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editorial

Gláucia Viola, editora

Comportamento alimentar
e seus transtornos

A
alimentação moderna é a principal razão pela qual as pessoas de todo o mundo estão cada vez mais
doentes. Recente matéria publicada na revista Super Interessante mostrou que 80% das doenças de co-
ração, 90% dos casos de diabetes e 70% dos casos de alguns tipos de câncer podem ter uma ligação
estreita com hábitos de vida e alimentares. Pesquisas mundiais atestam que o comer inadequada-
mente é uma das maiores causas de morte, junto com o tabaco.
0ARAA0SICOLOGIA AALIMENTA¥ÎOSEDElNECOMORESPOSTACOMPORTAMENTALINmUENCIADAPORCONDI¥ÜESSOCIAIS
e culturais. Sendo assim, o impacto sociocultural no padrão alimentar e no desenvolvimento de transtornos
alimentares tem sido estudado mais frequentemente, avaliando-se os costumes e re-
LA¥ÜESFAMILIARESEASINFORMA¥ÜESVEICULADASPELOSMEIOSDECOMUNICA¥ÎOEMMASSA
Nota-se, portanto, que o “comer desordenado” tem afetado crianças e adolescen-
TESEMMAIORNÞMEROEINTENSIDADEEGANHAATEN¥ÎODEPESQUISADORESEPROlSSIONAIS
da clínica. Tanto que na versão corrente do DSM-5, o Manual Diagnóstico e Estatístico
de Transtornos Mentais, editado no Brasil em 2014, os transtornos da alimentação (in-
fância) passaram a ser descritos como parte dos transtornos alimentares – anterior-
mente essa nomenclatura era exclusiva para adultos. Antes disso os transtornos da
ALIMENTA¥ÎOEMCRIAN¥ASERAMCONSIDERADOSUMTIPONÎOESPECIlCADODETRANSTORNO 
em separado ao dos adultos.

SHUTTERSTOCK
Esta edição da Psique se debruça sobre os problemas alimentares no artigo de
capa produzido pela psicóloga Flávia Machado Seidinger Leibovitz. Segundo ela
escreve no texto, apesar da complexidade em aferir o aumento da incidência desses
transtornos na infância, é certo que há uma procura maior por tratamento do transtorno de alimentação em
CRIAN¥ASEADOLESCENTES EÏBEMPOSSÓVELQUEHAJASIMUMAUMENTOEMCURSO EQUEIRÉSECOMPLEXIlCAREN-
QUANTOPERDURAREMASDIlCULDADESCOMAOBESIDADEEMNOSSACULTURA
Flávia ainda explica que há que se ter cuidado ao falar sobre transtornos alimentares, pois “paradoxal-
mente, quem recusa o alimento o mantém no comando de sua vida, habitando seu pensamento 24 horas por
dia – inclusive como principal motivo de abandono do tratamento”, principalmente em crianças, para quem a
chancela de um diagnóstico psiquiátrico pode gerar consequências psicossociais, muitas vezes negativas. Por
ESSARAZÎO ALERTAQUECABEAOSPROlSSIONAISDACLÓNICACUIDARDOSEQUÓVOCOSGERADOSACERCADOASSUNTOESEUS
efeitos muitas vezes danosos, zelando por não replicá-los e perpetuá-los.
/FATOÏQUEAINDAHÉMUITOSIMPASSESEDESAlOSPARATRATARTRANSTORNOSALIMENTARESEDEALIMENTA¥ÎO PRIN-
cipalmente no universo infantil, e esperamos que este artigo traga luz a esse debate.

Boa leitura!

Gláucia Viola “O maior pensar da criatura humana é


psique@escala.com.br comer; desde que o homem nasce até que
www.facebook.com/RevistaPsiqueCienciaeVida morre anda a procurar o pão para a boca.”
António Vieira
sumário

CAPA
Transtornos
que preocupam 56
Bulimia, anorexia nervosa,
transtornos alimentares e
DAALIMENTA¥ÎOGANHAM
: SHUT TERSTOCK

CADAVEZMAISESPA¥OEM
PESQUISASCIENTÓlCAS
IMAGEM DA CAPA

01:15:50
21/12/2016

MATÉRIAS

Doença não é mania


24 !mI¥ÎOCOMSIMETRIAOU
simplesmente refazer várias vezes a
MESMAA¥ÎOPODEMSERAPRESEN¥ADO
08 4/# QUEATINGETAMBÏMASCRIAN¥AS

ENTREVISTA O analista
Especialista em Psicologia desceu do salto 70
Financeira, Patrícia Rezende Nova realidade social exige
Chedid Simão alerta para a que a razão na prática
necessidade de um consumo clínica seja exercida
mais consciente COMMAISmEXIBILIDADE
SEÇÕES
05 EM CAMPO Volta por cima
14 IN FOCO
#ASOREALCONlRMAQUEUMADAS
16 SUPERVISÃO
formas de enfrentar adversidades
18 PSICOPOSITIVA
ÏARESILIÐNCIA RESSIGNIlCANDO
20 PSICOPEDAGOGIA
um momento difícil
22 SEXUALIDADE
32 COACHING
76
34 LIVROS
Síndromes e dist

50 CIBERPSICOLOGIA doss

52 NEUROCIÊNCIA DOSSIÊ: Distúrbios genéticos


úrbios genéticos

54 RECURSOS HUMANOS Algumas síndromes raras


64 DIVÃ LITERÁRIO Para o AVANÇO O apresentam características
NSÃ
e a COMPREErom
66 CINEMA es sínd
O debate sobre as ial e escolar,
SEMELHANTES MASAINDA
iente soc
74 PERFIL presentes no amb
em plen o século XXI
de diagnósticos e
, causam dificuldades
entendimento de
tamentos
DESPERTAMESTRANHAMENTO
sintomas e compor
80 EM CONTATO EDESCONHECIMENTOEM
82 PSIQUIATRIA FORENSE PROlSSIONAISDESAÞDEEEDUCA¥ÎO
35 psique ciência&
vida 35
SHUTTERSTOCK

iaevida.com.br 21/12/2016 01:17:41


www.portalcienc
em campo por Jussara Goyano

BIOFEEDBACK CARDÍACO
O treino da coerência cardíaca,
estado que demonstra o equilíbrio do
sistema nervoso autônomo, é uma das
ferramentas cada vez mais usadas no
tratamento coadjuvante de quadros de
ansiedade e depressão. Por meio de um
sensor corporal ligado a um computador,
o indivíduo pode saber, em tempo real,
como está a sua coerência, monitorando
seu comportamento para alcançá-la –
o chamado biofeedback cardíaco. “Por
meio de exercícios de concentração
mental, respiração controlada e uso de
imaginação positiva, podemos atingir
esse estado de equilíbrio, que tem
repercussões imediatas em nossa saúde”,
explica Marco Fabio Coghi, responsável
por tecnologia brasileira de biofeedback.
(Fonte: www.makeitpositivemag.com)

GAMES PAR A PERFOR MANCE


O mercado mundial de serious games deve

MEMÓRIA E FUTURO ultrapassar os US$ 5 bilhões até 2020,


segundo a consultoria norte-americana
Markets and Markets. Trata-se dos
HIPOCAMPO TAMBÉM NOS AJUDA A FAZER PLANOS
JOGOSELETRÙNICOSUTILIZADOSPARAlNS
E MENTALIZAR RESULTADOS educacionais ou para treinamentos
Estudo publicado na revista Cerebral Cortex lança luz sobre como o nosso cérebro corporativos, favorecendo entre seus
IMAGINAOFUTURO IDENTIlCANDOASREGIÜESCEREBRAISRELACIONADASCOMESSAATIVIDADE USUÉRIOSAlXA¥ÎODECONTEÞDOSE
Pesquisadores da Escola de Medicina da Universidade de Boston descobriram que a aquisição de habilidades técnicas
o hipocampo, estrutura fortemente associada a memória e orientação espacial, é e comportamentais. Hora vilões,
também uma área-chave nesse processo. hora mocinhos, os videogames já se
Ainda não se sabe de que maneira ele participa nessa imaginação. Por meio encontram sob o guarda-chuva das
de ressonância magnética funcional, os pesquisadores compararam a atividade ce- chamadas “tecnologia positivas”,
rebral no hipocampo entre participantes do estudo enquanto estes respondiam a apresentando muito mais benefícios do
perguntas relacionadas ao presente ou ao futuro. Depois disso, eles compararam sua que prejuízos em seu uso, tais como o
atividade cerebral enquanto respondiam a perguntas incluindo ou não a projeção de favorecimento de maior conexão social
CENASDEFUTURO#OMORESULTADO VERIlCARAMINTENSAATIVIDADENESSAÉREADOCÏREBRO entre os jogadores e ganhos cognitivos
quando as projeções eram necessárias. e motores, em detrimento de potencial
O hipocampo é afetado por muitas condições neurológicas e doenças e também adiccção, estímulo à violência e ao
pode ser comprometido durante o envelhecimento. Por outro lado, sabe-se que exer- isolamento social entre jogadores.
cícios físicos aumentam o nosso hipocampo, ao mesmo tempo que têm implicações (Fonte: www.makeitpositivemag.com)
sobre quadros de depressão e ansiedade. Sabe-se, ainda, que pessoas deprimidas têm
DIlCULDADEDEIMAGINAROFUTURO!NOVADESCOBERTAPODEDIRECIONARESTUDOSRELACIO-
nando exercícios, capacidade projetiva e transtornos de humor, colocando, talvez, o
hipocampo no centro de novas terapêuticas no tratamento da depressão.

PARA SABER MAIS:


D. J. Palombo, S. M. Hayes, K. M. Peterson, M. M. Keane, and M. Verfaellie. Medial
IMAGENS: 123RF

temporal lobe contributions to episodic future thinking: scene construction or futu-


re projection? Cerebral Cortex, December 2016.

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em campo

CORPO E MENTE
CORRER MELHORA A
CONECTIVIDADE CEREBRAL
A conexão entre regiões cerebrais distintas é importante
para funções cognitivas como planejamento, tomada de decisão
e capacidade de mudar o foco de atenção entre tarefas. Achados
CIENTÓlCOSPUBLICADOSNAREVISTAFrontiers in Human Neuroscience
demonstram que essa conectividade é maior no cérebro de cor-
redores em comparação à de indivíduos mais sedentários.
Para chegar a essa conclusão, pesquisadores da Universi-
dade do Arizona compararam exames cerebrais de corredores
adultos jovens com os de adultos jovens que não praticavam ati-
vidade física regular. Os participantes do estudo tinham apro-
ximadamente a mesma idade – de 18 a 25 anos – com índice de

FUNÇÃO SOCIAL massa corporal e níveis educacionais comparáveis. Os exames


mediram a conectividade funcional do estado de repouso des-
ses jovens, ou o que se passava no cérebro enquanto os partici-
ESTUDO RELACIONA OCITOCINA
pantes estão acordados.
E CAPACIDADE HUMANA Embora pesquisas adicionais sejam necessárias para deter-
DE SINCRONIA RÍTMICA E minar se essas diferenças físicas na conectividade cerebral re-
INTEGRAÇÃO COM O OUTRO sultam em diferenças no funcionamento cognitivo, os achados
atuais ajudam a estabelecer as bases para que os pesquisadores
Durante um concerto, ao bater palmas junto com a me- possam entender melhor como o exercício afeta o cérebro, par-
lodia, as pessoas com níveis mais elevados de ocitocina po- ticularmente em adultos jovens.
dem aparentar maior sincronia umas com as outras do que
aquelas com níveis mais baixos do hormônio. A descoberta PARA SABER MAIS:
foi publicada no periódico 3CIENTIlC2EPORTS após a observa- David A. Raichlen, Pradyumna K. Bharadwaj, Megan C. Fitzhugh,
ção do comportamento de voluntários sob uma relação líder- Kari A. Haws, Gabrielle-Ann Torre, Theodore P. Trouard, Gene
-seguidor e o comando de batidas ao som de alguma música. E. Alexander. Differences in resting state functional connectivity
Sabe-se que a capacidade de sincronizar movimentos e between young adult endurance athletes and healthy controls.
sons corporais com uma batida musical é uma habilidade &RONTIERSIN(UMAN.EUROSCIENCE, n. 10, 2016.
humana. Sabe-se, ainda, que quando as pessoas sincronizam
seus movimentos, caminhando, batendo palmas ou fazendo
música, elas relatam gostar mais umas das outras. Outra in-
formação é que a ocitocina tem demonstrado promover in-
TERA¥ÎOSOCIAL COMOCOOPERA¥ÎOEAlLIA¥ÎO.ESSESENTIDO A
pesquisa realizada contribui para a compreensão de como o
comportamento de sincronia musical humana é afetado por
fatores sociobiológicos, como a ocitocina e as relações líder-
-seguidor. Ele também destaca como a música cria e mantém
a coesão social numa perspectiva evolutiva.
.OENTANTO NESSEESTUDO NÎOlCOUCLAROSEOEFEITOSOCIAL
IMAGENS: 123RF

da ocitocina é direto, ou se ela afeta a sincronização ou ape-


nas comportamentos sociais secundários.

PARA SABER MAIS:


L. Gebauer, M. A. G. Witek, N. C. Hansen, J. Thomas, I. Jussara Goyano é jornalista. Estuda Medicina
ARQUIVO PESSOAL

Konvalinka, P. Vuust. Oxytocin improves synchronisation in leader- Comportamental com foco em resiliência, bem-estar
e performance. É coach certificada pelo Instituto de
follower interaction. 3CIENTIlC 2EPORTS  N   ART   
Psicologia Positiva e Comportamento.

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giro escala

A QUESTÃO DO DISCURSO
REVISTA FILOSOFIA - EDIÇÃO 123
ENTREVISTA RENATO JANINE RIBEIRO
Sidnei de Oliveira fala sobre a simbiose Se o Brasil está no fundo do poço,
entre Filosofia e Música em sua pesquisa como tirá-lo de lá?
ANO IX No 123 – www.portalcienciaevida.com.br

A proposta do trabalho publicada oral, os discursos e f ilme alemão


na edição 123 da revista Filosof ia, as técnicas de de- PENSAMENTO
SISTÊMICO
A Onda (Die
pautada em três etapas distintas, é a clamação poética uma nova forma de
entender o mundo Welle), lançado
de apresentar ao leitor algumas no- constituíam formas FORMAÇÃO
DA RALÉ no Brasil em
O crescimento dos

ções básicas e conceitos da Filosof ia. de exercício de po- discursos de ódio, em


HANNAH ARENDT
2009, com di-
Apesar de abordar no ensaio assun- der, sendo essa uma reção de Den-
tos e contextos tão diversos entre si de suas principais OPRESSÃO PELO nis Gansel. A
– a poesia na Antiguidade, o empi- características. MASCULINO produção atua
Como o papel das mulheres
é subjugado na construção
rismo moderno e a discussão sobre Na etapa II, veri- do conhecimento como recurso

EDIÇÃO 123 - PREÇO R$ 12,90


política nos dias de hoje –, o autor f ica-se facilmente o artístico para
buscou uma consonância entre es- conceito de ideia em e prá
Como
ão
Reflextica 112

canaliz
e educação:
Cinema
ditatorial

Imagenco
filosófi
Mitologia
ar paixões
a experiência

em sala

s no texto
de um

de aula

e a verdade
grega,
Platão
como
regime
ENCA
RTE
DO
PROFE
SSOR

proble m at i z a r
não esquecimento

sas três abordagens no que se refere John Locke (1632- Tiago


Brentam

Carolina
de Carolina
Com curadoria Perencini

Desoti
Desoti
Fernandes

A
GRADUADAEM&ILOSOlA 
FernandesÏ
e

UISAAINmUÐNCIAAFRICANAN

REDATORAEPRODUTORACULTU
Tiago
Brentam
LTURALBRASILEIRA¡EDITORA 
PELA05# #AMPINAS0ESQ RAL
FORMA¥ÎODAIDENTIDADECU ÏLICENCIADOEBACHARELEM
PerenciniNODE&ILOSOlAPELA5NESP

&ILOSOlA-ESTREEM%NSI
PROFESSORDE&ILOSOlA#ON
*OÎO0AULO))DE-ARÓLIA
TEMPORÊNEANA&ACULDADE
E

REFLEXÃO E PRÁTICA: Imagens como mediadoras do discurso
os conceitos
principalmente à questão do discurso 1704) – enquanto de autocracia e
e da defesa de argumentos. Na etapa objeto da mente, originado a partir retórica. Nesse f ilme, o discurso retó-
I, há a retomada dos gregos antigos da experiência sensível. A palavra é rico é tomado como um veículo para
no que se refere à noção de Alétheia um componente fundamental para difundir e defender ideias e posições
e a credibilidade do discurso poético a manifestação das ideias – simples políticas (no caso, a autocracia) e, da
– palavra sagrada e acreditada. Na- e complexas. Na etapa III, a propos- mesma forma que o exemplo grego,
quela sociedade, fundamentalmente ta do texto é de uma apreciação do também promove um encantamento.

UMA PERSONALIDADE LIBERTÁRIA


REVISTA SOCIOLOGIA - EDIÇÃO 67

A norte-americana Angela XX, também com atuação marcan- a uma geração em que a luta políti-
Davis é considerada uma das perso- te neste século. Pós-doutoranda ca foi uma arena fundamental para
nalidades mais libertárias do século em Ciências da Comunicação pela a mudança do mundo. E isso nos
ECA-USP, professora do Centro de anos 60, um cenário que se consti-
Em Sala de Aula: Qualidade da educação rural na pauta do MST
Estudos Latino-Americanos sobre tuiu numa década importante para
Cultura e Comunicação da USP, in- a transformação social. Rosane re-
www.portalcienciaevida.com.br
tegrante da Cojira-SP (Comissão de lembra que a carreira política de
Jornalistas pela Igualdade Racial), Angela ganha visibilidade mun-
Qual a sua
autora e organizadora de diversos dial na década de 1970, quando ela
desculpa?
O ato de
desculpar-se livros, entre eles Espelho Infiel: o foi presa pela acusação grave de
na mira
de estudos
sociológicos Negro no Jornalismo Brasileiro, Mídia conspiração, sequestro e homicí-
Primavera
das Mulheres
Temas como
e Racismo, Rosane Borges escreveu dio. Tornou-se, por isso, a terceira
a orelha do livro Mulheres, Raça e mulher a integrar a Lista dos Dez
assédio e
aborto
reacendem

O OUTRO Classe, da ativista norte-americana, Fugitivos Mais Procurados do FBI.


o ativismo
feminino

Os contornos
da direita
lançado no Brasil. Uma personagem fascinante que a
Como PFL
e DEM
delinearam o
COMO Angela Davis é mulher, negra, faz absolutamente comprometida
INIMIGO
atual cenário
da política
conservadora
brasileira
O medo transformou
comunista e feminista, um conjun- com a mudança social, a partir de
as relações sociais
to de características que sinaliza ref lexão e da prática. A entrevis-
A verdadeira
identidade
da “piriguete” e as configurações
Feminilidade e urbanas, confinando a
comportamento
sexual população entre muros para um ativismo considerado pe- ta completa concedida por Rosane
exagerados
reforçam
hegemonia
rigoso para o establishment. Rosane Borges pode ser conferida na edi-
masculina

ressalta que Angela Davis pertence ção 67 da revista Sociologia.


ROSANE BORGES ANALISA TRAJETÓRIA DE ANGELA DAVIS NA LUTA CONTRA O RACISMO

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PATRÍCIA DE REZENDE CHEDID SIMÃO

NEM TODOS TÊM


FACILIDADE DE
AUTOCONTROLE
FINANCEIRO
Segundo Patrícia Simão, o comprador compulsivo se classifica
dentro do quadro de transtornos do impulso e adota um
comportamento repetitivo, no caso o ato de comprar; sempre
levado por um impulso, decidido pela emoção
Por Lucas Vasques

E
quilibrar o orçamento e manter uma COLOGIA %LA RESSALTA QUE O DESCONTROLE lNANCEIRO
VIDA lNANCEIRA CONTROLADA SÎO DESAlOS pode ser originário de um problema emocional, que
difíceis de enfrentar, principalmente em deve ser tratado. Mas faz uma ressalva: “Para ser
momentos de crise econômica, como a considerado um problema de ordem emocional é
atual fase do Brasil. Há indivíduos perdulários, mas necessário que seja tomado por um impulso, tenha
que conseguem, aos poucos, alterar seus hábitos e certa frequência na vida do indivíduo e causado
adequar seu padrão de vida à própria realidade. PREJUÓZOSNÎOAPENASDEORDEMlNANCEIRA-ASSEÏ
Entretanto, existem situações em que a pessoa é UMFATOISOLADO UMAESCOLHA ÏDELICADOAlRMARSER
tomada por um sentimento incontrolável de gastar um problema emocional”.
mais do que o bolso comporta. Nesses casos, a Psi- Patrícia é graduada em Psicologia, pós-graduada
cologia Financeira pode ser uma importante aliada em Psicopedagogia, tem formação em Terapia Com-
para auxiliar quem sofre de alguns transtornos re- portamental e Cognitiva, com extensão em Psico-
lacionados ao problema. logia Econômica, Educação Financeira, Mercado
Especialista na área, a psicóloga Patrícia de Re- Financeiro e Mercado de Ações, além de ser capa-
zende Chedid Simão destaca que, apesar de ser um citada como mediadora e conciliadora judicial. Atua
campo de estudo relativamente novo, vem ganhan- na área clínica desde 1996 como psicóloga e profes-
do espaço e importância no amplo espectro da Psi- sora em Orientação do Comportamento Financeiro.

Lucas Vasques é jornalista e escreve nesta publicação.

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E N T R E V I S T A

Para Patrícia Simão, o


papel da Psicologia
é importante, pois

IG‚GI G
é uma aprendizagem,
como qualquer outra,
e envolve aspectos
objetivos e subjetivos
CRÉDITO DA FOTO: DIVULGAÇÃO

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EXISTEM DIFERENÇAS ENTRE PSICOLOGIA A Psicologia Financeira todo o contexto da história que levou o
F INANCEIRA E PSICOLOGIA ECONÔMICA? indivíduo a esse comportamento. Nesse
QUAIS SÃO? diz respeito à caso isolado entendo mais como uma
PATRÍCIA: Se formos fazer essa compa- forma de compensação.
ração levando em conta a nomenclatu- administração de recursos,
RA  EM UM PRIMEIRO MOMENTO lCA CLARA
uma diferença. Enquanto a Psicologia
desde individuais a COMO A PSICOLOGIA FINANCEIRA
FICA UMA PESSOA QUE TEM DIFICULDADES
IDENTI-

Financeira diz respeito à administração pequenos grupos e de NO ORÇAMENTO DAQUELA QUE POSSUI UM
de recursos, desde individuais a peque- TRANSTORNO?
nos grupos e de uma sociedade como uma sociedade como um PATRÍCIA: !DIlCULDADEÏESPERADAQUAN-
um todo, já a Econômica, por sua vez, é do não se tem conhecimento do assun-
a ciência que estuda a atividade econômi- todo, já a Econômica, to, familiaridade, falta experiência. O
ca no âmbito social. O comum entre elas
é que as duas se utilizam da Psicologia,
por sua vez, é a transtorno tem dois aspectos: já se tem
conhecimento. Em alguns casos se inicia
que, por sua vez, é a ciência que estuda o ciência que estuda a a prática, mas não existe sustentação da
comportamento. Já em termos de como mesma; e quase sempre vem associado a
CADA UMA TRABALHA  NÎO TERIA DElNI¥ÎO  atividade econômica no algum tipo de prejuízo.
até porque Psicologia Financeira é um
termo que vem sendo utilizado pela mí- âmbito social QUANDO E POR QUE A PESSOA PRECISA DE
dia e a cada dia surgem novos nomes e UM TRATAMENTO PSICOLÓGICO?
trabalhos propostos por diferentes linhas ordem emocional é necessário que seja PATRÍCIA: E importante avaliar o contexto
da Psicologia. Como disse, isso é um pro- tomado por um impulso, tenha certa em que a queixa se apresenta. Alguns pon-
cesso que vem crescendo. Já a Psicologia frequência na vida dele e tenha causado tos devem ser observados: a queixa trazida
Econômica tem na Vera Rita de Melo PREJUÓZOSNÎOAPENASDEORDEMlNANCEI- é uma constante na vida do indivíduo; já
Ferreira, psicanalista de formação, seu ra. Mas se é um fato isolado, uma esco- fez tentativas de mudar e não conseguiu;
maior nome para essa proposta. Fui alu- LHA ÏDELICADOAlRMARSERUMPROBLEMA as pessoas o alertam para isso; sempre
na de sua primeira turma e, sem sombra emocional. Pelo contrário, às vezes se BUSCAJUSTIlCATIVASOUEVITAFALARSOBRESUAS
de dúvida, muitos estudos e informações faz até necessário. Por exemplo: quando CONDUTAS lNANCEIRAS O COMPORTAMENTO
que temos hoje no Brasil, nesse campo, A DOR OU O CONmITO SÎO MUITO GRANDES  em questão já lhe causou problemas, não
devemos a ela. Psicologia Econômica é necessitamos da famosa “válvula de APENAS NO CAMPO lNANCEIRO COMO TAM-
um estudo que surgiu na Europa. Tam- escape”. Melhor que seja no cartão de BÏMPESSOAL PROlSSIONALEAFETIVOSEXUAL
bém se falou muito de economistas com- CRÏDITODOQUElCARDOENTE BATEROCAR- avaliar a saúde. Em determinadas situ-
portamentais e sua proposta está em ro, fumar ou beber. Foi um descontrole, A¥ÜES ESSAS CONDUTAS lNANCEIRAS GERAM
trazer a Psicanálise como contribuição à sem dúvida, mas é importante entender problemas de saúde física e emocional.
%CONOMIA *É OUTROS PROlSSIONAIS SEGUI-
ram a linha da terapia comportamental
cognitiva, na qual eu me enquadro, ape-
sar de nunca descartar ideias de autores
DAS DEMAIS LINHAS !lNAL  Ï TUDO MUITO
novo e acredito que qualquer informação
que possa ajudar deve ser compartilhada.
Devemos ter o cuidado em não dividir a
0SICOLOGIA COMO lZERAM NA POLÓTICA /
que está em jogo aqui é a salubridade de
uma nação.
A matemática da educação
DESCONTROLE FINANCEIRO É UM PROBLE - ‚GI G\` IGdG G
MA EMOCIONAL? e gastar menos do que
G G:$I G G
PATRÍCIA: Depende. Precisamos entender
IMAGEM: 123RF

Ï

o que levou o indivíduo a esse descontro- desprendidos de emoções
le. Para ser considerado um problema de

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EXISTE UM PERFIL PSICOLÓGICO PADRÃO EN- serem cortados, diminuídos. Não há mui- sensação de inutilidade; perda do prazer
TRE OS COMPRADORES COMPULSIVOS? to como fugir dessa regra. Isso, no entan- SEXUALDIlCULDADEEMEXECUTARATÏMES-
PATRÍCIA: Segundo alguns estudos den- to, se torna difícil para muitos, porque o mo tarefas cotidianas. A apresentação
tro da terapia comportamental cognitiva, simples fato de olhar o orçamento nos faz de três ou mais desses sintomas merece
citando Range (1995), o comprador com- deparar com uma realidade de momento tratamento em psicoterapia, associado ou
PULSIVO SE CLASSIlCA DENTRO DO QUADRO DE angustiante, no que se diz respeito à ques- não de medicação, dependendo do grau.
transtornos do impulso, e isso nos leva à TÎO lNANCEIRA ECONÙMICA $E REPENTE  O
observação de algumas condutas comuns, dinheiro acabou, e agora? Minha resposta EM TEMPOS DE CRISE, COMO A QUE O PAÍS
entre elas comportamento repetitivo, nesse para isso é: ótimo! Quem sabe não seja o ESTÁ VIVENDO, É CORRETO AFIRMAR QUE
caso o ato de comprar; sempre levado por momento de pensar em outras condutas, HÁ UM AUMENTO CONSIDERÁVEL NOS CASOS
um impulso, sem planejamento; a compra valores, para que se tome conhecimento de DE DEPRESSÃO E ESTRESSE RELACIONADOS
é decidida pela emoção, ausência da razão. nossas aptidões, trabalhar internamente. AO ASSUNTO DINHEIRO?
PATRÍCIA: Foram desenvolvidos vários tra-
COMO DEFINE O COMPORTAMENTO ECONÔ- 0ARAMELHORElCÉCIA  balhos e pesquisas sobre isso. O Serviço
MICO DO BRASILEIRO? de Proteção ao Crédito (SPC Brasil), em
PATRÍCIA: Sendo bem objetiva, vejo que a Psicologia Financeira 2015, publicou um artigo sobre essa ques-
estamos caminhando para uma socieda- tão, apontando, inclusive, a porcentagem
de neurótica. Falo mais precisamente da tem muitas maneiras para cada alteração de humor observa-
neurose do fracasso, pois foi engolida por
um poder representado, em sua maior par-
de comparecer, desde da. Recomendo a leitura, disponível em
https://www.spcbrasil.org.br/uploads/st_im-
te, por indivíduos perversos. Citando La palestras informativas, prensa/release_sentimentos.pdf
Planche e Pontails, entende-se neurose do
fracasso, segundo estudos de René Laufor- grupos de apoio PODEMOS CLASSIFICAR A CORRUPÇÃO COMO
gue, como sendo “um grupo de todas as UMA ESPÉCIE DE TRANSTORNO, JÁ QUE ELA SE
ESPÏCIESDESÓNDROMESDOFRACASSOIDENTIl- emocional e orientação CARACTERIZA PELA BUSCA EXACERBADA DE
cáveis na vida afetiva e social, no indivíduo
ou num grupo social....”. Já Freud refere-se
lNANCEIRAE EMALGUNS PODER E DINHEIRO?
PATRÍCIA: Primeiro é importante enten-
a certos tipos de fracasso neurótico à com- casos, os tratamentos der o que é corrupção, ou seja, o ato de
pulsão, à repetição, o que ele chama de subornar alguém, dando dinheiro ou até
compulsões de destino (1920). Já o conceito em consultório com as mesmo presentes, na tentativa de atingir
de perversão, trago não apenas no concei- benefícios por interesse próprio, desrespei-
to da Psicanálise, mas, sim, mais amplo. É sessões de psicoterapia tando regras e leis. Nesse sentido, a prática
perverso o indivíduo que trapaceia, rouba, desse ato é até comum. Agora, indivíduos
manipula, visando usar o dinheiro de ter- QUAIS OS IMPACTOS EMOCIONAIS PROVOCA- que usam desse método como um meio de
ceiros para seu próprio benefício. Desres- DOS PELA CRISE FINANCEIRA? vida, compulsivamente, pode sugerir que
peita regras e leis sem o menor sentimento PATRÍCIA: Certa preocupação e medo estamos diante de algum tipo de trans-
de culpa. Enriquecimentos nesses casos DIANTE DE UMA CRISE lNANCEIRA SÎO ATITU- torno de personalidade. Alguns autores
são ilícitos. Suas relações são basicamente des normais e esperadas. O contrário não DEFENDEM QUE O CORRUPTO ESTARIA CLASSIl-
sadomasoquistas, em que atingem o pra- SERIA AlNALOCENÉRIOECONÙMICOMUDOU cado em alguns deles. Fácil entender essa
zer com o sofrimento de outros. Necessita- e existe a necessidade de readequar o or- conclusão se você ler um pouco sobre as
mos urgentemente tratar dessas neuroses, çamento e, em determinadas situações, características deles. Vou apresentar a des-
porque somente uma sociedade sã é capaz até mesmo buscar uma terceira fonte de crição de dois tipos de transtorno, que, de-
de controlar a perversão. renda para cobrir os gastos. No entanto, vido às suas características, levariam a essa
Ï PRECISO lCAR ATENTO  POIS DEPRESSÎO E conduta mais facilmente, sem nenhuma
EM MOMENTOS DE CRISE NO PAÍS , COMO transtornos de ansiedade podem apare- culpa. Para isso, cito Bernard Rangé, da
ADOTAR UM COMPORTAMENTO ECONÔ - cer, no caso de indivíduos que já possuam terapia comportamental cognitiva. Um é o
MICO ADEQUADO PRA EVITAR PROBLEMAS essa predisposição. Alguns sintomas da transtorno narcísico, cuja crença principal
FUTUROS? depressão: tristeza, acompanhada de sen- é o indivíduo acreditar que está acima das
PATRÍCIA: Nesse caso a lição de casa é bem timentos de culpa e vergonha; crises de regras e merece atenção especial, e, assim,
objetiva, concreta, direto no orçamento. CHOROSENSA¥ÎODEFRACASSODIlCULDADES ele transcende regras, é extremamen-
Rever o orçamento, os gastos possíveis de de concentração; irritabilidade; insônia; te competitivo, usando dos outros para

