D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
" C L A S S IF IC A Ç Ã O
A especialização do Direito dos valores mobüiários tem levado à
expansão da sua área de atuação em detrimento do Direito bancário: a
recondução do contrato de depósito de instrumentos financeiros ao uni­
verso mobiliário é disso uma evidência^^l
84. D ireito dos títulos de crédito e D ireito dos valores m obüiários
Os títulos de crédito são tradicionalmente apresentados como precus-
sores dos valores mobiliários: numa fase embrionária, em que o conceito
se encontrava ainda por preencher, o recurso ao conceito de título de cré­
dito, conhecido e dominado pela Ciência Jurídica, apresentou-se como
uma solução natural.
A recondução dos valores mobiliários ao universo dos títulos de cré­
dito é, ainda hoje, uma questão controvertida, havendo quem defenda,
mesmo entre nós, a utilização da dicotomia título de crédito em sentido
estrito, conceito agregador das modalidades clássicas - cheque, letra e
hvrança -, e em sentido amplo, abrangendo os valores mobiliários.
Mesmo admitindo esta interpretação, que não consideramos provei­
tosa, 0 Direito dos títulos de crédito não se confunde com o Direito dos
valores mobihários: para além dos aspetos institucionais e regulatórios,
em caso algum absorvíveis pelo primeiro ramo, a dogmática do Direito
dos títulos de crédito não tem densidade científica e prática que lhe pos-
sibihte hdar com as mais simples situações mobüiárias, quer seja a emis­
são, a transmissão ou o depósito de valores mobihários.
Acresce que a emergência do novo conceito de instrumento finan­
ceiro veio pôr em causa a conceção dicotômica título de crédito em sen­
tido estrito e em sentido amplo.
85. D ireito das sociedades com erciais e D ireito dos valores m obi­
liários
I. A proximidade entre o Direito dos valores mobihários e o Direito dos
títulos de crédito é essencialmente de ordem histórica, enquanto a liga-
Seiler e Kniehase, Grundlagen des K apitalm arktrechts, cit., 1031.
210
§ 21.
ção ao Direito bancário é fiuto da contiguidade institucional - prepon­
derância da dita banca universal - e regulatória -, havendo fortes áreas de
contacto entre ambos os supervisores: Banco de Portugal e Comissão do
I Mercado de Valores Mobihários. Mas, curiosamente, é sempre possível
determinar o que pertence a cada um dos ramos jurídicos, bastando, para
isso, remeter para o Direito dos títulos de crédito as suas modalidades
clássicas e para o Direito bancário as situações bancárias.
Este exercício de circunscrição não é, no que ao Direito societário
respeita, tão fácil e imediato: a sobreposição é, acima de tudo, dogmá­
tica, encontrando-se, no seu centro, a incontomável figura da sociedade
aberta^®*.
n. o legislador apresenta uma definição de sociedade aberta no
artigo 13.°do CVM: “sociedade com o capital aberto ao investimento do
púbhco”^®^. Na prática, são abertas todas as sociedades anónimas que
tenham o seu capital disperso em bolsa.
Enquanto pessoas coletivas comerciais, as sociedades anónimas aber­
tas encontram o seu espaço de regulação por excelência no Código das
Sociedades Comerciais, quer na parte geral (Título I) quer na parte espe­
cial correspondente (Título IV). Paralelamente, e ao contrário do que
se verifica nas restantes sociedades, às participações sociais das socieda­
des abertas correspondem instrumentos financeiros, o que determina a
recondução de todas as suas formas de transmissão ao conceito de situa­
ção jurídica mobiliária.
Assim, é sem surpresa que a matéria das ofertas públicas de aquisição
de ações, inicialmente tratada nos artigos 306.° e seguintes do CSC, tenha
transitado para o Código do Mercado de Valores Mobihários, primeiro,
e, posteriormente, para o Código dos Valores Mobihários“^^®. Atente-se,
contudo, que já então, e sem negar a preponderância do sistema formal
Menezes Cordeiro, D ireito das sociedades, II, 2.’ ed., Almedina, Coimbra, 2007, 254-255;
Costa e Silva, D ireito, cit., IIO ss.
O conceito é concretizado nas alíneas a) a e).
Numa primeira fase, a matéria manteve-se dividida entre o CdMVM e o CSC, o que exigia
um esforço de conjugação. Apenas com a entrada em vigor do Decreto-Lei n.°261/95, de 3 de
outubro, a problemática transitou, definitivamente, para o CVM.
211
 D IR E IT O DOS V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S § 21.“ C L A S S IF IC A Ç A O

na caracterização e catalogação jurídica, esta matéria era parte integrante ros, por natureza homogéneos e padronizados, ficando para o segundo os
do Direito dos valores mobiliários. negócios cujo conteúdo possa ser hvremente fixado pelas partes.

III. A separação entre o Direito das sociedades comerciais e o Direito II. O Direito dos contratos financeiros, nos moldes em que o conce­
dos valores mobiliários é facilitada se colocarmos, na sua base, algumas bemos, consubstancia um ramo particularmente recente, com não mais
linhas mestras: de algumas décadas. Trata-se de uma área com contornos difusos e com
um preenchimento ainda por determinar, mas que almeja sistematizar
- apenas a matéria respeitante a sociedades abertas é passível de ser
os grandes contratos de financiamento - empréstimos sindicados, con­
reconduzida ao universo mobiliário; sociedades por quotas, socieda­
tratos derivados ou projectjinance -, marcados por uma forte ascendência
des em nome coletivo ou em comandita encontram o seu tratamento
da Common Law e pela preponderância dos contratos-quadro elaborados
natural no seio do Direito das sociedades. O elemento diferenciador
por associações privadas, compostas pelos grandes escritórios de advoga­
é evidente: as participações sociais que compõem estas modalidades
dos e pelos players da banca de investimento mundial, pense-se na ISDA
societárias não podem ser descritas como valores mobiliários - desde
- International Swaps and Derivatives Association - ou na LMA - Loan Market
logo, por não serem transacionadas em mercados regulamentados;
- os aspetos relacionados com o funcionamento interno das socieda­
Association. A comunhão de cláusulas e a utihzação de uma linguagem
técnico-jurídica padronizada favorece o desenvolvimento de uma parte
des abertas, como, por exemplo, os direitos e os deveres dos sócios e
geral, comum a todos estes contratos, que tenderá a assumir especifici­
dos membros dos órgãos sociais são, por norma, parte integrante do
dades próprias em cada tipo contratual, em moldes em tudo próximos de
Direito das sociedades comerciais;
uma efetiva parte geral. A preponderância da Common Law na construção
- as questões com um impacto que extravase a simples relação interna
destes contratos exige um domínio do Direito contratual anglo-saxónico,
societária são disciplinadas pelo Direito dos valores mobiliários^^^
em especial inglês e nova-iorquino, sem o qual se tom a impossível entrar
A linha divisora, sempre ténue e por vezes nebulosa, encontra nas nos seus meandros^®^.
dicotomias participação social/valores mobihários e dimensão interna/
dimensão externa os seus elementos chave.

86. Direito dos contratos financeiros e D ireito dos valores m obiliários

I. O Direito dos valores mobiliários não se confunde com o Direito

dos contratos financeiros, também denominado de Direito financeiro,
por ascendência anglo-saxónica (Financial Lawy^^. O primeiro encontra,
no seu seio, os valores mobiliários e os restantes instrumentos financei-

Veja-se, a título meramente exemplificativo, que a matéria do uso de informação privile­

giada e da manipulação do mercado, originariamente tratada nos artigos 524.°e 525.°do CSC,
transitou para o CdMVM. Destacamos a obra de Andrew McKight, The L aw o f International Finance, OUP, Oxford,
O termo Direito financeiro está perfeitamente consolidado entre nós, sendo utilizado na 2008 e a coleção, composta por 7 volumes, de Philip R. Wood, The L aw and Practice o f Interna­
aceção de Direito das finanças públicas. tional Finance Series.

212 213

§22.“ CARACTERIZAÇÃO
87. D ireito privado regulado: evolução do D ireito dos valores m obi­
liários
I. O Direito dos valores mobiliários é Direito comercial e, por maio­
ria de razão, Direito privado. Isso não significa que o Direito dos valores
mobiliários, o Direito comercial ou mesmo o Direito civil devam ser des­
critos como sendo apenas Direitos privados. Não é assim. A recondução
de um determinado Direito ao universo privatístico ou publicista reflete
uma visão sistematizada do ramo jurídico analisado, ou seja, no seu côm­
puto geral, à luz dos interesses em questão, da atividade privada e da
intervenção do Estado: este ramo é (mais) Direito privado ou é (mais)
Direito público^®^.
Ora, 0 Direito dos valores mobiliários é mais Direito privado, mas não
é, evidentemente, apenas Direito privado; a intervenção do Estado, via
CMVM, e a criminalização de práticas contra o mercado descredibiliza-
riam por completo qualquer afirmação nesse sentido^®^.
António Menezes Cordeiro, Tratado de D ireito civil, I, 4.“ ed., Almedina, Coimbra, 2012,
88 ss.
A doutrina alemã reconhece a dimensão privatística do Direito dos valores mobiliários.
Todavia, tende, em face dos circunstancialismos já explorados, a sublinhar a dimensão publi­
cista, c£, Hanno Merkt e Ohver Rossbach, Z u r Einführung: K apitalm arktrecht, Jus 2003, 217-
-224,224; Buck-Heeb, K apitalm arktrecht, cit., 14; Grunewald/Schhtt, Eiführung, cit., 3: afirma,
apenas, que o Direito dos valores mobiliários corresponde a uma conjugação de Direito pri­
vado, Direito público e Direito criminal.
214
§22.“ CARACTERIZAÇÃO
1
II A recondução do Direito privado funda-se nas raízes históricas do
ramo jurídico e no facto de no seu núcleo encontrarmos relações estabe­
lecidas entre sujeitos privados e não entre sujeitos privados e públicos ou
apenas entre sujeitos públicos.
III. Originariamente, o Direito dos valores mobiliários seria Direito
privado no seu estado mais puro. Pensemos nas primeiras operações
mobiliárias modernas, realizadas em Amesterdão^®® ou em Londres^®b
os títulos eram comprados e vendidos livremente, sem restrições signifi­
cativas, mesmo de índole formal. Recorde-se que as primeiras bolsas de
valores foram constituídas, não por imposição governamental, visando,
por exemplo, uma supervisão mais atenta da realidade mobiliária, mas
por necessidade dos negociantes, que desejavam prosseguir as suas ativi­
dades comerciais em locais predeterminados e com instalações próprias
e capazes.
À medida que os valores mobiliários foram assumindo uma crescente
relevância económica e social, o Estado decidiu intervir, regulando o sec­
tor. Esta prática é distintamente recente, mesmo nos Estados Unidos da
América, onde pode ser encontrada nas Blue Sky Laws, datadas da década
de 20 do século passado, e, verdadeiramente, com a legislação mobihária
federal do pós-Grande Depressão^®®. Na Europa, a juventude da inter­
venção do Estado é igualmente notória, sendo conhecida uma correlação
entre esta tomada de posição e os avanços harmonizadores comumtários.
Na Alemanha, podemos apontar para a década de 70 e, em Portugal, para
a viragem da década de 80 pa.ra a década de 90 - período contemporâneo
com a entrada de Portugal na CEE.
IV. Os diplomas anteriores a este período, embora atendessem aos
interesses públicos e fizessem depender algumas atividades de autoriza­
ção governativa, estão longe de assumir as características hoje reconhe­
cidas e atribuídas aos Códigos mobiliários e que permitem falar de um
avanço do Direito público no universo jurídico mobiliário.
Ponto 71.
Ponto 72.
Ponto 76/n.
215
 D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
Um simples confronto entre as matérias abrangidas pela Lei n.°8/74
de 14 de janeiro, e o Código do Mercado dos Valores Mobiliários ou o
Código dos Valores Mobiliários é elucidativo do que se afirma.
As transformações operadas a partir deste período e que se estendem a
outros ramos historicamente privatísticos, caso paradigmático do Direito
bancário ou do Direito dos seguros, podem ser apresentadas como uma
outra face, ainda por explorar, do novo paradigma da intervenção do
Estado moderno, que cada vez mais assume um papel de regulador das
relações privadas'*^®.
V Se a crescente intervenção do Estado no Direito dos valores
mobiliários inviabiliza a sua recondução absoluta ao campo do Direito
Comum, também a afirmação de que se trata de uma simples manifesta­
ção do Direito da Economia (Direito Público) não pode ser aceite, como
já tivemos oportunidade de sublinhar. No núcleo do Direito dos valores
mobiliários encontramos relações privadas.
88. D ireito especial
O Direito dos valores mobiliários é Direito especial: Direito comercial
especial.
A especialidade do Direito mobiliário não se traduz numa autonomia
estrutural ou independência conceituai, pelo contrário. O epíteto especial
congrega duas ideias nucleares: (i) dependência fundacional em relação
ao Direito comum; e (ii) particularização dos regimes próprios.
O Direito dos valores mobiliários desenvolveu-se aos ombros de gigan­
tes: Direito civil e Direito comercial, na sua dimensão privatística domi­
nante, e Direito administrativo e Direito da Economia, na sua dimensão
regulatória. Mas não é, certamente. Direito comum, nem muito menos
se encontra refém das conceções civilísticas, no seu estado mais puro. As
especificidades do Direito dos valores mobiliários impõem o desenvol­
vimento de regimes próprios, preparados para responder às exigências
Vide, por todos: Marisa Apolinário, O Estado regulador: o novo p apel do Estado - análise da
perspectiva da evolução recente do D ireito adm inistrativo - o exemplo do sector da energia, Almedina,
Coimbra, 2015.
216
§22." CARACTERIZAÇÃO
da realidade que pretende regular: situações jurídicas mobihárias; o que
determina um afastamento pontual, em face das soluções vigentes no
Direito comum^°°.
89. D ireito técnico
Todo o Direito é técnico, num duplo sentido: exige tanto um conheci­
mento dos regimes aplicados como das reahdades reguladas, incluindo,
evidentemente, o jargão sectorial. Nessa perspetiva, o Direito mobiliário
não se distingue do Direito da famíHa, do Direito do arrendamento ou
mesmo da mais abstrata Teoria geral do Direito civil.
A tecnicidade do Direito dos valores mobiliários não deve ser con­
fundida com autonomia jurídica - remetendo-se, assim, para o que se
disse no ponto anterior. O estudo do Direito mobiliário pressupõe um
domínio prévio de Direito comum, pense-se no conceito de bem jurí­
dico ou no funcionamento da responsabilidade civil, indispensáveis
para compreender as especificidades próprias deste ramo. É um erro
julgar que as respostas para o Direito mobiliário se encontram inteira­
mente no seu seio.
O conhecimento da realidade regulada não deve ser confundido com
um domínio preciso. Os juristas não são financeiros nem gestores, não
lhes é exigida qualquer especialização nessas matérias. Aliás, a procura
por uma perceção plena deve mesmo ser evitada, por duas razões: afasta
os juristas (incluindo advogados) das matérias que efetivamente devem
controlar e potência a tentação do aconselhamento financeiro, com
consequências potencialmente gravosas: no limite, responsabilidade civil.
90. D ireito fragm entário
I. Ao apresentarmos o Direito dos valores mobihários como fragmen­
tário, temos em vista dois aspetos distintos: (i) fragmentação legislativa;
e (ii) fragmentação material.
°°Esta especificidade é comum ao Direito comercial e a todos os seus ramos especializados,
cfr., Menezes Cordeiro, D ireito comercial, cit., 44.
217

D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
II. A pulverização legislativa é uma marca dos nossos tempos. Esta
realidade é transversal a todo o sistema, estendendo-se mesmo ao seu
núcleo: o Código de 66 não abarca hoje matérias que são centrais ao
estudo do Direito civil, pense-se na Lei Quadro das Fundações, na Leis
das Cláusulas Contratuais Gerais ou nos incontáveis diplomas rela­
cionados com menores - adoção, prestação de alimentos ou guarda de
menores. Em alguns ramos e respetivos Códigos, caso paradigmático do
Direito comercial e do Código Veiga Beirão, os diplomas extravagantes
chegam a desempenhar um papel tão ou mais relevante, mesmo numa
perspetiva sistemática - p. ex.: a Lei do Contrato de Agência assume o
papel de Direito comum em face dos restantes contratos de distribuição.
No âmbito do Direito dos valores mobiliários, o CVM continua a ocu­
par um lugar fundacional, todavia, está longe de cobrir todas as matérias
mobiliárias^“^
III. A fragmentação não se resume à dispersão legislativa, estendendo-
-se igualmente ao seu conteúdo. Não há, no Direito dos valores mobihá-
rios, uma continuidade lógico-científica, como se verifica, por exemplo,
no Direito das sociedades comerciais ou no Direito da insolvência. Uma
rápida leitura do índice do CVM é disso elucidativo; o diploma cobre
áreas tão distintas como a dos instrumentos financeiros, dos sujeitos
mobihários, das situações mobiliárias e dos crimes de mercado.
A medida que escrevemos estas linhas, torna-se cada vez mais evidente
que a natureza fragmentária do Direito dos valores mobiliários permite,
senão mesmo exige, uma compartimentação do seu conteúdo em gran­
des sub-ramos, sistematicamente ligados, é certo, mas autonomizáveis:
o Direito dos instrumentos financeiros (coisas); o Direito dos sujeitos
mobiliários (pessoas); o Direito das situações mobiliárias (obrigações); o
Direito mobiliário regulatório (administrativo ou Direito da economia);
e Direito dos crimes do mercado (penal).
A juventude do ramo, a insuficiência da produção científica e a falta
de espaço nos nossos cursos de hcenciatura travam, por ora, um reco­
nhecimento desta multiplicação de Direitos mobiliários. A nossa Ciência
é lenta e ponderada, as mudanças raramente são radicais e dependem
' Ponto 54.
218
§ 22.° C A R A C T E R IZ A Ç Ã O
de sucessivas renovações geracionais, mas não temos dúvidas que o con­
teúdo substantivo abarcado permite o aprofundamento que se vaticina.
91. Direito comunitarizado
I. A intervenção legislativa europeia assume hoje um papel central na
evolução dos Direitos internos dos Estados Membros. O Direito do con­
sumidor e o Direito da concorrência são dois claros exemplos de ramos
jurídicos que foram moldados pela ascendência comunitária. Também o
Direito dos valores mobiliários deverá ser incluído neste cada vez mais
extenso grupo^“^
O impacto da intervenção europeia assume uma espantosa transver-
salidade. Desde o processo de emissão e de transmissão, passando pelos
deveres dos intermediários financeiros e pelas contraordenações e cri­
mes contra os mercados até aos conceitos de valor mobiliário e de instru­
mento financeiro. Todos estes aspetos são devedores do Direito Europeu.
II. A ascendência comunitária tem caminhado num sentido hegemó­
nico. Atualmente, é possível afirmar que mais de 3/4 dos Direitos mobi­
liários internos têm uma origem europeia e com uma clara tendência
para prosseguir nesse sentido^“^.
Certamente, que não poderá falar-se em unificação, pese embora a
tendência recente para as entidades europeias intervirem de forma
direta, recorrendo aos cada vez mais comuns regulamentos mobiliá­
rios^“^, mas é hoje evidente que os Direitos dos valores mobiliários inter­
nos se encontram a atravessar um intenso processo de harmonização que
só será descontinuado com uma mudança drástica do paradigma comu­
nitário europeu.
O processo de harmonização mobiliária é gradual e constante. Mais
recentemente, o movimento foi objeto de um reforço substancial, com a
Ponto 33.
Seiler/Kniehase, Schim ansky, cit., 1034: falam em 80%.
S04
A unificação formal e plena é hoje uma solução ultrapassada, salvo casos excecionais e pon­
tuais, em face da rigidez que acarreta. Veja-se o interessante e sucinto artigo de Marc Angel,
From the U nification o f L aw to its H arm onization, 51 Tul L Rev, 1976,108-117.
219
 D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
criação, há muito desejada por amplos sectores, da ESMA - autoridade
de supervisão europeia para o sector®“^.
in.
Ao analisar o movimento de harmonização dos Direitos mobihá-
rios europeus somos sistematicamente confrontados com duas grandes
questões: (i) quais os próximos passos?; e (ii) irá a harmonização desa­
guar numa efetiva unificação? A primeira pergunta centra-se num futuro
próximo, ficando, para a segunda, o destino longínquo e, como tal, mais
incerto e imprevisível.
Os estudos patrocinados pelas entidades europeias, em especial pela
Comissão^“®, são perentórios: só é possível criar um mercado único de
instrumentos financeiros com um maior grau de harmonização legisla­
tiva. As falhas na transposição interna das diretrizes, bem como o dife­
rente ritmo da sua adoção^“'’, críticas sublinhadas em todos esses docu­
mentos, têm estimulado a substituição das diretrizes pelos regulamentos.
Este panorama é já hoje uma realidade (por exemplo: Regulamento (CE)
n.° 1060/2009, de 17 de novembro, relativo às agências de notação de
risco; Regulamento (UE) n.°236/2012, de 14 de março, relativo às vendas
a descoberto e a certos aspetos dos swaps de risco de incumprimento e
Regulamento (UE) n.°648/2012, de 4 de julho, relativo aos derivados de
balcão).
Embora se reconheça a necessidade de uniformizar alguns regimes,
sob pena de o mercado único europeu se tornar uma simples miragem“ ^
Lucas Henrique e Matteo Gatti, Is There a Uniform E U Securities L aw A fter the F in an cial Ser­
vices A ction P lan?, 14 Stan JL Bus Fin, 2008, 43-82; os Autores expressaram sérias dúvidas
quanto ao processo de harmonização, precisamente pela ausência de uma entidade de super­
visão supranacional. Veja-se, ainda, com idênticas considerações: Eric J. Pan, H arm onization o f
U S-EU Securities R egulation: The Casefo r a Single European Securities R egulation, 34 Law & Pol’y
Int’l Bus, 2003, 499-536 e Robert S. Karmel, The Casefo r a European Securities Commission, 38
Colum J Transnat’l L, 1999, 9-43: sublinha a importância da SEC no desenvolvimento de um
efetivo mercado estado-unidense de valores mobiliários.
506 ^ g o
Zeynep Ozkok, F in an cial H arm onization and In d u strial G row th: Evidence from Europe, 2012,
(Net): o Autor defende que o desfasamento temporal na transposição das diretrizes, para as
respetivas ordens internas, tem um significativo impacto negativo para os Estados Membros
que optam por uma célere transposição.
Derek Takehara, F in an cial Reform in the European Union: E stablishing the Common Technical
Rulebook, 26 Glo Bus & Develop LJ, 2013,531-553.
220
§ 22.» C A R A C T E R IZ A Ç Ã O
não é credível nem desejável que este processo venha a abarcar todo o
Direito dos valores mobihários: desde logo por imphcar uma completa
uniformização dos sistemas jurídicos europeus.
IV. As diferenças substantivas entre os Direitos mobihários europeus
são mais acentuadas do que usuahnente gostamos de admitir, mesmo
dentro do Direito dos valores mobihários: pense-se no caso de escola dos
organismos de investimento coletivo e na multiphcidade das soluções
encontradas intemamente^®^. Estas diferenças refletem as especificida­
des de cada ordenamento juridico interno.
É precisamente porque no seio da União Europeia coexistem 28
Direitos distintos que a uniformização do Direito dos valores mobihá­
rios, englobando todas as suas dimensões, só será possível mediante uma
uniformização plena e transversal, com o consequente desaparecimento
dos Direitos mtemos. Em abstrato, até podemos admitir um cenário de
unificação do Direito regulatório, mas nunca do Direito privado: seria
necessário alterar, de forma radical, o núcleo de todos os ordenamentos -
grosso modo, os três primeiros Livros do nosso Código Civil, bem como os
Direitos especiais relevantes: Direito comercial e Direito das sociedades
comerciais.
Mas vamos reconhecer, por mero exercício académico, que esse cená­
rio é possível: seria desejável ou sequer necessário? Não. Os Direitos
refletem as especificidades históricas, sociais e culturais de uma determi­
nada comunidade e não podem evidentemente ser ignoradas. O período
que hoje vivemos permite ver esta conceção, espantosamente descrita
como ultrapassada, em ação. A crise financeira afetou os países europeus
de forma distinta, sendo natural que as medidas legislativas tomadas tam­
bém o tenham sido^^°. A unificação legislativa não pode atender apenas
às supostas vantagens pohticas que acarreta: as reahdades e os contextos
Dirk A. Zetzsche, Prinzipien der kollektiven Vermögensanlage, Mohr Siebeck, Munique, 2015:
o Autor chega, precisamente, a esta conclusão.
Emiliano Grossman e Patrick Keblond, European F in an cial Integration: F in ally the G reat Leap
Forw ard, 49 JCMS, 2011,413-435: os Autores defendem que a crise afastou, em alguns pontos
concretos, os Direitos internos dos Estados Membros.
221
 D IR E IT O DOS V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
concretos devem ser atendidos e valorizados, sob pena de se estar a regu­
lar comunidades que não existem^^\
Não deixa de ser espantoso como alguns autores apresentam a unificação do Direito pri­
vado europeu como estando simplesmente nas mãos dos legisladores (a título meramente
exemplificativo, veja-se; Daniela Caruso, The M issing View o f the C athedral: The P rivate Lava
Paradigm o f European L egal Integration, 3 Eur LJ, 1997, 3-32). Não vemos como esta unificação
possa ocorrer por simples decreto. Será um processo lento, demorado e fortemente depen­
dente da Ciência Jurídica, Remhard Zimmermann, C ivil Code and C ivil L aw : The “European­
ization o f P rivate L aw w ithin the European Com m unity and the Re-emergence o f a European Legal
Science, 1 Colum J Eur L, 1994, 63-105. Dário Moura Vicente, Urn Código C ivil p ara a Europa?
A lgum as reflexões em EH Inocêncio G alvão Telles, Vol. 1, Almedina, Coimbra, 2002,73; está por
demonstrar a necessidade real de uma unificação do Direito privado europeu. Veja-se, ainda,
Susana Maltez, A elaboração de um Código C ivil europeu, FDL, Lisboa, 2002, inédito.
222
§ 23.“ CONCEITOS MOBILIÁRIOS NUCLEARES
92. Enquadram ento
^ titulo introdutorio, apresentamos a conceitualização jurídica dos
termos mobiliários dominantes como sendo um dos objetivos primor­
diais do modelo metodológico adotado.
Estando a conceitualização intrinsecamente associada à ideia de natu­
reza jurídica e sendo esta uma decorrência dos regimes correspondentes,
poderá, porventura, ser considerado prematuro avançar soluções dogmá­
ticas, na medida, precisamente, em que qualquer conceitualização deve
refletir as conceções positivadas nas Leis mobiliárias e não o seu oposto.
Contudo, versando este primeiro livro sobre a dogmática mobiliária
geral, julgamos vantajoso esclarecer alguns conceitos nucleares que irão
acompanhar as subsequentes incursões pela matéria.
A decisão de avançar o leque fiindacional dos conceitos mobiliários
permite ainda aperfeiçoar a visão adotada nesta obra - e reconhecida pelo
legislador no preâmbulo ^ Direito dos valores mobiliá­
rios é parte integrante de uma Ciência Jurídica consolidada, partilhando,
para além dos mesmos princípios e da mesma metodologia, uma lingua­
gem comum, transversal a todo o ordenamento.
II. Adaptando a visão clássica às especificidades hnguísticas e estrutu­
rais do Direito dos valores mobiliários, julgamos ser possível identificar
Considerando 2.
223
 D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
txês grandes conceitos que atravessam todo o Direito dos valores mobi­
liários, moldando o seu conteúdo, a sua aprendizagem e transmissão de
conhecimentos: (i) bens mobiliários; (ii) situações mobiliárias; e (iii) fac­
tos mobiliários.
93. Bens, situações e factos m obiliários
I. O preenchimento dos conceitos de bem mobiliário e de situação
jurídica mobiliária remete-nos, inevitavelmente, para a discussão em
torno da natureza jurídica dos valores mobiliários e dos restantes instru­
mentos financeiros^^^: são coisas ou situações? E, sendo situações jurí­
dicas, devem ser reconduzidas ao universo dos direitos de crédito, dos
direitos reais ou dos ainda imprecisos direitos reificados^’^“^?
O esclarecimento destas matérias, que apenas pode ser alcançado
mediante o acompanhamento de uma análise dos diferentes regimes dos
instrumentos financeiros, extravasa os propósitos deste primeiro livro;
todavia, importa esclarecer o que se entende por bem mobiliário, situa­
ção mobiliária e facto mobiliário.
II. No seio da Ciência Jurídica nacional, é tradição antiga, que remonta,
mais modernamente, aos textos de Pascoal de Melo, recorrer-se à expres­
são coisa, do latim res. O termo bem, particularmente difundido com a sua
positivação no Código Napoleónico, não logrou, pese embora a natural
ascendência francesa ao longo de todo o período de Seabra, impor-se por
substituição^^^. A locução ‘coisa’ pode, assim, ser descrita como o termo
Dorothee Einsele, W ertpapierrecht als Schuldrecht: Funktionsverlust von Effektenurkunden im
internationalen Rechtsverkehr, Mohr Siebeck, Tubinga, 1995 (xxxiv + 649 pp) e Matthias Leh­
mann, Finanzinstrum ente: vom W ertpapier- und Sachenrecht zum Recht der unkörperlichen Vermö­
gensgegenstände, Mohr Siebeck, Tubinga, 2009 (xxxii + 559 pp); obras incontomáveis, no
esclarecimento da natureza jurídica dos instrumentos financeiros.
Do trust, cit., 1181-1182.
António Menezes Cordeiro, Tratado de D ireito civil, Vol. Hl, 3.* ed, Almedina, Coimbra,
2013,49.
224
§ 2 3 .” C O N C E IT O S M O B IL IÁ R IO S N U C L E A R E S
jurídico oficial, estatuto que lhe advém , desde logo, da sua utiHzáção no
Código C ivil de 66 (artigos 202.° ss)^^®.
A oficialidade da expressão coisa é acompanhada de uma tendência para
utilizar a locução bem como sinónimo - a elegância da escrita lusitana,
pouco favorável ao emprego repetitivo de palavras, a isso ajuda.
Esta correspondência linguística não impediu que cada um dos ter­
mos assumisse, paulatinamente, contornos próprios, promovendo, deste
modo, uma certa repartição conceituai, reconduzível aos seguintes ter­
mos gerais: para o termo coisa ficam as coisas corpóreas ou materiais e
para o termo bem as coisas incorpóreas ou imateriais. Não se trata, cer­
tamente, de um dogma jurídico, o próprio Código Civil utiliza o termo
bens imóveis (p. ex.: artigo 39.°/4), necessariamente coisas corpóreas, e
o Código do Direito de Autor e dos Direitos Conexos, apresenta as obras
como coisas iacorpóreas (p. ex.: artigo 10.°/1).
Se o emprego indiferenciado das locuções se apresenta aceitável na
maioria das situações, a comunidade jurídica tende a excluir o emprego
da expressão coisa de áreas muito específicas: a vida, a imagem, a integri­
dade moral e restantes bens de personalidade não são coisas, são bens;
também a prestação, no âmbito de um mandato, é descrito como bem e
não como coisa®^^.
Em face desta dicotomia, e atendendo ao conteúdo das situações jurí­
dicas mobiliárias, de seguida esclarecidas, é evidente que o termo mais
correto será o de bem mobihário e não o de coisa mobihária; basta, para
0 efeito, atender às obrigações, enquanto valores mobiliários creditícios;
assumindo o pagamento periódico de juros e a entrega do capital a fun­
ção de bem (prestações) da relação estabelecida entre o emitente e os
obrigacionistas.
III. Nos termos ora descritos, a prestação de um título creditício
assume-se como bem; mas será o próprio valor mobiliário um bem ou
uma situação jurídica? A resposta terá de ser a seguinte: o valor mobi­
liário é um bem, mas que não se esgota na prestação per se, engloba.
José Dias Marques, índice dos vocábulos do Código C ivil português, 27 RFDUL, 1986,327-390,
347-348; artigos em que o termo ‘bem’ é empregue e 356-357; artigos em que o termo ‘coisa’
é empregue.
Menezes Cordeiro, Tratado, III, cit., 163-164.
225
 D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
§23.° CONCEITOS MOBILIÁRIOS NUCLEARES

