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Fichamento Textual – Texto 2.

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Encontro 2 – Elementos Estruturantes
Egberto Martins
Texto 2.1: DENZIN, N.K.; LINCOLN, Y.S. O planejamento da pesquisa qualitativa:
teorias e abordagens. Porto Alegre: Artmed, 2006. (Parte II, Capítulo 7: Três posturas
epistemológicas para a investigação qualitativa: interpretativismo, hermenêutica e
construcionismo social, p; 193-218)

Investigação qualitativa é a denominação de um movimento reformista surgido no início


dos anos 1970 no meio acadêmico. Ao longo dos anos, o movimento conquistou um lugar
em termos políticos e também intelectuais no meio acadêmico. Em certos momentos,
esses movimentos mais pareciam uma “indústria”.
Brigas em torno de organização departamental, de alianças interdisciplinares, do que
constitui uma pesquisa “legítima”, refletem, em parte, a confusão quanto ao que constitui
as metas e os meios apropriados de investigação humana. Há controvérsias maiores nas
disciplinas da psicologia, da sociologia, da antropologia, dos estudos feministas, da
história e da literatura sobre a finalidade, os valores e a ética do labor intelectual.
Assim, é melhor entendermos a investigação qualitativa como um terreno ou uma arena
para a crítica científica social, do que como um tipo específico de teoria social,
metodologia ou filosofia.
Levando em consideração o caráter analítico, o uso da retórica, da argumentação e da
palavra, de fato há um viés bastante social nas pesquisas qualitativas, bem como a crítica
em todos os seus aspectos. Ouso dizer que não há investigação qualitativa sem uma
crítica àquilo que se está estudando.
Assim, é melhor entendermos a investigação qualitativa como um terreno ou uma arena
para a crítica científica social, do que como um tipo específico de teoria social,
metodologia ou filosofia.
As tradições de longa data da pesquisa de trabalho de campo na sociologia e na
antropologia foram revitalizadas e apropriadas sob a bandeira da “investigação
qualitativa”. Há atração por esse terreno por considerarem-no o local em que se revelam
os debates sobre os objetivos das ciências humanas. Muitos pesquisadores parecem
enxergar nesse terreno um lugar para a experimentação com metodologias empíricas e
estratégias textuais inspiradas pelo pensamento pós-modernista e pós-estruturalista.
O interpretativismo, a hermenêutica e o construcionismo social seguem diferentes
perspectivas quanto ao objetivo e à prática da compreensão da ação humana, de diferentes
compromissos éticos e de diferentes posturas em relação a questões metodológicas e
epistemológicas que envolvam a representação, a validade, a objetividade, e assim por
diante.
Há uma questão pertinente sobre a investigação qualitativa e as questões metodológicas
e epistemológicas, pois em uma das notas ao final do capítulo, o autor revela a fatídica
ideia de se utilizar esta linha de pesquisa para “fugir” das pesquisas de cunho
quantitativo, evitando assim o tratamento de dados numéricos. Isso foi ressaltado em
outras oportunidades no decorrer das aulas dos demais professores do programa, e
assim fica bastante claro quando, na proposta da disciplina de Métodos Qualitativos, é
dada ênfase em “ser cursada em permanente ‘diálogo intelectual’ com os conteúdos das
demais disciplinas [...]. Em conjunto, tais disciplinas integram a base epistemológica e
metodológica do pesquisador em formação”.
A investigação social é uma práxis distintiva, um tipo de atividade (como ensinar) que,
ao ser executada, transforma a própria teoria e os próprios objetivos que a orientam. Ou
seja, a partir do momento que o indivíduo envolve-se em atividades “práticas” de geração
e de interpretação de dados para solucionar dúvidas quanto ao significado daquilo que
outros estão fazendo e dizendo, para, então, transformar esse entendimento para o
conhecimento público, ele inevitavelmente estará assumindo inquietações “teóricas”.
Aqui cabe mais uma lembrança de nota de aula: quando é colocado no texto essa
dualidade prática-teoria, acredito que devemos relacionar com a “subjetivação da
objetividade”, uma vez que estamos, através da prática, transformando teoria (objetiva)
em uma ação ou prática que será desenvolvida por uma pessoa (subjetiva).