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benef ício próprio e se autoengrandecer. Primeiro é importante AS CRIANÇAS SÃO BEM VULNERÁVEIS ÀS
A visão que faz dos outros é que são infe- OFERTAS DO CONSUMO. COMO OS PAIS PO -
riores e devem ser seus admiradores, e ele, entender o que é DEM CONDUZIR UMA EDUCAÇÃO FINANCEI-
sim, é especial, único e superior. O segun- RA SAUDÁVEL PARA SEUS FILHOS?
do é o transtorno antissocial, cuja crença corrupção. Indivíduos PATRÍCIA: Com crianças, o trabalho é pre-
principal é a de que regras não são para ele
e o negócio é levar vantagem em tudo e,
que usam desse método ventivo, uma vez que, segundo alguns au-
tores, a personalidade já está formada aos
assim, ele engana, manipula, ataca e rouba, como um meio de vida, 4-5 anos, e, de fato, nessa fase você conse-
enxergando os outros como otários, vul- gue observar comportamentos no brincar
neráveis e exploráveis. Ele é forte, esperto, compulsivamente, pode da criança, que sugerem suas tendências
autônomo, não precisa de ninguém. Den- lNANCEIRAS%UCOSTUMODIZERQUEOBRIN-
TRODESSEQUADROlCAFÉCILENTENDERPORQUE sugerir que estamos quedo é o dinheiro da criança, enquanto
alguns autores de saúde levam a esse diag-
nóstico. No entanto, eu já iria por outro
diante de algum que para o adulto, dinheiro é brinquedo.
Os pais precisam se dar conta do quanto
viés. Vejo a corrupção, antes de mais nada, tipo de transtorno de é poderosa essa ferramenta na educação.
como uma falha de educação, e o indiví- Cabe aqui uma citação de Winnicott:
duo corrupto é resultado de um somatório personalidade “A criança joga (brinca) para expressar
de atos que poderiam ter sido corrigidos e agressão, adquirir experiência, controlar
não foram, levando-o, digamos assim, ao estado patológico, uma vez que ele se ca- ansiedades, estabelecer contatos sociais
vício da corrupção. Uma vez instalado só racteriza pelo aparecimento de alegria, como integração da personalidade e por
existe uma maneira de controlar: a reedu- otimismo e ânimo, mas que não corres- prazer”. O que eu teria a dizer para os pais
cação. E, aí, nós temos de recorrer a uma ponde à realidade da vida da pessoa que Ï BRINQUEM COM SEUS lLHOS  ENQUANTO
linha da Psicologia que, a meu ver, nesse diz experimentá-los”. Portanto, voltamos ainda é tempo. Se ele for um pré-adoles-
caso a mais recomendada seria a Experi- aí outra vez à questão do princípio do cente, jogue, não espere o dinheiro entrar
mental, que propõe a extinção de compor- prazer como fuga da realidade. A lição no mundo dele, o que hoje acontece cedo,
tamentos prejudiciais por meio da punição de casa nessas situações é muito simples. a partir do momento que ele já entende a
e a aprendizagem de novas condutas, atra- Primeiro, quando estiver eufórico evi- existência do mesmo e sabe fazer contas.
VÏSDEESTÓMULOSEREFOR¥OSPOSITIVOS% l- te as compras. Fale, converse, caminhe, Mas não abandonem a brincadeira, que é,
nalizando no caso da corrupção sistêmica, movimente-se, como uma forma de ca- no meu ponto de vista, a melhor maneira
eu entendo que a prisão, por si só, não leva- nalizar essa energia por outro caminho de ensinar e educar. O jogo permite ensi-
rá a resultado nenhum. E esses indivíduos, QUENÎOVÉLESÉ LOlNANCEIRAMENTE nar a criança que regras existem e devem
mais cedo ou mais tarde, vão comprar a ser respeitadas, saber ganhar e perder e
sua liberdade. A punição deve ser feita no DENTRO DESSE CENÁRIO, O BRASILEIRO ter a merecida punição se houver tenta-
ponto mais vulnerável, nesse caso o bolso. NÃO TEM O HÁBITO DO PLANEJAMENTO. tiva de trapaça. No jogo, na brincadeira,
Corrupto tem que pagar com dinheiro e QUAIS ELEMENTOS A PSICOLOGIA F INAN- VOCÐEDUCASEUlLHOASERUMHOMEMME-
com trabalho que exija muita disciplina. CEIRA TRAZ PARA PROPORCIONAR UMA POS - lhor. Por isso, se ele ganhar vibre com ele,
Como eu disse, esses indivíduos devem ser SÍVEL MUDANÇA DESSE HÁBITO? mas se ele perder deixe que chore, deixe
reeducados. E é claro que uma avaliação PATRÍCIA: Então, vamos entender essa que sofra, não lhe tire essa oportunidade
de ordem neurológica também, no caso de mudança de hábitos como uma aprendi- de aprender com a dor, porque a vida é
transtornos mais severos. zagem, e nesse caso é mais fácil adqui- assim e dessa forma você estará preparan-
rir novos hábitos que tenham reforços DOSEUlLHOPARAUMMUNDODEVERDADE 
NAS DATAS COMEMORATIVAS, COMO NATAL, POSITIVOS ! PRIMEIRA COISA A IDENTIlCAR onde temos de ganhar, sem dúvida, mas
DIA DAS CRIANÇAS E DAS MÃES, HÁ CER- é se ocorre motivação interna para essa não vamos morrer se perdermos.
TA EUFORIA EM RELAÇÃO ÀS COMPRAS DE mudança e quais seriam elas. Depois, re-
PRESENTES. QUAIS OS PRINCIPAIS CUIDADOS gistrar os ganhos que a pessoa possa ter POR QUE AS PESSOAS SE DEIXAM LEVAR PE-
PRECONIZADOS PELA PSICOLOGIA FINANCEI- COMNOVOSHÉBITOS% lNALMENTE TRA¥AR LAS EMOÇÕES NA HORA DE COMPRAR OU
RA QUE O CONSUMIDOR DEVE TER PARA NÃO estratégias e caminhos que levem a isso. INVESTIR SEU DINHEIRO?
DAR O PASSO MAIOR QUE A PERNA? .ESSE CASO SØ SABEREMOS COMO DElNI- PATRÍCIA: Importante essa sua pergunta.
PATRÍCIA: Você usou o termo correto: eu- -las com o paciente em sessão. Mesmo E eu, entendendo isso e vendo o quan-
FORIA6OUDElNIRTRAZENDOOMAISANTIGO porque temos de observar as respostas e to o trabalho em clínica pode ser longo
dos livros, o dicionário: “A euforia é um irmos adaptando às ferramentas. e para algumas situações não podemos

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esperar tanto tempo, fui buscar ferra-
mentas para ajudar nessa questão. Isso
foi em 2009, quando outro campo do
saber também vinha ganhando terre-
no, a Educação Financeira. Observei,
então, dois pontos nesses cursos: a pre-
ocupação com questões relacionadas a
endividamento, consumismo, e o sonho
da aposentadoria, passíveis de serem
entendidos em nível racional, uma vez
que são objetivos, e não estão errados. Já
para o entendimento da Psicologia, isso
é somente a ponta do iceberg, o sintoma.
/ CONmITO Ï QUE NOS INTERESSA 1UANDO
FALAMOSEMlNAN¥AS AQUESTÎOEMJOGO
é mais subjetiva do que parece. Para isso,
busquei também a psicopedagogia, dis-
ciplina que visa justamente trabalhar as
DIlCULDADESDEAPRENDIZAGEM!MELHOR
resposta que encontrei para isso está As crianças são mais vulneráveis aos apelos do consumismo e, por isso, os pais devem ter uma
em Alicia Fernandez, 1991, em seu livro IGhÔ GH
IGhÔ‚GI G
Inteligência Aprisionada %LA AlRMA QUE
aprendizagem é sempre singular, especí- Vejo que estamos rônea que associa dinheiro ao sucesso, le-
lCA$IZOQUANTOÏIMPORTANTEENTENDER vando um dos parceiros, ou até mesmo os
a forma que cada um tem e ainda reforça caminhando para uma dois, à sensação de fracasso no casamento
que a modalidade de aprendizagem asse- QUANDO HÉ UMA CRISE lNANCEIRA .O EN-
melha-se à modalidade sexual, e até com sociedade neurótica. tanto, pelo contrário, muito dinheiro tam-
a forma de relação que o sujeito estabe-
lece com o dinheiro. Esse meu estudo foi
Falo mais precisamente BÏM PODE SER UMA FORMA DE CAMUmAR A
falência do casal. Nesse momento, os dois
o trabalho de conclusão de curso, publi- da neurose do fracasso, devem sentar e conversar muito. A con-
cado com o tema “A aprendizagem em versa sempre foi e será o melhor caminho,
Educação Financeira: diagnóstico, pre- pois foi engolida por um ajudar um ao outro, dividir suas ideias,
venção e intervenção psicopedagógica”. MEDOSECONmITOS/SEUPARCEIROA TEM
Quem se interessar, encontra-se disponí- poder representado, em que saber o que se passa na sua cabeça
vel no endereço HTTPWWWPSICOLOGIAl-
NANCEIRACOMBRPSIDOWNLOADSMONOGRAlA?
sua maior parte, por para ambos poderem juntos desvendar o
que, de fato, é real, o que é fantasia e que
APRENDIZAGEM?EM?EDUCACAO? lNANCEIRAPDF indivíduos perversos medidas devem ser tomadas.

QUAIS OS PRINCIPAIS ERROS QUE OS INVES- UM TRATAMENTO COM BASE NA PSICOLO - QUAIS SERIAM OS CONSELHOS QUE DARIA
TIDORES COMETEM EM RELAÇÃO ÀS QUES- GIA F INANCEIRA PODE SER UMA ALTERNA- AO LEITOR EM RELAÇÃO A COMO LIDAR
TÕES EMOCIONAIS? TIVA PARA CASAIS EM CRISE NO RELACIO - COM O DINHEIRO?
PATRÍCIA: São as famosas atitudes im- NAMENTO POR RAZÕES FINANCEIRAS? DE PATRÍCIA: %STÉEMCRISElNANCEIRA%N-
pulsivas. Investidores que cometem esse QUE MANEIRA? tão, primeiro, comece revendo seus
tipo de erro se enquadram no mesmo PATRÍCIA: Sim, mas temos de levar em valores. Segundo, veja suas aptidões e
PERlLQUECOMPRADORESCOMPULSIVOS SØ conta os valores, conceitos e pré-concei- o que, de fato, o faz feliz, e, terceiro,
que nesse caso o objeto dele é o merca- tos de cada um dos parceiros. Ainda vive- levante seus recursos internos e trans-
DO lNANCEIRO /S ESQUEMAS COGNITIVOS mos numa cultura em que a cobrança de forme o que você tem de melhor em
são os mesmos. A decisão pelos investi- papéis é muito grande, principalmente no algum produto ou serviço que possa
IMAGEM: SHUTTERSTOCK

mentos, às vezes, é tomada pela oferta, QUE DIZ RESPEITO Ì lGURA MASCULINA  QUE vir, de alguma maneira, a ser compar-
pelo modismo e é imediata, sem plane- tem de ser o provedor. Além disso, ainda TILHADO %  lNALIZANDO  DESENVOLVA SUA
jamento algum. pecamos muito em cima de uma ideia er- capacidade de amar.

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in foco por Michele Müller

MENTE presente
ESTAR NO MOMENTO DE AGORA PERMITE DESLIGAR
A CAPACIDADE CEREBRAL DE ALERTAR PARA
AS POSSIBILIDADES QUE PODEM ESTAR NOS AGUARDANDO

A
observação atenta pode ser forma. Persegui-lo é como perseguir um “A iluminação parte de processos mui-
entendida como a capaci- fantasma, um que constantemente nos TOSSIMPLESv ENSINAOlLØSOFOAUSTRÓACO
dade de estar presente. A escapa e quanto mais corremos para Rudolf Steiner em A Iniciação, em que
presença, em sua aparente alcançá-lo, mais rapidamente ele foge. É apresenta formas de desenvolver a ha-
simplicidade, guarda algo impalpável por isso que a civilização corre apressa- bilidade de se conectar ao que chama
e abstrato que perseguimos com fre- da, raramente valoriza aquilo que tem de “mistérios superiores da existência”
quência nos lugares errados: “felicida- e está sempre querendo mais e mais. A n O QUE SØ Ï POSSÓVEL POR MEIO DE UM
DE Ï ESTAR NO PRESENTEv  COMO DElNIU felicidade, então, consiste não em rea- processo meditativo, um conceito que
OlLØSOFO!LAN7ATTS UMDOSGRANDES LIDADESSØLIDAS MASEMALGOABSTRATOE na época ainda era considerado parte
difusores do pensamento asiático no SUPERlCIAL COMOPROMESSASEEXPECTA- de um campo do ocultismo, restrito
mundo ocidental. Estar presente é o tivas”, conclui Watts. a poucos. Steiner derruba essa ideia,
requisito para perceber a vida de forma Sem conseguirmos nos livrar, ao mostrando que o treino da atenção ple-
plena e deixar-se maravilhar por ela. menos de vez em quando, da angústia na – ou “iluminação”, como aborda – é
“Como o que sabemos do futuro é DE SERMOS COMANDADOS PELO RELØGIO E ACESSÓVELATODOSEhPROCEDEDAMESMA
FEITOAPENASDEELEMENTOSABSTRATOSELØ- da pressão que representam os ideais forma que com todo o restante saber
gicos – inferências, palpites e deduções QUE NOSSA CULTURA CONSTRØI E PROPA- ou capacidade do ser humano”: basta
– ele não pode ser degustado, sentido, GA TÎO BEM  ACABAMOS lCANDO EM UM estar disposto e ter a paciência para
visto, ouvido ou desfrutado de alguma constante estado de alerta. Percebemos desenvolver e despertar sentimentos
sinais de que atrás de alguma árvore E PENSAMENTOS LATENTES h/ INÓCIO SE
pode haver um predador: o coração fará com a contemplação, de uma de-
QUEBRAR A ACELERA APETITE SONOERESPIRA¥ÎOlCAM terminada maneira, de diversos seres
MOLDURA DO a lterados, causa ndo uma sensação pa ra- da Natureza – por exemplo, uma trans-
lisadora de ameaça. parente e bem-formada pedra (cristal),
ABSOLUTISMO Muito antes do termo mindfulness ga- uma planta e um animal. Procure-se
E ACEITAR O nhar popularidade no Ocidente, a psi- inicialmente dirigir toda a atenção à
CØLOGAEPESQUISADORA%LLEN,ANGER DO comparação da pedra com o animal,
INCERTO REQUEREM
Departamento de Psicologia da Univer- da seguinte forma: os pensamentos que
RECONHECER O QUE sidade de Harvard, estudava o fenôme- PARAAÓSÎODIRIGIDOSTERÎODEATRAVESSAR
DE FATO ESTÁ SOB no da atenção plena. Quando a mente a alma acompanhados de sentimentos
está presente, ela defende, nos tornamos vivos. E nenhum outro pensamento, ne-
NOSSO CONTROLE E SENSÓVEISAOCONTEXTO-ASNÎOBASTADE- nhum outro sentimento poderão intro-
DEIXAR FLUIR SEM CIDIRESTARPRESENTEODOMÓNIODAATEN- meter-se e perturbar a contemplação
ção é uma habilidade que, como qual- intensiva e compenetrada”, instrui. Essa
RESISTÊNCIA AQUILO quer outra, precisa ser exercitada. contemplação profunda pode ser dire-
QUE NÃO ESTÁ Começa com a prática de perceber. cionada a outros sentidos: para alguns,

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dirigir a atenção às informações sono- trevista ao programa OnBeing (http:// correspondem à realidade e que, mes-
RASDOAMBIENTEÏOMEIOMAISElCAZDE bit.ly/TZAnRs). MO EM MOMENTOS DIFÓCEIS  O CENÉRIO
alcançar o estado meditativo. Devemos lembrar que qualquer per- imaginado pode ser muito pior que o
Trazer a mente para o presente en- gunta que nos fazemos mentalmente evento real.
VOLVETAMBÏMOEXERCÓCIODAACEITA¥ÎO  vem com todos os tipos de possibili- Quebrar a moldura do absolutismo
OUTRO CONCEITO ENRAIZADO NA lLOSOlA dades – tanto negativas quanto positi- e aceitar o incerto, tanto no campo in-
oriental. Deixar de se apavorar com vas. Criadas e alimentadas pela mente dividual como universal, requerem re-
as possibilidades imaginárias depende ausente, essas presunções estão quase conhecer o que de fato está sob nosso
de aceitarmos – e até apreciarmos – o sempre erradas. Errar nas positivas CONTROLE E DEIXAR mUIR SEM RESISTÐNCIA
incerto. “Tudo muda e tudo se torna pode trazer uma enorme frustração. AQUILO QUE NÎO ESTÉ %SSE EXERCÓCIO DE
diferente a partir de outra perspectiva. Errar nas negativas – sempre as mais CONlAN¥A NA VIDA NOS MANTÏM ATENTOS
Portanto, o estado inteligente de cons- comuns e acompanhadas de evidências às necessidades de mudanças e evolu-
ciência seria de incerteza. Mas somos que construimos com maestria – nos ção, nos ensina que diferentes pontos de
ensinados a procurar pelo absoluto. Te- coloca em constante estado de preo- vista são enriquecedores e nos permite
mos a noção equivocada de que abso- cupação. Coisas ruins acontecem, mas UM CONTATO MAIS ÓNTIMO E REALIZADOR
lutos existem e que devemos conhecê- é bom trazer à consciência que nossas com as belezas que a ansiedade geral-
-los. Mas o que acontece é que, uma vez TEMÓVEIS PREVISÜES MUITO RARAMENTE mente oculta.
que você tem certeza de alguma coisa,
123RF E ARQUIVO PESSOAL

você não presta atenção nela, não está


presente para perceber as mudanças e Michele Müller é especialista em Neurociências e Neuropsicologia da
perde oportunidades – seja no trabalho Educação. Pesquisa e cria ferramentas para o desenvolvimento da
linguagem. É autora do blog www.leituraesentido.blogspot.com
ou nos relacionamentos”, disse em en-

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supervisão Por Ricardo Wainer

DIREITOS
do terapeuta

É FATO QUE O PSICOTERAPEUTA SE DEFRONTA COM


O SOFRIMENTO E AS FORMAS DE RELACIONAMENTO
DESADAPTATIVAS DE SEUS PACIENTES, MAS DEVE
RESPEITAR SEUS LIMITES NO ATENDIMENTO CLÍNICO

D
esde o século XIX, não fo- tência são intrínsecas à vida e ao contex- tua para uma grande complexidade e di-
ram poucos os teóricos que to pessoal do paciente? É exatamente so- lCULDADEPARAOALCANCEDEÐXITOSTOTAIS
debateram sobre as habilida- bre essas situações que muito do trabalho Não é raro que supervisores tenham
des, competências pessoais da supervisão em psicoterapia mira sua que tranquilizar seus supervisionandos
e técnicas requeridas dos psicólogos e prática e esforços. PARA QUE ESTES NÎO lQUEM SOFRENDO OU
psiquiatras para que viessem a oferecer /S DESAlOS PARA QUE SE CONCRETIZE se acusando por fracassos que, na verda-
UMAAJUDAQUALIlCADAECOMPOUCORIS- uma relação terapêutica sólida e, então, de, nada mais são do que trechos de uma
co de iatrogenias a seus clientes. Pas- aconteçam as mudanças comportamen- história maior ainda a ocorrer. O que pa-
sando pelas ideias de autoconsciência tais, emocionais e cognitivas propostas no RECEOlMDEUMAHISTØRIATERAPÐUTICADO
pela autoanálise em Freud até a neces- início do tratamento dependem de fato- indivíduo, na grande maioria das vezes, é
sidade de medidas objetivas de evolu- RES$ESDEOTIPODEDIlCULDADETRANSTOR- só um capítulo desse paciente no seu pro-
ção do tratamento em Hans Eysenck, o no mental) apresentado pelo paciente e o cesso de mudança. Os problemas que uma
fantasma do erro e da imperícia sempre grau de motivação para o processo psico- díade paciente-terapeuta teve no passado
assombrou o setting terapêutico. terápico até a capacidade de engajamento podem representar material extremamen-
Mas o que dizer aos clínicos quando numa relação colaborativa minimamente TERICOPARAOTRABALHODEOUTROPROlSSIO-
a refratariedade, a desmotivação e a resis- empática com o terapeuta, tudo compac- nal com aquele mesmo paciente.

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NAS BANCAS!
É trabalho da supervisão e da forma- VALIDAR EMOÇÕES
¥ÎOEMPSICOTERAPIALEVAROSPROlSSIONAIS
A   BUSCAREM A NEUTRALIDADE CIENTÓlCA
E DESESTABILIZAÇÕES
Esta entendida como a capacidade de DO PACIENTE, EM
olhar o outro através da lente do entendi- ALGUNS MOMENTOS,
mento teórico-clínico dos constituintes da
vida que levaram o indivíduo a ter aque-
SÃO DIFERENCIAIS
la identidade e conduta. Somente assim ESPERADOS E
conseguirão ter a empatia necessária para DE IMPACTO
com o sofrimento do cliente e não reagir
GUIADOPORSUASCREN¥ASPESSOAIS IDEN- TERAPÊUTICO
TIlCAREM AS ATIVA¥ÜES EMOCIONAIS QUE O NA UNICIDADE
paciente lhe causa. Sabe-se que as ativa-
DA RELAÇÃO
ções e reações afetivo-emocionais que o
cliente desperta no paciente são ferramen- TERAPÊUTICA
tas ricas, tanto para a compreensão do
que o paciente gera no seu entorno quanto tico na unicidade da relação terapêutica.
para explicitar esse funcionamento auto- Mas o terapeuta, como ser humano que
mático que, na maioria das vezes, está fora é e que tem de expressar seus direitos a
DA CONSCIÐNCIA DO SUJEITO   ESTABELECER TODOS INCLUSIVE SEUS PACIENTES  PRECISA
objetivos e limites realistas ao tratamento. ter claros os limites entre ser um instru-
Sendo o autossacrifício um componente mento de ajuda e entre se subjugar e ter
quase que universal da personalidade de seus direitos desrespeitados pelo cliente.
PROlSSIONAISDAÉREADASAÞDE ELETEMDE Quando o respeito mútuo não se
ser olhado com muita atenção. Por um consolida entre paciente-terapeuta nos
lado gera a motivação e persistência para primeiros meses de relacionamento, a in-
o trabalho de catalisar as mudanças nas terrupção do tratamento se faz premente.
dinâmicas do paciente, enfrentando todos 3ITUA¥ÜES TÓPICAS QUE EXEMPLIlCAM ISTO
OSTIPOSDERESISTÐNCIANORMAISEESPERA- são: casos onde não há a diminuição ou
das em todos os casos). Por outro lado, cessação de comportamentos que interfe-
entretanto, o autossacrifício pode apare- REMNATERAPIAFALTASCONSTANTES ATRASOS
cer numa postura onipotente e, de certo sistemáticos, vir alcoolizado ou drogado
modo, arrogante, de não saber a hora de para as sessões, não cumprir acordos em
lNALIZAR UM ATENDIMENTO QUE NÎO ESTÉ relação a comportamentos suicidas ou
chegando a bom termo. parassuicidas, etc.). Aqui é função tera-
É justamente neste último item que pêutica do clínico mostrar que a dupla
ESTETEXTOPROPÜEUMAREmEXÎO3EOPSI- não está tendo os progressos básicos ne-
coterapeuta tem que se defrontar com o cessários rumo às metas terapêuticas e
sofrimento e as formas de relacionamen- ENCAMINHAROPACIENTEAOUTROPROlSSIO-
to desadaptativas de seus pacientes, isto nal que pode ter mais sucesso.
NÎO SIGNIlCA QUE ELE DEVA SER MALTRATA- Não é fácil nem agradável tomar tais
do ou agredido por aqueles. Vivenciar e medidas, mas elas representam mais um
validar emoções e desestabilizações do aprendizado importante, através do exem-
paciente, em alguns momentos, são dife- plo, de que todos precisamos conhecer e
renciais esperados e de impacto terapêu- estabelecer nossos limites pessoais.
SHUTTERSTOCK / ACERVO PESSOAL

Ricardo Wainer é doutor em Psicologia, especialista em Terapia do Esquema,


com treinamento avançado pelo New York Schema Institute, e supervisor
credenciado pela International Society of Schema Therapy. Pesquisador em
Psicoterapia Cognitivo-Comportamental e em Ciências Cognitivas. Professor titular
da Faculdade de Psicologia da PUC–RS. Diretor da Wainer Psicologia Cognitiva.

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psicopositiva por Lilian Graziano

VOCÊ está AQUI?


TRAGADOS PELA VELOCIDADE DO MUNDO ATUAL,
ENCONTRAMOS CADA VEZ MAIS DIFICULDADE DE NOS
FOCARMOS NO MOMENTO PRESENTE. A SAÍDA PODE ESTAR
EM TAREFAS SIMPLES, TAIS COMO ESCOVAR OS DENTES

A
pergunta pode parecer estra- ELA PORQUE AGUARDO UMA CONlRMA¥ÎO Finalmente o retorno que eu esperava.
nha. Mas eu mesma tenho de outro paciente sem a qual não consi- Volto ao texto com a urgência de uma
que me concentrar para ter go saber ao certo quais horários dispo- colunista que está com seu prazo de en-
a certeza de estar aqui, es- níveis terei para marcar a nova consul- trega estourando. Releio as linhas até
crevendo esta coluna. Pior, me lembro ta. Volto a este texto. Releio a primeira então produzidas e sou assaltada por
de uma tarefa importante, paro e vou frase. “Caramba, aquele paciente já de- um pensamento que diz: “Não posso
até ela. No caminho encontro aque- via ter me retornado!” Pego o celular, me esquecer de dar um retorno àquela
le papelzinho com o telefone de uma entro no WhatsApp A lM DE CHECAR AS paciente nova!”. É quando a conclusão
paciente nova que aguarda um retor- mensagens. Não. Ele ainda não respon- SURREAL SE FAZ ØBVIA .ÎO  DElNITIVA-
no meu para marcarmos uma consulta deu. Volto ao texto. Escrevo mais uma MENTE NÎO ESTOU AQUI / QUE SIGNIlCA
para amanhã. Não consigo retornar a frase. O celular treme. Mensagem nova. que estou escrevendo este texto como

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A CIÊNCIA JÁ RECONHECE A IMPORTÂNCIA COMPARTILHE A
DE FOCARMOS NOSSA ATENÇÃO NO PRESENTE. VIDA COM MAIS
TRATA-SE DO CONCEITO DE MINDFULNESS,
QUE MUITOS, ERRONEAMENTE, ACREDITAM TER
NASCIDO A PARTIR DA PSICOLOGIA POSITIVA
EQUILÍBRIO
se estivesse em outra dimensão. Ou em
várias delas, pra ser mais precisa.
SÎORECORRENTEÏACREN¥ADEQUEAÞNICA
maneira de atingirmos o estado mindful
E AMOR
É por isso que a pergunta expressa no PRESEN¥ANOAQUIEAGORA SEJAPORMEIO
título desta coluna se faz tão pertinente. DA MEDITA¥ÎO mindfulness. De fato, esse
Principalmente porque você, caro leitor, TIPO DE MEDITA¥ÎO Ï MUITO ÞTIL E TEM
muito provavelmente ao longo deste pa- sido objeto de diversas pesquisas que a
rágrafo esteve tão ausente quanto eu. O RELACIONAM COMO ElCAZ NA REDU¥ÎO DE
que torna nosso encontro quase que um estresse, ansiedade, dores crônicas etc.
verdadeiro milagre! Não me lembro de, Contudo, infelizmente, as evidências
nas deliciosas aulas de Teoria Literária, CIENTÓlCAS NESSE CASO PARECEM NÎO SER
ter lido algum artigo que falasse sobre a SUlCIENTESPARAINCUTIRNASOCIEDADEOCI- ENTENDER A
qualidade do texto que consegue resga- dental, ou pelo menos na maioria dela,
QUÍMICA DOS
tar o leitor de outras dimensões. Talvez a disciplina necessária para uma prática
porque, naquela época, tudo se resumis- diária meditativa. RELACIONAMENTOS
se à qualidade de um texto capaz de, Eu mesma confesso, um tanto en-
SIMPLESMENTE  PRENDER A ATEN¥ÎO DESSE vergonhada, ser uma aprendiz rebel- É A CHAVE PARA
leitor que estava ali, no presente à espera de e indisciplinada. Talvez por isso me
CONSTRUIR LAÇOS
DESERTOCADO lSGADOOUPURAMENTEEN- COMPADE¥A DAQUELES QUE  A DESPEITO DE
tretido pelas palavras do autor. reconhecerem a importância do estado VERDADEIROS.
É certo que vivemos em um ritmo mindful, não conseguem aderir à medita-
diferente – discos de vinil que saltaram ¥ÎOmindfulness. Para esses vale salientar,
DAROTA¥ÎOPARAAn MASTALVELO- entretanto, que existem outras práticas
CIDADETEMNOSIMPOSTOUMPRE¥O QUEÏ de mindfulness que simplesmente não in-
NOSSADIlCULDADEEMPARAR3IM PORQUE CLUEM A MEDITA¥ÎO &AZER UMA REFEI¥ÎO
a vivência do presente depende da cap- COM ATEN¥ÎO FOCADA EXCLUSIVAMENTE NA
tura do instante. E na captura do instan- experiência presente, obrigar-nos a esco-
te velocidade é igual a zero (V = 0). var os dentes com a mão não dominante
A ciência já reconhece a importância AlMDETIRAR NOSDOhPILOTOAUTOMÉTICOv
DEFOCARMOSNOSSAATEN¥ÎONOPRESENTE são pequenas iniciativas que podem nos
Trata-se do conceito de mindfulness, que levar ao estado mindful, talvez preparan-
muitos, erroneamente, acreditam ter do nosso cérebro para uma futura prática
nascido a partir da Psicologia Positiva. MAISESTRUTURADATALCOMOAMEDITA¥ÎO
Na verdade, embora amplamente discu- Mas enquanto isso não ocorre, a
tido por pesquisadores desse movimen- “briga” para executarmos tarefas sim-
NAS
TO CIENTÓlCO  O CONCEITO DE mindfulness ples, tais como escrever (ou ler) um
parece ter sido introduzido na língua TEXTO  CONTINUARÉ n AINDA QUE  AO lNAL  BANCAS E
inglesa já em 1881. Uma outra confu- consigamos sair vencedores. LIVRARIAS!
SHUTTERSTOCK / ACERVO PESSOAL

Lilian Graziano é psicóloga e doutora em Psicologia pela USP, com curso de extensão
em Virtudes e Forças Pessoais pelo VIA Institute on Character, EUA. É professora
universitária e diretora do Instituto de Psicologia Positiva e Comportamento, Ou acesse www.escala.com.br
onde oferece atendimento clínico, consultoria empresarial e cursos na área.
graziano@psicologiapositiva.com.br

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psicopedagogia por Maria Irene Maluf

A experiência de
VIAJAR SOZINHO
INSEGURANÇAS E ANSIEDADES
EXAGERADAS DE CRIANÇAS (E DOS PAIS)
ULTRADEPENDENTES PODEM SER VENCIDAS
NOS ACAMPAMENTOS RECREATIVOS QUE
ESTIMULAM O DESENVOLVIMENTO DE NOVAS
HABILIDADES E O AMADURECIMENTO SOCIAL

S
EMPRE QUE CHEGAM AS FÏRIAS OU ção infantil ou juvenil seja clara em meio 3ALVO EXCE¥ÜES  SE SUlCIENTEMEN-
feriados prolongados vemos a às atividades recreativas. Em tal sentido, te amadurecidas e preparadas pela
euforia das crianças pela busca além das referências de amigos, da fa- família, a partir dos seis ou sete anos
por diversão. Uma opção que mília ou da escola, é importante os pais as crianças poderão aproveitar e mui-
virou moda no país foram os acampa- VERIlCAREMAATUALIDADEDASINFORMA¥ÜES to a experiência de viajar sem os pais
mentos recreativos. Apesar dos pedidos recebidas. Sites e revistas são bons meios ATÏPARADESENVOLVERNOVASHABILIDADES
INSISTENTESDEALGUNSlLHOSMAISAVENTU- de pesquisa, mas a experiência e o relato sociais, de autoestima e de autonomia,
REIROS MUITOSPAISHESITAMEMDEIXÉ LOS DEQUEMJÉFOIOULEVOUOSlLHOSSÎOMAIS POIS SOZINHAS TERÎODERESOLVERPEQUE-
VIAJAR SOZINHOS PARA UM ACAMPAMENTO CONlÉVEIS !LÏM ISSO  VALE LEMBRAR AS nos problemas de cuidados pessoais,
desses. Mas essa pode ser uma ocasião experiências similares anteriormente vi- de relacionamento, que via de regra a
DE APRENDIZADO PARA PAIS E lLHOS  PO- venciadas, que envolveram separação da MÎE DECIDE PELO lLHO  TERÎO DE APREN-
rém, claro, deve ser bem pensada. FAMÓLIAEDIlCULDADESDERELACIONAMENTO der e aceitar viver sob novas regras e
-ANDAR O lLHO PARA UM ACAMPA- QUEASCRIAN¥ASTENHAMENFRENTADOCOM LIDARCOMSITUA¥ÜESDEMEDODEDORMIR 
MENTOÏØTIMOPARAAMPLIARSEUCONTA- seus iguais e outros adultos, inclusive se por exemplo, em conjunto com outras
to e relacionamento social, incentivar a passaram por exemplo por experiências crianças que estão passando pela mes-
PARTICIPA¥ÎOEMNOVOSGRUPOS TRABALHAR de bullying, ou se sofreram a separação ma situação.
ASQUESTÜESDEACEITA¥ÎODASDIFEREN¥AS de modo muito acentuado. Esses fatores O amadurecimento social é visível,
pessoais, desenvolver sua independência devem ser levados em consideração antes HÉMELHORIANAAUTONOMIAESENTIDODE
e autonomia, ajudar a vencer inseguran- DEOPTARPORMANDAROlLHOOUNÎO segurança pessoal na maioria dos ca-
ças e ansiedades exageradas de crianças O cuidado deve ser maior ainda sos. Além disso, uma nova rotina gera
(e também dos pais) ultradependentes, QUANDO  ALÏM DO PERlL DE INSEGURAN- NOVOS INTERESSES  APRENDIZAGENS DIVER-
ENSINAR A RESOLVER SOZINHAS PROBLEMAS ¥A  DIlCULDADE DE AJUSTE SOCIAL  TIMIDEZ SIlCADAS INTERIORIZAADISCIPLINA MUDA
do dia a dia, a seguir regras, adaptar-se a ou mesmo uma introspecção maior, a o comportamento.
SITUA¥ÜESDIFERENTES ENTRETANTOSOUTROS criança estiver em meio a um tratamen- Mais importantes que a idade cro-
fatores. Essa espécie de atividade é mui- TOESPECIlCO SEJAFÓSICO PSICOLØGICO FO- NOLØGICA PARA ENVIAR A CRIAN¥A SÎO A
TOINDICADADEVIDOÌSVANTAJOSASHABILI- NOAUDIØLOGO  PSICOPEDAGØGICO /S PRO- maturidade emocional e a autonomia já
dades que desenvolve. lSSIONAISENVOLVIDOSSABERÎOORIENTAROS adquiridas, tanto por meio da educação
Para que nada dê errado, é decisivo es- PAISESPECIlCAMENTESOBREASVANTAGENS familiar quanto pelas experiências ante-
COLHERUMACAMPAMENTOBEMESTRUTURA- e desvantagens de tal empreitada nesse riores, como dormir em casa de amigos,
DO ONDEAPROPOSTADEAPOIOÌSOCIALIZA- momento da vida dessa criança. sair de férias com parentes etc.

