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35ª aula

Sumário:
Reacções nucleares. Cisão nuclear. Fusão nuclear

Reacções nucleares

Numa reacção nuclear há nucleões que são removidos ou adicionados a um


núcleo. Um exemplo simples de reacção nuclear é a captura de um neutrão para formar
o deuterão:

1
1 H + 01 n → 21 H + γ . (35.1)

Esta mesma reacção nuclear é representada, por vezes, de uma maneira mais compacta
simplesmente por 1 H (n, γ )2 H . Da mesma maneira, a reacção de captura de um neutrão
pelo carbono para produzir carbono-13 é 12 C(n, γ )13 C .
A primeira reacção nuclear realizada em laboratório foi a transformação de azoto
em oxigénio, de acordo com a reacção

14
7 N + 42 He→178 O + 11 H (35.2)

ou, abreviadamente, 14 N (α , p )17 O . Note-se que nestas reacções nucleares se conserva o


número de protões e de neutrões. A reacção (35.2) foi realizada pela primeira vez por
Rutherford, em 1919.
Analisemos esta reacção do ponto de vista da massa−energia segundo um
procedimento análogo ao que usámos na aula anterior para obter as energias de ligação,
ou seja, comparando a soma das massas dos núcleos que reagem com a soma das
massas dos núcleos resultantes da reacção. Temos, por um lado,
m (147 N ) + m ( 42 He ) = 18,005677 u , e, por outro lado, m (178 O ) + m (11 H ) = 18,006958 u .
Estamos a usar nestas expressões a unidade de massa atómica [ver (34.4)], sendo o seu
equivalente em energia 931,5 MeV:

MeV
1 u = 931,5 . (35.3)
c2

A variação de energia é, portanto,

∆m c 2 = −1,193 MeV . (35.4)

A massa dos núcleos iniciais é menor do que a dos finais, o que significa que é
necessário fornecer a energia (35.4) para que a reacção possa ocorrer. Esta energia pode
ser fornecida como energia cinética da partícula alfa incidente.
Ao contrário desta reacção, na reacção nuclear (35.1) liberta-se energia. A soma
das massas do protão e do neutrão excede em 2,224 MeV/c2 a massa do deuterão. A
energia do fotão emitido nessa reacção é, portanto, 2,224 MeV.

1
Cisão nuclear

Tanto na 33ª aula, quando estudámos a radioactividade, como na secção


precedente, vimos várias reacções nucleares. Vimos também, na aula nº 34, que a
energia de ligação por nucleão é menor em núcleos pesados do que em núcleos da
região central da Tabela Periódica. Esta diferença na energia de ligação liberta-se
quando um núcleo pesado se cinde em dois com cerca de metade da sua massa, como
referimos no final da aula anterior. Mas como induzir este tipo de reacções? O próprio
Rutherford mostrou-se céptico quanto a esta possibilidade. De facto, a probabilidade de
ocorrência espontânea de fissão ou cisão espontânea é muito pequena. Contudo, em
1939, os alemães Otto Hann e Fritz Strassman mostraram que, bombardeando urânio
com neutrões podia-se formar bário, cujo número atómico (56) é muito menor do que o
do urânio (92). À descoberta experimental, seguiu-se a explicação teórica, pelos
também físicos alemães Lise Meitner e Otto Frisch (mas que trabalhavam na Suécia
como refugiados) que invocaram a reacção

urânio (Z = 92) + n → Ba (Z = 56) + Kr (Z = 36). (35.5)

Este tipo de processos não é único, como se viria a confirmar mais tarde. Ao absorver
um neutrão, o núcleo de urânio (é o isótopo 235 que cinde) fica num estado meta-
estável. A esfera original desenvolve dois lóbulos que começam a oscilar
coerentemente, há formação de um “pescoço” e o núcleo inicial acaba por se partir em
dois fragmentos principais (ver Fig. 35.1)

Figura 35.1

Um aspecto muito importante no processo de cisão do urânio-235 é ele ser


acompanhado da emissão de dois ou três neutrões, como mostra a Fig. 35.2

Figura 35.2

2
Estes neutrões que assim se libertam podem ir cindir outros núcleos, havendo lugar a
uma reacção em cadeia. Duas reacções típicas de cisão do urânio 235 são as seguintes:

235
U + n →139 Ba + 95 Kr + 2n
. (35.6)
235
U + n →144 La + 89 Br + 3n

Em média1 há cerca 2,5 neutrões a serem produzidos em cada reacção de cisão o que
torna a reacção em cadeia muito rápida. Por cada núcleo que cinde há energia que se
liberta pois a massa dos núcleos (e neutrões) do estado final é inferior à massa dos
núcleos iniciais. É esta a energia que se aproveita nas centrais nucleares para a
transformar em energia eléctrica. O plutónio 239, que é produzido artificialmente a
partir do urânio, apresenta também propriedades de cisão, sendo utilizado em reactores
nucleares. Nos reactores nucleares (ao contrário do que sucede nas bombas nucleares)
tem de se manter controle sobre o ritmo dos processos de fissão, o que se consegue com
absorvedores de neutrões (barras de boro ou cádmio). De facto, como por cada reacção
de fissão saem em média 2,5 neutrões é necessário deixar um só neutrão para a reacção
prosseguir e absorver os restantes. Caso se perca o controle do ritmo de processos de
fissão o reactor explode.