Origem: Parte 1
Interpretativismo e hermenêutica vs positivismo: no centro da disputa estava a declaração
de que as ciências humanas tinham diferenças fundamentais em relação às ciências
naturais quanto à natureza e à finalidade. Os defensores do interpretativismo afirmavam
que o objetivo das ciências humanas era compreender a ação humana. Aqueles que
defendiam o positivismo e aqueles que propunham a unidade das ciências mantinham-se
fiéis à ideia de que a finalidade de qualquer ciência é oferecer explicações causais de
fenômenos sociais, comportamentais e físicos.
Essa nova abordagem faz sentido, porém é necessário visualizar todo panorama geral, o
contexto histórico do momento em que essa ideia é lançada. Pois ao que pude entender,
há uma severa ruptura paradigmática entre o positivismo e o interpretativismo e
hermenêutica.
Filosofias interpretativistas
Partindo-se de um ponto de vista interpretativista, o que diferencia a ação (social) humana
do movimento dos objetos físicos é o fato de a primeira ser inerentemente significativa.
Dizer que uma ação humana é significativa é o mesmo que alegar que esta possui um
certo conteúdo intencional que indica seu tipo de ação e/ou que o significado de uma ação
pode ser compreendido apenas como o sistema de significados ao qual esta pertence.
Identificação empática
Dilthey afirmava que, para entender o significado da ação humana, é preciso que se
compreenda a consciência ou intenção subjetiva do ator a partir de dentro. É um ato de
restabelecimento psicológico – entrar na cabeça de um ator para entender do que ele é
capaz em termos de motivos, crenças, desejos, pensamentos e assim por diante.
Sociologia fenomenológica
Cicourel e Garfinkel: A análise fenomenológica interessa-se principalmente em
compreender a constituição do mundo intersubjetivo, cotidiano. O objetivo é
compreender como chegamos a considerar significativamente a nossa própria ação e a
dos outros e a “reconstruir a gênese dos significados objetivos da ação na comunicação
intersubjetiva dos indivíduos no mundo de vida social”. Instrumentos: indexicalidade a
reflexividade. A primeira indica que o significado de uma palavra ou enunciado é
dependente de seu contexto. A segunda direciona nossa atenção para o fato de que os
enunciados não são apenas sobre algo, mas também fazem algo.
Jogos de linguagem
Winch tomou emprestada de Wittgenstein a noção de que existem muitos jogos
executados com a linguagem. Cada um desses jogos possui regras ou critérios próprios
que o revestem de significado a seus participantes. A ação humana faz sentido em virtude
do sistema de significados ao qual ela pertence.
Aspectos comuns
(a) consideram a ação humana significativa; (b) evidenciam um compromisso ético na
forma de respeito e de fidelidade em relação à experiência de vida; e (c) enfatiza a
contribuição da subjetividade humana (intenção) em relação ao conhecimento sem
sacrificar, desse modo, a objetividade do conhecimento. Para não interpretar
equivocadamente o significado original, os intérpretes devem empregar algum tipo de
método que lhes possibilite um afastamento de seus referenciais históricos.
O Verstehen é, em um primeiro nível, “o nome de um processo complexo pelo qual todos
nós, em nosso cotidiano, interpretamos o significado de nossas próprias ações e das dos
outros com os quais interagimos”. O objetivo dos interpretativistas é reconstruir as
autocompreensões dos atores engajados em determinadas ações.
As epistemologias interpretativas podem ser retratadas como hermenêuticas. Para
entender uma parte, o investigador deve entender o todo e vice-versa.
Por fim, o interpretativismo supõe uma compreensão epistemológica da compreensão
(Verstehen). Ou seja, considera a compreensão um processo intelectual pelo qual um
conhecedor (investigador) adquire conhecimento a respeito de um objeto (significado da
ação humana). Por isso, a noção de um círculo hermenêutico de compreensão é, como
explica Bernstein (1983), voltada para o “objeto”.
As definições teóricas sobre o interpretativismo dão suporte ao seu conceito a medida
em que há um interesse particular nesse tipo de filosofia, ou seja, atende a alguns
interesses específicos.
Hermenêutica filosófica
Gadamer e Taylor. Vamos partir da premissa de que as filosofias interpretativistas, em
geral, definem o papel do intérprete no modelo do exegeta, um indivíduo engajado em
uma análise crítica ou explicação de um texto (ou alguma ação humana) empregando o
método do círculo hermenêutico. A metodologia exegética joga os trechos estranhos de
uma narrativa [ou de alguma ação social] contra a integridade da narrativa como um todo,
até que suas passagens estranhas sejam resolvidas ou justificadas.
