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ETNOCIÊNCIA, SEMIÁRIDO E CONVIVÊNCIA COM A SECA: DESAFIOS E

PERSPECTIVAS NO CONTEXTO DA EDUCAÇÃO DO CAMPO

Nilmar dos Santos Silva1


IF Baiano
nilmar821@hotmail.com

Eric Silva 2
UNEB
eric.uneb2010@gmail.com

Taíse Menezes 3
IF Baiano
taise_menezess@hotmail.com

Resumo: objetivou-se neste trabalho neste trabalho de modo geral discutir a relação dos
conceitos de etnociência, semiárido e convivência com a seca relacionada às perspectivas
de problematização no cerne da Educação do Campo. Em contrapartida, de modo
específico procurou analisar quais alternativas têm sido desenvolvidas pelos agricultores no
âmbito do Semiárido Baiano no que concerne a construção de saberes etnocientíficos para
lidar as peculiaridades geoambitentais e, por fim dialogar com a experiência desenvolvida
por Abelmanto na sua propriedade no distrito de Mucambo, no município de Riachão do
Jacuípe. De acordo com Diegues e Arruda (2001, p. 36) citado por Costa (2008, p. 132) os
saberes etnocientíficos são compreendidos como os saberes populares que foram
construídos pelos diversos grupos populacionais e que não foram formalmente
sistematizados, portanto constroem outras perspectivas de fazer conhecimento diferente dos
estudos cientificamente produzidos no âmbito formal. A produção acadêmica em questão
justifica-se pela necessidade de se penar as diversas perspectivas de construção dos
conhecimentos, pois vale ressaltar que a produção de saberes transcende a sistematização
formal existente, mas que os diversos grupos sociais e identitários também têm construídos
que são de extrema relevância para o processo formativo e para a produção da vida dos
sujeitos do campo e que contribuem para a construção de uma ação educativa mais
condizente com as necessidades e demandas das populações campesinas. Quanto aos
instrumentos metodológicos para o desenvolvimento desta produção acadêmica fez uma
visita de campo a propriedade de Abelmanto e, posterirormente, desenvolveu-se uma
discussão teórica a partir da busca de artigos científicos e documentos oficiais que versem
sobre o tema em questão e, por fim o desenvolvimento de um estudo de caso a partir das
experiências vivenciadas na propriedade de Abelmanto. São perceptíveis as diversas
contribuições que a Educação do Campo pode trazer para o entendimento das questões do
semiárido brasileiro, uma vez que possibilita ressignificar as representações sociais que se
tem de rural, de sociedade, natureza, mulher e campo inclusive a partir da articulação com o
paradigma de convivência com a seca e valorizando os princípios agroecológicos que trazer

1Graduado em Licenciatura Plena em Geografia pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB) –


Campus XI – Serrinha e Discente do Curso de Especialização em Educação do Campo pelo Instituto
Federal de Educação Ciência e Tecnologia Baiano – Campus Serrinha.
2Graduado em Licenciatura Plena em Geografia pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB) –

Campus XI – Serrinha.
3 Graduado em Licenciatura Plena em Pedagogia pela Universidade do Estado da Bahia (UNEB) –

Campus XI – Serrinha e Discente do Curso de Especialização em Educação do Campo pelo Instituto


Federal de Educação Ciência e Tecnologia Baiano – Campus Serrinha.
uma perspectiva holística para a construção de um processo educativo que dê conta da
produção da vida dos povos campesino e que contribuam para o empoderamento e
autonomia dos sujeitos.