Fusão nuclear

A fusão nuclear é o nome genérico que se dá ao tipo de reacções nucleares em


que núcleos leves se juntam dando lugar a um núcleo mais pesado. Este processo pode,
portanto, ser visto como o processo inverso do de cisão. Vimos na aula anterior que a
fusão de núcleos leves leva à formação de núcleos com maior energia de ligação por
nucleão. Tal significa que há libertação de energia sempre que ocorrem processos de
fusão. É este mecanismo que ocorre nas estrelas e que ocorreu no primeiros minutos do
universo.
No Sol realiza-se a síntese do hélio através dos chamados processos de fusão
protão-protão. Dois protões dão origem ao deuterão; a colisão com mais um protão
produz hélio-3, e da colisão de dois hélio-3 resulta o hélio-4, sendo libertados dois
protões. O esquema do ciclo do hidrogénio no Sol está representado na Fig. 35.3.

Figura 35.3

1
Considerando todos os possíveis canais de cisão e respectivas probabilidades e não apenas (35.6).

3
Em suma, quatro hidrogénios fundem-se dando lugar a um núcleo de hélio e à
emissão de energia (e de positrões e de neutrinos).
Este processo que ocorre no Sol é lento o que o torna desaconselhado para a
produção de energia na Terra em reactores de fusão nuclear. Para a produção de energia
de forma permanente e controlada, as seguintes reacções nucleares são mais
competitivas:

2
1 H + 21 H → 42 He + n (libertam-se 3,3 MeV) (35.7)

2
1 H + 21 H → 31 H +11 H (libertam-se 4,0 MeV) (35.8)

2
1 H + 31 H → 42 He + n (libertam-se 17,6 MeV) (35.9)

Para termos uma ideia mais concreta da energia de que estamos a falar,
lembremos que a ionização de um átomo de hidrogénio requer 13,6 eV e que as energias
envolvidas nos processos químicos são da ordem de grandeza do electrão-volt. Nos
processos nucleares as energias são uma dezena de milhão de vezes maiores…
O núcleo de hélio-3 é formado por dois protões e por um neutrão. O de hélio-4
por dois protões e por dois neutrões (este último é o isótopo mais abundante do hélio).
O hélio é um gás inerte, ou seja não se combina quimicamente com outros elementos,
sendo este um dos motivos por que as centrais termonucleares não poluem.
O tritão, ou 31 H , que entra como combustível na reacção (35.9), é produzido
"aproveitando" o neutrão que se liberta e fazendo-o reagir com lítio (lítio-6 ou lítio-7,
este último mais abundante na natureza: 30 g/m3 na crosta terrestre) segundo as
reacções

6
3 Li + n → 31 H + 42 He , 7
3 Li + n→ 31 H + 42 He + n (35.10)

Curiosamente, na reacção com o lítio-7 o neutrão também aparece como produto da


reacção.
A entrada em funcionamento de centrais nucleares de fusão (economicamente
rentáveis, claro!) não tem data marcada. Será com certeza durante o séc. XXI mas tanto
poderá ser para meados do século, como ainda durante este primeiro quartel. Em breve
entrará em funcionamento o primeiro reactor nuclear de fusão apenas para investigação.
O ITER (www.iter.com) será uma central de confinamento magnético de 1 GW que
utiliza reacções deuterão-tritão.
O que torna a reacção nuclear tão difícil de realizar? Os núcleos (deuterão, tritão,
etc.) por terem carga eléctrica positiva, repelem-se e essa repulsão coulombiana será
tanto maior quanto menor for a proximidade entre eles. Mas se a distância se reduzir
muito, passam a entrar em jogo as "forças fortes" já referidas na 33ª aula. A força
nuclear forte é atractiva e, como o próprio nome indica, muito mais intensa do que a
força de repulsão de natureza electromagnética. Mas enquanto a forca de Coulomb tem
alcance infinito a forte não: cessa a distâncias muito curtas. Mas dentro do seu raio de
acção supera largamente a força repulsiva (é por isso que os núcleos, feitos de protões e
de neutrões, são estáveis!). Quando a "barreira" de repulsão coulombiana é vencida,
surge a "depressão" de atracção devida à força forte. É então que a fusão se dá.

4
A Fig. 35.4 esquematiza a situação. Imagine-se um núcleo a vir da esquerda e outro da
direita. A fusão só ocorre se as barreiras de repulsão coulombiana forem vencidas o que
acontece a temperaturas muito altas.

energia

barreira de barreira de
energia a vencer energia a vencer

energia libertada
quando há fusão

Figura 35.4

As reacções de fusão exigem que os dois núcleos tenham energias cinéticas suficientes
para vencer as barreiras coulombianas. Para se terem essas energias tem de se “aquecer”
o combustível, formando-se um plasma (electrões completamente separados dos
núcleos). O plasma tem de permanecer junto e isolado das paredes do recipiente que o
contém − uma câmara de geometria toroidal (tokamak, ver Fig. 35.5) − o que se
consegue à custa da aplicação de campos magnéticos muito fortes. O plasma está à
temperatura de cem milhões de graus Celsius.

Figura 35.5

As futuras centrais de fusão nuclear não originarão os mesmos problemas das actuais
centrais baseadas na cisão nuclear pois: 1) não utilizarão combustíveis radioactivos já
que a sua matéria-prima é basicamente hidrogénio; 2) os produtos das reacções
nucleares serão átomos de hélio, um gás inofensivo, ao contrário dos resíduos
radioactivos produzidos nas centrais nucleares convencionais; 3) a matéria-prima é
abundante na Terra (basta pensar que cada molécula de água contém dois átomos de
hidrogénio); 4) em caso de acidente na central não se colocarão os problemas
ambientais associados às actuais instalações nucleares.

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