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tem lugar quando se realiza pela pri- seman e Severi apresentam, no capítulo
meira vez uma determinada prática. 7, um conjunto de críticas às teorias do
Sua análise toma como elemento cen- ritual, que se centram em sua função ou
tral a relação entre o Ego (laua) e seu em seu significado, e propõem uma ex-
tio materno (wau), que se comporta co- plicação da ação ritual centrada na
mo mãe e esposa do laua. A partir des- identificação do nível organizacional. É
sa inversão, produzem-se outras, que apenas a partir deste que se poderia co-
Bateson, entretanto, não leva em consi- meçar a pensar no significado e na fun-
deração, e que Houseman e Severi res- ção do ritual.
saltam, como por exemplo, a da tia pa- Essa teoria é cruzada com naven,
terna (yau) que atua como pai e esposo ritual considerado desprovido de cone-
de Ego. Naven expressaria, portanto, o xão com a política, a economia, o xama-
conflito entre os sexos característico do nismo etc. Tal afirmação nos parece um
ethos Iatmul. As etnografias recentes tanto arriscada se levarmos em conta
criticam esses desenvolvimentos e colo- que durante o ritual o Ego “escolhe”
cam em cena outro conjunto de cerimô- entre todos os possíveis Wau seu Wau,
nias que os Iatmul também denominam servindo o ritual como contexto para
naven e que Bateson não levou em con- determinar a identificação da relação
ta. Essas novas investigações propõem avuncular classificatória. Mais do que
considerar o ritual iatmul como uma isso, o laua classificatório está destina-
cerimônia tipicamente feminina. do a ser o wau real dos descendentes de
Houseman e Severi servem-se des- seu wau classificatório e vice-versa,
se corpus etnográfico para analisar três dando lugar a um tipo particular de
tipos diferentes de naven, ou três moda- aliança. E é “a relativa pobreza do na-
lidades diferentes de naven. Sua análi- ven que pode nos ajudar a esclarecer as
se centra-se em torno de duas questões: modalidades de transmissão do simbo-
por que ações muito diferentes são re- lismo ritual através da ação, encontra-
conhecidas por seus atores como na- das em outros lugares de maneira tão
ven? Por que são diferenciadas de ou- mais complexa que geralmente é im-
tras práticas que também incluem o tra- possível detectá-las. Naven é, de fato,
vestismo? “Estas duas perguntas só tanto por sua forma quanto pelos perso-
admitem uma resposta. Trata-se de nagens que envolve, um ritual relativa-
identificar nos dois casos um nível orga- mente simples” (:193).
nizacional que, ligando as diversas oca- Em sua elaboração de uma explica-
siões cerimoniais, defina o conjunto de ção para o simbolismo ritual, House-
traços que permitem (aos Iatmul e a man e Severi valem-se de certos desen-
nós) reconhecê-los sempre como naven volvimentos de Dan Sperber que lhes
e diferenciá-lo de outros rituais” (:170). permitem estabelecer o que diferencia
Esse nível organizacional é entendido uma ação ritual de uma não ritual, e
como “uma série de regularidades que como se apreende uma ação ritual pro-
o contexto impõe à ação” (:171) e pode priamente dita. Esta nova teoria do ri-
ser buscado tanto na encenação ou, tual utiliza cinco conceitos-chave: con-
como sustentam os autores, na configu- densação, forma relacional, estilo, cam-
ração de relações estabelecidas em tor- po relacional e trabalho do rito.
no de Ego pela própria ação ritual. A ação ritual condensa uma série de
O quarto cruzamento relaciona o relações e oposições entre os sexos; prin-
naven com a teoria da ação ritual. Hou- cípios matrilineares e patrilineares; pro-
RESENHAS 199