Palavras-chave: Etnociência. Convivência com a seca. Semiárido. Educação do Campo

INTRODUÇÃO

Na atualidade tem sido de extrema relevância discutir a potencialidade dos


saberes populares dos povos do campo, sendo que estes têm sido importantes para
a produção da existência das pessoas que vivem em comunidades rurais, desta
forma tais conhecimentos têm potencializado perceber como os sujeitos campesinos
têm construído etnociência no âmbito comunitário e como estes estudos têm trazido
para as populações rurais uma nova ótica sobre o seu lócus de vivência como
também potencializado usos diferenciados dos recursos naturais.
No âmbito do semiárido, inclusive do Semiárido Baiano4 os conhecimentos
etnocientíficos tem possibilitado aos agricultores familiares e aos diversos atores que
produzem sua existência no cenário rural a proposição de alternativa que viabilizem
lidar com as especificidades ambientais desta região, devido à escassez de chuvas
e as peculiaridades do clima que colocam em questão a emergência de se pensar
em ações que possibilitem conviver com as peculiaridades geoambientais deste
contexto regional.
Desta forma, pensar o campo nos dias que ocorrem se torna crucial
problematizar sobre as potencialidades dos saberes populares que não foram
problematizados pelos currículos formais, como também compreender como eles se
articulam com as problematizações relacionadas ao semiárido e a convivência com
a seca e como se interseccionam com as discussões sobre Educação do Campo.
A relevância do trabalho em questão se dar pelo protagonismo que as
discussões sobre os processos educativos e formativos das populações do campo
têm adquirido representatividade nos dias atuais, em virtude das diversas lutas
implementadas pelos movimentos sociais do campo em prol da legitimação de
direitos e demandas conquistadas, principalmente nos últimos 15 anos.
A produção acadêmica em questão justifica-se pela necessidade de se penar
as diversas perspectivas de construção dos conhecimentos, pois vale ressaltar que

4Semiáridoocupa mais de um terço do bioma do Nordeste. ... População: 6.316.846 habitantes (em
2013), 48% do total do estado e 31% dos habitantes do Semiárido do Nordeste. Densidade
demográfica: 16,5 habi/km2 (Fonte: IBGE apud UPB)
a produção de saberes transcende a sistematização formal existente, mas que os
diversos grupos sociais e identitários também têm construídos que são de extrema
relevância para o processo formativo e para a produção da vida dos sujeitos do
campo e que contribuem para a construção de uma ação educativa mais condizente
com as necessidades e demandas das populações campesinas.
A problemática do trabalho em questão está relacionada a pensar de que
maneira as populações do campo, especificamente no Semiárido Baiano, têm-se
apropriado dos saberes etnocientíficos para lidarem com as especificidades e
peculiaridades desta região para que possam produzir sua vida e atividades
produtivas e econômicas.
Em relação ao lócuo de pesquisa, o trabalho de campo foi feito mediante uma
visita a propriedade de Abel Manto localizada na comunidade rural de Mucambo, no
município de Riachão do Jacuípe5, cidade situada no Território de Identidade Portal
do Sertão6, onde este agricultor familiar tem utilizado os saberes etnocientíficos e
agroecológicos com o intuito de produzir e tem adequado o trabalho na propriedade
a realidade climática e ambiental do semiárido.
Objetivou-se neste trabalho de modo geral discutir a relação dos conceitos de
etnociência, semiárido e convivência com a seca relacionada às perspectivas de
problematização no cerne da Educação do Campo. Em contrapartida, de modo
específico procurou analisar quais alternativas têm sido desenvolvidas pelos
agricultores no âmbito do Semiárido Baiano no que concerne a construção de
saberes etnocientíficos para lidar as peculiaridades geoambitentais e, por fim
dialogar com a experiência desenvolvida por Abelmanto na sua propriedade no
distrito de Mucambo, no município de Riachão do Jacuípe.
Quanto aos instrumentos metodológicos para o desenvolvimento desta
produção acadêmica fez uma visita de campo a propriedade de Abelmanto e,