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Outro ponto importante é a postura A POSTURA DOS PAIS FRENTE AO
dos pais frente ao afastamento da criança e AFASTAMENTO DO FILHO É MUITO
AMANEIRACOMOELAÏCONDUZIDAAOACAM-
pamento. Esses são diferenciais fundamen- IMPORTANTE, POIS A CRIANÇA PRECISA
TAISPRINCIPALMENTEPARAOSMAISNOVINHOS  SENTIR QUE ELES ESTÃO TRANQUILOS
que precisam sentir que seus pais estão
PARA QUE TAMBÉM POSSA TER
tranquilos e seguros para também se senti-
rem assim em um novo ambiente. SEGURANÇA EM UM NOVO AMBIENTE
Sempre existem maneiras de ajudar
OSlLHOSAADQUIRIREMânimo para novas idade e possa experimentar esse tipo de quado para a independência e autonomia.
EMPREITADAS COMO ESSA  CASO NA HORA PASSEIOSEMNENHUMTRAUMA Podem assim sentir também os efeitos do
“H” falte coragem: no caso de crianças !CHO IMPORTANTE REmETIR TAMBÏM SO- EXCESSODESUAPROTE¥ÎOPELASREA¥ÜESDOS
tímidas ou inseguras, o ideal é que uma bre as mudanças vantajosas que podem lLHOSEDEPENDÐNCIAEXCESSIVAAELESEDE-
outra criança conhecida vá junto com ser geradas na família a partir da ausência les com as crianças, coisa que não é pro-
ela, ao menos na primeira experiência TEMPORÉRIA DO lLHO MÎES E PAIS PODEM dutiva nem saudável. E ainda tirar outro
FORADECASA QUEAMBASTENHAMAMES- perceber que apesar da idade, compara- APRENDIZADODISSOTUDOOSlLHOSUMDIA
MA FAIXA ETÉRIA E POSSAM lCAR NO MES- tivamente a outras crianças, ainda não o VÎOTERMESMOAPRØPRIAVIDAEAFAMÓLIA
mo grupo. A mais segura e extrovertida PREPARARAMOSUlCIENTEOUDEMODOADE- existe para prepará-los para isso...
serve de modelo e de apoio enquanto a
SHUTTERSTOCK/ ARQUIVO PESSOAL

MAISTÓMIDAFAZNOVOSAMIGOS
Maria Irene Maluf é especialista em Psicopedagogia, Educação Especial e
Crianças menores de seis ou sete Neuroaprendizagem. Foi presidente nacional da Associação Brasileira de
anos não têm ainda tantas defesas emo- Psicopedagogia – ABPp (gestão 2005/07). É editora da revista Psicopedagogia da
cionais, a não ser que os pais acreditem ABPp e autora de artigos em publicações nacionais e internacionais. Coordena curso
de especialização em Neuroaprendizagem. irenemaluf@uol.com.br
QUE O lLHO ÏBEM AMADURECIDO PARA A

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sexualidade Por Giancarlo Spizzirri

O desenvolvimento
da IDENTIDADE
PESQUISAS MOSTRAM QUE AS
PESSOAS TRANSEXUAIS COM DISFORIA
DE GÊNERO APRESENTAM MAIORES
CHANCES DE EXIBIR TRANSTORNOS
PSIQUIÁTRICOS AO LONGO DE SUAS VIDAS

A
PUBLICA¥ÎO DA a EDI¥ÎO DO TIlCAM COM O SEU SEXO EOU GÐNERO DE
-ANUAL $IAGNØSTICO E %STA- NASCIMENTO D  TRANSEXUAL Ï QUEM NÎO
TÓSTICO DOS 4RANSTORNOS -EN- SEIDENTIlCACOMSEUSEXODENASCIMENTO
TAIS $3-   DA !SSOCIA¥ÎO E PROCURA ADEQUAR  OU PASSOU POR ADE-
0SIQUIÉTRICA!MERICANA!0! EXPANDIU QUA¥ÎO  PARA O GÐNERO COM O QUAL SE
AVISÎOSOBRESEXOEGÐNEROSEXOREFERE- IDENTIlCA OQUE EMVÉRIOS MASNÎOEM
SE TANTO A MASCULINO QUANTO A FEMINI- TODOSOSCASOS ENVOLVETRANSI¥ÎOSOMÉ-
NO  RELACIONADO AOS ASPECTOS BIOLØGICOS TICAPORTRATAMENTOHORMONALECIRURGIA
COMO CROMOSSOMOS SEXUAIS  GÙNADAS  de redesignação sexualADEQUA¥ÎODOSEXO
HORMÙNIOS SEXUAIS E GENITÉLIA INTERNA E DENASCIMENTOPARAOGÐNEROCOMOQUAL
EXTERNA NÎO AMBÓGUAS E GÐNERO Ï UTILI- O INDIVÓDUO SE IDENTIlCA  E  DISFORIA DE
ZADOPARADESIGNAROPAPELSOCIALnME- GÐNERO REFERE SE Ì INCONGRUÐNCIA ACEN- TOS RELATAM SINTOMAS SIGNIlCATIVOS DE
NINOOUMENINA HOMEMOUMULHER QUE  TUADAENTREOSEXODENASCIMENTOE COMO ESTRESSE PSICOLØGICO E PROCURAM TOMAR
NAMAIORIADASPESSOAS ESTÉRELACIONADO ELE Ï PERCEBIDO E MANIFESTADO NO COM- MEDIDAS PARA ALTERAR AS CARACTERÓSTICAS
AO SEXO DE NASCIMENTO %NTRETANTO  O PORTAMENTO DO INDIVÓDUO  COM DURA¥ÎO DESEUSCORPOSPOREXEMPLO PORMEIO
DESENVOLVIMENTO INDIVIDUAL DO GÐNERO DEPELOMENOSSEISMESESALÏMDOMAIS  DOUSODEHORMÙNIOSSEXUAISECIRURGIA
SOFRE INmUÐNCIAS BIOPSICOSSOCIAIS E NEM ESSA CONDI¥ÎO DEVERÉ ESTAR ASSOCIADA A PLÉSTICA  DE FORMA A SE ADEQUAREM  O
TODOS OS INDIVÓDUOS SE PERCEBEM COMO SOFRIMENTOCLINICAMENTESIGNIlCATIVOOU MAIS PRØXIMO POSSÓVEL  AO GÐNERO COM
HOMENSOUMULHERES$AÓ VÉRIASCLASSIl- PREJUÓZONOFUNCIONAMENTOSOCIAL PROlS- OQUALSEIDENTIlCAM6ALELEMBRARQUE
CA¥ÜESA DESIGNA¥ÎODEGÐNEROREFERE- SIONALOUEMOUTRASÉREASIMPORTANTESDA OSINDIVÓDUOSTRANSEXUAISPODEMOUNÎO
SE Ì DESIGNA¥ÎO INICIAL COMO HOMEM VIDADOINDIVÓDUO%MBORANEMTODOSOS APRESENTAR DISFORIA DE GÐNERO  SEGUNDO
OU MULHER  E GERALMENTE ISSO OCORRE NO INDIVÓDUOS VENHAM A SENTIR DESCONFORTO O$3- 
NASCIMENTO E  POR CONSEGUINTE  CRIA SE COMORESULTADODETALDESARMONIA MUI- 0ESQUISAS MOSTRAM QUE AS PESSOAS
O hGÐNERO DE NASCIMENTOv B  IDENTIDA- TOSSENTIRÎO SEASINTERVEN¥ÜESDESEJADAS TRANSEXUAIS COM DISFORIA DE GÐNERO TÐM
DE DE GÐNERO Ï UMA CATEGORIA DA IDEN- SOBREOFÓSICO PORMEIODEHORMÙNIOSE MAIORES CHANCES DE EXIBIR TRANSTORNOS
TIDADE SOCIAL E REFERE SE Ì IDENTIlCA¥ÎO OUCIRURGIAS NÎOESTIVEREMDISPONÓVEIS PSIQUIÉTRICOSAOLONGODESUASVIDASENTRE
DO INDIVÓDUO COMO HOMEM OU MULHER  0ESSOAS QUE SE IDENTIlCAM COMO ELES EPISØDIOS DEPRESSIVOS  TENTATIVAS DE
IMAGENS: 123RF E ARQUIVO PESSOAL

OU  OCASIONALMENTE  COM ALGUMA CATE- TRANSEXUAIS REPORTAM NA SUA HISTØRIA EOUSUICÓDIOEHISTØRIADETRAUMAFÓSICO
GORIA DIFERENTE DE HOMEM OU MULHER DESCONFORTOPERSISTENTECOMOSEXOQUE EOUEMOCIONAL DURANTEAINFÊNCIA-AIS
C  TRANSGÐNEROS  REFERE SE AO AMPLO LHEFOIDESIGNADONONASCIMENTOEAPRE- ESPECIlCAMENTE PESSOASQUEAPRESENTAM
CONJUNTO DE INDIVÓDUOS QUE TRANSITORIA- SENTAMFORTEIDENTIlCA¥ÎOCOMOGÐNERO TRANSTORNOANSIOSOASSOCIADOÌTRANSEXU-
MENTEOUPERSISTENTEMENTENÎOSEIDEN- OPOSTOAOSEUSEXODENASCIMENTO-UI- ALIDADECOMDISFORIADEGÐNEROTENDEMA

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MUITOS TRANSGÊNEROS RELATAM EVIDÐNCIADEQUEOAMBIENTESOCIALAPØSO
NASCIMENTODESEMPENHEPAPELCRUCIALNA
SINTOMAS SIGNIFICATIVOS DE ESTRESSE
DETERMINA¥ÎO DA IDENTIDADE DE GÐNERO 
PSICOLÓGICO E PROCURAM TOMAR MEDIDAS ENTRETANTOASRELA¥ÜESENTREASDIFEREN¥AS
PARA ALTERAR AS CARACTERÍSTICAS SEXUAISESTRUTURAISEFUNCIONAISDEVÉRIAS
ÉREASDOCÏREBROEMRELA¥ÎOÌSVARIA¥ÜES
$%3%53#/20/3$%&/2-!!3%!$%15!2%-  HORMONAISDURANTEOPERÓODOGESTACIONAL
/-!)302œ8)-/0/33°6%, !/'º.%2/ TÐMSIDOVERIlCADAS
COM O QUAL SE IDENTIFICAM
Referências:
APRESENTAR MAIS PROBLEMAS PSIQUIÉTRICOS !PESAR DE A CONSCIENTIZA¥ÎO PÞBLICA SPIZZIRRI, Giancarlo. Morfometria cerebral
e imagens de tensores de difusão da
QUEAPOPULA¥ÎOEMGERAL ALÏMDESEREM  SOBRE O AMPLO ESPECTRO DE INDIVÓDUOS
microestrutura de substância branca em
JUNTOCOMOSTRANSTORNOSAFETIVOSCOMO TRANSGÐNEROS ESTAR SE DESENVOLVENDO  A homens para mulheres transexuais antes
A DEPRESSÎO  POR EXEMPLO  OS DISTÞRBIOS COMPREENSÎOCIENTÓlCASOBREOFENÙMENO e durante o processo transexualizador
MAIS FREQUENTES NESSA POPULA¥ÎO / USO DODESENVOLVIMENTODAIDENTIDADEDEGÐ- (Tese). Faculdade de Medicina da USP, São
ABUSIVODESUBSTÊNCIASPSICOATIVASILÓCITAS NEROAINDAÏLIMITADA.ÎOHÉNENHUMA Paulo, 2016.
OUSEMPRESCRI¥ÎOMÏDICAÏOUTROASPECTO
RELEVANTE  DOS TRANSGÐNEROS COMEN- Giancarlo Spizzirri é psiquiatra doutorando pelo Instituto de Psiquiatria (IPq)
TAMQUEPROCURARAMTRATAMENTOPARAUSO da Faculdade de Medicina da USP, médico do Programa de Estudos em
Sexualidade (ProSex) do IPq e professor do curso de especialização em
ABUSIVODESUBSTÊNCIASEMPESQUISAREALI-
Sexualidade Humana da USP.
ZADANAPOPULA¥ÎOAMERICANA

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PSICANÁLISE

TOC em
crianças
Comportamentos
C omportamentos repetitivos
repetitivos
fazem
fazem parte
parte ttambém
ambém dodo
universo
universo infantil
infantil e adolescente,
adolescente,
trazendo
trazendo llimitações
imitações que
que
prejudicam
prejudicam asas relações
relações ssociais
ociais
desde
desde muito
muito ccedo
edo

Por
Por C Cristiane
ristiane FFlôres
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Bortoncello
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e JJuliana
uliana Braga
Braga Gomes
Gomes

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-‡.¢ -ˆÔ‡=;<A¢=;<Dˆ9
Psiquiatria (UFRGS) e especialista em Terapia Cognitivo-Comportamental
‡$GGˆ:.GhÔ.G G
GG‡$.ˆ9.G G
 G
(WP), treinamento intensivo em Terapia Comportamental Dialética. É membro
do tecDbt – time de estudos e consultoria em DBT, professora do curso

I G GhÔ.G G  ¢GGG$ËI G
Adolescência (InTCC). Psicóloga dos grupos de tratamento para o TOC do
# G
^ IG
+
=;;BG=;<?:
Juliana Braga Gomes é psicóloga e pedagoga formada pela PUCRS,
especialista em Terapia Cognitivo-Comportamental (Infapa),
mestre em Ciências Médicas, Psiquiatria, doutora em Psiquiatria e
Ciências do Comportamento-UFRGS; pesquisadora do Transtorno
*H ¢ .G
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# G
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SHUTTERSTOCK

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GI GhÔ
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Cognitivas do Rio Grande do Sul (ATC-RS).

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PSICANÁLISE

E
m crianças e adolescen- São comuns preocupações com
tes, rituais, medos, com-
portamentos repetitivos simetria, alinhamento ou exatidão (precisar
e eventuais fobias fazem organizar os brinquedos por tamanho ou
parte do desenvolvi-
mento normal e devem ser diferen- categoria, sensação de que as coisas não
ciados dos sintomas do TOC, como estão no devido lugar) ou simplesmente
é o caso das crianças pequenas, que
apresentam rituais nos horários de refazer várias vezes para que fique perfeito
dormir (uma determinada maneira
para adormecer), comer (dificuldade curso geralmente é crônico e, caso fazer lavagens excessivas e rituali-
em misturar as comidas) e demorar não seja tratado, se mantém por toda zadas das mãos para ter certeza de
no banho. Esses comportamentos a vida, raramente desaparecendo por que estão limpas); dúvidas seguidas
tendem a ser mais frequentes entre completo (American Psychiatric As- de verificações ou de perguntas re-
os 2 e 4 anos de idade (Evans et al., sociation, 2014). Caracteriza-se pela petidas, ou necessidade de confir-
1997). As crianças de 3 a 5 anos cos- presença de pensamentos, impulsos mações (checagens para confirmar
tumam brincar de imitar comporta- ou imagens recorrentes e persisten- se os materiais estão na mochila, li-
mentos de outras pessoas (mímica), tes (obsessões) e comportamentos ou gar seguidas vezes para se certificar
repetir as mesmas brincadeiras, mú- atos mentais repetitivos (compulsões) de que nada de horrível aconteceu
sicas e até assistir aos mesmos filmes realizados, na maior parte das vezes, com um familiar; verificar a porta
diversas vezes. Na idade escolar, os com o intuito de diminuir o descon- da casa ou do carro para garantir
jogos passam a ter regras rígidas, que forto que acompanha as obsessões. que esteja trancada), sendo segui-
são discutidas e negociadas entre os Nas crianças e adolescentes, os dos, muitas vezes, por evitações
participantes, e há muito interesse sintomas mais comuns são: medo (não usar o banheiro da escola ou
por coleções (figurinhas, modelos de de contaminação seguido de com- não chegar perto dos colegas). Tam-
carros, aviões, bonecos, filmes, etc.). pulsão por limpeza e lavagem (evi- bém são comuns preocupações com
Na adolescência, é muito co- tar utilizar o banheiro da escola ou simetria, alinhamento ou exatidão
mum ter grande interesse por artis- da casa de um amigo, não dividir o (precisar organizar por tamanho ou
tas, celebridades, estilos musicais/ lanche por considerar nojento/sujo, categoria os brinquedos, sensação
banda de música, bem como cole- de que as coisas não estão no devido
ção de objetos e lembranças de um lugar/ordem) ou simplesmente refa-
ídolo. Todos estes comportamentos zer várias vezes para que fique per-
permanecem durante uma determi- feito ou completo (refazer os temas
nada fase do desenvolvimento e de casa, passar a limpo várias vezes
não interferem nas atividades as anotações de aula ou os cadernos,
diárias nem prejudicam o de- reler inúmeras vezes uma página ou
sempenho escolar. um parágrafo para ter certeza de que
Já o transtorno obsessivo- entendeu tudo ou de que a letra está
-compulsivo (TOC) é uma perfeita) (Bortoncello et al., 2014).
doença mental grave, que aco- Podem estar presentes pensamentos
mete principalmente indiví- de conteúdo indesejado e repugnan-
duos jovens no final da adoles- te (medo de xingar outras pessoas
cência, embora muitas vezes os ou de dizer involuntariamente algo
primeiros sintomas se ma- obsceno, medo de ser responsável
nifestem na infância. Seu por desgraças, como provocar um
desastre de carro ou queda de avião
por ter pensado ou sonhado). Ou-
Medos e fobias eventuais
tro sintoma com comorbidade com
são normais, fazem parte
da evolução de crianças e
o TOC é a acumulação compulsiva
adolescentes e não devem ser (grande dificuldade em descartar
confundidos com os sintomas brinquedos quebrados ou estraga-

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dos, objetos sem valor como eti-
quetas, roupas que não servem, ca-
dernos e folhas velhas, assim como
embalagens vazias).
Também são comuns nas crian-
ças e adolescentes as compulsões
mentais: “atos” mentais como con-
tar, repetir palavras, anular um pen-
samento “ruim” por um pensamento
“bom”, com a finalidade de reduzir
a ansiedade e o desconforto. Como
são realizados em silêncio, muitas
vezes passam despercebidos pelos
familiares e demais pessoas.

Rotina alterada
A rotina diária da criança e do ado-
lescente com TOC pode ser mui-
to alterada pela doença. E eles pró- Apesar dos primeiros sintomas se manifestarem na infância, o TOC é uma doença grave, que atinge
prios percebem seus comportamentos especialmente jovens no final da adolescência
como estranhos e diferentes do com-
portamento dos seus colegas. Sentem Podem estar presentes pensamentos de
vergonha e, muitas vezes, precisam
disfarçar ou esconder-se para realizar conteúdo indesejado como medo de xingar
seus rituais compulsivos. ou de dizer involuntariamente algo obsceno,
O TOC causa sofrimento sig-
nificativo, interfere no rendimento medo de ser responsável por desgraças, como
escolar, nas relações sociais e no provocar desastre de carro ou queda de avião
funcionamento familiar. Os sinto-
mas podem ser muito graves e inca- por ter pensado ou sonhado com isso
pacitantes, sendo acompanhados de
medos acentuados, impedindo, por pacientes pediátricos apresentam
exemplo, a criança ou o adolescente geralmente pouco insight sobre a na-
de frequentarem a escola ou de con- tureza de suas obsessões, que está
viverem com os colegas. associada à dificuldade de expres-
Esse transtorno acomete 2% são verbal, o que torna o diagnósti-
a 3% dos indivíduos, o que seria co mais difícil, e são mais propensos
em média 1 em cada 40 indivíduos a terem comorbidades como tiques,
(Hollander; Simeon, 2012), sendo depressão maior, transtorno do dé-
que os familiares de 1º grau de por- ficit de atenção com hiperatividade ŒRevisão dos
tadores do TOC têm quatro vezes (TDAH) e transtorno desafiador pensamentos negativos Œ
mais chances de desenvolverem a opositivo (Geller, 2006). A terapia cognitivo-comportamental, co-
nhecida por TCC, é uma linha da psicotera-
doença (Hettema et al., 2001). Um Um estudo multicêntrico no
pia proposta e desenvolvida pelo psicólogo
estudo com 2.323 adolescentes de Brasil com 842 pacientes clínicos norte-americano Aaron Beck, que preconiza
14 a 17 anos, alunos do ensino mé- verificou que o início dos sintomas a revisão dos pensamentos negativos por in-
dio, encontrou uma prevalência do ocorreu um pouco mais cedo nos termédio das informações obtidas ao longo
TOC atual de 3,3% (Vivan et al., homens, em média aos 12,4 anos, e da vida. O método reúne um conjunto de téc-
IMAGENS: SHUTTERSTOCK/123RF

nicas e estratégias terapêuticas, com o obje-


2013). É considerado uma doença um pouco mais tarde em mulheres,
tivo de transformar padrões de pensamento.
multifatorial, que envolve questões aos 12,7 anos (Ferrão et al., 2006). Essa forma de terapia é extremamente efetiva
genéticas e ambientais entre os fato- Outro estudo, realizado em no tratamento com crianças e adolescentes.
res de risco (Pauls et al., 2014). Os Porto Alegre com adolescentes do

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PSICANÁLISE

problemas para a identificação pre-


coce do TOC se dá pela dificuldade
de perceber os sintomas e descobrir
quando já está interferindo grave-
mente na rotina da criança. Por esse
motivo, poucos familiares conseguem
descrever o momento exato em que a
criança apresentou os primeiros sin-
tomas (Stengler-Wenzke et al., 2004).
Além disso, para os pais é difícil sepa-
rar o que é um comportamento nor-
mal do que é excessivo, ou quando os
sintomas já estão graves (quando o
filho leva muito tempo para se vestir,
demora várias horas no banho, não
quer mais dormir sozinho ou repete
inúmeras vezes a mesma pergunta).
Nas crianças e adolescentes os sintomas mais comuns, entre vários, são o medo de contaminação,
seguido de compulsão por limpeza e lavagem Entrevistas
ensino médio, verificou que apenas
9,3% dos que foram diagnosticados
lente em crianças e adolescentes, o
TOC, muitas vezes, não é percebido
A avaliação normalmente é fei-
ta em uma ou mais entrevis-
tas, nas quais além da obtenção de
como tendo TOC sabiam da doença, pela família, o que acarreta demora informações são aplicadas escalas,
e dentre estes apenas 6,7% haviam pela busca de tratamento. Um dos como é o caso da Children’s Yale-
realizado algum tipo de tratamento
(Vivan et al., 2013). Ou seja, mais de
90% desconheciam o fato de terem Um estudo multicêntrico no Brasil com 842
TOC. É importante ressaltar que o
diagnóstico e o tratamento precoces
pacientes clínicos verificou que o início dos
são essenciais para impedir o agra- sintomas ocorreu um pouco mais cedo nos
vamento dos sintomas e aumentar as
homens, em média aos 12,4 anos, e um pouco

IMAGEM: 123RF
chances de uma remissão completa.
Mesmo sendo altamente preva- mais tarde em mulheres, aos 12,7 anos

NAS BANCAS!
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Estudo realizado PARA SABER MAIS

em Porto Alegre + - )g .*


com adolescentes
do ensino médio, O conceito do chamado transtorno desafiador opositivo (TDO) pode ser
definido como um padrão persistente de comportamentos hostis,
desobedientes, negativos e desafiadores, como o próprio nome diz. Essas
verificou que formas de conduta são observadas nas relações sociais da criança com
adultos e figuras que representam autoridade de maneira geral, como pais, tios,
apenas 9,3% professores e avós. Seus principais sintomas são os seguintes: discussões com
dos que foram adultos, recusa a obedecer regras, perda frequente de paciência, perturbação
e implicância com as pessoas, podendo responsabilizá-las por seus maus
diagnosticados comportamentos ou pelas próprias atitudes erradas. Os sintomas surgem nos
como tendo mais variados ambientes. Contudo, em casa e na escola podem ser mais bem
percebidos e, inclusive, diagnosticados. Esse quadro pode representar prejuízos
TOC sabiam da significativos na vida social, escolar e ocupacional da criança ou adolescente.
doença, e dentre Quando não tratado, o TDO pode evoluir para o transtorno de conduta na
adolescência, que tem como características graves violações dos direitos dos
estes apenas outros e das normas sociais.
6,7% haviam feito
algum tipo de ria, bem como por meio de material Os familiares são de extrema
tratamento lúdico disponível, busca-se conhe- importância na vida da criança, e
cer os sintomas (inclusive possí- inevitavelmente sofrem e se envol-
veis sintomas não percebidos pelos vem nos sintomas. É fundamental
-Brown Obsessive Compulsive Scale pais). Em pré-adolescentes que têm que o terapeuta reserve momentos
(CY-BOCS) (Asbahr, 1992). No boa comunicação ou adolescentes, a individuais dos pais e em conjun-
atendimento de crianças, a primeira entrevista inicial pode ser feita com to (pais e paciente) para apoiá-la
entrevista costuma ser apenas com eles, e num segundo momento com e passar as orientações adequadas
os pais (para colher o maior núme- os pais, que por sua vez podem tra- ao longo do tratamento. Esse en-
ro de informações) e depois com a zer informações mais precisas sobre volvimento e a participação dos
criança, quando, através do uso de o início dos sintomas, a interferên- membros da família nos rituais
desenhos, brinquedos e questiona- cia nos estudos, nas rotinas da famí- compulsivos, bem como a modifi-
mentos adequados para a faixa etá- lia e na vida social do filho. cação no cotidiano da família em

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www.escala.com.br
PSICANÁLISE

decorrência dos sintomas do TOC, O TOC, muitas vezes, não é percebido


chamam-se acomodação familiar
(AF) (Calvocoressi et al., 1995).
pela família, o que acarreta na demora
Com alta prevalência encontrada pelo tratamento. Um dos problemas para a
em nosso meio, de 98,2% (Gomes,
2014), ocorrendo em algum grau em identificação precoce é a dificuldade de notar
praticamente todas as famílias. os sintomas e descobrir quando o transtorno
No tratamento do TOC em
crianças e adolescentes, tanto a te- está interferindo na rotina da criança
rapia cognitivo-comportamental
(TCC) quanto os psicofármacos TOC nessa faixa etária foi verificada mento precoce pode evitar grande
inibidores seletivos de recaptação em ensaios clínicos, numa revisão sofrimento ao indivíduo que, muitas
da serotonina (ISRS) e a clomipra- sistemática e em uma metanálise vezes, sofre anos com os prejuízos
mina são efetivos em reduzir os sin- (Pots, 2004; Ashbar, 2005; Prazeres causados pela doença sem saber que
tomas. De modo geral, recomenda- et al., 2007). existe tratamento eficaz, que pode
-se combinar as duas modalidades A TCC é a primeira escolha de eliminar os sintomas e melhorar a
de tratamento (Pots, 2004). A efi- tratamento em casos de crianças e qualidade de vida.
cácia/efetividade da terapia cogni- adolescentes com TOC com sinto-
tivo-comportamental (TCC) para o matologia de leve a moderada, ao Base de estudo
passo que a farmacoterapia, prefe-
rencialmente associada à TCC, é a
abordagem terapêutica de escolha
P or entender a importância da
prevenção dos transtornos
mentais e do tratamento precoce e
nos casos de intensidade moderada conhecer a falta de materiais des-
a grave (<23 na CY-BOCS; 6 ou 7 tinados a essa faixa etária, as au-
na CGI) ou quando existe depres- toras elaboraram um livro infantil
são associada (Mancuso et al., 2010; (Gomes; Bortoncello, 2016) com o
Practice Parameters, 2012). As téc- objetivo de psicoeducar crianças/
nicas de exposição e prevenção de adolescentes e seus familiares, de
resposta (ou de rituais) (EPR) são
as estratégias cruciais para a maio-
ria dos modelos propostos, embora
muitos modelos, às vezes, acrescen-
tem também estratégias cognitivas,
especialmente quando os pacientes
são adolescentes.
É fundamental que cada vez mais
pessoas tenham conhecimento sobre
esse transtorno, pois ele pode ter ŒConflitos inconscientes Œ
um impacto profundo na vida de As técnicas de exposição e prevenção
crianças e adolescentes que estão de resposta (EPR) foram pioneiras na
abordagem psicológica no tratamento
em pleno desenvolvimento. A par- dos sintomas do TOC, que demonstra-
tir da experiência de uma década de ram ser muito efetivas. Começaram nos
pesquisa no Hospital de Clínicas de anos 1960, devido à insatisfação com os
Porto Alegre (HCPA), é possível ob- resultados da Psicanálise e da psicotera-
servar que apesar de muitos pacien- pia de orientação psicanalítica, que não
eram eficazes o suficiente, além de serem
tes buscarem atendimento somente tratamentos muito longos. Contrariando
na idade adulta, relatavam ter seus a teoria psicodinâmica, que considerava
sintomas iniciados ainda na infân- a “neurose obsessiva” consequência de
Algumas características do TOC mostram
indivíduos que sofrem com acumulação cia ou adolescência. Isso reforça a conflitos inconscientes, esse modelo de-
importância de cada vez mais di- fendia que medos e ansiedade eram re-
compulsiva, tendo dificuldade em descartar
sultado de aprendizagens.
brinquedos quebrados, por exemplo vulgar esse transtorno, pois o trata-

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! Ü)$-
EVANS, D. W.; LECKMAN, J. F.; CARTER, A.; REZNICK, J. S.; HENSHAW, D.; KING, R. A.; PAULS,
D. Ritual, habit, and perfectionism: the prevalence and development of compulsive-like
behavior in normal young children. Child Development, v. 68, n. 1, p. 58-68, fev. 1997.
Associação Americana de Psiquiatria. (GG G` I G^ I
.G
Mentais, 5ª edição (DSM-5). Porto Alegre: Artmed, 2014.
BORTONCELLO et al. O TOC na infância e adolescência. In: TOC: Manual de terapia
cognitivo-comportamental para o transtorno obsessivo-compulsivo. 2ª ed. Porto Alegre:
Artmed, 2014.
HOLLANDER, E.; SIMEON, D. Transtornos de ansiedade. In: Hales, R. E.; Yudofsky, S. C.;
Gabbard, G. O. Tratado de Psiquiatria Clínica. 5ª ed., Porto Alegre: Artmed, 2012.
HETTEMA, J. M.; NEALE, M. C.; KENDLER, K. S. A review and meta-analysis of genetic
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1578.
VIVAN, A. S., RODRIGUES, L., WENDT, G., BICCA, M. G., BRAGA, D. T. CORDIOLI, A. V.
Obsessive-compulsive symptoms and obsessive-compulsive disorder in adolescents: a
population-based study. Revista Brasileira de Psiquiatria, v. 36, n. 2, p. 111-118, 2014.
PAULS, D. L.; ABRAMOVITCH, A.; RAUCH, S. L.; GELLER, D. A. Obsessive-compulsive
disorder: an integrative genetic and neurobiological perspective. )G  
)I I, n. 15, p. 410-424, 2014.
GELLER, D. A. Obsessive-compulsive and spectrum disorders in children and adolescents.
Outra característica da doença é interferir +I G I  I)  IG, v. 29, n. 2, p. 353-370, jun. 2006.
no rendimento escolar, por isso a instituição
FERRAO, Y. A.; SHAVITT, R. G.; BEDIN, N. R.; DE MATHIS, M. E.; CARLOS, L. A.; FONTENELLE,
de ensino deve colaborar no diagnóstico
L. F. et al. Clinical features associated to refractory obsessive-compulsive disorder. Journal
precoce do problema
of Affective Disorders, n. 94, p. 199-209, 2006.
forma clara e lúdica, sobre o que é STENGLER-WENZKE, K.; TROSBACH, J.; DIETRICH, S.; ANGERMEYER, M. C. Experience of
o TOC e auxiliar na identificação stigmatization by relatives of patients with obsessive compulsive disorder. Archives of
+I G I) , v. 18, n. 3, p. 88-96, 2004.
dos sintomas. O livro TOC: Apren-
dendo Sobre os Pensamentos Desa- ASBAHR et al. IGG3G¢
*H€€ – versão para crianças (CY-
BOCS). Tradução brasileira, 1992.
gradáveis e os Comportamentos Re-
CALVOCORESSI, L.; LEWIS, B.; HARRIS M.; TRUFAN, B. S.; GOODMAN, W. K.; MCDOUGLE,
petitivos também pode ser excelente C. J. et al. Family accomodation in obsessive compulsive disorder. American Journal of
ferramenta para ser utilizada pelos Psychiatry, v. 152, n. 3, p. 441-443, 1995.
profissionais de saúde mental para GOMES, J. B.; VAN NOPPEN, B.; PATO, M.; BRAGA, D. T.; MEYER, E.; BORTONCELLO, C.
psicoeducar o paciente quanto ao F.; CORDIOLI, A. V. Patient and family factors associated with family accommodation in
transtorno e ao tratamento na abor- obsessive-compulsive disorder. +I GG
  IG)I I, n. 68, p. 621-630,
dagem cognitivo-comportamental, 2014.
pois, além de apresentar os princi- Pediatric OCD Treatment Study (POTS) Team. Cognitive-behavior therapy, sertraline, and
their combination for children and adolescents with obsessive-compulsive disorder: the
pais tipos de sintomas comuns em
pediatric OCD treatment study (POTS) randomized controlled trial. JAMA, v. 292, n. 16, p.
crianças com TOC, ensina a manei- 1969-76, out. 2004.
ra mais assertiva de responder aos ASBAHR, F. R.; CASTILLO, A. R.; ITO, L. M. et al. Group cognitive-behavioral therapy versus
sintomas, o que será trabalhado ao sertraline for the treatment of children and adolescents with obsessive compulsive disorder.
longo do tratamento. Journal of the American Academy of Child & Adolescent Psychiatry, v. 44, n. 11, p. 1128-1136,
É fundamental que cada vez 2005.
mais as pessoas e os profissionais PRAZERES, A.; SOUZA, W.; FONTENELLE, L. Cognitive-behavior therapy for obsessive-
divulguem sobre o TOC, pois trata- compulsive disorder: a systematic review of the last decade. Revista Brasileira de
Psiquiatria, v. 29, n. 3, p. 262-270, 2007.
-se de um transtorno com ampla
MANCUSO, E.; FARO, A.; JOSHI, G.; GELLER, D. Treatment of pediatric obsessive-compulsive
diversidade de sintomas, que causa
disorder: a review. Journal of Child and Adolescent Psychopharmacology, n. 20, p. 299-308,
prejuízos ao indivíduo e seus fami- 2010.
liares, pois através do tratamento
IMAGENS: SHUTTERSTOCK/123RF

___________. Practice parameter for the assessment and treatment of children and
adequado pode-se reduzir e até eli- adolescents with obsessive-compulsive disorder. Journal of the American Academy of
minar por completo os sintomas do Child & Adolescent Psychiatry, v. 51, n. 1, p. 98-113, 2012.
paciente, restabelecendo sua quali- GOMES, J. B.; BORTONCELLO, F. C. TOC: Apreendendo sobre os Pensamentos
dade de vida. Desagradáveis e os Comportamentos Repetitivos. Porto Alegre: Sinopsys Editora, 2016.