também, o próprio documento, escriturai ou titulado, que representa [,• V. A abstração da discussão é facilitada se for acompanhada de alguns
posição jurídica. Dito de outra forma: o documento, escriturai ou tim! (exemplos elucidativos^^^:
lado, representativo da posição jurídica de acionista ou de obrigacionista
é apenas parte do respetivo valor mobiliário; este, enquanto bem que 1. A, comprador, e B, vendedor, celebram um contrato de compra e
e, engloba todas as prestações inerentes à posição ocupada pelo titular fvenda, sobre o imóvel X.
O facto de uma determinada situação jurídica ser representada num
documento - recorrendo ao disposto no artigo 362.° do - não ' [] bem: imóvel X;
[] situação jurídica do A: direito a exigir a entrega da coisa + dever de
juridicamente indiferente, alterando tanto o conteúdo da situação - que
passa a poder ser negociado em mercado regulamentado - como o do pagar o preço;
[] situação jurídica do B: direito a exigir o pagamento do preço + dever
própno bem subjacente - que passa a incorporar o documento represem
tativo, para além de todas as novas prestações inerentes à representação de entregar a coisa.

2. A, intermediário financeiro, e B, investidor não qualificado, cele­

IV. Segmndo este raciocínio, são situações jurídicas não o valor mobi­
bram um contrato de consultoria financeira:
liário per mas as situações encabeçadas pelos titulares desses valores
mobiliários - desde o mais singelo direito de crédito dos obrigacionistas à [] bem: consultoria financeira;
mais complexa participação social dos titulares de ações de sociedade n situação jurídica encabeçada por A: direito a exigir o pagamento do
abertas -, bem como todas as situações emergentes da emissão, do depó­ serviço prestado + dever de prestar consultoria financeira;
sito ou dos contratos financeiros de intermediação ou de aconselhamento. D situação jurídica encabeçada por B: direito à consultoria financeira
O recurso à expressão situação mobiliária, utilizada noutros campos + dever de pagar o serviço prestado.
- Direito bancário: situação jurídica bancária^^®; ou Direito do trabalho:
situação jurídica laboraP^° -, concede uma consistência dogmática que de 3. A, obrigacionista, adquire um conjunto de obrigações emitidas por
outro modo não seria alcançável. Ao mesmo tempo, permite um enqua­ B, entidade emitente:
dramento fimdado na conceção moderna de Direito, enquanto Ciência
n bem: respetivo valor mobiliário, que abrange não apenas o título
reguladora de relações estabelecidas entre pessoas e entre pessoas e
como as próprias prestações que nele surgem representadas, de
coisas. Acresce que a relevância atribuída ao conceito de situação jurídica
entre as quais se destacam: a prestação de juros, a entrega do capi­
mobihária fortalece a inclusão do núcleo do Direito dos valores mobihá-
tal, a informação e a participação em assembleias de obrigacionistas;
rios no campo do Direito comum.
D situação jurídica encabeçada por A: direito a transacionar a situação
jurídica em mercado regulamentado; direito a exigir o pagamento
[D]iz-se documento qualquer objeto elaborado pelo homem com o fim de reproduzir ou dos juros; direito a exigir a restituição do capital; direito à informa­
representar uma pessoa, coisa ou facto”. Abrangendo, assim, quer os valores mobiliários escri­ ção; e direito a participar nas assembleias de obrigacionistas -i- dever
turais quer os valores mobiliários titulados. de pagar o preço;
Menezes Cordeiro, D ireito bancário, cit., 325 ss.
°Veja-se o trabalho clássico de Menezes Cordeiro, D a situação ju ríd ica laborai: perspectivas do
D ireito do trabalho, Separata RO A, 1982. A centrahdade da situação jurídica laborai mantém-
-se nas obras de referência contemporâneas: Pedro Romano Martinez, D ireito do trabalho, 7.”
ed., Almedina, Coimbra, 2015,125 ss ou Maria do Rosário Palma Ramalho, Tratado de D ireito
do trabalho. Parte 1, 3.“ ed., Almedina, Coimbra, 2012,383 ss: com importantes diferenças em
Apenas se referem os direitos e deveres mais característicos. Não se busca uma exposição
relação ao conteúdo da situação jurídica laborai.
exaustiva.

226
227
 D IR E IT O DO S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S

□Situação jurídica encabeçada por B: direito a exigir a entrega do

preço + dever de pagar os juros; dever de restituir o capital; e dever
de prestar todas as informações devidas e pedidas.

4. A, acionista, adquire um conjunto de ações emitidas por B, sociedade

comercial:

D bem: respetivo valor mobiliário, que abrange não apenas o título

como as próprias prestações que nele surgem representadas, de
entre as quais se destacam: parte dos lucros, participação na vida da
sociedade e informação;
D situação jjurídica encabeçada por A: direito a transacionar a situa­
ção jurídica em mercado regulamentado; direito a quinhoar nos
lucros; direito a participar na vida da sociedade; direito à informa­
ção (artigo 21.“ do CSC) + obrigação de entrada e dever de quinhoar
nas perdas (artigo 20.°do CSC);
D situação jurídica encabeçada por B: direito a exigir a entrega do
preço + dever de distribuir os lucros e dever de informação.
VI. Às situações jurídicas mobiliárias e aos valores mobiliários cumpre
acrescentar um terceiro conceito nuclear: o de facto jurídico mobiliário.
Em termos genéricos, um facto mobiliário corresponde a um aconteci­
mento real ao qual o Direito associa a produção de determinados efeitos
jurídicos, quer sejam atos ou negócios, unilaterais ou plurilaterais. Como
exemplos de factos jurídicos, refiram-se a emissão, o depósito ou a com­
pra e venda de valores mobiliários.
VII. Em jeito de recapitulação, propomos a seguinte abordagem,
assente na tricotomia clássica: (i) bem mobiliário: abrange o documento
representativo da situação jurídica mais a prestação inerente ao docu-
rnento e à situação subjacente; (ii) situação jurídica mobiliária: situa­
ção jurídica complexa que abrange não apenas os direitos emergentes
da sua representação em valor mobiliário, maxime, direito a transacionar
o direito em mercado regulamentado, como todos os restantes direitos
e deveres inerentes à própria posição, seja a de obrigacionista, de acio­
nista ou de qualquer outra titularidade mobiliária; e (iii) facto jurídico
mobiliário: corresponde aos acontecimentos reais em relação aos quais o
Direito atribui a produção de efeitos jurídicos (mobiliários).
228
§24.“ INTERPRETAÇÃO
95. Quadro interpretativo geral e a letra da lei
I. À luz dos disposto no artigo 9.° do Código Civil, o intérprete-
-aplicador deverá atender, no âmbito da sua atividade interpretativa, a
quatro elementos distintos, conquanto concomitantes: (1) a letra da lei;
(2) o elemento histórico-comparatístico; (3) o elemento sistemático;
e (4) o elemento teleológico^^^.
II. A primeira frase do número I do artigo 9.°do Código Civil, aqui
aphcável por inteiro, não deixa de causar alguma perplexidade: “A inter­
pretação não deve cingir-se à letra da lei”. O legislador, ao invés de intro­
duzir 0 regime jurídico da interpretação da Lei começando por subli­
nhar a preponderância do texto positivado, optou precisamente pelo seu
oposto, ou seja, por evidenciar a insuficiência do elemento gramatical.
Esta primeira linha é enganadora: a incontornabihdade da letra da lei é
evidenciada nos números que se seguem: o número 2 do mesmo artigo
exclui qualquer solução que “não tenha na letra da lei um mínimo de
correspondência verbal”, consagrando, por seu lado, o número 3 uma
^ Sobre a interpretação, vide, em especial, Menezes Cordeiro, Tratado, I, cit., 671 ss: segue-
-se de perto o método expositivo e sistemático aí desenvolvido; Miguel Teixeira de Sousa,
Introdução ao D ireito, Almedina, Coimbra, 2012, 337 ss; Fernando José Bronze, Lições de intro­
dução ao D ireito, 2.“ ed., Coimbra ed., Coimbra, 2010 (= 2006), 875 ss; e o clássico mas sem­
pre mfluente, João Baptista Machado, Introdução ao D ireito e ao discurso legitim ados, Almedina,
Coimbra, 2010 (= 1982), 175 ss.

229
 DIREITO DOS VALORES MOBILIÁRIOS
ponderada presunção: a de que o legislador “soube exprimir o seu pensa­
mento em termos adequados”.
A insuficiência do elemento literal é uma consequência da ambigui­
dade da própria linguagem; as palavras e as expressões assumem diferen­
tes preenchimentos e interpretações, encontrando-se dependentes dos
pré-entendimentos, conhecimentos e experiência do intérprete.
Em ramos jurídicos muito técnicos, como o nosso Direito dos valo­
res mobiliários e, em geral, em todos os restantes Direitos comerciais
especiais, é comum recorrer-se, na prática legislativa, ao jargão sectorial
- espera-se que as leis sejam feitas por especialistas. Confrontado com
possíveis múltiplos preenchimentos, deve eleger-se o que mais se apro­
xima da prática comercial dominante.
As fragilidades da letra apenas poderão ser superadas se atendermos
aos restantes elementos interpretativos.
96. Elem ento histórico-com paratístieo
I. A afirmação de que o Direito é uma Ciência histórico-cultural não é
desprovida de conteúdo útil. A lei não é - ou pelo menos não deveria ser
- o produto de uma decisão irrefletida ou infundada; pelo contrário: cada
preceito conta uma história, composta, grosso modo, pelas necessidades e
exigências, reais ou imaginárias, de uma comunidade, assim como pelo
modo encontrado pelo legislador para as regular.
O elemento histórico decompõe-se em quatro componentes:
- a occasio legis;
- os trabalhos preparatórios;
- as opções do legislador histórico;
- as soluções comparatísticas.
II. A occasio legis corresponde ao conjunto de circunstâncias existentes,
de índole económica, social, cultural, pohtica, legislativa ou judicial, que
condicionaram a elaboração de cada preceito, individualmente.
A occasio legis encontra nos preâmbulos legislativos a sua dimensão
mais reconhecida. Não raramente, os diplomas são antecedidos de textos
230
§24.° INTERPRETAÇÃO
introdutórios, tradicionalmente elaborados por comissões responsáveis
pela sua elaboração - caso do CVM®“ .
1
O interesse dos preâmbulos é normalmente reduzido, Umitando-se,
na maioria das vezes, a narrar as circunstâncias que envolveram a pre­
paração da lei, a expor as linhas gerais das reformas ou a relevar algum
ponto que se julgue determinante.
O preâmbulo do CVM é um bom exemplo do conteúdo que um
preâmbulo deve assumir. Bem estruturada, equilibrada e elegante, a
introdução não cai no erro de ser excessivamente específica nem des­
necessariamente geral. De entre as passagens mais relevantes, desta­
camos três: (i) a dedicada à inclusão do Direito dos valores mobihários
no sistema jurídico português: não se pretendeu criar um novo Direito,
alheado do ordenamento onde se insere: o ramo mobihário assume-se
como Direito especial; (ii) a focada no equilíbrio das fontes: a pretensão
de descentrahzação legislativa, atribuindo poderes de concretização às
autoridades de supervisão, maxime, à CMVM, é posta em evidência; e (iii)
0 esclarecimento quanto à opção originária, ultrapassada com a reforma
de 2004, da tipificação dos valores mobiliários.
Dificilmente os preâmbulos podem dar respostas a dúvidas concretas;
mas, caso isso aconteça, exigem-se sérias cautelas, por variadas razões:
por vezes, o texto é elaborado antes da versão final, podendo, conse­
quentemente, não refletir importantes alterações subsequentemente
introduzidas; os diplomas estão sujeitos a constantes reformulações, o
que se traduz numa rápida desatuahzação dos próprios preâmbulos; e a
natureza não vinculativa destas introduções: nada impede que, à luz de
todos os elementos interpretativos, o seu conteúdo seja rejeitado pelo
intérprete-aplicador.
III. Os trabalhos preparatórios merecem um destaque natural, no
seio do elemento histórico: fornecem pistas sobre as grandes opções e
esclarecem o porquê de se ter preferido uma determinada solução, em
detrimento das restantes. Infelizmente, os trabalhos preparatórios não só
são raros como, por norma, são também desvalorizados pela comunidade
jurídica, que não os aproveita condignamente.
Trabalhos preparatórios^ cit., 173 ss.
231
 D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
A Comissão Ferreira de Almeida deixou-nos um volume de trabalhos
preparatórios, o que evidentemente se saúda. Todavia, o seu conteúdo
fica aquém do desejado, não consubstanciando propriamente trabalhos
preparatórios, no sentido mais próprio do termo: recordem-se os monu­
mentais estudos de Vaz Serra, na elaboração do Código Civil de 66.
Também aqui o seu interesse circunscreve-se, essencialmente, à
caracterização do Direito dos valores mobiliários.
IV. O legislador é uma persona. Não existe efetivamente, é uma mera
ficção; contudo, sabe-se quem foi o autor material da Lei, pergunta-se-
que peso deverá ser atribuído à sua interpretação? Como exemplo de
escola, refira-se o Código Civil Anotado, de Pires de Lima/Antunes Varela.
Em relação ao CVM“ ^ são conhecidos os nomes que compunham a
comissão responsável, bem como a divisão interna do trabalhosas.
- Carlos Ferreira de Almeida, Amadeu Ferreira e Paulo Câmara: Capí­
tulos I e II do Título I;
- Amadeu Ferreira: Decreto-Lei preambular; Capítulo V do Título I;
Títulos II, rV, V, VI e VII, Secção I do Capítulo II do Título VIII e,
ainda. Estatuto das sociedades gestoras de mercados e Estatuto da
CMVM;
- Paulo Câmara: Capítulos III e IV do Título I e Título III;
- Frederico da Costa Pinto: Título VIII, salvo Secção I do Capítulo II.
Tendo a revisão final do texto ficado a cargo de Carlos Ferreira de
Almeida, Amadeu Ferreha e Paulo Câmara.
Ora, tendo estes Autores se pronunciado sobre os regimes que os
responsabilizam, até que ponto as respetivas interpretações vinculam o
aplicador? A resposta é necessariamente negativa. As posições manifes­
tadas têm um peso meramente subjetivo. Valem na medida da sua coe­
rência científica, à luz do método interpretativo positivado no artigo 9°
do Código Civil.
Ponto S3.
Trabalhos preparatórios, cit., 36.
232
§24.» INTERPRETAÇÃO
V. o Direito português é classicamente permeável à ascendência jurí­
dica externa, notavelmente por parte da Ciência Jurídica alemã, com uma
sensível viragem anglo-saxórdca.
O peso do Direito comparado assume um papel indiscutível no nosso
Direito dos valores mobiliários, em face da comunitarização operada,
que tende a aproximar e a harmonizar os Direitos internos dos Estados
Membros^^®.
A Ciência Jurídica moderna não vale só por si. O facto de uma teoria
surgir em língua inglesa ou alemã não é um fator de imediata valorização.
Tudo depende da sua adequação à realidade jurídica nacional.
O interesse do Direito comparado mobihárío reside, em grande
medida, nas decisões jurisprudenciais produzidas: a proximidade dos
regimes e a necessária harmonização imposta pela denominada interpre­
tação conforme as diretrizes assim o exigem^^^, em especial num orde­
namento português em que os acórdãos mobfiiários são manifestamente
escassos. A XI secção civil {XI. Zivilsenai) do Supremo Tribunal alemão
(Bundesgerichtshof), dedicada ao Direito bancário e ao Direito dos valores
mobihários merece um lugar de destaque.
97. Elem ento sistem ático
I. O elemento sistemático recorda-nos que nenhum preceito existe
isolada ou autonomamente, antes surgindo integrado num ordenamento
concreto: é moldado por outros regimes e por preceitos próximos; os ter­
mos e conceitos aí empregues assumem um preenchimento transversal,
com contornos científicos definidos; e a unidade do sistema sustenta-se
numa conceção jurídico-dogmática que molda todas as normas, desde a
sua elaboração até à sua interpretação.
Com propósitos meramente expositivos, é possível identificar quatro
níveis, no que ao elemento sistemático respeita: (i) preceito; (ii) regime
jurídico; (iii) ramo jurídico; e (iv) sistema. Trata-se de mm processo
móvel, em que o peso de cada componente surge associado à concreta
reahdade normativa. Vejamos um exemplo particularmente elucidativo.
S26 ^ ^ o
Ponto 99.
233
 d ir e it o d o s v a l o r e s m o b il iá r io s
II. De acordo com o disposto no artigo 304.° /!;
Os mtermediários financeiros devem orientar a sua atividade no
sentido da proteção dos legítimos interesses dos seus cHentes e da efí
ciência do mercado.
No preenchimento da obrigação genérica “proteção dos legítimos
mteresses dos cHentes”, e ao nível da primeira componente, devemos
atender: (i) ao contrapeso operado pela proteção da eficiência do mer­
cado, previsto no mesmo número; e (ü) aos deveres gerais que moldam
a posição jundica do intermediário, elencados no número seguinte: “os
mtermedianos financeiros devem observar os ditames da boa-fé de
acordo com elevados padrões de dÜigência, lealdade e transparência”.
or sua vez, a materiaHzação destes deveres gerais só é possível se
atendermos ao próprio regime jurídico dos intermediários financeiros-
de outro modo, o preenchimento, por exemplo, da expressão “elevados
pa^oes de diligencia” toma-se um exercício puramente abstrato, desH-
fo ^ a Íç ^ ^ efetivamente se espera de alguém que ocupa essa posição de
No ambito do terceiro nível, a nossa atenção deve focar-se nas especi-
cidades do ramo jurídico em questão: a concretização dos deveres fidu-
cianos dos intermediários financeiros irá refletir a fúndonaHzação carac­
terística no nosso Direito mobihário.
É no campo da mterpretação que a ideia de sistema se tom a mais per­
cetível: pense-se no caso paradigmático da boa-fé. Ao exigir que o inter­
mediário financeiro observe os “ditames da boa-fé”, o legislador está a
recorrer a toda a carga histórica e cultural que rodeia o instituto; o seu
proposito é dehberadamente esse: visa-se um aproveitamento de concei­
tos e de métodos com méritos reconhecidamente comprovados.
A relevancia atribuída ao elemento sistemático e às vantagens daí
decorrentes e assumida e reconhecida pelos autores materiais do Código:
atente-se na esclarecedora passagem do preâmbulo do CVM que ora se
transcreve:
A intenção codificadora revela-se também no cuidado de inte­
gração harmoniosa do diploma no conjunto do sistema jurídico, de
acordo com uma relação de especialidade. Evitou-se regular o que
234
§24.° INTERPRETAÇÃO 1
estava regulado, tomando como pressupostos os regimes gerais já
consagrados no direito privado (civil e societário), no direito adminis­
trativo, no direito penal e de mera ordenação social.
98. Elem ento teleológico
I. Qualquer norma jurídica, independentemente da sua origem -
positiva, jurisprudencial ou costumeira -, tem uma razão que a sustenta
oü um propósito que visa alcançar. Identificada essa ratio, a interpretação
toma-se, em princípio, mais acessível e direta. Mas a experiência mostra-
-nos algo diferente: o elemento teleológico, conquanto decisivo na iden­
tificação das linhas gerais de um determinado preceito ou regime, é de
pouca utilidade na resolução de querelas mais profimdas, relacionadas
com questões ditas de pormenor e que em nada afetam as respetivas tra­
ves mestras jurídico-sociais.
II. A funcionahzação que caracteriza o Direito dos valores mobiliá­
rios®^® molda a própria interpretação dos preceitos que o compõem. Qual­
quer preenchimento deve ter em consideração os princípios mobiliários,
nomeadamente: a transparência, a integridade do mercado e a confiança
que sustenta as relações mobihárias. Em caso de dúvida, o intérprete-
-apHcador deverá interpretar no sentido que melhor os potencie, isolada
e conjuntamente.
99. Interpretação eonform e com as diretrizes
I. O primado do Direito europeu e a ascendência comunitária no
âmbito do Direito dos valores mobiliários internos justificam uma incur­
são por um dos núcleos em maior crescimento®^® da pujante metodologia
§25.“.
Alguns autores apresentam a interpretação conforme como a forma mais eficaz de garantir
a aplicação do Direito europeu pelos tribunais dos Estados Membros: Gerrit Betlem, The Doc­
trine o f Consistent Interpretation: M anaging Legal U ncertainty, 22 OJLS, 2002, 397-418.
235
 D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
jxmdica comumtária®^®: o denominado princípio da interpretação con­
forme com as diretrizes^^^
O princípio da interpretação conforme merece uma especial atenção
em ramos que se revestem de especial complexidade técnica e jurídica,
como é o caso do Direito bancário ou do Direito dos valores mobiliários!
A transposição de diretrizes nestas áreas nem sempre é feita correta­
mente, pense-se nas dúvidas que a transposição da Diretriz da Resolução
tem suscitado.
II. As bases do princípio da interpretação conforme, também denomi­
nado de efeito indireto das diretrizes (expressão propagada pela Ciência
Jurídica anglo-saxónica), foram lançadas pelo então Tribunal de Justiça
das Comunidades Europeias, no célebre acórdão Von Colson etKamann^^^,
datado de 1984. Confrontado com a transposição de uma diretriz em
moldes que não correspondiam aos propósitos do diploma comunitário,
decidiu 0 Tribunal que;
Compete ao órgão jurisdicional nacional dar à lei adotada para
aplicação da diretriz, em toda a medida em que o Direito nacional lhe
concede uma margem de apreciação, uma interpretação e uma apHca-
ção conforme as exigências do Direito comunitário^^^.
Seis anos volvidos, o Tribunal de Justiça, no acórdão Marleasin^^,
volta a ter uma oportunidade para esclarecer o campo de aplicação da
construção, ampliando-o. Confrontado com uma dissonância entre o dis­
posto num artigo do Código Civil espanhol e o conteúdo de uma dire­
triz ainda não transposta, o Tribunal de Justiça sustenta a prevalência do
Direito comumtário, apesar de a transposição ainda não ter tido lugar^^^:
Clemens Höpfiier e Bernd Rüthers, G rundlagen einer europäischen M ethodenlehre, 209 AcP,
2009,1-36.
Domingues, TJE n.°C-282/10,24-jan.-2012: apanhado geral do panorama hoje vigente; vide
considerandos 24 e seguintes.
TJE n.“ 14/83,10-abr.-1984.
Conclusões 3. Segue-se de perto a tradução de Miguel Moura e Silva, D ireito com unitário I:
jurisprudência, questões e notas. Tomo I, AAFDL, Lisboa, 2002 (= 2000), 239.
“ “ TJE n.°C-106/89,13-nov.-1990.
Considerando 8.
236
§ 2 4 .“ IN T E R P R E T A Ç Ã O
[A]Oaplicar o direito nacional, quer se trate de disposições anterio­
res ou posteriores à directiva, o órgão jurisdicional nacional chamado
a interpretá-lo é obrigado a fazê-lo, na medida do possível, à luz do
texto e da finalidade da directiva.
Mais recentemente, o Tribunal de Justiça veio elucidar, no acórdão
Pfeiffer^^, que a interpretação conforme não se encontra circunscrita ao
conteúdo da diretriz, transposta ou não transposta, aphcando-se, ainda, a
todo o Direito nacionaP^^:
Quando ao órgão jurisdicional nacional seja submetido um htígio
que envolva exclusivamente particulares, o mesmo é obrigado, ao aph-
car as disposições de direito mtemo adoptadas para transpor as obri­
gações previstas na directiva, a tomar em consideração todo o direito
nacional e a interpretá-lo, na medida no possível, à luz do texto e da
final dessa directiva, para alcançar uma solução conforme ao resultado
por ela pretendido.
III. O crescente campo de aphcação da construção tem sido contra­
balançado com a inclusão de delimitações com propósitos de circunscri­
ção. Às hmitações de índole geraP^® acrescentam-se duas específicas; (i)
a proibição de interpretações contrárias aos Direitos nacionais; e (ii) a
obrigação de respeitar os prazos de transposição das diretrizes.
IV. No caso Pupino^^^-^*°, datado de 2003, o Tribunal de Justiça decidiu
que o princípio da interpretação conforme as diretrizes cessava quando a
solução imposta pelo Direito europeu fosse contrária ao Direito nacional,
representando, na prática, uma interpretação contra legem ou uma inter­
pretação ab-rogante^^^;
TJE n.» C-397/01 a C-403/01,5-out.-2004.
Conclusão 3.
S38
Im pact, TJE n.°C-268/06,15-abr.-2008, considerando 100: princípios gerais, caso da não
retroatividade.
TJE n.°C-105/03,16-jun.-2005,
Veja-se a anotação de Christian HiUgruber, E uG H , 1 6 .6 .2 0 0 5 - C -105/3M aria Pupino. Uni­
onsrecht und nationales Recht - der F a ll Pupino, 60 JZ, 2005,838-844.
Considerando 47.
237
 D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S

