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3º Encontro Nacional da ABRI

Zane Halruth
Mestre em Relações Internacionais no Programa San Tiago Dantas, UNESP-UNICAMP-PUC-SP.
Matemática e Analista de Negociações Políticas Internacionais.

Resumo:

O presente artigo discute a contribuições da análise de Foreign Policy Analysis (FPA)


sob a perspectiva da teoria construtivista de Relações Internacionais com excertos de fatos da
política externa dos Estados Unidos (EUA). Este artigo visa oferecer uma exploração teórica do
processo através do qual as decisões de política externa e os acordos se tornam regras
constitutivas de um regime de segurança nos EUA. Esta abordagem neste artigo pretende fazer
duas coisas: em primeiro lugar, visa à chamada de orientação para uma análise de estudos com
o objetivo de abordar explicitamente a questão do arbítrio em ações de um Estado em política
externa proporcionando um diferencial entre as teorias de RI e as teorias de FPA nos EUA; em
segundo lugar, busca definir uma agenda de investigação.

Palavras chave: política externa dos EUA, regime de segurança, construtivismo.

CONSTRUTIVISMO E POLÍTICA EXTERNA DOS EUA: UMA ABORDAGEM PARA


FOREIGN POLICY ANALYSIS (FPA)

Os Estados Unidos da América (EUA) enfrentam um dilema singular na atualidade:


com uma hegemonia aclamada por uns e discutível pelo termo em si por outros, encontram-se
enquanto Estado, ativamente engajados em uma guerra global contra o terrorismo. No governo
Obama esse foco se mescla com um objetivo de recuperação econômica nacional, mas por
herdar essa prioridade da gestão anterior não se desvincula da majoritária preocupação com a
agenda política de segurança.

Nessas circunstâncias, indaga-se: os EUA pretendem criar, gerenciar e manter um


ambiente seguro nas várias regiões do mundo em áreas temáticas diversas? A resposta padrão
para essa pergunta poderia ser: um Estado adota uma política externa destinada a realizar seus
objetivos de segurança e estes objetivos se baseiam em uma refletida ação conjunta entre as
forças políticas constitutivas do país. E a dedução prossegue: Quais seriam essas forças? São
objetivos formulados isoladamente entre estas forças e articulados paralelamente por grupos ou
ainda são objetivos individualmente determinados pelo presidente?
A história da política externa americana nos traz um fato para a apreciação
exemplificada. Para proteger o acesso ao petróleo no final dos anos 1970, os EUA aprovaram a
Doutrina Carter, (FUSER, 2006) resume bem o processo quando descreve:

No início de 1980, o presidente Carter anunciou que os EUA


consideravam o Golfo Pérsico como uma região do seu interesse vital
e que estariam dispostos a defendê-la por “todos os meios necessários,
inclusive a força militar”. A Doutrina Carter representa uma mudança
em relação à política que os EUA seguiam desde 1945, quando o
petróleo do Oriente Médio passou a desempenhar um papel importante
na sua política externa. Tratava-se, até então, de garantir o acesso a
essa matéria-prima sem empregar diretamente o poderio militar.
Washington se apoiava em uma ambígua parceria com a Grã-Bretanha

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e, depois, na aliança com o Irã e a Arábia Saudita – a estratégia dos
“Dois Pilares”. Esse esquema desmoronou com a revolução islâmica
que, em fevereiro de 1979, instalou no Irã um regime teocrático
muçulmano que elegeu os EUA como inimigo número 1. A
reviravolta aconteceu ao fim de uma década em que o “choque” do
petróleo havia elevado a importância estratégica do Oriente Médio a
um patamar sem precedentes. Finalmente, em dezembro de 1979, a
União Soviética iniciou sua intervenção militar no Afeganistão. Foi
nesse contexto conturbado que os EUA adotaram como política oficial
a defesa do petróleo do Golfo Pérsico pela forças das armas. A
Doutrina Carter – que o historiador Douglas Little definiu como “uma
Doutrina Monroe para o Oriente Médio” – foi anunciada em 23 de
janeiro de 1980, no discurso anual “O Estado da União”. Essa tomada
de posição foi um esforço da Casa Branca para retomar a iniciativa
política no Oriente Médio e marcar uma atitude de firmeza do EUA
diante um duplo desafio: 1) assegurar o controle das reservas de
petróleo do Golfo Pérsico, e 2) reagir à ação militar da URSS na Ásia
Central, interpretada, ao menos publicamente, como uma ameaça. O
discurso do presidente vinculou o petróleo e a segurança do Golfo
Pérsico em dois parágrafos chaves. (FUSER, 2006 p.27)