Primeiramente, a hermenêutica de Gadamer e Taylor, imaginada em linhas gerais como
um programa filosófico, rejeita o ponto de vista interpretativista segundo o qual “a
hermenêutica é uma arte ou técnica de compreensão cuja finalidade é a construção de um
fundamento metodológico para as ciências humanas”. A hermenêutica filosófica sustenta
que a compreensão não é, em primeiro lugar, uma tarefa controlada por procedimentos
ou por regras, mas, sim, justamente, uma condição do ser humano. A compreensão é a
interpretação.
Em segundo lugar, no ato de interpretar (ou tomar algo por algo), a tendenciosidade ou o
preconceito sócio-historicamente herdados não são considerados uma característica ou
um atributo do qual um intérprete deva esforçar-se para se livrar. A hermenêutica
filosófica sustenta a ideia de que a tradição não é algo externo, objetivo e pertencente ao
passado. A tradição é “uma força viva que penetra toda a compreensão”. Como as
tradições “influenciam o que somos e o modo como compreendemos o mundo, a tentativa
de nos afastarmos do processo da tradição seria comparável a tentarmos nos afastar de
nossa própria pele”.
A compreensão requer o engajamento das tendenciosidades do indivíduo. Ainda que as
ideias preconcebidas, os preconceitos ou os prejulgamentos sugiram as concepções
iniciais que um intérprete traz para a interpretação de um objeto ou de outra pessoa, o
intérprete põe em risco esses preconceitos ao deparar-se com o que deve ser interpretado.
Em terceiro lugar, é somente em um encontro dialógico com o que não é compreendido,
com o que é estranho, como o que exige de nós, que podemos nos abrir para arriscar e
testar nossas ideias preconcebidas e nossos preconceitos. A compreensão é algo
produzido nesse diálogo, e não algo reproduzido por um intérprete por meio de uma
análise do diálogo que ele procura compreende. O significado é temporal e progressivo.
Nesse sentido, a hermenêutica filosófica opõe-se a um realismo ingênuo ou objetivismo
no que diz respeito ao significado, e pode-se dizer que defende a conclusão de que nunca
existe uma interpretação definitivamente correta.
A compreensão é ela mesma um tipo de experiência prática “no” e “sobre” o mundo que,
parcialmente, constitui os tipos de pessoas que somos no mundo. A compreensão é
“vivida” ou existencial.
A hermenêutica filosófica não é uma metodologia para “resolver problemas” de mal-
entendidos ou problemas relacionados ao significado correto da ação humana. Gadamer
(1975) enfatizou várias vezes que a tarefa da hermenêutica “não é desenvolver um
procedimento de compreensão, mas esclarecer as condições nas quais ocorrem a
compreensão. Porém, essas não são condições da natureza de um ‘procedimento’ ou de
um método que o intérprete deva por si mesmo aplicar no texto”. A meta da hermenêutica
filosófica é filosófica – ou seja, compreender o que está envolvido no processo da
compreensão propriamente dita (Madison, 1991).
Uma dúvida: já que se falou tanto em compreender o compreender, podemos afirmar que
a hermenêutica filosófica é um campo de estudo para a metacompreensão, tendo em vista
conceitos de tradição, tendenciosidade, interpretação e significado temporal e
progressivo para formar uma compreensão aproximada da realidade de um texto?
Origem: Parte 2
As filosofias do positivismo lógico e do empirismo lógico tinham como principal
preocupação a reconstrução racional do conhecimento científico. O empirismo lógico
trabalhava a partir de uma concepção do conhecimento como representação correta de
uma realidade independente.
Em seu ensaio Overcoming epistemology, Taylor afirma que o empirismo lógico segue
uma filosofia da linguagem que pode ser caracterizada, em termos gerais, como empírica
e atomística no sentido de que ela admite: (a) que os significados das palavras ou das
frases são explicados por suas relações com as coisas; (b) que a linguagem deve exibir
uma estrutura lógica; e (c) que não devemos fundir ou confundir as funções descritivas
ou avaliadoras da linguagem.
A linguagem e a razão são entendidas como instrumentos de controle na descoberta e na
ordenação da realidade do mundo. Há uma variação considerável nos modos como as
teorias de investigação e as teorias de conhecimento aproveitam esse encadeamento de
uma teoria empírica da linguagem, uma teoria atomística do eu e uma epistemologia
representacional.