[O] princípio da interpretação conforme não pode servir de fdnda

mento a uma interpretação contra legem do direito nacional, no entanto
este prmcípio exige que o órgão jurisdicional nacional tome em con­
sideração, sendo caso disso, o direito nacional no seu todo para apre­
ciar em que medida pode ser objecto de uma interpretação que não
conduza a um resultado contrário ao pretendido pela decisão-quadro.

O ultimo parágrafo da passagem transcrita impõe, aos tribunais nacio­

nais, a obrigação de buscarem uma solução que se coadune com os pro-
positos do diploma comunitário, mas sem desrespeitar o Direito interno.
O facto de o acórdão Pupino versar sobre matéria criminal causou Capítulo III
a guma incerteza quanto ao seu campo de aplicação substantivo. A deci­
são Impact vQio esclarecer essa dúvida: a decisão Punino estende-se a todo A Funcionalização do Direito dos Vaiores Mobiliários
o Direito^^^.

V. A obrigação de respeito pelos prazos de transposição das diretrizes §25.° INTRODUÇÃO

recentemente defendida pelo Tribunal de Justiça e criticada por parte da
doutrina especializada^«, representa um recuo da posição sufragada no
acórdão Marleasing.
No caso Römer, datado de 2011, o Tribunal de Justiça, ao ser confron­
tado com uma discrepância entre uma norma de Direito interno e o con­
teúdo de uma diretriz, decidiu, sem negar esta desconformidade subs­
tantiva, que, não tendo o prazo de transposição sido ultrapassado, seria
de excluir a aplicação do princípio da interpretação conforme^“^^.
Assim, na interpretação dos preceitos mobiliários nacionais, o intér-
prete-aplicador deve, caso necessário, confrontar a fonte interna com os
diplomas mobiliários europeus que a sustentam.
TJE C-268/06,15-abr.-2008.
Damian Chalmers, Gareth Davies e Giorgio Monti, European Union L aw , 3.“ ed., CUP,
Cambridge, 2014, 325; Laurent Pech, Between Ju d icial M inim alism and Avoidance: The Court o f
Justice Sidestepping o f Fundam ental C onstitutional Issues in R öm er and D ominguez
1841-1880. * ’
544 j j g o C-147/08,10-mai.-2011, conclusão 3.
238
100. Enquadram ento
I. É comum apresentar-se o Direito dos valores mobiliários como
sendo um Direito frmcionalizado^^^. Mas que propósito subjaz a esta
caracterização? Que conteúdo específico se pretende atribuir ou vislum­
brar no Direito mobiliário que o distancia dos demais ramos jurídicos?
Todas as áreas do Direito têm uma função específica: a regulação das
situações jurídicas desenvolvidas no seu seio. À luz deste pressuposto,
todo o Direito encontra-se funcionalizado: o Direito da família regula as
situações jurídicas familiares, o Direito sucessório as situações jurídi­
cas sucessórias e o Direito dos valores mobiliários as situações jurídicas
mobiliárias.
Se pretendemos atribuir a esta caracterização um qualquer conteúdo
útil, teremos de procurar um diferente e mais específico preenchimento.
II. A característica da funcionalidade é usualmente remetida para a
dimensão regulatória do Direito dos valores mobiliários e, consequente-
49 CMLR 2012
Veja-se a definição adotada pela maioria da doutrina alemã: Ponto 11/11.

239
 D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
mente, para o campo do Direito da economia. Nesta perspetiva, busca-se
uma resposta para a seguinte questão: que pretende o Estado acautelar,
quando decide intervir no universo mobiliário?
Atendendo ao disposto no artigo 358.°, seriam cinco, esses funda­
mentos®^®:
a) Proteção dos investidores;
b) Eficiência e regularidade de funcionamento dos mercados de ins­
trumentos financeiros;
c) Controlo da informação;
d) Prevenção do risco sistémico;
e) Prevenção e repressão das atuações contrárias à lei ou a regula­
mento.
Esta lista é tradicionalmente resumida em dois grandes princípios: (i)
a eficiência dos mercados; e (ti) a proteção dos investidores®^^. Alguns
autores defendem a autonomização da prevenção do risco sistémico,
enquanto terceira função do Direito dos valores mobiliários®^®. Esta
fiincionalização tripartida tem sido especialmente divulgada pela Inter­
national Organization of Securities Commission^'^^, que, nos seus célebres
A alíneaf) independência perante quaisquer entidades sujeitas ou não à sua supervisão
- respeita à autonomia da CMVM e não aos fundamentos da sua existência.
Esta visão dicotômica, seguida, sem especiais opositores, pelas Ciência Jurídica alemã,
remonta aos primeiros textos mobiliários modernos de Hopt e de Schwark. A título mera­
mente exemplificatívo, veja-se: Seiler/Kniehase, Schim ansky, cit., Rn. 85 e Quids, K iim pel/W ittig,
cit., 1826 ss; Buck-Heeb, K apitalm arktrecht, cit., 3; Christian Bumke, Regulierung am B eispiel der
K apitalm ärkte em K apitalm arktgesetzgebung im Europäischen B innenm arkt, coordenação de Klaus
Hopt, Rüdiger Veil e Jörn Axel Kämmerer, Mohr Siebeck, Tubinga, 2008,107-141,118.
Entre nós: Paulo Câmara, M anual, cit., 31. Anita I. Anand, k Systemic R isk R elevant to Securi­
ties Regulation?, 60 U Toronto LJ, 2010,941-981: aceita-se a argumentação da Autora: os riscos
de uma crise sistémica exigem alterações legislativas e a renovação do modelo de supervisão,
nomeadamente no que respeita à integração da supervisão sectorial e à regulação dos produ­
tos híbridos; todavia, isso não basta para incluir o combate aos riscos sistémicos no leque de
funções transversais do Direito dos valores mobiliários.
A . A. Sommer, Jr., IO SCO : Its M ission and Achievem ent, 17 Nw J IntT L & Bus, 1996, lS-29;
David Zaring, International L aw by O ther M eans: The T w ilight Existence o f International F in an cial
Regulatory O rganizations, 33 Tex Int’ L J, 1998, 281-330, 292 ss; Birgit Rost, D ie H erausbildung
transnationalen W irtschaftsrechts a u f dem Gebiet der internationalen Finanz- und K apitalm ärkte,
BWV, Berhm, 2007,137 ss.
240
§ 25.° IN T R O D U Ç Ã O ■“ 1
Objectives and Principles o f Securities Regulation, identifica três objetivos ou
funções primordiais®®“:
- Protecting investors;
- Ensuring that markets arefair, efficient and transparent;
- Reducing systemic risk.
m. Não acompanhamos esta visão. Certamente que a prevenção de
riscos sistémicos assume um lugar de destaque, tanto no edifício regula-
tório financeiro - banca, bolsa e seguros -, como na intervenção de todas
as entidades de supervisão, incluindo, consequentemente, a CMVM.
A importância do tema saiu mesmo reforçada com a crise financeira ini­
ciada em 2007®®\ Todavia, trabalhamos com objetivos estruturalmente
distintos. Cumpre distinguir as funções gerais e transversais das funções
sectoriais, independentemente da sua relevância.
A proteção dos investidores e a eficiência do mercado moldam o tecido
mobiliário em todas as suas vertentes, enquanto o acautelamento de ris­
cos sistémicos tem um campo necessariamente circunscrito, centrado
em aspetos essencialmente institucionais. A densificação dos deveres dos
sujeitos mobiliários ativos - emitentes, intermediários financeiros, audi­
tores externos ou agências de notação de risco - é disso uma evidência.
Atente-se ao disposto no artigo 304.° /l:
Os intermediários financeiros devem orientar a sua atividade no
sentido da proteção dos legítimos interesses dos seus clientes e da efi­
ciência do mercado.
As exigências relacionadas com a informação a inserir nos prospetos
de investimento são igualmente esclarecedoras: pretende-se um mercado
eficiente, ao mesmo tempo que se acautela a posição dos investidores.
“ “ UtUizámos a versão de junho de 2010.
Veja-se o esclarecedor discurso de Ben Bemanke, à época presidente da Reserva Federal,
proferido a 10 de março de 2009, no Council on Foreign R elations. F in an cial Reform to Address
Systemic R isk (Net). Steven L. Schwarcz, M arkets, Systemic R isk, and the Subprim e M ortgage Crisis,
61 SMU L Rev, 2009, 209- 217. John C. Coffee, Jr., The P olitical Economy o f D odd-Frank: W hy
F in an cial Reform Tends to Be Frustrated and Systemic R isk Perpetuated, 97 Cornell L Rev, 2012,
1019-1082: revela um enorme ceticismo quanto ao sucesso das medidas legislativas introduzi­
das no pós-crise, tendo em vista uma diminuição dos riscos sistémicos.
241
 D IR E IT O DOS V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
§ 25.» IN T R O D U Ç Ã O

O argumento de que o cumprimento das obrigações assumidas por

IV. A funcionalização do Direito dos valores mobiliários, característica
cada sujeito mobüiàrio para com o mercado ou para com outros sujeitos
que partilha, por exemplo, com o Direito bancário^®^ ou com o Direito do
atua como uma primeira barreira no combate às crises sistémicas é exa­
consumo, é usualmente apresentada como um forte indício da viragem
gerado: trata-se de uma consequência lógica e indireta das preocupações
publicista e como o mais claro fundamento da sua recondução ao uni­
transversais subsequentes às atividades regulatória e de supervisão.
verso do Direito da economia. Esta visão não pode ser aceite sem mais,
Não se pretende menorizar a atenção que deve ser dedicada a este como já tivemos oportunidade de sublinhar anteriormente.
aspeto, a crise tornou claro que o sistema financeiro exige uma integra­
A eficiência dos mercados e a proteção dos investidores são pros­
ção da supervisão, em resposta ao movimento de consolidação institucio­
seguidas, numa primeira fase, no seio das próprias situações privadas.
nal - banca, bolsa e seguros uma legislação que acautele fiituras crises;
Pense-se nas já referidas relações investidores/intermediários; de resto,
e uma atenção redobrada em relação à complexidade nos novos produ­
foi precisamente no campo do Direito civil que a posição jurídica dos
tos, por natureza híbridos e, consequentemente, de difícil ou prejudicial investidores foi primeiro acautelada^^e. conservando, atualmente, esse
catalogação Tudo isto é verdade. Porém, o propósito do presente
papel decisivo. A concentração da funcionalização do Direito dos valo­
ponto consiste na identificação das especiais funções do Direito mobiliá­
res mobihários na sua dimensão regulatória é redutora: transmite a ideia,
rio, enquanto microssistema jurídico e não na identificação de todos os
incorreta, de que ambas as funções apenas são prosseguidas e alcançadas
seus princípios ou preocupações.
por intermédio da intervenção direta da CMVM e da imposição de fortes
Em suma, a funcionalização reflete um cuidado, presente em todo
deveres de divulgação de informação ao mercado e ao supervisor. Não
0 sistema mobiliário - Lei, doutrina, jurisprudência e supervisão -, em
é certamente assim: os deveres que adstringem a atuação dos interme­
atender, no âmbito da regulação desenvolvida, aos interesses dos investi­
diários financeiros e moldam as relações mobihárias privadas, intrinseca­
dores, enquanto parte mais frágil, e à eficiência do mercado. Todas as res­
mente fiduciárias, assumem um papel decisivo. É precisamente porque o
tantes funções/objetivos podem ser, de forma mais ou menos evidente,
Direito mobiliário material incorporou estes dois propósitos últimos - a
reconduzidos a um ou a ambos os alicerces^^'*.
proteção dos investidores e a eficiência do mercado -, que a fiincionaliza-
A funcionalização do Direito mobiliário deve ser devidamente bali­
ção pode ser apresentada como uma das suas características, ao lado das
zada e sistematizada: esta não traduz o seu propósito originário ou sequer demais já apontadas.
ultimo. Como em qualquer ramo jurídico, o Direito dos valores mobi­
liários existe para regular as situações jurídicas que se desenvolvam no
seu seio.
101. A eficiência do m ercado

I. Partindo de uma visão económica, um mercado será eficiente sem­

Sobre o conceito de risco sistémico e possíveis medidas que o sustenham, vide: Steven L.
Schwarcz, Systemic R isck, 97 Geo LJ, 2008,193-249; Iman Anabtawi e Steven L. Schwarcz, Regu­
latin g Systemic R isk: Towards an A n alytical Fram ew ork, 86 Notre Dame L Rev, 2011,1349-1412.
E hoje evidente que parte dos riscos sistéimcos incorridos advêm da proliferação destes
instrumentos, c£, Steven L. Schwarcz, R egulating Com plexity in F in an cial M arket, 87 Wash U L
Rev, 2009, 211- 268; Manuel A. Utset, Complex F in an cial Institutions and Systemic R isk, 45 Ga L
Rev, 2011, 779-839; Kathryn Judge, Fragm entation Nodes: A Study in F in an cial Innovation, Com­
p lexity and Systemic R isk, 64 Stan L Rev, 2012, 657-725; Dan Awrey, Com plexity, Innovation and
the Regulation o f M odem F in an cial M arkets, 2 Harv Bus L Rev, 2012,235-294.
Bumke, Reguliem ng am B eispiel der K apitalm ärkte, cit., 119.
pre que os preços dos produtos aí transacionados reflitam a informação
É
disponível a cada momento^^^. À luz desta conceção, torna-se possível,
pelo menos numa perspetiva abstrata, quantificar a eficiência dos mer­
cados: basta, para o efeito, comparar o valor das transações com o valor
resultante de uma análise objetiva à informação existente.
® Menezes Cordeiro, D ireito bancário, cit., 184 ss.
'tf
,Ȕ S57
Grunewald/Schlitt, E ifuhrung, cit., 2.
Fernando Araújo, D ireito da economia, cit., 286 ss.

242
243
..Ml
D IR E IT O DOS V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
Por muito correto, do ponto de vista económico, que este raciocínio
seja, é juridicamente insuficiente: a determinação da eficiência ou da não
eficiência do mercado corresponde a um mero dado estatístico, sendo
que ao Direito, mesmo admitindo que o resultado final não seja indi­
ferente, importa, primordialmente, atentar aos meios disponibilizados
para alcançar essa eficiência, ou seja, os regimes jurídicos positivados.
Tendo em vista uma sistematização do princípio da integridade do
mercado, enquanto função primordial do Direito mobiliário, a doutrina
alemã propõe, tradicionalmente, a seguinte divisão tripartida: (i) eficiên­
cia institucional; (ii) eficiência alocativa; e (iii) eficiência operacionaP^®.
II. A eficiência institucional respeita ao acesso ao mercado, tanto por
parte dos emitentes, como dos investidores. Pode, assim, ser apresentada
como o pressuposto-base da própria existência do mercado.
Não é concebível um mercado eficiente em que os emitentes não con­
sigam emitir valores mobiliários ou em que os putativos investidores não
tenham acesso a esses mesmos instrumentos.
A determinação da eficiência ou da não eficiência institucional do
mercado passa por uma simples e objetiva análise à quantidade de sujei­
tos emitentes e à liquidez dos valores mobiliários transacionados.
III. A eficiência alocativa assenta numa maximização do jogo da oferta
e da procura. Um mercado será eficiente quando, em cada momento, os
investidores sejam direcionados para os emitentes com maiores necessi­
dades de capital. De certo modo, a eficiência alocativa incorpora a razão
da própria existência dos mercados financeiros: a transferência do capital
poupado para a esfera jurídica dos empreendedores com liquidez insufi­
ciente para prosseguir as suas atividades económicas individualmente^®^.
A eficiência alocativa é duplamente benéfica: por um lado, permite
aos investidores apostarem em instrumentos mais propícios à valorização
558 Markus Lenenbach, K apitalm arktrecht und Börsenrecht, RWS, Colónia, 2002, 18 ss; Veil,
Rechtsentwicklung, cit., 24 ss; Nikolai Vokuhl, K apitalm arktrechtlicher Anlegerschutz und K ap i­
talerhaltung in der A ktiengesellschaft, Nomos, BerUm, 2007,179 ss; Christiane Wählers, P rivate
Selbstregulierung am B eispiel des K apitalm arktrechts: Vorteile, N achteil, Optimierung, V&R, Gotinga,
2011,77 ss.
Christoph Benicke, W ertpapierverm ögensverwaltung, Beck, Munique, 2006,75 ss.
244
§25,- INTRODUÇÃO
das suas poupanças e, por outro lado, possibilita a capitalização de novos
ou renovados projetos financeiros que de outra forma dificilmente iriam
passar de uma simples aspiração.
A opção de investimento irá assentar, em última análise, numa simples
comparação entre o risco de cada projeto e o retomo prometido: aquele
que se mostrar mais vantajoso irá granjear o apoio do mercado^°.
IV. Finalmente, por intermédio da eficiência operacional visa-se uma
diminuição dos custos associados a todo o processo, tanto do lado da
oferta como do lado da procura. O aumento dos custos desencadeia um
efeito dominó, encarecendo os bens transacionados e espoletando o risco
do investimento. Na prática, desincentiva a procura e dificulta a coloca­
ção dos bens nos termos pretendidos pelo emitente.
A eficiência operacional é alcançada, em teoria, através de uma redu­
ção dos custos de emissão dos instmmentos financeiros, em todas as suas
complexas variáveis, e de uma redução dos custos de investimento, quer
sejam custos diretos - caso paradigmático das comissões cobradas pelos
intermediários financeiros -, quer sejam custos indiretos - pense-se na
facilidade ou dificuldade em reunir informação fidedigna sobre um dado
instrumento ou emitente. A liquidez do mercado atua como um fator
decisivo na diminuição dos custos das operações®®!
102. A teoria do m ercado eficiente e a econom ia com portam ental
I. Partindo do pressuposto de que os valores dos bens transacionados
no mercado são diretamente determinados pela informação disponível,
parte da doutrina económica®®^, especialmente influenciada pelo estu-
Benicke, W ertpapierverm õgensverwaltung, cit., 76.
Zohan Goshen e Gideon Parchmovsky, On Insider Trading, M arkets and “N egative" Property
Rights in Inform ation, 87 Va L Rev, 2001,1229-1277,1244 ss.
As origens da teoria são ancestrais. Fama apenas lhe concedeu uma consistência econó­
mica e teórica até então não alcançada: Martin Sewell, H istory o f the Efficient M arket H ypothesis,
20 janeiro de 2011, Research Note UCL RN /11/04 (Net). Para um apanhado da evolução con­
temporânea, vide, Lawrence A. Cunningham, From Random W alks to Chaotic Crashes: The L inear
Genealogy o f the Efficient C ap ital M arket Hypothesis, 62 Geo Wash L Rev, 1994,546-608.
245
D IR E IT O DOS V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
dos de Eugene veio sustentar a.constante e perfeita eficiência
dos mercados. O raciocínio sufragado, de fácil compreensão, assenta na
seguinte ideia mestra: sendo a nova informação incorporada pelo mer­
cado assim que seja tomada pública, então os preços dos bens transacio­
nados irão refletir, em cada preciso momento, todos os dados conhecidos.
A lu ï desta premissa, concluem os defensores da construção, o mercado
só poderá ser descrito como intrinsecamente eficiente - eficient-market
hypothesi^^^.
A teoria de Fama reconhece a coexistência de três graus de eficiência:
(i) a eficiência fraca: o mercado apenas valoriza a evolução das cotações;
os investimentos são feitos com base no histórico dos valores mobiliá­
rios transacionados; (ii) a eficiência semi-forte: o mercado incorpora
toda a informação disponível; a opção por um determinado investimento
depende dos elementos públicos conhecidos; e (iii) a eficiência forte: o
mercado incorpora toda a informação pública e não-pública; neste cená­
rio, a informação dita privilegiada pode ser livremente utilizada pelos
investidores^®®. Excluída esta última dimensão, por manifesta contrarie­
dade em face da realidade vigente na maioria dos sistemas financeiros -
criminahzação do uso de informação privilegiada®®^ -, resta-nos a eficiên­
cia fraca e, em especial, a eficiência semi-forte. E com base nesta última
aceção que as análises económica e jurídica são usualmente desenvolvi­
das. Mesmo do ponto de vista económico, a denominada eficiência forte
levanta sérias dúvidas, na medida em que os preços não refletem essa
informação: apenas possibilitam aos detentores de especiais dados vencer
0 mercado^^.
Prémio Nobel da Economia, em 2013.
Fama abordou o tema na sua tese de doutoramento, no início da década de 60 do século
passado. Eugene F. Fama, Efficient C ap ital M arkets: A Review o f Theory and E m pirical W ork, 25 J
Finance, 1970, 383-417. O Autor retomou o tema em diversas ocasiões. Sublinha-se a impor­
tância do seguinte estudo, apresentado pelo próprio como uma revisão à sua teoria inaugural:
Efficient C ap ital M arkets: II, 46 J Finance, 1991, 1575-1617. Fama reconhece, sem repudiar a
construção, as críticas que lhe foram dirigidas e aperfeiçoa a construção.
Araújo, Introdução, cit., 286 ss.
^ Fama, Efficient C ap ital M arkets, cit., 383.
Ponto 109.
Joseph E. Finnerty, Insiders and M arket Efficiency, 31J Finance, 1976,1141-1148.
246
II. A suposta intrínseca correlação entre a informação pública e o com­
§ 2S." IN T R O D U Ç Ã O
1
portamento dos mercados (eficiência semi-forte) tem sido recentemente
objeto de fortes críticas. No núcleo desta contestação encontramos a
hehavioral economics e, mais especificamente, a behavioralfinanceff’^^. Esta
nova escola de pensamento®^® estuda o impacto de fatores sociais, psico­
lógicos ou emotivos nos comportamentos económicos. Na sua essência,
o ramo da economia comportamental coloca-se nos antípodas na escola
de Fama. Para os defensores da eficiência intrínseca do mercado, a análise
do comportamento dos investidores assenta em pressupostos puramente
racionais. Já para a escola comportamental, a irracionalidade, enquanto
característica indissociável do ser humano, é necessariamente extensível
ao funcionamento dos mercados financeiros.
A irracionalidade dos mercados, sem conotações pejorativas, reflete-
-se, por exemplo®^^:
- Na excessiva confiança na evolução dos títulos adquiridos, por parte
de cada investidor individualmente (endowment effectsy^'^;
Andrei Shleifer, Inefficient M arkets: A n Introduction to B ehavioral Finance, OUP, Oxford, 2000
(viii + 216 pp); Robert J. Shiller, From Efficient M arkets Theory to B ehavioral Finance, 17 J Econ
Perspect, 2003, 83-104; Burton G. Malkiel, The Efficient M arket H ypothesis and Its C ritics, 17
J Econ Perspect, 2003, 59-82. Os defensores da eficiência intrínseca do mercado, embora
reconhecendo a pertinência das críticas, têm-se mostrado reticentes em abandonar a cons­
trução: Eugene F. Fama, M arket Efficiency, Long-Term Returns, and B ehavioral Finance, 49 JFE,
1998, 283-306: numa perspetiva a longo prazo, o mercado acaba por compensar os desvios
não sustentados na informação disponível.
As suas origens são usualmente remetidas para os estudos inaugurais de Daniel Kahneman
e Amos Tversky, Prospect Theory: A n A nalysis o f Decision under R isk, 47 Econométrica, 1979,263-
-292, posteriormente aprofundados em Amos Tversky e Daniel Kahneman, Advances in Pros­
pect Theory: C um ulative Representation o f U ncertainty, 5 J Risk Uncertainty, 1992, 297-323. Para
um apanhado sucinto dos diversos contributos: Joshua D. Wright e Douglas H. Ginsburg,
B ehavioral L aw and Economics: Its O rigins, F atal F law s, and Im plications fo r Liberty, 106 Nw U L
Rev, 2012,1033-1088,1036 ss.
Nicholas Barberis e Richard Thaler, A Survey o f B ehavioral Finance em H andbook o f the Eco­
nomics o f Finance, Vol. LA: Corporate Finance, coordenação de George M. Constantinides, Mil-
ton Harris e René M. Stulz, Elsevier, Amesterdão, 2003,1052-1121,1063 ss: apanhado mais
completo; Wright/Ginsburg, B ehavioral L aw , cit., 1041 ss.
A ideia de que os sujeitos atribuem aos seus bens um valor superior ao valor de mercado
foi demonstrada nos estudos pioneiros de Jack L. Knetsch e J. A. Sinden, W illingness to P ay and
Compensation Demanded: Experim ental Evidence o f an Unexpected D isparity in M easures o f Value, 99
Q J Econ, 1984,507-521. O tema foi retomado com idênticos resultados pelo P ai fundador da
247
D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
- Na valorização não fundamentada dos conhecimentos detidos, indi­
vidualmente, por cada investidor^^^;
- Na opção por diferentes soluções, quando confrontado com cená­
rios idênticos (framing effectsY^'^;
- Na tendência para procurar lucros a curto prazo, desconsiderando
as consequências futuras (hyperbolic discountingY^^;
- Num otimismo não fundamentado: indissociável da natureza
humana, os investidores estão normalmente convencidos de que o
futuro lhes é especialmente promissor (pptimism biasy^^;
- Na tendência para interpretar os dados disponíveis à luz de uma
posição predeterminada (confirmation biasy^;
- Na dificuldade em alterar as orientações iniciais (beliefperseveranceY’^;
- Na dificuldade em rever suficientemente a posição inicialmente
assumida (anchoringY^^;
- Nas tomadas de decisão motivadas por simples preferências subje­
tivas, p.ex.: um gosto especial em adquirir títulos associados a uma
marca.
A estes fatores de ordem psicológica interna cumpre acrescentar
outros elementos sociológicos, com igual impacto nos mercados finan-
B ehavioral Economics: Daniel Kahneman, Jack L. Knetsch e Richard H. Thaler, A nom alies: The
Endowm ent Effect, Loss Aversion, A nd Status Quo B ias, J Econ Perspect, 1991,193-206.
Neil D. Weinstein, U nrealistic O ptimism A bout Future L ife Events, 39 J Pers Soc Psychol, 1980,
806-820.
Kahneman/Tversky, Prospect Theory, cit., 277-279; Erich Kirchler, Boris Maciejovsky e Mar­
tin Weber, Fram ing Effects, Selective Inform ation and M arket Behavior: A n E xperim ental A nalysis,
fevereiro 2004 (Net).
David Laibson, Golden Eggs and H yperbolic D iscounting, 112 Q J Econ, 1997,443-478: estudo
clássico sobre a matéria.
Weinstein, U nrealistic Optimism, cit.
April Kein, A D irect Test o f the Cognitive B ias Theory o f Share Price Reversals, 13 J Account
Econ, 1990,155-166.
Amos Tversky e Daniel Kahneman, Judgm ent Under U ncertainty H euristics and Biases em
R atio n ality in A ction: Contemporary Approaches, coordenação de Paul K. Moser, CUP, Cam­
bridge, 1990,171 ss: texto inicialmente pubhcado na revista Science, n.°1985, de 1974,1124-
-1131. Charles G. Lord, Lee Ross e Mark Re Lepper, B iased A ssim ilation and A ttitude P olariza­
tion: The Effects o f P rior Theories on Subsequently Considered Evidence, 37 J Pers Soc Psychol, 1979,
2098-2109.
Barberis/Thaler, A Survey, cit., 1066.
248
§ 2 5 .” IN T R O D U Ç Ã O
ceiros e nas cotações dos títulos transacionados e que, na maioria dos
casos, surgem associados a uma classe muito específica de investidores:
a dos especuladores. A atuação dos especuladores, raramente interessa­
dos no sucesso a longo prazo das empreáas em que investem - buscam
o lucro rápido -, afeta as cotações do mercado de forma imprevisível e
pouco consentânea com a conceção que correlaciona a informação com a
evolução do mercado^®“.
III. O comportamento humano nem sempre é racional, pelo que difi­
cilmente se pode esperar que um mercado que resulta de incontáveis
decisões humanas possa ser intrinsecamente eficiente. Acresce ser hoje
pacificamente aceite que um ambiente de grupo afeta diretamente o
comportamento humano individual de forma imprevisível e inesperada.
No universo dos mercados de capitais, as bolhas especulativas fazem a
balança pender nesse sentido. Nem se diga que o facto de todas as bolhas
acabarem por rebentar consubstancia uma evidência da eficiência a
longo prazo do mercado: a tese não é o mercado acabará por ser eficiente, mas
0 mercado ésempre eficiente.
Outros comportamentos típicos dos mercados, dificilmente explicá­
veis à luz da teoria de Fama, encontram, na irracionalidade humana, uma
resposta mais clarividente^^^:
- Diversificação insuficiente: apesar da globahzação dos mercados, os
investidores demonstram uma tendência para apostar nas empresas
do seu país^®^;
Vejam-se os estudos inaugurais de J. Bradford De Long, Andrei Shlerfer, Lawrence H.
Summers e Robert J. Waldmann, Noise Trader R isk in F in an cial M arkets, 98 J Poht Econ, 1990,
703-738.
Barberis/Thaler, A Survey, cit., 1099 ss.
Joshua D. Coval e Tobias J. Moskowitz, Home B ias a t Home: L ocal E quity Preference in Domestic
P o rfo lio s, 54 J Finance, 1999, 2045-2073; Alan G. Aheame, Wilham L. Griever e Francis E.
Wamock, Inform ation Costs and Home B ias: A n A nalysis o f US H oldings o f Foreign Equities, 62 J
Int’l Econ, 2004, 313-336: a tendência para investir localmente está muitas vezes associada a
entraves ao investimento externo e à inexistência de informação suficiente.
249
 D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S

