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Análise do discurso: os sentidos e suas movências

“A Análise do Discurso é o modo de leitura dos fenômenos registrados em falas e em


textos, que se localizam no espaço da discursividade. Na relação com a língua, a Análise
do Discurso compartilha tríplice especificidades que traduzem o seguinte: os
funcionamentos sintáticos não se limitam na competência da frase. Os três
compartilhamentos são: (1) com a tradição lexicométrica, com estruturas sintáticas sob a
sequência de unidades lexicais; (2) com as tradições semiológicas e semióticas, a tarefa
de apreender e descrever as condições estruturais de existência do sentido; (3) com a
perspectiva arqueológica foucauldiana, a tarefa de levar em conta as condições históricas
de existência de discursos na sua heterogeneidade, visando reintroduzir explicitamente a
problemática da língua (Pêcheux, (1984a) 2011, p. 228). Esses “compartilhamentos”
mencionados pelo autor são pensados em relação aos funcionamentos sintáticos no “real
da língua” (Pêcheux, 1981). A posição epistemológica da Análise de Discurso de Michel
Pêcheux compreende a concepção de língua “como um real específico formando o espaço
contraditório do desdobramento das discursividades” (Pêcheux, (1984a) 2011, p. 228).
Neste presente trabalho, proponho desenvolver o compartilhamento (3) com a
arqueologia (derivada dos pressupostos de Michel Foucault, em especial a obra
Arqueologia do Saber, publicada em 1969). Serão exemplos desse compartilhamento
pesquisas de Nascimento (2011) e Gregolin; Mazzola (2012). Esses autores adotam as
perspectivas teórico-metodológicas de Foucault e de Pêcheux. Com os alertas de Michel
Pêcheux sobre as transformações do discurso político e das novas materialidades, este
trabalho demonstra alguns desdobramentos promissores no campo do discurso em que
diversos objetos linguísticos se inscrevem como materialidades: depoimento
(Nascimento, 2011) e charge, e pintura (Gregolin; Mazzola, 2012). A relevância dos
compartilhamentos mencionados por Pêcheux (1984a), de interesse à Análise do
Discurso, promovem deslocamentos a outras disciplinas que só contribuem ao campo
discursivo, em sua tarefa primeira: ler e interpretar textos”.
A Literariedade como objeto da Teoria da Literatura

A teoria da literatura tem como objeto do seu estudo, o que foi denominado por Roman
Jakobson de literariedade. Esse conceito caracteriza o que torna diferente um texto
literário de um texto de literatura (lato sensu). Um texto para ser literário, parte de uma
elaboração especial da linguagem, utilizando elementos da ficção e da imaginação do
autor, a chamada literatura stricto sensu. Essa elaboração especial constitui um desvio,
que afasta a linguagem literária das ocorrências verbais ordinárias (SOUZA, 1986). Para
que esse desvio proceda, dois aspectos são fundamentais: plurissignificação e
ambiguidade do signo linguístico. Afastar-se por completo do uso da linguagem como
ferramenta, tomando-a como coisa e não como signo:

Pois a ambiguidade do signo implica que se possa, a seu bel-prazer, atravessá-lo como a
uma vidraça, e visar através dele a coisa significada, ou voltar o olhar para a realidade do
signo e considerá-lo como objeto (SARTRE, 1989, p. 13).

Essas determinações constituem uma marca da literatura, causando a exigência de um


método de base linguística para que o texto carregue tal especificidade (SOUZA,
1986). Preceitos que raramente conseguimos detectar nessa babel de produção textual
(que se auto intitula literatura) de péssima qualidade que contamina as bancas, livrarias e
internet. Os aspectos imaginário e ficcional também podem determinar a marca literária
do texto, extrapolando as suas bases linguísticas, tornando a teoria da literatura aberta a
métodos de investigação que valorizam bases sociológicas, antropológicas e
psicanalíticas, ou seja, não basta ler, achar bonito, é necessário entender o que se está
lendo, inclusive as motivações implícitas ao texto.

Essas três disciplinas estão relacionadas com a literatura por elementos que lhe são
comuns, a saber, o simbólico e o imaginário “que antes representa do que expressa o
significado” (SARTRE, 1989, p.15). Tais formações de linguagem se amalgamam pelo
“discurso literário (interesse da teoria da literatura), pelo discurso mítico (interesse da
antropologia) e pelo discurso onírico (interesse da psicanálise)” (SOUZA, 1986, p. 62).
Dentro dessas considerações, acerca do que caracteriza um texto como literário ou não,
não poderíamos deixar de citar um gênero em especial, a poesia. Dentre tantos, esse é,
com certeza, aquele que melhor pode exemplificar a condição de plurissignificação do
signo linguístico. “O homem que fala está além das palavras, perto do objeto; o poeta esta
aquém. Para o primeiro as palavras são domésticas; para o segundo, permanecem no
estado selvagem” (SARTRE, 1989, p.14).

O texto literário em poesia é, ao mesmo tempo, “um objeto linguístico e um objeto


estético” (FILHO, 1986, p. 37). Em nome da expressão poética a norma gramatical é
quebrada, pois o “poeta vê as palavras pelo avesso, como se não pertencesse à condição
humana” (SARTRE, 1989, p. 14).

Em Aliança, poema abaixo, notamos a integração de novos processos encantatórios;


recursos semânticos, palavras de significado abstrato, adjetivação rara. Sem mudar a
organização rítmica, Drummond trouxe para o poema a ambiguidade da linguagem:

Deitado no chão. Estátua/enrodilhada, viaja/ ou dorme, enquanto componho/o que já de


si repele/arte e composição./[...]Enquanto prossigo/tecendo fios de nada,/moldando potes
de pura/água, loucas estruturas/do vago mais vago, vago./Oh que duro, duro, duro/ofício
de exprimir! (ANDRADE, 2006, p.35)

A multissignificação é, pois, uma das marcas fundamentais do texto literário como tal.
Sem esse traço de literariedade não seriam possíveis as múltiplas interpretações dos textos
literários, prosaicos e poéticos, uma vez que “a permanência de determinadas obras se
prende ao seu alto índice de polissemia, que as abre às mais variadas incursões e
possibilita a sua atemporalidade” (FILHO,1986, p.40).

Referências:

ANDRADE, Carlos Drummond de. José & outros. 9.ed. Rio de Janeiro: Best Seller, 2006.

FILHO, Domício Proença. A Linguagem Literária. São Paulo: Ática, 1986.

SARTRE, Jean-Paul. Que é a Literatura? São Paulo: Ática, 1989.

SOUZA, Roberto Acízelo de. Teoria da Literatura. São Paulo: Ática, 1986.

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