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coaching por Eduardo Shinyashiki

Transformação
para o ANO TODO
O FENÔMENO DO “COMO SERIA SE...” NÃO É EXCLUSIVO
NAS PROMESSAS HABITUAIS QUE REPRESENTAM UM NOVO
CICLO, MAS PERMANECE FIRME POR TODA A VIDA

Q
uem não inicia um ano com a mais alto, limitando-nos a achar alterna- sensações limitantes tomarem as rédeas
CABE¥ACHEIADEREmEXÜESSO- tivas para transformar em realidade tudo da nossa vida, fazendo-nos acreditar que
BREOANOQUElCAPARATRÉSE aquilo que desejamos. essa é uma opção mais segura, calma e
ansioso sobre o que está por Quantas pessoas brilhantes, corajosas, tranquila de viver. É assim que deixamos
vir? É uma mistura de sensações positivas determinadas e comprometidas vivem para trás nossas ideias, objetivos, sonhos
e negativas que varia de indivíduo para dessa forma? Elas simplesmente deixam de criança e essência, tudo para viver com
indivíduo, mas normalmente inclui alívio, de lado os seus próprios objetivos devido medo do nosso futuro, mas não nos da-
satisfação, alegria, esperança, medo, an- às interferências que surgem no meio do mos conta de que esse mesmo futuro que
siedade, frustração, entre muitas outras. caminho e nem tentam ir além por medo tememos já está sendo criado, porém, por
Por isso, independentemente do estado de errar, de não serem aceitas ou de sim- outras mãos: as mãos do medo.
atual, nos primeiros meses do ano é pre- plesmente não dar certo. Para alcançar as metas, sejam pesso-
ciso diminuir e reorganizar a mente para AISOUPROlSSIONAIS EDEIXARDELADOTUDO
vivenciar tudo de maravilhoso que a vida ANTES DE aquilo que nos aborrece e não nos serve
pode oferecer. mais, precisamos desmascarar as falsas
PROMOVER UMA
É comum nesse período desenhar- seguranças que os hábitos nos propiciam,
mos planos e projetos para os próximos TRANSFORMAÇÃO, É e sobre as quais constantemente constru-
meses, agregando diversas promessas e NECESSÁRIO FAZER ímos a vida. Para realizar uma mudança,
já sonhando com os resultados. Conse- precisamos morrer metaforicamente para
guimos até visualizar como será quando
UMA VERDADEIRA o que já não faz sentido no momento. É
aquele objetivo for alcançado, sentir a feli- AUTOAVALIAÇÃO, como a metamorfose da lagarta. Para se
CIDADEDEQUANDOlNALMENTECUMPRIRMOS CONSIDERANDO transformar em borboleta, ela desaparece
com tais promessas e até ouvir todas as e “morre” para aquela identidade que não
palavras de incentivo e conforto como se ALGUNS ASPECTOS terá mais propósito dali em diante.
fossem trilha sonora de nossas vidas. Mas QUE VÃO GUIAR AS Antes de promover uma transforma-
qual o verdadeiro saldo dos resultados ção, é necessário fazer uma verdadeira au-
NOSSAS AÇÕES E
dessas promessas depois dos primeiros toavaliação, considerando alguns aspectos
meses do ano? DECISÕES DURANTE que vão guiar as nossas ações e decisões
Todos os sonhos tomam conta dos O ANO COMPLETO durante o ano.
nossos pensamentos, mas muitas vezes Estar consciente de onde se encontra
lCAMOSPRESOSNOhCOMOSERIASEvEDEI- A sensação é de que há um grande no momento e para onde se deseja ir é
xamos todos os objetivos guardados em abismo entre onde se está e o lugar que se UMA DELAS !UTOAVALIA¥ÎO E IDENTIlCA¥ÎO
uma gaveta esperando o momento certo quer chegar. Parece que sempre há mais das próprias competências, qualidades,
de serem realizados. Desse modo, não vi- problemas do que soluções e que surgirão experiências e potencialidades são im-
vemos a vida em plenitude, já que permi- mais obstáculos do que caminhos livres. portantes, assim como os pontos fracos a
timos que as desculpas e os medos falem Daí, então, deixamos o medo e outras SEREM MELHORADOS ¡ IMPORTANTE REmETIR

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casa
i ag em
família v
feliz

r
laze dinheiro

bebê
neg
ó ci o
s

bebê
ento
s am
ca

ainda sobre as motivações e os valores nho e manter a resiliência necessária para Comece hoje mesmo! Não precisa
mais importantes da sua vida. Analise a alcançar aquilo que tanto desejamos. esperar outro ano iniciar para colocar os
situação de partida e a possível evolução .ADAÏMAISDESAlADORDOQUEVIVERDE PLANOS E OBJETIVOS EM PRÉTICA !lNAL  A
e desenhe detalhadamente como irá che- acordo com nossos sonhos, assim como vida tem que ser vivida todos os dias e não
gar ao estado desejado e o que precisa ser nada é tão emocionante que criar objeti- apenas nos primeiros meses de um novo
feito para isso. Ou seja, tenha claro quais vos no pensamento, antecipando-se ao fu- ano. Colher os melhores resultados sem-
serão as suas estratégias, o plano de ação, turo. Nessa busca pelo sucesso e do que o pre é uma tarefa constante e prazerosa.
AEXECU¥ÎOEAFORMADEVERIlCARSEOSRE- faz feliz, recorde-se sempre de que há mo- E lembre-se: sonhos e metas nunca
sultados estão de acordo com cada etapa mentos na vida em que nós também preci- deixarão de existir, pois eles são combustí-
DESENHADA4ERUMPRAZOPARAAlNALIZA- samos “morrer” para o velho e viver o que vel para a vida. Portanto, tenha em mente
ção do processo é importante para que o escolhemos. Somos capazes de decidir que a busca pela realização é constante e
compromisso seja assumido, e ele deve ser sobre pontos limitantes para transformar periódica, por isso não atrase nem deixe
real, ou seja, possível de ser alcançado. tudo o que ousamos sonhar em realidade. para trás aquilo que pode realizar hoje.
IMAGENS: SHUTTERSTOCK/ACERVO PESSOAL

É fundamental, ainda, treinar a auto-


disciplina, pois é dessa forma que evitamos Eduardo Shinyashiki é palestrante, consultor organizacional, especialista em
que o medo nos domine e que comecemos Desenvolvimento das Competências de Liderança e Preparação de Equipes.
É presidente do Instituto Eduardo Shinyashiki e também escritor e autor de
ANOSAUTOSSABOTAR4REINARAmEXIBILIDADE importantes livros como Transforme seus Sonhos em Vida (Editora Gente), sua
é outro exercício essencial para que possa- publicação mais recente. www.edushin.com.br
mos compreender as mudanças no cami-

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livros Por Lucas Vasques

A escuta do silêncio (arquitetura do poema)


Mia Couto, escritor e jornalista moçambicano, escreveu uma das epígrafes do livro Um Fio de Silên-
cio, composto por poemas que resultam de experiências de escuta do silêncio. “Os poemas tratam,
DEMANEIRAGERAL DOFAZERPOÏTICO DAARQUITETURADOPOEMA UMCAMINHOQUEFOISECONlGURANDO
durante a própria construção. Assim sendo, o silêncio foi estruturando todo o processo à medida
que ele está diretamente vinculado à poética da leitura”, explica a autora Daisy Justus. Ao longo
da obra, encontra-se um pouco de música – de Monk a Ravel –, paisagens de cores inesperadas,
retratos do amor e da memória, conversas entre folhas (ao som que sussurra o vento) com outros
escritores e poetas. Além da eterna descoberta que só a literatura – e todas as outras artes contidas
nela, a cada nova história, cena, personagem ou poema – revela, na amplidão de novos sentidos que
despertam a cada leitura.

Um Fio de Silêncio
Autora: Daisy Justus
Editora: 7 Letras
Número de páginas: 80

Vínculos afetivos (manual de sobrevivência)


O amor é um dos temas em que o psicoterapeuta Flávio Gikovate mais se debruçou ao longo de
sua longa carreira. Para ele, ter clareza sobre os obstáculos que impedem experiências amorosas
de boa qualidade é o primeiro passo para avançar no campo sentimental. Pensando nisso, escre-
veu Para Ser Feliz no Amor – os Vínculos Afetivos Hoje, um verdadeiro manual de sobrevivência para
quem precisa entender como as transformações sociais moldam os vínculos afetivos. O livro ensi-
na a amar sem medo e a construir relações sólidas e prazerosas. E se o namoro não evoluir para o
casamento, viver só também é uma boa alternativa. Para o autor, o desenvolvimento tecnológico,
que gerou a boa qualidade de vida para os solteiros, tem deixado as pessoas pouco tolerantes a
CONVÓVIOSCHEIOSDECONmITOS!SSIM UMDOSAVAN¥OSESSENCIAISÏAPREOCUPA¥ÎOMAIORCOMO
IMAGENS: DIVULGAÇÃO

rigor na comunicação.

Para Ser Feliz no Amor – os Vínculos Afetivos Hoje


Autor: Flávio Gikovate
Editora: MG Editores
Número de páginas: 168

Dependência química (impacto nas famílias)


Pesquisas e evidências mostram que o uso abusivo de álcool ou substâncias ilícitas pode causar um
impacto negativo nas pessoas mais próximas dos dependentes. Essa é a tônica do livro Toninho e a
Poção da Falsa Felicidade, ou seja, mostrar o quanto é nocivo o uso de substâncias ilícitas para quem
usa e para seus familiares. A exposição a experiências como violência doméstica, abuso infantil,
ausências prolongadas e negligência se manifesta na forma de sintomas físicos e psicológicos. Dessa
forma, o livro é uma ferramenta que possibilita às crianças o aprendizado de estratégias assertivas
para lidarem com essa dolorosa problemática. Além da história de Toninho, os autores organizaram
UMCADERNODEEXERCÓCIOSCOMSUGESTÜESPARAQUEACRIAN¥ACONSIGAAPRENDERALIDARCOMASDIlCUL
dades decorrentes de alguém da família ser usuário dessas substâncias.

Toninho e a Poção da Falsa Felicidade


Autores: Adriana Zanonato, Luiz Carlos Prado, Maria de Fátima Padin, Marina Gusmão Caminha e Renato Caminha
Editora: Sinopsys
Número de páginas: 64

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livros.indd 34 26/12/2016 18:29:44


Síndromes e distúrbios genéticos
dossiê

Para o AVANÇO
e a COMPREENSÃO
O debate sobre as síndromes
presentes no ambiente social e escolar,
em pleno século XXI, causam dificuldades
de diagnósticos e entendimento de
sintomas e comportamentos
SHUTTERSTOCK

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dossiê

Identidades PLURAIS
Síndromes de Christ-Siemens-Touraine, Marshall,
Waardenburg, Down e Noonan apresentam certas
características similares, mas ainda despertam estranhamento
e desconhecimento nos profissionais de saúde e educação
Por Marlinda Gomes Ferrari, Rogério Drago, Camila Reis dos Santos,
Michell Pedruzzi Mendes Araújo e Lívia Vares da Silveira

E
ste dossiê traz alguns estu- -Siemens-Touraine, Marshall, Wa- uns com os outros do que com seus
dos que têm sido desenvol- ardenburg, Down e Noonan. São próprios irmãos.
vidos pelo Gepei – Grupo artigos breves, que trazem descri- A herança genética dessa síndro-
de Estudos e Pesquisas ções acerca das síndromes em ques- me está relacionada a um gene reces-
em Educação e Inclusão, vinculado tão, além de outras informações que sivo ligado ao cromossomo X (70%
à linha de pesquisa de Diversidade podem ser úteis para o planejamen- dos casos) ou proveniente de uma mu-
e Práticas Educacionais Inclusivas, to da ação pedagógica de sujeitos tação nova nesse cromossomo (30%
do Programa de Pós-Graduação em concretos, já que tais estudos são dos casos). No caso de herança gené-
Educação da Universidade Federal fruto de pesquisas maiores (Drago, tica, como as mulheres possuem dois
do Espírito Santo, que tratam de su- 2013a, 2013b, 2014), que são desen- cromossomos X (cariótipo 46, XX),
jeitos diagnosticados por síndromes, volvidas pelo grupo junto a crian- ela pode ser apenas portadora do gene
às vezes raras, outras vezes nem tan- ças e adolescentes matriculados nas alterado em um de seus cromossomos,
to, mas que se presentificam no am- escolas comuns da educação básica ou seja, ser heterozigotas para o gene e
biente social e escolar e que, em pleno dos diferentes municípios do estado não desenvolver a patologia.
século XXI, ainda causam estranha- do Espírito Santo. Segundo Visinoni (2009), cerca de
mento e desconhecimento por parte 70% das mulheres heterozigotas podem
de profissionais das mais diferentes Síndrome rara manifestar sinais brandos da síndrome,
áreas e do público em geral.
O objetivo deste dossiê é apre-
sentar ao leitor artigos focando
A síndrome de Christ-Siemens-
-Touraine ou displasia ecto-
dérmica hipoidrótica ligada ao
tais como ausência de alguns dentes e
atividade sudorípara levemente dimi-
nuída. Porém, os homens, por terem
síndromes com diferenças feno- cromossomo X é uma síndrome ge- apenas um cromossomo X (cariótipo
típicas e genotípicas, mas que se nética rara, com incidência de um 46, XY), se esse X tiver a alteração gené-
assemelham no sentido de trazer em cada cem mil meninos nascidos. tica, desenvolverão a patologia. Como
para o debate a existência de sujei- Geralmente não afeta o desenvol- o cromossomo X masculino é sempre
tos únicos revestidos da pluralidade vimento intelectual e psicomotor. de origem materna, no caso de herança
identitária, que é subjetivada a par- Pessoas acometidas pela síndrome genética, o gene alterado é transmiti-
tir do diagnóstico. Nesse sentido, de Christ-Siemens-Touraine têm do pela mãe portadora do mesmo para
trazemos as síndromes de Christ- aparência típica e se parecem mais seus filhos do gênero masculino.
Nesse contexto, cabe trazer à tona
Marlinda Gomes Ferrari é licenciada em Pedagogia, mestre e doutoranda em Educação pelo PPGE/CE/UFES.
algumas definições do site da Funda-
Rogério Drago é autor do livro Síndromes: Conhecer, Planejar e Incluir (Wak). Licenciado em Educação, é mestre ção Nacional de Displasias Ectodér-
pelo PPGE/CE/UFES, doutor pela PUC-Rio e pós-doutor em Educação pelo PPGE/CE/UFES. micas (NFED), que tem por objetivo
Camila Reis dos Santos é bióloga e licenciada em Pedagogia. Mestre em Educação pelo PPGE/CE/UFES e pesquisar, informar e conectar pessoas
doutoranda do Programa de Pós-Graduação em Biologia Vegetal-PPGBV-UFES. acometidas por displasias ectodérmi-
Michell Pedruzzi Mendes Araújo é biólogo, mestre em Educação pelo PPGE/CE/UFES e doutorando do cas. No site, é destacado que o corpo é
Programa de Pós-Graduação em Biologia Vegetal-PPGBV-UFES.
formado por bilhões de células, sendo
Lívia Vares da Silveira é licenciada em Pedagogia e mestre em Educação pelo PPGE/CE/UFES.
que cada célula tem em seu interior uma

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pequena estrutura central chamada (2007): “O genoma humano apresen- São os cromossomos que transpor- Síndromes e distúrbios genéticos
núcleo. Dentro do núcleo estão os cro- ta, aproximadamente, cerca de 35 mil tam as informações genéticas da célula-
mossomos, que são pequenos cordões genes, que são unidades de informação -mãe para as células-filhas. Nesse sen-
de fio de material genético (DNA). Os genética, distribuídos em locais exatos, tido, qualquer alteração no número de
cromossomos, por sua vez, são compos- numa molécula de DNA (ácido deso- cromossomos ou na sequência de seus
tos por genes. Para entender melhor o xirribonucleico), e que, em conjuntos, genes, durante a meiose, produz uma
conceito de genes basta pensar em uma estão compactados em um aspecto de inviabilidade celular, na formação dos
célula como uma caixa de joias e no nú- bastão denominados cromossomos. Os gametas e/ou após a formação do em-
cleo como uma das gavetas da caixa. Os genes estão distribuídos em 23 pares brião, e muitas vezes resulta em anoma-
cromossomos podem ser considerados de cromossomos, dos quais 22 pares lias ao indivíduo, que recebem o nome
como um colar de pedras na gaveta, e os são designados autossomos e dois são de aberrações cromossômicas.
genes como cada pedra desse colar. sexuais, X e Y; uma mulher normal é Diante disso, cabe antever que a
Nesse mesmo caminho, cabe tra- representada pela notação 46, XX, e o síndrome de CST possui suas origens
123RF

zer ao debate a fala de Vasconcelos homem pela notação 46, XY (p.13). relacionadas com os genes – entidades

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dossiê

A avaliação do padrão genético


Como o cromossomo X familiar, examinando as mulheres
masculino é de origem
materna, no caso de
quanto ao padrão de distribuição cor-
herança genética, o gene poral das glândulas sudoríparas, exame
alterado é transmitido odontológico, preferencialmente com
pela mãe portadora para o uso de ultrassonografias, pode ser
‚   utilizada para o diagnóstico diferencial
entre displasia ectodérmica ligada ao X,
autossômica recessiva ou dominante.

Tratamento
O tratamento dos sujeitos com
síndrome de CST é puramente
paliativo e tem por objetivo fornecer
uma melhoria nas condições de vida,
aumentando o conforto e a autoesti-
ma. Portanto, é recomendado con-
São os cromossomos que transportam as informações trolar a temperatura corporal através
de banhos frios, compressas frias,
\ IG
GI\G¢ÔGGGI\G¢‚ G: bebidas geladas, ambientes refrigera-
Nesse sentido, qualquer alteração no número de dos, uso de roupas leves e evitar es-
forço físico. Além disso, é importante
cromossomos ou na sequência de seus genes, o acompanhamento de uma equipe
durante a meiose, produz uma inviabilidade celular multidisciplinar que inclua: pediatra,
geneticista, dermatologista, odontólo-
genéticas responsáveis pela heredita- orelhas grandes; pele fina, lisa, seca e go, psicólogo e pedagogo.
riedade. As principais características ocasionalmente podem ocorrer áreas Os indivíduos com hipodontias
fenotípicas (aspecto físico, exterior) com alteração de pigmentação; perda graves poderão ser submetidos a tra-
do indivíduo com a síndrome de auditiva pode ocorrer raramente; foto- tamentos protéticos, para aumentar
Christ-Siemens-Touraine são: ausên- fobia; desenvolvimento defeituoso ou
cia ou defeitos nos dentes; sudorese incompleto dos ductos lacrimais; dis-
ausente ou diminuída, resultando trofia da córnea; diminuição da fun-
em intolerância ao calor, sendo que a ção das glândulas lacrimais.
capacidade reduzida de transpiração O diagnóstico deve ser suspeitado
resulta em hipertermia e os pacientes diante da descamação ao nascimento
manifestam febre intermitente, em es- e/ou uma febre recorrente de origem
pecial durante o clima quente e após desconhecida logo no primeiro ano
exercícios ou refeições; ausência ou
escassez capilar e corporal. Os cabe-
de vida. A incapacidade de transpirar
na intolerância ao calor pode causar
ŒCaracterísticas secundárias Œ
Algumas características secundárias
los são finos, esparsos, secos e pouco incapacitação severa e febre alta acima da síndrome de Marshall incluem pele
pigmentados. Curiosamente, a barba e de 40º C após um pequeno esforço ou flexível, unhas em forma de “colher”,
bigode são normais, apesar de os pelos mesmo durante a alimentação. A fe- esclera (tecido fibroso externo que re-
pubianos e da axila serem escassos. bre também pode causar convulsões, veste o globo ocular, conhecido como
Geralmente, as unhas são normais, podendo resultar em danos neuro- branco do olho) azul, idade óssea ace-
mas podem ocorrer distrofia (unhas lógicos. A biópsia da pele fetal com o lerada, tórax estreito, escoliose, testa
defeituosas) ou ausência ao nascimen- uso de fetoscópio e a ultrassonografia proeminente, problemas respiratórios,
dificuldades na alimentação, arco pala-
to, podendo ser frágeis ou quebradiças. 3D podem ser instrumentos úteis na
tino elevado, falanges médias das mãos
A pessoa pode ter também lábios gros- detecção da síndrome de um embrião
anormais, pés longos, calcanhares pro-
sos, proeminentes; ponte nasal baixa; ainda na fase intrauterina. eminentes, retardo psicomotor, retardo
nariz em sela1 com base achatada; ru- no crescimento, orelhas pequenas.
gas ao redor dos olhos, nariz e boca; 1
Destruição maciça do tecido nasal.

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Síndromes e distúrbios genéticos
Mutações no gene PARA SABER MAIS

COL11A1 podem alterar a ADOLESCENTE COM CST NÃO


produção de colágeno, APRESENTA PROBLEMA DE APRENDIZADO
resultando na síndrome

(G G: N o ano de 2013, foi matriculado no Instituto Federal de Ensino do Espírito
Santo – IFES um adolescente de 15 anos com uma aparência envelhecida,
poucos cabelos, rosto enrugado, pele seca. Visto que o aluno apresentava certa
características descritas diferença dos padrões estéticos de normalidade estabelecidos na contempora-
pelas literaturas incluem neidade, houve uma conversa com ele, sendo constatado que era acometido por
uma doença rara, conhecida como síndrome de Christ-Siemens-Touraine. A par-
miopia severa, nariz tir daí, foram realizadas pesquisas em sites da internet, onde foi possível encon-
trar alguns estudos na área médica sobre a referida síndrome. Agora, em 2016,
“em sela”, perda auditiva ele está cursando o 4º e último ano em um curso técnico integrado ao ensino
IÈ G G G médio, é extremamente dedicado, organizado, não apresentou nenhum proble-
ma de aprendizagem no referido instituto federal, é elogiado pelos professores
médio facial e rodeado de amigos, que, inicialmente, também estranharam sua “aparência di-
ferente”. Porém, ao saber que se tratava da síndrome e tomarem conhecimento
as eficiências mastigatória e fonética, desta através de pedagogos e professores, a curiosidade cessou. O aluno passa
bem como proporcionar uma apa- por problemas de aceitação de sua autoimagem (maneira pela qual o indivíduo
rência mais harmônica, elevando sua se percebe e se sente em relação ao próprio corpo), interferindo no seu auto-
autoestima. Em crianças, porém, esse conceito (percepção do indivíduo sobre si como resultado de suas interações
trabalho pode ser dificultado, mas sociais e de determinantes ideológicos) e na sua autoestima (sentimento de valor
não impossibilitado, pela necessidade que acompanha essa percepção que há de nós próprios).
de constantes modificações nas pró-
teses, uma vez que as arcadas dentá-
rias estão em desenvolvimento, e pela Infelizmente, há uma incipiência de quem tem suas vulnerabilidades
pouca colaboração do indivíduo. de estudos que buscam dar visibili- expostas para além dos limites da es-
dade a esses sujeitos, principalmente cola (Freitas, 2013).
Condrodisplasia no que diz respeito aos processos de

S egundo os autores do artigo, a


síndrome de Marshall (SM) é ca-
racterizada por uma condrodisplasia
inclusão. Nesse sentido, é preciso per-
mear questões inerentes aos sujeitos
incluídos na escola comum, não mais
Caso
A ssim, esse estudo buscou compre-
ender aspectos da vida escolar e
(doença óssea constitucional, em que na perspectiva de quem enxerga o identitário de uma criança de 11 anos
o desenvolvimento cartilaginoso dos “pessoal da inclusão”, mas sob o olhar (nome fictício de Mariana) com sín-
ossos foi modificado por alterações
genéticas, metabólicas, mecânicas ou
vasculares) de caráter genético. Estu-
dos acerca da SM apontam que as
alterações relacionadas à síndrome se
devem a uma mutação na região ter-
minal do gene COL11A1 (Marwah;
Josh, 2005).
Mutações no gene COL11A1 po-
dem alterar a produção de colágeno,
resultando nas características da sín-
drome de Marshall. As características
descritas pelas literaturas disponíveis
incluem miopia severa, nariz em sela
(destruição maciça do tecido nasal),
IMAGENS: 123RF

perda auditiva congênita e hipoplasia *IÔI


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G G\ I‡)ˆ99G9Ô
médio facial. compostos por genes

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dossiê

)G(G G9\I G€ 


aos sujeitos incluídos na escola comum, não mais na
perspectiva de quem enxerga o “pessoal da inclusão”,
GH G
GGH 
G

expostas para além dos limites da escola
drome de Marshall, matriculada no 6º Marshall; como a síndrome interfere ŒAcompanhamento Œ
ano de uma escola municipal de Serra- ou não em sua vida. No caso da aluna Mariana citada no tex-
-ES. Como procedimento para coleta Quando indagada a respeito de to principal, vale ressaltar que ela não
possui atendimento educacional espe-
de dados, optou-se pela aplicação de sua rotina e de como se descreveria, a
cializado (AEE) na escola em questão.
um questionário. A escolha pelo ques- mesma se diz uma garota “tranquila”,
Os sintomas da síndrome que afetam
tionário foi adequada para o estudo em que gosta de ficar “na dela”, de ler e sua visão e audição são acompanhados
questão, uma vez que permitiu maior mexer no computador. Afirma não ter periodicamente pelos profissionais mé-
liberdade nas respostas do entrevista- amigos, pois suas amizades são since- dicos. Por não ter déficit cognitivo, a es-
do, além de favorecer a obtenção dos ras. Seus amigos, segundo ela, são seus cola considera desnecessário o acom-
dados de forma mais rápida e precisa pais e seu irmão. panhamento junto à profissional de AEE.
(Marconi; Lakatos, 2003). Sobre suas preferências e interes-
O questionário aplicado à criança ses, ressalta a paixão por livros e diz
contemplou, dentre outros aspectos: ter dúvida entre cursar Medicina ou espaços, influenciam decisivamente na
rotina de Mariana; como a criança Biologia, suas perspectivas profissio- formação e constituição do ser humano
se descreve; suas preferências; se tem nais. Torna-se relevante citar o víncu- (Santos, 2013).
interesse específico por alguma área lo familiar de Mariana, que se cons- Outro aspecto interessante diz
do conhecimento; sua vida escolar; titui forte no discurso: “Minha mãe respeito ao caráter social da deficiência
sua relação criança-criança e adulto- sempre me acorda com um beijo ou imerso no discurso de Mariana. Ao ser
-criança; seu relacionamento familiar; um abraço, é uma pessoa amigável e indagada se mudaria algo nela mesma,
o que conhece sobre a síndrome de honesta e também generosa. Meu pai a resposta foi a seguinte: “Não, eu não
é uma pessoa presente e mudaria. Estou satisfeita como eu sou”.
ajuda nos meus deveres de
casa, é uma pessoa brinca- Visão da mãe
lhona e muito divertida, é
uma pessoa legal, ele é co-
rajoso, honesto, generoso.
C abe agora contar a história narrada
pela mãe, durante conversa infor-
mal. Ela disse que em nenhum mo-
É um cara que ajuda as pes- mento do pré-natal foi diagnosticada
soas. Meu irmão às vezes ou presumida a síndrome de Marshall.
é um cara implicante, mas Ao nascer, Mariana apresentou altera-
eu gosto dele. Ele me ajuda ções na face e na tonalidade da pele. A
nas coisas quando eu mais mãe relatou ter superado todas as ad-
preciso, é um cara legal”, versidades e disse que Mariana é a filha
diz Mariana. que toda mãe teria sonhado ter. Com o
Percebe-se que a influ- passar dos anos, a criança foi se desen-
ência da família de Mariana volvendo naturalmente, e suas feições
parece ter sido uma media- faciais mudaram bastante, sendo não
ção positiva em seu processo perceptíveis as características físicas pro-
de constituição identitária. venientes da SM. Sua capacidade psico-
As formas como são cons- motora não foi afetada e há um atraso
truídas as relações entre os pouco significativo em seu crescimento.
 I G IGGI^ IG^ IG
G-.ÔdGÈI G sujeitos, sejam elas no con- A partir do relato da mãe perce-

 
e
G
 ^
G9 texto familiar, escolar ou bemos que a própria ação do defeito
resultando em intolerância ao calor ainda em outros diferentes resulta sempre de forma secundária no

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Síndromes e distúrbios genéticos
Os genes, na CST,
estão distribuídos em 23
pares de cromossomos,
dos quais 22 pares são
designados autossomos
e dois são sexuais, X e
3eG G
é representada pela
notação 46, XX, e o
GGhÔ
46, XY
#P hÔ
G^
-.
G
G
IGGhÔGGI ¤GH
 

I I
G  G

G Em suma, por meio dos relatos de
Mariana, e sustentados em uma pers-
sujeito com limitações orgânicas, isto é, te dos colegas de sala ou por qualquer pectiva histórico-cultural, observa-
não de forma direta, mas de forma refle- outro profissional da escola, apesar de -se que, a partir da ação do sujeito no
tida. E esse reflexo se refere ao plano so- ficar claro em seu discurso que não tem mundo, tem-se a produção de signifi-
cial. A defectividade, segundo Vigotski muitas amizades. Foi pontuado pela cados e sentidos e que em cada espa-
(1997), é um conceito social. Mariana criança, durante conversa informal em ço social o sujeito vive experiências as
se aceita como é, tem sua identidade, sua casa, que os alunos da sua turma quais constituem sentidos subjetivos,
suas vontades, desejos e sonhos. As di- são “bagunceiros” e “desinteressados” e que reverberam em seu processo de
ficuldades derivam de uma sociedade acabam atrapalhando a aula. formação identitária.
preconceituosa, imersa em discursos
REFERÊNCIAS
vazios de incapacidade em torno de li-
 "*9 :.G
 ‚I ÈI Gd$IÔ IG GhÔ: 
%G d
mitações orgânicas. Wak, 2014.
Quando perguntada se a síndrome _________. Estudos e Pesquisas sobre Síndromes: G
G: 
%G d1G9=;<>G:
interfere de alguma forma em sua vida,
_________. Síndromes: I9+G G$I :=s
: 
%G d1G9=;<>H:
Mariana destacou: “Só o fato de usar
!/)gÉ*)GI G
 G G I
\ IG: ^d¼ d¤¤:
:¤»:I
os óculos e o aparelho de audição, mas d<;
:=;<?:
o restante sou uma pessoa qualquer”. 0-*) '*-9: 

GÈI G
GHGh€IÏ IGGI G


Nesse sentido, a questão social pode ser G/
G

"\ IG
$ 
G GhG<DD==;;=9 GhÔ‡(G

uma ferramenta amplificadora ou, por  ÈI Gˆ:!GI
G

(
I G
G/ 
G

-Ô+G9-Ô+G9=;;B:
outro lado, limitante da diversidade. Se 0$-$)*)$9:!: G G I
\ IG®  Ô
9GG GhÔ
HGI

G

a diversidade é encarada como “anor- G G
GP 
G G
 <:.‡G
"\ IGˆ:/ 
G

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G
+GGP9  HG9=;;D: ^d <http://dspace.c3sl.ufpr.br/dspace/bitstream/
malidade” ou é “invisibilizada” por
handle/1884/18101/Displasias%20Ectodermicas.pdf?sequence=1>.Id=< :=;<?:
influência dos processos culturais se-
! $.-9(::
:O Aluno Incluído na Educação Básica:G GhÔ+GÈI G:-Ô+Gd
gregadores, que tendem à homogenei- 9=;<>:
zação, o desfecho malquisto é o da pro- "$'9::Estudo de Caso. -Ô+GdG9=;;D:
dução da desigualdade em detrimento %*--*9(::GGhÔ
 GG 
GGGhÔ
 ` G

G:Educação9:>9:A>9
da heterogeneidade (Santos, 2013). :?<>¢?>C9:¤
:=;;B:
Com relação ao relacionamento de
IMAGENS: 123RF/SHUTTERSTOCK

'&.*-9 :(:e( *)$9(::!


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(
 G ^‚IG:-Ô+GdG9=;;>:
Mariana com os “personagens” da es- ( 1#9+:e%*-#$9-:(G G
: Indian Pediatrics9:?=9:<BB¢<BC9=;;@:
cola Céu Estrelado, ela afirma ter uma -).*-9: :+I
‚I ÈI G I^ 
0 ` Gd
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ótima relação com todos. Mariana não <@>: GhÔ‡(G

IGhÔˆ:/ 
G
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G
 ^ -G90 ` G9=;<>:
relata ter sofrido preconceito por par- 03"*.-&$9':-:Obras Escogidas:!
G
I^G90:(G
 d0 9<DDB:

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dossiê

Estudos
de CASOS
esclarecem
DÚVIDAS
Algumas síndromes, conhecidas por serem
doenças genéticas, são mais comuns do
que a maioria das pessoas acha e, aos
poucos, vão sendo desvendadas por
intermédio de pesquisas teóricas e práticas
Por Euluze Rodrigues da Costa Junior, Josué Rego da Silva, Michelli Drago,
Rogério Drago, Aline de Melos Catrinck, Eduardo Lopes da Cunha e Raíssa
dos Santos Prado, Dirlan de Oliveira Machado, Israel Rocha Dias

P
ensar sobre a síndrome de os familiares. A motivação pela te- – PPGE da Universidade Federal do
Waardenburg não é uma mática foi potencializada a partir do Espírito Santo – UFES.
novidade para os autores contato com outros pesquisadores A partir dos estudos de Martins,
deste artigo. O interesse da linha de Diversidade e Práticas Yoshimoto e Freitas (2003), Barzotto
havia surgido a partir da observação Educacionais Inclusivas, do Progra- e Folador (2004) e Araújo, Araújo e
de traços comuns da síndrome entre ma de Pós-Graduação em Educação Gonring (2014), a síndrome de Wa-
ardenburg foi descrita inicialmente
Euluze Rodrigues da Costa Junior é mestre em Educação (UFES), professor assistente do pelo oftalmologista e geneticista ho-
Departamento de Linguagens, Cultura e Educação da Universidade Federal do Espírito Santo landês P. J. Waardenburg no ano de
(DLCE/UFES).
1951. A síndrome de Waardenburg é
Josué Rego da Silva é mestrando em Educação (PPGE/UFES) e graduado em Letras-Libras. É bolsista
Capes/DS.
uma doença de incidência genética,
Michelli Drago é especialista em Educação Especial Inclusiva, graduada em Educação Física e professora
de herança autossômica de penetrân-
de Educação Física na Prefeitura Municipal de Vitória. cia e expressividade variada, e pode
Rogério Drago é licenciado em Educação, mestre em Educação pelo PPGE/CE/UFES, doutor em representar cerca de 3% das causas de
Educação pela PUC-Rio e pós-doutor em Educação pelo PPGE/UFES. surdez em crianças. Ainda segundo os
Aline de Melos Catrinck, Eduardo Lopes da Cunha e Raíssa dos Santos Prado são licenciados em estudos, os sinais clínicos são repre-
Pedagogia pela UFES.
sentados pela heterocromia total ou
Dirlan de Oliveira Machado é mestre em Educação pelo PPGE/CE/UFES, especialista em Artes,
Gestão Escolar e Alfabetização e Letramento. Licenciada em Pedagogia, professora de Educação parcial da íris; mecha branca frontal de
Especial no município de Viana e professora de Ações Inclusivas no município de Cariacica, ambos cabelo; surdez profunda unilateral ou
no Espírito Santo. bilateral; entre outras.
Israel Rocha Dias é mestre em Educação pelo PPGE/CE/UFES, licenciado em Pedagogia, professor do Segundo Barzotto e Folador
Atendimento Educacional Especializado e dos Anos Iniciais do Ensino Fundamental, ambos no município
de Serra, no Espírito Santo. (2004), a origem genética é respon-
sável por cerca de 50% de indivíduos

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Síndromes e distúrbios genéticos
com deficiência auditiva profunda. surdez são os sintomas mais preocu- meados do século XX, focalizavam
Eles podem ter tanto a deficiência pantes da síndrome de Waardenburg. pressupostos clínicos. Em segundo
auditiva isolada quanto o somatório Entretanto, apoiados em Elias (2014), lugar, deve-se ressaltar que um indi-
de outras características da síndro- percebe-se que a produção de conhe- víduo surdo ou com deficiência audi-
me em órgãos diversos. Além disso, cimento que emerge nas academias tiva causada pela síndrome de Waar-
a partir dos autores, compreende-se não ocorre de imediato e descolada denburg se comunicará por meio das
que um indivíduo com a síndrome de dos contextos sociais as quais estão línguas de sinais a partir do contato
Waardenburg parcial pode transmitir inseridos o pesquisador e o objeto/ com essa língua.
o quadro completo para seu filho. sujeito de pesquisa. Diante disso, pode-se destacar
Nessa direção, por meio do es- Nessa direção, é possível discor- o caso de Carlos (nome fictício), 26
tudo de Araújo, Araújo e Gonring dar de Martins, Yoshimoto e Freitas anos, filho de pais surdos. Ele nasceu
(2014), é possível entender que a (2003) e concordar com Araújo, Araú- diagnosticado com surdez bilateral
prevalência varia entre 1:30.000 e jo e Gonring (2014), no sentido de cri- profunda, casado com uma pessoa
1:42.000 e a mutação responsável ticar os estudos que se ancoram ape- surda, tem uma filha ouvinte e atua
pela síndrome localiza-se no braço nas nos modelos clínicos terapêuticos como professor de Língua Brasileira
longo do cromossomo 2 e determina e não discutem sobre os indivíduos em de Sinais – Libras.
a perda de função do gene 1,23-28. A outras redes de interdependência as O seu conhecimento sobre a sín-
intensidade da síndrome pode variar quais constituem. drome se deu por meio da própria fa-
e aparecer no nascimento ou em ida- A fim de discutir a síndrome de mília, pois havia outros casos em seu
de posterior, sob quatro formas clíni- Waardenburg a partir de outras redes seio familiar, por exemplo, a mãe, a
cas (Barzotto, Folador, 2004). de interdependência, primeiramente, avó e a bisavó. Entretanto, de acordo
SHUTTERSTOCK

Para Martins, Yoshimoto e Frei- é importante lembrar que os estudos com Carlos, apenas ele e sua mãe têm
tas (2003), a deficiência auditiva ou a pioneiros sobre essa síndrome, em surdez profunda. O entrevistado re-

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dossiê

da Libras. Na infância, o que mais in-


comodou Carlos, em contato com ou-
vintes nas redes de interdependência
dos espaços escolares, foram as signi-
ficações pejorativas que giravam em
torno de sua surdez. Ele lembra que foi
constantemente elogiado pelo fato de
ter olhos azuis e, quando perguntado,
especialmente a respeito dos cabelos
brancos, explicava, por meio de sinais
ou pela escrita, a síndrome para seus
colegas surdos ou ouvintes.