§ 25." IN T R O D U Ç Ã O

- Diversificação ingénua: a repartição é usualmente feita de forma

II. Confrontado com questão análoga, o Professor Menezes Cordeiro
meramente aritmética, pelas diferentes possibilidades de investi­
veio defender que a funcionalização do Direito bancário traduz-se no
mento, sem atender ao risco inerente a cada um dos investimentos^®^.
prosseguimento de crescimento económico efetivo®®®.
- Transações excessivas: os dados empíricos demonstram que a solu­
O mesmo raciocínio pode ser transposto para o nosso Direito dos valo­
ção mais racional aponta para uma consolidação temporal dos inves­
res mobiliários. Certamente que não se julga possível excluir a irracio­
timentos efetuados (carteiras passivas), decisão que permite ainda
nalidade dos mercados. Contudo, esta falta de racionalidade pode sem­
reduzir custos com as comissões cobradas pelos intermediários
financeiros^®^; pre ser minorada através da imposição de deveres de informação mais
estritos e de um controlo mais rigoroso. O sucesso destas soluções tra­
- Decisões de compra e de venda infundadas: a decisão de com­
dicionais é, à partida, limitado: a falta de eficiência do mercado decorre,
prar ou vender valores mobiliários raramente assenta em critérios
em última análise, de comportamentos irracionais do ser humano, que
objetivos e fundados; padecendo das condicionantes psicológicas
apenas podem ser combatidos através da formação dos investidores®®^
sociais e emotivas exploradas pela economia comportamental acima
identificadas®®®.

104. A proteção dos investidores

103. A fiincionalização substantiva do D ireito dos valores m obiliários

I. Do ponto de vista jurídico, o reconhecimento da irracionalidade dos
mercados e do comportamento dos investidores abre uma nova frente
na problemática da fimcionalização do Direito dos valores mobiliários- o
sistema basta-se com a simples procura da eficiência do mercado, através
do fornecimento dos elementos julgados necessários à prossecução da
eficiencia do mercado ou exige resultados efetivos? Na prática, a ideia de
funcionalização traduz-se - recorrendo a conceitos jurídicos algo deslo­
cados mas elucidativos do problema - numa obrigação de meios ou numa
obngaçao de resultados? Esta questão parece não ser levantada quando
atendemos ao segundo pilar da funcionalização - a proteção da posição
dos investidores -, na medida em que o que se busca só poderá ser uma
efetiva proteção.
Shlomo Benartzi, Excessive E xtrapolation and the A llocation o f 401(k) Accounts to Company
5iocfa, 56 J Finance, 2001,1747-1764.
Brad M. Barber e Terrance Odean, Trading is H azardous to Your W ealth: The Common Stock
investm ent Perform ance o f Ind ivid u al Investors, 55 J Finance, 2000, 773-806.
Barberis/Thaler, A Survey, cit., 1102.
2S0
I. Ao lado da eficiência do mercado, enquanto função última do
Direito dos valores mobiharios, surge a proteção dos investidores®®®.
Curiosamente, parte importante da doutrina tende a subalternizar o
segundo pilar®®®. Esta conceção assenta no pressuposto de que a proteção
dos investidores é alcançada indiretamente, por intermédio da eficiência
do mercado. Em termos mais lineares: a proteção da posição dos investi­
dores afeta, de forma direta e proporcional, a eficiência do mercado.
Este raciocínio, para além de assentar num simples jogo de lógica que
tende a desvirtuar o dinamismo do Direito, desvaloriza o papel nuclear
que a proteção dos investidores assume na determinação da eficiência ou
D ireito bancário, cit., 185.
Ponto 105.
José Nunes Pereira, O novo Código dos Valores M obiliários e a protecção dos investidores, 1 Cad-
MVM, 2000, 76-87: sublinha a importância da proteção dos investidores no Direito dos valo­
res mobiliários e na relevância atribuída a este aspeto na elaboração do Código dos Valores
Mobiliários. Vide, ainda: António Cunha Reis, A protecção dos investidoresface ao Código de Valores
M obiliários, 11 CadMVM, 2001.
’ Matthias Schüppen, Überblick: G rundlagen des Börsenrechts em Schüppen/Schaub M ünchener
Anw altshandbuch Aktienrecht, 2 l ed., Beck, Munique, 2010: o objetivo primário do Direito (do
mercado) dos valores mobiliários consiste em garantir a eficiência do mercado, em benefício
da economia e do púbUco em geral. A proteção individual é um reflexo da proteção concedida
ao mercado.

251
 D IR E IT O DOS V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
da não eficiência dos mercados. Trata-se de funções concomitantes, cuja
prossecução apenas pode ser alcançada conjuntamente55°.
II. Não é benéfico, quer do ponto de vista sistemático, quer do ponto
de vista prático, resumir ou centrar a dimensão funcional do Direito dos
valores mobiliários no mercado, secundarizando a proteção devida aos
investidores. Para além das observações já proferidas, importa referir que
o enfoque no conceito impreciso e abstrato de “mercado” promove a des-
personalização do Direito, com todas as consequências gravosas que lhe
estão associadas.
Os mercados que acautelem a posição jurídica dos investidores são,
naturalmente, mercados eficientes, com grande liquidez, com sociedades
bem geridas e equilibradas - do ponto de vista dos diversos interesses em
questão^®^
105. A educação dos investidores
I. Os temas da educação dos investidores e da Hteracia financeira têm
despertado um interesse crescente junto da doutrina especializada das
mais variadas Ciências Humanas e Sociais.
O espoletar desta curiosidade pode ser explicado se atendermos ao
impacto benéfico que uma melhoria de ambas as realidades pode repre­
sentar na qualidade de vida das populações, em todas as camadas demo­
gráficas: uma melhor instrução dos meandros dos mercados financeiros
permite enfrentar a saída do mercado de trabalho e a entrada na reforma
com maior otimismo e confiança^^^, ao mesmo tempo que estimula o
empreendedorismo nas camadas mais jovens^^^. No geral, o combate à
Hopt, D er K apitalanlegerschutz im Recht der Banken, cit., 52; Bumke, Regulierung am Beispiel
der K apitalm ärkte, cit., 119.
Rafael La Porta, Florencio Lopez-de-Silanes, Andrei Shleifer, Robert Vishny, Investor Pro­
tection and Corporate Governance, 58 JFE, 2000, 3-27.
Armamaria Lusardi e Obvia S. MitcheUi, F in an cial L iteracy and Retirem ent Preparedness: E vi­
dence and Im plicationsfo r F in an cial Education, 42 Bus Econ, 2007,35-44.
O impacto é especialmente notado em países ditos emergentes ou que passaram por com­
plexas situações ou conflitos internos: M riam Bruhn e Bilal Zia, Stim ulating M anagerial C apital
252
iliteracia financeira contribuiu, de forma significativa, para o progresso
social e económico^^^.
§ 2S.» IN T R O D U Ç Ã O
1
As vantagens da educação financeira foram certeiramente identifica­
das por Ben Bemanke, então Presidente da Reserva Federal Amerícana^^^:
Well-informed consumers, who can serve as their own advocates, are one
of the best lines o f defense against the proliferation o f financial products and
services that are unsuitable, unnecessarily costly, or abusive.
No fundo, um mercado composto por investidores conhecedores será
necessariamente mais eficiente.
A educação dos investidores, com as vantagens individuais - melhor
preparação para atuar nos mercados financeiros - e sociais - favoreci-
mento da eficiência do mercado - que se üie reconhece, surge, em certa
medida, sustentado na parte final do artigo 101.° da CRP: “O sistema
financeiro é estruturado por lei, de modo a garantir . . . a aphcação dos
meios financeiros necessários ao desenvolvimento económico e social”^®^.
O combate à üiteracia financeira ergue-se, assim, como uma missão do
sistema financeiro, enquanto um todo.
II. Por educação financeira temos em vista um projeto amplo, que
vá para além de uma simples explicação sobre os conceitos financeiros-
-base ou sobre o funcionamento do mercado. A instrução terá, neces­
sariamente, que assumir contornos transversais, tanto na perspetiva das
matérias abrangidas como das entidades envolvidas. Importa primeiro
exphcar a relevância da poupança e só depois entrar nos aspetos mais
específicos dos mercados. A iniciativa deve partir das entidades gover-
in Em erging M arkets: The Im pact o f Business and F in an cial Literacy fo r Young Entrepreneurs, World
Bank, Research Working paper 5642, abril de 2011.
Annamaria Lusardi e Olivia S. Mitchell, The Economic Im portance o f F in an cial Literacy: Theory
and Evidence, 52 JEL, 2013,5-44, 37.
Statem ent o f the C hairm an o f the Board o f Governors o f the Federal Reserve System a t a hearing
conducted by the Subcommittee on Oversight o f Government M anagem ent, the Federal Workforce, and
the D istrict o f Colum bia o f the Committee on H om eland Security and G overnm ental A ffairs, apud.
Lusardi/Mitchell, The Economic Im portance, cit., 37.
Ponto 57. r:,
253
 D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
'■"1
§ 2 5 .” IN T R O D U Ç Ã O

namentais e do próprio mercado (sistema financeiro), mas também das

A razão principal para este volteface é facilmente compreensível: uma
famílias^^^ e das instituições de ensino^^®.
maior instrução contribui, não raramente, para uma sensação de falso
o ensino não deve, em caso algum, circunscrever-se aos meandros
domínio da matéria e que culmina na tomada de decisões potenciahnente
financeiros, no sentido mais técnico do termo.
desastrosas. A complexidade dos mercados financeiros, do seu funciona­
A instrução jurídica assume um papel determinante e decisivo no
mento e dos bens aí transacionados exige, para o seu efetivo controlo,
combate às fraudes financeiras, especialmente prejudiciais para as cama­
um nível de conhecimento que extravasa largamente os resultados que
das mais idosas da nossa comunidade^®®.
reahsticamente se possam esperar de uma campanha de educação deste
tipo. Outros elementos podem contribuir para esta realidade; por exem­
in. Se, em abstrato, a ideia da instrução dos investidores se apresenta plo, os investidores mais instruídos têm, em regra, maiores possibihdades
particularmente aliciante, a realidade mostra-nos que melhores conhe­
económicas e de investimento; e a procura de conhecimentos é usual­
cimentos não se traduzem, inevitavelmente, em investimentos mais
mente acompanhada por um interesse especial em investir nos mercados
intehgentes ou especialmente proveitosos. Vejamos dois interessantes de capitais.
estudos®°°.
O problema da educação das populações sobre as realidades finan­
Partindo de uma amostra de (apenas) 79 alunos, em que 39 haviam
ceiras reside, essencialmente, no conteúdo e no modo como a instrução
frequentado um curso semestral de gestão de finanças pessoais e 40 não
é prestada®®^. Assim, e voltando ao conteúdo da instrução, este terá de
0 haviam feito, os investigadores concluíram, à luz dos dados recolhidos,
focar-se não tanto no funcionamento do mercado ou nas vantagens da
pela irrelevância da firequência do curso na tomada de decisões de gestão
capitahzação das poupanças, mas nos riscos incorridos e na complexi­
financeira pessoal, nomeadamente, de decisões de investimento®®^
dade que caracteriza o sector. O papel desempenhado pelos intermediá­
Num outro estudo, realizado em 2003 e com um universo particu­
rios financeiros, os deveres que os adstringem e os meios de proteção
larmente mais vasto, os seus Autores pretendiam estudar o impacto de
colocados ao dispor dos investidores para acautelar a sua posição e os
um prolongado aconselhamento financeiro, prestado ao longo de um
seus interesses são elementos fulcrais e que apontam no sentido de uma
período de 18 meses, na tomada de decisões de investimento. Os resul­
efetiva preparação da população®®'^.
tados recolhidos apontam, também aqui, para uma irrelevância material
Paralelamente, o melhoramento da literacia financeira deve sempre
deste incremento de conhecimentos®®^
ser acompanhado de outras medidas estruturais, sob pena de os resulta­
dos alcançados ficarem muito aquém do desejado®®®.

Bryce L. Jorgensen e Jyotu Savla, F in an cial L iteracy o f Young A dults: The Im portance o f P arental IV. Embora se reconheça que a sociedade, enquanto um todo, deve
Socialization, 59 Fam Relat, 2010, 465-478.
James A. Fanto, We re A ll C apitalists N ow: The Im portance, N ature, Provision and Regulation o f
contribuir para a educação das populações, independentemente do
Investor Education, 49 Case W Res L Rev, 1998,105-180.
Jayne W. Barnard, Deception, Decisions, and Investor Education, 17 Elder LJ, 2009, 201-237.
Sandra J. Huston, M easuring F in an cial Literacy, 44 J Consum Aff, 2010, 296-316: importa
Para urn apanhado geral dos estudos realizados e das conclusões alcançadas: J. Michael
esclarecer o que se entende por iliteracia financeira e que tipo de conhecimentos se pretende
Collins e Colhn M. O’Rourke, F in an cial Education and Counseling - S till H olding Prom ise, 44 J
melhorar.
Consum AíF, 2010, 483-498.
Riccardo Calcagno e Chiara Monticone, F in an cial L iteracy and the D em and fo r F in an cial
Lewis Mandell e Linda Schmid Klein, The Im pact o f F in an cial Literacy Education on Subse­
Advice, 50 J Bank Finance, 2015,363-380: a procura por aconselhamento profissional é direta­
quent F in an cial Behavior, 20 JFCP, 2009,15-24.
mente proporcional ao grau de literacia financeira detida pelos investidores.
Jinhee Kim, E. Thomas Carman e Benoit Sorhaindo, R elationships A m ong C redit Counsel­
Lauren W. Willis, Evidence and Ideology in Assessing the Effectiveness o f F in an cial Literacy Edu-
ing C lients’ F in an cial W ellbeing, F in an cial Behaviors, F in an cial Stressor Events, and H ealth 14 JFCP,
2003,75-87. L Rev, 2009, 415-458, 456; Lusardi/Mitchell, The Economic Importance,

2S4
255
D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
sector em causa, cabe às entidades públicas liderar movimentos desta
natureza. No âmbito do Direito dos valores mobiliários, esse papel cabe,
inquestionavelmente, aos supervisores.
Entre nós, esta função é assumida pela CMVM. A responsabilidade do
nosso supervisor é, de resto, reconhecida nos seus Estatutos. Atente-se
ao disposto no artigo 4.°/2:
São atribuições da CMVM:
c) Contribuir para o desenvolvimento dos mercados financeiros;
d) Prestar informação e apoio aos investidores não qualificados.
E ao incontestável artigo 5.°:
Na prossecução das atribuições de contribuição para o desenvol­
vimento dos mercados financeiros, a CMVM deve, designadamente,
a) Difundir e fomentar o conhecimento dos mercados e das nor­
mas legais e regulamentares aplicáveis;
b) Desenvolver, incentivar ou patrocinar, por si ou em colaboração
com outras entidades, estudos, inquéritos, pubhcações, ações de for­
mação e outras iniciativas semelhantes.
Para além da CMVM, e sublinhando, uma vez mais, a partilha de res­
ponsabilidades por entre todos os sujeitos mobiliários, não podemos dei­
xar de fazer referência às Associações de Defesa dos Investidores, cuja
existência não pode resumir-se à simples, conquanto necessária, prote­
ção dos interesses dos seus associados^“®.
106. A insuficiência da conceção e a sugestão de um a nova abordagem
I. A visão clássica, especialmente desenvolvida pela doutrina germâ­
nica, que atribui duas grandes funções ao Direito dos valores mobiliários
- a proteção dos investidores e a eficiência do mercado - apresenta-se
excessivamente formal e, consequentemente, de pouca utihdade real.
5Artigo 32.°e Decreto-Lei n.°294/2003, de 21 de novembro.
256
§ 2 5 .” IN T R O D U Ç Ã O
tanto numa perspetiva legislativa como numa perspetiva dogmática. O
que tom a o mercado eficiente? E como melhor pode acautelar-se a posi­
ção dos investidores? Uma resposta a ambas as perguntas só pode ser
alcançada através do preenchimento substantivo da dimensão fimciona-
lizadora do Direito mobiliário.
Assim, não nos parece correto apresentar-se a Hvre concorrência, a
igualdade de participação de sujeitos (emitentes ou investidores) ou a
transparência do mercado como princípios subordinados a esta dupla
função®“^ E precisamente o oposto: sem princípios substantivos, a con­
ceção dicotômica toma-se de impossível aplicação.
Mesmo no campo da interpretação jurídica, em que o elemento fun­
cional assume maior preponderância®“®, o seu interesse tende a circuns­
crever-se à proteção dos investidores: confrontado com um preceito de
conteúdo impreciso, o intérprete-aplicador deve assumir a solução que
melhor acautele a posição jurídica desses sujeitos. No campo da eficiên­
cia do mercado, a abstração que lhe subjaz tom a impossível a assunção de
uma posição interpretativa sem mais.
Não se pretende retirar a centralidade da proteção dos investidores e
da eficiência do mercado, apenas se contesta, em face da excessiva abs­
tração que ambos os conceitos condensam, a sua utilidade no desenvolvi­
mento sistemático, no sentido mais puro do termo, do Direito dos valores
mobiliários.
II. Tendo em vista a dogmatização do Direito dos valores mobiliários
e atendendo ao conteúdo do ramo jurídico, dos seus propósitos e das
suas funções, propomos uma sistematização da matéria focada em dois
grandes princípios, necessariamente sustentados em normas e institutos
mobüiários: (i) a integridade; e (ü) a transparência.
O recurso a estes dois alicerces permite sustentar uma unidade interna
que, de outra forma, não seria alcançável: a criminalização do uso de
informação privilegiada ou da manipulação do mercado podem ser apre­
sentadas como decorrências diretas do princípio da iategridade do mer­
cado; enquanto a disponibüização de informação clara, precisa e de forma
atempada consubstancia uma exigência do princípio da transparência. A
Bumke, Regulierung am Beispiel der K apitalm ärkte, cit., 119.
§24.°.
 D IR E IT O DOS V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
§ 25." IN T R O D U Ç Ã O

recondução das diversas concretizações a cada um dos princípios-base
não é absoluta: a tipificação penal do uso de informação privilegiada e da
manipulação do mercados tem a marca da transparência, sendo o inverso
igualmente correto: os deveres de informação são igualmente moldados
pelo princípio da integridade.
Partindo desta visão sistematizadora, devedora do pensamento savyg-
niano, tanto os princípios estruturantes como os regimes, os preceitos e
os conceitos se influenciam reciprocamente, num constante e incansável
progresso que tão bem caracteriza a evolução do Direito e da Ciência
Jurídica.

III. Como temos vindo a sublinhar, quer a proteção dos investidores e

a eficiência do mercado - numa perspetiva formal -, quer a transparência
e a integridade - numa perspetiva substantiva - são igualmente prosse­
guidas e acauteladas no seio das relações privadas. Relembre-se o acima
transcrito artigo 304.°/!:

Os intermediários financeiros devem orientar a sua atividade no

sentido da proteção dos legítimos interesses dos seus clientes e da efi­
ciência do mercado.

A atividade a que o preceito se refere é a de intermediação, em todas

as suas vertentes; incluindo, evidentemente, a gestão de carteiras e o
aconselhamento profissional. A posição jurídica do intermediário, em
especial a densificação dos seus deveres em concreto, é devedora da fun-
cionalização do Direito dos valores mobihários.
A ideia de que a atividade dos intermediários financeiros é influen­
ciada por esta dupla vertente substantiva: a transparência e a integridade
do mercado - sem descurar o elemento mais importante: os interesses
dos clientes que em concreto consigo contratarem —é extensível a uma
outra categoria de sujeitos privados: a dos gatekeepers, e da qual fazem
parte as agências de notação financeira e os auditores externos.