Esta política externa realizada pelos EUA para patrulhar o Golfo Pérsico e impedir que
as forças externas interferissem na região, garantindo fornecimento de petróleo e energia
adequada para os EUA e economia global, foi objetivamente articulada pelo poder executivo,
mas com apoio da opinião pública americana. E o congresso observava em privilegiada situação
de esperar os resultados e testar se os poderes dado ao executivo, no que tange esse assunto,
teriam bons resultados. Hoje, os EUA identificam o terrorismo global e a proliferação nuclear,
como sendo ameaças de segurança crítica e tal como no passado na culminante Doutrina Carter,
os EUA adotaram uma série de posturas e ações em política externa que traduzisse essa nova
constatação. Esse conjunto de informações seria convergente se não houvesse apesar desta
política, a tentativa dos EUA em criar um novo regime de não proliferação que favorecesse e
provavelmente melhorasse a segurança estadunidense. A premissa seria: cada caso é um caso?
ou há um padrão decisório em termos de segurança? Os contrastes dessas decisões com sua
execução criam um dilema ou uma lacuna explicativa que as teorias políticas e suas hipóteses
ficam por vezes em xeque. Portanto como poderíamos explicar esse processo por meio de uma
teoria?

As Teorias de Relações Internacionais (TRI) expressam uma perda significativa de


elementos para explicar esse processo aparentemente simples da política de segurança
americana. Em parte, é porque esta pergunta na verdade abrange dois ramos diferentes das
teorias de RI, que operam em dois níveis distintos de análise. As teorias de nível sistêmico de
segurança internacional explicam a estrutura de segurança do ambiente internacional e como
esses fatores estruturais formam a ação do Estado. Nesse caso, estudos de segurança estão bem
posicionados para detalhar os efeitos de um regime global de não-proliferação, como o NPT-
Nuclear Non-Proliferation Treaty. Mas, como Waltz (Waltz, 1979) apontou, essas teorias
sistêmicas têm pouco a dizer sobre a política externa de qualquer Estado ou de cada um. A
Foreign Policy Analysis (FPA)1, por outro lado, também desenvolveu teorias para explicar por

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Foreign Policy Analysis is a decision-making approaches and theories fall within the subfield of foreign policy analysis, within
the larger field of international relations. Foreign policy analysis (known as FPA) is distinguished from other theoretical
approaches in international relations by its insistence that the explanatory focal point must be the foreign policy decision
makers themselves and not larger structural or systemic phenomena. Explanatory variables from all levels of analysis, from
the most micro to the most macro, are of interest to the analyst to the extent that they affect the decision making process.

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que um determinado Estado adota uma política particular. Concentrando-se exclusivamente nos
níveis nacional e individual de análise, a FPA explica as ações e decisões de cada um dos
tomadores de decisão e não de sistemas (Hudson, 2005). A FPA pode explicar os diversos
fatores que levaram à aprovação da Iniciativa de Proliferação da Segurança (PSI) como política
oficial dos EUA, mas não pode explicar se essa política irá na verdade fazer algo para prover de
fato segurança.

Este artigo visa diminuir esta lacuna, oferecendo uma exploração teórica do processo
através do qual as decisões de política externa e os acordos se tornam regras constitutivas de um
regime de segurança. Primeiro vou discutir as vertentes teóricas da diferença entre a unidade e
abordagens no nível do sistema que produziu o dilema articulado acima. Em seguida,
examinarei a abordagem FPA para a política externa, identificando seu foco exclusivo na
tomada de decisões. Então, oferecerei uma lente de análise para diminuir esta lacuna. Esta lente
baseia-se em insights construtivistas, que os regimes de segurança são conjuntos de regras. Ao
estudar a política externa como um processo que adiciona à aplicação de insights construtivistas
torna-se possível estudar a produção de regras e a criação de um novo regime de segurança.