5
Riachão do Jacuípe é um município brasileiro do estado da Bahia situado a 186 km de distância da
capital estadual, e pertencente à Área de Expansão Metropolitana de Feira de Santana. Sua
população, conforme estimativas do IBGE de 2018 era de 33 403 habitantes, sendo o segundo
município mais populoso da RMFS entre 16 municípios. Área da unidade territorial (km²) 1.190,196.
Riachão fica situada as margens do Rio Jacuípe e tem uma economia voltada para a pecuária e
agricultura, destacando-se o rebanho bovino e suíno e a extração da fibra de sisal para exportação,
juntamente com Candeal são os únicos municípios da Região Sisaleira pertencente a RMFS, e tem
como principal rodovia a BR 324. (Fonte: Wikipedia)
6
O Território Portal do Sertão é composto por 18 municípios: Riachão do Jacuípe, Água Fria, Amélia
Rodrigues, Anguera, Antonio Cardoso, Conceição de Feira, Conceição do Jacuípe, Coração de
Maria, Feira de Santana, Ipecaetá, Irará, Santa Bárbara, Santanópolis, Santo Estevão, São Gonçalo
dos Campos, Tanquinho, Teodoro Sampaio e Terra Nova. (Fonte: http://portaldosertao.blogspot.com/)
posterirormente, desenvolveu-se uma discussão teórica a partir da busca de artigos
científicos e documentos oficiais que versem sobre o tema em questão e, por fim o
desenvolvimento de um estudo de caso a partir das experiências vivenciadas na
propriedade de Abelmanto.
Imagem 01 – Mapa do município de Riachão do Jacuípe

Imagem 2: Propriedade de Abelmanto – local da visita de campo

Fonte: SILVA, Eric


ABORDANDO ALGUNS CONCEITOS: A COMPREENSÃO SOBRE
ETNOCIÊNCIA, SEMIÁRIDO E CONVIVÊNCIA COM A SECA E SUA
INTERSECCIONALIDADE COM A EDUCAÇÃO DO CAMPO

De acordo com Diegues e Arruda (2001, p. 36) citado por Costa (2008, p.
132) os saberes etnocientíficos são compreendidos como os saberes populares que
foram construídos pelos diversos grupos populacionais e que não foram
formalmente sistematizados, portanto constroem outras perspectivas de fazer
conhecimento diferente dos estudos cientificamente produzidos no âmbito formal.
Diante disso, pensar na valorização e consideração dos conhecimentos
produzidos pelos diversos sujeitos que têm processos de produção de existência
diferenciados, realidades de vidas distintas e práticas específicas perpassa por
compreender que estes saberes populares têm sido principalmente por grupos
comunitários de longa ancestralidade, como por exemplo, índios e comunidades
quilombolas, por exemplo.

A etnociência é um campo de diálogo entre sujeitos com diferentes kosmos,


corpus e práxis, porém historicamente sempre concentraram seus estudos
em etnias indígenas e outras comunidades consideradas ‘tradicionais’, ou
povos dito ‘primitivos’ a partir de uma ótica ‘moderna (ALVES; SOUTO,
2010 apud CYPRIANO & TEIXEIRA, 2017, p. 8).

A partir das ideias de Costa (2008, p. 165), compreende-se que a perspectiva


de etnociência não tem como propósito deslegitimar os conhecimentos científicos
formais, mas sim evidenciar a importância e relevância dos saberes construídos
pelos diversos grupos populacionais que possibilita a construção de processos que
contribuem para a produção da ressignificação da vida dos sujeitos, como também
para viabilizar no âmbito formativo outras possibilidades de aprendizagem.
Conforme Latour (2000) referenciado por Cypriano & Teixeira (2017, p. 8)
problematizam que a etnociência também contribui com diversas possibilidades para
o trabalho do pesquisador, visto que potencializa a sua atuação e o leva a
transcender este olhar científico carregado de rigidez, que são questões bastante
relevantes no âmbito da análise e problematização a partir dos saberes articulados a
etnociência, isto é, possibilita que os papéis de quem pesquisa e de que se intitula
como atores participantes e interseccionem o que contribui para o fazer científico ter
mais fidelidade.
Apesar de a proposta de discussão deste artigo não ser meramente discutir
processos de escolarização formais e sim, em contrapartida perceber os potenciais
da discussão teórica para se pensar a Educação de Campo de modo mais amplo,
vale dizer que os saberes populares são cruciais para o processo de escolarização e
formação dos sujeitos campesinos, uma vez que tais conhecimentos potencializam o
processo formativo e agregam a possibilidade de quem aprende ver o seu contexto
comunitário de modo diferenciado.

