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Revista de Psicologia
INTERVENÇÃO GRUPAL
Vol. 17, Nº. 26, Ano 2014
RESUMO
Armando Sérgio Emerenciano
de Melo
Universidade de Fortaleza - Unifor O ser humano é ser social e somente existe em função de seus
relacionamentos grupais. O campo do conhecimento sobre a
armandosemelo@gmail.com
convivência em grupo e de suas relações com os outros grupos e com as
instituições mais amplas foi denominado dinâmica dos grupos. Este
Osterne Nonato Maia Filho artigo tem por objetivo explicitar elementos conceituais básicos em
Universidade Estadual do Ceará - UECE relação à dinâmica de grupos. Para tanto, objetivos, estrutura,
osterne_filho@uol.com.br necessidades interpessoais, tarefas e emoção na interação, papéis, entre
outros elementos são destacados. A abordagem da dinâmica de grupos
Hamilton Viana Chaves aplica-se as mais variadas estratégias de pesquisa e de intervenção em
Instituto Federal de Educação, Ciência e instituições. Presta-se ao serviço de transformação das relações
Tecnologia do Ceará – IFCE humanas uma vez que põe em destaque o entrelaçamento de desejos
Universidade de Fortaleza - Unifor pessoais e objetivos coletivos.
hamilton@unifor.br
Palavras-Chave: dinâmica de grupos; grupo; processo grupal; intervenção
grupal.
ABSTRACT
The human being is a social being and only exists due to the group
relationships. The field of knowledge about living in a group and its
relationships with other groups and with the wider institutions was
called group dynamics. This article aims to make explicit basic
conceptual elements in relation to group dynamics. Therefore, purpose,
goals, structure, roles, interpersonal needs, tasks and emotion in
interaction, and other elements are highlighted. The group dynamics
approach is applied to the most varied strategies of research and
intervention in institutions. It is useful for the service of transforming
human relationships once it highlights the intertwining of personal
desires and collective goals.
1. INTRODUÇÃO
O ser humano é um ser social e somente existe em função de seus relacionamentos
grupais. O fato de que o indivíduo nasce, aprende, trabalha e morre em grupo, torna
evidente a necessidade do estudo da vida grupal. Para Zimerman e Osório (1997), todo
indivíduo é um grupo na medida em que, no seu mundo interno, há um grupo de
personagens introjetados, como os pais, os irmãos entre outros, que convivem e interagem
entre si. Este fato indica que, se quisermos compreender o ser humano, devemos estudar
sua vida em grupo.
Para Lewin (1978), um grupo é mais do que a soma de seus membros: consiste
numa totalidade dinâmica que não resulta apenas da soma de seus integrantes, tendo
propriedades específicas enquanto totalidade, princípio da Escola da Gestalt. Possui
estrutura própria, objetivos e relações com outros grupos. A essência de um grupo não é a
semelhança ou a diferença entre seus membros, mas sua interdependência. Lewin
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caracteriza um grupo como sendo um todo dinâmico, o que significa que uma mudança
no estado de uma das suas partes provoca mudança em todas as outras.
Nesse sentido, as tentativas com vistas à realização dos objetivos grupais criam
no grupo um processo de interação entre as pessoas, que se influenciam reciprocamente e
pode haver a produção de novos significados e metas.
Devido à importância que o objetivo do grupo tem para sua existência parece-nos
oportuno uma classificação que considere esta característica como balizadora. Assim, há
os grupos operativos e os psicoterápicos. Os operativos cobrem o campo institucional,
organizacional, comunitário, com foco psico-educativo, portanto, na modificação desses
campos. Os psicoterápicos são classificados a partir da abordagem teórica e têm
perspectiva terapêutica. Neste último caso, temos as perspectivas psicodramática,
psicanalítica, cognitivo-comportamental e teoria sistêmica (ZIMERMAN; OSÓRIO, 1997).
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Por causa do seu caráter amplo, a expressão “dinâmica de grupo” nem sempre é
empregada num sentido acurado. Por isto, é necessário precisar o seu emprego. A
expressão caiu em descrédito devido à aplicação que, às vezes, dela se fez para se referir a
atividades utilizadas com objetivos ilustrativos, recreativos, místicos, entre outros.
Certamente, contribuiu para o descrédito a aplicação inconsequentemente realizada por
profissionais descomprometidos ética e cientificamente.
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campo de pesquisa teve um excelente momento na época de sua fundação, mas que
atualmente dispõe de poucas pesquisas no âmbito acadêmico.
Para Mucchielli (1979) a dinâmica dos grupos, como passaremos a denominar a partir de
agora esse campo de conhecimento, compreende dois conjuntos diferentes de processos:
Nos dois sentidos atribuídos pelo autor para a expressão dinâmica dos grupos,
podemos concluir que se trata de um campo da ciência, pois investiga os fenômenos de
sujeitos em microgrupo; também se trata de uma ciência aplicada, pois se propõe uma
intervenção.
