneticamente, que estavam nos Estados Unidos. Os pesquisadores
fizeram fotos e, nas garrafas que receberiam oração, foram afixadas palavras
indicando que elas deveriam receber bons pensamentos.
Então, essas fotos foram enviadas ao Japão. Cerca de 2 mil pessoas foram
convidadas, por cinco minutos, a direcionar uma oração de gratidão à água que
estava no laboratório em Los Angeles, EUA, ou seja, praticamente do outro lado
do mundo.
Cristais de gelo formados a partir de ambas amostras de água foram
fotografados e as imagens foram avaliados esteticamente por 100 voluntários
recrutados pela internet. E o que os resultados trouxeram? Os cristais da água
que receberam orações tiveram pontuações maiores, por terem sido
consideradores mais bonitos. Detalhe: os voluntários que avaliaram as fotos dos
cristais não sabiam quais deles haviam recebido oração ou não. Ou seja: o
pensamento positivo, segundo os pesquisadores, modificou a formação dos
cristais, deixando-os mais esteticamente atraentes.
Embora haja controvérsias em pesquisas como estas, prefiro seguir com a
seguinte filosofia: vamos aproveitar o que o universo nos oferece de bom. Nem
tudo o que é bom é necessariamente bom em tudo. Assim como nem tudo que é
ruim, é ruim em tudo. Existe um equilíbrio, o qual devemos buscar.
É o princípio da filosofia chinesa Yin e Yang, na qual Yin significa escuridão,
representada pela cor preta e Yang é a claridade, pela cor branca. E ambas
carregam um ponto: cada força (Yin e Yang) tem uma esfera na cor contrária,
que significa que, toda vez que uma das forças chega ao seu ápice, surge dentro
de si um sentimento oposto. Por isso, nem tudo o que é ruim, é totalmente ruim.
Sempre há algo de bom para extrair. E esse pensamento é fruto do treino diário:
é preciso se deixar seduzir por esta ideia e tentar observar o lado bom da vida.
E qual a melhor forma de começar a cultivar pensamentos positivos? Cada um
tem o seu caminho, mas há coisas que se pode fazer, como assumir a
responsabilidade por nossas próprias atividades, ou seja, nós somos os
responsáveis pelos nossos próprios pensamentos. Somos nós mesmos que nos
alteramos quando alguém fala algo que não gostamos. Podemos simplesmente
ignorar e seguir em frente, ou podemos criar uma briga, que só gera desgastes e
gasta energia.
Outra proposta é tentar se cercar de pessoas que pensam de forma positiva,
pois acabamos por nos deixar se influenciar pelas pessoas ao nosso lado. Os
pensamentos delas, da forma de encarar a vida, podem nos ajudar. Geralmente,
em consultórios médicos, as pessoas ficam só centradas em doenças e, ao sair,
sentimo-nos carregados. Num parque de diversão, dificilmente saímos tristes,
pois o foco de nossa atenção é em coisas positivas. O meio externo pode,
portanto, influenciar em nossos pensamentos.
Há momentos que não conseguimos fugir de pessoas negativas. Inclusive isso
acontece muito em ambientes de trabalho, ou mesmo em nossa família. Se nos
deixarmos envolver pelos pensamentos negativos, mergulhamos nessa
sensação de que tudo, exatamente tudo, é ruim. Não é assim. Pessoas com
atitudes tóxicas, que vivem reclamando de tudo, falando mal de todos, dizendo
coisas negativas, estão mal consigo próprias e não percebem que as palavras
ecoam pelo universo e fazem com que foquemos em coisas ruins.
Quando eu tive depressão só via o lado ruim de tudo. Era algo normal, para
mim. Faltava eu entender que eu precisava mergulhar de corpo e alma na
tentativa de mudar esses pensamentos e bloquear os pensamentos externos: há
muita gente ao nosso redor que acaba influenciando pensamentos pessimistas.
Ao invés de nos dizer: “nossa, como você está bem”, olham para nós e falam
“nossa! Você parece acabado”. E isso nos contamina, involuntariamente.
Comecei então, aos tropeços, a tentar ver o lado bom de tudo.
E eu também passei a agradecer as coisas que aconteciam do jeito não
programado: “que ótimo que não deu certo, pois vou tentar de outra forma”.
Cada dia é um recomeço e que ótimo que é assim. Como disse o senhor, no
desfile de sete de setembro: “os problemas dão o sentido da vida”. E que bom
que as coisas acontecem para podermos resolvê-las, pois nos colocamos em
movimento.
É importante ter em mente também que ser positivo em tudo pode não ser
algo benéfico. É preciso ter pés no chão. Uma vez me contaram a história dos
irmãos Pedrinho e do Joãozinho. Pedrinho era uma criança sempre pessimista,
com a cara amarrada, com jeito de ter chupado um limão azedo. Joãozinho, por
sua vez, era otimista a ponto de parecer viver em fantasias. Certa vez, Pedrinho
ganhou uma bicicleta. Ele não perdeu tempo e começou: “Eu não sei andar de
bicicleta. Nunca vou aprender. Vou me machucar. É perigoso”. Joãozinho, por
sua vez, ganhou uma sacola repleta de bosta de cavalo. E, com um sorriso de
orelha a orelha, começou a berrar: “Eu sempre quis ter um cavalo! Obrigado!
Onde ele está? Quero ver meu cavalo!”.
Esta historinha é fictícia, mas revela dois extremos: há aqueles muito
pessimistas, que só pensam o pior. E aqueles otimistas ao extremo, que não tem
pés no chão. É preciso ter parcimônia, ou seja, saber se equilibrar. Não se pode
pensar em extremos: é preciso analisar as situações e, no contexto geral, ver o
lado bom das coisas e também o que não é tão bom. O equilíbrio permite que
sejamos sensatos em nossas atitudes e, desta forma, salva-nos de excessos. É
um trabalho diário, em que devemos nos policiar e entender que a vida reserva
várias surpresas pelo caminho, porém é preciso olhar essas surpresas como
aprendizados.


Depoimento
A depressão me acometeu há 20 anos. Nunca se passou pela minha cabeça
que teria ou passaria por uma situação como aquela. O alicerce da minha vida
sempre foi minha mãe, uma mulher guerreira que criou seis filhos sozinha e, até
em virtude disso, sempre fui uma pessoa otimista com relação a tudo. Portanto,
sempre acreditei ser uma pessoa forte o suficiente para que uma
depressãozinha interrompesse completamente minha vida.
Estava tudo perfeito. Eu acabara de casar com a mulher da minha vida e a
mãe do meu filho, Pedro, na época com 3 anos. Trabalhava em uma grande
empresa com bom salário e na minha área de formação. Foi exatamente neste
momento maravilhoso que tudo começou: de uma hora para outra parecia que
tudo estava desmoronando a minha volta.
Primeiros foram os sintomas. Doenças, muitas doenças. Eu sentia tudo, mas
os médicos diziam que não era nada. Fui a cardiologista, neurologista,
angiologia, urologista e, depois de tantos especialistas e muitos remédios, nada
foi diagnosticado, pois tudo era coisa da minha cabeça.
Fui afastado do trabalho e fui me afastando da minha família, mãe e irmãos.
Eu não os encontrava mais. Não os via mais e, mesmo com meu filho e esposa
morando na mesma casa, não tínhamos quase contato nenhum, pois eu vivia no
quarto e no escuro, não me alimentava direito, não sentia vontade de comer.
Perdi mais de dez quilos em poucas semanas.
Só pensava em ficar sozinho, pois nada na minha vida tinha sentido. Até que
parti em mais uma aposta para mais um diagnóstico. Neste percurso, me
apareceu um anjo: Dr. Milton Santiago, que é clínico geral. Pela primeira vez, o
médico me disse que eu não tinha absolutamente nada. Como as palavras tem o
poder da cura, elas tiveram o poder de mostrar como entender seus problemas.
Neste processo, o remédio também me ajudou. Assim, após seis meses
sofrendo, encontrei a pessoa certa que me auxiliou neste processo de
recuperação. As conversas com o Dr. Milton Santiago, clínico geral, se estendiam
por horas e, com certeza, as palavras de fé, força e otimismo faziam toda
diferença. Precisei de apenas 3 meses para me sentir bem novamente e, hoje,
após esses 20 anos, me sinto a melhor pessoa do mundo. Para mim, depressão
nunca mais.
Ivan Ferreira, 51 anos, professor, mineiro. Americana-SP.