Quando um professor opta, como proposto neste trabalho, a valer-se dos


conhecimentos etnológicos de seus alunos, ele estará confrontando dois
tipos de conhecimentos – o científico e o popular – distintos e até
conflitantes em certos casos, a partir dos quais se abre uma potencial fonte
de mudança conceitual para o aprendiz sobre o mundo que o cerca. [...].
(Costa 2017, 2017, p. 167)

Desta forma estas são algumas questões relevantes que se inserem no


cenário da discussão sobre etnociência. No contexto das discussões sobre os
conhecimentos etnocientíficos construir uma problematização relacionada ao
contexto do Semiárido, principalmente no contexto baiano, pois estes saberes
podem trazer enormes contribuições para que os agricultores familiares possam lidar
com as peculiaridades desta região. Portanto, faz-se necessário fazer algumas
considerações sobre o semiárido.
O Semiárido brasileiro é a região do globo mais povoada que tem estas
tipológicas geoambientais, desta maneira foi uma área colonizada a partir do
processo de interiorização da colonização a partir das atividades pecuárias,
decorrente da primazia de amplificar a produção de gado no Brasil Colônia com a
finalidade de atender as necessidades de consumo neste período.

A região semiárida brasileira, que se caracteriza por ser atualmente a zona


semiárida mais povoada do mundo, teve seu processo de ocupação e uso
da terra iniciada na época do Brasil colonial, em decorrência da
necessidade de se expandir a criação de bovinos, para atender à
demanda dos senhores de engenhos. [...]. (CORREIA et al., 2011, p. 32-
33)

De acordo com SUDENE (2017) a delimitação atual da região semiárida do


Brasil é composta por 1262 municípios dos nove estados do Nordeste e o estado de
Minas Gerais que compõe esta sub-região, assim, foram incluídos 73 novas áreas
munícipes nesta porção regional do território brasileiro.
Imagem 3 – Nova delimitação do Semiárido brasileiro

Conforme Perez-Marin & Santos (2013, p. 15) a região semiárida é uma


porção regional delimitada que está inserida na porção territorial brasileira, portanto,
é uma sub-região que teve sua delimitação no início dos anos 2000. As áreas
munícipes que integração esta faixa regional possui características bastante
específicas, como por exemplo, nível de precipitações inferiores a 800 mm, nível de
aridez que não ultrapassa 0,5 e suscetibilidade a período de estiagem que podem
ser prolongados.
Esta sub-região tem uma enorme dependência das características
geoambientais, visto que historicamente estes elementos têm influenciado as
condições de subsistência dos grupos populacionais da região semiárida. A porção
semiárida do território nacional sempre sofreu com intensos períodos de estiagem,
assim, os índices de pluviosidade sempre se demonstraram irregulares para a
demanda hídrica desta área. Diante disso, a região semiárida é percebida por uma
grande irregularidade das chuvas e altas temperaturas no decorrer do ano.

O Semiárido brasileiro, mais do que qualquer outra área do país, é


altamente dependente dos elementos climáticos, que definem, há séculos, a
sobrevivência das famílias e dos rebanhos. Caracteristicamente essa
região sempre passou por grandes secas e, mesmo em anos regulares
ou bons, a precipitação, que ocorre em quatro meses, apresenta-se de
maneira muito variável no tempo e no espaço, inclusive com grande
número de dias sem chuva durante a estação chuvosa,
comprometendo a disponibilidade de água e forragem durante todo o
ano. Da mesma forma que o Semiárido é marcado pela grande
variabilidade espaço-temporal das precipitações, há grande
homogeneidade térmica, em que a maior parte da região apresenta
elevadas temperaturas durante praticamente todos os meses do ano.
(PEREZ-MARIN & SANTOS, 2013, p. 43-44)