O NÍVEL DE ANÁLISE

O fosso entre a política externa e de segurança é uma exemplificação dos níveis de


discussão de análise na qual mencionei. Conforme (Singer, 1961) originalmente formulada,
existe uma diferença entre a análise de um sistema e a análise de uma unidade. Waltz foi
especialmente enfático na consideração de uma distinção entre análise sistêmica e nível da
unidade, ver (Waltz, 1979). Esta conclusão é na verdade, não muito diferente do problema do
agente-estrutura identificado por Wendt (Wendt, 1987). Para a maior parte dos estudiosos das
teorias de Relações Internacionais, houve um bom grau de aceitação por esta distinção e
classificação de suas teorias ao longo dos dois níveis de análise. A natureza material do neo-
realismo e neo-liberalismo serviu para reforçar ainda mais esta distinção.

Os teóricos sistêmicos são claros ao afirmar que um sistema não é simplesmente uma
soma de suas partes constituintes. As decisões individuais, ações, características e capacidades
não se adicionam para formarem as estruturas sistêmicas. Pelo contrário, a distribuição global,
interação e as relações entre esses elementos formulam propriedades sistêmicas além do
controle de qualquer uma unidade. A natureza material das teorias tradicionais leva a uma visão
bastante sistêmica de reposição de elementos para um neo-realista, é tão simples como a
distribuição de recursos. Neoliberais também podem adicionar distribuição de informação e
estruturas institucionais. Enquanto qualquer um pode alterar a unidade de suas próprias
capacidades ou de acesso à informação internamente ou alterar as capacidades de outra unidade
através de uma interação, o resto do sistema não permanece estático enquanto isso ocorre, há
sempre algo acontecendo que influencia um grande todo. Qualquer ação que acontece no
âmbito de outras ações está relacionada a alterações e novas distribuições que fornecem efeitos
sistêmicos e resultados.

Thus, of all subfields in international relations, FPA is the most radically integrative theoretical interprise. Investigations into
the roles that personality variables, perception and construction of meaning, group dynamics, organizational process,
bureaucratic politics, domestic politics, culture and system structure play in foreign policy decision making are the core
research agenda of FPA. Fonte: http://www.americanforeignrelations.com/A-D/Decision-Making-Decision-making-and-
foreign-policy- analysis.html#ixzz0yHmlqx8I. Acesso em junho de 2010.

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Grande parte da literatura de estudos de segurança, especialmente no realista, neo-
realista, e da tradição neoliberal, centra-se neste nível sistêmico e nos constrangimentos
sistêmicos da ação estatal. A estrutura destes constrangimentos sistêmicos geralmente é
bastante rigorosa e traçam limites de ação do Estado para as práticas que tendem a manter o
sistema existente. Na verdade, a crítica do realismo estrutural original era que ele não tinha uma
teoria da mudança (Ruggie, 1986), não havia alternativa para a mudança no sistema de uma
guerra curta e não há maneira de mudar o próprio sistema em seu todo. Esta crítica, porém, veio
de uma veia construtivista. Ataques neoliberais sobre o realismo estrutural desafiou a premissa
da competição sobre a cooperação dentro dos limites da sistêmica (Keohane, 1984), mas não de
outra maneira a questão da mudança.

O desenvolvimento do construtivismo oferece duas vagas para abordar esta questão. A


primeira seria uma nova maneira de ver o problema agente-estrutura (Giddens, 1984; Wendt
1999). Considerando que as teorias anteriores privilegiam um em detrimento do outro
(geralmente a estrutura, a expensas do agente), um marco de abordagem construtivista delineia
um insight sobre como a estruturação da sociologia pode ter a posição de agente e estrutura de
duas partes e do mesmo todo. Assim, os agentes fazem estrutura e estruturas tornam-se agentes.
A segunda abertura foi postular um novo tipo de teoria que foi além “por” questões de causa e
efeito “como” e “o que” questões de processo e constituição (Wendt, 1998).

O foco no processo é em parte uma conseqüência da abordagem construtivista aos


agentes e estruturas, que estão ligados através do processo da prática. Estruturas não são
externas, objetivas, objetos estáticos a serem encontrados como muros, mas são linguística e
socialmente construídas por normas e regras aprovadas e continuamente referenciadas no
processo de produção no sentido social. Este significado social é o material da estrutura social,
que é compartilhado entre os agentes intersubjetivamente. Um foco sobre o processo permite
que se pergunte como são as práticas de (re) produzir as regras da estrutura social, embora
aceitando o fato de que esses processos são por sua vez, moldados por estruturas existentes. O
próprio processo de ação da unidade prevê a ligação entre o agente e estrutura. No entanto,
segundo (CHECKEL 1998), os construtivistas muito poucos têm aproveitado a oportunidade de
explorar a criação de novas regras e normas, dando pouca atenção às questões da agência. Tal
como os seus antecessores, o construtivismo mantém um estrutura pesada, oferecendo mais de
teorias sociais e como regras, normas dão forma e identidades ao Estado e as suas ações e
menos teorias de como os Estados fazem as próprias estruturas.