Para refletir
Ao falar sobre Depressão, é comum entender que representa para o ser
humano algo como incapacitante e penoso. Complexa doença, que pode atingir
diversas esferas de um indivíduo, sendo estes mais diversos, como estudar,
trabalhar, se relacionar no âmbito familiar e ou amorosa. É preocupante
também, devido ao alto risco de suicídio que pode estar diretamente
relacionada a este tipo de patologia, atingindo entre 10% a 15% da população.
Por isso, é de extrema importância que se identifique os sintomas
depressivos, por meio do tratamento e, também, das devidas observações
quanto a resposta do mesmo, como também nas decisões tomadas ao longo do
tempo. Ao relacionarmos a PNL (Programação Neurolinguística), com a função
cerebral, tudo é aprendido, e o estado depressivo assim como os tais
pensamentos suicidas também são.
Estratégias que geralmente são perigosas, pois é particular de cada indivíduo.
Existem formas de dar um novo sentido, ressignificar, criar uma motivação para
estas pessoas enfrentando o passado, onde geralmente estão arraigadas com
mágoas e traumas. Mesmo esses problema não existindo mais, costuma-se
continuar dando vida a eles, trazendo para o presente e sofrendo com tais
problemas novamente.
A depressão é criada pela pessoa, e dá trabalho mantê-la. Pois gasta muita
energia para tais pensamentos negativos. É importante compreender que, ao
tomar controle da mente, é possível alterar de maneira gradativa tais
pensamentos, os tornando positivos. Por isso o tratamento é inevitável, e
quanto mais rápido identificar os sintomas, mais rápido será a melhora de tais
pensamentos.
Geralmente a pessoa depressiva elimina os momentos de alegria e apenas
foca nas próprias tristezas, com pensamentos que reforçam unicamente os
momentos ruins da vida. Logo, é importante questionar as idealizações: “Será
que sempre tudo é tão ruim? Será que não existe nada de bom?”. Tais
questionamentos ajudam a pessoa a ampliar suas ideias, compreendendo que a
vida não é apenas ruim, mas é construída por momentos, fases que não devem
durar por muito tempo, mas que acontecem para a própria construção
individual do ser humano.
É importante entender que não se vive em realidade idealizada, onde tudo na
vida é bom, alegre e perfeito. A vida precisa ser vivida de maneira consciente,
entendendo que há situações difíceis e frustrantes. Porém quando a tristeza
chegar, não é necessário temer, mas acolher, de forma natural e aprender com
ela, para que, quando a alegria chegar, sentir o prazer de viver, de ser uma
pessoa mais forte e corajosa para enfrentar os próximos desafios.
Rafael A. Monteiro, psicólogo com especialização em Hipnose Clínica e
professor. Americana-SP



Enfrentar os medos
De repente, quando você menos espera, é como se um nó sufocasse a
garganta. As forças para agir, desaparecem. O corpo fica paralisado: não há
escapatórias, não há o que se fazer a não ser se entregar e desistir de tomar uma
atitude, de enfrentar o que se anuncia e que pouco temos certeza do que
realmente é. O medo é isso: uma construção imaginária que, embora seja feita
de pensamentos, paralisa-nos de tal forma que perdemos nossas forças e não
sabemos como agir.
Na depressão, o medo pode ser uma das grandes barreiras para assumirmos
mudanças que são necessárias. Construímos mil possibilidades de algo dar
errado, enquanto que a esperança de que dê certo se restringe a uma ansiedade
sufocante. Então o medo cresce, de pequena semente sombria, vai se
desenvolvendo a ponto de se tornar uma planta cheia de espinhos e gavinhas,
que nos enroscam cada vez mais. Impedem nossos movimentos, fixam nossos
pés num ambiente inseguro e, por fim, reduzem-nos a meros fantoches que
estão impossibilitados de tomar atitudes necessárias.
Os pensamentos conseguem nos transformar em gigantes ou nos reduzir a
poeira. Basta pequenas variações na forma de pensar que conseguimos,
inclusive, entrar em pânico, mesmo sem menor sinal de perigo. Uma simples
nuvem no céu, com um leve tom acinzentado, já é pretexto para uma
tempestade devastadora. Um simples caminhar na rua é motivo de ser
assaltado. O medo amplifica tudo: é uma caixa de ressonância, que colore tudo
em tons de alerta.
Não que o medo seja totalmente mal: ele é fruto da evolução e protege-nos de
vários acontecimentos. Ele é essencial, sob certo aspecto, para a sobrevivência.
Assim, do ponto de vista biológico, ele tem sua razão de existir. Um estudo51
apontou, inclusive, que primatas, ao serem expostos a imagens, tiveram
respostas mais rápidas e fortes a imagens de cobras, quando comparadas a
reações relacionadas a formas geométricas ou rostos e mãos de macacos.
Outro estudo52 feito com 74 crianças, de 3 a 4 anos, contou com a exposição
destas crianças a imagens em branco e preto de flores, misturadas com imagens
de cobras. Nas fotos das cobras, havia aquelas que estavam em posição de
descanso e, também, imagens de cobra em posição de ataque. As crianças
reconheceram mais rapidamente as cobras que estavam em posição de ataque.
Estes estudos, quando analisados, podem sugerir que o medo é, por conta da
pressão evolutiva, fruto do instinto de sobrevivência. Tanto é que, assim como
todas as reações instintivas, não conseguimos impedir que o medo apareça.
Porém, ao contrário dos outros animais, temos a capacidade de raciocínio e,
portanto, podemos aprender a regulá-lo., buscando um tratamento. Sob esta
ótica, podemos dizer que o medo é essencial para nossa sobrevivência, porém,
para a nossa qualidade de vida, é preciso aprender a modulá-lo, de forma a não
ser um entrave para nossas ações.
Lembro exatamente que, quando estava deprimido, o medo surgia o tempo
todo. Ele me imobilizava e criava sensações que chegaram, em alguns
momentos, ao pânico. Primeiro começava com uma ansiedade, que ia
crescendo, tomando conta de meu peito. Apertava meu estômago feito um nó e
a respiração ficava ofegante. Eu me via sufocado, apertado, sem reação. Era
como se eu estivesse dentro de algo que me comprimisse e a sensação era de
pavor, de vontade de gritar – mas sabia que se gritasse não adiantaria. Eu só
queria fugir do lugar, desaparecer do mundo, me dopar com alguma coisa que
fizesse eu dormir e esquecer daquela situação.
Tive crises de pânico, inclusive, em lugares comuns, como em supermercado.
Lembro exatamente que estava na área de frutas e, sem perceber, comecei a
sentir meu peito se apertar. Com essa sensação, começava a aflorar uma
estranha e forte necessidade de chorar, de pavor, de medo, de uma fobia que eu
não conseguia controlar. Eu não estava numa situação assustadora. Os tomates
não me atacariam e eu nem seria vítima de uma mordida de cebola. Mas ali, em
meio as frutas e legumes, eu senti pavor. Um pavor de estar no mundo e eu
sabia que aquilo era irracional.
Em minha trajetória eu conheci os dois lados de sensações horríveis: a
ansiedade e a depressão. Nenhum dos dois é comparável. A ansiedade me
privava de raciocinar e me sufocava, enquanto que a depressão me revestia de
uma névoa que me insensibilizava frente a tudo, a qualquer prazer. Os dois
pareciam irmãos gêmeos: quando uma não estava, lá estava a outra, tentando
segurar minha mão.
Ao longo da depressão, tive muito medo de ter crises de ansiedade,
principalmente depois de ter provado o pânico. E esse medo amplificava ainda
mais minha ansiedade. Ou seja: eu tinha medo de ter medo, o que me deixava
ainda mais nervoso. Eu vivia uma expectativa, tinha um pressentimento, sentia
um perigo iminente a qualquer momento. Ficava pensando que, se saísse e
tivesse uma crise de pânico, eu sentiria todas aquelas sensações sufocantes. Isso
me impossibilitava.
Também, comumente, eu sentia uma angústia tomar parte de mim. Era a
mesma sensação de aperto, a crescer na região do meu estômago. Eu não sabia
exatamente explicar o que era aquilo, mas me oprimia, me diminuía, me fazia
sentir sem ar. Não era pânico, mas uma sensação total de desolação, que me
deixava sem norte a seguir. Com ela, ficava aquela sensação de querer chorar
por não ter perspectivas e, o pior, por não saber o motivo de senti-la.
Para tirar minhas dúvidas, fiz diversos exames clínicos – desde exames de
sangue a testes ergométricos – para verificar se minha causa de pânico ou de
angústia não tinha origem orgânica, como, por exemplo, algum problema na
tireoide. Eu sabia que estas causas físicas podiam influenciar de alguma forma
na ansiedade ou angústia. Após fazer os exames, logo os resultados me
indicaram que, clinicamente, eu estava em perfeitas condições. A questão era
outra: o problema residia em minha mente. Eu estava me tornando doente,
mesmo estando perfeitamente são.
Eu confesso que torcia por ter algum problema de saúde, pois sabia que se
tomasse alguma medicação para controlar esse problema, possivelmente todas
as sensações que me acompanhavam desapareciam. Mas a verdade se fez nua e
crua: o problema residia não no orgânico, mas em minha mente. Aquilo então
me fez tomar uma atitude: eu deveria enfrentar os medos, aprender a lidar com
a ansiedade e entender as origens da minha angústia. Estava dada a largada
para eu buscar meu reestabelecimento e, assim, lutar para enfrentar aquelas
situações que me aterrorizavam.
Confesso que não foi fácil e nem um pouco prazeroso ter que respirar fundo e
encarar as sensações que surgiam. Quantas e quantas vezes fui, por exemplo,
fazer musculação e não conseguia ficar nem meia hora, por conta das crises que
surgiam? Mas mesmo assim, eu continuava insistindo, por saber que elas não
tinham origem orgânica – o problema estava em minha cabeça e eu tinha o
poder de mudar minha realidade. O medo, a ansiedade e a angústia estavam ali,
pois eu não sabia entendê-los. Eu precisava insistir em aprender a tolerá-los, até
o momento em que eu, por tentativa e erro, compreendesse a melhor forma de
lidar com essas três sensações.
E o que foi que aprendi com tudo isso? Que eu não podia exigir demais de
mim e que eu era falível. Aprendi que eu devia aceitar quem eu era, aceitar
situações que eu não tinha controle e lutar, diariamente, para me entender e
aprender a lidar com as sensações que surgiam. As situações me ensinaram que
não é vergonhoso nenhum pouco eu assumir que precisava de ajuda e que, o
auxílio de alguém para nos ouvir – um amigo ou algum familiar, por exemplo –
era o diferencial para não me sentir só.
Ter medo não é fraqueza. É apenas uma resposta involuntária de alguma
situação que fomos expostos ou acreditamos que seremos expostos. Ele
paralisa, sufoca, prende-nos no mesmo lugar. Qual o caminho a seguir?
Enfrentá-lo de todas as formas: pedindo ajuda, conversando sobre o medo,
tentando dar passos pequenos (e comemorando eles), se expondo aos poucos
ao mundo além de nossa própria bolha, vivenciando o dia como uma
oportunidade de se entender.
É preciso, principalmente, compreender e aceitar que temos fraquezas. Todos
têm. É preciso parar de se culpar, de se sentir diminuído, de se sentir a pior das
vítimas do universo. O medo faz isso conosco. Porém ele deve ser encarado não
como uma âncora, mas sim um estímulo para repensarmos o que queremos de
nossa vida e, acima de tudo, como combatê-lo ou, ao menos, aprender a lidar
com ele. A vida é a arte do aprendizado.