IV. À luz do que ora se escreveu, propomos uma diferente dogmati-

zação do Direito dos valores mobiliários. Por um lado, assente em dois
grandes princípios substantivos: a transparência e a integridade, que sus­
tentam e densificam as mais distintas manifestações mobiliárias e os seus
regimes, institutos e conceitos. Por outro lado, ela postula a valorização
do papel desempenhado pelas relações privadas no correto funciona­
mento dos mercados e no desenvolvimento do Direito dos valores mobi­
liários. Finalmente, também a atividade de supervisão da CMVM surge
devedora desta funcionalização substantiva do Direito mobihário.

2S8
259

§26.0 A INTEGRIDADE
107.0 princípio da integridade e os desafios futuros
I. A integridade do mercado surge intimamente associada aos prin­
cípios da igualdade de oportunidades e da livre concorrência. Numa
perspetiva mais prática, um mercado será íntegro se os seus participantes
tiverem acesso às mesmas oportunidades de negócios e ao mesmo nível
de informação.
Nessa medida, a integridade aproxima-se, inevitavelmente, da trans­
parência®®^. Contudo, as preocupações subjacentes a cada um dos dois
institutos são distintas: em termos genéricos, mas esclarecedoras, a trans­
parência respeita à divulgação de informação e a integridade ao nivela­
mento substantivo da informação que pode ou não ser utilizada. Pode­
mos assim afirmar que a transparência assume uma forte dimensão ativa,
impondo, essencialmente, obrigações de facere, e a integridade assume
uma dimensão passiva, proibindo determinadas condutas: obrigações de
non facere^^°.
Moredo Santos, Transparência, cit., 59-60: atribuindo especial ênfase a esta ligação umbi­
lical, sem transparência e sem o cumprimento das obrigações de divulgação de informação,
o mercado não será certamente íntegro. A integridade do mercado depende da integridade
dos seus participantes.
Em geral, António Menezes Cordeiro, Tratado de D ireito civil, VI, 2.“ ed., Almedina Coim­
bra, 2012, 489 ss.
260
§ 2 6 .“ A IN T E G R ID A D E
1
II. Enquanto princípio substantivo estruturante do Direito dos valo­
res mobiliários, a integridade concretiza-se numa série de institutos e
regimes, com especial destaque para os denominados crimes de mer­
cado: abuso de informação privilegiada e manipulação do mercado.
É, no entanto, redutor circunscrever o princípio da integridade aos
artigos 378.° e 379.° do Código dos Valores Mobiliários. Às suas mais
reconhecidas concretizações, cumpre acrescentar parte importante do
Direito mobiliário contraordenacional, bem como a possibilidade de
interposição de ações de responsabilidade civil, intrinsecamente associa­
das ao desrespeito do princípio da integridade.
III. Os mercados financeiros enfrentam sérios desafios futuros, em
decorrência do rápido processo de computorização que tende a afetar,
sem exceção, todas as atividades humanas. No âmbito mais concreto do
princípio da integridade, o destaque natural vai para a negociação de alta
frequência (high-frequency trading - HFT). Em termos genéricos, a HFT
agrega um conjunto de mecanismos tecnológicos sofisticados, apoiados
em complexos algoritmos que agfiizam o processo de negociação, desde
a tomada de decisão à receção das ordens de compra e de venda, que,
em muitos casos, contabilizam-se em não mais de algumas frações de
segundos®^!
Com os avanços tecnológicos da década de 80 do século passado, os
mercados financeiros foram confrontados com novos mecanismos de
transação, mais rápidos, precisos e baratos - o que permitiu reduzir os
custos de transação e de intermediação de forma considerável®^^. As van­
tagens da nova tecnologia foram reconhecidas pela SEC, em 1998, ao
introduzir importantes reformas estruturantes - de entre as quais se des­
taca a Regulation o f Alternative Trading System -, no sentido de promover
plataformas de negociação alternativas ao modelo tradicional®^®.
Michael J. McGowan, The Rise o f Computerized H i^h Frequency Trading: Use and Controversy,
Duke L & Tech Rev, 2010,16: apanhado geral do tema e dos problemas levantados.
Tom C. W. Lin, The New F in an cial Industry, 65 Ala L Rev, 2014, 567-623,572 ss: breve rese­
nha histórica.
Alexis L. Collins, Regulation o f A lternative Trading Systems: E volving Regulatory M odels and
Prospects fo r Increased Regulatory Coordination and Convergence, 33 Law Pol’y Int’l Bus, 2002,
481-506.
261

D IR E IT O DOS V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
A revolução operada através da introdução desta nova tecnologia foi
posta em evidência com o Flash Crash de 2010: no dia 6 de maio de 2010
os mais reconhecidos índices dos Estados Unidos da América desceram
cerca de 9%, voltando a subir, pouco minutos volvidos, para valores pró­
ximos, com avultadas perdas ao longo do processo. Este acontecimento
impôs a tomada de decisões legislativas e de supervisão®^^.
rV. Para além dos evidentes problemas jurídicos que levanta, com des­
taque para o crime de manipulação®^^, a negociação de alta frequência
desequilibra o mercado, pondo em causa a sua integridade e os princípios
da livre concorrência e da igualdade de oportunidades®^®.
Certamente que os mercados financeiros e o próprio Direito dos valo­
res mobiliários não podem nem devem combater o progresso das novas
tecnologias: as desvantagens de uma semelhante posição afetariam todos
os sujeitos mobiliários, o mercado, enquanto um todo, e o próprio desen­
volvimento económico e social das comunidades em que se insiram. Mas
o reconhecimento da importância da HFT não significa que esta não deva
ser regulamentada: é imperativo fornecer a todos os investidores as mes­
mas oportunidades de negócio.
Receia-se, contudo, que a rapidez na transmissão de ordens impeça
uma regulação totalmente consentânea com o princípio da integridade
do mercado.
Austin J. Sandler, The Invisible Pow er o fM achines: R evisiting the Proposed Flash Order B an in the
Wake o f the F lash Crash, Duke L & Rech Rev, 2011, 39-56; Andrew J. Keller, Robocops: R egulat­
ing H igh Frequency Trading A fter the F lash Crash o f2010, 73 Ohio St LJ, 2012,1457-1483; Edgar
Ortega Barrales, Lessons from the Flash Crash fo r the R egulation o f High-Frequency Traders, 17
Fordham J Corp & Fin L, 2012,1195-1262.
Tara Bhupathi, Technology’s L atest M arket M anipulator? H igh Frequency Trading: The Strategies,
Tools, R isks, and Responses, 11NC J L & Tech, 2010, 377-400; Alyse L. Gould, R egulating H igh-
-Frequency Trading: M an v. M achine, 12 J High Tech L, 2011,273-329; Nathan D. Brown, The Rise
o f H igh Frequency Trading: The R ole A lgorithm s, and the L ack o f Regulations, P lay in Today’s Stock
M arket, 11 Appalachian J L, 2012, 210-230.
James J. Angel e Douglas McCabe, Fairness in F in an cial M arkets: The Case o f H igh Frequency
Trading, 112 J Bus Ethics, 2013,585-595: para os Autores, o problema não reside propriamente
no uso desta tecnologia, mas no modo como é utilizada.
262
'n
§ 2 6 ." A IN T E G R ID A D E
108. M anipulação do m ercado
I. O crime de manipulação do mercado consubstancia, a par do crime
de abuso de informação privilegiada, uma manifestação evidente do
princípio da integridade. Mas o tipo penal manipulação do mercado cor­
responde apenas à face mais visível do instituto manipulação do mercado,
sem o esgotar. Noutra perspetiva: o tipo penal previsto no artigo 379.°do
Código dos Valores Mobiliários representa tão-só uma parte, conquanto
muito relevante, do instituto da manipulação do mercado. Nem todas as
manipulações do mercado estão sujeitas a tutela penal, mas não deixam,
em si mesmas de consubstanciar uma manipulação em sentido amplo,
podendo acarretar consequências de índole civil ou contraordenacional.
II. Previsto no artigo 379.°, o crime de manipulação do mercado sus­
tenta-se em três elementos nucleares®^^: (i) a prática de um dos factos
descritos; (ii) a sua idoneidade para alterar artificialmente o mercado; e
(iii) uma atuação dolosa - aphca-se a regra geral prevista no artigo I3.°
do CP®!^
O legislador indica, no número 1 do artigo 379.°, as condutas passíveis
de serem criminalizadas:
- A divulgação de informações falsas, incompletas, exageradas ou ten­
denciosas - p. ex.: eventuais lançamentos de OPAs®^®;
- A realização de operações de natureza fictícia - p. ex.: simulação de
operações mobiliárias®^®;
- A execução de outras práticas fraudulentas - p. ex.: ordens dadas
com identidades falsas®^’^.
Costa Pinto, O novo regime, cit., 83; Rute Martins Santos, E stabilização depreços e m anipulação
de mercado: o sindrome da ilh a, 4 DVM, 2003, 395-435; Cláudia Verdial Pina, Crime de m anipu­
lação do mercado: elementos típicos e recolha de prova, 17 Julgar, 2012, 35-66; Gonçalo S. de Melo
Bandeira, Abuso de inform ação, m anipulação do mercado e responsabilidade p en al das “pessoas colec-
tivas”: “tipos cum ulativos” e bensjurídicos colectivos na “globalização”, Juruá, Lisboa, 2015, 479 ss.
Só é punível o facto praticado com dolo, ou nos casos especialmente previstos na lei, com
^sgligência”, o que em concreto não se verifica.
RLx 16-dez.-2009 (Fernando Estrela), proc. n.°S523/07.8TFLSB.L1: dado como exemplo.
RLx 29-jun.-2007, proc. n.» 12421/01.7(A)TDLSB, CMVM.
RLx 29-jun.-2007, proc. n.» 12421/01.7(A)TDLSB, CMVM.
263
D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
desde que idóneas para alterar artificialmente o regular fimciona-
mento do mercado. O agente manipulador é punido com pena de prisão
até 5 anos.
O número 3 do artigo 379.° prevê uma outra modalidade de crime,
que consiste na violação do dever de impedir práticas manipuladoras.
Aplica-se aos titulares dos órgãos de administração e restantes sujeitos
responsáveis pela direção ou fiscalização de áreas de atividade de um
intermediário financeiro que conheçam a prática de um ato manipulador
do mercado e que nada façam para pôr termo à situação. Podem ser puni­
dos com pena de prisão até 4 anos.
A tentativa de manipulação do mercado, inicialmente prevista no
número 4, mas revogada em 2009 (Lei n.° 28/2009, de 19 de junho),
voltará a ser criminalizada, por imposição do disposto no artigo 15.°
do Regulamento relativo ao abuso de mercado (Regulamento (UE) n.°
596/2014, de 16 de abril):
É proibida a manipulação de mercado ou a tentativa de manipula­
ção do mercado.
III. Apesar da reduzida dimensão do mercado português, conhecem-
-se hoje algumas decisões jurisprudenciais que permitem ter uma ideia
mais precisa sobre a realidade prática do crime de manipulação:
RLx 29-jun.-2007®^^. Um corretor de uma sociedade financeira de corre­
tagem foi condenado em 1 ano e 4 meses de pena de prisão, suspensa pelo
período de 4 anos. Foi-lhe ainda aplicada a sanção acessória de interdição
profissional pelo período de 3 anos (artigo 380.°, a)) -, pela prática do crime
de manipulação do mercado. Deu-se como provado que o corretor simulou
uma grande operação de compra de warrants x, por um preço muito supe­
rior ao de mercado, com o propósito de alienar valores mobiliários dessa
mesma categoria e de que era titular, arrecadando, assim, mais-valias muito
proveitosas.
■
Proc. n.°12421/01.7(A)TDLSB, CAÍVM.
264
§ 2 6 .» A IN T E G R ID A D E
RLx 2-jul.-2009®“ . Os arguidos neste processo emitiram, de forma con­
certada, ordens de compra de warrants, descritas pelo tribunal como sendo
“irracionais do ponto de vista financeiro, pelas suas quantidades e preço
proposto face ao valor mobiliário em causa e às condições do mercado” (na
prática, consubstancia uma acasalamento de ordens). Visavam, com esse
procedimento, uma quebra na cotação do valor mobiliário de forma bastante
significativa, com o propósito, uma vez mais, de lucrarem pessoalmente com
esta descida artificial. O tribunal deu como provada a prática do crime de
manipulação do mercado.
IV. Nem todas as manipulações de mercado são criminalizadas. Exce­
tuam-se pelo menos as seguintes:
- Operações efetuadas pelo Banco Central Europeu, por um Estado,
pelo seu banco central ou por qualquer outro organismo designado
pelo Estado, por razões de política monetária, cambial ou de gestão
de dívida púbhca, artigo 379.°/6;
- Operações de estabilização de preços, desde que respeitando as
condições legalmente estabelecidas, artigos 379.°/6 e 349.°;
- Operações de fomento de mercado, artigo 348.° e Regulamento
CMVMn.° 3/2007;
- práticas de mercados aceites, artigo 360.° /l,
V. Como referimos a título introdutório, o instituto de manipulação
não se circunscreve ao tipo penal previsto no artigo 379.°. Vejamos dois
exemplos elucidativos.
Scalpin^'^. Em termos genéricos, entende-se por scalping a reco­
mendação de compra de um determinado tipo de valor mobiliário com
o intuito de, no imediato, alienar valores mobiliários do mesmo tipo,
adquiridos momentos antes da recomendação. Aposta-se, assim, numa
subida do valor de mercado. Não tendo sido prestada qualquer informa­
ção falsa, não se têm por verificados os requisitos do tipo criminal pre-
Proc. n.°12800/01.0TDLSB Qoão Carrola), CMVM.
Esta exceção surge especialmente desenvolvida no artigo 13.°do Regulamento relativo ao
abuso de mercado.
Miguel Brito Bastos, Scalping: abuso de inform ação p rivilegiada ou m anipulação de mercado?, 3
RC&R, 2012,393-424.
265
 D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
Visto no artigo 379.°. Mas, sendo esse o caso, nada impede o lesado de
mterpor uma ação de responsabiHdade civil. Indiretamente, acautela-se
a integridade do mercado.
Chuming^^^
Sem tradução direta para o português, o termo corres­
ponde a prática de intermediação excessiva - contraordenação muito
^ ave prevista no artigo 397.72, c). Embora não preencha os requisitos
do cnme de mampulação de mercado, é evidente que consubstancia uma
pratica lesiva da mtegridade do mesmo, no caso de essa insistência se
traduzir numa aquisição realmente não desejada, o intermediário está a
colocar em causa o correto e justo fiincionamento do mercado, assente
no incontomável jogo da oferta e da procura.
109. Abuso de inform ação privilegiada
I. Com origens no Direito estado-unidense“ ^, o crime de abuso de
informação privilegiada^^® foi pela primeira vez positivado entre nós no
artigo 524.° do CSC“ l Com a codificação do Direito dos valores mobi­
liários, 0 preceito societário foi revogado e a matéria transitou para o
José António Veloso, Churning: alguns apontam entos com um a proposta legislativa em D ireito
dosvaloresm obiliários, Lex, Lisboa, 1997,349-453; Frederico Costa Pinto, Interm ediação excessiva
em E H C arlos Ferreira de A lm eida, Vol. I, Coimbra ed., Coimbra, 2011, 755-788.
A história estado-unidense da criminalização da utilização abusiva de informação privi-
le^ada e particularmente complexa, fruto da incerteza legislativa, dos amplos poderes atri­
buídos à SEC e das diferentes interpretações jurisprudenciais: Marco Ventoruzzo, Com paring
Insider Trading in the United States and in the European Union: H istory and Recent Developments,
ECFLR, 2014,554-593.
Fátima Gomes, Insider trading, APDMC, Valadares, 1996; Costa Pinto, O novo regime, cit., 41
ss; Jose de Faria Costa e Maria Elisabete Ramos, O crime de abuso de inform ação p rivilegiada (insi­
der trading): a inform ação enquanto problem a jurídico-pen al, Coimbra ed, Coimbra, 2006; Pedro
Verdelho, Infrações no m ercadofinanceiro: crimes de abuso de inform ação p rivilegiada e de m anipulação
de mercado em D ireito sancionatório das autoridades reguladores, Coimbra ed., Coimbra, 2009,339-
-354; Melo Bandeira, Abuso de inform ação, cit., 265 ss.
O preceito apenas foi introduzido pelo Decreto-Lei n.°184/87, de 21 de abril - diploma
que positivou o regime penal societário, até então em falta.
266
§ 2 5 .“ A IN T E G R ID A D E
ÇdMVM. O artigo 449.° do CSC, que consagra o regime civil do instituto,
mantém-se atualmente em vigor“ °'^®^
Com a sua transposição para o CdMVM, artigo 666.°, a matéria é objeto
de profundas alterações, em decorrência da transposição da Diretriz n.°
89/592/CEE, de 13 de novembro, relativa à coordenação das regulamentações
respeitantes às operações de iniciado
O regime então previsto, criticado por parte da doutrina especiali-
zada“ ^ voltou a ser objeto de uma profunda renovação com a segunda
codificação mobiliária, em 1999. Dos trabalhos preparatórios, a cargo de
Frederico da Costa Pinto®®^ sairia a versão final, consagrada no artigo
378.°.
O tipo criminal sofreu novas e importantes alterações, aquando da
extensa reforma de 2006 (Decreto-Lei n.° 52/2006, de 15 de março),
desta feita em resultado da transposição da Diretriz n.°2003/6/CE, de 28
de janeiro: a 1.“ Diretriz relativa ao abuso de mercado®®®'®®®.
Paulo Câmara, Anotação ao artigo 449° do C SC em CSC/M C, 1157-1163; Maria Elisabete
Ramos, Anotação ao artigo 449° do CSC em CSC/CA, Vol. VI, 892-919: ambos com amplas refe­
rências bibliográficas.
Paulo Câmara, M anual, cit., 816: para a comparação entre o regime societário e o regime
mobOiário.
Raffaello Fronasier, The D irective on Insider D ealing, 13 Fordham Int’l LJ, 1989, 149-184;
Christine A. McGuiness, Towards the U nification o f European C ap ital M arkets: The E C C ’s Pro­
posed D irective on Insider Trading, 11 Fordham Int’l LJ, 1987, 432-452, 447 ss: a Autora faz uma
análise da proposta inicial, apresentada pela Comissão a 25 de maio de 1987 QO C153/08);
Amy E. Stutz, A New Look a t the European Economic Com m unity D irective on Insider Trading, 23
Vand J Transnat’l L, 1991,177-135: apanhado geral dos diferentes regimes positivados, com
especial destaque para a solução comunitária.
Costa Pinto, O novo regime, cit., 42; Miguel Pedrosa Machado, A entrada em vigor das incrim i­
nações de abuso de inform ação e de m anipulação do mercado do Código do M ercado de Valores M obiliá­
rios: cham ada de atenção p ara m ais um erro de técnica legislativa em D ireito p en al económico e europeu:
textos doutrinários, Vol. 11, Coimbra ed., Coimbra, 1999, 287-300.
^ Trabalhos preparatórios, cit., 36.
R elativa ao abuso de inform ação p rivilegiada e à m anipulação de mercado (abuso de mercado).
Quanto aos diplomas complementares, vide ponto 41/11.
Paulo de Sousa Mendes, A adaptação do D ireito português à directiva sobre o abuso de mercado em
D ireito sancionatório e das autoridades reguladoras, Coimbra ed., Coimbra, 2009,325-337; Guido
A. Ferrarini, The European M arket Abuse D irective, 41CMLR, 2004,711-741; Jesper Lau Hansen,
The New Proposalfo r a European Union D irective on M arket Abuse, 23 J Int’l L, 2002, 241-268.
267
 D IR E IT O DO S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
§ 2 6 .“ A IN T E G R ID A D E

yrr;^ ^ Diretriz relativa ao abuso de mercado (2014/57/
nc * ^ e a r' ), cuja transposição para a ordem jurídica interna deve
ocorrer ate ao * a 3 de julho de 2016- e o Regulamento relativo^o
abuso de mercado (596/2014, de 16 de abril), que n í entrar em vig™ nâ
sua globalidade, na mesma data®^®. °
IL Atualmente, a prática de criminalizar o uso de informação privi-
egiada encontra-se generalizada nos diversos sistemas financeiros- mas
nem sempre foi assim. Durante muito tempo, as Ciências Económicas
vantagens e desvantagens desta posi-
^ ^ ^ discórdia foi alcançado, em solo estado-unidense na
década de 80 do século passado, período que coincidiu com uma polé­
mica vaga de escândalos financeiros, na maioria dos casos envolvendo
precisamente, a utilização de informação não-pública^^«. O empasse jurí-
^ FraudEnforce-
III. Existe um forte consenso quanto aos argumentos favoráveis à cii-
mmalizaçao do uso de informação privilegiada; as diferenças, a existirem,
R C rim inal Sanctionsfor M arket Abuse: A M ove
H arm om ztng Inside Trading C rim inal L aiv a t E U Level?, 9 Brook J Corp Fin & Com L,
Moloney, E U Securities, cit., 712 ss.
residem, essencialmente, na relevância atribuída a cada um dos funda­
mentos invocados.
Em termos genéricos, procura garantír-se a integridade dos mercados
e promover a confiança dos investidores no correto funcionamento dos
mercados«^^'«^^. Numa perspetiva mais prática, entende-se que os custos
sociais inerentes à criminalização se sobrepõem aos benefícios decorren­
tes da sua desregulação«^.
Associados a estas duas traves mestras, surgem outros argumentos«'^^:
(i) a igualdade de oportunidades dos investidores; (ii) a livre e justa con­
corrência; ou (iii) a função pública da informação e a justa distribuição
do risco«^«.
IV. Numa perspetiva mais economicista, os defensores da regulação
defendem que a possibilidade de a informação privilegiada poder ser uti­
lizada livremente tenderia a afastar todos os restantes putativos investi­
dores que não sejam titulares de especiais conhecimentos«^^. Sem negar
0 cabimento deste argumento, não podemos deixar de notar que, sendo
0 comportamento dos mercados e dos investidores irracional«^«, é per­
feitamente concebível que, num determinado contexto, a desregulação
absoluta levasse a um aumento da liquidez do mercado«^^.
Ainda no campo do funcionamento do mercado, as duas escolas,
embora partindo do mesmo pressuposto - centralidade do acesso a infor­
mação clara e precisa -, divergem quanto ao impacto da criminalização do

BniVml'tsTT Bainbridge, The Insider Trading Prohibition: A L egal and Economic

I ^ Í ÒW Ambos os elementos surgem em evidência nos considerandos da Diretriz n.°2003/6: con­
k e tsM ^ ã W í-372; Laura Nyantung Beny, Insider Trading L a J a n d Stock M a t
; siderado 12.
Com T JC ior n ln aon" Contribution to the Theoretical L aw and Economics Debate, 32 J Eberhard Schwark, A notação ao §14 do W pHG em Schw ark/Zim m erK apitalm arketrechts-K om -
C o ^ L, 2006, 237-300; Bradley J. Bondi e Steven D. Lofchie, The L aw o f Insider Trading: Legal
mentar, 4.“ ed.. Beck, Munique, 2010, Rn. 5.
151-2oT' Defenses, and Best Practices fo r E nsuring Compliance, 8 NYU JL & Bus, 2011,
^ Kenneth E. Scott, Insider Trading: R ulelO b-S, D isclosure and Corporate P rivacy, 9 J Legal Stud,
1 1980, 801-818, 809: o Autor reconhece que, em concreto, nem sempre é fácil determinar as
The Jurisprudence o f R ule lO b-S, 52 Alb L Rev,
vantagens e desvantagens desta regulação.
T -J T J- o f t^^dH isappropriation Theory and the New Pano Pananis, Anotação ao §38 do W pHG em M ünchener Kom m entar zum Strafgesetzbuch, Vol.
Insider Trading Legislation: From Fairness to Efficiency and B ack, 52 Alb L Rev, 1988, 775-839.
Vn, Beck, Munique, 2015, Rn. 5; Costa Pinto, O novo regime, cit., 64-66: apanhado geral dos
Barbara Bader Aldave, The Insider Trading and Securities Fraud Enforcem ent A ct o f 1988: An
argumentos invocados; Considerando 43 da Diretriz n.°2003/6.
A nalysis and A ppraisal, 52 Alb L Rev, 1988, 893-921; Stuart J. KasweU, An Insider’s View o f the
^ Costa Pinto, O novo regime, cit., 65.
in sid n Trading and Securities Fraud Enforcem ent A ct o f1988, 45 Bus Law, 1988,145-180; Howard
Lawrence M. Ausubel, Insider Trading in a R atio n al Expectations Economy, 80 Am Econ Rev,
lo o n ^ L c Trading and Securities Fraud Enforcem ent A ct o f 1988, 68 NC L Rev,
1990,1022-1041.
a J' ^hmiel. The Insider Trading and Securities Fraud Enforcem ent A ct o f
^ Ponto 102.
1988: Codifying a P rivate R igh t o f Action, U 111L Rev, 1990, 645-674.
Cox/Forgary, Bases, cit., 354: tecendo idênticas considerações.
268
269
 D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S