Pode-se pensar que os estudos de segurança, com seu foco de longa data sobre a
aplicação do poder militar, pode oferecer noções consistentes de mudança, mas não é esse o
caso. Estudos tradicionais de segurança ainda vêem a capacidade militar como uma
condicionante da ação do Estado. Solicita-se de acordo com (Baldwin, 1996) a ampliação do
foco de estudos de segurança, um olhar além do poder militar, um olhar na capacidade de ação
da sociedade civil, criando um desafio a unidade de análise e não se contestando o viés
estrutural do campo. Consequentemente, a grande área da literatura de estudos de segurança é
muito mais capaz de oferecer introspecção em que os Estados devem fazer em resposta a uma
determinada situação e como uma determinada situação pode influenciar a ação do Estado ao
invés de sugerir como um Estado pode reformular a sua situação de segurança ou em que
nuances a sociedade civil americana pode atuar. Aquém de seu potencial, essa estagnação
deixou o campo sem a visão exploratória necessária da não leitura clara, também segundo a
opinião de (Smith, 2004), da nova ênfase militar dos EUA na “definição de estratégias” para
utilizar recursos militares americanos para moldar o ambiente estratégico de uma região crítica

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(Priest, 2003) não se considerando também a sociedade civil como uma variável influenciadora
dessas estratégias.

O CERNE DA DECISÃO

Foreign Policy Analysis (FPA) evoluiu como uma das muitas críticas das teorias
estruturais. Qualquer um que tivesse experiência estudando ou servindo no governo americano
facilmente observa que as decisões do governo, raramente, são seguidas de constrangimentos
estruturais como neorealistas e neoliberais teorizaram. FPA parte da premissa de que os atores,
Estados, indivíduos, organizações e instituições são elementos chaves em decisões de política
externa, e essas decisões são resultados relevantes na política internacional para ser explicada
(Hudson 2005). O campo, portanto, divide o processo decisório para explicar por que os atores
fazem as escolhas que fazem. As teorias desenvolvidas giram em torno de uma literatura
centrada em dois diferentes níveis de decisão. A literatura política sob influência da FPA
claramente teoriza o óbvio, nenhuma decisão do governo é sempre uma resposta puramente
racional aos imperativos sistêmicos (Allison e Zelikow 1999). Pelo contrário, ela reflete a
batalha política dentro do governo, a empurrar e puxar políticos de diferentes agendas. A
política externa final é, assim, um compromisso, não refletindo o que o sistema exige, mas sim
os que as diferentes facções dentro do governo de um Estado podem concordar. Ao trazer de
volta a política e as organizações para o estudo da política, a literatura política produz
explicações de eventos que são bastante fiéis à experiência política real.

Outros trabalhos de FPA são focados em pessoas. No caso dos EUA em política externa,
grande parte da literatura centrou-se na tomada de decisão presidencial, uma vez que é o
presidente que faz a maioria das principais decisões de segurança nacional. Há numerosos
estudos para investigar os diversos fatores que podem causar um indivíduo a fazer as escolhas
que faz; desde fatores psicológicos, personalidade cognitiva à influência do grupo. Ao longo
dos anos, o avanço nesse campo têm se tornado muito eficiente em se analisar os vários fatores
que contribuem para uma decisão. Uma das consequências globais da agenda de investigação
tem sido a redução de uma decisão a uma escolha entre alternativas políticas. Embora esse
enfoque possa produzir teoria, dá uma versão reduzida da tomada de decisões e dos processos
de política externa. Isso impede que o analista estude o que acontece após a decisão, mais
notavelmente a sua implementação. Para ser mais preciso estudiosos de FPA não trabalham em
um vácuo. Inicialmente, alguns dos primeiros estudiosos a fazer política externa, designados
policy makers, incluiam todo este processo em sua formulação, decisão e execução, ambos
relacionados (Snyder et al. 2002). A divisão entre a escolha de política e execução das políticas
tem suas raízes em 1890, quando a cadeira acadêmica Woodrow Wilson estabeleceu a distinção
entre política e administração (Palumbo, Calista e de Estudos Políticos da Organização,1990).
Desde então, a Ciência Política e a Administração Pública mantiveram-se como disciplinas
distintas. No entanto, a política de escolha não é resolvida por si só, decisão isolada. A
execução é vital nesse modo de análise.