Mais comum
/GGGI
GG^

1GG
HGI GG
I GI
G  
G
IGG‚ 
O s pesquisadores que produ-
ziram este artigo, criaram es-
tudos, como Thompson (2008) e
Castro e Ferrari (2013), para abordar
A origem genética é responsável por cerca de 50% a síndrome de Down, considerada
como o acidente cromossômico mais

 
^
I
‚I ÈI GG
 G
G: comum e conhecido, com frequên-
* 
^

GG
‚I ÈI G cia de um caso para cada 800 nasci-
mentos. Essa incidência elevada tem
auditiva isolada quanto o somatório de outras forte relação com a idade materna,
características da síndrome em órgãos diversos acometendo com maior frequência
mulheres com 35 anos de idade ou
lata que, segundo seus pais, a surdez naquela época e, a partir do diagnós- mais (Thompson, 2008).
nunca foi preocupação durante a sua tico, confirmaram a surdez. Ainda segundo estudos, a proba-
gestação, e quando completou nove Desde a infância, Carlos frequen- bilidade de ocorrência de uma ges-
meses de idade descobriram que ele tou espaços da comunidade surda tação de um bebê com síndrome de
era surdo. Procuraram um médico onde a comunicação ocorria por meio Down para uma mulher de 20 anos se
dá em torno de 1 caso para 1.600 nas-
PARA SABER MAIS cimentos, enquanto para uma mulher
de 35 a frequência é de 1 para cada
MÉTODOS DE DIAGNÓSTICO DA 370 (Griffths apud Castro; Ferrari,
SÍNDROME DE DOWN 2013). Esses mesmos autores apon-
tam, ainda, que apesar do risco subir
O diagnóstico confirmatório da síndrome de Down é feito logo após o nasci-
mento do bebê, por meio do exame chamado cariótipo. No entanto, exis-
tem outras técnicas, que são chamadas de métodos invasivos e métodos não
gradativamente após os 30 anos de
idade, tem aumentado o número de
invasivos. Os principais métodos invasivos são a amniocentese1 e a biópsia do casos em mães mais jovens, porém a
vilo corial2, que tem por finalidade analisar o líquido amniótico e uma amostra da causa ainda é desconhecida.
placenta. Segundo Castro e Ferrari (2013), esses métodos são confirmatórios, Essa síndrome foi descrita pri-
no entanto são dolorosos e oferecem risco de aborto em torno de 1%. Entre os meiramente pelo médico inglês
métodos não invasivos destaca-se a análise da translucência nucal pelos exames John Langdon Down em 1866. Po-
ultrassonográficos, nos quais é possível detectar alguma anormalidade. Por meio rém, apenas em 1959 o geneticista
do ultrassom morfológico, por exemplo, podem-se observar os marcadores francês Jérôme Lejeune verificou
anatômicos do osso nasal, que são diferentes em um bebê com síndrome de que a causa da síndrome de Down
Down. Esses tipos de exame não oferecem risco, contudo não podem ser usa- era genética, “sendo resultado de
dos como métodos confirmatórios, mas apenas como marcadores de risco. uma alteração tipo numérica, que
 GG\ GGIG
^
G ` I‡^

GHGHG GˆGG‚
GP :
1 ocorre durante a divisão celular do
 GIGG

IGHG 
P :
2
embrião ou durante a formação dos

44 psique ciência&vida
Síndromes e distúrbios genéticos
‚

I G^

1GG
H
a partir de outras redes de interdependência,
primeiramente é importante lembrar que os estudos
pioneiros sobre essa síndrome, em meados do
século XX, focalizavam pressupostos clínicos
Œ Cromossomos Œ geralmente com uma prega transver- com a síndrome possui característi-
Normalmente, nas células da espécie
humana existem 46 cromossomos di-
sa palmar única; os pés apresentam cas que se assemelham ao Alzhiemer.
vididos em 23 pares. Porém, em 95% maior separação entre o hálux e o E Mello (apud Castro; Ferrari, 2013,
dos indivíduos com a síndrome de segundo dedo; hipotonia muscular; p. 222-223) ressalta que: “[...] aparen-
Down encontram-se em suas célu- alterações visuais e auditivas. temente, o Alzheimer não se origina
las 47 cromossomos divididos em 23 No que tange ao desenvolvi- a partir de determinado período da
pares, estando o cromossomo extra mento cognitivo dos indivíduos com vida desses indivíduos, mas, sim, al-
ligado ao par 21, o que se chama de síndrome de Down, Bissoto (2005) terações histológicas semelhantes às
trissomia livre. apresenta algumas concepções que encontradas no mal de Alzheimer [...]
relacionam o declínio das capacida- culminando na manifestação de de-
gametas dos seus genitores” (Cas- des referentes à linguagem e de es- mência em uma idade mais avançada.
tro; Ferrari, 2013, p. 218). quemas motores ao atingir a adoles- Essa tese é reforçada pelo fato de que
Os estudos destacam também cência e a possibilidade mais elevada genes importantes para a patogenici-
que, além da trissomia do cromos- de tais indivíduos desenvolverem o dade da doença de Alzheimer estão
somo 21 existe a síndrome de Down mal de Alzheimer, ressaltando resul- localizados no cromossomo 21.
Mosaico, que atinge cerca de 2% dos tados obtidos por meio de pesquisas Algumas questões ainda valem
indivíduos e é detectada por meio do de Devenny e colaboradores (1992, ser ressaltadas, considerando de-
exame cariótipo, que mediante uma apud Bissoto, 2005) que “não reve- terminadas características que são
amostra de mistura de células é en- laram achados significativos a apoiar postas como sendo próprias do su-
contrada uma porcentagem das célu- a hipótese de correlação entre en- jeito com síndrome de Down, como
las com a trissomia do 21 e outra por- velhecimento e decréscimo das fa- por exemplo a sexualidade aflorada
centagem sem a trissomia. E, ainda, culdades cognitivas dos portadores e a afetuosidade. Muitas vezes essa
as translocações, que ocorrem em 3% de síndrome de Down” (p. 82). No correlação ocorre por não haver um
a 4% dos casos e ocorre quando a có- entanto, Mello (apud Castro; Ferra- conhecimento mais amplo acerca da
pia do cromossomo 21 é translocada ri, 2013) afirma que a demência que síndrome, ou até mesmo por não con-
para outro cromossomo, geralmente geralmente se manifesta em adultos siderar outras possibilidades, sejam
os de números 14, 21 ou 22. elas do ccontexto social ou biológico
As principais características
cas des- indivíduo, o que acaba por ser mis-
do indiví
sa síndrome são: déficit cognitivo,
ognitivo, tificado ccomo tal.
que varia de acordo com os estímu- A sexualidade
sex aflorada é um dis-
los utilizados a fim de potencializar
ializar o túrbio sesexual e não tem relação com
desenvolvimento dos indivíduos uos que o déficit cognitivo. A afetuosidade
apresentam a síndrome; vulnerabili-
nerabili- relacionada com a consideração
está relac
dade maior a algumas doenças, as, como de que ttais sujeitos são mentalmen-
cardiopatias e problemas respirató-
espirató- te crianças.
crianç Vale salientar que essas
rios; baixa estatura; olhos amendoa-
mendoa- características podem ser atenuadas
caracterí
dos com a presença das manchasnchas de dependendo do modo como são sig-
dependen
Brushfield na íris; ponte nasal
3
al baixa; nificadas (ou não) no contexto social
pescoço curto; mãos curtas e largas,
IMAGENS: 123RF/SHUTTERSTOCK

^

1GG
H\G

hG
 I
ÈI G\ IG9
-ÔHGI
>

G  G
G^ 
  G

 IIGGI^ IGG
a uma agregação de um elemento normal IIG
>Ú
GIGG



G^ ‡I
I  ˆ: em crianças

www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 45


dossiê

A síndrome de Down foi descrita primeiramente grande; nariz bulboso e a ponta nasal
achatada e a base alargada. Na fase
\
I È% 'G
 escolar, a face parece grotesca ou fá-
<CAA:+\9GG<D@D I G cies miopáticas5, e o contorno facial
torna-se triangular.
GIÈ%\Ï'  ‚IGIGG No período da adolescência e no
da síndrome de Down era genética adulto jovem: os olhos tornam-se me-
nos proeminentes; o nariz mais fino,
(macro) e no contexto escolar (mi- em 1963, baseados em nove pacien- com a ponta nasal mais alta; o pescoço
cro). Pode-se ressaltar que o ser hu- tes de ambos os sexos, definiram é alado ou com trapézios proeminen-
mano tem possibilidades infindáveis uma nova condição, distinta da sín- tes. Na fase adulta: as pregas nasola-
e a síndrome de Down e suas caracte- drome de Turner, que mais tarde biais6 são proeminentes; a implemen-
rísticas precisam ser entendidas pelo veio a receber o epônimo síndrome tação de cabelo na fronte é alta; a pele
viés social, sem desmerecer o viés bio- de Noonan. Caracteriza-se por baixa torna-se enrugada e transparente.
lógico. Porém, o segundo não pode estatura, defeito cardíaco, pescoço Ao nascer, o comprimento mé-
ser impeditivo do primeiro. curto ou alado, deformidade toráci- dio do bebê é de 47 cm e o peso é em
ca, fácies características com hiper- geral normal em 40% dos afetados
Herança dominante telorismo 4 e deficiência intelectual pela síndrome de Noonan. Durante

D irlan de Oliveira Machado e


Israel Rocha Dias alertam que,
segundo Brasil (2009), a síndrome de
em alguns casos.
As características craniofaciais
nos afetados pela síndrome de Noo-
a infância o crescimento tem a velo-
cidade normal, o tórax largo parece
curto e os mamilos baixo-implanta-
Noonan apresenta herança dominan- nan, segundo Gonzalez (1993), modi- dos. Nas axilas há uma prega cutâ-
te e é considerada uma síndrome re- ficam-se com a idade. De modo geral, nea que persiste até a fase adulta. Po-
lativamente frequente na população. as principais características podem rém, o crescimento na puberdade, na
Na síndrome de Noonan, pelo menos ser assim visualizadas – no período idade do estirão, pode ser reduzido.
quatro genes dessa via são responsá- neonatal, os achados principais são: A idade óssea está atrasada em cer-
veis pelo fenótipo: PTPN11, SOS1, hipertelorismo com inclinação pal- ca de 20% dos casos. A estatura final
RAF1 e KRAS. Mutações no gene pebral antimongoloide 95%; orelhas média do homem é de 162,5 cm e na
PTPN11, o primeiro gene descrito com implantação baixa ou posteriori- mulher 152 cm.
em associação com a síndrome, são zada; excesso de pele e baixa implan- São encontrados problemas car-
encontradas em aproximadamente tação de cabelo na região posterior díacos em 2/3 dos indivíduos com
40% dos casos. O segundo gene des- do pescoço; cabeça relativamente síndrome de Noonan. Como obser-
crito, KRAS, é responsável por cerca vado por Malaquias et al. (2008) e
de 2% dos casos que não apresentam Brasil (2009), algumas cardiopatias,
mutações no gene PTPN11. Mu- como o prolapso da válvula mitral, o
tações no gene KRAS estão presen- ventrículo único, a estenose do ramo
tes em pessoas com a síndrome com da artéria pulmonar e a anomalia de
deficiência intelectual e/ou atraso no Ebstein, têm sido descritas nos afeta-
desenvolvimento mais acentuado. dos. O eletrocardiograma revela que
Muitas vezes a síndrome de Noonan é as principais anomalias cardíacas en-
chamada inapropriadamente de “sín- volvem o lado direito do coração.
drome de Turner masculina”. Porém, Œ Citogenética Œ No sexo masculino, em relação
pode ocorrer tanto no sexo masculino No início de 1930, os médicos reco- ao sistema geniturinário observa-se
quanto no feminino. Sua incidência nheciam que alguma alteração cromos- um desenvolvimento puberal com
foi estimada entre 1:1.000 e 1:2.500 sômica poderia explicar a síndrome de virilização e subsequente fertilidade
nascidos vivos, sendo uma das mais Down e suas características fenotípicas
primeiramente descritas. Todavia, essa 4
Olhos muito distanciados
frequentes síndromes associadas a @
*
I
G
ÏIG9
constatação só foi possível por meio
problemas cardíacos. dos avanços da citogenética, que pos- GG
PHGIG^
GPH 
A primeira descrição da sín- mostram salientes.
sibilitou, por meio de várias técnicas, a A
-Ô
G
HG
9G
IG
GG


drome de Noonan foi feita por Ko- análise dos cromossomos humanos. 9I

GGG
G G\
bylinski em 1883. Noonan e Ehmke, IG
GHIG

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Síndromes e distúrbios genéticos
em cerca de 40% dos casos. A criptor-
quidia7 pode causar espermatogênese
deficiente, podendo provocar inferti-
lidade. No sexo feminino observa-se
que a maioria é fértil, porém a puber-
dade pode ser atrasada ou normal.
^


Diagnóstico é considerada como o

S egundo Malaquias et al. (2008, p.


803), o diagnóstico da síndrome
de Noonan deve ser fundamentado
GI
IÏ IG 
I I
9I
GÈI G
IGGG
IG
GC;;GI 
nos achados clínicos. A síndrome de
Noonan é lembrada como diagnósti-
co diferencial em pacientes com típi- escore dificultou o seu uso rotinei- correto e o acompanhamento clínico
ca e/ou com estenose pulmonar. Mas ro. Em 1994, Van der Burgt e cols. adequado há necessidade dos espe-
o diagnóstico da síndrome de Noo- propuseram um sistema simples e cialistas atentarem para várias altera-
nan pode ser difícil, principalmente eficiente com base na pontuação de ções sindrômicas.
por causa da grande variabilidade fe- critérios maiores e menores que con- No momento, o diagnóstico da
notípica, com a presença de pacientes sidera a variabilidade clínica presente. síndrome de Noonan é clínico-gené-
com características faciais discretas e/ O diagnóstico clínico segundo tico. Entretanto, descobrir um marca-
ou na ausência de malformações car- Dias (2004) é baseado no achado dos dor, através de técnicas moleculares,
díacas. A atenuação dos traços faciais caracteres fenotípicos e o genético, ajudaria no diagnóstico e no aconse-
nos indivíduos adultos é outro fator na ausência de alteração no carióti- lhamento genético dos pacientes com
que dificulta o diagnóstico após a in- po. Para que ocorra um diagnóstico essa síndrome.
fância. Em 1981, Duncan e cols. pro-
puseram um sistema de escore para o REFERÊNCIAS
diagnóstico da síndrome de Noonan  Y%*9!:e /%*9(:+:(:e"*) $)"90:(: IÔ
GIG^


com base em 26 itens encontrados 1GG
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www.portalcienciaevida.com.br psique ciência&vida 47


recursos humanos por João Oliveira

Acabou a
faculdade,
E AGORA?
A BUSCA PELA PRIMEIRA
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42!"!,(/-%3#,!!!.3)%$!$%0/2
5-&5452/02/-)33/2%5-0%2°/$/
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A
pós investir de quatro a cinco ENORMES LISTAS INlNDÉVEIS DE CERTIlCA-
anos nos bancos de uma fa- DOSQUE MUITASVEZES NÎOPOSSUEMADE-
CULDADEOPROlSSIONALDEVERIA rência com o cargo em questão.
estar pronto para entrar no ! EXPERIÐNCIA CONTA  CLARO  MAS Ï
mercado de trabalho. Mas a realidade é a capacidade de administração emo- mesmo que elas estejam distantes de
BEM DIFERENTE  POIS O MERCADO  ESCASSO cional que vai fazer toda diferença no suas moradias. É um grande erro pen-
PELAATUALCRISE AINDAEXIGEEXPERIÐNCIA lNAL$ESDECEDO DEVE SEBUSCARINVES- sar que poderá se acostumar aos longos
ou oferta de estágios com baixa ou ne- tir nessa área de crescimento pessoal. trajetos e ao desperdício de horas todos
nhuma remuneração. A inteligência emocional aliada à ca- os dias dentro dos transportes públicos
O Brasil está começando agora a pacidade de se comunicar claramente LOTADOS!OlNAL OTRABALHOPODERÉlCAR
entrar na tendência mundial de prepa- TORNAM  ATÏ MESMO O CANDIDATO COM insuportável apenas porque esse item
RARUMGRANDEQUANTITATIVODEPROlSSIO- MENOR EXPERIÐNCIA  UMA BOA AQUISI¥ÎO não foi computado com sua real impor-
nais de nível tecnólogo para dar veloci- para as empresas. tância. Sempre que fazemos processo
dade à entrada no mercado de trabalho Excelente estratégia para uma carrei- de recrutamento e seleção alertamos os
de uma nova geração de trabalhadores. ra promissora é buscar estágios o mais candidatos para a possibilidade de esgo-
O que mais impulsiona as pessoas nessa cedo possível. Muitas pessoas deixam tamento físico e mental que isso pode
direção é o curto tempo de formação PARAOlNALDOCURSO MASISSOPODERE- acarretar e na possível perda de rendi-
E  ALIADO A ISSO  OS SALÉRIOS CRESCENTES tardar ainda mais a formação e principal- mento na instituição.
dessa categoria. mente o aprendizado prático. Além de ser É importante ter critérios e analisar
Algumas ações podem ser úteis para uma forma de criar networking UMAREDE bem as empresas para as quais se preten-
um bom começo na área de interesse. de contatos sólida dentro do seu ambien- DEMANDAROCURRÓCULO(OJE PELAINTER-
4ER UM CURRÓCULO BEM ELABORADO  POR TEPROlSSIONALQUEPODESERÞTILNOFUTURO NET ÏPOSSÓVELDESCOBRIRMUITACOISASO-
EXEMPLO  SEJA VIRTUAL OU NÎO  Ï A PRI- Um detalhe importante que os ini- bre as relações das empresas com os seus
meira impressão que o candidato deixa CIANTESNOUNIVERSOPROlSSIONALIGNORAM funcionários. Uma dica é acessar o site do
e pode abrir portas para uma entrevista ÏADIlCULDADEDAMOBILIDADEURBANAE  Tribunal da Justiça do Trabalho do Esta-
pessoal. Os departamentos de RH dão QUASE SEMPRE  BUSCAM COLOCA¥ÜES EM do que deseja e procurar pelo nome da
mais valor para a desenvoltura do que EMPRESASQUEOFERECEMMAIORESSALÉRIOS  empresa. Se houver muitas ocorrências

48 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br


5-$%4!,(%15%
OS INICIANTES
NO UNIVERSO
PROFISSIONAL
IGNORAM É A
$)&)#5,$!$%
$!-/"),)$!$%
52"!.!15%02%#)3!
3%2!6!,)!$!
PARA EVITAR O
ESGOTAMENTO
FÍSICO E MENTAL
MENTE  PARA UMA VAGA DE SUPERVISÎO
!ESCOLHAlNALSEMPREÏDOGESTOR EM
sua última entrevista avaliativa. No en-
TANTO CABEAOSPROlSSIONAISDESELE¥ÎO
INDICARPARAESSEMOMENTOlNALSOMEN-
TEAQUELESQUE SEMSOMBRADEDÞVIDA 
poderão ocupar o cargo com perfeita
desenvoltura.
Nesses casos o foco vai se voltar para
OS ELEMENTOS QUE PODEM DESQUALIlCAR
#OMOSPONTOSFORTESDElNIDOS OSELE-
ÏSINALDEQUENÎOHÉUMABOAAlNIDADE COLABORADOR$EVEMOSDESTACARQUE DO cionador deve procurar as áreas onde
entre a linha gestora e o corpo laboral. OUTRO LADO DA MESA  O PROlSSIONAL DO esse candidato pode apresentar fragili-
Todo processo seletivo gera tensão. processo de seleção também está sub- DADES !QUI  NESSE ESTÉGIO  OS DETALHES
!lNAL  O FUTURO DO CANDIDATO PODE ES- metido a pressões e deve ter níveis de são valorizados para que se possam eli-
tar em jogo. Uma preparação emocional estresse consideráveis quando encontra minar aqueles com menor potencial em
pode ser bem-vinda para que não se co- UMNÞMERORAZOÉVELDEBONSPROlSSIO- COMPARA¥ÎOAOSDEMAISJÉQUALIlCADOS
METAMERROSBÉSICOS COMO nais. Fazer escolhas que podem alterar !SSIM  NENHUM DETALHE DEVE SER
,INGUAGEM CORPORAL PELA PRESSÎO a vida de pessoas de forma radical não considerado pequeno demais para não
em que o candidato normalmente se só aumenta a responsabilidade de ex- merecer investimento por parte daquele
ENCONTRA SEUCORPOPODETRAZERIMPRES- TRAIR O MELHOR DE CADA UM  MAS TAM- que deseja se colocar no mercado de tra-
sões prejudiciais. Algumas ações são bém a certeza de estar selecionando BALHO .INGUÏM NASCE PREPARADO  ISSO
AVALIADASNESSESENTIDO TAISCOMOCOLO- o melhor para a empresa contratante. Ï UM FATO %DIlCAR UM BOM PERlL PRO-
CARASMÎOSNOSBOLSOSAOFALAR COLOCARA 5MA ESCOLHA MALFEITA PODE SIGNIlCAR lSSIONALEXIGEDISCIPLINAEINVESTIMENTO
bolsa sobre as pernas cruzadas e balan- perdas para ambos os lados envolvidos. para estar preparado no momento em
çar pés e mãos para lá e para cá. Tudo Em um processo recente tivemos que tudo for posto à prova. Sorte só exis-
ISSOPODEDEMONSTRARINSEGURAN¥A NER- MAISDECINCOCANDIDATOSAPTOS PLENA- te para quem a constrói.
vosismo e falta de equilíbrio emocional.
IMAGENS: SHUTTERSTOCK/ACERVO PESSOAL

!UTENTICIDADE O CANDIDATO NÎO


pode querer mostrar o que não é. Ele João Oliveira é psicólogo e diretor de Cursos do Instituto de Psicologia Ser e
Crescer (www.isec.psc.br). Entre seus livros estão: Relacionamento em Crise:
PRECISA PASSAR CONlAN¥A EM SUAS CA- Perceba Quando os Problemas Começam. Tenha as Soluções!; Jogos para Gestão
PACIDADES  CASO CONTRÉRIO  COMO A de Pessoas: Maratona para o Desenvolvimento Organizacional; Mente Humana:
empresa empregadora poderá ter essa Entenda Melhor a Psicologia da Vida; e Saiba Quem Está à sua Frente – Análise
Comportamental pelas Expressões Faciais e Corporais (Wak Editora).
segurança no possível empregado ou

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ciberpsicologia Por Igor Lins Lemos

e, por f im, o revenge porn. Os pensa-

Vingança e mentos de ponderação plausíveis se-


riam: “isso também pode acontecer
comigo”,“não é seguro envia r fotos,
mesmo em aplicativos em que as fo-

PORNOGRAFIA tos são dissolvidas após alguns se-


gundos” (ex.: Snap), “a intimidade do
ca sa l pode ser preservada de outra s

on-line
forma s” e “envia r fotos erótica s não
é necessa ria mente prova de a mor”.
Esse último é um relato constante
em consultório, principa lmente da s
mulheres. Em vários momentos ouço
OS MODELOS DE EXPRESSÃO DA que é prova de a mor envia r esse tipo
SEXUALIDADE SOFRERAM ALTERAÇÕES de fotos pa ra o pa rceiro. Outra s men-
ciona m que se sentia m pressionada s
SIGNIFICATIVAS AO LONGO DAS ÚLTIMAS a isso. Por f im, já me foi narrado um
DÉCADAS, PRINCIPALMENTE NO QUE SE evento em que a paciente necessitou
enviar fotos íntima s para o parceiro,
REFERE AO CONCEITO DE “EXPLÍCITO” quando este estava viajando, para
que ele não a traísse.

T
empos atrás seria impensá- tipo de comportamento está atrelado Segundo tópico é a objetif icação:
vel termos revista s, websi- a diversos danos emocionais a quem ainda existe uma cultura (doentia)
tes, f ilmes, livros e debates sofre essa retaliação, desde sintoma- predomina nte de que a s mulheres são
acalorados sobre sexo e tologia condizente com transtorno vista s como objeto e o envio de fotos
suas vertentes. Essa é uma conquis- depressivo maior até casos de suicí- permite que diversos pa rceiros(a s) a s
ta de muitos anos de lutas, dores e dio. Dessa forma, de maneira direti- utilizem como troféus, mostra ndo-a s
de diversa s causa s, desde a igua ldade va , comento a lguns tópicos que po- para terceiros (esses relatos costu-
entre homens e mulheres até a liber- dem ajuda r no cuidado pa ra que esse mam ser feitos por pacientes do sexo
tação sexua l. Porém, como toda s a s tipo de experiência não ocorra com masculino). Combatendo esse ponto,
mudanças, essa também está inseri- você, leitor(a), ou com pacientes que perspectivas do campo da Psicologia
da, no século XXI, no campo da tec- na rra m essa dema nda. demonstra m que envia r fotos íntima s
nologia e, como esperado, a lguma s O primeiro ponto: verif ique seus pode estar relacionado a diversos
características negativas surgiram. pensamentos de permissão. Co- problema s psicológicos, dentre eles
Um tema que passou a ter maior mumente os pacientes mencionam
visibilidade na ciberpsicologia, que que enviar fotos íntima s para o(a)
relaciona a sexualidade negativa- pa rceiro(a) não irá gera r consequên- NO CAMPO DA
mente ao uso de aparelhos eletrôni- cia s, o que é um enga no em vários LEGISLAÇÃO AINDA
cos, é o chamado revenge porn, que casos. Na verdade, existem diversos
tipos de problemática s relacionada s
EXISTEM LACUNAS
pode ser compreendido como o ato
de utilizar fotos íntima s como um a esse comportamento, como o ris- SOBRE A PUNIÇÃO
recurso para realizar chantagens ou co de inva são de hackers que possa m DE QUEM TEM
punições, com o conhecimento ou utilizar essa s fotos para f ins negati-
não do outro. Um exemplo comum vos, assaltos (permitir ao infrator ter
A CONDUTA DO
é um relacionamento entre jovens acesso ao ba nco de dados do celula r), CHAMADO REVENGE
em que, após a ruptura , o pa rceiro enviar de forma incorreta fotos para PORN, CONSIDERADO
ou parceira ameaça divulgar fotos grupos de Whatsapp (ca sos de vídeos
eróticas do outro na internet caso a e fotos que caem em grupos da fa- UM TIPO DE
relação de fato seja f inalizada. Esse mília desse aplicativo não são raros) ABUSO SEXUAL
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prejuízos signif icativos na autoesti- buem são diversos, desde a dif iculda- nos relacionamentos, a ascensão da
ma, dif iculdades sexuais, transtorno de de compreender o assunto como cibercultura e a liberação da sexu-
depressivo maior e transtornos de a minimização dos danos do revenge alidade são realidades, porém toda
ansiedade. Um tópico secundário à porn. Apesar de ser um tema ainda essa alteração social deve e pode ser
objetif icação é o julgamento: a mu- emergente, mas que, como dito, já vivenciada com poucos riscos à in-
lher comumente é relatada como a entrou no campo da discussão da Psi- tegridade emocional dos envolvidos.
culpada. Em relação a esse terceiro cologia, é inegável verif icar os inú- Como psicoterapeuta, meu posicio-
aspecto, é verif icado que, infeliz- meros impactos que ele traz à vítima. namento é de não estimular o envio
mente, ainda existe um abismo para A principal estratégia, até então, é a de fotos íntimas, mesmo que esteja-
que esse tipo de avaliação machista prevenção. As atuais conf igurações mos suscetíveis a isso.
seja modif icado, porém, em diver-
sos veículos de comunicação e nos Referências:
relatos de pacientes em consultório, HAKALA, P.; RIMPELA, A.; SALMINEN, J.; VIRTANEN, S. M.; RIMPELA, M. Back, neck, and shoulder pain
‚  G
IdG GII G:British Medical Journal9:>=@9=;;=:
existe uma sincronia nessa informa-
# ''-. š(9:e)$'--*)9&:1:e' ++ .9%:e-'/)9: IG
I G 
ção: a mulher foi quem errou em en-  G
 
 9IG9G
I G I:Upslada Journal
viar as fotos, o homem não. of Medical Sciences,:<=;9:?9=;<@:
Aspectos legais: um site intitu- %( -*)9 :e. 0 )9%:e-1$)9): I IG GG 
GI :Pain Research and
lado endrevengeporn.org tem como Management9:<A9:<9=;<<:
proposta gerar campanhas para a TORSHEIM, R.; ERIKSSON, L.; SCHNOHR, C. W.; HANSEN, F.; BJARNASON, T.; VALIMAA, R. Screen-
criminalização do revenge porn, que é HG
GI   G
  IGIG GG
I )
II :BMC
Public Health9:<;9=;<;:
considerado um tipo de abuso sexual.
IMAGENS: 123RF/ACERVO PESSOAL

No campo da legislação ainda exis-


Igor Lins Lemos é doutor em Neuropsiquiatria e Ciências do Comportamento
tem lacunas sobre a punição de quem pela Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e especialista em Terapia
tem esse tipo de conduta, as leis ba- Cognitivo-Comportamental Avançada pela Universidade de Pernambuco (UPE).
nindo essa prática ainda estão sendo É psicoterapeuta cognitivo-comportamental, palestrante e pesquisador das
dependências tecnológicas. E-mail: igorlemos87@hotmail.com
discutidas, e os fatores que contri-

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neurociência por Marco Callegaro

DIVERGENTE:
pensando fora da caixa
VALORIZAÇÃO DO FOCO E DESEMPENHO EM ATIVIDADES
QUE REQUEREM PENSAMENTO ANALÍTICO LEVAM
AO CONTROLE METACOGNITIVO DO PENSAMENTO

E
stamos vivendo tempos de foco ness”. Essa ironia sobre uma versão pop cérebro se adapta ao treinamento da
executivo na tarefa, com uma da meditação mindfullness revela uma capacidade de focar a atenção, e gen-
valorização de tudo que possa CRÓTICA AO ENTENDIMENTO SUPERlCIAL DA tilmente afastar pensamentos intrusos.
aumentar nosso desempenho população, induzido pelo enfoque ba- Se treinarmos um determinado circui-
no trabalho ou no estudo. O resgate nalizador da mídia, sobre os conceitos to cerebral, as conexões se fortalecem,
da prática milenar da meditação do fundamentais dessa rica vertente, e e a cada prática melhoramos o de-
tipo mindfullness atinge níveis de po- não à meditação em si. De fato, exis- sempenho naquelas funções. Fazendo
pularidade tão grande que já circulam tem muitos benefícios na prática desse uma analogia com o sistema muscular,
brincadeiras, como as contidas no jogo tipo de meditação, e diversos estudos da mesma forma que aumentamos o
de palavras da expressão “macmindfull- de Neurociências mostraram que o NÞMERO DE lBRAS MUSCULARES  OU SUA

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espessura, ao malhar, fortalecemos os EMBORA EXISTAM MUITAS VANTAGENS
circuitos do cérebro, ao malhar nosso
pensamento. Voltar ao foco e prestar NA CAPACIDADE DE DIRIGIR NOSSO FOCO
atenção de forma concentrada, sem DE ATENÇÃO E MONITORAR NOSSOS
deixar pensamentos nos distraírem,
PENSAMENTOS, SERÁ QUE TAMBÉM GANHAMOS
são fundamentais se estamos em uma
aula, reunião de trabalho ou muitas ALGO DE BOM AO DEIXAR A MENTE LIVRE?
outras atividades de nosso cotidiano.
Com esse destaque todo para o Novos estudos estão começan- torrelato, mostraram impacto negati-
foco atencional, a visão contemporâ- do a indicar que existem benefícios, vo dessa capacidade na criatividade.
nea sobre deixar o pensamento “livre” pelo menos em certos contextos, no Existem limitações nessa metodolo-
varia, desde uma noção mais branda pensamento espontâneo e livre. Os gia, mas esses resultados sugerem que
de constituir uma perda de tempo até pesquisadores dessa abordagem têm em certos contextos as habilidades
versões que associam essa forma de apontado que existe uma tradição de metacognitivas de monitorar, planejar
pensar com a ruminação. Ruminar se enfatizar o pensamento analítico e e regular os pensamentos inibem os
refere aos pensamentos obsessivos, an- uso de tarefas padronizadas clássicas processos divergentes e criadores.
siosos e de preocupação, quando pen- que medem o desempenho acadêmi- Estamos começando a entender a
samentos negativos invadem a mente co. Existem evidências de que f icar no diversidade de processos mentais que
e são processados e reprocessados, mundo da lua prejudica a aprendiza- estão envolvidos com o pensamento
levando a um aumento da tristeza e gem em sala de aula, ou no entendi- e atenção, e a visão mais global que
ansiedade. No entanto, se acumulam mento de textos complexos, e certa- emerge desses estudos aponta para
evidências de que o processo de rumi- mente é importante ter a capacidade que se integrem várias formas de pro-
nação é bem diferente do pensamento de focar a atenção quando necessário. cessamento, em termos de vantagens
espontâneo. O pensamento livre de No entanto, se nosso olhar se dirige e desvantagens, para determinadas
amarras, que vaga entre lembranças para o pensamento divergente e reso- pessoas, contextos e demandas parti-
do passado e imagens do futuro, na lução criativa de problemas, o cená- culares, antes de estabelecer simples
língua inglesa é chamado de mind- rio muda e surgem aspectos positivos dicotomias ou antagonismos. A mente
-wandering, expressão que pode ser do pensamento espontâneo. Pesqui- é rica e a natureza tem sabedoria em
entendida como “deixar a mente va- sas têm mostrado que a fantasia e a suas construções, não devemos sim-
gar ou divagação, sonhar acordado, ou imaginação são mais frequentes em plesmente ceder à tentação de descar-
fantasiar”. Fazemos isso uma boa parte pessoas criativas como artistas e es- tar como defeitos processos que leva-
do tempo em que estamos acordados. critores, e que o sonhar acordado está ram milhares de gerações para serem
Se não houver demanda de foco em ta- relacionado a aumento da criativida- esculpidos. Manter o foco, e prestar
refas, quando estamos sem fazer nada, de, em especial no período de incuba- atenção consciente, traz vantagens
A MAIOR PARTE DO TEMPO lCAMOS hVIA- ção de novas ideias. em determinadas situações e desvan-
jando” em nossas mentes, em mundos Um estudo recente no Chile apon- tagens em outras, da mesma forma
virtuais de nossa imaginação. tou que estudantes que relataram mais que sonhar e imaginar livremente.
Teria a seleção natural, a grande episódios de sonho acordado tiveram Af inal, o que seria da humanidade
arquiteta do design cerebral, construí- maiores escores nas medidas de cria- sem os sonhadores? Sonhar é preci-
do um sistema que requer um contro- tividade, pensamento divergente e so, mas os f iltros e testes das funções
le metacognitivo o tempo todo para solução inovativa de problemas. Me- executivas são também necessários
prestar atenção consciente no “aqui e didas de metacognição, através do au- para que os sonhos se realizem.
agora”? A metacognição, ou a capaci-
dade de pensar sobre o pensamento, é Para saber mais:
PREISS9::G: G    ƒI 
G
 G
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a faculdade que permite que se perce-   G
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9Learning and Individual Differences‡=;<Aˆ9 d¤¤
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bam os pensamentos, e que se direc io- ¤<;:<;<A¤ : 
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IMAGENS: 123RF/ARQUIVO PESSOAL

nem esses pensamentos para alguma


Marco Callegaro é psicólogo, mestre em Neurociências e Comportamento,
direção voluntária e conscientemente diretor do Instituto Catarinense de Terapia Cognitiva (ICTC) e do Instituto
escolhida, como voltar ao foco da res- Paranaense de Terapia Cognitiva (IPTC). Autor do livro premiado O Novo
piração consciente, em uma versão da Inconsciente: Como a Terapia Cognitiva e as Neurociências Revolucionaram o
Modelo do Processamento Mental (Artmed, 2011).
meditação mindfullness.