de informação privilegiada na transparência do mercado. Os defeo

U SO
§ 26.* A IN T E G R ID A D E
1
sores da regulação consideram que a proibição do seu uso irá favorecer à Não sendo feita qualquer referência à criminalização por atuações
[negligentes, resta-nos concluir que a aplicação do regime previsto no
dispombilizaçao de mais informação^s« e os seus críticos o oposto^^i
[artigo 378.° está circunscrita a atuações ditas dolosas.
guns estudos mais recentes demonstram que os mercados com
regulações mais apertadas e rigorosas são mais eficientes; a liquidez e a
VI. Seguindo a prática estado-unidense®^®, a proibição estende-se a
dispersão de valores mobifiários é superior e a informação flui^de forma
mais celere e segura^l ^ rorma [várias classes de sujeitos. No número 1 do artigo 378.° encontramos qua-
I tro categorias distintas:
Não podemos ainda deixar de fazer expressa referência à construção
Que a te f? Partindo do pressuposto de
a) titulares de órgãos de administração ou de fiscalização do emitente
que informaçao e um bem pertencente às entidades a que esta respeita e acionistas (corporate insiders)-,
defendem uma simples atribuição do controlo da sua divulgação ao L es’ b) sujeitos com um vínculo profissional (contrato de trabalho ou de
petivos orgaos de administração, que, deste modo, poderífm gerir essa prestação de serviços), com carácter permanente ou ocasional, a
informaçao. No limite, nada impede a sua comerciafização ou divulgação um emitente ou outra entidade (temporary insiders)-,
fep m T en tld aT ^ atendendo aos interesses últimos da pessoa c o fe L c) sujeitos que exerçam profissão ou função pública (temporary
insiders)-,
d) sujeitos que tenham tido acesso a informação privilegiada por
rrê J ’ ? 6S4 informação privilegiada surge sustentado em recurso a meios ilícitos (insiders secundários ou tipees).
tres elementos ; (i) as qualidades típicas do agente; (ii) a prática de um
dos factos descntos; e (m) uma atuação dolosa. O último elemento não Em todos estes quatro casos, o sujeito poderá ser punido com pena de
prisão até 5 anos.
i3 ™ rS d "„ p3 ! ’ ’' "O A circunscrição do tipo a classes de sujeitos é aparente. No número 2
do artigo 378.°, o legislador estende a proibição a todos os sujeitos não
Só é punível o facto praticado com dolo ou, nos casos especial­ abrangidos pelo número 1.
mente previsto na lei, com negligência.
Vn. Na anáhse ao segundo elemento - a prática de um dos factos des­
“ nd Inform ational A dvantages under the Federal Securities
critos -, importa, primeiro, atender ao conceito de informação prmle-
giada, previsto no artigo 378.°/3“ ^: 1
rZ :! ! Z l ’ f Mendelson, The Economics o f Insider Trading
Reconsidered. Recensão, 117 U Pa L Rev 1969 470 ^90 4.7 f ætt i j r ° Entende-se por informação privilegiada toda a informação não
nnrif. rlprirlv .o i _ ^^ ^/U-Ò2Ü, 476-477: o titular dessa informação
L . po.:s tomada púbhca que, sendo precisa e dizendo respeito, direta ou indi­
retamente, a qualquer emitente ou a valores mobihários ou outros
Hayne E. Leland, Jnriddr Trading: Should I t Be Prohibited?, 100 J Polit Econ, 1992 859-887- a
ios rndT re T h privilegiada pode ser benéfico para alguns merca­
dos, tudo depende das suas exatas características.
S.E.C . V Tome, 638 F Supp 596-629 (SD NY, 1986), 616: “ The term “insider trading)’ actually is
w T a P relim inary Com parative E vi­
dence, 7 Am La-w Econ Rev, 2005,144- 179. ^ a misnomer, only im perfectly describing the proscribed conduct, since liab ility under the securities law s can
extend to those who are not insiders, as th at term is commonly understood!’. Victor Brudney, Insiders,
S S w S , 8«“ ' S“ " ^ Outsiders, cit.
Costa Pinto, O novo regime, cit., 69. O preceito legal é diretamente inspirado no conceito previsto na 1.“ Diretriz relativa aos
crimes do mercado. As semelhanças são evidentes.
70
 D IR E IT O DOS V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
§ 2 6 .“ A IN T E G R ID A D E

instrumentos financeiros, seria idónea, se lhe fosse dada publicidade, nós: o critério estabelecido é o do impacto da publicitação da informação
para influenciar de maneira sensível o seu preço no mercado. no preço do mercado, independentemente da sensibihdade do homem
médio.
Temos, assim, quatro elementos: informação (i) não-pública; (ii) pre­
cisa, (iii) respeitando, direta ou indiretamente, a emitentes ou instru­ XI. Aos sujeitos abrangidos pelo disposto no número 1 e 2 do 378.°,
mentos financeiros; e (iv) relevante - passível de influenciar, de forma sendo, como tal, detentores de informação privilegiada, são vedadas as
sensível, o preço do mercado.
seguintes atuações:
A informação passa a ser pública a partir do momento em que seja
conhecida dos intermediários financeiros e dos profissionais do sec­ - Transmitir a informação privilegiada a terceiros; no caso dos insiders
tor, não se exigindo uma disseminação da informação pelo público em primários é excecionada a transmissão no âmbito normal das respe­
geraP^^. A mformação só pode ser utilizada depois de disponibilizada tivas funções;
ao público; o simples envio dessa informação, por exemplo, a agências - Negociar ou aconselhar alguém a negociar instrumentos financei­
noticiosas não é suficiente: exige-se uma efetiva divulgação®^^ De modo ros, com base nessa informação privilegiada;
análogo, também a divulgação a grupos restritos, quer sejam acionistas, - Ordenar, com base na informação privilegiada detida, a subscrição,
intermediários financeiros ou outras entidades, não basta para preencher aquisição, venda ou troca, direta ou indiretamente, para si ou para
os requisitos do tipo“ ®. terceiros, de instrumentos financeiros.
As exigências quanto à precisão da informação permitem afastar, do
campo de aplicação da norma, os rumores, os conselhos, as dicas e todas
as restantes manifestações assentes em interpretações subjetivas ou não
fundamentadas“ ®. Por outro lado, a criminalização não está dependente
da infalibilidade ou da exaustividade da informação.
No Direito estado-unidense, o último elemento - passível de influen­
ciar de maneira sensível o preço de mercado do instrumento financeiro
em questão - é preenchido por recurso ao conceito de investidor comum:
ao intérprete-aplicador cabe determinar se a publicitação dessa informa­
ção concreta alteraria o comportamento do homem médio“ ! Não nos
parece que esta solução se coadune com o texto legal positivado entre

Pananis, A notação ao §38 do W pHG, cit., R q. 55.

658
Faça-se um paralelismo com a teoria da emissão das declarações não recipiendas.
'^5’ Pananis, A notação ao § 38 do W pHG, cit., Rn. 56-58.
Costa Pinto, O novo regime, cit., 76, P t ;'•
661 - -
Anheuser-Busch Companies, Inc v Sum m it Coffee Co, 858 SW 2d 928-945 (Tex App-Dallas,
1993), 936: “A n omission or misrepresentation is m aterial i f there is a substan tial likelihood th at a
reasonable investor w ould consider it im portant in deciding to invest. Stated another w ay, there m ust
be a substan tial likelihood th at proper disclosure w ould have been viewed by the reasonable investor as
significantly alterin g the to tal m ix o f inform ation made available” '. People v B utler, 212 Cal App 4th
404-430 (Cal App 4 Dist, 2012), 421.

272
273

§27.“ A TRANSPARÊNCIA
110. O princípio da transparência e a centralidade da inform ação
I. O princípio da transparência, intrinsecamente associado ao conceito
de informação e às obrigações de divulgação, impõe-se de forma trans­
versal, em todo o universo mobiliário: um mercado será transparente na
exata medida em que os investidores e os restantes sujeitos mobiliários
tenham acesso à informação necessária na tomada das suas decisões^l
A importância da informação e da sua divulgação reflete-se na posição
que lhe e unanimemente atribuída pela doutrina especializada e no usual
epíteto de bem mais valioso do Direito dos valores mobiliários^^^-^*.
A centralidade da mformação é posta em evidência pelo número de
vezes que a palavra é mencionada no Código dos Valores Mobfliários:
mais de 400.
Carlos Osório de Castro, A inform ação no D ireito do mercado de valores m obiliários em D ireito
dos valores m obiliários, Lex, Lisboa, 1997, 333-347; Paulo Câmara; Os deveres de inform ação e a
form ação de preços no mercado de valores m obiliários, 2 CadMVM, 1998, 79-93; Mafalda Gouveia
Marques e Mário Freire, A inform ação no mercado de capitais, 3 CadMVM, 1998,111-123.
Amadeu Ferreira, D ireito, cit., 333; Eduardo Paz Ferreira, A inform ação no mercado de valores
m obiliários, 3 DVM, 2001,137-159,150; Costa e Silva, D ireito, cit., 202; Hugo Moredo Santos,
Transparência, OPA obrigatória e im putação de direitos de voto, Coimbra ed., Coimbra, 2011,49 ss.
Apanhado geral da discussão que envolve a dogmatização dos direitos sobre bens imate­
riais: Do trust, cit., 931.
274
§27.“ A TRANSPARÊNCIA
II. A regulação da informação impõe-se essencialmente em duas
dimensões: (i) o conteúdo da informação; e (ii) a imposição de extensos
e complexos deveres de divulgação, nas mais variadas situações e às mais
distintas entidades - emitentes, intermediários e, pontualmente, aos
próprios investidores.
O objetivo principal da regulação da informação é evidente: procura-
-se equilibrar a assimetria informativa que caracteriza os mercados de
capitais^“ . Paralelamente, e de forma porventura acessória, outros pro­
pósitos são prosseguidos, com destaque para a minimização das situações
de conflitos que não raramente opõem os titulares de posições mobiliá­
rias e societárias próximas, maxime, a administração de sociedades cota­
das e os respetivos acionistas ou, em menor medida, obrigacionistas®^^.
A evolução do Direito dos valores mobiliários tem caminhado no sen­
tido do reforço dos regimes de divulgação de informação, tanto ao nível
das obrigações impostas como em relação à quahdade da informação
disponibilizada.
III. As vantagens de um mercado transparente são sobejamente
conhecidas®®^.
Quanto mais informação for colocada à disposição dos mercados,
menor será o risco incorrido pelos investidores®®^. O conhecimento, por
exemplo, do estado financeiro de uma sociedade aberta, das suas pers­
petivas futuras ou do curriculum dos seus administradores favorece uma
análise mais objetiva e, consequentemente, uma gestão mais equilibrada
e conhecedora dos riscos inerentes à aquisição de determinados valores
mobiliários.
Costa Pina, D ever de inform ação, cit., 20 ss.
Paul M. Healy e Krishna G. Palepu, Inform ation Asym m etry, Corporate D isclosure, and the
C ap ital M arkets: A Review o f the E m pirical D isclosure Literature, 31J Account Econ, 2001, 405-
-440,407 ss: a imposição de deveres de informação aos emitentes e às sociedades abertas agi­
liza as relações mobiliárias, não raramente marcadas por uma hostilidade entre os acionistas
e a administração.
Sendo a Economia uma Ciência Social, facilmente se encontram estudos que apontam em
sentido oposto ao referido no texto principal. Procurou identificar-se as posições mais con­
sentâneas e fundamentadas.
““ Christopher B. Barry e Stephen J. Brown, D ifferential Inform ation and Security M arket E quili­
brium , 20 JFQA, 1985,407-422.
275
 D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
Do ponto de vista do emitente, a disponibilização de informação espo­
leta o interesse do mercado e credibüiza a atividade prosseguida, desa­
b a n d o num desenvolvimento positivo da liquidez««», na valorização dos
títulos transacionados«^« e numa diminuição dos custos operacionais«^
Na perspetiva da eficiência do mercado, a divulgação de mais e melhor
informação dá iguais provas de sucesso, aumentando a confiança dos
investidores, a liquidez dos títulos e a eficiência operacional e alocatíva«^^
Finahnente, a gestão da informação surge, nos mercados atuais, como
um elemento muito sensível e que exige, por parte das administrações,
cuidados redobrados. A forma como a informação é gerida, nomeada­
mente a sua apresentação ao público e o modo como é analisada têm um
conhecido impacto nas cotações dos valores mobihários«^^
111. A qualidade da inform ação
I. O sistema não se basta com a shnples divulgação de informação.
Interessa-lhe, ainda, regular o próprio conteúdo dos elementos que che­
gam ao mercado. Atente-se no disposto no artigo 7.°, extensível a todo o
espectro do ramo aqui estudado - bens mobiliários, situações mobiliárias
e sujeitos mobüiários«^^:
Christine A. Botosan, D isclosure Level and the Cost o f E quity C ap ital 72 Acc Rev 1997
323-349. 1 J .
Douglas W. Diamond e Robert E. Verrecchia, D isclosure, L iquidity, and the Cost o f C a p ita l 46
J Finance, 1991,1325-1359: o excesso de informação poderá ser prejudicial para a cotação dos
valores mobiliários.
David Easly e Maureen O’Hara, Inform ation and the Cost o f C ap ital 59 1 Finance, 2004,
1553-1583.
Venkat R. Elesvi^arapu, Rex Thompson e Kumar Venkataraman, The Im pact o f Regulation
F air D isclosure: Trading Costs and Inform ation Asym m etry, 39 JFQA, 2004,209-225.
A titulo de curiosidade, atente-se ao seguinte estudo; Joon Chae, Trading Volume, Infor­
m ation Asym m etry, and Tim ing Inform ation, 50 J Finance, 2006, 413-442: o Autor conclui que
a divulgação atempada e preparada da informação tem um impacto residual, por oposição
à informação divulgada inesperadamente: por exemplo, em conferências não programadas.
Esta lista de características é seguida em diversos artigos: 135.°/!: a informação contida
no prospeto; 389.°/!, c): informações prestadas à CMVM que não respeitam estes elementos
constituem contraordenação muito grave; 393.°/2, d): a inclusão de informação, em prospetos
276
§27.°A TRANSPARÊNCIA
A informação respeitante a instrumentos financeiros, a formas
organizadas de negociação, às atividades de intermediação financei­
ras, à hquidação e à compensação de operações, a ofertas púbHcas de
valores mobüiários e a emitentes deve ser completa, verdadeira, atual,
clara, objetiva e Hcita.
Em suma, a informação disponibihzada deve ser (i) completa; (ii) ver­
dadeira; (üi) atual; (iv) clara; (v) objetiva; e (vi) lícita.
II. Para evitar interpretações subjetivas da qualidade de compleitude,
por natureza quantificável, o legislador comunitário, movido igualmente
por razões de uniformização, optou por apontar, de forma expressa e não
raramente individuaüzada, perante cada facto mobihário específico, a
informação a disponibihzar, por recurso a modelos tipificados. A título
meramente exemplificatívo:
- Regulamento (CE) n.°809/2004, de 29 de abril; contém um vasto
conjunto de modelos com a identificação pormenorizada da infor­
mação a constar nos prospetos de investimento;
- Regulamento (CE) n.°1287/2006, de 10 de agosto: contém a iden­
tificação dos elementos a constar na divulgação de informação ao
mercado e às autoridades competentes.
A ascendência comunitária sobre o legislador nacional é visível neste
campo; veja-se o caso do Anexo II do RJOIC: tipifica a informação a cons­
tar nos prospectos de investimento dos organismos de investimento cole­
tivo, artigo 15 8 .7 2 .
A solução encontrada pelo legislador comunitário e seguida pelo por­
tuguês facilita o trabalho dos emitentes - limitam-se a dar cumprimento
aos quadros tipificados - ao mesmo tempo que acautela a posição jurídica
dos investidores - garantindo a disponibüização dos elementos conside­
rados necessários para a tomada de decisões fundamentadas.
Pontualmente, em decorrência das inúmeras variáveis envolventes,
não é possível ou benéfico positivar um conjunto de elementos mínimos.
de investimentos, que não assegure estas características constitui igualmente uma contraor-
denação muito grave.
277
 DIREITO DOS VALORES MOBILIÁRIOS
§27.“ A TRANSPARÊNCIA

Nesses casos, optou-se por recorrer a expressões indeterminadas (p. ex.;

VI. A informação deve ser objetiva. Por contraposição, refira-se a infor­
informação suficiente®^^), que deverão ser preenchidas à luz da realidade
mação tendenciosa®*“, ou seja, a informação influenciada por interesses
concreta.
estranhos à situação mobiliária concreta ou que contradiga o conteúdo
dos deveres especificamente assumidos®*^
III. Por verdadeira entende-se a informação correta®^® ou exata®’'^, por
A objetividade da informação divulgada assume uma dimensão espe­
oposição a informação falsa, exagerada ou enganosa^^l A veracidade da
cial na densificação da posição jurídica dos intermediários financei­
informação assume um destaque natural no seio do princípio da integri­
ros e restantes fiduciários mobiliários®*^ bem como dos denominados
dade do mercado, em especial no âmbito do instituto da manipulação do gatekeeper^^.
mercado e do crime correspondente.

VII. Finalmente e por contraste com as restantes qualidades, a licitude

IV. A informação a disponibilizar tem de espelhar, com exatidão, a real
não respeita à informação per se, mas ao dever de divulgar®*^. A obrigato­
situação do emitente, sociedade aberta, intermediário financeiro ou valor
riedade de dar cumprimento ao dever de informação não é certanTente
mobiliário. Ocasionalmente, o sistema não se basta com uma divulgação
absoluto, cedendo sempre que, da aplicação das regras gerais®*®, um
da situação atual, exigindo a disponibilização de elementos passados ou direito conflituante se mostre hierarquicamente superior.
futuros. As exigências impõem-se também ao nível da informação pro­
Também neste caso, é no campo das relações fiduciárias que o con­
visória e futura: os dados utilizados na sua compilação devem ser o mais
teúdo do preceito se toma mais evidente; conquanto os intermediários
atualizados possível.
financeiros e restantes consultores assumam a obrigação de aconselha­
mento e de prestação de informações pertinentes, devem abster-se de o
V. Ao contrário do que se verifica com a esmagadora maioria dos ramos
fazer se dessa atuação resultarem (i) situações conflituosas, envolvendo
jurídicos, os bens regulados pelo Dbeito dos valores mobiliários - os ins­
interesses de outros cbentes; (ii) a violação de outros deveres, p. ex.: do
trumentos financeiros - são estranhos do público em geral. A complexi­
dever de sigilo; ou (iii) a violação de direitos de terceiros.
dade crescente dos títulos, as especificidades muito próprias dos factos
jurídicos mobiliários e as situações que estes originam exigem cuidados
redobrados, em especial por parte dos sujeitos mobibários profissionais -
intermediários financeiros e emitentes.
Intimamente associado ao dever de prestar informações claras surge
0 dever, que adstringe os intermediários financeiros, de indagar, junto
de cada cliente, os “conhecimentos e experiência no que respeita ao tipo
específico de instrumento financeiro ou serviço oferecido ou procurado,
bem como, se aplicável, sobre a situação financeira e os objectivos de
investimento do cliente”'"^®.

A expressão tendenciosa pode igualmente ser empregue como antónimo de verdadeira

Artigo 246.75 , d) ou 314.°-C/4.
® Artigo 311.73 , e) e f) .
Artigo 312.0-A/l, b).
Ponto 125.
Artigo 314.°-C/2: inexata.
^ Ponto 126.
5^8 Artigo 311.73 , e) e/;.
679
Costa Pina, Dever de inform ação, cit., 40-41
Artigo 304.73 . 68S
’ Artigo 335.°. ^

278
279
 Capítulo IV
Relações de Confiança

§28.° INTRODUÇÃO

112. Enquadram ento social e Jurídico

I. A sociedade moderna caracteriza-se, cada vez mais, pela prevalência

do coletivo sobre o indivíduo. A cooperação de esforços é hoje, reconhe­
cidamente, o motor da civilização humana, com especial evidência nos
campos científicos e tecnológicos. Não é credível que as próximas gran­
des descobertas resultem de estudos desenvolvidos por génios isolados -
0 CERN apresenta-se como o exemplo perfeito das exigências colocadas
pela realidade contemporânea.
O novo paradigma social favorece a emergência de estreitas relações
de confiança, marcadas pela atribuição de extensos poderes - por regra
discricionários - operando, estruturalmente, como uma grande rede
fiduciária em que os interesses individuais e coletivos são acautelados e
prosseguidos por outros que não os seus diretos interessados®*®.

Com idênticas considerações: Tamar Frankel, Fiduciary L aw , 71 Cal L Rev, 1983, 795-836,
797-798.

281
 D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
II. A confiança tem sido especialmente estudada por parte importante
da sociologia moderna. Os estudos pioneiros de Luhmann“ ^ (1968), a que
se seguiram os de Barber“ » (1983), deram origem a uma farta e vaHoia pro­
dução científica“ ®, que vem reforçar a ideia, defendida no texto, da cen-
tralidade assumida pela confiança na estruturação da complexa sociedade
contemporânea.
III. É no campo do Comércio e da Economia que a centralidade das
relações de confiança se faz sentir de forma mais notória - com um evi­
dente impacto na regulação daí decorrente.
As organizações comerciais assentam hoje em fortes laços fiduciá­
rios. Basta, para o efeito, atender aos tipos contratuais hoje dominan­
tes - p. ex.: os contratos de mediação^®® ou os inúmeros contratos de dis­
tribuição: agência, concessão ou franquiarei - ou às relações constituídas
entre os administradores ou gestores das variadas manifestações coleti­
vas - sociedades, fundações e associações®®^.
IV. Também o Direito mobiliário é marcado pela proeminência das
relações de confiança; de resto, o próprio ramo jurídico, nos moldes em
que hoje o conhecemos, gira em torno da relação intermediário finan-
ceiro/cliente, intrinsecamente fiduciária. A este exemplo paradigmá­
tico, acrescente-se, a título exemplificativo, o caso dos promotores de
Niklas Luhmann, Vertrauen: E in M echanism us der Reduktion sozialer K om plexität, Enke, Esni-
garda, 1968 (105 pp). A tradução para a língua inglesa, em 1979, permitiu uma maior divul­
gação da obra.
»»» Bernard Barber, The Logic and L im its o f Trust, New Brunswick, Rutgers University Press,
1983 (183 pp).
A título exemplificativo: Piotr Strompka, Trust: A Sociological Theory, CUP, Cambridge,
2000 .
De outro modo nem poderia ser, atendendo que o mediador atua em nome dos seus clien­
tes e necessariamente em benefício dos seus interesses. Sobre o tema, veja-se a tese de douto­
ramento de Higina Orvalho Castelo, O contrato de mediação, Almedina, Coimbra, 2014.
Os artigos 1.“ e 6.°do Decreto-Lei n.“ 178/86, de 3 de julho, relativos ao contrato de agência
e aphcáveis, na medida da sua adequação, aos restantes contratos de distribuição são particu­
larmente elucidativos.
Para uma hstagem mais completa das relações de confiança, vide Do trust, cit., 470 ss.
282
§ 28.« IN T R O D U Ç Ã O
emissões de valores mobihários®®^ ou das diversas entidades de gestão de
patrimónios coletivos®®^.
A reduzida dimensão desta lista é enganadora: associado ao termo
intermediário financeiro surge um número extenso de atividades sujeitas
a um elevado grau de autonomia e de especialização. O disposto nos arti­
gos 291.°e 292.° é particularmente esclarecedor:
- A receção, transmissão e execução de ordens por conta de outrem;
- A gestão de carteiras;
- A tomada firme e a colocação, com ou sem garantia, em operações
púbhcas de distribuição;
- A consultoria para investimento;
- A elaboração de estudos de investimento, de análises financeiras,
estratégicas, comerciais e governativas.
113. Por um a doutrina unitária das relações de confiança
I. As relações de confiança não podem ser descritas como reaUda-
des sociais modernas: a sobrevivência da espécie humana é devedora
deste conceito; de que outra forma poderiam as primeiras comunidades
ter sobrevivido, se entre os seus membros não houvesse uma confiança
recíproca?
Também o Direito não as desconhece. As relações familiares e as rela­
ções análogas são, todas elas, moldadas por fortes laços de confiança juri­
dicamente reconhecidos: pais/filhos®®®, marido/mulher®®®, tutor/inter-
dito®®^ ou curador/inabilitado®®®.
Andrew F. Turch, Securities U nderwriters in P ublic C ap ital M arkets: The Existence, Param eters
and Consequences o f the Fiduciary O bligation to A void Conflicts, 1 J Corp L Stud, 2007,51-84.
Artigo 4.“ do RJOIC: “A entidade responsável pela gestão . . . [age]. . . no exclusivo inte­
resse dos participantes”.
Artigo 1877.°ss do CC. Fala-se, neste caso, de um dever funcional, c£, Menezes Cordeiro,
Tratado, 1, cit., 910.
Artigo 1672.° do CC.
^ Artigo 139.°do CC.
Artigos 153.°e 154.°do CC.
283
 D IR E IT O DO S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
Este cenário estende-se a todo o espectro juridico, atravessando de
orma transversal o Direito privado português - e, porventura, também o
Direito publico . As relações jurídico-comerciais acima referidas acres
centem-se os diversos contratos de prestação de serviço - com o destaquè
natural para o mandato^°°, com raízes ancestrais (mandatunf°^) ~ onde o
prestador assume a obrigação de atuar no interesse do mandante, con­
fiando, este ultimo, no compromisso assumido^®^ ou todas as relações em
que um sujeito se apresente munido de poderes (de representação) para
atuar em nome do representado^“ , com raízes igualmente remotas^“ .
II. Sem negar a existência de relações de confiança no seu seio, o Direito
civil e a sua Ciência apenas recentemente"“ e, em grande medida, em
resultado de uma crescente ascendência jurídica anglo-saxónica"“ , deci­
diram explorar o interesse e a viabilidade de desenvolver uma doutrina
unitária que congregasse todas as diferentes manifestações fiduciárias
Nos próprios, bem recentemente, defendemos a pouca utilidade deste
canunho, sem, contudo, negar um certo interesse pedagógico ou exposi-
tivo, com base na seguinte fimdamentação"“ : (i) na tradição da Common
Law, as relações fiduciárias são devedoras do trust, tanto numa perspe­
tiva estrutural como numa perspetiva substantiva, especialmente notada
No que a penetração pubHcista da teoria fiduciária respeita, veja-se, como ponto de par-
Oda: Ethan J. Leib, David L. Ponet e Michael Serota, M apping P ublic Fiduciary R elationships em
P hilosophical Foundations o fF id u ä a ry L aw , coordenação de Andrew S. Gold e Paul B Miller
OUP, Oxford, 2014,388-403.
"““ Artigo 1157.“ do CG.
Antomo Santos Justo, D ireito privado romano - U (D ireito das obrigações), 4.“ ed., Coimbra ed„
Coimbra, 2011,80. r y, , ,
Depósito: 1185.“; Empreitada: 1207.“.
262.“ do CC e Am go 266.“ do CCom (comissão).
Pedro de Albuquerque, Representação volun tária em D ireito d v il: ensaio de reconstrução dogmá­
tica, Almedina, Coimbra, 2004.
Ponto 114/m.
Esta influência tem sido especialmente sentida no campo do Direito societário e no
Direito dos valores mobiliários. Veja-se a monumental obra de Jan von Hein, D ie Rezeption US-
am erikanischen Gesellschaftsrechts in D eutschland, Mohr Siebeck, Tubinga, 2008 (XLVI + 1089
pp). Nao podemos amda deixar de notar a gradual receção do frasf pelos sistemas civih'sticos,
cí. Do trust, c it., 47 ss.
Do trust, cit., 976 ss.
284
§ 2 8 .” IN T R O D U Ç Ã O
00 preenchimento da posição jurídica dos fiduciários - ora, este raciocí­
nio lógico-dedutivo não se adequa à reahdade continental, onde o papel
científico dos negócios fiduciários é historicamente diminuto"“®; e (ii) na
possibüidade de se recorrer, por analogia, a regimes mais desenvolvidos,
p. ex.: o mandato para todas as prestações de serviço ou a agência para
os restantes contratos de distribuição. A estes argumentos adicione-se
um outro particularmente relevante (iü): a maioria das relações referidas
tem sóhdas raízes entre nós, tendo os respetivos regimes evoluído paula­
tinamente, em muitos casos ao longo de dezenas de séculos, refletindo,
supostamente, os anseios e as necessidades das comunidades reguladas.
n i. Os argumentos então aduzidos e ora reforçados são ponderosos.
Todavia, impõe-se uma mudança de posição, que vá no sentido do reco­
nhecimento do interesse e da utüidade em adotar uma construção unitá­
ria que permita preencher e esclarecer os exatos contornos das posições
jurídicas dos diversos fiduciários. Esta alteração é motivada por funda­
mentos de ordem dogmática, prática e sistemática.
Da leitura da maioria dos regimes que regulam relações ditas de con­
fiança não resulta claro que tipo de atuação material se espera do fiduciá­
rio, em especial na pendência da execução do acordado. Vejamos o caso
paradigmático do mandatário.
O preceito não deixa dúvidas quanto aos propósitos finafisticos do
tipo contratual, mas pouco nos diz sobre os deveres assumidos. Está o
mandatário sujeito a deveres de lealdade, nos moldes desenvolvidos, por
exemplo, para os administradores das sociedades comerciais (o incontor-
nável artigo 64.°do CSC)? Tudo indica que sim. Porém, isso mesmo não
decorre do regime positivado. O não tratamento desta matéria no tipo
contratual do mandato é especialmente prejudicial, na medida em que o
artigo 1156.°manda aplicar este regime, de forma subsidiária, a todos os
contratos de prestação de serviço.
A conceitualização de uma doutrina unitária permite, assim, concreti­
zar alguns aspetos nucleares de regimes que, embora incontestavelmente
consohdados, se mostram lacunares.
' Do trust, cit., 703 ss.
285
 D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
rV. As fragilidades dogmáticas atuais-têm um evidente reflexo na vida
prática do dia-a-dia: o que fazer se um mandatário, embora sem incum-
prir as instruções recebidas, atuar de forma a retirar benefícios para si ou
para terceiros? Exemplifique-se.
A, mandatário de B, na exploração e gestão de uma herdade, contrata
sempre com os mesmos fornecedores, não por serem os mais competiti­
vos, mas porque recebia sempre uma interessante bonificação. Admita-
-se mesmo que os fornecedores habituais prestavam um serviço acima da
média.
A, mandatário de B, para a aquisição de uma biblioteca, opta por
negociar com C, em detrimento de D, por ser amigo de longa data do pri­
meiro. Ambas as coleções preenchiam os requisitos mínimos indicados e
encontravam-se dentro do intervalo de preços estabelecidos por B, mas a
proposta de D era objetivamente mais favorável.
V. Numa perspetiva sistemática, o acolhimento de uma solução uni­
tária, abarcadora de todas as relações de confiança, é particularmente
ahciante: permite uma consohdação dogmática, com todas as vantagens
teóricas e práticas associadas, assim como um intercâmbio de decisões.
Mas não se confunda sistematização com uniformização. A solução pro­
posta deve ser flexível e adaptável às especificidades de cada relação con­
creta, sob pena de operar um total esvaziamento.
Do ponto de vista do nosso Direito dos valores mobihários, o desenvol­
vimento de uma teoria unitária assume um interesse redobrado, por duas
razões principais. Permite concretizar os deveres que moldam a atuação
dos intermediários financeiros, maxime, os de lealdade, bem como os
deveres assumidos pelas restantes posições fiduciárias. Fornece, ainda,
elementos decisivos no aprofundamento e na sistematização dos deveres
dos denoxainâdos gatekeepers (p. ex.: agências de notação de risco e audi­
tores externos), em especial no âmbito da problemática que envolve os
denominados conflitos de interesses. Conquanto se reconheça que a sua
inclusão no leque das fiduciary relationships seja forçada, a proximidade
existente abre as portas a um tratamento senão consolidado, pelo menos
mutuamente influente.
VI. O papel hoje desempenhado pelas relações de confiança, conjugado
com uma certa abertura e propensão para uma análise integrada e siste-
286
§ 28.» IN T R O D U Ç Ã O
matizada, torna esta matéria não apenas apta a integrar uma parte geral do
Direito dos valores mobihários, como a parte geral do nosso Direito comum,
devendo, consequentemente, ser incluída no programa da cadeira de Teo­
ria Geral do Direito Civil. Podemos ir mais longe: uma futura atuahzação da
Parte Geral do Código Civil, cada vez mais premente, deve incluir a positiva-
ção de um regime geral das relações de confiança, aplicável subsidiariamente
a todas as relações que preencham os predicados base. Estruturalmente, esta
matéria será incluída na parte dedicada ao exercício dos direitos (artigos
334.° ss do CC)^°®.
114. Negócios fiduciários e relações de confiança
I. Na Common Law, a dimensão interna do trust, ou seja, a relação
de confiança estabelecida entre o trustee e o beneficiário, representa o
arquétipo dasfiduciary relationships - expressão usualmente traduzida por
relações de confiança -, servindo de modelo tanto para a construção de
um conceito geral, como para preencher os espaços lacunares de todas as
relações jurídicas posteriormente identificadas com o instituto^^°.
Cumpre assim perguntar se também os negócios fiduciários devem
ser descritos como relações de confiança. Ora, enquanto facto jurídico
que é, o negócio fiduciário não pode ser descrito nesses termos, mas a
mesma hmitação já não se verifica em relação à dogmatização da relação
o desenvolvimento de uma doutrina sistematizada e unitária exige um desenvolvimento
que escapa, reconheça-se, às pretensões destas foUias.
™ Re, West o f E ngland & South W ales D istrict B ank, ex p arte D ale & Co (1879) 11 C hD 772-778,
778: “ W hat is a fid u ciary relationship? It is one in respect o f which i f a w rong arise, the same remedy
exists against the wrong-doer on b eh alf o f the p rin cip al as w ould exist against a trustee on b eh alf o f the
cestui que tru sf. Os próprios tribunais reconhecem a progressão gradual do processo. Pri­
meiro, através da aphcação analógica da relação fiduciária por excelência - trust - e, numa
segunda fase, através da construção de uma figura geral, cff., Gwembe Valley Development Co
L td VKoshy (No 3) [2004] 1BCLC131-179,157: “ T hefiduciary relationship has developed by analogy
from the trust relationship” -. Swindle v Harrison [1997] 4 All ER 705-736,734: “fid u ciary duties are
equitable extensions o f trustees duties”. Alguma doutrina admitia, já em meados do século X K , a
coexistência de duas aceções: (i) em sentido amplo abrangia todas as relações hoje descritas
como sendo de confiança; e (ii) em sentido estrito, circunscrito aos negócios fiduciários, cfr.,
William Evans, A Treatise upon the L aw o f P rin cipal and A gent in C ontract and Tort, edição esta-
do-unidense, Vol. I, Blackstone, Filadélfia, 1888,319.
287
 M Ü BILTA RIO S