A partir das ideias de Menezes et al. (2016, p. 5) pensar o processo formativo


dos sujeitos do campo no âmbito da região semiárida brasileira perpassa
compreender que as comunidades rurais sofreram um processo de ocupação,
produção e convivência nesta porção territorial mediante a articulação de diversos
grupos populacionais e diversas ações e práticas dos sujeitos que constroem
cotidianamente o território camponês. Desta forma, pensar a trajetória educativa
atores do espaço rural remete-se a perceber que é uma prática carregada de
pluralismos sejam eles relacionados a formação, da territorialidade e dos indivíduos
que produzem sua existência no campo.
A proposta de Educação do Campo que se almeja é resultante das diversas
mobilizações contra hegemônicas das populações rurais, consequentemente,
possibilitando a ressignificação do seu lócuo de vivência, do tecido societário, dos
indivíduos, logo, possibilitando a construção de um processo contra hegemônico na
cena campesina embasado em práticas econômicas mais solidárias e preocupadas
com uso sustentável dos recursos naturais. Portanto, o processo formativo no
campo precisa dar conta dos saberes que são construídos fora dos espaços
escolares, uma vez que a formação educativa nas comunidades rurais tem uma
perspectiva mais amplia, isto é, de um processo formativo para a cidadania, devido a
ação educativa se dar em diferentes espaços.

Frente a essa realidade, os povos do campo desenvolveram estratégias de


resistência que culminaram na construção de um projeto de contra
hegemonia – uma outra visão de campo, de sociedade, de homem e de
mulher, de desenvolvimento do campo e fundado em outras bases
economicamente justas e ecologicamente sustentável. Portanto, a
“educação do campo” representa uma das estratégias de construção desse
projeto. Por essa razão pressupõe, no projeto de Educação Escolar, a
inclusão dos saberes produzidos nos espaços não escolares, construídos
no cotidiano da produção da existência – o trabalho, a cultura, os modos de
viver e de conviver, a relação com a natureza. A educação do campo
precisa dar conta de considerar a identidade dos sujeitos do campo [...].
(SILVA et al., 2009, p. 136)

Nesta perspectiva, segundo Silva & Lima (2010, p. 10) aponta que o processo
formativo que se almeja no campo, onde as demandas e necessidades dos sujeitos
sejam consideradas possibilitam a construção de novos pontos de vista se for
alicerçado pelos ideais que tratam dos mecanismos para se conviver com a seca.
Diante disso, a construção dos conhecimentos precisa dar conta de ações e práticas
que possibilitem que os sujeitos adquiram aspectos valorativos, atitudinais, saberes
e atividades que trabalhem a necessidade de se fomentar o pertencimento dos
indivíduos que moram na região semiárida e a construção de relações que coloquem
em questão o fortalecimento dos espaços de formação e de vivência, como também
dos ideais de convivência que são necessários nesta sub-região.
A proposta educativa para as comunidades rurais na região semiárida coloca
em evidência que se faz necessário e primordial abarcar as especificidades
educativas e formativas dos sujeitos do campo. Neste contexto, os ideais de
conviver com as peculiaridades desta sub-região apontam como questões
norteadoras para se considerar na proposta de Educação do Campo do Semiárido
brasileiro. O paradigma da Convivência do Semiárido torna-se relevante devido a ser
uma vertente que foi construído pelos diversos setores sociais populares que
percebem a primazia de se ressignificar o olhar que se tem sobre a região semiárida
brasileira a partir da consideração dos aspectos sustentáveis, dos elementos
desenvolvimentistas endógenos e dos saberes populares alicerçados pelos
conhecimentos agroecológicos.