Primeiramente, a “sabedoria convencional” sobre a racionalidade e qualidade de uma


decisão, muitas vezes depende de como os formuladores de políticas viram algo que não pôde
ser conhecido pelo tomador de decisão com antecedência. Essa incerteza sobre os resultados à
custa de uma decisão é mais presente na área de segurança. Se as decisões levam ao fracasso,
então a conclusão que se toma é que um ator possivelmente relevante, de alguma forma
“irracional”, faltou conhecer um fator chave que ao fazer uma escolha levou a um resultado
subótimo. Então, por essa lógica tem-se como rara a situação em uma decisão amparada de
fundamentação adequada ocorra com execução falha. No entanto, essa consideração baseia-se

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na tendência de antropomorfizar o Estado e outros intervenientes de RI. O fracasso da
antropomorfização do Estado que não é sobre se “os Estados são pessoas também”, no sentido
analítico (Wendt, 1999), mas sim que os Estados não são atores individuais. Estados, como
todo ator relevante em RI, são as empresas participantes, o congresso, os movimentos da
sociedade civil, a opinião pública e demais derivados. Enquanto um indivíduo pode aplicar suas
próprias escolhas, assegurando que a ação corresponde à escolha, os grandes atores
corporativos, especialmente aqueles organizados em burocracias, escolha e a aplicação seriam
processos separados. Estudos de organizações complexas e suas burocracias demonstram “(...)
discrepâncias enormes em organizações de grande porte que produzem espetacular fracasso da
interação de muitas vezes erros banais na execução” (Perrow, 1984). Alguém deve fazer uma
política escolhida e pautada em uma realidade e normalmente, não será o presidente.

Além disso, grande parte da disputas burocráticas que Allison (1999) descreve como
parte do processo de tomada de decisões continua durante todo o processo de execução. Isso
ocorre porque o significado de qualquer política não está definido em uma decisão. É preciso
ação para interpretar o que a política vai significar na prática. As decisões não podem explicar
todas as situações possíveis em que a política será aplicada, cabendo aos executores a aplicação
a política em circunstâncias imprevistas para produzir uma regra geral (Howard 2004a; Yanow
1996). O “burocrático experiente” sabe que a decisão é apenas metade da batalha, e estão
dispostos e capazes a dar forma ao processo de implementação na mudança de política de
preferências. Por exemplo, a decisão da administração Bush para ir à ONU antes de lançar a
guerra no Iraque. Embora esta decisão representasse uma vitória para o Departamento de
Estado, outras agências foram capazes de moldar a execução da decisão, fazendo a
apresentação que o Secretário de Estado Colin Powell fez, refletir essa análise. Assim, embora a
“linha dura” possa ter perdido na decisão de ir para a ONU, finalmente conseguiram o que
queriam porque a apresentação de Powell na ONU, agora reconhecida como falha em maior
parte de seu curso de ação devido a repercussão causada pelo questionamento da legitimidade
da guerra quando os EUA decidiram fazê-la mesmo sem a aprovação da ONU; demonstra em
outra perspectiva de análise a seguinte constatação: um momento decisivo na condução da
guerra foi que uma batalha burocrática venceu na fase de execução, apesar dos pesares das
consequências oriundas desta.

A natureza abstrata de muitas críticas as decisões de política externa só contribui para o


reconhecimento da importância da implementação. O presidente pode decidir invadir o Iraque
ou reabrir as negociações com a Coréia do Norte, mas ele não aprova a relação de batalhões que
vigiam as linhas de abastecimento na retaguarda para batalhões de corrida em Bagdá, nem é ele
quem escreve o discurso de abertura do principal negociador para a próxima rodada de seis
países. Ele escolhe, contando com sua gestão para obter o trabalho feito, mas estes processos
são cruciais para o resultado da decisão. Uma declaração bem escrita pode oferecer uma
abertura para um avanço nas negociações em área comercial rígida. A área mal guardada na
retaguarda abre a possibilidade de ataques de insurgentes contra uma força de ocupação
despreparada. São todas considerações relevantes na análise de um todo político
estrategicamente articulado.