Para refletir
O medo do desconhecido é uma das maiores dificuldades humanas. Provoca
ansiedade, angústia, fazendo com que a pessoa, muitas vezes, perca
oportunidades de ter uma vida melhor sob vários aspectos.
Tudo isso é uma questão de aprendizado, onde desde crianças somos
condicionados a evitar aquilo que não conhecemos. Alguns desses aprendizados
são importantes para a manutenção da nossa saúde e integridade física, já
outros não. Por exemplo: não ir no escuro porque tem bicho papão, não
conversar com estranhos.
O desconhecido, apesar de todo medo que pode despertar, muitas vezes pode
nos levar a bons aprendizados que, provavelmente, não teríamos se não os
tivéssemos enfrentado. Muitas pessoas preferem continuar uma vida onde ela
está por exemplo: num relacionamento ruim, num trabalho que ela não suporta,
mas mesmo assim, ela prefere manter o status quo ao invés de fazer alguma
coisa para mudar aquela realidade.
Parafraseando Zeca Baleiro, muitas vezes, “o melhor futuro é esse hoje
escuro”, e por mais escuro que seja o momento atual, as pessoas têm medo de
acionar o interruptor e acender a luz, tem medo de atravessar a ponte, por não
saberem e terem medo do desconhecido que podem encontrar do outro lado
dela.
Sem não existisse o novo, nossa vida não teria sentido. Não existiria ideias,
inovações, nem mesmo crescimento e desenvolvimento da própria pessoa como
indivíduo. A vida está em constante mudança, por isso é necessário aprender a
lidar com o novo, para que possamos crescer, desenvolver-nos, prosperar,
sermos felizes em vários aspectos da nossa vida.
A única coisa certa nessa vida é que amanhã será outro dia, por mais rotineiro
que seja o seu dia e a sua vida, como diria Toquinho: “a vida é uma astronave
que tentamos pilotar. Não tem tempo, nem piedade e nem hora pra chegar. Sem
pedir licença muda a nossa vida e depois nos convida a rir ou chorar. Nessa
estrada não nos cabe perceber ou ver o que virá. O fim dela, ninguém sabe bem
ao certo onde vai dar”.
Então, esteja sempre preparado, encare o medo, encare o novo. Não se
contente com uma vida medíocre que poderia ser muito melhor e você não
inicia um movimento no sentido da mudança, apenas porque tem medo daquilo
que está por vir e você não sabe o que é. Coisas muito boas podem estar
esperando por você do outro lado da ponte.
Robson Santos, psicólogo clínico, especialista em hipnose clássica e
ericksoniana. Piracicaba-SP.


O luto
A vida é um caminho que se perde e se cruza. É uma sucessão de passos que
se encontram e se desencontram. É um suceder de acontecimentos, que nos
levam a caminhos que não pensávamos trilhar. Paixões que surgem e morrem.
Amigos que fazemos e nos desencontramos. Pessoas amadas que partem.
Mudanças de emprego, de escola, de cidade. Rompimentos de relacionamentos
que eram para sempre. Mas não foram. É a vida se traduzindo em movimento.
Num movimento repleto de efemeridade, numa sucessão de ganhos e perdas. E
nestas perdas podemos, muitas vezes, passar pelo processo de luto.
O luto pode ser um misto de sentimentos: a culpa por não ter feito algo, a
saudade dos bons momentos, a sensação de nunca mais poder partilhar certas
coisas com alguém. O luto dói. Machuca. É uma ferida que não se cicatriza e fica
a pulsar. Sentimos um aperto no coração, como se algo faltasse ali: um sorriso,
uma palavra, um perfume, o timbre de uma voz, um momento inesquecível, as
brincadeiras, as pequenas discussões, os trejeitos únicos de alguém. O luto é o
momento em que a dor da perda se une à amargura da saudade.
E, muitas vezes, o luto pode ser aquele que nos leva a ter depressão. A perda
abrupta de alguém muito querido, o fim de um relacionamento, a morte de um
animal, uma mudança repentina. Olhamos diante da vida e sabemos que as
situações que antes vivenciámos, ou gostaríamos de continuar a vivenciar, se
tornaram meras lembranças, guardadas em nosso coração. É como se todos a
nossa volta tivessem uma realidade diferente, com a vida seguindo, enquanto
que, ao vivenciarmos o processo de luto, a nossa vida vibra em outra
frequência: a da saudade reunida à dor.
Cada um tem seu processo, pois cada um é único e sabe o que mais lhe dói.
Porém o luto é um processo necessário: é por meio dele que podemos nos
reconstruir. Reconstruir no sentido de assimilar a perda, de entender o que
aconteceu, de tentar olhar para frente e seguir, mesmo que a saudade corroa. É
um processo solitário, que somente nós podemos passar. Mas nem por isso
devemos sofrer solitariamente.
Nenhuma pessoa é uma ilha. Estamos todos de alguma forma conectados,
mesmo que não percebamos. Por mais que queiramos estar sozinhos neste
momento, para deglutir a saudade e a dor do luto, não devemos jamais se
entregar a pensamentos sombrios. Embora a sensação é de que tudo nunca vai
passar, o tempo, por incrível que pareça, aos poucos cicatriza certas feridas.
Jamais nos livramos das cicatrizes, mas o que antes era um corte pulsante, com
o tempo vai se cicatrizando. E buscar apoio em amigos, parentes, pessoas que se
importam conosco, é um processo que ajuda ao menos abrandar a dor da perda.
O processo do luto é um momento de recomeço, em que fazemos nossa vida
tomar um novo rumo, seguir uma nova história. A ruptura é um fato, que não
temos como mudar. A questão é o que faremos a partir das perdas. Cada um tem
seu momento de se “curar” do luto. Mas o mais importante é não sucumbir à
escuridão, nem aos pensamentos incapacitantes. Quando eles surgem, é bom
respirar fundo, entender que vivemos um processo de reassimilação de uma
nova realidade e ter a certeza que o tempo é um dos melhores acalentadores da
dor.
Pode parecer que aquilo nunca vai passar, que a dor vai continuar dilacerante,
que tudo perdeu o sentido. O tempo, por incrível que pareça, vai aos poucos
unindo pedacinhos desfragmentados e ajudando a cobrir o ferimento – as
cicatrizes ficam, mas devem ser encaradas não como algo que machuca, mas sim
como memórias de experiências que foram muito importantes para nós.
Ao passarmos pelo luto – que pode desencadear inclusive a depressão – nada
melhor do que buscar apoio. Não devemos se entregar à dor que corrói, mas sim
tentarmos, mesmo com todos os sentimentos sufocantes, buscar algum tipo de
ajuda, seja espiritual, uma terapia, o contato com amigos, parentes, enfim, não
se entregar.
A dor de cada um é única – não há como saber como cada um sente e, por isso,
é preciso respeitar o momento de cada um. Em muitos casos, a dor impõe o
silêncio, a reflexão, o isolamento. O luto, esse véu escuro que cobre os olhos, não
é algo a ser curado: é o processo de cada um. O problema é quando ele avança
no sentido de se transformar numa depressão. Neste momento, nada melhor do
que procurar um auxílio e, inclusive, mesmo com toda a dor e com todos os
prazeres que se sentia desaparecendo, é preciso, mais do que tudo, querer lutar
conta esse esvaziamento.
Além disso, é necessário acreditar que o tempo é o melhor remédio para
acalentar a dor da perda e batalhar com todas as forças (buscando auxílio,
inclusive) para não se perder na depressão. Lembrando que, cada dia é um novo
recomeço, com novas possibilidades e deve ser celebrado como uma nova
oportunidade de reaprendermos a nos amar.