Seguindo nessa linha, a linguagem e a razão juntas formam a estrutura da compreensão?
Construcionismo social
Em um sentido quase imperceptível, somos todos construtivistas se acreditamos que a
mente está ativa na construção do conhecimento. O construtivismo significa que os seres
humanos não conseguem encontrar ou descobrir conhecimento tanto quanto o
construímos ou elaboramos, inventamos conceitos, modelos e esquemas para entender
uma experiência. Há uma dimensão histórica e sociocultural inevitável para essa
construção.
Esse senso comum do construcionismo é também chamado de perspectivismo. É a visão
de que todas as alegações de conhecimento e a avaliação destas ocorrem dentro de um
esquema conceitual através do qual o mundo é descrito e explicado. O perspectivismo
opõe-se a uma epistemologia empírica e realista ingênua que acredita que possa haver
algum tipo de entendimento direto, não-mediado, do mundo empírico.
Potter (1996) que explica o construcionismo na tradição da etnometodologia e da análise
de conversas. “O mundo (...) forma-se de uma maneira ou de outra à medida que as
pessoas o discutem, o escrevem e o contestam”. Sua primeira preocupação está em definir
como um enunciado descritivo é produzido socialmente (ou seja, interativamente) para
parecer estável, factual, neutro, independente do falante e um mero reflexo de algum
aspecto do mundo. O modo como os enunciados funcionam é uma questão de
compreensão das práticas sociais e de análise das estratégias retóricas que estão em jogo
em determinados tipos de discurso.
Denzin (1997) sustenta que o discurso é a prática material que constitui a representação
e a descrição. Para Gergen (1994a), o construcionismo é nada mais nada menos que uma
“forma de inteligibilidade – um conjunto de proposições, de argumentos, de metáforas e
assim por diante – esperando de portas abertas”.
Todas essas visões discordam daquela que pode ser chamada de realismo do significado
– segundo a qual os significados são entidades fixas que podem ser descobertas e cuja
existência independe do intérprete.
A hermenêutica filosófica confia no potencial da linguagem para revelar o significado e
a verdade. Em um evidente contraste com as opiniões de Gadamer e Taylor, muitos
relatos construcionistas (porém, nem todos) sustentam que não existe nenhuma verdade
em relação à questão da interpretação.
O construcionismo então leva às vias de fato o significado puro do que está acontecendo
com a sociedade e as palavras utilizadas para sua formação e evolução, considerando
que o desenvolvimento da mesma se dá através dos diálogos, com seus significados e
interpretações predeterminadas.
O construcionismo “fraco” e o “forte”
Uma interpretação fraca ou moderada do papel desempenhado pelos fatores sociais pode
bem servir para rejeitar as definições de noções tais como o conhecimento, a justificação,
a objetividade e a evidência da forma como são desenvolvidas dentro do nexo
representacionalista-empírico-fundacionalista. Uma interpretação forte, ou radical, do
papel desempenhado pelos fatores sociais no que constitui o conhecimento legítimo
resulta em uma postura mais radicalmente cética e até mesmo niilista
O construcionismo “fraco”: uma ilustração
Longino afirma que muitas críticas feministas da ciência têm razão em criticar a
epistemologia tradicional por concentrar-se exclusivamente na lógica da justificação das
alegações científicas enquanto ignora métodos de descoberta ou tendenciosidades
heurísticas. Apesar do sucesso dessas críticas, essas epistemologias feministas recusam-
se a oferecer um relato adequado de como devemos decidir ou justificar decisões entre
alegações de conhecimento aparentemente conflitantes.
“Empirismo contextual” – os dados experimentais ou observacionais são as bases menos
facilmente rejeitadas de hipóteses e de validação da teoria. Ao mesmo tempo, argumenta
que os métodos empregados para gerar, analisar e organizar dados e para relacionar a
evidência às hipóteses não estão sob o controle de um sujeito.
Essas suposições básicas devem ser submetidas à crítica conceitual e comprobatória à
visão de que o conhecimento é uma produção de um processo cognitivo individual. Se
considerarmos as práticas da investigação e da produção do conhecimento como sociais
e aceitarmos a tese de que a objetividade é uma função das interações sociais, então
podemos passar a explorar uma forma de criticar com eficácia as suposições básicas.
Nesse caso, os métodos como parte do conjunto social não devem ser utilizados pelos
sujeitos, dado que os últimos não estão no controle dos métodos?