Assim, quando falamos da Educação do Campo no semiárido, estamos


demarcando um jeito específico de se pensar a educação. Temos hoje, um
paradigma consolidado que é a Convivência com o Semiárido. Este
paradigma tecido pelos movimentos e organizações sociais articulados, tem
fundamentado um Projeto de Desenvolvimento do Semiárido brasileiro
pautado na sustentabilidade, no desenvolvimento local e na agroecologia,
constituindo-se como uma “proposta política de mobilização para a
implementação de políticas públicas apropriadas ao desenvolvimento
sustentável na região” (SILVA, 2010, p. 76 apud MENEZES, 2016, p. 7)
Portanto, estas são algumas questões que alicerçam a discussão teórica
colocando em questões a importância de discutir tais conceitos e como sua inter-
relação é importante para o fortalecimento do território camponês e da produção da
vida dos sujeitos do campo.

AS EXPERIÊNCIAS NA PROPRIEDADE DE ABELMANTO: PERCEPÇÕES


SOBRE A VISITA DE CAMPO

A propriedade de Abelmanto, a Fazenda Pau de Colher, lócuo da visita de


campo fica localizada no município de Riachão do Jacuípe, na comunidade rural de
Mucambo. Assim, o trabalho realizado por Abelmanto tem sido responsável agregar
ao contexto comunitário atributos relacionados à sustentabilidade rural trabalho que
tem sido potencializado tanto com os moradores como na articulação com a escola.
Assim, Abelmanto tem trabalhado na sua propriedade levando em conta o
equilíbrio da biodiversidade e levando em conta os princípios agroecológicos.
Desenvolve-se intercâmbios onde se compartilha os saberes desenvolvidos no
âmbito da propriedade, como por exemplo, o ensino de técnicas de manejo do solo,
plantio e adubação, além disso desenvolve um projeto de conservação das espécies
endêmicas do local.
Imagem 4 – Espaço da propriedade de Abelmanto

Fonte: SILVA, Eric

Abelmanto tem feito aporte dos saberes populares pautados na logica da


etnociência e da Agroecologia para potencializar a produtividade da sua
propriedade, assim, fazendo experimentações, construindo alternativas para se fazer
uma gestão da água que contribua para o processo produtivo, principalmente em
momentos de estiagem, além disso tem feito uso de diversas tecnologias sociais que
potencializam o desenvolvimento de ações que contribuam para se lidar com as
peculiaridades do semiárido.
Com a apropriação dos conhecimentos agroecológicos e a partir das
experimentações realizadas na propriedade Abelmanto tem possibilitado a
conservação dos recursos hídricos a partir da construção de barramentos, assim,
diminuindo a perca de água e contribuindo para uma melhor qualidade do solo e, em
contrapartida um melhoramento da fertilidade.
Com relação às tecnologias sociais pode-se afirmar que o proprietário da
Fazenda Pau de Colher tem feito aporte de diversas tecnologias sociais que tem
viabilizado ressignificar as atividades produtivas, dentre elas, pode-se citar: a
barragem subterrânea, bomba giratória micro aspersor feito de canetas, liquidificador
manual rotacionado a uma corda, etc.
Imagem 5 – Barragem subterrânea

Fonte: SILVA, Eric


De acordo com as informações ditas pelo agricultor à barragem subterrânea
tem tido uma importância para a vida sertaneja, visto que possibilita que se faça uma
gestão da água e, concomitantemente, viabiliza que a produção agrícola ocorra
independente da chuva, pois á agua fica armazenada no solo e contribui para o
entendimento de como as plantas se adaptam para se produzir. Além disso, ele tem
cultivado diversas espécies frutíferas. Portanto, esta tecnologia traz contribuições
siginificativas para a desconstrução da trajetória histórica do homem do campo.
Por outro lado, Abelmanto tem desenvolvido ações para criar possibilidades
de reversão do processo de desertificação na sua propriedade a partir do uso de
esterco e da periodicidade de chuvas, assim, contribuindo para a revitalização de
áreas mediante a experimentação e plantação de espécies que contribuem para
mudança do quadro, consequentemente, revertendo a ação desertificadora e a
compactação.
Também aponta que é crucial que o agricultor tenha consciência do seu papel
de fomentador de saberes e a necessidade de realizar experimentações na
propriedade, como também trocar experiências, além de ter consciência do processo
histórico que tem se enfrentado a partir da globalização e da mecanização das
atividades agrícolas com o surgimento da Revolução Verde, desta forma salienta
que o agricultor necessita se desvincular das práticas agrícolas convencionais.
No cenário da convivência com o semiárido o agricultor tem construído
alternativas pautem pelo conviver com a seca, dentre elas a bomba malhação para
retirar água do barreiro.
Imagem 6 – Bomba malhação para tirar água do barreiro