Depoimento
Perdi minha mãe para o câncer em 2015. Ela faleceu em 4 meses, após o
diagnóstico das metástases. Foi algo muito triste e sofrido. Ela tinha 57 anos.
Durante este processo, meu pai a abandonou e não participou. Após a perda
dela, em julho de 2015, comecei a ver que havia algo além do luto, pois eu não
tinha ânimo nem para sair da cama. Por fim, tive o diagnóstico de depressão. Fiz
cinco meses de psicanálise com uma psicóloga especialista em luto e tomei a
medicação por 1 ano e 9 meses. Estou sem medicação há quase 2 meses.
Para minha recuperação da depressão, houve vários fatores: eu fui me
sentindo melhor, sendo que esta melhora pelo medicamento só senti com mais
de um ano de uso. Então, comecei a reintroduzir a atividade física em minha
vida, pois sempre fui ativa, sendo que consegui regularidade nos exercícios de
novembro de 2015 pra cá.
Outra coisa que me ajudou muito também foi ler sobre luto e filosofia. Outros
fatores incluíram a paciência e o carinho de poucos amigos que ficaram ao meu
lado. Digamos então que o que me auxiliou neste processo de cura da
depressão, após eu estar mais estável, foi a atividade física, que me motivou. A
distração, por meio de leitura. E o apoio dos amigos.
O luto me fez valorizar a vida. Da depressão, o que tirei foi que, nada é tão
maravilhoso quanto estarmos com saúde, seja física ou mental. Porque a
depressão quase me fez fazer uma besteira. Mas havia luz no fim do túnel,
felizmente.
Michely Guerra, bióloga, 36 anos. Cascavel-PR.

Para refletir
Na vida a todo o momento ganhamos e perdemos. Existem perdas inevitáveis,
previsíveis e que causam sofrimento dor e luto. Ao nascer ganhamos a vida, um
mundo novo, mas perdemos o útero materno para chegar num mundo estranho
com muita luz e sons. Um mundo desafiador. Ganhamos no decorrer da vida
irmãos e perdemos nas disputas diárias pelo amor da mãe, do pai, por um lugar
na família.
Ganhamos um lar, uma escola e, de repente, vemo-nos na necessidade de
abandonar esses lugares por mudanças inevitáveis na vida. Perdemos nosso
canto, nossos professores e amigos. Ganhamos amigos, vida social, festas, troca
de segredos e, por várias circunstâncias, os perdemos.
Alguém nos trai. Nós nos sentimos traídos e perdemos um grande elo de
confiança. Ganhamos um(a) namorado(a), apaixonamo-nos, fazemos sonhos,
somos um só e os perdemos no decorrer das nossas vidas por vários motivos.
Essa perda causa dor, desespero, perda da autoestima, perda da confiança nas
pessoas.
Perde-se a possibilidade por algum tempo de confiar nas pessoas e se
entregar à possibilidade de amar novamente. Ganha-se um casamento, filhos e a
tão sonhada e idealizada família. De repente essa família se desfaz, desmonta.
Perde-se o sonho, o projeto de vida, sonhos perdidos. Nesse momento todos da
família vivem um luto, cada um à sua maneira.
Tem-se um emprego conquistado pelos méritos, sonhos e projetos. De
repente, a pessoa se vê desempregada. Como contar à família que não será mais
o provedor? Perde-se o poder, a identidade, os sonhos, sente-se um fracasso.
Muitas vezes a pessoa se perde nessa perda e luto, "se entrega" à depressão, à
bebida e se isola socialmente. A pessoa tinha saúde, que trouxe tantos ganhos e
se vê recebendo diagnósticos de doenças incapacitantes e terminais. É um
processo doloroso de perdas e de um luto imenso.
Há ainda o envelhecimento, a perda da juventude, da vitalidade por
envelhecer, de não ser produtivo. E, por fim, a morte, que deixei para mencionar
por último, por essa ser a mais dolorosa perda em nossas vidas. A perda
inevitável.
Muitas vezes a morte é por fatalidades, doenças prolongadas que nos causam
muita dor e luto. Ocorre a perda da cronologia da vida, quando se vela um filho.
A morte impõe-nos silencio, vazio... Faz de nós pensadores da vida, refém de
nossos pensamentos. Entre todos os lutos, o que mais fracassa é o fracasso da
empatia, de compreender o significado da dor e experiência do outro.
Rosangela R. Brandão Leoni, psicóloga com especialização em escolar e
educacional, hipnose e terapia do luto. Itatiba - SP

Culpa
Qual é a culpa que você carrega? Quais erros você julga que cometeu? Qual o
fardo que lhe torna a vida sufocante? Qual o preço a se pagar por ser quem você
é? Só quem teve depressão sabe que, muitas vezes, surge no decorrer de todo o
processo um sentimento de culpa. Culpa por estar depressivo. Por não
corresponder expectativas de quem amamos. Culpa por errar. Por nos
sentirmos improdutivo, inúteis, por nos considerarmos um peso para a família
ou para aqueles que amamos. Sentimos culpa, simplesmente, por existir.
Na trajetória da depressão, a culpa é caracterizada como um sintoma. Ela
caminha ao lado da tristeza constante, do pessimismo, da apatia, da baixa
autoestima, do cansaço, dos problemas com o sono, dos distúrbios alimentares
e dos tantos outros sintomas. A culpa está ali. Esperando o momento certo para
seduzir nossos pensamentos e, como uma cobra constritora, esmagar nosso
desejo de continuarmos existindo. Ela faz com que queiramos, a todo o
momento, sermos punidos. Força-nos a todo instante a desejarmos que algo nos
machuque, puna-nos, faça-nos sangrar.
Tal como um moinho de vento, está a moer todo dia um pedacinho de nós. Ela
machuca aos poucos, desgasta nossa energia, projeta-nos (como se sussurrasse)
que somos culpados por tudo. Inclusive, por estarmos com depressão. Fraco,
inútil, imprestável, improdutivo, infeliz. A culpa sussurra isso. Desde que
abrimos os olhos pela manhã, ela está ao nosso lado. Afinal, nós temos a
obrigação de sermos felizes a todo o momento, segundo a sociedade, não é? Por
que, tendo tudo, sentimos um vazio tão grande? Como nos permitimos ficar
deste jeito, sem vontade de viver? A culpa musicaliza estas e outras questões e
as toca com notas dolorosas.
Embora a psicologia encare a culpa como um sintoma da depressão, eu,
particularmente, vejo-a em alguns casos como uma propulsora. Ela está ali para
levar à depressão. Vivemos num mundo em que se depositam, sem que
percebamos, uma série de expectativas desde o nosso nascimento. São projetos
edificados (por outros) antes mesmo de darmos o primeiro suspiro.
Crescemos com ideias de que devemos atender a muitas expectativas. São
projeções de um mundo que pode, inclusive, não serem exatamente aquilo que
nos faz sentir bem. Mas seguimos, muitas vezes, aquelas expectativas que não
são as nossas, apenas para satisfazer outros. A culpa surge, pois nos sentimos
uma farsa, com medo de sermos quem somos, com medo de que, se nos
posicionarmos, machucaremos aqueles que amamos.
A culpa, inclusive, é encarada a sociedade normalmente como algo bom. Ela
pode, até mesmo, ser referencial de boa índole. Se a pessoa sente culpa, ela se
arrependeu e está pagando por tudo o que fez. Será perdoada. Mas até que
ponto a culpa deve persistir? Até quando ela deve seguir ao nosso lado,
machucando-nos?
Introjetamos em nossos pensamentos uma vida construída em desilusões.
Acolhemos e amplificamos tudo o que deu errado. Olhamos o que nos circula e
vemos o quanto somos culpados por tudo o que acontece, mesmo sem termos
realmente culpa. Absorvemos tudo, como se pudéssemos resolver tudo.
Buscamos, como que de forma autônoma, uma punição.
Podemos nos culpar por um divórcio, por um rompimento amoroso, por não
termos passado num vestibular concorrido, por estarmos desempregados, por
não termos falado algo a alguém, pela sexualidade, por estarmos solteiros, por
estamos com alguém que não amamos mais, por não ter certas competências.
Culpamo-nos pelas escolhas dos outros, pela vida de pessoas que mal
conhecemos, pelos encontros que ficaram no “vamos marcar algo” e nunca
aconteceram. Culpamo-nos por não termos coragem de mudar coisas que
devemos ou, ainda, por termos mudado. Culpamo-nos por qualquer coisa:
aprendemos a nos culpar, como uma forma de se martirizar e, assim, tentar
mostrar (ao mundo?) o quanto sofremos e merecemos ser “perdoados”.
Talvez o perdão tenha que vir de nós mesmos. Devemos nos perdoar por
estarmos, a todo o momento, deixando de olhar a nossa verdadeira essência.
Esquecemos de nos amar. A culpa é a tradução da dor interiorizada. Como
romper esta dor? Simplesmente nos permitindo entender que, cada dia, é um
momento para reaprendermos a nos prestar pequenas homenagens. Ao invés
de se culpar, é preciso olhar para dentro de si e falar, consigo próprio: “Eu sou
uma pessoa maravilhosa e só por hoje vou dar o meu melhor para me amar. Eu
me amo. E eu perdoo a todos e a mim mesmo”.
Quando um pensamento de culpa surge, devemos encará-lo e desviá-lo. Pode-
se, para tanto, fazer uma mentalização pedindo forças para o universo, para
Deus, ou qualquer outra fonte de inspiração. Quando alguém nos lembra de algo
que nos faz sentir culpados (e nós sabemos que, no caso, não temos culpa),
podemos projetar, com nossa mente, uma mentalização de amor próprio, além
de desejar luz para a outra pessoa (mesmo que, sob certo ponto de vista, esta
pessoa possa ser odiosa). Somos aquilo que vibramos. Se permitimos que a
amargura alheia adentre, contaminamo-nos.
Ao invés de nos diminuirmos frente aos apontamentos dos outros (que não
sabem realmente o que sentimos), devemos lembrar que cada pessoa tem sua
limitação. E talvez aquela que nos faça sentir culpados, não entenda isso.
Portanto, não devemos somatizar a culpa apontada por dedos alheios. Isso nos
faz mal. É um treino diário. É brincar de se equilibrar numa corda bamba. Leva
tempo. Eu diria que, todo dia, é um novo aprendizado. E não há fórmulas
mágicas a não ser lutar.
A culpa, mais do que uma dor internalizada, é uma fonte de autopunição. Elas
nos arrasta para o fundo, como uma âncora. Ela não permite que vejamos o
nosso lado bom: sempre veremos o ruim em nós, aquilo que é mais perverso, a
abominação. Ela nos motiva a uma revisão detalhada de todos os nossos erros.
Amplifica nossa vigilância sobre nossos futuros passos. Ela colore tudo com
uma sensação de dor. Assim, sentimos certo gosto por nos encararmos como
vítimas de nossa própria culpa. Aspiramos que, com ela, teremos nossa punição
e que, com isso, vamos amortecer certos sentimentos. É um erro. Um erro com
nossa autoestima.
Ao surgir a autopunição, como forma de “expurgar” a culpa, machucamo-nos
ainda mais. Sobrecarregamos nossos corações com todo tipo de sentimento
rancoroso e amargo para com nós mesmos. Vamos aos poucos perdendo nosso
respeito próprio, esquecendo de nossa consciência, deixando-se de se
preocupar com nossa saúde. Podemos parar de comer, de se exercitar, de
buscar inspiração. Passamos a nos autossabotar. E isso só nos traz mais dor,
aumentando a nossa angústia. É algo que se retroalimenta: ao nos punirmos,
pela culpa, afundamo-nos ainda mais num campo de areia movediça feita de
dor.
Portanto, quando a culpa surgir, é preciso entender que respirar é preciso e
que nada é melhor do que se permitir lutar contra essa sensação. Quando sentir
uma pontada de culpa, lute para mudar o pensamento: use a energia não para
se culpar, mas para fazer algo que te entretenha e seja de alguma forma
estimulante, positiva (cozinhar, fazer algum trabalho manual, passear com o
cachorro, cuidar de uma planta etc.). Compartilhe a sensação com alguém de
confiança, buscando sempre apoio: pode ser um amigo, um terapeuta, ou
qualquer outra pessoa que lhe permita conversar.
Acima de tudo, faça um acordo. Um acordo com você: faça o possível para de
sentir melhor, mesmo que, naquele momento, não sinta força nenhuma. Porém
é importante insistir, mesmo sem vontade. Autoperdoe-se: entenda que nem
tudo como você enxerga é realmente como é. Muitos dos “fantasmas” que
carregamos não são nossos, mas sim de situações que “achamos” ser nossas,
mas não são.
Deixe de projetar expectativas na mudança dos outros para que você possa
buscar se sentir bem: preocupe-se com a pessoa mais importante da face da
Terra: você. E lembre-se: a vida é uma sucessão de acontecimentos, bons e
ruins. O que já foi, serve de experiência para que não insistamos nos mesmos
erros. Agradeça de coração o que a vida ofereceu, mesmo que tenha sido
doloroso. É isso que te faz uma pessoa única. Aprendemos com nossos erros.
Porém a culpa não deve ser uma muleta. Ela deve ser uma mola propulsora para
que possamos nos encarar de uma forma melhor: saber que somos falíveis, mas
que podemos continuar sempre tentando, todo dia, sermos o melhor para nós. É
preciso aprender a se amar, todo dia.