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ALERTA

EM TEMPO DE
TRATAR
Problemas alimentares na
infância são preocupação
mundial e passaram a ser mais
pesquisados e publicados
entre pediatras e psicanalistas
Por Flávia Machado Seidinger Leibovitz

Flávia Machado Seidinger Leibovitz é psicóloga clínica em São Paulo e Campinas.


Possui especialização em Psicanálise (Escuela de la Orientación Lacaniana/
Núcleo de Investigación de Anorexias y Bulimias – Argentina), mestre em Ciências
Médicas/Saúde Mental (Unicamp). Membro do Centro Lacaniano de Investigação
da Ansiedade (CLIN-a), do Grupo Interdisciplinar de Assistência e Estudos em
Transtornos Alimentares (GETA-Unicamp) e da Clínica de Estudos e Pesquisas
em Psicanálise da Anorexia e Bulimia (Ceppan). flaviamsleibovitz@gmail.com

54 psique ciência&vida
SHUTTERSTOCK

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ALERTA

B
ulimia e anorexia nervo- adultos. Para melhor compreensão, se-
sa, transtornos alimenta- guiremos utilizando aqui a nomencla-
res e transtornos da ali- tura anterior que os diferencia.
mentação são nomes que O que hoje se conhece por trans-
circulam na mídia com tornos alimentares corresponde a um
frequência no século XXI. Nunca é de- grupo de diagnósticos de transtornos
mais advertir sobre a seriedade com a mentais ligados ao comportamento,
qual merecem ser encarados. O comer sobretudo o comportamento alimen-
“desordenado” na infância era descrito tar, podendo incluir prática excessiva ŒPrejuízo Psicossocial Œ
no Brasil pela tradução de Feeding Di- de atividade física e outras variantes do Os transtornos alimentares são os
sorders, em nosso idioma transtornos comportamento de controle obsessivo transtornos mentais de maior morbida-
da alimentação, nomes bastante seme- do peso, como a presença ou não de de e mortalidade, inclusive por suicídio.
lhantes. Na versão corrente do DSM-5, práticas purgativas, variando em cada São considerados os mais graves dentre
os transtornos psiquiátricos. Produzem
o Manual Diagnóstico e Estatístico de diagnóstico/subtipo. Na atualidade importante prejuízo psicossocial e uma
Transtornos Mentais, editado no Brasil são fortemente ligados às questões série de complicações clínicas: odon-
em 2014, os transtornos da alimenta- com a própria imagem, preocupação tológicas, dermatológicas, gástricas,
ção (TdA) (infância) passaram a ser excessiva com o peso, geralmente distúrbios endocrinológicos e cardio-
descritos como parte dos transtornos acompanhado de um saber decidido a patias. Devido à incidência de suicídio
e depressão, estimada em vinte vezes
alimentares (TA) – anteriormente esse respeito – muitas vezes por com- mais alta entre jovens com transtornos
nomenclatura exclusiva para adultos. portamentos aprendidos na internet, alimentares, estes foram considerados
Antes disso os TA em crianças eram ou pela adesão ao polêmico e perigo- como doenças mentais prioritárias pela
considerados um tipo não especifica- síssimo slogan “anorexia como estilo Organização Mundial da Saúde.
do de transtorno, em separado ao dos de vida” – espécie de roleta russa à qual

Os transtornos da alimentação, que


historicamente eram diagnosticados e
acompanhados por pediatras, vêm sendo
trasladados para o campo da Psiquiatria Infantil
jovens aderem radicalmente, diferente gativo na dinâmica familiar, ricamente
da chamada anorexia santa como for- descrito por Lasègue em conselhos
ma de jejum e ascese na Igreja Católi- válidos até nossos dias, apesar das dife-
ca no século XIII, conforme analisado renças do quadro a cada época.
por Weinberg & Cordás (2006), e da O que se costuma referir e replicar
anorexia histérica, o clássico texto do no main stream da literatura psiquiátrica
final do século XIX, de Charles Lasè- é que a bulimia teria sido descrita so-
gue, quem localizou, na França, os mente em 1979 por Russell, como va-
quadros alimentares, como de origem riante da Anorexia Nervosa. No entan-
psíquica. Simultaneamente surgiu a to, há registros médicos do quadro bem
descrição de Willian Gull, na Inglater- mais antigos, inclusive em documentos
ra, da Anorexia Nervosa, mais voltada médicos (Stein; Laakso, 1988), e abun-
para aspectos clínicos. Nessas épocas dantes referências nas pesquisas de
o quadro não incluía a questão com a Brusset e Couvreur (2003).
imagem do corpo, nem a paciente ti- Diferentes dos mais conhecidos na
nha qualquer saber sobre o mal-estar grande mídia, exclusivos aos adultos,
O excesso da oferta de alimentos e de dietas,
que começava com dor epigástrica e anorexia nervosa, bulimia e o comer
bulimia e anorexia nervosa e transtornos da
alimentação na criança ganham cada vez mais
dificuldade de comer, atraindo o olhar compulsivo, os TdA podem ocorrer
peso no mundo moderno, deixando-a, assim, familiar. O quadro evoluía para a recu- em bebês, crianças pequenas ou em
mais vulnerável a esses transtornos sa do alimento, com forte impacto ne- idade pré-escolar por desencadeantes

56 psique ciência&vida www.portalcienciaevida.com.br


Ao contrário do que muitos pensam,
a obesidade não faz parte do grupo de
diagnósticos psiquiátricos, mas os
transtornos da compulsão alimentar sim,
quando acompanhado de práticas
compensatórias e com determinada frequência

diversos exceto quando associados a A introdução nos situa no tema


transtornos do desenvolvimento ou do ponto de vista médico, no entanto
condições clínicas específicas; suas vale a reflexão em termos mais gerais,
causas são descritas nas ciências médi- visando ampliar o olhar para o fenô-
cas no entrecruzamento de fatores mé- meno que nos preocupa, incluindo
dicos, de desenvolvimento e compor- outros aspectos.
tamentais. Apresentam-se sob a forma Ainda que a descrição do quadro
da seletividade, pica, ruminação, e ou- entre “moças jovens”, meninas, exista
tras variantes – ingestão persistente de desde que se tornou entidade mórbida
substâncias não nutritivas que não são no fim do século XIX, com breves re-
alimentos durante ao menos um mês ferências no texto freudiano, somente
– podem levar a perigosas consequên- em meados do século passado foi alvo Os transtornos alimentares estão vinculados ao
cias médicas para o bebê ou a criança, crescente de pesquisas e publicações comportamento, não só o alimentar, podendo
incluir prática excessiva de atividade física e uso
inclusive falha no crescimento ou des- de pediatras e psicanalistas, como
de outras substâncias ou práticas com o objetivo
nutrição (Burklow, 1998; Silverman A. Hilde Bruch (1904-1984), nos anos de perder peso
H., 2010). 60 descreveu o transtorno da imagem
As descrições vão sofrendo va- corporal, período em que se voltou es-
riações a cada edição dos manuais pecialmente para o quadro na infância. Descritos nos manuais diagnósticos e
estatísticos e diagnósticos, mas a pro- Em nossos dias, na infância, os TA têm estatísticos, passam por mudanças na
blemática nos toca para além disso: como grande referência Bryan Lask, apresentação do quadro com o andar
se trata-se de um aumento de fato, já Professor inglês, falecido há um ano. da carruagem da história e mudanças
apontamos a dificuldade em aferir, mas Em seu último livro, recém publicado, na sociedade. Especula-se que em pa-
é certo que há uma procura maior por encontra-se debate sobre o aumento da íses ocidentais apresentem-se em ida-
tratamento, e é bem possível que haja incidência em crianças, afirmando-o. de mais precoce com aspectos dos TA
sim um aumento em curso, e que irá se
complexificar enquanto perdurarem as PARA SABER MAIS
dificuldades com a obesidade em nos-
sa cultura, dentre outros fatores. Nao FAZER DIETA AUMENTA O RISCO DE TA
podemos esperar extinguir. A pulsão
de morte, já advertiu Freud, é consti-
tutiva do ser humano. Segundo estu-
O besidade não é um dos TA, mas constitui fator de risco para desenvolvê-
-los. Nutrição é um dos principais fatores provocadores de mudanças
epigenéticas, e dieta afeta a atividade cerebral, aumentando cerca de 18 vezes
dos, são profundamente relacionados o risco de TA (Stice et al, 2002; Szyf et al, 2008). E vale lembrar que nossa
os problemas da obesidade dos pais e cultura atual dá lugar a uma obsessão com o corpo, produzindo uma relação
seus padrões e ambiente alimentar e o com sua imagem cada vez mais assujeitada à tirania da comparação aos ideais
surgimento de TA nos filhos. Estudos impossíveis dos photoshops. Não somente quem tem obesidade ou sobrepeso
já apontaram também a correlação da faz dieta, ou se utiliza de métodos compensatórios para perda de peso. Triste
anorexia com tempos de excesso, rela-
IMAGENS: 123RF/SHUTTERSTOCK

e perigosa realidade que tem início com a ideia de que se pode controlar seu
cionando-se muito mais ao abastado uso. Porém, encontramos no relato dos que cruzaram a fronteira diagnóstica e
do que ao que falta, e com a excessiva que tarde demais vieram a dar-se conta de que essa lógica havia adquirido vida
preocupação em emagrecer dos pais ou própria, e como um mestre autoritário passado a comandar sua existência.
à restrição de certos alimentos.

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ALERTA

em adultos, como temor de engordar


(lipofobia) e excessiva preocupação O comer “desordenado” na infância
com a imagem. Podem relacionar-se ganhou o estatuto de transtornos
ao aumento de peso da população em alimentares no Manual Diagnóstico
e Estatístico de Transtornos
geral – no Brasil, confirmado no últi- Mentais (DSM-5). Anteriormente,
mo censo IBGE, reflexos do ambiente transtornos da alimentação
familiar – fatores como pais obesos eram considerados um tipo não
fazendo dietas, discurso alarmante da I ‚IG

G
saúde sobre riscos da obesidade, refle-
tem nas crianças, bem como da mídia:
o padrão de beleza e a identificação a
todo custo com as medidas impossí-
veis da Barbie, da estética “cadáver” e
outros personagens do mundo perfeito
e brilhante que se quer vender, sobre-
tudo no que importamos da cultura
norte americana, como a clínica reve-
la. Também a faixa etária da menarca
vem diminuindo. Ainda que com dife-
renças não tão gritantes na média, TA
sempre acompanharam as questões
adolescentes emergentes nessa fase.
No entanto, afirmar sobre incidên-
cia e real aumento é sempre polêmico O aspecto emocional cultura ocidental. Porém, ante a glo-
e muito difícil de ser aferido: a com- balização, vêm sendo descritos em
plexidade diagnóstica dos TA e seus descrito na psicologia praticamente todo o mundo. Pesqui-
subtipos dificulta pesquisas na área; das anorexias e sas antropológicas verificam aumento
abandono e mortalidade elevados im- da incidência em contextos de rápida
pactam resultados gerando estudos
bulimias: sujeitos mudança cultural nas regiões “em de-
inconclusivos; as pesquisas são válidas desorientados senvolvimento”. Na tese de doutorado
apenas no contexto cultural em que fo-
ram realizadas e sempre contêm vieses;
pelos laços sociais “Histórias de vida com transtornos
alimentares: gênero, corporalidade e
a maioria dos estudos é com pacientes e padecem das a constituição de si” (Unicamp, 2011),
inseridos em serviços, e o diagnóstico descompensações Silva defende que: “(...) ao serem inseri-
muda ao longo do tratamento, com das no mercado de produção mundial,
variações de massa corporal e a evolu- do controle, diferentes regiões do mundo sofrem
ção clínica. Não há estudo epidemio- acossados pela modificação decisiva no sentido do de-
lógico sobre transtornos alimentares senvolvimento de uma cultura de con-
nem da alimentação no Brasil. Sendo
demanda frenética sumo e do individualismo competitivo,
nova tal especialidade médica, antes de consumir descrita sob as rubricas de “moderni-
disso não seriam assim identificados, zação” ou “ocidentalização”. Apontam
embora comportamentos constassem
e descartar, na mesma direção a famosa pesquisa
em registros históricos na Antiguida- inclusive alimentos de Becker (2002), que testemunha o
de, após adventos na sociedade e nas aparecimento de quadros alimentares
ciências médicas, agora bem descritos, ficados? Observamos sim crescimento com a chegada da televisão nas Ilhas
passariam a ser notificados, podendo da demanda de tratamento, mas não há Fiji, e estudos no sul da Austrália, que
parecer mais frequentes, havendo que comprovação científica sobre aumento afirmam aumento de comportamentos
levar-se em conta também o significa- real da incidência em crianças. purgativos (Hay et al., 2008).
tivo aumento populacional. A impres- Ressalvas feitas, algo se pode afir- As perspectivas sociológica e psi-
são do aumento se deve a anteriormen- mar baseado em estudos científicos: canalítica relacionam esse fenômeno à
te serem subdiagnosticados, subnoti- TA são historicamente mais ligados à incessante demanda da cultura do con-

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sumo “24 horas” do capitalismo na era vez mais rápidas que estamos vivendo?
globalizada, na qual o Ideal do corpo O sujeito contemporâneo sofre desse
magro como padrão de beleza, veicula- “desamparo” – o que coincide com o
do associado a status, sucesso, controle, aspecto emocional descrito na psico-
triunfo, contribuindo para a insatisfação logia das anorexias e bulimias: sujeitos
com a imagem corporal, segundo meta- desorientados pelos laços sociais em
nálise de Groesz et al (2002). As teses liquidação são desamparados e pade-
do sociólogo Zigmunt Bauman vão na cem das descompensações do controle,
mesma direção, nas obras Sociedade de acossados pela demanda frenética de ŒPara um bom tratamento Œ
Há consenso na literatura científica em
Consumo e Modernidade Líquida; nes- consumir e descartar, inclusive alimen- afirmar que quanto mais cedo chegar ao
ta, analisa que recaem sobre os ombros tos. O Outro da sociedade de consumo tratamento, melhor efetividade: segundo
do indivíduo responsabilidades que até é a grande mãe que empurra a comida. Schmidt (2015), enquanto 60% a 80%
então pertenciam ao Estado, ou aos re- O termo anorexia mental foi res- dos adolescentes com anorexia nervosa
se recuperam em abordagem que inclui
gimes monárquicos e feudais, resultan- gatado por Lacan por colocar acento
a família, apenas 20% a 30% dos adultos
do no aumento da angústia existencial, no aspecto psíquico e não no aspecto que tiveram a forma mais duradoura da
traduzida em comportamentos com- orgânico do termo médico “nervosa” – doença se restabelecem, mesmo com o
pulsivos a objetos de consumo, inclusi- aliás, ressurgido fortemente em tempos melhor dos tratamentos. Diante da enor-
ve o alimento. Quais as consequências atuais regidos pelo DSM e a Psiquiatria me dificuldade em aceitar tratamento, são
levados por terceiros e tendem a abando-
subjetivas da economia neoliberal nesse Neurobiológica. Lacan dizia que a ano-
ná-lo facilmente. Nossa revisão de litera-
processo? E o declínio da função pater- rexia mental caracterizava-se por um tura encontrou: taxa de abandono de 40%
na, mudanças nas estruturas familiares “voraz apetite de amor”, e nesta não dei- a 60% nos adultos. Entre filhos de pais
e sociais, dentre outras revoluções cada xa de comer, mas “come o nada”; frase separados e em pacientes que apresen-
tam comportamento purgativo há mais
abandono do tratamento, também guar-

O que se costuma referir no main stream dando relação inversa com escolaridade.
Adolescentes e crianças têm melhor ade-
da literatura psiquiátrica é que a bulimia são, pois os pais obrigatoriamente partici-
pam. Seidinger-Leibovitz (2016)
teria sido descrita somente um século
depois. No entanto, há registros médicos
de impacto que suscitou debates teóri-
do quadro da bulimia bem mais antigos cos, importando destacar seu ponto de
verdade: por mais que recuse o alimen-
to no seu jogo para inverter a relação de
poder e controle, o sujeito anoréxico re-
laciona-se excessivamente com esse ob-
jeto, dele alimentando-se em sua sofrida
obsessão diuturna, isto é, relaciona-se
com o mesmo excesso que comanda sua
recusa. Anorexia e bulimia, TA e obesi-
dade: dois lados da mesma moeda, que
possuem em sua raiz um voraz apetite,
tal qual nas adicções.

TA, obesidade e adicção


A o contrário do que muitos pen-
sam, a obesidade não faz parte
desse grupo de diagnósticos psiqui-
IMAGENS: 123RF/SHUTTERSTOCK

átricos. Seus parentes próximos, os


transtornos da compulsão alimentar,
sim, quando acompanhados de práti-
A história de obesidade na infância predispõe a transtornos alimentares na adolescência ou vida adulta cas compensatórias com determinada

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ALERTA

Na bulimia a
negação dos
riscos é ratificada
pela captura
da imagem de
um corpo “com
peso normal”
como sinônimo
de saúde. Muitas
vezes, as pessoas
com bulimia não
são identificadas
As pessoas que sofrem de transtornos alimentares adotam discursos semelhantes aos adictos ao álcool e
outras drogas, apresentando semelhanças psicológicas
como padecendo
de TA, e o
frequência e marcados por aspectos tando seu pensamento 24 horas por dia mantêm em
psicológicos próprios.Escutamos em – inclusive como principal motivo de
tom pesaroso, cotidianamente, na clí- abandono do tratamento, o que é en-
segredo
nica: “Tarde demais. Queria com isso contrado em estudo qualitativo como
controlar tudo, mas passei a ver que “uma escravidão ao vício” (Seidinger-
era controlada. Fui perdendo autono- -Leibovitz, 2015).
mia e muitas outras coisas”. Discurso
corrente na problemática da adicção Desfazer o mal-entendido
ao álcool e outras drogas, cujo funcio-
namento psíquico se assemelha aos
TA, especialmente à bulimia. Na lite-
A nomenclatura médica interna-
cional ilumina a diferença entre
Eating Disorders – em adolescentes e
ratura científica médica há uma linha adultos; e Feeding Disorders – trans-
de pesquisa que considera TA como tornos da alimentação em crianças;
“comportamento aditivo”. Essa classi- diferença que se esclarece na língua
ficação diferencia-se do que até então inglesa: a declinação passiva do verbo
se conhecia por adicção. Os addicti- feeding coloca a dependência da crian-
ve behaviour, descritos por Goodman ça em seu ato de “ser alimentado” pelo
em 1990, passaram a ser um grupo de o(O)utro. Assim implica “a relação”
comportamentos com características e supõe, em oposição, adolescentes e
e psicodinâmica específicas, nos quais adultos “autônomos” em sua alimenta-
a noção de adicção extrapola a ideia de ção (Eating); enquanto o ato alimentar
droga enquanto substância e entende do bebê/criança inclui o adulto que
como aspecto principal a “relação adi- lhe apresenta o mundo e é responsável
tiva” com diversos objetos investidos por alimentar a criança, passiva ainda
do caráter “droga” para determinados neste ato (Feeding). A diferença não se
sujeitos, inclusive a comida, seja ela restringe a preciosismos de linguagem,
excessivamente presente – na bulimia
– também excessiva, mas ambivalen-
Curiosamente, o que caracteriza a
temente negada, na anorexia. Parado- bulimia é o “excesso de fome” e não
xalmente, quem recusa o alimento o a prática de vômitos provocados,
mantém no comando de sua vida, habi- como acredita a maioria

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ŒLeitura complementar Œ
Os transtornos alimentares apresentam
características que se iniciam em idade
muito precoce, ainda mais na sociedade
atual que não oferece um olhar de estra-
nhamento para as restrições alimentares
severas e até para a exclusão de certos
grupos de alimentos com a intenção de
perder peso. É na adolescência, quando
a progressão da doença captura a aten-
ção de que algo realmente sério está
acontecendo, que os diagnósticos são
 G
G  G9
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GGhÔG  GH G IGGG^ G‡ I H
feitos. Segundo Steinhausen, os trans-
corpo, comida e peso) são fatores predisponentes dos TA em geral
tornos alimentares acometem cerca de
1% dos adolescentes, podendo chegar
a consequências graves. Além disso, são encontramos o rechaço à comida como dando relevo a tudo o que compreende
responsáveis também por 1% a 18% da “moeda de troca”, numa greve de fome essa instância que antecede o sujeito,
mortalidade. A obra A obra recém lan-
çada e organizada por Cybelle Weinberg
que tenta “inverter a relação de potên- desde onde ele é “falado/(in)desejado”
Psicanálise de Transtornos Alimentares cia com o Outro” (Lacan, 1995). desde antes de seu nascimento; fonte da
– Volume II reúne artigos de psicanalis- As contribuições de Lacan ajudam linguagem, de influências culturais e so-
tas com vasta experiência na clínica dos a transcender o mal-entendido, a posi- ciais no sujeito. Mais cedo ou mais tarde
TA, membros da CEPPAN, que trabalham ção equivocada que estava no front da este se encontra com sinais de que ele
junto a outros renomados especialistas.
explicação das anorexias e bulimias e não supre totalmente o desejo deste Ou-
que culpabilizava diretamente os pais, tro materno – encarnado na mãe –, não
mas sim a algo que se perde na tradu- especialmente as mães: o que era atri- o completa e responderá a isso de mo-
ção ao português do Brasil e indica buído de modo reducionista à mãe, de dos distintos. Se o sujeito vai consentin-
um ponto fundamental dessa clínica e “carne e osso”, deve-se a ela encarnar,
que ambos os transtornos mantêm, em via de regra, para a criança tudo o que
suas descrições ao longo das épocas: se diferencia da criança, isto é, o mun- As dificuldades
o componente da “relação” do sujeito, do; a matriz de sua alteridade, daquilo no relacionamento
em constituição, com o outro do qual que ao mesmo tempo ele terá de se di-
está se diferenciando, jogo no qual o ferenciar, e lhe custa, como as perdas interpessoal
alimento participará, inevitavelmente. da separação, a castração, à qual muitas dos pacientes
Não somente em Lacan o ato da vezes se resiste, rechaça. Neste rechaço,
recusa alimentar guarda relação com se dá o terreno psíquico para anorexia,
fazem com que o
protestos da criança à figura da alteri- principalmente. Já em Freud estavam investimento dos
dade encarnada nos pais, mais espe- descritos mecanismos pelos quais o profissionais na
cificamente na mãe – nutriz por exce- bebê inconsciente, e muito precoce-
lência desde os registros arcaicos, filo mente, aceita, acusando recebimento aliança terapêutica
e ontogeneticamente, a mãe constitui ou recusando os indícios que esse mun- deva ser constante.
IMAGENS: 123RF/SHUTTERSTOCK/DIVULGAÇÃO

um o(O)utro associado ao alimento. O do lhe apresenta de castração, isto é, de


que se passa nas anorexias e bulimias ruptura e separação entre ele e o outro Escutá-los e
enquanto rechaço desse Outro, en- – e a mãe, de quem nasce e precisa se saber acolhê-los
carnado na mãe, é um mecanismo in- diferenciar, encarna esse lugar. Lacan
consciente, segundo a Psicanálise, para grafou com maiúscula o termo “Outro” sem julgar são
manter consigo o controle. Em Lacan, para distinguir do outro (semelhante), fundamentais
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ALERTA

do com tais operações de separação do No início do aqui tocados guardam relação com essa
Outro, resultará uma falta, de um lado, forma muito particular de padecimen-
e um objeto, de outro (chamado objeto século XX, to que se encontra na clínica, e que tem
a). Em torno destes se organizarão as surgiu o termo se feito notar fora dela, também nos ou-
pulsões, o circuito de satisfação. Dessa tdoors ou passarelas, pela semelhança
defasagem, dessa falta constitutiva re-
“anorexia mental”, das formas apresentadas na anorexia
sulta o sujeito do inconsciente, como ser depois resgatado na cultura atual sob o Império das Ima-
de linguagem, resultando em diferentes
estruturas psíquicas, por assim dizer.
por Lacan por gens; o que é vez por outra denunciado,
flagrado ou (in)confesso, nos segredos
No complexo interjogo com o colocar acento no da bulimia, já que essa variante não fica
Outro e seu consentimento ou recusa aspecto psíquico evidente no corpo.
da separação do Outro materno se co- Estima-se que a bulimia seja sub-
locam as tentativas de recuperação e e não no aspecto diagnosticada em torno de apenas
perda, o que nos permite compreender orgânico do termo 30% de sua real incidência, e somen-
melhor a dimensão da questão com o te pequena parte busque tratamento.
controle, central nessa clínica. Como o
médico “nervosa” Dentre outras razões, devido ao temor
sujeito, no adolesc(S)er, tem dificulda- por restaurar o peso ou ver-se sem os
des e “inseguranças” em consentir com imagem, em que sempre encontrarão métodos imaginados como eficazes
efetivar essa separação, pode resistir a defeitos, e a ilusão de que a magreza os de emagrecimento e causadores de
tornar-se adulto e vir a fazer-se presa apagaria, resolvendo tais angústias. consequências mortíferas inimagi-
dos circuitos libidinais mais antigos A nós, profissionais da clínica, náveis para tais sujeitos. Na bulimia a
de sua história: orais e anais, especial- cabe cuidar dos equívocos e seus efei- negação dos riscos à saúde é ratificada
mente implicados nos fenômenos ali- tos muitas vezes danosos, legados des- pela captura da imagem do corpo “com
mentares, os métodos de esvaziamento sa confusão, e sempre que possível ze- peso normal”. Assim, a grande maio-
do corpo, tentando murchar um Outro lar por não replicá-la, não perpetuá-la. ria das pessoas com bulimia pode não
muito cheio, do qual são ambivalentes ser identificada como tal mantendo
em separar-se; vacilando em consentir Desafios seu padecimento e comportamentos
com a perda apegam-se ao corpo da in-
fância, e conflitos maiores se deslocam
para o alimento e o problema de sua
M as, afinal, o que isso tem a ver
com os transtornos da alimen-
tação ou alimentares? Todos os pontos
de risco – dentre outros, parada car-
díaca – em segredo. Essas demandas
não se apresentam diretamente, mas
se enredam silenciosamente por meio
de outros comportamentos e queixas.
Escutá-los, saber acolhê-los sem jul-
gar, tratá-los e/ou encaminhá-los são
fundamentais. As dificuldades no re-
lacionamento interpessoal de tais pa-
cientes fazem com que o investimento
dos profissionais na aliança terapêutica
deva ser constante; condição sine qua
non para adesão a tratamento farmaco-
lógico, tendendo a reduzir o abandono
do tratamento clínico como um todo.
O tratamento segundo Guideli-
nes da American Psychiatry Associa-
tion (2006) preconiza em primeiro
lugar ativar a motivação para tratar,
destacando a aliança terapêutica, a
restauração do peso saudável (cresci-
Em adolescentes e adultos a psicoterapia ainda é a primeira conduta a ser indicada, acompanhada de
mento e desenvolvimento em crianças
tratamento com psicofármacos – quando associada a outros sintomas psiquiátricos –, nutrição, terapia e adolescentes), bem como padrões ali-
ocupacional, endocrinologia, a depender da complexidade do caso e faixa etária mentares mais adequados, reduzindo

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questões psíquicas para o físico, elemen-
to típico do funcionamento anoréxico-
-bulímico. Cabe a nós profissionais da
clínica psi escutar com sabedoria para
Estima-se que a bulimia acompanhar, deixando-nos guiar por
seja subdiagnosticada tais sujeitos em seus dolorosos proces-
em torno de apenas 30% sos. Frente aos impasses e desafios para
de sua real incidência, tratar transtornos alimentares, reco-
pois muitos não buscam
tratamento, dentre outras
mendamos acolhimento e disponibili-
razões, devido ao temor dade para o “manejo clínico” ou, como
por restaurar o peso quer a Psicanálise, “manejo da transfe-
rência”. Há que acompanhá-los despro-
vidos de qualquer furor curandi, como já
recomendavam Freud e Lasègue, para
O que a Psicanálise psíquicas, e que silenciosamente gritam que seja possível colocar a aposta no su-
por ajuda em uma demanda muda, no jeito e a interrogação ética como parcei-
descreve há um corpo sequestrado, evidente na aliena- ras constantes, como fizeram esses dois
século, vem sendo ção na imagem, e no deslocamento das grandes clínicos.
encontrado em
estudos científicos REFERÊNCIAS
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O padrão-ouro, na criança e ado- SEIDINGER-LEIBOVITZ, F. M. et al. Abandono do tratamento em anorexia nervosa e bulimia: uma revisão
lescência com TA seria o mesmo, crítica. Revista Interface, n. 11, p. 120-137.
acrescido da exigência total dos pais ou SEIDINGER9!:(:-  ‚IG
 I` I
GHG

GGGHG GG
alimentares na visão dos pacientes: um estudo clínico-qualitativo. [Mestrado] Faculdade de Ciências
responsável pela criança, especialmen-
Médicas, Unicamp, 2014.
te o responsável na hora das refeições, SILVERMAN, A. H. Interdisciplinary care for feeding problems in children. Nutrition in Clinical Practice, v.
figura fundamental neste caso. (Bryan 25, n. 2, p. 160-165, 2010.
Lask, 2015; Fairburn et al) STEIN, D. M.; LAAKSO, W. Bulimia: a historical perspective. In: International Journal of Eating Disorders, v.
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As demais abordagens STICE, E & WHITENTON, K. Risk Factors for Body Dissatisfaction in Adolescent Girls: A Longitudinal

E nfim, a angústia, o padecimento Investigation, Vol. 38 (5), 669–78. 2002.


subjetivo invariavelmente presente The effect of experimental presentation of thin media images on body satisfaction: a meta analysis
review, IJED, 31:1-16, 2002.
na fonte desses quadros, e tão esque-
WEINBERG, C.; CORDÁS, T. Do Altar às Passarelas – da Anorexia Santa à Anorexia Nervosa. São Paulo:
cidos muitas vezes pelos atoleiros das
IMAGENS: 123RF

ANABLUME Ed., 2006.


questões no território do corpo, e das World Health Organization. Mental health: facing the challenges, building solutions. Who Library Catal
complicações clínicas secundárias às +H IGG9=;;@9 d¤¤:: : ¤
GG¤G¤
¬‚¤;;;C¤DA?@=¤ CB>;<:


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divã literário por Carlos São Paulo

LADOS de
metades INTEIRAS
O AMOR PRESSUPÕE UM EU DIVIDIDO EM PARTES QUE SE
OPÕEM. ESSA É A LIÇÃO DE O VISCONDE PARTIDO AO MEIO,
UMA FÁBULA DE ÍTALO CALVINO QUE EXPLORA O FANTÁSTICO

