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INFECÇÕES NECROTIZANTES DO PERINEO


Profa. Dra. Josimeire Batista Mehl

As infecções necrotizantes do períneo são conhecidas desde a antiguidade,


porém a primeira descrição aconteceu durante a Guerra Civil Americana como
“gangrena hospitalar”. A condição foi descrita na genitália masculina por Fournier
em 1883, e de forma mais generalizada por Meleney em 1924. Inicialmente foi
atribuída ao streptococo  hemolítico e desde então, muitos outros
microorganismos foram implicados. Hoje sabemos haver múltiplas bactérias
envolvidas, aeróbios Gram-positivos, negativos e anaeróbios.

CLASSIFICAÇÃO

Embora existam muitas classificações para estas infecções, adotaremos


uma classificação clínica mais prática que as divide em três grupos:

1) Celulites Necrotizantes. Estas lesões comprometem apenas pele e


tecido subcutâneo e são causadas apenas por um microrganismo, usualmente
estreptococo A.

2) Fasciite Necrotizante. Infecção inicia-se no tecido subcutâneo,


progredindo a seguir para pele e fáscia, poupando a musculatura. Essa infecção
geralmente é polimicromicrobiana.

3) Mionecrose (gangrena gasosa). Causada inicialmente pelo


Clostridium perfringens, envolve fáscia e musculatura.

ETIOLOGIA/FISIOPATOLOGIA

Embora estas infecções possam ocorrer em qualquer região anatômica, são


comuns no períneo, originando-se da região perianal, genital ou isquiorretal. Não
se sabe qual o fator desencadeante, mas é necessária haver uma porta de
entrada, que pode ser a própria patogênese do abscesso perianal ou qualquer
procedimento sobre esta região. Há descrição inclusive após ligadura elástica de
hemorróidas. Aproximadamente 75% das infecções necrotizantes provém da
porção distal do trato urinário. Ocorre principalmente em indivíduos obesos,
diabéticos e imunossuprimidos.
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QUADRO CLÍNICO

Nos estágios iniciais os sinais cutâneos são mínimos e desproporcionais em


relação à dor referida pelos pacientes. A seguir, ocorre edema local e finalmente,
aparecem áreas de necrose e crepitação. Esta evolução natural ocorre em poucas
horas e pode culminar em choque séptico, falência de múltiplos órgãos e morte.

Histologicamente ocorre inflamação e necrose que se estendem da


epiderme ao tecido subcutâneo e fascia muscular. Ocorre trombose vascular e
liquefação da gordura. Embora haja presença de gás no tecido subcutâneo, não o
encontramos na pele e musculatura. A gravidade da necrose está relacionada à
extensão da trombose vascular. Esta é a chave do evento patológico à qual está
relacionada a falha da antibioticoterapia e rápida progressão da lesão. Aqueles
pacientes que evoluem rapidamente para a morte têm evidências de coagulação
intravascular disseminada.

CONDUTA DO SERVIÇO

A evolução do quadro é modificada quando o desbridamento cirúrgico


precoce é realizado diante da menor suspeita clínica. Devemos estar atentos aos
seguintes itens do tratamento:

1) Cuidados gerais, hidratação, correção de distúrbios hidroeletrolíticos


e metabólicos são essenciais.

2) Antibioticoterapia que cubra amplamente os possíveis germes


envolvidos. São recomendadas as associações de penicilina cristalina, clindamicina
e aminoglicosídeos; ou cefalosporina de primeira geração, aminoglicosídeos e
metronidazol.

3) Oxigenação hiperbárica: sendo disponível, deverá ser sempre


utilizada, pois vários estudos demonstram a sua contribuição no controle do
quadro.

4) Cirurgia radical: a exploração cirúrgica precoce é essencial e


indispensável, tanto para o tratamento quanto para o estadiamento da lesão.
Deverá ser realizado o desbridamento de todo o tecido comprometido até que não
existam áreas de necrose ou lojas entre o tecido subcutâneo e a fáscia, não se
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deixando impressionar pelo aspecto estético inicial da ferida. Na presença de


mionecrose, a ressecção ampla do tecido necrótico deverá ser realizada.

5) Colostomia. Deverá ser realizada, de forma temporária, quando a


perda de tecidos perianais for extensa ou comprometerem a musculatura
esfincteriana.

6) Seguimento. Novos desbridamentos cirúrgicos, além dos curativos


meticulosos e cuidados freqüentes com a ferida poderão ser necessários. Quando
não houver sinais infecciosos e presença de tecido de granulação, os tecidos
poderão ser aproximados, assim como técnicas plásticas de reconstrução como
enxertos e rotação de retalhos poderão ser utilizados.

A cirurgia agressiva e precoce reduz a taxa de mortalidade para cerca de


10%. Quando realizada tardiamente, a mortalidade chega a 30 – 60% para a
fasciite necrotizante e 80% para a gangrena gasosa.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
1. Finlay IG: Necrotizing infections of the perineum. Clinical decision making in
colorectal surgery. 203-206, 1995.

2. Pizzorno R; Bonini F et al: Hyperbaric oxygen therapy in the treatment of


Fournier’s disease. J Urol; 158(3Pt 1):837-40,1997 Sep.

3. Onaca N; Hirshberg A; Adar R: Early reoperation for perirectal abscess: a


preventable complication. Dis Colon Rectum; 44(10):1469-73,2001 Oct.

4. Ochiai T; Ohta K et al: Fournier’s gangrene report of six cases. Surg


Today;31(6):553-6,2001.

5. Muñoz-Villasmil J; Sands L; Hellinger M: Management of perianal sepsis in


immunosuppressed patients. Am Surg;67(5):484-6,2001.

6. Villanueva-Saenz E; Martinez Hernandez-Magro P et al: Experience in management


of Fournier’s gangrene: Tech Coloproctol;6(1):5-10,2002.
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RESUMO ESQUEMÁTICO DE CONDUTA

Identificação da
lesão

Estabilização
clínica do paciente
+
antibioticoterapia

Exploração
cirúrgica

Câmara hiperbárica

Seguimento Mionecrose Comprometimento


esfincteriano

Considerar Colostomia
desbridamento
agressivo

Considerar reconstrução,
enxertos, retalhos.

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