Para refletir
Quando uma pessoa está exposta a determinadas situações aversivas, é
comum serem produzidos sentimentos de tristeza, preocupação, angústia,
culpa, entre outros. Falemos um pouco mais então sobre a culpa.
A pessoa com uma medida alta de sentimento de culpa sofre sanções por
comportamentos considerados “inadequados”. Lembremos que este critério
(inadequado) é estabelecido de forma arbitrária, seguindo regras culturais,
sejam elas regionais, sociais, familiares etc.
Ocorre que, ao punir determinado comportamento, o “punidor” (muitas vezes
o próprio indivíduo) está atento apenas ao comportamento em si,
desconsiderando todas as variáveis responsáveis por ele e considera a pessoa
culpada, responsabilizando-a, então, pelo que fez: “VOCÊ me deixa louco”;
“VOCÊ me tira o sono”; “O que VOCÊ faz me deixa triste/nervoso”; “O professor
contou o que VOCÊ fez”.
Os comportamentos considerados pela pessoa como “inadequados” e que
geram sentimento de culpa são frutos de contextos e, portanto, não são apenas
de responsabilidade dela própria. Isto faz grande diferença nos
desdobramentos emocionais, já que, exposta a condições deste tipo, por longo
período de tempo, aumenta-se a probabilidade do indivíduo se deprimir.
A dor de sentir-se deprimido já é, por si só, insuportável. Agravada pelos
sentimentos de culpa, leva a pessoa a culpar-se também por estar doente. Ela
não discrimina sozinha que seu estado de depressão é resultado da exposição a
condições pelas quais, por deficiências comportamentais, não pode esquivar-se,
ou seja, evitar, ou mesmo enfrentar de maneira mais eficaz essas situações,
ocorrendo, por consequência, a perda de vitalidade, ânimo, prazer, levando-a a
entrar no doloroso processo de culpa por estar em depressão.
Uma pessoa não deprime deliberadamente, e ainda que seus sentimentos de
culpa ou angústia tenham sido selecionados e reforçados aumentando a
possibilidade de deprimir, seu sofrimento é real e intenso. Sendo assim, num
processo psicoterapêutico, o indivíduo precisa não apenas identificar a culpa,
mas quais condições sociais estão produzindo e mantendo tal sentimento, para
que então possa desenvolver habilidades e repertórios que produzam bem-
estar e qualidade de vida.
Gabriela Carvalho Paes, especialista em Psicologia Comportamental;
supervisora do curso de Especialização no ITCR (Instituto de Terapia por
Contingências de Reforçamento) Campinas e atendimentos clínicos em
CPC (Centro de Psicologia Comportamental) em Americana-SP.