A
mar o outro faz-nos perceber Sentir-se pela metade é bem pró- idealizações que precisamos sofrer para
nossa incompletude. Ao no- prio da juventude quando se permite nos darmos conta do quanto o ideal é
tarmos em nós mesmos dois deixar a força natural do desenvolvi- inimigo do real.
lados como inimigos irre- mento empurrá-la em direção à tota- Metade de nós revela virtude, outra
conciliáveis, sentimos a luta entre eles lidade, um lugar a que nunca se chega. metade mostra maldade, mas, para além
e também a dor de se ferirem para uni- Em nosso amadurecimento, o sentir- dessas metades, existimos. Precisamos
rem-se em um todo chamado indivíduo. -se incompleto deverá continuar para sair dessa ignorância de nos sentirmos
É dessa forma que obtemos o verdadeiro que nos faça sentir que ainda há vida inteiros. Inteiros por pensarmos que so-
ato de amar a si e ao outro. Assim nos a ser vivida. mos só virtuosos ou então apenas des-
ensina o livro O Visconde Partido ao Meio Vivemos lidando com a ideia do trutivos até que os sintomas apareçam
de Ítalo Calvino. aceitável e do não aceitável em nossa para denunciar a inconsciência dessa
O visconde Medardo, no intuito de convivência com aqueles que nos ar- unilateralidade.
agradar alguns duques, vai à guerra e rodeiam e com os que podem nos dar Ensina a Psicologia de C. G. Jung
é atingido por um tiro de canhão que ou não amor. Escondemos na sombra o que todas as vezes em que o homem se
o divide ao meio. Retorna à sua cidade comportamento ou ideia que nos pareça encontra em num de seus extremos, sua
uma metade do visconde que se revela fazer perder esse amor e exibimos o que outra parte o avisa em sonhos. Um ho-
muito cruel. Quando os habitantes da achamos que irá impressionar o outro na mem vivendo sua unilateralidade como
cidade já estavam desanimados e amar- ilusão de ser amado. Chega o momento o bem absoluto ou o mal absoluto é
gurados, eis que aparece a outra meta- em que nos sentimos divididos e perce- alguém que prejudica os demais e a si
de como um visconde absolutamente bemos que parte de nós é desejo e outra próprio com a sua incompletude. Quan-
bom. Até que os habitantes percebem parte é renúncia. do conseguimos alertá-lo desses lados
que maldades e virtudes igualavam-se Muitas são as feridas que experi- opostos e irreconciliáveis, precisamos de
na desumanidade, pois pessoas cheias mentamos em nome da boa educação um ego forte para suportar a tensão até
de boas intenções podem ser chatas e dos nossos pais e são essas feridas pri- que transcenda para uma terceira condi-
terríveis. Por amor a Pamela, essas duas mais que nos atrapalham em fazer parte ção completamente nova. Essa terceira
bandas do visconde entram num duelo dessa unidade universal que chamamos condição é diferente de cada uma das
e se ferem mortalmente. Para salvá-las, natureza. Algumas fazem-nos perder duas outras originais, mas também con-
o dr. Trelawney costura uma metade parte de si e, como se estivéssemos ata- tém, de algum modo, aquelas mesmas
na outra e faz das duas partes um úni- DOSAUMlOINVISÓVEL GUIAMO NOSPOR partes opostas entre si.
co visconde. Nas palavras do autor, “o ele nessa busca do que possa nos com- Quando metade de nós mesmos
homem mutilado, incompleto, inimigo pletar. Ao encontrarmos o que estava não consegue amar, e essa condição
de si mesmo, precisou do amor para perdido, unimo-nos pela paixão para pertence a outra metade à qual não
tornar-se inteiro”. depois sentirmos tão opostas as nossas conseguimos estar unidos, o objeto

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ENSINA A PSICOLOGIA
DE C. G. JUNG QUE
TODAS AS VEZES
EM QUE O HOMEM
SE ENCONTRA NUM
DE SEUS EXTREMOS,
SUA OUTRA PARTE O
AVISA EM SONHOS

do nosso amor poderá nos fazer sentir Sofremos com o drama de nos sen- esses dois lados é a esperança da intei-
confusão já que não estamos inteiros tirmos inacabados. Sempre estamos reza. Somente o homem consciente de
nesse ato. Uma metade luta com a ou- por nos completar com alguma busca sua incompletude e em busca de se har-
tra, e apenas quando se ferem é que se que muitas vezes aparece na forma de monizar com a natureza que o acolhe,
torna possível, mediante tratamento, objetos ou atitudes irracionais diagnos- e que ele chama de Deus, é que poderá
transcender esses opostos incompatí- ticados como angústias existenciais. É o tornar-se um indivíduo.
veis para tornarem-se unos e dignos sofrimento da alma do homem sempre Para aqueles que enxergaram a
dessa união. Descobrimos que nossa a buscar se completar com afazeres e disputa de Hillary Clinton e Donald
parte perdida estava projetada nos ou- atividades lúdicas, ou mesmo vícios, ex- Trump como o discurso de um lado
tros e era tracionada pela angústia da pressões imaginais do que o completa. bom e civilizado contra um lado mau
incompletude. Dessa forma, o papel do Por outro lado, aqueles que se sen- EPRIMITIVO EUCONVIDO OSAREmETIREM
analista é costurar e unir o que antes tem completos talvez não sintam mais a sobre o que existe de certeza no que vai
existia separadamente. necessidade de viver para buscar o que ser e o quanto em nós mesmos apare-
IMAGENS: SHUTTERSTOCK/ DIVULGAÇÃO E ARQUIVO PESSOAL

lhes falta. A nossa parte boa e a parte cem esses dois lados disfarçados em
mesquinha nunca conseguem fazer ao sintomas ou modos de vida inapropria-
outro algo virtuoso, porém a luta entre dos à evolução do ser.
O Visconde
Partido ao Meio
Autor: Ítalo Calvino
Editora: Companhia Carlos São Paulo é médico e psicoterapeuta junguiano.
das Letras É diretor e fundador do Instituto Junguiano da Bahia.
carlos@ijba.com.br / www.ijba.com.br
Número de páginas: 104

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cinema Por Dr. Eduardo J. S. Honorato e Denise Deschamps

Respostas
contraditórias
entre arrepios e
ƒ€
/3%2)!$/BLACK MIRROR02/6/#!
).4%.3!3$)3#533š%33/"2%
4%-!3!0!2%.4%-%.4%
!02%3%.4!$/3%-5-&5452/
02œ8)-/ -!315%.!2%!,)$!$%*£
./3!.'534)!-!45!,-%.4%

T
rataremos aqui do episódio 4 da temporada mais atual, a
terceira, porém recomendamos a série Black Mirror para
ser assistida na íntegra. Cada episódio mostra de maneira
INDEPENDENTEUMAHISTØRIACOMINÓCIO MEIOElM-ASELA
se amarra e sempre deixa um gosto de “quero mais”. Essa temporada
que foi disponibilizada há pouco tempo chegou ainda mais provoca-
tiva. Futuro e presente se fundem de uma forma realmente genial, e,
segundo o que o criador dela tem declarado em entrevistas, parece
SERESSAMESMASUAINTEN¥ÎO CAUSARARREPIOSEREmEXÎO
Somos apresentados a duas ambições igualmente ansiadas, um
sistema de saúde de cuidado integral que contempla a velhice com
cuidados paliativos no sentido de dar qualidade de vida e minimi-
zar o sofrimento; e a possibilidade de que, de alguma maneira, se
tenha o recurso de driblar a morte ou tomá-la nas próprias mãos,
além de deixar uma mensagem implícita no quanto de virtual tem o
que chamamos de vivência, mas diferente do argumento de Matrix
(1999/2003) das irmãs Wachowski, em San Junipero as escolhas per-
tencem à própria pessoa.
O episódio que foi dirigido por Owen Harris e roteirizado por
#HARLIE "ROOKER COME¥A NAQUELE ESTILO lLME ANOS   JUVENTUDE E
DIVERSÎO LIBERDADEELOCALDEVERANEIO!JOVEMTÓMIDA9ORKIE-A-
ckenzie Davis) leva o espectador a conhecer sua narrativa para em
SEGUIDAENTRAREMCENAAhDESCOLADAv+ELLY'UGU-BATHA 2AW /
encontro das duas trará ao episódio uma sensação de “fofura”, que

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a.com
om br
om. br
nho com muitos anos a menos ou mais
magro, mais atlético, mais encorpado,
bronzeado etc.? Alguns pais sonham
COMSEUSlLHOSCOMOBEBÐSOUCRIAN¥AS 
DEPOIS QUE ELES JÉ ESTÎO  HÉ MUITO  NA
FASEADULTA4ERAJUVENTUDEDEVOLTANÎO
ÏDEALGUMAMANEIRAUMDESEJOIMENSO
DEUMAGRANDEPARCELAQUEJÉESTÉCOMA
idade mais que madura?
Outro ponto a pensarmos é no quan-
TOAPØSAJUVENTUDEUMSUJEITOPERMANE-
ce muito parecido com o antes, apenas
tendo seu corpo sofrido os impactos do
envelhecimento, como dizem popular-
MENTE  hPOR DENTRO AINDA Ï UM JOVEMv
Esse episódio toca com encantamento
nesse aspecto, como se fosse possível
abrir na vida uma outra possibilidade de
O encontro da jovem tímida Yorkie (Mackenzie Davis) e da descolada Kelly (Gugu Mbatha-Raw) dá um EXPERIÐNCIA.OSERIADOOTEMPOQUEPO-
tom de “fofura” ao gênero de suspense da série dem experimentar isso é limitado, no es-
tilo “embalos de sábado à noite”, e então
pouco tem a ver com o restante da série, ¡).4%2%33!.4% aproveitam tudo que podem. É dada a
que quase sempre cai para o suspense até possibilidade a alguns de que, depois de
com certo terror. Esse ponto fora da cur-
/2/4%)2/4%2 morrer, possam continuar para sempre
va da série acaba se convertendo em uma %3#/,()$/%33% em San Junipero.
gostosa surpresa. 2%#/24%$/3!./3 “Gostei, você é autêntica”, lança Kelly
De forma bastante competente, intro- PARA 9ORKIE  RECONHECENDO SUA SINGULAR
duz na relação que se forma entre Kelly  -!2#!$/30/25- lGURAFRENTEAOSOUTROSQUEVIVEMALIIN-
E 9ORKIE UM AFETIVO HISTØRICO E UMA RE- £0)#%$%-5$!.—! tensamente em busca dos referenciais da
lação daquilo que se costuma nomear MODA DOS ANOS  ¡ INTERESSANTE O RO-
$%#/-0/24!-%.4/
COMOhSAIRDOARMÉRIOv OUSEJA ASSUMIR teiro ter escolhido esse recorte de tem-
para si e para o entorno a orientação se- !4¡$%3#!-"!2%- PO  AlNAL FORAM ANOS MARCADOS POR UM
xual diversa do que impõe como norma 5-2%42/#%33/ ápice de mudança de comportamento,
TODO O CONJUNTO SOCIAL ! CONVERSA QUE uma revolução que vinha das décadas de
acontece entre as duas sobre essa ques-
02).#)0!,-%.4%0%,/ 60/70 até descambar em um retrocesso e
tão, de como foi para cada uma perceber !0!2%#)-%.4/$! fechamento principalmente pelo apareci-
sua orientação homoafetiva e como foi !)$3 15%-/$)&)#/5 MENTODA!IDS QUEMODIlCOUOSPADRÜES
sustentar isso em seus grupos sociais, é DEBUSCASEXUALAFETIVA1UEMFOIJOVEM
de uma delicadeza informativa, e leva
/30!$2š%33%85!)3 NADÏCADADESABEDALIBERDADEIMENSA
mesmo o mais empedernido espectador que se respirou em sua primeira metade e
a uma empatia com a história que será a pensar que nos mecanismos dos sonhos todo um declínio nisso que descamba nas
condutora da trama. muitos fazem com que o sonhador se décadas seguintes, produzindo gerações
VEJAANOSMAISJOVEMOUAINDACOMFOR- bem mais confusas em relação às esco-
/3/.(/$!*56%.45$% MASMODIlCADASQUECOMBINAMCOMO lhas que podem fazer, convivem em igual
/LUGARÏEFETIVAMENTEUMSONHO JÉ DESEJADO1UEMNUNCASEVIUEMUMSO- medição de forças com um movimento
que é uma vivência compartilhada pu-
ramente mental, possibilitada por inven-
Eduardo J. S. Honorato é psicólogo e psicanalista, doutor em Saúde
ções tecnológicas que permitem criá-lo.
IMAGENS: DIVULGAÇÃO

da Criança e da Mulher. Denise Deschamps é psicóloga e psicanalista.


.ESSAIMERSÎO+ELLYE9ORKIESÎOJOVENS Autores do livro  GG Gd 

ƒ : Participam de
e cheias de disposição para as aventu- palestras, cursos e workshops em empresas e universidades sobre
este tema. Coordenam o site www.cinematerapia.psc.br
RASDAVIDA.ESSEPONTO ÏINTERESSANTE

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aparelhos. Passagem bela do episódio,
avançamos algumas casas em direitos
DECIDADANIAE+ELLYSECASACOM9ORKIE
para atender seu pedido de morrer, em-
bora continue com sua decisão de, após
sua própria iminente morte, não acei-
tar a opção de San Junipero, diferente
DE9ORKIE QUE COMSUAVIDAPOUCOOU
nada aproveitada, estava decidida pela
opção da continuidade.
-UITOS QUE ESCREVERAM SOBRE ESSE
EPISØDIO CRITICARAM NO JUSTAMENTE POR
se apresentar como um ponto fora da
curva do restante da série, até por isso
MESMOESCOLHEMOSJUSTAMENTEELEPARA
abordar essa série instigante, que traz
em seus outros episódios das três tem-
GHGGI9  
GƒÔHG
IHG
GGhÔG G poradas provocações bem contundentes
que se forma entre Kelly e Yorkie para fazer pensar na atualidade e para
ONDE QUEREMOS IR ENQUANTO SUJEITOS DA
%33%%0)3œ$)/#/.4%-0,!!3!5$!$% HISTØRIA3AN*UNIPEROTALVEZSEJAORECA-
15%./3!42!6%33!./#/22%2$! do do criador da série de que no caos
do mundo, na insensibilidade que nos
6)$!&2%.4%! #/-/$)2)!&2%5$  atravessa, no frenesi que nos rouba da
#/.34!4!—§/$!).%6)4!"),)$!$% experiência, a ousadia e o vínculo amo-
roso possam nos salvar da angústia e do
$!./33!%84).—§/3%-15%/-5.$/
vazio, possam fazer de toda paraferná-
6£0!2!20/2#/.4!$)33/ lia tecnológica não algo que esterilize o
viver, mas ao contrário traga-lhe novas
libertário e outro de extremo retrocesso. CEQUEOSANOSJAMAISACONTECERAM E perspectivas e oportunidades de pleni-
Kelly pontua isso ao dizer “as pessoas podemos ter certeza de que aconteceram tude: “a vida é tão rara”. Abordando um
não são quadradonas como antigamen- sim e com muita intensidade. tema que parece ser um ponto onde os
TEvCONTRA ARGUMENTANDOQUANDO9ORKIE retrógrados gostam de destilar sua ira,
CONTATERlCADOINCOMODADAPORESTAREM 0/.4/&/2!$!#526! ENQUANTOOMUNDOCORAJOSAMENTEAVAN-
as duas dançando na pista e com isso Aos poucos e com muita sutileza a ça em ações de transformação. Foi di-
sentir-se observada. história vai se revelando em seus deta- VULGADORECENTEMENTEPELO)"'%QUEO
4ALVEZ ESSA NOSSA DÏCADA AGORA ES- lhes, San Junipero e nossas duas per- chamado “casamento gay” percentual-
TEJA GRITANDO O CONmITO LATENTE QUE AS sonagens dão a conhecer os detalhes mente em número cresceu muito mais
anteriores deixaram em aberto e que, de suas vidas e daquele local. Emoção DOQUEOSHETEROSNO"RASIL.OANODE
por desventura, tenhamos evitado olhar ascendente no encontro na vida real de 2015 foram realizadas 5.614 uniões se-
com mais cuidado. Houve um looping +ELLY$ENISE"URSE E9ORKIE!NNABEL gundo o instituto, isso devido em parte
em comportamentos afetivos e sociais. Davis), ambas condenadas à morte em à nova lei que determina que todos os
Alguma coisa disso restou no não en- tempo próximo, duas senhoras de ida- cartórios tenham que realizar ou mesmo
tendido e sequer explicitado. É uma das DE JÉ BEM AVAN¥ADA  QUE TRAZEM DEN- converter a união civil em casamento de
possibilidades para tentarmos, quem tro de si toda uma gama de intensas acordo com o pedido do casal.
sabe, entender a confusão que reina nos EMO¥ÜES 0ARA QUE O DESEJO DE 9ORKIE
últimos tempos por todo o planeta, que QUANTO A SUA MORTE SEJA RESPEITADO ELA 42!—/$%./34!,')!
movimenta uma onda conservadora e re- iria se casar com seu enfermeiro Greg !JUVENTUDEMARCAASAUDADEQUEA
trógrada que não pode se circunscrever a 2AYMOND -C!NALLY  NÎO HAVIA ATÏ vida adulta sempre alimentará; exemplos
nenhum fenômeno puramente local, está ENTÎOCOMOSAIRDOJUGODESUAFAMÓLIA disso são aqueles encontros de turmas
por toda parte. Para uma parcela pare- que não pretendia deixar desligar seus de colégio, clube, rua etc. De alguma


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da.com
a.ccom.
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m brr
maneira, essa fase de imensa potência
O enredo condutor
deixará em todos um traço de nostalgia da trama mostra
E DESEJO DE RETORNO 6ERDADE QUE Ï UM como foi sustentar
momento de muito vazio existencial e a percepção da
angústias sem nome, mas também pos- orientação homoafetiva
nos grupos sociais
sui um olhar de amplidão que a vida
das protagonistas.
vai tratar mais adiante, enquadrar sem Yorkie luta contra
piedade. O roteiro desse episódio con- a angústia que isso
templa essa saudade que nos atravessa costumeiramente
no correr da vida e principalmente fren- provoca nela

te à, como diria Freud, decrepitude e a


constatação da inevitabilidade da nossa
extinção sem que o mundo vá parar por
CONTADISSO$ESEJAMOSMORRERAONOSSO
próprio modo, diria ainda o criador da
Psicanálise, e San Junipero é o máximo
da realização disso.
Em entrevistas recentes o diretor
do episódio disse que até há uma pos-
sibilidade de um spin-off JÉQUEESTERE-
ALIZADO  O lNAL MAIS ESPERAN¥OSO  TERIA
surpreendido os seguidores da série.
Ele alerta para o fato de que, caso isso
venha a ser feito, provavelmente Char-
LIE "ROOKER NÎO DARÉ DOIS lNAIS FELIZES
para o episódio, então a surpresa talvez
NÎOSEJAASSIMTÎOBEM VINDAPARAQUEM /,54/¡5-4%-!3/"2%/15!,
GOSTOU 1UESTIONA /WEN (ARRIS SE PO-
deríamos realmente chamar o episódio
!03)#!.£,)3%3%$%"25—!#/-&2%15º.#)!
de doce, que ele tende a vê-lo mais como %5-$/342!"!,(/303°15)#/315%
um “agridoce”, porque a decisão de se- -!)3#/.3/-%-/35*%)4/
guir vivendo administrando seus lutos,
uma vez que como no caso de Kelly ela .OEPISØDIOSÎODUASVIVÐNCIASABSO- vida tem um prazo de validade, que lu-
estaria sem seus amados por perto, não lutamente diferentes que encontraremos, TAMOS INTERNAMENTE ENTRE O DESEJO DE
FOIUMAESCOLHAFÉCIL.ESSEASPECTOSE- uma que foi capaz de fazer suas escolhas enlaçar mais vínculos e de cessar de vez
RIAMESMOCOMOVIVERUMAOUTRAVIDA JÉ e lidar com suas perdas ao fazê-las, Kelly; com a morte a angústia que isso costu-
QUESABEMOSOQUANTOOlODOSAFETOSÏ e outra que foi impedida de viver o que meiramente provoca. Kelly é bem pontu-
ALGOQUENOSCONSTRØIEMNOSSATRAJETØ- DESEJAVA POR UMA ESCOLHA EM SEGUIR OS al quanto a isso quando em uma discus-
ria pelas experiências. parâmetros de uma família opressora e SÎO COM 9ORKIE FALA DE SEUS MAIS DE 
Se aprofundarmos a discussão sobre repressiva, o que poderíamos ver como anos de casamento e da relação com sua
San Junipero encontraremos então esse duas opções bem básicas que qualquer lLHA DETUDOQUESEENFRENTAPARAQUEOS
tema, o luto que é com toda certeza um SUJEITOENFRENTAEMSUAVIDA RESPONSABI- importantes vínculos permaneçam irri-
dos trabalhos psíquicos que mais conso- lizar-se por suas experiências ou deitá-las GADOSDEAFETO4ALVEZAÓ NESSASEQUÐNCIA
MEM O SUJEITO 3OBRE O TEMA A 0SICANÉ- nas mãos de todo um regramento. do episódio, de forma sutil, se toque nos
lise se debruça com muita frequência, é 3AN*UNIPERO +ELLYE9ORKIENOSCHA- ARREPIOSMAISINTENSOSDOSUJEITODOSVÓN-
levada a isso até mesmo porque a prática mam a pensar no evidente fato de que a culos, bem ao estilo de Black Mirror.
clínica nos mostra que em qualquer situ-
ação, quando aprofundado o tratamento,
IMAGENS: DIVULGAÇÃO

Título Black Mirror ‡-G>ˆ‡*  Gˆ9 hÔdG.GI H%GH


lá estará de alguma maneira o trabalho 0H%G#G%G1G ‡$$ˆ%1  *#G 9
DEDESVINCULA¥ÎODEALGUMOBJETOPERDI- "ÈdGG! IhÔ ^‚IG.  9+G^
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DO OUSEJA DEUMLUTO

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CONCEITO

NOVOS (e vazios)
DESAFIOS da Psicanálise
Em função da nova realidade social, a prática na clínica aponta
para um profissional que não tenha o perfil de dono da verdade,
pois a necessidade obriga uma postura interrogativa
Por Roney A. Moraes

É
inegável a mudança que o emblema de sujeito do suposto saber, o palmente, tudo pode ser dito, mas nada
tratamento analítico sofreu famoso “s.s.s.” lacaniano. Não é papel pode ser afirmado. Sob pena de propor
ao longo dos anos desde sua do analista ditar a verdade definitiva. uma psicoterapia “uma”, quando as
função pelo pioneirismo de Até porque não a possui. Ninguém é problematizações são “múltiplas”.
Sigmund Freud. Do iní- dono da razão, mas, sim, cheio de in- É possível ficar à vontade para sub-
cio do século XX até hoje, a Psicanálise certezas, e o psicanalista não foge à verter certas teorias, porque para o filó-
tem evoluído junto com as necessidades regra. Hoje, o psicanalista, frente às sofo Derrida “escrever é retirar-se. Não
culturais e humanas e de acordo com os novas fronteiras clínicas e sociais, deve para sua tenda para escrever, mas da
novos paradigmas do século XXI. adotar uma postura interrogativa. sua própria escritura. Cair longe da sua
O analista desceu do salto. Não Simpatias ou dogmatismo por es- linguagem, emancipá-la ou desampa-
mais lhe cabe exibir o seu pomposo colas à parte... Na transmissão, princi- rá-la, deixá-la caminhar sozinha e des-

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munida”. E, para isso, os ingredientes, Quem procura
mesmo que aparentemente tabelados,
podem cumprir diferentes funções tratamento
degustativas no paladar de cada leitor. psicanalítico, hoje,
Seja ele analista ou analisando.
Quanto aos pacientes, é comum, apresenta uma
na clínica de hoje, uma alta incidên- tendência para a
cia de sujeitos com um sentimento
de baixa autoestima e toxicomania. busca de soluções ŒModernidade líquida Œ
Também há os quadros de sujeitos mais rápidas e, O sociólogo polonês Zygmunt Bauman é
considerado um dos principais pensado-
altamente estressados. Contudo, as
patologias clássicas também apare- alegando razões res da modernidade, alvo de suas reflexões
mais frequentes, entre elas a famosa defi-
cem (neuroses fóbicas, por exemplo). econômicas reais, nição do conceito de liquidez. Analista dos
Entretanto, somos tomados a estudar fatos cotidianos, Bauman é dono de uma
um fenômeno relativamente recente: insiste em ter um vasta obra literária a respeito de temas con-
temporâneos, com destaque para o livro
a patologia do vazio. menor número Amor Líquido, que busca compreender as
Segundo o psicanalista David E. relações afetivas no mundo atual.
Zimerman, a queixa inicial desses de sessões
pacientes postulantes à análise recai semanais, além de
frequentemente em uma angústia as inovações tecnológicas, por exemplo.
existencial quanto à validade da exis- duração mais curta As últimas novidades de celulares de
tência em si. Zimerman também diz da análise hoje não sobreviverão até a próxima
que nos pacientes que sofrem da “pa- estação, já serão ultrapassadas por mo-
tologia do vazio”, o eixo do sofrimen- delos mais “completos” que acumularão
to não gira tanto em torno dos clás- Adicionada ao sucesso dos medi- mais funções e terão uma vida útil redu-
sicos conf litos resultantes do embate camentos milagrosos ocorre uma pe- zida na mesma medida.
entre pulsões e defesas. rigosa confusão entre muitos pacien- Da mesma maneira, ou com a mes-
“O giro se faz predominantemente tes e psicoterapeutas de outras linhas ma lógica, funcionam os relacionamen-
em torno das carências, provenientes e métodos teóricos. Alguns, e não me tos. Como aponta o sociólogo polonês
das faltas e falhas que se instalaram furto em falar de analistas também, Zygmunt Bauman em seu livro Amor
nos primórdios do desenvolvimento agem como se fossem resolver todos Líquido, as relações amorosas da atua-
emocional primitivo e determinaram os problemas humanos sem encami- lidade seguem o princípio da satisfação
a formação de vazios no ego, verdadei- nhamento para possíveis profissionais – como se prega no comércio em geral –,
ros “buracos negros” à espera de serem mais adequados àquela demanda. em que para permanecer com alguém é
preenchidos pela figura do psicanalis- preciso ter nossas necessidades satisfei-
ta, o que poderá ser feito por meio de Eficácia do método tas plenamente.
sua função psicanalítica.”
Quem procura tratamento psica-
nalítico, hoje, apresenta, em boa parte,
O prejuízo para o paciente é incal-
culável e, para o analista, indisso-
lúvel. É preciso aprender mais sobre as
Com isso, o esvaziamento é cons-
tante, tanto dos produtos quanto das
pessoas, e a Psicanálise se defronta cada
uma tendência para a busca de soluções novas formas de se fazer análise, pois, vez mais com um mal-estar, cuja inci-
mais rápidas e, alegando razões econô- mais do que nunca, a Psicanálise está dência nos consultórios aumenta. Não
micas reais – porque de fato o poder em evidência e isso tem um preço: o da se trata de uma ocorrência inusitada,
aquisitivo baixou –, insiste em ter um eficácia do método. pois Freud, em 1926, já citava esse tipo
menor número de sessões semanais, A sociedade contemporânea disse- de paciente portador de uma angústia
além de duração mais curta da análise. mina o vazio e a solidão. Basta observar automática e desamparo.
A contemporaneidade e seus impac-
IMAGENS: SHUTTERSTOCK/WIKIPEDIA

Roney A. Moraes é psicanalista; Especialista em Saúde Mental e Dependência Química; Mestre em tos contribuem para o surgimento de um
! ‚G
G   Ôe+ I G‡: :IˆeG
+ IGP ‡+
ˆeG G
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G número maior dessas pessoas, as quais
IG!
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 ^  pertencem a um grupo psicopatológico
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+ GHRIGG
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GIG
 GGI  
'G‡'ˆ: que denominamos de portadores de pa-
tologia do desvalimento.

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CONCEITO

PARA SABER MAIS Adicionada ao


)  --$  /(SETTING(*$!$* sucesso dos
medicamentos
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G


‚IGhÔ
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necessária para acolher a nova subjetividade que emerge nesses tempos de
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e psicoterapeutas

  
G
9
IG9
GG G:'G
 ÈI GG9Ô G: de outras linhas e
métodos teóricos.
Zygmunt Bauman (sociólogo po- Zygmunt Bauman usa para descrever as Alguns agem
lonês nascido em 1925) popularizou o relações frágeis. A grande sacada desta
conceito de modernidade líquida, que palavra envolve a noção de que, em uma como se fossem
é a época atual em que vivemos. Seria conexão, a vantagem não está só em ter resolver todos os
esse conceito um dos sintomas sociais várias conexões, mas, principalmente,
para as patologias do vazio? em conseguir desconectar sem grandes problemas humanos
perdas ou custos. A relação frágil tem
Volatilidade como pressuposto a transformação dos “O sujeito líquido não tem mais

A modernidade líquida é o conjunto


de relações, ações e operações que
dá base para a contemporaneidade. É
humanos em mercadorias que podem
ser consumidas e jogadas no lixo a qual-
quer momento – a qualquer momento
referenciais de ação: toda a autori-
dade de referência é colocada em si e
é sua responsabilidade construir ou
uma época de liquidez, de fluidez, de eles (os humanos) podem ser excluí- escolher normas a serem seguidas
volatilidade, de incerteza e insegurança. dos”, descreve Vinicius. – tudo se passa como se tudo fosse
Os referenciais morais da época ante- Para ele, o sociólogo diz que a co- uma questão de escolher a melhor
rior (segundo Bauman, modernidade nexão é frágil porque o sujeito líquido opção, com melhores vantagens e,
sólida) são retirados de cena para dar lida com um mundo de consumo e op- de preferência, nenhuma desvanta-
espaço à lógica do agora, do consumo, ções, mas esse mundo nunca é objeti- gem”, revela.
do gozo e da artificialidade. vo e frio, ele ainda causa frustrações e, Essa era é também reconhecida
De acordo com o colunista Vini- como já dito, insegurança. como sociedade de consumo, era da
cius Siqueira, em seu trabalho sobre imagem, sociedade do espetáculo, era
Bauman publicado no site Colunas do vazio, ou do homem light.
Tortas, as relações de trabalho cada
vez mais se desgastam, e a própria Patologias
esfera do trabalho cada vez mais vira
um campo fluido desregulamentado.
Então, empregos temporários, meia
P ara David E. Zimerman, na atu-
alidade está sendo bastante va-
lorizado um novo paradigma: os
jornada, empregos em que as relações déficits-vazios, ou seja, a formação
de empregado-empregador são cons- de verdadeiros “buracos negros” psí-
tituídas somente pelos dois (como os quicos decorrentes das falhas primor-
trabalhadores que são Pessoa Jurídi- diais no decurso do desenvolvimento
ca) tornam-se situações fáceis de ob- emocional primitivo, do que resulta
servar e consideradas legítimas pela uma grande demanda de pacientes
sociedade. Nisso, emerge a figura do portadores do que se denomina “pa-
G9‚
GI GG
desempregado crônico. para pessoas que apresentam um sentimento
tologia do vazio”, os quais, acima de
“Nas relações pessoais, as conexões de baixa autoestima, toxicomania e quadros tudo, ficam à espera de que o analista
123RF

predominam. Conexão é o termo que altamente estressados consiga preencher tais vazios.

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MOMENTO DO LIVRO

NO DIRECTION HOME

BOB DYLAN
A mais completa biografia do artista

Centenas de livros foram publicados sobre outro jornalista conseguiu. Finalmente, depois
%RE '\ODQ PDV HVWH p R ~QLFR HVFULWR FRP de 20 anos de muita pesquisa, No Direction
a cooperação do biografado. Robert Shelton Home foi publicado pela primeira vez em 1986
teve acesso exclusivo aos familiares e amigos HDFODPDGRFRPRELRJUDÀDHVVHQFLDOGHVVHJr-
bem próximos de Dylan, algo que nenhum nio de temperamento difícil, mas apaixonante.