Longino defende uma epistemologia social na qual as questões ideológicas e de valor
ligadas às práticas socioculturais estejam entrelaçadas às questões empíricas na
investigação científica. Ao aprovar a objetividade e ao defender com veemência os
aspectos normativos de uma teoria da investigação, ela evita claramente a visão relativista
de que qualquer interpretação é adequada.
Nesse final, a impressão que dá é de que a Longino prega uma ideia inicial de “amarra”
ou rigidez para que a investigação seja conduzida.
O construcionismo “forte”
Somente é possível descrever e decifrar o significado de uma ação dentro de uma
determinada forma de vida e com referência a esta. Os padrões para avaliar as crenças
racionalmente dependem totalmente dos jogos de linguagem ou das formas de vida nas
quais essas crenças se originam. Logo, os significados de diferentes jogos de linguagem
ou de diferentes formas de vida são incomensuráveis. Como explica Fay (1996), no
relativismo epistemológico, “não se admitem julgamentos através do cruzamento de
esquemas, [pois] o conteúdo só pode ser determinado a partir de um esquema conceitual
específico”.
Gergen examina o construcionismo social como um meio de ampliar e de democratizar o
diálogo a respeito das práticas humanas e de submeter tais práticas a um processo
contínuo de reflexão.
Denzin (1997) é inflexível em rejeitar o que ele chama de epistemologia realista – uma
epistemologia que “afirma que é possível produzir representações exatas do mundo e
[que] tais representações traçam fielmente os mundos da experiência real”. Ele defende
as epistemologias do ponto de vista que estudem o mundo da experiência partindo do
ponto de vista do indivíduo situado histórica e culturalmente.
O construcionismo “forte” deixa bastante claro que a análise, a compreensão deve se
dar no ambiente em que se encontra, com as regras do “jogo” daquele ambiente e com
aquela linguagem, além de ter que levar em consideração a história e a cultura. A
sensação é de que há maiores restrições nesse tipo de construcionismo.
Resumo: questões permanentes
O movimento de investigação qualitativa baseia-se em uma profunda preocupação com a
compreensão do que os outros seres humanos estão fazendo ou dizendo.
Compreender e justificar a compreensão
O interpretativismo, todas as variedades do construcionismo social (incluindo o
perspectivismo nietzchiano, o neopragmatismo e o desconstrucionismo) e a hermenêutica
filosófica gadameriana, todos “insistem em rejeitar a simples ideia de qualquer realidade
fundacionalista, de livre pensamento e permanentemente fixa que pudesse ser
compreendida ou mesmo sensatamente imaginada sem a medição da estruturação
humana”. Para praticamente todas as filosofias pós-empíricas das ciências humanas, a
compreensão é um mergulho profundo na interpretação.
Concordo, inclusive se levar em consideração que a compreensão seja sinônimo de
entendimento.
O holismo forte
Existem, por um lado, seguidores do holismo forte que defendem a ideia de que, a partir
do fato de que sempre enxergamos (damos um sentido, conhecemos) tudo por meio da
interpretação, devemos concluir que, na verdade, tudo é constituído pela interpretação.
Partindo do fato de que o conhecimento é perspectivo e contextual, eles chegam à forte e
cética conclusão de que é impossível distinguir uma determinada interpretação como mais
correta, melhor ou pior do que outra.
Nossas interpretações – etnocêntricas. Uma expressão da subjetividade pessoal ou
política.
“Se não podemos propor critérios universais fixos para avaliar a plausibilidade das
interpretações concorrentes, isso significa que não possuímos base racional para
distinguir entre as interpretações melhores e as piores, as mais plausíveis e as menos
plausíveis, quer sejam estas interpretações de textos, de ações ou de épocas históricas”.
O holismo fraco
O conhecimento dos outros sempre depende de uma base de compreensão. Os adeptos do
holismo fraco alegam que a base (a “medição” de toda a compreensão) “não é forte o
suficiente para servir de limite fixo ou para impossibilitar a decisão normativa entre as
interpretações baseadas em evidência”.
O holismo fraco procura explicar e analisar uma base racional que sirva para decidir se
uma interpretação é “válida” ou justificada. Outros seguidores do holismo fraco tentam
redefinir a racionalidade com base no raciocínio prático, ou seja, em como “podemos
realizar julgamentos comparativos, e de fato o fazemos, e buscamos ampará-los com
argumentos e com o apelo por boas razões”.