Uma reflexão sobre o envelhecer
Quando criança, o tempo tinha um correr lento. As horas eram extensas, os
dias longos. Anos pareciam infinitos para terminar. A data do meu aniversário,
tão aguardada por conta dos presentes, nunca chegava. Feito um carrinho numa
montanha russa, o tempo na infância começava vagaroso, sem velocidade. Ia
seguindo lento pela subida, metro por metro, deixando-me a vontade para
admirar tudo o que se seguia pelo caminho. Mas num ápice, sem que eu me
desse conta, o carrinho por fim chegou ao topo da montanha russa e começou a
queda. Se antes tudo estava vagaroso, logo após o ápice da montanha russa, veio
a descida. E conforme o carrinho avançava, mais e mais rápido se tornava ela.
Assim é a sensação do tempo: quando somos crianças, ele passa
vagarosamente. Mas conforme vamos avançando na idade, ele escorre por
nossos dedos sem que percebamos. Isso me lembra, certa vez, um programa de
televisão. Não lembro ao certo quem falava, mas algo daquilo ficou registrado
em mim. Nossa vida é comparada a um pêndulo com um longo fio ao nascermos.
Ele está balançando de um lado para o outro. Como o fio é longo, ele se
movimenta vagarosamente. Mas conforme vamos vivendo a vida, o fio vai se
encurtando. E conforme o fio se encurta, mais rápido se movimenta o pendulo.
O tempo é assim: vagaroso quando ainda estamos em nossos primórdios e
rápido feito um flash quando já estamos mais velhos.
Lidar com o tempo e, certamente, com o envelhecer, em alguns casos, pode
levar a casos de depressão. Há quem tema o envelhecimento, pois o encara
como uma fase melancólica, de declínios, perdas, do fim se aproximando. Ouvi
desde criança que “envelhecer era o inferno na terra”, pois conforme
envelhecemos, “perdemos a beleza da juventude, nosso corpo não responde
mais o que queremos, enfim, vivemos uma realidade mais difícil”. Peguei-me
inúmeras vezes pensando a respeito disso. E me entristecia. Muito. Era como se
envelhecer fosse algo ruim, nefasto. Era como se o próprio ato de viver muito
não fosse bem-vindo.
Acho que devo muito à depressão, por ela ter me mostrado que a vida é uma
questão de como a encaramos. Em outros tempos, quando eu vivia melancólico,
com um vazio a me preencher com uma sensação de nada, jamais acreditei que
a forma como encarávamos tudo podia fazer diferença. E quem vinha com o
papo de “ter pensamentos positivos é importante” eu já olhava de canto e
pensava comigo mesmo: “Ata, senta lá e espera”.
Hoje, consigo vislumbrar que tudo é questão de como encaramos a vida. O
envelhecer traz sim uma série de limitações, pois afeta nossa estrutura
biológica e, em alguns casos, a psicológica. Mas antes de tudo isso, o envelhecer
a certeza de que ainda estamos vivos e temos a possibilidade de continuarmos
sempre buscando algo novo. Basta querermos e, acima de tudo, movimentamos
o universo para que as coisas possam acontecer.
Fico maravilhado quando vejo pessoas com seus oitenta e pouco anos
realizando o sonho de ter um diploma universitário. Quando no auge da idade,
não ouvem os “sábios” conselhos dos mais novos e não se privam de fazer uma
viagem que sempre sonharam. Encanta-me quando uma pessoa já passando dos
seus oitenta anos, continua a semear seu conhecimento escrevendo livros,
pintando, criando uma música, promovendo eventos, gerindo uma empresa,
ensinando. Inspira-me saber que estas pessoas, antes de olharem a data de
nascimento, encaram aquilo que os faz diferentes: sua essência, seus
pensamentos, sua forma de se enxergar frente a tudo o que enfrentam.
Elas não se entregam ao peso da idade. Pelo contrário: usam todas as
energias para continuar a transformar o mundo ao redor e, inclusive, a
transformar a vida delas em algo cada vez mais maravilhoso. Lógico que há,
muitas vezes, a limitação do corpo, do biológico, mas a essência continua firme a
acreditar, que cada dia, é uma nova possibilidade. Conheço idosos que são assim
e eles são meu modelo de envelhecer. Quando me olho diante deles, sinto o
quanto eles são mais jovens em matéria de espírito que eu (e confesso que fico
com certa inveja pelo despojamento de levar a vida, que eu ainda quero
aprender).
Viver é um processo diário de envelhecer. Cada dia não deve ser encarado
como um dia a menos, mas sim uma possibilidade a mais de lutar por pequenas
conquistas para nosso bem-estar. Sei o quanto é difícil, ainda mais por vivermos
numa sociedade que preza pela necessidade de parecer jovem ou esteticamente
enquadrado nos padrões impostos.
Tanto é que, no Brasil, só em termos numéricos, em 2015, foram registradas
1.224.300 cirurgias plásticas, colocando o País apenas atrás dos Estados Unidos
da América. Em 2013, o Brasil ficou em primeiro lugar, com no ranking dos
países que mais faziam cirurgias plásticas no mundo. Os dados são da Isaps
(Sociedade Internacional de Cirurgia Plástica e Estética).
Lembrando que, em alguns casos, fazer uma cirurgia plástica, para melhorar a
autoestima, sempre é bem-vinda, pois a pessoa pode se sentir mais confiante em si.
Cada um é cada um. E cada pessoa sabe aquilo que a incomoda. Batalhar para se
sentir bem consigo mesmo é essencial e melhorar a autoestima é uma ferramenta
essencial no lidar com a vida.
O problema é que vivemos, infelizmente, numa sociedade em que a imagem tem
mais valor do que a essência. A questão é que o essencial mesmo não é o que se
aparenta, mas o que se sente. A verdadeira idade não está no rosto, mas na forma
como se encara a realidade. Conheço pessoas jovens que são verdadeiros idosos:
reclamam de tudo e todos. Enquanto que conheço pessoas idosas que estão o
tempo todo a sorrir de forma sincera e, portanto, nem aparentam a idade que tem.
Eles trazem uma juventude nos atos, nas ações. Eles fazem com que queiramos
dividir momentos e experiências, além do que são fonte de conhecimentos.
Aquele que aprende a olhar o mundo com um olhar de uma criança, ou seja,
consegue ver a beleza nas coisas que se desdobram, passa a captar e a refletir o que
há de melhor. E isso traz leveza. Traz a sensação de que o mundo é uma caixinha de
surpresas, as quais devem ser aceitas como aprendizados e não como um castigo.
Portanto, cada aniversário deve ser comemorado. É uma dádiva, uma oportunidade
de mostrar que se venceu mais um ano e que há novas possibilidades.
Não existe idade para voltar a estudar, lutar por sonhos, realizar antigas
vontades. Existe, na realidade, a gente se permitir criar o mundo em que vivemos. E
isso depende da força de vontade e da capacidade de, em meio as possibilidades,
encontrar o melhor caminho. A idade, neste ponto, traz a maturidade. Representa a
experiência. Ela permite com que as decisões sejam mais acertadas, pois há por
detrás de cada marca, uma história. De cada história, um aprendizado. E é isso que
deve ser levado em consideração. Envelhecer não é um castigo: é o atestado de que
estamos vivos. Só não envelhece quem já não está mais vivo.

Para refletir
Quando perguntamos a um idoso qual é o seu maior medo, a resposta não é a
morte ou alguma doença específica. A maioria dos idosos temem, na verdade, a
perda da qualidade de vida e a dependência. E não podemos falar em prejuízo à
qualidade de vida do idoso sem mencionarmos a depressão que é, atualmente, a
terceira causa de incapacidade, mas que será a primeira em 2030. Estamos
diante de um problema de saúde pública, que gera muita preocupação, pois a
população vem envelhecendo e a atual estrutura familiar é diferente do
passado, com menor número de filhos para suporte dos pais na velhice.
A depressão é mais comum em jovens, mas o idoso é uma população em risco,
devido às perdas que podem ir se acumulando ao longo da vida, como a morte
dos pais e amigos, a aposentadoria, que leva ao fim da rotina de trabalho e à
possibilidade de declínio nas finanças, a perda da saúde física com o
aparecimento de doenças, e até mesmo as situações de abandono e outras
formas de violência, praticadas infelizmente e geralmente por familiares.
Além dos sintomas clássicos de depressão, como tristeza, desânimo, ideias
negativas e alteração de sono, o idoso pode apresentar sintomas atípicos, como
cansaço, dores pelo corpo e esquecimentos. Muitas dessas pessoas não
procuram tratamento, pois consideram que seus sintomas são decorrentes do
próprio envelhecimento. Isto faz com que a doença se cronifique, gerando mais
sofrimento emocional e físico. Sim, físico. A depressão pode reduzir o apetite,
levar ao emagrecimento e à fraqueza muscular e aumentar o risco de quedas. A
depressão é ainda considerada fator de risco para o desenvolvimento da doença
de Alzheimer, agrava problemas de saúde que o idoso já possui, e é um fator
que, independentemente, aumenta a mortalidade.
Lidar com a depressão não é tarefa fácil, especialmente nos casos mais
graves. Deve haver uma cooperação e envolvimento da família. Idosos
deprimidos que não têm apoio familiar ou da comunidade apresentam um pior
prognóstico. Muito importante que o idoso use regularmente o medicamento
anti-depressivo prescrito pelo médico, e que só o interrompa após sua
indicação. Apesar da resistência, muitos idosos se beneficiam da psicoterapia,
que pode ser suficiente em quadros mais leves. Sempre bom lembrar da
importância do exercício físico e dos contatos sociais, tanto no tratamento,
quanto na prevenção dos transtornos depressivos.
Virgílio Moraes Ferreira, médico com título de especialista em geriatria
e medicina de família e comunidade, com mestrado em Saúde Coletiva.
Marília-SP.
O lado bom da depressão
O mais desesperador da depressão é aquela sensação de que ela nunca terá
fim. É como se as horas do dia se estendessem, ficassem paradas, prendendo-
nos a um vórtice de tristeza, dor e melancolia. Sentimo-nos angustiados, com
algo a apertar nosso peito, uma sensação enorme de vazio. Só quem tem ou teve
sabe o que é a sensação de que estar tão reduzido, que nada sente. E se alguém
me dissesse que, à época em que estava depressivo, a depressão me traria algo
bom, eu desconfiaria com ceticismo. Como pode algo que nos faz sentir morto
em vida trazer algo bom?
Só depois de conseguir superá-la, passei a ver o lado bom desta doença. E, por
incrível que pareça, eu agradeço por ter tido depressão. Pode parecer algo
estranho agradecer por tudo o que passei ao viver na névoa sem sentimentos:
foi a depressão quem me levou à escuridão, me fez sentir que nada mais valia a
pena. Foi ela quem me jogou ao fundo do poço e me fez sentir um lixo. Foi a
depressão quem fez eu ter pensamentos ruminantes, ou seja, pensamentos
negativos repetitivos, que me reduziram a nada. Sim. Foi ela. Somente ela.
Mas foi a depressão quem fez eu pensar nos problemas que tanto me
diminuíram e me reduziram a nada. Foi ela quem me fez olhar para tudo o que
me machucava, que me levava ao chão só com uma simples menção. Foi ela
quem fez eu encarar meu próprio eu. Foi a depressão que me jogou na cara o
que me feria. Ela botou o dedo diretamente nos pontos que eu mais sentia dor. E
assim ela me mostrou claramente minhas fraquezas e como elas afetavam
minha vida.
Acredito que se confrontar é o mais difícil. Ficamos presos em nossos dilemas,
em pensamentos ruminantes, que se repetem sem parar. Qualquer coisa é
gatilho para eles voltarem. A depressão escancara isso. Ela não é carinhosa,
passando a mão em nossas cabeças e dizendo: você vai superar. Simplesmente
ela esfrega em nossa cara aquilo que nos faz sentir mal e fica esperando outra
oportunidade para cutucar nossas feridas. É justamente esse fato que a faz ser
“interessante”: ela mostra aquilo que não queremos confrontar. E enquanto não
confrontarmos aquilo, ficamos presos e nos reduzimos cada vez mais.
Foi a depressão, após escancarar meu eu interior para mim mesmo, que me
fez começar a tomar as rédeas de minha vida. Foi a partir dela que comecei a
mudar escolhas. Escolhas que, se eu continuasse, faria da minha vida uma
porcaria de vida, pois ficaria repetindo as mesmas coisas, os mesmos
pensamentos, sofrendo com os mesmos medos. Foi a partir da depressão que
comecei a aceitar o que não podia mudar. E a trabalhar para mudar o que eu
podia.
A depressão me tornou mais humano. Colocou-me em sintonia com minhas
dores e me fez pensar sobre a vida, sobre o vazio que existia em mim e que vi
refletido em tantas pessoas. Ela me tornou mais empático: passei a me colocar
no lugar dos outros, de uma forma que antes não fazia. A entender que meus
problemas podem ser tão pequenos quando comparados aos outros. Eu não via
isso quando estava em depressão, pois nossa dor é a maior do mundo. Mas hoje,
depois que saí dela, vejo claramente. Ela me ajudou a enxergar o mundo com
olhos mais humanos. E a entender que todos nós temos nossas dores e que é
preciso aprender a lidar com elas.
Um estudo norte-americano, feito por dois pesquisadores evolucionistas, Paul
W. Andrews e J. Anderson Thomson Jr53, propõe justamente que a depressão
seria uma adaptação natural, pois de certa forma precisaríamos dela. Parece
estranho a proposta dos dois pesquisadores, pois segundo eles, a depressão
serviria para podermos resolver problemas complexos.
No estudo, eles propõem que a depressão induziria mudanças nos sistemas
corporais. Desta forma, haveriam efeitos, que facilitariam a ruminação analítica
de um problema, ou seja, o depressivo ficaria analisando o tempo todo uma
questão complexa que o faz sentir melancólico. Segundo essa visão:
1) a pessoa com depressão focaria a atenção no problema;
2) ela seria induzida à anedonia (perda da capacidade de sentir qualquer tipo
de prazer);
3) o depressivo teria alterações psicomotoras, que reduziram sua exposição a
estímulos, ou seja, iria ter desejo de isolamento social, perda de apetite, entre
outros.
Este mecanismo da depressão, desta forma, forçaria a pessoa a parar e ser
obrigada a olhar dentro de si, mesmo que isso não fosse consciente e a levasse
ao sofrimento. O objetivo? Resolver o problema que a aflige. Em outras
palavras: a depressão seria um mecanismo que forçaria a resolução de um
problema que nos afeta. Seria uma espécie de “greve” do nosso corpo para que a
questão existencial fosse resolvida.
Quanto estava com depressão, jamais pensei que haveria um lado bom dela.
Porém ela me fez tomar as rédeas de minha vida, para que eu pudesse mudar
aquilo que me afligia. A depressão me fez fazer escolhas. Enfrentar medos.
Encarar verdades. Ela me fez aprender que, se eu continuasse a me vitimizar o
tempo todo, continuaria a ser vítima de mim mesmo. Era preciso tirar forças –
que ela havia exaurido – de algum lugar. E confesso: não foi nada fácil.
Tirei forças do pensamento de que eu iria sair da depressão, mesmo
parecendo impossível. Mas parecer não significará que será. Parecia impossível.
Mas foi possível. E ela me tornou uma pessoa melhor em vários aspectos: mais
empático, mais preparado para lidar com meus sentimentos, mais forte em me
posicionar frente a outras pessoas, mais seguro de mim mesmo. Sou uma
pessoa infinitamente melhor depois da depressão: ter depressão me ensinou a
lutar para nunca mais voltar a ela, pois aprendi os mecanismos internos que me
levaram a ela. E lógico: não foi de um dia para o outro. Levou tempo. Mas cada
dia é uma vitória, mesmo que pequena. E são essas pequenas vitórias que
devemos comemorar.