Das inúmeras decisões de política externa feita a cada ano, cabe-se perguntar: algumas
são mais importantes que outras? Algumas têm efeitos mais duradouros do que outras?
Algumas funcionam melhor do que outras? Se a análise se reduz a decisão individual, é difícil
dizer. No entanto, se a análise é expandida para a execução dessa decisão, então se torna
possível responder essas perguntas e até teorizá-las.

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Significativamente, a FPA é secretamente um projeto estrutural, que procura articular os
fatores que produzem uma determinada decisão, mas em nenhum lugar na FPA há espaço para
a creditação da criatividade individual pura, inovação e escolha. Relatos descritivos de batalhas
políticas burocráticas creditadas a indivíduos criativos para saltar por uma janela política
perfeitamente aberta soam como propaganda política, mas as mais rigorosas teorias sejam de
FPA ou de RI indicam a redução do tomador de decisão a uma equação, eliminando a
criatividade individual. O arbítrio é necessariamente imprevisível, mas não desconectos de uma
estrutura decisória mais complexa. Existe a crença de se estar construindo uma solução criativa
para problemas repentinos, no terreno, que é a marca de uma política de sucesso. Normalmente,
essas adaptações políticas podem acontecer no processo decisório majoritariamente em nível de
trabalho, não em nível de decisão política, e são, portanto, fora da vista de teorias FPA entrando
nas fronteiras das Teorias de Relações Internacionais com um olhar mais detalhado no elemento
e no conjunto. Portanto, a FPA repousa seu foco principal, quase exclusivo, na tomada de
decisões, enquanto as Teorias de Relações Internacionais analisam as possíveis conseqüências e
efeitos das tomadas de decisão. Não havendo uma análise coerentemente relacional entre
tomada de decisão, implementação e consequências-efeitos do contexto decisório. Isso implica
em se considerar como esses termos se relacionam em uma análise

SEGURANÇA NÃO É UMA DISTRIBUIÇÃO FAVORÁVEL DE RECURSOS MATERIAIS

Um insight construtivista central se estabelece na afirmação de que o sistema


internacional não é fixo, externo, material-estrutura, é em vez disso uma estrutura socialmente
produzida de significados compartilhados (regras ou normas) (Onuf 1989; Wendt 1999). As
regras do sistema são produzidas pelas interações dos Estados e, por sua vez a prática do Estado
as forma. Segurança não é uma distribuição favorável de recursos materiais (Mearsheimer
2001, Waltz, 1979), mas sim um regime especial de regras (Howard 2002; Kratochwil 1989).
Kratochwil argumenta que mesmo os mais básicos dos acordos de segurança constituem um
regime. Qualquer política externa move negociação, conciliação, ameaça, compromisso ou
desafio e requer um quadro comum para fazer a ação compreensível para todos os participantes.
Atores contam com “conhecimentos básicos” como uma base para a interpretação de outros
movimentos (Kratochwil, 1978). Para uma política externa produzir segurança, deve ser capaz,
em contribuir de alguma forma, para o entendimento comum de que constituem um sistema de
segurança. A linguagem é a chave para desbloquear este processo, pois é como os atores
percebem ou compartilham o significado. A linguagem não é apenas um meio para a
comunicação através do qual as idéias fluem, não é apenas uma representação pictórica da
realidade. A linguagem é em si um conjunto de entendimentos partilhados que produzem o
mundo social (Fierke, 2002; Howard, 2004; Onuf, 1989; Wittgenstein, 1953). O insight central
de base construtivista sobre esta interação é que não podemos ir além da nossa capacidade
linguística para uma realidade mais objetiva, a linguagem constitui a nossa realidade. Isso não
significa que atores não possam falar da existência de qualquer realidade. No entanto,
linguagem só tem sentido como um conjunto comum de regras a seguir, mas que falam uma
língua, mais que entender as regras é se comungar uma interação constitutiva de objetivos e
significados, este é o ato poderoso da língua. Exemplificando, temos um alto- falante que emite
aleatoriamente palavras sequencialmente, mas essa emissão deve seguir as regras do discurso
compreendido, a fim de fazer sentido. Não há maneira de determinar o que um falante dirá, sua
autonomia é preservada, porque cada ator detém o controle criativo sobre suas próprias ações.
No entanto, um analista pode determinar o que é possível um ator dizer, para ser compreendido.
Como esta possibilidade torna-se este espaço o reino da constrição, os atores se vêem atrelados
as regras de uma língua (Howard, 2002). A realidade material de estudos de segurança é dado
pelo significado e propósito da linguagem compartilhada que permite a sua utilização. Aqui