Fonte: SILVA, Eric.


Por outro lado, tem desenvolvido práticas agrícolas sustentáveis que
respeitem as especificidades geoambientais da sua propriedade, como o
desenvolvimento de um sistema de irrigação com garrafas pet.
De acordo com Abelmanto (2012, s/d) a melhor estratégia para se lidar com
as peculiaridades do semiárido é fazer reservas de forragens e aproveitar todos os
recursos encontrados na propriedade, construir reservatórios para armazená-lo o
máximo possível de água da chuva captada na propriedade, assim ajuda a resolver
os problemas encontrados nos períodos críticos de longas estiagens.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Enfim, ficou compreendido as diversas potencialidades que a etnociência


pode trazer para o processo de produção da vida no cenário rural, visto que os
saberes populares são tão relevantes como os conhecimentos sistematizados pela
produção científica formal.
Desta forma, o processo educativo das populações do campo tem que dar
conta de problematizar no âmbito da formação destes indivíduos a primazia de se
correlacionar os conhecimentos produzidos pelos povos do campo com o processo
formativo, visto que os saberes não escolares dão conta de diversas problemáticas
que cercam dos grupos sociais rurais.
São perceptíveis as diversas contribuições que a Educação do Campo pode
trazer para o entendimento das questões do semiárido brasileiro, uma vez que
possibilita ressignificar as representações sociais que se tem de rural, de sociedade,
natureza, mulher e campo inclusive a partir da articulação com o paradigma de
convivência com a seca e valorizando os princípios agroecológicos que trazer uma
perspectiva holística para a construção de um processo educativo que dê conta da
produção da vida dos povos campesino e que contribuam para o empoderamento e
autonomia dos sujeitos.
Além disso, no âmbito da visita de campo constatou-se como se faz
necessário que os agricultores sejam fomentados a desenvolver ações mais
sustentáveis no âmbito da produção agrícola, pois elas contribuem para se lidar com
as peculiaridades do semiárido brasileiro e ressignificar as relações econômicas e
produtivas, assim, contribuindo para a melhorar as condições do agricultor e de seu
grupo familiar.
REFERÊNCIAS

CYPRIANO, Raphael Jonas & TEIXEIRA, Reinaldo Duque Brasil Landulfo.


Etnociência da Ciência: a busca por simetria na pesquisa científica. R. Inter.
Interdisc. INTERthesis, Florianópolis, v.14, n.3, p. 01-13 Set.-Dez. 2017

CORREIA, Rebert Coelho (et al.). A região semiárida brasileira. In: VOLTOLINI, T.
V. Produção de caprinos e ovinos no semiárido. - Petrolina: EMBRAPA
Semiárido. 2011. 553p.

COSTA, Ronaldo Gonçalves de Andrade. Os saberes populares da etnociência


no ensino das Ciências Naturais: uma proposta didática para aprendizagem
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MENEZES, Ana Célia Silva (et al.). Educação do Campo no Semiárido: reflexões
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OLIVEIRA, Abelmanto Carneiro de. Um desafio é aprender a conviver com a


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PEREZ-MARIN, Aldrin Martin & SANTOS, Ana Paula Silva dos. O semiárido
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