Depoimento
No momento em que caímos em depressão, ficamos com medo e sem forças
para lutar. Ficamos no abismo, remoendo pensamentos obscuros, contando as
horas ansiosamente, para que o dia passe e venha o próximo que, aliás, pode ser
a mesma coisa. Então bate o desespero e tudo fica sem sentido. A nossa mente
fala o tempo todo: “para que continuar aqui se você pode acabar isso de uma
vez? ”. Ficamos com esse pensamento, de querer sair deste plano e ir para outro
lugar. Só queremos fugir das sensações que sentimos.
Não é raiva ou ódio de viver. É medo e receio. É tristeza de não conseguir se
amar. É insegurança de enfrentar aquela situação na qual você acha que não
tem forças mais para persistir. É ruim se sentir o último, o mais fraco, que não
está no lugar certo, querendo falar tudo e ao mesmo tempo preferir ficar calado.
Alguns se acabam aqui: no momento em que você está no fundo do poço e não
vê nenhuma luz.
Aos que passaram por esta situação, como eu passei, é possível criar forças
para enfrentar os desafios da vida. Nós aprendemos a enfrentar o nosso maior
inimigo: nós mesmos. Passamos a entender que as críticas externas eram um
meio para acharmos uma desculpa para não nos amarmos.
A depressão me ensinou a enxergar um lado obscuro que temos dentro de nós
e, quem sai de lá, não quer mais voltar. Sabemos o quanto é ruim aguentar
nosso monstro interno, a todo o momento nos julgando, culpando e devorando
por dentro. Olhar neste passado dá um aperto no coração e, ao mesmo tempo,
um alívio de não feito alguma besteira.
Passar por isso me ensinou a aprender a me amar cada vez mais. O mais
gratificante é ter estes desafios diários, pelos quais eu tinha medo antes, mas
hoje são eles me dão sentido à vida. Estamos preparados? Acredito que nunca
estamos. Mas qual a graça da vida se ela não tiver seus "sustos" e emoções? A
tristeza, vez ou outra, ensina-nos a levantarmos mais fortes, prontos para outra
luta! Hoje eu entendo o sentido da frase: “a vida é uma luta constante...".
Não podemos evitar certos acontecimentos. Eles são os desafios que temos
que observar, passar por eles, e usar nossa energia para seguir em frente.
Nossos dias estão cheios de desafios e cada um oferece uma oportunidade única
de crescimento e realização.
Alison Santos, 24 anos, universitário. Americana – SP.

A importância de sempre seguir em frente
Nesta caminhada, que é a vida, estamos sempre diante do inesperado. E é ele
quem faz com que mudemos planos, caminhos e direcionamentos. Até mesmo o
que projetamos, idealizamos e criamos expectativas, está, sob certo aspecto, nas
mãos do universo: pode ser que a nossa idealização não ocorra da forma que
gostaríamos.
Nunca sabemos qual a paisagem que vai se desdobrar conforme avançamos.
Talvez, uma das grandes maravilhas da vida seja exatamente isso: o desbravar,
o conhecer, o se encantar. Temos algumas projeções, que as pegamos como
certezas.
Muitas vezes, insistimos em projetos que não nos fazem felizes, em
relacionamentos que não nos fazem bem, em amizades que nos desgastam, em
trabalhos que nos sufocam e não nos valorizam. Ficamos estagnados, com medo
das incertezas. Temos medo de dizer não, de mudar algo que nos faz infeliz, de
encarar o que não nos agrada e seguir em frente.
Outras vezes, idealizamos tanto algo que, quando acontece, não era
exatamente como o esperado: o curso tão sonhado, o encontro tão desejado, o
trabalho tão aguardado, enfim, tudo o que idealizamos e conseguimos tocar.
Mas não é exatamente da forma como imaginávamos. Investimos nossas
energias para, sob uma ótica pessimista, não ser exatamente do jeito que era.
Ficamos arrependidos. Culpamo-nos por ter feito escolhas. Queremos voltar
atrás.
Eu, particularmente, aprendi a agradecer. Agradecer as escolhas erradas e ser
grato por algo que, antes de ter depressão, eu não conseguia entender: a vida é
movimento e, se estagnamos num ponto, morremos em vida. Só soube que
certas decisões foram erradas, pois eu as tomei. Investi em desejos, trabalhei
para que eu pudesse me aproximar deles. Ao chegar e alcançá-los, vi
exatamente que não era da forma como eu imaginava. E isso é perfeito: para
mostrar que se movimentar é sempre preciso.
Nós nunca sabemos qual a sensação de perder o chão, até o momento que ele
cede. A vida é esse solo mágico: muitos momentos, está palpável. Em outros,
cede. Cair é algo natural e só acontece por que nos colocamos a se movimentar,
ou seja, viver. O bebê começa engatinhando. Aos poucos, tenta se equilibrar:
leva tempo aprender a ficar de pé. Até este “aprender”, quantos e quantos
tombos ele não leva? Se fosse contabilizar todas as quedas e fracassos, os bebês
não conseguiriam jamais andar.
É o mesmo processo de aprender a andar de bicicleta. Lembro-me
exatamente que demorei muito tempo para abandonar as “rodinhas” que
ficavam fixas na roda traseira. Elas me davam o amparo na falta de treinamento
do meu equilíbrio. Até o momento em que uma delas, pelo grande uso que fiz,
arrebentou. Tentei enfrentar meu medo de seguir em frente e comecei a me
aventurar de bicicleta com apenas uma rodinha.
Desequilibrei-me muitas vezes. Fui ao chão outras tantas. Mas não desisti,
mesmo com medo. Passado algum tempo, então, meu pai tirou a outra rodinha.
Eu estava sem os amparos. Insisti, desequilibrando. Foi numa tarde, ainda
criança, que aprendi a me equilibrar. Lembro-me até hoje da sensação do vento
em meu rosto, passando enquanto eu andava de bicicleta me equilibrando
sozinho. Eu sorria. Eu sentia algo vivo dentro de mim: havia seguido em frente,
sem me deixar afetar pelo medo das quedas.
A vida é um andar de bicicletas. Estamos o tempo todo nos e equilibrando e,
mesmo tendo aprendido a andar de bicicleta, podemos passar por alguma
pedra, ou um buraco, e se desequilibrar. A questão é entender que estar em
movimento sempre é preciso. Tomar decisões é necessário: dói escolher algo,
pois sempre que se escolhe algo, abdica-se de outra escolha. Uma decisão pode
impedir outra. E não é por isso que devemos parar de tomar decisões.
A depressão me ensinou que existe uma necessidade urgente de sempre
seguirmos em frente. Quando eu estava completamente sem vontade de viver e
sem nenhuma perspectiva de melhora emocional, eu me falei: “Vou levantar,
mesmo chorando, mesmo com vontade de me esconder do mundo, mas vou.
Vou seguir em frente, buscar aceitar o que não posso mudar e mudar o que
posso”. Mais do que isso: eu aprendi que o mais importante não era o futuro,
mas o agora. Apenas no hoje eu consigo dar um passo que me leva até um
objetivo – mesmo que esse objetivo seja algo simples. Pode ser que, ao alcançar
o que tanto desejamos ou esperamos, as coisas não sejam da forma como foram
imaginadas.
Hoje consigo vislumbrar nossa essência como um grande lago. Dentro dele,
encontramos uma série de seres transitando (são nossos genes, sentimentos,
emoções, vivências, histórias, enfim, um conjunto de tudo o que somos,
passamos e interagimos). Para que esse lago continue a ter vida, é preciso que
ele tenha oxigênio dissolvido em suas águas. Só assim, a grande parte dos seres
continuará se desenvolvendo. Um lago estagnado, sem movimentação, tem uma
menor troca gasosa com a atmosfera. Logo, há menos oxigênio e, portanto, pode
haver um colapso, levando os habitantes dele a morte.
Para que o lago possa estar sempre com uma boa oferta de oxigênio, é preciso
fazer com que as águas entrem em movimento. Se não há nenhuma cascata de
água no lago, uma alternativa são os aeradores: eles servem para incorporar
oxigênio na água. Eles também ajudam a misturar a água para que não aconteça
o acúmulo de gases tóxicos no fundo além de fazerem uma quebra de barreira
de temperatura entre o fundo e a superfície do ambiente, buscando um
equilíbrio. Ou seja: a água em movimento representa uma melhor qualidade de
vida para quem habita o lago.
O mesmo acontece conosco. Se ficamos estagnados, a vida que há em nós
começa a perder forças. Perdemos “oxigênio”. Sufocamo-nos em nós mesmo.
Desta forma, é preciso agir. É preciso instalar aeradores em nosso lago: seja
buscando uma terapia, se alimentando bem, praticando atos de amor-próprio,
procurando o apoio de um amigo, fazendo exercícios, se preenchendo de coisas
boas, entre outras possibilidades.
Somente quando nos colocamos em movimento é que fazemos com que as
águas estagnadas comecem a se preencher de oxigênio. Acima de tudo, é preciso
sempre seguir em frente. Podemos cair. Mas é preciso levantarmos (inclusive,
ter apoio é muito importante) e seguimos sempre para frente. Sempre. A vida só
tem esse caminho e querer recusá-lo é se privar de novas possibilidades e
novos horizontes. Vale muito a pena lutar por si e para se sentir bem consigo
próprio.