§ 2 8 .“ IN T R O D U Ç Ã O

interna que se estabelece entre o fiduciário e o beneficiário - e^rln.

1 foi recentemente aplaudida e desenvolvida por Grundmann^® e Lõh-
nig^^ autores de duas das mais relevantes obras fiduciárias modernas.
Oportunamente criticámos estas três teses expansionistas. Ao coloca­
rem a pedra de toque na dimensão interna da relação, desconsiderando,
em absoluto, a posição jurídica ocupada, i.e., a titularidade de um direito,
II. Num negócio fiduciário para administração o titular de um rl• ■ estes Autores estão, na prática, a suprimir um conceito clássico, para mais
perfeitamente consolidado, e a substituí-lo por um outro. Ora, não vemos
qualquer razão para proceder a tamanha alteração, tanto mais que nada

= .= i'™ £ 2-sr^rr~
impede a coexistência de ambas as figuras.
Parece ter sido precisamente este ponto que escapou à doutrina
expansionista: foi identificada uma necessidade prático-científica: a con-
A estrutura básica dos negócios fiduciários não encontra continui ceitualização sistemática e unitária de uma nova posição jurídica, com
dade restantes relações de confiança: compare-se cornos 5n «™ T uma presença crescente nos mais variados ramos jurídicos; todavia, ao
lanos financeiros, os administradores das sociedades comerciais partir da figura clássica do negócio fiduciário tomou-se refém nas suas
mmdatarios. Em nenhum destes casos a dimensão fiduciária do carso características e especificidades. A assunção desta interpretação, espole­
tou, de imediato, a emergência de fundados anticorpos, pondo em causa
?a pÕs“ ™ ' "" caracteristici 0 sucesso da constmção.
Repare-se que as diversas teorias expansionistas, em especial a de
Lõhing, são particularmente proveitosas, do ponto de vista do apro-
neeóc-'''‘S ! douttina alemã que se debruçou sobre os
fimdamento de uma doutrina unitária dos negócios de confiança, em
g los “ õianos advoga uma renovação conceituai, de modo a abar tudo similar às fiduciary relationships anglófonas. Estes Autores poderiam
car também as relações de confiança».
mesmo ter defendido uma aproximação aos negócios fiduciários, o que
Ção d T o E a caracteriza-se pela simples assun­ certamente se reconhece, sem pôr em cheque uma figura clássica e com'
ção da obngaçao de atuar no interesse de outrem, sendo indiferente a
esm tura ou as especificidades jurídicas da posição ocupada» O Autor uma relevância crescente no panorama jurídico continental. De modo
algum a sua teoria sairia afetada.
chega mesmo a descrever o fiduciário como u m ^ s to r » A c o n s ^ ^

IV. Intemamente, ou seja, no que ao conteúdo das obrigações das

diversas partes respeita, existe uma inegável proximidade entre os negó­
cios fiduciários e as relações de confiança, mas não podemos desconsi­
derar as diferenças estruturais: os negócios fiduciários pressupõem nma
distinção material entre o titular do direito e o seu beneficiário último, o
2^ZZ t o fS rtl'. (fiiucú, que não se verifica nas relações de confiança.

Do trust, cit., 971 ss.

Stefan Grundmann, D er Treuhandvertrag: insbesondere die werbende Treuhand, Beck, Munique,

1997 (xxx+609 pp).
Cit., 22-23. ™ Martin Löhnig, Treuhand: Interessenwahm ehm ung und Interessenkonflikte, Mohr Siebeck,
Tubinga, 2006 (xxxix + 904 pp).
288

289
 D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S

Esclarecido este ponto, nada impede que as posições jurídicas dos

diversos intervenientes sejam analisadas de forma integrada, benefi­
ciando, também neste ponto, com uma sistematização e dogmatização
mais precisas e aperfeiçoadas. ^

§30.° DOUTRINA UNITÁRIAS

115. Enquadram ento

Na busca por uma sistematização unitária que congregasse todas as

fiduciary relationships, a Ciência Jurídica anglo-saxónica desenvolveu uma
série de teorias que se desejam unificadoras das diferentes relações fidu­
ciárias. Aos ricos desenvolvimentos anglófonos cumpre acrescentar os
avanços alcançados pela escola expansionista germânica, com merecido
destaque para a construção de Lõhnig.
Com propósitos ordenadores das diferentes soluções, é possível iden­
tificar cinco teorias principais: (i) a teoria da propriedade; (ii) a teoria do
poder ou da discricionariedade; (iii) a teoria do escopo; (iv) a teoria do
enriquecimento sem causa; e (iv) a teoria do interesse^^®. A multiplicidade
de construções desenvolvidas em torno da teoria do interesse, conjugada
com a sua especial utilidade, favorece uma autonomização expositiva.

116. Teoria da propriedade

I. A teoria clássica da propriedade, conceitualmente dependente da

estrutura do trust e da posição desempenhada pelo trustee, apresenta a

Do trust, cit., 509 ss: as conclusões aí chegadas respeitam ao conceito de fiduciário no

âmbito dos negócios fiduciários clássicos, não podendo, consequentemente, ser transpostas
para o campo das relações de confiança sem as necessárias e devidas adaptações.

290

D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
relação fiduciária como sendo toda aquela em que existe uma separação
entre a titularidade do direito sobre uma coisa corpórea ou o seu con­
trolo de facto e o benefício efetivo do bem^^®. A construção não pode ser
aceite, visto deixar de fora a esmagadora maioria das relações de con­
fiança. Mesmo no campo dos negócios fiduciários, a teoria clássica da
propriedade encontra-se ultrapassada: o objeto da fidúcia pode ser uma
coisa incorpórea ou um direito de crédito’’^®.
II. Recentemente, a teoria da propriedade foi adaptada de modo a
abranger todas as situações fiduciárias que não encontrassem na titulari­
dade de um direito real o seu núcleo identificativo. O seu Autor, Gordon
Smith, substituiu a expressão direito de propriedade pelo termo criticai
resourcé^^K Com o uso deste termo pretendeu identificar-se o bem, direito
ou interesse que é confiado ao fiduciário, quer seja uma coisa corpórea
ou uma simples informação. Esta subtil alteração, embora dando res­
posta às críticas usualmente dirigidas à teoria da propriedade - exces­
sivo apegamento às raízes históricas do trust -, mostra-se insatisfatória
quando posta em prática: qual o criticai resource das relações de confiança
complexas (p. ex.: administradores/pessoas coletivas ou intermediários
financeiros/investidores)? As ff agilidades da construção manifestam-se
na própria linha de raciocímo seguida ao longo das folhas e que tende a
aproxhnar a posição do Autor das teorias finahsticas^^l
A criticai resource theory é ainda criticável por circunscrever os deveres
fiduciários ao que considera ser o núcleo da relação. Ora, os deveres fun­
damentais de qualquer posição estendem-se a toda a relação fiduciária^^.
™ John C. Shepherd, The L aw o f Fiduciaries, The Carswell Company, Toronto, 1981,52.
Do trust, cit., 921 ss.
D. Gordon Smith, The C ritical Resource Theory o f Fiduciary D uty, 55 Vand L Rev, 2002,1399-
1497. Andrew S. Gold, On the E lim ination o f Fiduciary D uties: A Theory o f Good F aith fo r Unincor­
porated Firm s, 41 Wake Forest L Rev, 2006,123-187,130: aparenta acolher a teoria.
Veja-se a seguinte passagem retirada das conclusões: “ W hen a person is authorized to act on
b eh alf o f another and to exercise discretion over critical resources belonging to the other, a duty o f loyally
helps to align incentives” : cit., 1497.
™ Deborah A. DeMott, Breach o f Fiduciary D uty: On Ju stifiab le E xpectations o f L o yalty and Their
Consequences, 48 Ariz L Rev, 2006, 925-956, 936: apontando semelhantes críticas.
292
§ 2 9 .” D O U T R IN A U N IT Á R IA S
117. Teoria do poder ou da discricionariedade
I. A teoria da discricionariedade foi desenvolvida por Wemrib^^“^. Para
este Autor, o elemento distintivo das relações fiduciárias deve ser pro­
curado não nos deveres per se, mas na imposição de hmitações legais ao
exercício dos poderes conferidos. A posição dos diferentes fiduciários
caracterizar-se-ia, assim, pela atribuição de extensos poderes discricioná­
rios, cujo exercício deve sempre guiar-se pela prossecução dos fins e dos
objetivos que estão na origem da própria relação^^. A dimensão criativa
dos poderes, particularmente visível em posições intrinsecamente discri­
cionárias - pense-se na gestão de alguns fundos de investimento coletivo
-, impeliram o sistema a desenvolver estritos critérios regulatórios for­
mais e substantivos, para acautelar a frágil posição dos beneficiários da
relação^^'^.
II. A teoria da discricionariedade foi retomada por Tamar Frankel.
Adotando uma conceitualização claramente profilática, a ilustre Pro­
fessora apresenta a imposição de deveres fiduciários como mecanismos
de defesa contra a utilização dos poderes atribuídos aos fiduciários^^l
Alguns tipos de serviços, concretiza Frankel, apenas podem ser efetiva­
mente prestados se o interessado transmitir, para o prestador, um vasto
conjunto de poderes e de direitos. Ao fazê-lo, o interessado assume riscos
consideráveis: nada lhe garante que o fiduciário não irá utilizar a posição
ocupada para prosseguir os seus interesses pessoais ou os interesses de
terceiros, desconsiderando, por completo, a ratio subjacente à constitui­
ção da relação^^®.
A imposição de deveres fiduciários apresenta-se, assim, como uma
garantia de que esses poderes apenas serão exercidos no exclusivo inte­
resse dos beneficiários (p. ex.: os investidores).
Emest J. Weinrib, The Fiduciary O bligations, UTLJ, 1975,1-22. O próprío Autor reconhece
as insuficiências da sua tese (9-15).
^“ Cit.,4.
Cit., 7.
Fiduciary L aw , cit., 809. A Autora expõe e aprofunda esta construção em outros estudos:
Fiduciary D uties as D efault Rules, 74 Or L Rev, 1995, 1209-1278 e Fiduciary L aw in the Twen­
ty-First Century, 91BU L Rev, 2011,1289-1299.
^ Fiduciary L aw in the T w enty-First Century, cit., 1293.
293

D IR E IT O DO S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
III. A construção, nos moldes desenvolvidos por Tamar Frankel, mere­
ceu o acolhimento de amplos sectores da Ciência Jurídica anglófona^^g
mas não conseguiu impor-se nas salas dos tribunais^^». -
A teoria da discrícionariedade também não pode ser aceite. Para além
de assentar numa visão muito redutora da posição jurídica dos fiduciá-
nos, sendo, como tal, insuficiente para esclarecer os exatos contornos
dos deveres assumidos, não é suficientemente delimitadora: a atribuição
de poderes discricionários não é uma prerrogativa exclusiva dos fiduciá­
rios. Da aplicação da teoria não é possível distinguir as relações de con­
fiança das restantes, nem determinar em que tipos de casos estas relações
emergem^^^
118. Teoria do escopo
I. A teoria do escopo, desenvolvida por Arthur Laby^^a^
logo ao que se verifica para a teoria da discricionariedade, adota uma
Kevin Rogers, Trust and Confidence and the F iduciary D uty ofiB anks in Iow a, 35 Drake L Rev,
1986,611-632,620; Beverly M. M cL zch lin , A New M orality in Business L aw , 16 Can Bus LJ, 1989,
319-327, 324; Jef&ey N. Gordon, The M andatory Structure o f Corporate L aw , 89 Colum L Rev,
1989,1549-1598,1596: a teoria tern merecido especial aceitação por parte da doutrina soci­
etária, que a invoca para proteger a posição dos sócios minoritários; Great M. Fung, A Com­
mon G oalfro m Two D ifferent P aths: Protection o f M in ority Shareholders in D elaw are and C anada, 57
Alb L Rev, 1993,41-92,44; Patricia M. L. Illingworth, Patient-T herapist Sex: C rim inalization and
Its D iscontents, 11J Contemp Health L & Pol’y, 1995, 389-416, 404: parece seguir a posição de
Frankel, embora reconheça que, tendo a construção sido desenvolvida à luz das tradicionais
relações fiduciárias, a sua aplicação às novas relações de confiança levanta sérias dificuldades;
Katsuhito Iwai, Persons, Things and Corporations: The Corporate Personality Controversy and Com­
parative Corporate Governance, 47 Am J Comp L, 1999, 583-632, 620; Janice D. ViUiers, Clergy
M alpractice Revisited: L iab ility fo r Sexual M isconduct in the C ounselling R elationship, 74 Denv U L
Rev, 1996,1-64,42. acolhe com especial entusiasmo a dimensão profilática da construção.
Smith, The C ritical Resource, cit., 1426: o Autor leva a cabo uma análise exaustiva das deci­
sões em que o artigo de Frankel é citado e conclui que em nenhuma delas a teoria da discri­
cionariedade é efetivamente aplicada.
Smith, The C riticai Resource, cit., 1426; Frank H. Easterbrook e Daniel R. Fischel, Contract
and Fiduciary D uty, 36 J Law & Econ, 1993, 425-446, 436: os Autores são bastante críticos
da construção; afirmam que não responde às questões centrais do tema: “ W hat kind o f power,
under w h at circumstances, w ith ensuing duties?”.
Arthur B. Laby, The Fiduciary O bligations as the A doption o f Ends, 56 Buff L Rev, 2008,99-168.
294
§ 2 9 .” D O U T R IN A U N IT A R IA S
visão finahstica das relações de confiança: ao recorrer a intermediários
financeiros com propósitos de gestão de carteiras, o investidor tem em
vista um objetivo concreto: apela aos conhecimentos e à experiência de
nm sujeito concreto por considerar ser este o mais indicado para pros­
seguir os fins pretendidos. Ora, ao aceitar essa fimção, o intermediário
financeiro compromete-se a prosseguir os objetivos para os quais foi con­
tratado, pelo que não pode, em caso algum, afastar-se desse fim, sob pena
de violar os deveres voluntariamente assumidos.
II. A teoria do escopo também não nos permite distinguir as relações
^
de confiança das restantes. Qualquer tipo de prestação de serviço tem
como objeto primário a prossecução do fim indicado pelos contraentes.
Laby, pretendendo, precisamente, contornar esta crítica, recorre a dois
elementos centrais: (1 ) a relação fiduciária tem uma natureza continuada;
e (2) os fiduciários apenas estão sujeitos, ou tenderão a estar, a obriga­
ções de meios e não de resultados. Enquanto um eletricista se obriga a
trocar uma lâmpada, os fiduciários comprometem-se a prosseguir os fins
indicados pelos beneficiários, exemplifica^^^.
Esta argumentação é claramente insuficiente. Os intermediários
financeiros estão sujeitos, no âmbito da relação de confiança estabelecida
com os seus clientes, a obrigações de resultado, pense-se numa simples
ordem de compra ou de venda de valores mobiháríos. Acresce que Laby
coloca, no núcleo das relações de confiança, os deveres de cuidado e não
os deveres de lealdade, o que tende a desvirtuar todo o instituto^^^.
119. Teoria do enriquecim ento sem causa
I. A tese do enriquecimento sem causa foi apresentada, pela primeira
vez, por Shepherd^^®, num exercício puramente científico. Repare-se que
a absorção da relação fiduciária pela doutrina do enriquecimento sem
Cit., 133.
Arthur B. Laby, Resolving Conflicts o f D uty in Fiduciary R elationships, 54 Am U L Rev, 2004,
75-149,78.
J. C. Shepherd, Towards a Unified Concept o f Fiduciary Relationships, 97 LQR, 1981, 51-79,
53-56.
295
 ' .......... ■ " § 29.” DOUTRINA'UNITARTAS’
D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S

causa’’^® não parece ter sido defendida, abertamente, por nenhum autnr
ou tribunaF^^.
Shepherd considera que o facto de a teoria não ter sido expressamente
defendida não significa que não tenha sido implicitamente aphcada
O autor recondu-la às decisões jurisprudenciais focadas na dimensão res-
sarcitória do regime do trust. No acórdão Exparte Dale & o tribunal
colocou a pedra de toque da relação fiduciária na possibihdade ou impos­
sibilidade de aphcação dos remédios que tradicionalmente são colocados
à disposição dos beneficiários. Seguindo esta linha de raciocínio. Fry J
após concluir pela aphcação dos “remédios fiduciários”, invoca a existên­
cia, na esfera jurídica dos beneficiários, de equitable rights'^^^.
A grande crítica à tese do enriquecimento sem causa reporta-se à sua
Inatureza meramente formal. De facto, como parte da doutrina tem apon-
ítado, a construção não fornece qualquer elemento que permita, ao intér-
[prete-aplicador, distinguir as relações fiduciárias das não-fiduciárias. No
‘ limite, a teoria, mesmo em termos abstratos, não é aphcável: redunda
^num círculo no qual muito dificilmente se consegue entrar: (i) a relação
^fiduciária caracteriza-se pelos remédios disponibihzados aos beneficiá-
‘ rios; e (ii) o reconhecimento ou a emergência de novas relações fiduciá-
■ rias depende da aphcação desses mesmos remédios. O objeto último da
demanda pela unificação conceituai - o que permite identificar uma rela­
ção fiduciária - fica sem resposta^^\

II. As críticas à tese partem do próprio autor. Shepherd recorre a dois

argumentos: (i) a violação do dever de lealdade pressupõe um efetivo
prejuízo para o beneficiário; e (ii) a aplicação da doutrina do enriqueci­
mento sem causa está dependente da má-fé do enriquecido^^®. Ambas as
asserções não são corretas. A aphcação e o preenchimento dos deveres
fiduciários, pelos tribunais ingleses, caracteriza-se por uma reconhecida
inflexibihdade, não sendo valorizado se da atuação do fiduciário resulta
a produção de qualquer tipo de dano na esfera jurídica do beneficiário.
Também o segundo argumento não reflete o regime vigente: a aphcação
da doutrina do enriquecimento sem causa não está dependente da inten­
ção do enriquecido, bastando-se com o seu enriquecimento efetivo.

A doutrina do enriquecimento sem causa apenas foi introduzida no sistema jurídico anglo-
-saxónico nos finais do século XIX, estando ainda, nos dias que correm, a viver um processo
de consolidação e aprofundamento, cfi:., Peter Birks, U njust Enrichm ent, 2.“ ed., OUP, Oxford,
2005. Entre nós, a doutrina do enriquecimento sem causa tem merecido atenção nas grandes
obras de referência dedicadas ao tema, cfr.. Luís Menezes Leitão, O enriquecimento sem causa no
D ireito civil: estudo dogmático sobre a viabilidade da configuração un itária do instituto,fa ce à contrapo­
sição entre as diferentes categorias de enriquecimento sem causa. Centro de Estudos Fiscais, Lisboa,
1996,371 ss.
Gareth Jones, U njust Enrichm ent and the Fiduciary D uty o f L oyalty, 84 LQR, 1968, 472-502:
embora invoque uma certa identidade entre os dois institutos, o autor acaba por reconhecer
que, em situações pontuais, os fiduciários serão judiciahnente responsabüizados, apesar de
os benefi'cios obtidos não estarem, à luz da doutrina do enriquecimento sem causa, vedados.
(1878) 11 Ch D 772-778,778. Sealy, Fiduciary Relationships, cit., 73-74; Ernest J. Weinrib, The Fiduciary O bligation, cit., 5;
Cit., 778. Easterbrook e Fischel, C ontract and Fiduciary D uty, cit., 435: descrevem a teoria como sendo
™ Cit., 54-56. circular.