O holismo fraco tende a uma valorização daquilo que é quantiitativo, ou se não,
quantificar o conhecimento a ponto de compara-lo com outros conhecimentos, mesmo
considerando não existir uma base de medição que normatize esse processo. O holismo
forte critica duramente esse comportamento, afirmando que não dá para comparar e que
não existe conhecimento melhor ou pior, mas apenas conhecimento.
Situando o projeto interpretativo
Alguns neopragmáticos, teóricos críticos e algumas feministas têm um compromisso com
a tarefa da interpretação para fins de criticar e de desmantelar práticas sociais e
educacionais injustas e não-democráticas e transformá-las.
Outros neopragmáticos e alguns defensores da hermenêutica filosófica compartilham
dessa crença iluminista geral no poder da reflexão crítica para melhorar nossa sorte, mas
estabelecem uma ligação menos direta do projeto interpretativo com a transformação
política e mais próxima do diálogo. Ao seu entender, a emancipação crítica – a libertação
(ou a fuga) das estruturas reprodutivas, hegemônicas e autoritárias – nunca ocorrem
completamente. A reflexão crítica sempre caracteriza-se pela autonomia e pela
autoridade. “A emancipação é um processo contínuo dentro da experiência educacional,
e não o resultado final da reflexão crítica”.
A investigação qualitativa é um movimento amplamente controverso. Trata-se de uma
livre coalizão de investigadores que aparentemente encontram-se unidos apenas em sua
oposição geral ao que anteriormente era denominado de o nexo fundacionalista-empítico-
representacionalista de crenças.
É importante ressaltar que a pesquisa qualitativa, carregada de reflexão crítica e
interpretativa, deve fazer de tudo para que haja uma emancipação crítica da maneira
que está exposta no texto – como processo contínuo que flutua na pesquisa.
Considerações éticas e políticas
A prática da pesquisa social (incluindo a investigação qualitativa, porém não se limitando
a esta) não está imune aos efeitos das forças centrais da cultura da modernidade –
tecnologização, institucionalização, burocratização e profissionalização.
Como eu deveria ser em relação a essas pessoas que estou estudando? Alguns
pesquisadores qualitativos talvez criticassem como uma visão convencional, modernista
e perigosa do investigador como um indivíduo que “tenta minimizar a intromissão do
pesquisador no campo e no texto que é produzido ao final”, criando uma forma de olhar
e de compreensão que se ajuste às sociedades cinemáticas contemporâneas, mediadas
pelas massas, que observa e deseja não o conhecimento instrumental técnico, mas as
compreensões existenciais em profundidade. Essa observação nos conduz ao domínio da
ética e da filosofia moral.
Em poucas palavras, o esquema-padrão abrange um núcleo comum de ideias: (a) de que
a moralidade é deontológica (preocupa-se primeiramente com as obrigações e os
compromissos morais), (b) de que o ponto de vista moral é marcado por sua
imparcialidade e universalidade e (c) de que os conflitos entre os direitos e as obrigações
estão abertos para a resolução argumentativa. O ponto de vista moral é definido em termos
de critérios formais.
Nesse esquema alternativo, a relação ética está fundamentada na noção do estar ao lado
do outro. A relação do estar ao lado antecede a intencionalidade, antecede a escolha. A
orientação moral vem antes de qualquer ação calculista por parte do agente moral;
antecede a determinação, a reciprocidade e a contratualidade. Noddings refere-se a essa
noção de moralidade como o cuidar. Trata-se de uma orientação ética, um embasamento
particular de significado e de valor com sua própria lógica interna de trabalho relacional
(Thompson, 1997).
Esse trabalho de fato sugere que a maneira como um pesquisador deve relacionar-se aos
outros e consequentemente representa-los pode ser formulada em pelo menos duas
formas. As relações ético-morais, por um lado, podem ser definidas como um tipo de
“problema” que precisa ser resolvido através da adoção do tipo correto de ética de
pesquisa em relação ao “olhar”, ou da utilização do tipo correto de forma textual, ou ainda
do emprego do tipo correto de metodologia.
Ainda acredito que é fundamental o pesquisador utilizar da ótica pura e simplesmente da
técnica, dos processos, do objeto e dos resultados da pesquisa, sendo imparcial, ético, e
vigilante para que não cometa nenhuma injustiça ou interprete os resultados de forma
desvirtuada. O envolvimento do pesquisador deve ser profissional, e não pessoal.

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