Depoimento
Até os meus nove anos fui uma criança normal. Após esta idade, minha mãe
começou a trabalhar em casa e eu ficava assistindo televisão e brincando de
princesa sozinha no quarto. De repente, engordei. Imagine uma criança de nove
anos com quase 70 quilos e, aos 13, com quase 115 quilos.
Eu poderia ficar reclamando e chorando. Mas sempre tive um sorriso no
rosto, lutei contra a obesidade e, dentro do possível, vivia minha vida. Muitas
vezes, fantasiava situações e isso me dava forças para prosseguir. Eu estava
sempre rodeada de amigos e minhas amigas dormiam todos os finais de
semana em casa. Mas como eu disse: eu vivia fantasias. No fundo, eu me tornava
uma pessoa desacreditada, desacordada da vida real, vivia um mundo que não
pertencia a mim.
Em 1998 casei. Em 2000, tive minha primeira filha, a Fernanda. Nesta época,
cheguei ao auge da obesidade, exatos 126 quilos. Tive depressão durante a
gestação, foram meses lutando contra meus pensamentos e ideias negativas. Eu
estava no fundo do poço, totalmente desacreditada. Todas estas situações, entre
outras, contribuíram para o término de um relacionamento de 7 anos. Separei
no ano de 2002 e voltei a morar com meus pais junto de minha filha de dois
anos. Depois de um ano divorciada, envolvi-me com uma pessoa que me fez,
inclusive, perder um carro devido a dívidas que me fez arcar. Tive outra
depressão, com um ano fazendo análise e tomando remédios.
Em 2005, recebi a notícia que faria minha cirurgia bariátrica. Tinham se
passado três longos anos de espera na fila do SUS. Submeti-me ao tão esperado
procedimento e isso foi de extrema importância para a recuperação da
depressão: emagreci 60 quilos, curti a vida, namorei, paquerei, fui a barzinhos,
conheci muita gente, tive novas decepções, porém estava mais forte, muito mais
forte!
A pior situação de minha vida até os dias de hoje aconteceu no ano de 2010,
quando minha mãe teve mieloma múltiplo nos ossos. Foram meses acamada e
anos de tratamento. Ela faleceu em 2014. E foi uma barra: corri com tudo: do
funeral ao reconhecimento do corpo, pois ela faleceu em Campinas e, para sair
do hospital, alguém precisava fazer isto.
Em 2011 conheci meu atual esposo, Eder. Engravidei em 2013 e nos casamos
ao final do ano. Em 2014, Manuela nasceu. Nesta mesma época, perdi meu
emprego, mas logo consegui recolocação. Posso dizer que as dificuldades
enfrentadas por mim e as duas depressões que tive, tornaram-me muito mais
forte. Aprendi muito, lutei e luto contra “os fantasmas” que criamos em nossa
mente. Sim! Fantasmas! E somente com nossa força interior conseguimos
derrota-los, não foi fácil, NÃO É FÁCIL, mas tudo depende de nós de nossa força
interior.
Hoje posso dizer que minha vida está mais tranquila. Faço pedagogia, um
sonho que não realizei antes, por NÃO ACHAR QUE EU FOSSE CAPAZ! Mas sim,
EU SOU CAPAZ, e sou MUITO CAPAZ! Hoje consigo enxergar o quanto sou forte,
e o quanto eu superei na vida as dificuldades da obesidade. Esta é minha
trajetória até aqui. Dos 9 aos 43 anos! E daqui para frente a história será
diferente. O futuro a Deus pertence.
Adriana Silva, 43 anos, universitária. Americana-SP.


Para refletir
Sob uma visão Holística, a depressão é o que chamamos de um processo de
aprendizado no qual o ser humano poderá entrar quando o curso da vida o
convida a uma grande mudança.
Durante a jornada terrena, o espírito possui uma tarefa muito importante:
evoluir, aprender constantemente por meio de interações, ações, reflexões, que
o conduzam a um estado de paz e alegria. Mas, quando esse objetivo fica de
lado, juntamente com o bem-estar e felicidade, o próprio Espírito proporcionará
circunstâncias que tragam inquietação e mudança na forma de pensar, agir e
escolher, para continuar a evoluir. Essa inquietação muitas vezes virá
manifestada como angústia, frustração, vazio, aparente falta de escolhas. É
como se a beleza da vida e a paisagem cheia de cores tivessem dado lugar a uma
nova imagem, em preto e branco, sombria, sem vida.
A grande chave para pintar com novas cores esse cenário é iniciar a análise do
contexto a partir de uma visão externa, muitas vezes proporcionada pela ajuda
de um psicólogo ou terapeuta, ou mesmo por um amigo de confiança. Eles
poderão ajudá-lo a ver o seu problema de forma diferente e ajudá-lo a
encontrar soluções. Pois a depressão exige do ser humano muita coragem para
enfrentar os desafios com serenidade, a fim de fazer escolhas que tragam
resultados diferentes e melhores daqueles que vinha tendo.
É necessário estar aberto à mudança, aprendendo com o passado,
reconhecendo o presente e agindo para um futuro melhor.
Aprender com o passado é realizar um exame de consciência, ressignificando
valores de vida. É virar a página e compreender que já não dá mais para viver
oprimido, angustiado. É reconhecer que viver feliz é a sua meta.
Reconhecer o presente é perceber que está no momento de escolher. Poderá
escolher seguir em frente com coragem e assumir que a sua felicidade e bem-
estar valem muito, ou permanecer acomodado, esperando que o contexto mude
por si só - mas esta não é a melhor saída, acredite, pois poderá se frustrar ainda
mais.
Agir para o futuro é tomar as rédeas da situação, enfrentar os problemas com
coragem, sejam eles situações ou pessoas. É dar um basta e aprender a dizer
não para o que lhe faz mal, priorizando a sua saúde e bem-estar.
É necessário coragem e esforço para superar a depressão. Toda ajuda é válida
quando realmente se quer melhorar e sair dessa fase. Escolher seguir em frente,
criando novos e bons hábitos de vida, te ajudará a trilhar caminhos melhores e
mais felizes. Escolha ser feliz.
Fernando H. G. de Oliveira, terapeuta holístico. São Paulo-SP.

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