$ HGLWRUD /DIRQWH UHODQoD HVVD ELRJUDÀD


num momento em que Bob Dylan ganha o
3UrPLR 1REHO GH /LWHUDWXUD  ´SRU WHU
criado uma nova expressão poética dentro da
grande tradição norte-americana da canção”,
segundo a secretária permanente da Academia
6XHFDUHVSRQViYHOSHODSUHPLDomRGR1REHO
Sara Danius. Se a Academia surpreendeu ao
FRQFHGHU R 3UrPLR 1REHO D XP FRPSRVLWRU
aqueles que conhecem a obra de Dylan sabem
o quanto de poesia e literatura ela carrega.
´2 UHFRQKHFLPHQWR GR 1REHO j VXD P~VLFD
entendida como um organismo vivo no qual
as letras são o corpo sobre o qual se apoia o
resto, é portanto algo histórico”, escreveu Fer-
QDQGR1DYDUURQREl País.
'HVIUXWHGHVWDELRJUDÀD

“Ei, eu recusei todos os pedidos. E


estou lhe dando todo o apoio. Eu estou
Livro: EŽĚŝƌĞĐƟŽŶŚŽŵĞͲ BOB D YLAN
Prêmio confiando em você para trilhar este ca-
ǀŝĚĂĞĂŵƷƐŝĐĂĚĞŽďLJůĂŶ NOBE L
Número de páginas: 788
de Liter atur a
2016
minho comigo.”
Editora: Lafonte Bob Dylan

À venda nas livrarias

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PERlL Por Anderson Zenidarci

O jovem
Hughes
em 1912

H
oward Robard Hughes Junior
foi um aviador, construtor de
AVIÜES  INDUSTRIAL  PRODUTOR E
diretor de cinema e um dos
homens mais ricos do mundo. Ficou fa-
MOSOAOQUEBRARORECORDEMUNDIALDE
VELOCIDADEEMUMAVIÎO&OIMUITOBELO 
SEDUTOR E ELEGANTE .ASCEU NA VÏSPERA
DE .ATAL DE   NÎO GOSTAVA DA DATA 
POISNÎOTINHAFESTADEANIVERSARIOSEM
PAREAREMCOMO.ATAL#OMOESTUDAN-
TE  APRESENTA UM INTERESSE ESPECIAL POR
matemática, voo e mecânica. Cresceu
Howard Hughes em FORTEMENTE INmUENCIADO E SUPERPROTE-
frente ao seu novo GIDO POR SUA MÎE  !LLENE (UGHES  QUE
Boeing Army Pursuit Plano, apresentava misofobia (medo de germes
na década de 1940
e de contágios de enfermidades). Por
CONTA DISSO TRATAVA DE ISOLAR SEU lLHO

Do CÉU
de todos os germes ambientais. Assim,
O MENINO CRESCEU COM UMA PERCEP¥ÎO
HOSTILEPERIGOSADOMUNDOEXTERIOR.A
ADOLESCÐNCIA  (UGHES TEVE UMA PARALI-

ao INFERNO
SIAElCOUMESESSEMANDAR TENDOSIDO
DIAGNOSTICADO COMO CAUSA PSICOLØGICA
(hoje denominada transtorno histri-
ÙNICO  /S MÏDICOS NÎO ENCONTRARAM
HOWARD HUGHES NÃO SE CAUSAS ORGÊNICAS !PØS lCAR ØRFÎO  FOI
DECLARADO UM MENOR EMANCIPADO E TO-
AMEDRONTAVA EM SER PILOTO EM VOO MOU O CONTROLE DA COMPANHIA DO SEU
PAI AOSANOS ESTIMADAEMMILHÎO
EXPERIMENTAL DE IMENSOS AVIÕES, DEDØLARES$EVIDOÌSUACRIA¥ÎOISOLADA 
MAS SUCUMBIU ÀS “AMEAÇAS” TINHAPOUCOSAMIGOS ERADESCONlADOE
EXAGERADAMENTE PREOCUPADO COM SUA
CRIADAS POR MINÚSCULOS GERMES PRØPRIA SAÞDE &OI DIAGNOSTICADO COMO

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HUGHES TINHA TOC E DESENCADEOU
UMA FOBIA SOCIAL SEVERA. NÃO TINHA
CONTATO FÍSICO COM AS PESSOAS. ELAS ERAM
PROIBIDAS DE FALAR OU OLHAR PARA ELE
portador de TOC (transtorno obsessivo- QUE FOSSEM RETIRADOS DO LOCAL %STAVA
COMPULSIVO  %LABOROU PROCEDIMENTOS CERCADO POR DEZENAS DE CAIXAS QUE ELE
RÓGIDOSERITUALÓSTICOSDEHIGIENEAOSSEUS DIARIAMENTEARRUMAVAVÉRIASVEZES/U-
FUNCIONÉRIOS  QUE INCLUÓAM LAVAREM AS TRA VEZ  TORNOU SE OBCECADO COM O lL-
MÎOS DEZENAS DE VEZES NO DIA  USAREM me Estação Polar Zebra e, de acordo com
LUVAS MÉSCARASEGUARDANAPOSDEPAPEL SEUSASSESSORES ASSISTIUVEZESSEGUI-
AOLHESERVIRALIMENTOS%MABAN- da. Tornou-se dependente das drogas,
DONOUAUNIVERSIDADE CASOU SECOM%LLA ENTRE AS QUAIS CODEÓNA ORIGINALMENTE
Rice e juntos mudaram-se de Houston RECEITADAPARAOALÓVIODADORDASLESÜES
PARA (OLLYWOOD  ONDE PRETENDIA PRO- SOFRIDAS NOS DESASTRES DE AVIÎO OCORRI-
DUZIRlLMES PORÏMOCASAMENTODUROU DOSANOSANTES E6ALIUM%MOUTROISO-
SOMENTEATÏ LAMENTOlCOUSENTADOEMUMACADEIRA 
(OWARD SEMPRE TEVE UMA PAIXÎO a maior parte do tempo nu, continua-
POR AVIÜES !LÏM DE PILOTAR  APRENDEU MENTE ASSISTINDO A lLMES 3UA HIGIENE Poster do longa Hell’s Angels, considerado o
SOZINHO SOBRE ENGENHARIA E PROJETOU E PESSOAL TORNOU SE INEXISTENTE n ELE NÎO ‚G IG G\Ô:hG
de cerca de US$ 3,8 milhões, conjugou as
CONSTRUIU VÉRIOS MODELOS DE AVIÜES *É TOMAVABANHONEMCORTAVAOCABELOEAS
G €
# I GGG GhÔ
ERARICOElCOUMUITOPOPULAREFAMOSO unhas por meses, embora isso possa ter
3OFREUACIDENTESAOTESTAROSPROTØTIPOS SIDODEVIDOÌALODINIARESPOSTADEDORA
DOSAVIÜESQUEPROJETAVA.ÎOAPRESENTA- ESTÓMULOSQUENORMALMENTENÎOCAUSA- FOS PARAESSEFATODENÎOSEHIGIENIZAR 
VAMEDOEDESAlAVASEUSLIMITES%MBO- RIAMDOR %TAMBÏMPORACREDITARQUE Ï QUE SE RECUSAVA AO TOQUE DEVIDO Ì
RARESTRITONOSCONTATOSFÓSICOS SUAVIDA A ÉGUA PODERIA TRAZER GERMES MORTAIS DOR CAUSADA PELA 3$2# SÓNDROME DE
SENTIMENTAL FOI BASTANTE AGITADA  TENDO 3EUCOMPORTAMENTOERACADAVEZMAIS DOR REGIONAL COMPLEXA  QUE Ï CARAC-
RELA¥ÜESAMOROSASCOMINÞMERASESTRE- IRRACIONAL E SUA SAÞDE FÓSICA TORNOU SE TERIZADA POR FORTE DOR E SENSIBILIDADE
LAS DE (OLLYWOOD COMO !VA 'ARDNER  PRECÉRIA %M UMA DAS RARAS VEZES QUE CUTÊNEAAESTÓMULOSMÓNIMOS(IPØTE-
Katherine Hepburn, Ginger Rogers, PERMITIUSERVISTO OMÏDICOQUEOEXA- SE BASEADA NOS ESTUDOS DOS RELATOS DE
"ETTE $AVIS  4ERRY -OORE  /LIVIA DE MINOUCOMLUVASEMÉSCARA COMPAROU SUAS QUEIXAS -AS A GRANDE PATOLOGIA
(AVILLAND *EAN(ARLOW ,ORETTA9OUNG  SUA SITUA¥ÎO Ì DOS PRISIONEIROS QUE TI- que o acometeu e que desencadeou to-
Lana Turner. Casou, e divorciou, com NHA VISTO EM CAMPOS DE CONCENTRA¥ÎO DASASOUTRASFOIAPSÓQUICA
A ATRIZ *EAN 0ETERS %LE NÎO TEVE lLHOS JAPONESESDURANTEAŠ'UERRA-UNDIAL (UGHES PASSOU O ÞLTIMO PERÓODO
-ASESSEGLAMOURCAMUmAVAOSEUDESE- %XTREMAMENTEMAGRO MUITOSUJO DE- DASUAVIDANO-ÏXICO FÓSICAEMENTAL-
QUILÓBRIOPSICOEMOCIONAL SIDRATADOEANÐMICO%LESERECUSAVAA MENTE DOENTE E ABSOLUTAMENTE SOZINHO
%M (UGHESAGRAVOUSEU4/# QUALQUER TIPO DE TRATAMENTO OU INTER- NO MUNDO  SE NÎO CONTARMOS COM OS
ECOME¥OUAEXIBIRCOMPORTAMENTOSBI- VEN¥ÎO-AISNOlNALDESUAVIDA TINHA g uarda-costas que o acompanhavam.
ZARROSEALARMANTES!FOBIAAOSGERMES OCABELOCORTADOEASUNHASAPARADAS -ORREUAOSANOS DEPARADACARDÓACA 
DESENCADEOU UMA FOBIA SOCIAL SEVERA APENAS UMA VEZ POR ANO  MUITO PELA EMPLENOVOODO-ÏXICOPARAOS%5! 
.ÎOTINHACONTATOFÓSICOCOMASPESSO- EVITA¥ÎODOTOQUEEMEDODECONTÉGIOS onde seria internado para tratamento.
AS%LASERAMPROIBIDASDEFALAROUOLHAR PORMAISPARADOXOQUEPOSSAPARECER %STAVAIRRECONHECÓVEL LONGEDOHOMEM
PARAELE%PISØDIOSDETOTALISOLAMENTO COM SUA TOTAL FALTA DE HIGIENE  /UTRA QUE ESTAMPAVA AS CAPAS DOS TABLOIDES
SEM SAIR DO AMBIENTE QUARTO  ESTÞDIO HIPØTESE LEVANTADA PELOS SEUS BIØGRA- COMOUMACELEBRIDADE
ETC SETORNARAMROTINA5MADASVEZES
IMAGENS: WIKIPEIDA/ ARQUIVO PESSOAL

lCOUNOQUARTOESCURODOESTÞDIO SEM Anderson Zenidarci é mestre em Psicologia pela PUC-SP, supervisor e


palestrante. Coordenador e professor do curso de Especialização em
sair, por mais de quatro meses. Comia Transtornos e Patologias Psíquicas pela Facis, professor de pós-graduação no
APENAS BARRAS DE CHOCOLATE  FRANGO  E curso de Psicologia de Saúde Hospitalar na PUC-SP. Atua há mais de 30 anos
BEBIA SØ LEITE  DEPOIS URINAVA EM GAR- em atendimento clínico em diversos segmentos da Psicologia, com especial
dedicação à psicossomática, transtornos e patologias psíquicas.
RAFASERECIPIENTESVAZIOSENÎODEIXAVA

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ESTUDO DE CASO

RESILIÊNCIA:
entre a expectativa
e a realidade
Momentos difíceis, por
piores que sejam, podem
ser encarados por meio de
inúmeras reações e maneiras
de enfrentamento, com
o objetivo de retomar o
autodesenvolvimento a partir
de novos aprendizados
Por Amanda Oliveira

Amanda Oliveira é psicóloga, pós-graduada em Gestão


Estratégica de Pessoas pelo Mackenzie e extensão em
Práticas Psicoeducativas em Instituições e Comunidades
pela PUC COGEAE. Master coach formada pelo Instituto
G  
GI 9 I ‚IGh€$GI G 
ECA (European Coaching Association), GCC (Global
Coaching Community) e ICI (International Association of
Coaching Institute). Autora do livro O Grito que Ninguém
Ouviu (Editora Novo Século) e coautora dos livros Coaching
nas Empresas – Estratégias de Coaching para o Ambiente
Corporativo e Por que Sou Coach? (ambos da Editora IBC).
123RF

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A
o longo da vida, mui- se esforçando o suficiente para melhorar parecia que só eu estava sofrendo com
tas pessoas passam sua vida. Quem nunca ouviu esse tipo de aquilo, realmente poderia ser besteira.
por situações que são cobrança? Todos, obviamente. Afinal, não tinha acontecido nada de-
consideradas adversas, mais, eu só tinha levado um tiro em um
como perda de entes Experiência pessoal assalto e ficado com sequelas. Isso acon-
queridos, adoecimentos, conflitos
com pessoas que amamos, desempre-
go ou até a violência, seja ela psicoló-
A os 19 anos eu fui vítima de violên-
cia urbana, fui baleada durante um
assalto, e esse fato me trouxe sequelas
tece com milhares de pessoas por aí e o
tempo todo, então, deve ser normal.
Eu me esforcei para pensar assim
gica ou física. Quando observamos os físicas, emocionais e psicológicas que e seguir os conselhos que me eram
indivíduos nos momentos difíceis de viraram meu mundo de cabeça para dados, mas percebi que pensar dessa
suas vidas, é possível perceber que as baixo. Eu não sabia lidar com nenhuma maneira era muito fácil na teoria, mas,
reações e formas de enfrentamento daquelas emoções e sentimentos inten- na prática, superar e agir como se tudo
são diversas, pois há os que conse- sos que experimentava, tampouco con- fosse muito normal e estivesse tudo
guem retomar o autodesenvolvimen- seguia organizar minhas ideias. Então, bem não eram nada fácil.
to, a partir de novos aprendizados, e
aqueles que não conseguem seguir
adiante sem arrastar as correntes No auge do desespero, busquei o apoio das
que os mantêm presos aos fan- pessoas do meu convívio, tentando conversar
tasmas de um passado que só
traz dor e pesar. Esse meca- com elas para dividir um pouco aquele peso que
nismo de enfrentamento eu carregava, na esperança de que alguém me
das adversidades é o que
se chama de resiliência. dissesse o que fazer com aquilo tudo
A resiliência é um
termo originado da Físi- no auge do desespero, busquei o apoio Mesmo concluindo isso, a exigên-
ca e da Engenharia, que das pessoas do meu convívio, tentan- cia de estar sempre bem ainda me per-
se refere à capacidade do conversar com elas para dividir um seguia. Eu me esforçava para mostrar
que um corpo apresenta pouco aquele peso que eu carregava, na ao mundo que havia superado tudo e
de retornar à sua forma esperança de que alguém me dissesse sempre que tocavam no assunto eu até
original após ter sido o que fazer com aquilo tudo. Sabia que fazia piadas. Isso era o que esperavam
submetido a uma defor- ninguém resolveria os meus conflitos de mim, já que além de forte eu era estu-
mação elástica. Quando a internos, queria apenas perceber em- dante de Psicologia e, por isso, não tinha
Psicologia passou a empre- patia em quem me ouvia, saber que me o direito de me deprimir ou de sentir
gar esse termo, ela o adap- entendiam, mas isso não aconteceu. raiva, pois que tipo de psicóloga eu seria
tou dizendo que a resiliência Todas as vezes em que tentava con- se não superasse tudo com maestria?
é a capacidade de uma pessoa tar o que ia dentro de mim, eu escutava
desenvolver-se a partir da res- que deveria esquecer tudo aquilo, que Significado da superação
significação de uma adversidade,
ou seja, ela não voltaria ao estado
original, mas minimizaria os danos
tinha que ser forte e não deveria me
deixar abater, afinal tudo já havia pas-
sado e que agora era “bola pra frente”.
N a frente das pessoas, eu tentava
corresponder a todas as expecta-
tivas, mas quando eu estava só comigo
causados pelo fato traumático (Yunes; Disseram-me também que ficar falan- mesma percebia que a realidade não
Szymanski, 2001; Ungar, 2004). do naquele assunto ou lembrando não era igual. Mesmo assim, mentia para
Esse termo, ao ser interpretado e ia me ajudar, pois o importante era que mim e escondia toda a minha dor, toda
julgado pelo senso comum, passa a signi- eu estava viva e que eu deveria agrade- a minha confusão emocional, já que
ficar que se a pessoa não esquecer com- cer a Deus e parar de me lamentar, já era menos difícil quando não tinha
pletamente os fatos ruins que acontece- que muitas pessoas não tinham a mes- que olhar para elas. Afinal, como me
ram em sua vida, e passar a viver como ma sorte que eu. diziam, eu era forte e isso significava
se tudo fosse apenas aprendizado e a ex- Aqueles conselhos, vindos de tan- que não podia lembrar ou me lamentar.
trair somente as coisas positivas daquela tas pessoas, me fizeram questionar se Passei longos anos da minha vida
experiência, ela não é resiliente e, prova- eu não estava dando importância de- agindo como queriam que eu fizesse,
velmente, está sofrendo porque não está mais para um fato tão banal, pois, como mas isso não funcionou, e a cada dia que

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ESTUDO DE CASO

PARA SABER MAIS Os conselhos,


PROCESSO DE RESSIGNIFICAÇÃO DA PSICÓLOGA vindos de tantas
pessoas, me
A lgumas pessoas iniciam o curso de Psicologia acreditando que com isso estarão
imunes a problemas psicológicos e que conseguirão passar ilesos pelas peças
que a vida nos prega de vez em quando. Embora eu nunca tivesse essa expectativa,
fizeram questionar
tudo o que vivi me faz acreditar que essa crença é uma ilusão. se eu não estava
Ser estudante de Psicologia e estudar muito não me livraram de um transtorno dando importância
de estresse pós-traumático, e ser psicóloga não anulou meu sofrimento psíquico,
pois o ser humano não é lógico, tão pouco previsível. Somos tão complexos que demais para um
em muitos momentos somos incapazes de nos erguer sozinhos, e reconhecer fato tão banal,
que nossa condição humana implica na não existência da autossuficiência nos
permite buscar ajuda. pois como parecia
Ser psicóloga não acelerou meu processo de ressignificação. No entanto, toda a que só eu estava
minha história, principalmente os momentos que mais me fragilizaram, com certeza
contribuiu com o meu constante desenvolvimento e crescimento profissional, pois sofrendo com
acredito que a experiência de vida nos capacita muito mais do que a teoria. aquilo, realmente
poderia ser besteira
passava eu estava mais mergulhada no riam que eu não era resiliente, e eu não
inferno que habitava dentro de mim. queria perder essa imagem perante to- tudo o que eu estava escondendo. Além
E sem perceber passei apenas a existir, dos. Mas, com o passar do tempo, passei disso, durante a formação havia diver-
pois eu não vivia mais. a não me importar com a opinião alheia. sas pessoas passando por processos de
Até que um dia, no auge da solidão O processo de terapia foi muito im- autodescoberta e ressignificação, e ali
e do desespero de um caminhar sem portante, mas foi durante as formações tudo o que eu sentia não era banal. Tal-
rumo, eu olhei para mim, apática como de coaching que eu pude ressignificar vez isso tenha me encorajado a me abrir.
um robô, e me perguntei o que eu esta- o impacto que aquelas adversidades Durante aquele curso, quando a
va fazendo comigo. Por que eu criticava tiveram sobre mim, talvez porque na- opinião dos outros sobre a minha saúde
tanto as pessoas que não me ajudavam quele momento eu realmente estivesse emocional e psicológica passou a não ter
se estava agindo como elas? Perguntei- disposta a olhar para dentro e encarar tanta importância, comecei a pensar em
-me o que eu estava fazendo para me como havia me negligenciado para me
ajudar e estarrecida percebi que não es- sentir “normal” e, consequentemente,
tava fazendo nada. a me perguntar: Quem determinou que
Aquele diálogo comigo mesma, de eu não posso ter raiva depois de ser bale-
alguma forma, me ajudou a despertar. ada em um assalto? Quem disse que eu
Então, a partir dali, eu prometi que não não posso ter medo ao sair na rua? Por
me abandonaria mais e que de algum que chorar é sinal de fraqueza? Por que
jeito tudo ficaria bem novamente. as pessoas sempre dizem frases prontas
O primeiro e mais importante pas- de um otimismo que talvez nem elas sin-
so foi admitir que eu não estava bem, tam, como “veja o lado positivo”, “não
que precisava de ajuda profissional e ŒCoaching Œ fica assim” ou “pare de chorar e esque-
que a minha dor não era banal como os O termo coaching indica uma atividade de ça isso”? Por que não posso chorar até
formação pessoal em que um instrutor (co-
otimistas de plantão sempre me fizeram ach) ajuda o seu cliente (coachee) a evoluir
não ter mais vontade? Ou, ainda, quem
acreditar. Então, comecei a fazer terapia em alguma área da sua vida. Pode ser definido determinou que só é resiliente aquele
e a me consultar com um psiquiatra. com uma soma de recursos que usa técnicas, que não se deixa abater? Afinal, nunca li
Claro que ouvi de muitas pessoas que ferramentas e conhecimentos de inúmeras uma definição de resiliência que disses-
eu não devia tomar o remédio que me áreas, como administração, gestão de pesso- se tratar-se de um rótulo para pessoas
as, Psicologia, Neurociência, recursos huma-
foi prescrito, pois era para gente louca e nos, planejamento estratégico, objetivando
com capacidade de esquecimento e de
eu não era assim. No início eu não con- a conquista de resultados efetivos dentro de embotamento afetivo.
tei para ninguém que estava fazendo o qualquer contexto, profissional ou pessoal. Então, tomei uma decisão impor-
tratamento, pois sabia que as pessoas di- tante. Decidi aceitar que eu não estava

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bem, que as feridas causadas naquele
episódio da minha vida ainda sangra-
vam e que, por isso, eu poderia cho-
rar o quanto quisesse, poderia sentir
raiva, querer ficar sozinha por alguns
instantes e me poupar de pessoas que,
mesmo sem saber ou ter a intenção,
banalizavam o meu sofrimento com o
seu discurso. Tal como um mochileiro,
que após uma longa caminhada precisa
tirar a mochila das costas e descansar
um pouco para depois ter energia para
prosseguir, eu passei a fazer igual, e fun-
cionou para mim.
Quando eu finalmente aceitei mi-
nhas limitações e tive a coragem de
sentar lado a lado com meus fantasmas,
olhar para eles para conhecê-los melhor )G+ I G9G  ÈI G

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GIGIGGI
G

GG   G
G
e entender que fazem parte de mim e da provocados pela ocorrência traumática
minha história, uma vez que somos seres
completos formados por luzes e sombras, Eu finalmente aceitei minhas limitações e tive
eu me permiti aprender com todas as ad-
versidades e me desenvolvi a partir delas.
a coragem de sentar lado a lado com os meus
Depois do lançamento do meu livro, fantasmas, olhar para eles para conhecê-los melhor
O Grito que Ninguém Ouviu, onde conto
sobre a minha história com riqueza de
e entender que fazem parte de mim e da minha
detalhes, muitas pessoas me perguntam história, uma vez que somos seres completos
se eu superei tudo o que aconteceu co-
PARA SABER MAIS
migo, e a minha resposta é que depende
do que ela entende por superação. Se
LIVRO MOSTRA QUE É POSSÍVEL superação significar ter esquecido com-
RECONSTRUIR A VIDA pletamente, não sentir mais nada sobre
esse episódio e viver como se nada tives-
U ma jovem estudante de Psicologia, residente na zona leste da capital paulista,
que trabalha, estuda e participa de trabalhos voluntários. Durante um sábado,
aparentemente igual aos outros, ela acaba sendo vítima de um assalto próximo à
se acontecido, eu afirmo que não supe-
rei. Mas, se para você superação tiver o
sua casa. Durante a ocorrência, é baleada. Um tiro que mudou sua vida. Após esse mesmo significado que tem para mim,
dia, sua saúde jamais foi a mesma. Aqui está o ponto de partida para a história que é se permitir sentir raiva ou triste-
de Amanda Oliveira, retratada no livro O Grito que Ninguém Ouviu – Uma História za e lembrar os fatos que causaram dor
Real de Superação. Além do trauma pelo que sofreu, devido às consequências quando achar necessário, mas continuar
do ato de violência, uma coisa chamou muito a atenção da autora: nenhuma das aprendendo e vivendo sem deixar que os
pessoas que passavam pelo local quis prestar socorro, deixando Amanda estirada fantasmas a impeçam de crescer e seguir
e ferida na calçada. Quando chegou ao hospital foi maltratada, inclusive pelos em frente, sim, eu superei.
médicos. Ao receber alta, e sem estar recuperada, internou-se em outro hospital.
REFERÊNCIAS
Lá, descobriu que precisaria se submeter a uma nova cirurgia. Daí em diante, a
CYRULNIK, Boris. O Murmúrio dos
vida de Amanda se transformou em uma luta diária, deixando marcas visíveis e
Fantasmas. São Paulo: Martins Fontes,
IMAGENS: 123RF/SHUTTERSTOCK

invisíveis. A obra tenta ajudar as pessoas a entenderem que quem passa por um 2005.
trauma grande, às vezes, só precisa de carinho e atenção. O objetivo do livro YUNES, M.; SZYMANSKI, H. Resiliência:
não é oferecer um manual de como superar adversidades, mas, sim, revelar que é hÔ9II G‚I
Gh€
possível reconstruir a vida, mesmo quando tudo parece estar perdido. críticas. In: TAVARES, J. (Org.). Resiliência e
Educação. São Paulo: Cortez, 2001.

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1an0os INFLUÊNCIA DA MÍDIA


$ISCUTIROPAPELDAMÓDIAEQUALAINmUÐNCIAQUEELAEXERCENOCOMPORTAMENTODOPÞBLICOEUVEJO
COMOOBRIGA¥ÎODOSPRØPRIOSMEIOSDECOMUNICA¥ÎO0ORISSO ACHORELEVANTEOSERVI¥OPRESTADOPELA
Psique COMOFOINOCASODAEDI¥ÎO NAQUALABORDAOSEFEITOSNOCIVOSQUEAMÓDIAPODEPROVOCAR
NA SOCIEDADE .INGUÏM NEGA A IMPORTANTE FUN¥ÎO DESEMPENHADA POR ESSES VEÓCULOS EM RELA¥ÎO A
INFORMARAPOPULA¥ÎO/QUEDEVESERMOTIVODEDEBATEÏOFATODESETORNAREMFORMADORESDEOPINI-
ÜESEATÏMESMOIDEOLOGIAS!MÓDIAPODESETRANSFORMAREMUMCANALDEGRANDESMUDAN¥ASSOCIAIS
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IMPOSTOSPELACULTURADAVAIDADEEDOCORPOEOEXAGERONAVEICULA¥ÎODAVIOLÐNCIASÎOEXEMPLOSNE-
GATIVOSDECOMOASPESSOASPODEMSERMANIPULADASPELOSMEIOSDECOMUNICA¥ÎO0ONTOPARAAREVISTA
&RANCISCO#ARLOS/LIVEIRA PORe-mail

#/.42/,%$!/"%3)$!$% Ï IMPORTANTE RESSALTAR  PARA QUE NÎO HAJA REVISTAEXPLICABEMAQUESTÎO DIZENDOQUE


!CREDITOQUEUMDOSPRINCIPAISPROBLEMAS CONFUSÎO  A DIFEREN¥A ENTRE UMA SIMPLES ESTÉPRESTESAVIRARLEINO"RASILACRIMINALI-
EM TERMOS DE SAÞDE PÞBLICA Ï O FATO DE MANIADECOLECIONAROBJETOSEACOMPULSÎO ZA¥ÎODESSAPRÉTICA TÎONOCIVAACRIAN¥ASE
GRANDEPARTEDAPOPULA¥ÎOMUNDIALESTAR DEACUMULAROBJETOS SEMQUESEJAMUSADOS  ADOLESCENTES!lNAL ELESNÎOTÐMCULPADAS
ACIMADOPESO!ENTREVISTACOMAPSICØ- ALÏMDEUMAGRANDEDIlCULDADEEMSEDE- BOBAGENS DOS PAIS -INHA PREOCUPA¥ÎO 
LOGA !NDREA ,EVY  PUBLICADA NA EDI¥ÎO SAPEGARDESSESITENS MESMOQUESEJAMPE- APENAS ÏNOSENTIDODEQUESEJAMAPURADAS
 FOIESCLARECEDORA NOSENTIDODEALER- RIGOSOS OCUPEMMUITOESPA¥OOUQUENÎO COMRIGORESSASOCORRÐNCIAS PARAQUENÎO
tar para a necessidade de os especialistas SIRVAMPARANADA%SSASPESSOASPERDEMO ACONTE¥AMEQUÓVOCOS
ENFRENTAREMOPROBLEMACOMASERIEDADE SENSODEAUTOCONTROLEETORNAMOAMBIENTE ,ILIAN.OGUEIRA PORe-mail
QUEELEEXIGE%USABIAQUEASITUA¥ÎOERA DECONVÓVIOPRATICAMENTEIMPOSSÓVEL
GRAVE  MAS NÎO IMAGINAVA QUE  SOMENTE /SMARDE#ASTRO PORe-mail !*5$!0!2!/#!3!,
NO"RASIL MAISDEDASPESSOASESTÎO 0ARABÏNSÌREVISTAPsique por mais um ano
COMSOBREPESO SENDOOBESAS-UITO /3&),(/3.§/4º-#5,0! DEBONSSERVI¥OSDEDICADOSÌINFORMA¥ÎODO
SE FALA SOBRE A CIRURGIA BARIÉTRICA E SEUS !CHOAVIDAADOISMARAVILHOSA-ASNEM SEUPÞBLICO!ENTREVISTANAEDI¥ÎOFOI
POSSÓVEISRISCOS MASAENTREVISTADADEIXOU SEMPREÏUMMARDEROSAS%QUANDONÎODÉ MUITOBOA!ESPECIALISTAEMTERAPIADECA-
CLAROQUEÏAPRINCIPALALTERNATIVAPARAO MAISCERTOEOMELHORCAMINHOÏUMPARA SAL #RISTINA6ILLA¥A DESMISTIlCAAQUESTÎO
CONTROLE DESSE MAL  DESDE  Ï LØGICO  QUE CADA LADO  SÎO OS lLHOS QUE SOFREM MAIS  EMOSTRAQUE EMDETERMINADASSITUA¥ÜES 
SEJA BEM INDICADA 0OR SE TRATAR DE UM GERALMENTE0ORABSOLUTAFALTADEHABILIDA- PRINCIPALMENTENAQUELASEMQUE APARENTE-
QUADRO TÎO PROBLEMÉTICO  NOS ASPECTOS DEEATÏMESMOEGOÓSMO ALGUNSEX CASAIS MENTE NENHUMDOSDOISPARCEIROSENXERGA
FÓSICOEPSICOLØGICO ENTENDOQUEOPROCE- COLOCAMASCRIAN¥ASEMSITUA¥ÜESDECON- UMASAÓDAPARAOSPROBLEMAS ÏNECESSÉRIO
DIMENTOCIRÞRGICODEVESERAMPLIADOPARA mITO BEM COMPLICADAS  QUE PODEM TRAZER OAUXÓLIODEUMPROlSSIONALESPECIALIZADO
CONTEMPLAR ESSE UNIVERSO TÎO GRANDE DE CONSEQUÐNCIASPSICOLØGICASGRAVESPARAOS -ASNEMSEMPREÏFÉCILDETERMINARQUALO
PESSOASQUENECESSITAMDEAJUDA PEQUENOS5MADASPRÉTICASMAISHORRÓVEIS  MOMENTOEXATODESEPROCURARESSETIPODE
#ÏLIA2EGINA PORe-mail NESSASITUA¥ÎO ÏACHAMADAALIENA¥ÎOPA- TRATAMENTO 1UANDO O DIÉLOGO NÎO BASTA 
RENTAL/ARTIGOQUESAIUNONÞMERODA OUNÎOEXISTEMAIS PRINCIPALMENTEEMRELA-
!#/-05,3§/$%!#5-5,!2 ¥ÎO A TEMAS FUNDAMENTAIS
!MENTEHUMANAÏ DEFATO SURPREENDENTE PARA O CONVÓVIO HARMO-
0ARAUMAPESSOAQUENÎOTEMESSEPROBLE- NIOSO DOS CÙNJUGES  COMO
MA  Ï DIFÓCIL IMAGINAR QUE ALGUÏM POSSA NASCIMENTOEEDUCA¥ÎODOS
SOFRER DE UM MAL CHAMADO TRANSTORNO DE lLHOS QUESTÜESlNANCEIRAS 
ACUMULA¥ÎO  UM DOS TEMAS CENTRAIS DA SEXUAIS DEPROJETODEVIDA
EDI¥ÎO DE NÞMERO  DA Psique .O EN- DIVERGENTES  A SAÓDA PODE
TANTO DEPOISDELERARESPEITODOASSUNTOE SER A TERAPIA DE CASAL 5M
OBSERVAREXEMPLOSÏPOSSÓVELPERCEBERQUE ABRA¥OATODOS
ESSEDISTÞRBIOPSÓQUICO APESARDEAINDASER #LÉUDIA3ERRA PORe-mail
POUCOCONHECIDO PODETRAZERCONSEQUÐN-
CIASNEFASTASPARAASPESSOAS.AVERDADE 

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Ano XI - Edição 131
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Ethel Santaella
TAISNAVIDADOSlLHOS!OLONGODOSANOS  OUTRO CONTINENTE %SSE Ï O NOVO DESAlO DIRETORA EDITORIAL

PORÏM ESSARELA¥ÎOFOISETRANSFORMANDO  -ATÏRIA DA EDI¥ÎO  ESTÉ COMPLETA NO Denise Gianoglio
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psiquiatria forense por Guido Arturo Palomba

Condutopata POLÍTICO
O CONCEITO DOS INDIVÍDUOS NARCISISTAS QUE
TÊM PODER PARA ROUBAR E ROUBAM PARA TER O PODER.
É UM TRANSTORNO DO CARÁTER, ACIMA DE TUDO,
COM EVIDENTE COMPROMETIMENTO DA CRÍTICA

O
quadro clínico teve origem em 1835, na loucura Seria possível se falar em dois subtipos. Primeiro, aqueles
moral de Henry Pritchard. No correr desses 181 QUEENTRAMPOBRESNAPOLÓTICAE PORMEIODELA ROUBAMPARAl-
anos, vieram outros nomes: loucura lúcida ( Júlio de car ricos. Nesse caso, o escopo precípuo desses indivíduos é ter
Matos), cego moral (Schule), personalidade psico- o poder para roubar e roubar para ter o poder. Larapiam verda-
pática, psicopata, sociopata e condutopata, termo que adotamos deiras fortunas, das quais para qualquer pessoa normal a meta-
por ser etimologicamente o mais apropriado para caracterizar DEOUBEMMENOSJÉSERIASUlCIENTEPARAASUAFAMÓLIA NETOSE
certos indivíduos que, enfermos do caráter, praticam atos do- bisnetos viverem extremamente bem. E mesmo já atingido esse
entios que as pessoas normais não praticam. Por isso conduto- nível de riqueza, continuam roubando, pela enfermidade do ca-
patia, pois a pathéia, a moléstia, está na conduta. ráter, pela tara de enriquecer, ganância e deformidade moral.
Existem inúmeros tipos de condutopatas (psicopatas). Para /SEGUNDOTIPODECONDUTOPATAPOLÓTICOPODESERIDENTIlCADO
dar exemplo, só com Kurt Schneider são dez: hipertímico, quando o escopo precípuo não é o dinheiro, porque ele já é rico,
carente de estima, fanático, explosivo, abúlico etc. Há outras mas o poder para mandar pelo prazer em subjugar o próximo, a
CLASSIlCA¥ÜESPITORESCASBUROCRATASOLENE AMÉVELINSOSSO CIR- lMDEALIMENTAREINmARCADAVEZMAISASSUASVAIDADESEXACER-
cunspecto presumido, laborioso eufórico. Entre os condutopa- badas. É um transtorno do caráter, narcisismo acima de tudo,
tas criminosos são citados: serial killer, tarado sexual, criminoso com evidente comprometimento da crítica.
nato, desalmado etc. Porém, quanto à nocividade, ambos se equivalem. Aqueles
A nosso juízo, está faltando cunhar outro tipo: condutopata que são pobres roubam do povo, lesando-o não só na saúde e na
político, para caracterizar o homem público que, por distúrbio educação, bases primordiais para qualquer país, mas em tudo
do caráter, lesa impiedosamente o povo. o mais. E quanto àqueles que são ricos, o grande problema é
que esse subtipo compõe-se de indivíduos extravagantes, quer
na imagem, quer nas ideias. Um bom exemplo é Hitler, com os
seus gestos narcísicos, bigodinho tipo cerdas de escova den-
tal e ideias racistas, nacionalistas, discriminatórias etc. E agora
Donald Trump, com a sua fácies abespinhada, topete bizarro a
la faisão-dourado (pássaro chinês) e ideias xenófobas, dizendo
que vai construir um muro isolando países e que mulheres se
arrastam pela vagina.
São os condutopatas políticos, sem altruísmo, perigosos, de-
magogos e boquirrotos que, além do distúrbio de conduta que
caracteriza a perturbação mental de que padecem, não têm re-
morso sobre aquilo que fazem de errado. São incorrigíveis.
ARQUIVO PESSOAL/123RF

Guido Arturo Palomba é psiquiatra forense e membro


emérito da Academia de Medicina de São Paulo.

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