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Para Amado e Guittet (1982, p.99), “os grupos nascem da tomada de consciência de
indivíduos isolados de seus interesses comuns e de sua interdependência”.
Compreendidos assim, os grupos são fundados a partir do compartilhamento de fins que
justificam sua existência e pelo reconhecimento da dependência em relação ao “outro”
para alcançar esse resultado. Os objetivos direcionam as ações grupais. Quando
trabalhamos com grupos, devemos saber como o objetivo do grupo foi estabelecido, como
o objetivo grupal está em interação com os objetivos de cada membro e como o objetivo
do grupo influenciou o processo de inclusão grupal. Quando os motivos que levam os
indivíduos a fazerem parte de um grupo ficam muito destoantes entre si há uma
tendência a surgirem insatisfações e angústias que geram estresses e conflitos. Os
objetivos individuais e grupais podem modificar-se ao longo da existência do grupo.
Assim, é necessário rever os objetivos através de uma discussão explícita no grupo.
Merece atenção especial e acompanhamento sistemático da relação entre os objetivos
individuais e coletivos.
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inclusão se dão facilmente com todos e têm grande círculo de relações, gozam de
prestígio, valorizam a fama e a popularidade. As pessoas que têm inclusão negativa são
retraídas, desligam-se das funções sociais e apreciam o isolamento.
Todos nós usamos as três formas de interação: ora uma, ora outra, mas uma delas
predomina no nosso estilo pessoal. Schutz (1989) ainda destaca que as três necessidades
ocorrem em diferentes momentos ou fases dos grupos (inclusão, controle e afeição).
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Já incluídas pelo grupo, as pessoas sentem-se responsáveis por tudo aquilo que
constitui o grupo, passando à fase de controle. Esse momento corresponde ao momento
no qual o jogo de forças assume caráter importante, uma vez que os membros, ao
procurarem firmar seu lugar no grupo, tentam também a mostrar seu poder de influência.
Compreendem as lutas, as disputas pessoais pela liderança e pela distribuição de poder;
refere-se ao domínio entre as pessoas, à competição fraternal, às discussões sobre os
objetivos, às normas, à organização interna e aos métodos de ação e a tomada de decisão.
Na afeição, por sua vez, o grupo torna-se mais produtivo, criativo, construtivo,
interdependente, sinérgico e amoroso. Em contrapartida, também aparecem o ciúme, a
hostilidade e as manifestações de sentimentos negativos. Cada indivíduo estabelece sua
norma pessoal no que concerne a dar e a receber afeto. Nesta fase, o grupo sente confiança
de expressar sentimentos de qualquer natureza na busca do crescimento individual e
grupal.
A estrutura do grupo se define pelas posições específicas que as pessoas ocupam nele.
Reflete as relações internas entre os membros do grupo e representam a maneira pela qual
as pessoas e seus papéis estabelecem esses relacionamentos. Segundo Cartwright e
Zander (1975, p.802), “parece quase impossível descrever o que acontece nos grupos sem
usar termos que indicam o „lugar‟ dos membros na sua relação mútua”.
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Pagès (1975) define os grupos como conjuntos de pessoas que, em razão de sua
história individual, de relações interpessoais anteriores ou de sua cultura, demonstram
um conflito efetivo sentido por um conjunto mais vasto de pessoas do qual fazem parte,
destacando a composição como uma categoria importante de análise da eficácia grupal.
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Para Bion (1975), as respostas emocionais podem apresentar uma das seguintes
hipóteses: a dependência, a luta-fuga e a união ou acasalamento. A dependência refere-se
à condição que toda pessoa apresenta de depender de algo ou alguém para a realização de
seus objetivos. Pressupõe que um dos motivos para os indivíduos buscarem os grupos é a
necessidade primária de obter deles a segurança, cuidado e proteção. Assim, a fase da
dependência caracteriza-se pela necessidade grupal de um líder, ou seja, de esperar que
alguém diga o que o grupo deve fazer, como e quando realizar ações.
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capazes de alternar papéis com outros membros de acordo com uma tarefa específica,
tornando possível o fluxo e a troca de experiências. Um grupo cujas pessoas assumem
papéis rígidos tende a ser um grupo com dificuldades de adaptar-se às mudanças e com
grande possibilidade de conflito interpessoal futuro.
Por outro lado, sabe-se que, durante o processo, o grupo abre espaço para
emergirem lideranças que têm um papel catalizador das tensões grupais. Estas lideranças
podem ter maior competência para lidar com os processos grupais da tarefa ou
emocionais. Isto é, ao deparar-se com dificuldades na solução de problemas, podem
emergir no grupo pessoas com maior facilidade de lidar com um determinado processo
que auxiliarão o grupo na transposição das adversidades.
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2. CONSIDERAÇÕES FINAIS
A abordagem da dinâmica dos grupos aqui proposta aplica-se as mais variadas
estratégias de intervenção e pesquisa em instituições. Presta-se ao serviço de
transformação das relações humanas uma vez que põe em destaque o entrelaçamento de
objetivos pessoais e objetivos coletivos.
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