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está a chave para ligar o nível da unidade de análise da FPA e do nível sistêmico de análise de
estudos de segurança (Kubálková, 2001). O link é a prática de falar, de modo a ser
compreendida, a partilha de significado. Um ator tem uma série de coisas possíveis de se dizer e
devem chegar a um ato de fala. Há decisões a serem tomadas e as oportunidades para a atitude e
criatividade na forma como é feito. Mas, também existem constrangimentos estruturais, um ator
não pode simplesmente dizer o que ele quer e esperar que o mundo se ordene de acordo com tal
ato. Os atores precisam dizer as coisas de certa maneira a serem compreendidos. Idioma,
instância, sentido e significado são contextuais. Este significado compartilhado passa a ser
chamado de regras. Assim, regimes como o Estado são um conjunto de entendimentos
partilhados. Regimes de segurança é um conjunto de entendimentos partilhados sobre o que é
segurança e como os Estados podem atuar para perceber a segurança. Regimes habilitam e dão
sentido às práticas do mundo material. Este significado evolui e muda com a prática.

Os estudos de como os Estados fazem as regras de segurança, exige um estudo de como


os Estados desenvolveram linguagens comuns de segurança com e no outro e em torno de um
tema específico ou dentro de uma região específica. Este é o estudo do processo. Ele pode ser
analiticamente discriminado em etapas (Howard, 2002). Nota-se que este é um processo
recursivo, não se pode apenas proceder através de A para B para C, como se estivesse descendo
por uma escada. Pelo contrário, é como uma orquestra. Começa-se com um instrumento
musical, adiciona-se os cinco primeiros, em seguida, um sexto, e assim sucessivamente então
juntos formam uma melodia completa. Uma vez concluída, a música está composta e os
elementos individuais são difíceis de distinguir na prática final, do todo completamente
formado.

E esse processo é difícil de teorizar, mas as teorias sejam as de RI ou as de FPA


colaboram no sentido de construir e desconstruir processos que contribuem para um exercício
decisório mais consciente em política externa e na percepção do que é segurança, seja em
situações inéditas ou a semelhantes já ocorridas. Esta abordagem neste artigo pretende fazer
duas coisas: em primeiro lugar, visa à chamada de orientação para uma análise de estudos com
o objetivo de abordar explicitamente a questão do arbítrio em ações de um Estado em política
externa proporcionando um diferencial entre as teorias de RI e as teorias de FPA nos EUA; em
segundo lugar, busca definir uma agenda de investigação.
Ao estudar a política externa como um processo que adiciona à aplicação de insights do
construtivismo oriundos de RI, em FPA, tornar-se-á possível estudar a produção de regras e se
conceber o surgimento dos regimes de segurança mais interligados com as demais esferas de
influência no cenário americano e internacional. No que tange a especificidade estadunidense,
necessário se faz o entendimento, acompanhamento constante e detalhado de suas políticas
internas onde se condiciona a reflexão elementar de suas ações pela assunção da variabilidade
que está embutida no sistema político americano e a complexidade de possibilidades que essa
realidade implica. O que mais considero interessante nessa conceituação é que de um caso
particular, à aplicação de insights do construtivismo oriundos de RI em FPA, avalia-se um
padrão de relação conjuntural e nesta perspectiva se torna possível incluir em uma linguagem
da teoria de conjuntos, a inclusão de sistemas como novas variáveis no sistema internacional
tais como a consideração sociológica e cultural de uma nação ou grupo social, as ações das
organizações da sociedade civil, em uma análise de um sistema e regime de segurança. E essa
ligação seria possível porque por meio de uma correlação biunívoca da linguagem
compartilhada ou não entre os conjuntos definidos, pois o que não se pode ser dito por meio de
um sistema de códigos, mas evidenciado por outro sistema de códigos ou linguagem; pode ser
hipotetizado e o que se pode ser hipotetizado pode ser configurado em um sistema de funções
os quais podem produzir convergências e mapeamentos estratégicos decisórios e operacionais,

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possibilitando análises conjunturais mais apuradas no contexto de políticas internacionais, não
se restringindo apenas ao caso particular dos EUA, relacionando-se porém a uma rede maior de
possibilidades a qual pode ser sistematicamente explorada.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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