296 297
 § 3 0 .» T E O R IA S DO IN T E R E S S E

A teoria, nestes exatos termos, foi objeto de algumas críticas^^®. No

núcleo do seu não acolhimento encontramos a ideia de que a obrigação,
legal ou contratual, de atuar no interesse de outrem não consubstancia
uma especificidade das relações de confiança. Em qualquer relação jurí­
dica, por muito simples que seja, as partes, conquanto busquem fins indi­
viduais, comprometem-se, mesmo que fiidiretamente, a atuar de forma a
que os propósitos, autónomos ou conjuntos, dos restantes intervenientes
sejam prosseguidos e alcançados. A obrigação de acautelar a posição jurí­
dica das contrapartes é um reflexo da sua natureza sinalagmática, sendo
especialmente visível no seio das relações duradouras, e na presença
§30.“ TEORIAS DO INTERESSE constante do princípio da boa-fé, ao longo da pendência do contrato
(762.°/2 do CC).
Não se trata de críticas substantivas, mas antes formais, dirigidas à
120. Ciência Jurídica anglófona
construção ffásica. Da leitura de Scott, toma-se evidente que o Autor
pretende circunscrever o conceito de fiduciário a posições muito concre­
I. A conceitualização de uma doutrina unitária baseada na prossecu­ tas e específicas.
ção de interesses de terceiros encontra o seu fundamento no §170 - que
tem Duty o f Loyalty - do First Restatement o f Trusts, datado II. Apesar das críticas apontadas, a Ciência Jurídica anglófona tende
dc 1933 •
a definir o fiduciário como sendo um sujeito que assume a obrigação de,
no âmbito de uma determinada posição jurídica, prosseguir os interes­
(1) The trustee is under a duty to the beneficiary to administer the trust ses do beneficiário em detrimento dos demais interesses, próprios ou de
solely in the interest of the beneficiary. terceiros. Os próprios autores que defendem outras teorias acabam por
reconhecer ser este o ponto de partida de qualquer análise^^®: a censura à
Partindo deste preceito, Austin Scott, o primeiro Autor a delibe- teoria do iateresse, independentemente das particularidades assumidas
radamente procurar uma sistematização unitária, propõe a seguinte por cada autor, reside na excessiva abstração que subjaz à ideia da “atua­
definição^^;
ção no interesse de outrem”, o que a torna sujeita a múltiplos preenchi­
mentos e sentidos.
A fiduciary is a person who undertakes to act in the interest o f another
person. III. No seio das teorias do interesse, cumpre destacar uma doutrina espe­
cífica: a da expectativa razoável. Para Finn, Autor que primeiro a explorou,
as relações fiduciárias emergem em todas as situações nas quais foi criada a
expectativa, por parte de um sujeito, na esfera jurídica de outrem, de que o

Mitchell Franklin, The H istorical Function o f the A m erican L aw Institute: Restatem ent as Transi­
tional Codification, 47 Harv L Rev, 1934,1367-1394: apanhado geral do papel dos Restatem ents.
Mattheiv Conaglen, Fiduciary L oyalty: Protecting the Due Performance o f N on-Fiduciary D uties,
Sobre o F irst Restatem ents o f Trust, vide: Thurman Arnold, The Restatem ent o f the L aw o f
Hart, Oxford, 2010, 246-247: referências bibliográficas; Laby, The Fiduciary O bligation, cit.,
Trusts, 31 Colum L Rev, 1931,800-823.
131.
Austin W. Scott, The Fiduciary Principle, 37 Cal L Rev, 1949,539-SSS, 540.
Gordon Smith, The C ritical Resource, cit., 1042.

298
299

D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
primeiro irá atuar em benefício do segundó, subalternizando os seus interes­
ses pessoais^^'’.
Defendida por alguma doutrina^^® e seguida em diversas decisões juris-
prudenciais^^®, a teoria da expectativa não pode também ser acolhida.
O conceito de expectativa está longe de se encontrar consolidado no Direito
anglo-saxónico^5°, o que impele muitos autores a considerá-lo juridicamente
irrelevante: as expectativas, ao contrário dos deveres, não podem ser judicial­
mente exigidas^^^
Na sua globalidade, a teoria introduz maior complexidade na discussão,
sem apontar soluções claras^®^.
121. Ciência Jurídica germ ânica
I. Com o acim a indicám os, a teo ria expansionista germ ânica, apesar de
não poder ser assum ida à luz dos seus propósitos originários - recons­
trução do conceito de negócio fiduciário apresenta-se de extrem a u ti­
lidade na conceitualização sistem atizadora de um a doutrina fiduciária
unitária.
Paul D. Finn, Fiduciary O bligations, The Law Book Co., Sidney, 1977,172-173.
DeMott, Breach o f Fiduciary D uty, cit.
A rklow Investm ents L td V M aclean [2000] 1WLR 594-602,598: “ the concept encaptures a situa­
tion where one person is in a relationship w ith another which gives rise to a legitim ate expectation, which
equity recognizes, th at thefiduciary w ill not utilize his or herposition in such a w ay w hich is adverse to the
, R v N eil [2002] 3 SCR 631, [16]; M clnem ey v M acD onald [1992] 2 SCR
interests o f the p rin cip al’■
138, [20]; H odgkinson v Sim m s [1994] 3 SCR 377, [28]; C him side v Fay [2007] 1NZLR 433-484,
460; H agem an vH olm es [2009] EWHC 50 (Ch), [52].
John H. Baker, From Sanctity o f C ontract to Reasonable Expectations, 32 CLP, 1979,18-39, 33:
0 Autor aponta a inserção do conceito de razoabihdade como a maior fragilidade da teoria;
Bailey H. Kuklin, The P lau sib ility o f L egally Protecting Reasonable Expectations, 32 Val U L Rev,
1997,19-66.
Catherine Mitchell, Leading a L ife o f Its O wn? The Roles o f Reasonable Expectation in Contract
L aw , 23 OJLS, 2003, 639-665: ao anahsar o conceito numa perspetiva contratual, a Autora
apercehe-se da irrelevância jurídica do conceito. Um contrato caracteriza-se pela possibili­
dade de os deveres assumidos poderem ser judiciahnente exigidos, o que, definitivamente,
não acontece no âmbito da simples expectativa.
Conaglen, Fiduciary L oyalty, cit., 250-251: esta construção representa uma outra forma de
expor a teoria da discrícionaríedade.
300
§ 3 0 .“ T E O R IA S DO IN T E R E S S E
A proxim idade da construção com o id eal fiduciário anglo-saxónico,
1
W dem onstrativo de um pensam ento com um , abre, para m ais, as portas a
[: um a consoHdação que extravase as fronteiras dos dois grandes sistem as
jurídicos dom inantes.
i Do ponto de vista científico, a precisão que caracteriza o pensam ento
í: jurídico alem ão facilita a d o ^ a tiz a ç ã o das conceções avançadas pelos
* mais relevantes teóricos fiduciários anglófonos.
II. A suposta excessiva am plitude da teo ria sufragada p or Scott favo­
receu a consolidação das críticas que lhe foram dirigidas. R elem bre-se.
em qualquer relação sinalagm ática, as partes com prom etem -se, nem que
seja por aplicação do disposto no artigo 762.°/2 do CC, a p rosseguir tam ­
bém os interesses da contraparte, p elo que não poderia certam ente ser
este o elem ento indentificador das relações de confiança.
A tese de B eyerle perm ite esclarecer o alcance da teoria do jurista
estado-unidense. Para o ilu stre germ anista, é possível agrupar as relações
jurídicas em três grandes categorias: (i) relações sinalagm áticas: carac­
terizadas por um equÜíbrio dos diferentes interesses em questão; (ii)
relações de com propriedade: já não é o interesse individual que é prosse­
guido, m as o interesse de um grupo de sujeitos ou de um a com um dade;
e (iii) relações fiduciárias: distinguem -se das restantes p elo facto de o
interesse de um determ inado sujeito não ser prosseguido ou acautelado
por si próprio, individual ou conjuntam ente, m as p or um terceiro .
III G rundm ann, que recentra a problem ática na dim ensão interna do
negócio, procura a essência da posição ju ríd ica nas obrigações assum idas
pelo fiduciário^^'^. Seguindo esta lin ha de raciocínio, G rundm ann conclui
que a obrigação nuclear consiste na assunção de acautelar o
beneficiário, no âm bito de um a específica posição ou função^^l
É com L ôhnig que a teoria expansionista germ ânica m ais se apro­
xim a das construções anglófonas. Para este A utor, o conceito de negócio
fiduciário abarca todas as relações jurídicas em que a prossecução de um
determ inado interesse seja assum ida não p elo sujeito diretam ente inte-
D ir Treuhand, cit., 16 ss.
D er Treuhandvertrag, cit., 88.
Cit., 99.
301
 D IR E IT O DOS V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
ressado, mas por um terceiro^^^ Deixando de lado a reconstrução con­
ceituai proposta, centremo-nos nas consequências sistematizadoras do
ponto de vista das relações de confiança.
O jurista alemão reduz a sua teoria a dois elementos: (i) atribuição
de um poder-dever que permite, ao seu titular, intervir ou interferir na
es era de interesses de um sujeito; e (ii) uma fonte atributiva dessa titu-
andade . Esta conceção leva Lõhnig a incluir, no leque das relações de
confiança (ori^ariam ente: negócios fiduciários), um conjunto variadís-
sfino de posições: pais, tutores, curadores, administradores de insolvên­
cia, testamenteiros, comissários, agentes, concessionários, franqueados
bancos - para com os titulares das contas -, corretores ou empresas de
investimento - para com os investidores^^s sujeitos a
quem sejam atribuídos, contratual ou legalmente, poderes para atuar no
interesse de terceiros.
A tese de Lõhmng encontra na ideia da substituição o seu elemento
mais criativo: todas as relações jurídicas em que um sujeito se substitua a
outrem, na prossecução dos seus interesses individuais, devem ser defini­
das como sendo fiduciárias.
122. Posição assum ida
I. As incertezas e críticas que são dirigidas à teoria do interesse residem
na forte abstração que rodeia a própria construção, o que dificulta, nesses
exatos termos, a sua aplicação direta e imediata. É à luz desta interpreta­
ção que parte importante da moderna doutrina fiduciária britânica vem
negar a utilidade e a credibilidade em desenvolver uma doutrina unitária,
em benefício de uma análise casuística, que encontre no confronto com
as relações clássicas e na analogia os seus mecanismos por excelência^^^.
Os defensores desta doutrina parecem confundir a abstração da teoria
com a necessidade de atender aos factos concretos, aspeto que merece.
Treuhand, cit., 116.
""" Cit., 118-119.
Cit., 119.
Conaglen, Fiduciary L oyalty, cit., 254 ss. ou Paul B. Miller, The Fiduciary R elationship em
P hilosophical Foundations, cit., 63-90, 65 ss.
302
§ 3 0 .“ T E O R IA S DO IN T E R E S S E
evidentemente, a nossa total concordância’’^“, ao mesmo tempo que des­
valorizam a importância teórica e prática de revestir as relações fiduciá­
rias de uma imidade sistemática interna - quanto a este segundo ponto,
remete-se para o que introdutoriamente se escreveu.
A abstração inerente a qualquer conceito indeterminado não deve
ser encarada como um obstáculo à sua existência: é precisamente essa
maleabilidade que abre as portas à resolução transparente e científica dos
litígios reais.
II. Como ponto de partida, devemos assim reconhecer que a expres­
são atuação no interesse de outrem, em resultado da indeterminabilidade
do conceito de interesse, está sujeita a incontáveis preenchimentos’“^
A multiplicidade de situações em que o vocábulo é empregue exige uma
compartimentação das diversas aceções, sob pena de as soluções preconi­
zadas não terem qualquer relevância científica e prática. Aquando da sua
materiahzação, o intérprete deve ter em consideração as exatas circuns­
tâncias em que a expressão é empregue’“^.
O mesmo se diga quanto à querela que opõe a visão subjetivista à
objetivista: não é possível, em abstrato, determinar se, na prossecução
dos interesses do beneficiário, o fiduciário deve atender às pretensões
pessoais do primeiro ou às suas necessidades objetivas, com toda a carga
indeterminável inerente a este segundo caminho’““: apenas em concreto
é possível averiguar se o fiduciário violou, efetivamente, a obrigação de
prosseguir o interesse do beneficiário último da relação. Assim, e indo,
de certa forma, ao encontro da moderna escola fiduciária britânica, não
Deborah A. DeMott, Beyond M etaphor: A n A nalysis o f Fiduciary O bligation, Duke LJ, 1988,
879-924; sublinha este ponto em inúmeras passagens do estudo.
Veja-se, como ponto de partida, a incontomável tese de Paulo Mota Pinto, em dois volu­
mes, Interesse contratual negativo e interesse contratual positivo, Coimbra ed., Coimbra, 2008, em
especial, as páginas 81 ss e 481 ss, com amplas referências bibliográficas e a tese de mestrado
de Pedro de Albuquerque, D ireito depreferência dos sócios em aumento de capital nas sociedades anó­
nim as ep o r quotas, Almedina, Coimbra, 1993, 313 ss.
Mota Pinto, Interesse contratual, I, cit., 500.
António Menezes Cordeiro, D a responsabilidade civil dos adm inistradores das sociedades comer­
ciais, Lex, Lisboa, 1997,516-517 e Do trust, cit., 979-980.
303
D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S § 3 0 ." T E O R IA S DO IN T E R E S S E

nos parece possível nem útil atribuir ao conceito “prossecução do inte­
resse do beneficiário” um conteúdo substantivo predeterminado^®^.
A atribuição de um conteúdo formal ao conceito de interesse - por
oposição às conceções subjetivistas e objetivistas - é hoje assumida pela
nossa doutrina de ponta. Mota Pinto afirma que o conceito de interesse
no âmbito da responsabilidade civil, pode ser definido como “a situação
em que estaria o lesado se não fosse o evento lesivo”’’®®. Já para Menezes
Cordeiro, será “a realidade apta a satisfazer desejos ou necessidades e
que, sendo protegida pelo Direito, dá lugar, quando desrespeitada, a um
dano”^®®.
III. O conceito de “prossecução dos interesses do beneficiário” deve,
assim, ser preenchido à luz destes três critérios: (i) contexto jurídico em
que se insere; (ii) focado nas obrigações assumidas pelo fiduciário; e (iii)
despojado de qualquer elemento subjetivo apriorístico^®’’.
O primeiro critério é, quase na sua totahdade, absorvido pelo segundo.
O contexto é um reflexo das obrigações assumidas pelo fiduciário: este
compromete-se a apenas prosseguir o interesse do beneficiário da rela­
ção, ou seja, o exercício da posição de confiança é moldada pela obriga­
ção de atuar no interesse do beneficiário. Na sua anotação ao complexo
artigo 64.“ do CSC, que encontra um paralelo evidente no artigo 304.“/2
do CVM, Menezes Cordeiro apresenta o conceito de interesse “como
exprimindo um círculo de valores protegidos por determinada norma ou
conjunto de normas”^®®.
A avaliação jurisdicional do cumprimento da prossecução ou não
prossecução dos interesses do beneficiário deve ser feita numa perspetiva
concretizadora, focada nas obrigações que moldam o conteúdo da posi­
ção jurídica. Em termos simplificadores, mas nem por isso imprecisos, o
fiduciário prossegue o interesse do beneficiário (“círculo de valores”) se
da sua atuação não resultar qualquer violação dos deveres que moldam a
posição ocupada (“conjunto de normas”).
Levando este raciocínio até ao fim, podemos apresentar o conceito de
interesse, neste contexto - prossecução de interesse -, como exprimindo
0 conjunto de obrigações que, em concreto, adstringem o fiduciário.
A ideia de círculo de valores, que corresponde à posição do beneficiário,
é absorvida pela expressão “em concreto”.
IV. Na busca por uma concretização do conceito de prossecução dos
interesses dos beneficiários, importa identificar o dever comum a todas
as posições fiduciárias - administradores, intermediários financeiros
ou sociedades gestoras de patrimónios coletivos - e que molda e limita
as respetivas atuações. É inequívoco que se trata do dever de lealdade
(artigo 64.“ do CSC, artigo 304.72 do CVM e artigo 68 .7 I do RJOIC). É o
cumprimento ou 0 incumprimento do dever de lealdade que nos permite
concluir pela obediência à obrigação de atuar no interesse do beneficiá­
rio último da relação, maxime, o investidor.

Ana Peresttelo de Oliveira, G rupos de sociedades de deveres de lealdade:por um critério unitário da

solução do “conflito de grupo”, Aknedina, Coimbra, 223: a Autora mostra-se muito crítica quanto
à operatividade do conceito.
Interesse, I, cit., 846.
Tratado de D ireito civil, VI, 2.“ ed, Almedina, Coimbra, 2012,311-312.
Dá-se, assim, seguimento às críticas formuladas pela doutrina fiduciária moderna britâ­
nica, preocupada com a excessiva abstração do conceito.
Anotação ao artigo 64° do C SC em CSC/M C, 2.“ edição, Almedina, Coimbra, 2011, 250-255,
253.

304 305

§ 31.° 0 DEVER DE LEALDADE
123. O rigens e fundam ento
I. É hoje muito comum, entre nós - por influência estado-unidense
-, apresentar-se a posição jurídica dos administradores como estando
estruturada em tomo de dois grandes deveres, descritos como flduciá-
rios: deveres de cuidado e deveres de lealdade^®®. Esta interpretação é
histórica, hnguística e conceitualmente imprecisa^^°.
™ Sem propósitos exaustivos. Doutrina: Paulo Câmara, O governo das sociedades e os deveresfidu­
ciários dos adm inistradores em Jornadas sociedades abertas, valores m obiliários e interm ediaçãofinancei­
ros, coordenação de Maria Fátima Ribeiro, Almedina, Coimbra, 2007,163-179; Pedro Pais de
Vasconcelos, Businessjudgem ent rule, deveres de cuidado e de lealdade, ilicitude e culpa e o artigo 64° do
Código das Sociedades Com erciais, 1DSR, 2009,41-79, em especial 63 ss; Ricardo Costa/Gabriela
Figueiredo Dias, A notação ao artigo 64° do C SC em CSC/CA, I, Almedina, Coimbra, 2010,726
ss; Hugo Moredo Santos/Orlando Vogler Guiné, D everesfiduciários dos adm inistradores: algum as
considerações (passado, presente efuturo), S RDS, 691-711. Jurisprudência: RPt 12-abr.-2012 (Leo­
nel Serôdio), proc. n.°9836/09.6TBMAI.P1: citando Pais de Vasconcelos.
Embora muito divulgada para lá do Atlântico, a interpretação é criticada por inúmeros
autores: Deborah A. DeMott, Beyond M etaphor: A n A n alysis o f Fiduciary O bligation, Duke LJ,
1988,879-924,915; D. Gordon Smith, The C ritical Resource Theory o f Fiduciary D uty, 55 Vand L
Rev, 2002,1399-1497,1409; Larry E. Ribstein, A reFartnersFiduciaries?, U lU L Rev, 2005,209-
253,220; Wilham Gregory, The Fiduciary D uty o f Care: A Perversion o f Words, 38 Akron L Rev,
2005,181-206; Carter G. Bishop, A Good Faith R evival o f D uty o f Care L iab ility in Business Organ­
ization L aw , Tulsa L Rev, 2006,477-512,480 - o Autor veio posteriormente a abandonar esta
posição: The D eontological Significance o f N onprofit Corporate Governance Standards: A Fiduciary
D uty o f Care w ithout a Remedy, 57 Cath UL Rev, 2008, 705-776; Darian M. Ibrahim, In d ivid ual
306
§ 31.° O D E V E R D E L E A L D A D E
A expressão dever de lealdade encontra no termo dever fiduciário um
evidente sinónimo: todos os elementos disponíveis, tanto de ordem his­
tórica como de ordem dogmática, apontam nesse sentido. Não é, assim,
adequado apresentar o dever de lealdade como sendo um dever fiduciá­
rio; o dever de lealdade é o dever fiduciário.
Também a recondução do dever de cuidado ao leque dos deveres fidu­
ciários não pode ser aceite: desconsidera as origens de ambos os concei­
tos e dificulta a sua compreensão.
O dever de cuidado anglo-saxónico corresponde ao continental dever
de atuar diligentemente e que molda qualquer posição jurídica - o campo
de aplicação dos artigos 487.°/2 e 799.°/2, ambos do CC, é total, abran­
gendo todo o sistema: qualquer titular de uma obrigação está obrigado
atuar diligentemente. As diferenças existentes residem no grau de dili­
gência exigida e não na sua exLgibilidade^^^
II. Dogmaticamente, é discutido se os deveres de lealdade se fundam
na boa-fé, especialmente nos moldes previstos no artigo 762.°/2 do CC,
ou na dimensão fiduciária das relações de confiança, pese o pleonasmo^^^.
O Professor Carneiro da Frada, Autor que entre nós maior atenção
dedicou ao problema, defende esta última posição, argumentando, sucin­
tamente, que o dever de lealdade, em face da centralidade que desempe­
nha neste tipo de relação - em que um sujeito assume a obrigação de
prosseguir, no âmbito dessa posição, os interesses de outrem -, extravasa,
a largamente, a ratio subjacente à imposição de deveres acessórios assentes
no princípio da boa-fé. Em suma, a recondução dos deveres de lealdade
ao universo do 762.°/2 do CC desconsidera o papel desempenhado por
esta situação passiva, tanto ao nível da estrutura da relação como do con­
teúdo da posição do fiduciário^^^.
or Collective L iab ility fo r Corporate D irectors, 93 Iowa L Rev, 2008, 929-971, 961; Kelh A. Alces,
D ebunking the Corporate Fiduciary M ith, 35 J Corp L, 2009, 230-282, 250.
Veja-se no nosso Deveres fiduciários de cuidado: imprecisão linguística, histórica e conceituai,
7RDS, 2015.
Ricardo Costa e Gabriela Figueiredo Dias, A notação ao artigo 64° do CSC em CSC/CA, Vol.
I, cit., 743: apanhado geral da doutrina, com referências bibliográficas.
Manuel Carneiro da Frada, A Business Judgm ent R ule no quadro dos deveres gerais dos adm inis­
tradores em Jornadas sociedades abertas, valores m obiliários e interm ediação financeira, coordenação
Maria de Fátima Ribeiro, Almedina, Coimbra, 2007, 201-242, 209-210.
307
 D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
Embora também nos pareça que- a apresentação dos deveres de leal­
dade como simples deveres acessórios acabe por relativizar o papel indis­
cutível que esta obrigação assume em todas as relações fiduciárias, não
nos parece que as duas doutrinas sejam irreconciliáveis.
III. Partindo do pressuposto de que as relações de confiança se carac­
terizam-se pela assunção da obrigação de atuar no interesse de outrem,
parece certo que os deveres de lealdade emergem, não como deveres
acessórios, mas como uma decorrência direta da própria prestação prin­
cipal, afastando-se, deste modo, do instituto previsto no artigo 762.°/2
do CC.
Mas a não recondução ao universo do 762.°/2 do CC não se traduz
num afastamento da boa-fé. De resto, a evolução e o preenchimento dos
deveres de lealdade, nos moldes desenvolvidos pela Ciência Jurídica con­
tinental, são devedores deste princípio. Foi no seu seio e recorrendo à sua
dogmática que a Ciência Jurídica romanística conseguiu sistematizar e
concretizar os deveres de lealdade^^^.
124. Deveres de lealdade positivos e deveres de lealdade negativos
I. Há uma certa tendência para circunscrever o dever de lealdade a
um conjunto de proibições de atos ou de omissões. Embora se reconheça
que é no campo da sua dehmitação negativa que os deveres de lealdade
assumem maior interesse e densidade dogmática e prática, isso não sig­
nifica que os deveres de lealdade não imponham igualmente obrigações
defacere.
Assim, entende-se que os deveres de lealdade positivos obrigam o
fiduciário a atuar sempre no interesse do beneficiário da relação^^^. Nesta
perspetiva, o dever de lealdade aproxima-se do próprio conteúdo da
obrigação principal. Distinga-se, exemplificando.
™ O nosso, D outrina das oportunidades societárias (corporate opportunities doctrinej. P arte II:
D ireito português, 5 RDS, 2013, 741-778, 758 ss: o mesmo problema se coloca no âmbito da
determinação da natureza jurídica da proibição de concorrência.
Veja-se a obra clássica de Günter Freese, D ie positive Treupflicht: E in B eitrag zu r K onkretisie­
rung von Treu und G lauben, Münster, 1970.
308
§ 31.“ 0 D E V E R D E L E A L D A D E
O cliente X recorre ao intermediário Y em busca de aconselhamento
financeiro.
Prestação principal; aconselhamento.
Dever de lealdade positivo: recomendar os investimentos que melhor
se adequem ao cliente em concreto.
II. Pela negativa, os deveres de lealdade desenvolveram-se, recorrendo
à terminologia anglo-saxónica, em tomo de dois grandes princípios
estmturantes: a no conflict rule es.noprofit rule'^'^^.
A no conflict rule veda, aos fiduciários, todo o tipo de atuação da qual
possa originar um conflito entre os interesses do beneficiário e os seus
interesses pessoais, enquanto a no profit rule impede, aos mesmos sujeitos,
a obtenção de lucros através da posição ocupada, salvo se previstos ou
devidamente autorizados’^^1
O dever de evitar conflitos de interesses apresenta-se como a garantia
última do cumprimento do contrato concluído e, de maior relevância, da
efetiva prossecução dos interesses do beneficiário^^®.
A proibição de obter lucros ou benefícios não contratualizados ou
autorizados, embora dogmaticamente dependente do dever de evitar
conflitos, permite resolver situações em que, embora possa não existir um
claro conflito, o fiduciário utilize a sua posição não no exclusivo interesse
do beneficiário, mas em seu benefício pessoaF^’ - fica, porém, a dúvida se
estes casos não poderiam simplesmente ser resolvidos por invocação da
dimensão positiva dos deveres de lealdade.
Do trust, cit., 519 ss.
^ B ristol & W est B uilding Society v M othew [1998] Ch 1-28,18; Don K in g Productions Inc v W arren
[1999] 2 All ER 218-240, 238-239; S in clair Investm ents (UK) L td v Versailles Trade Finance L td
[2010] EW H C1614 (Ch), [29].
Sn ell’s E quity, 32.* ed.. Sweet & Maxwell, Londres, 2010,
Quanto à autonomia da noproflt rule, veja-se: Do trust, cit., 539.
309

§ 32.° RELAÇÕES DE CONFIANÇA NO DIREITO DOS VALORES MOBILIÁRIOS
125. Enquadram ento
I. A complexidade dos mercados financeiros, aliada à importância
crescente das relações de confiança, fruto das especificidades da época
em que vivemos, torna o Direito dos valores mobiliários um ramo parti­
cularmente permeável à emergência deste tipo de relação.
De entre o leque existente, destaca-se, em face da transversalidade
que se lhe reconhece, a relação estabelecida entre os intermediários
financeiros. Atente-se ao disposto nos artigos 304.°/l:
Os intermediários financeiros devem orientar a sua atividade no
sentido da proteção dos legítimos interesses dos seus clientes.
e 309.°/3:
O intermediário financeiro deve dar prevalência aos interesses do
cliente, tanto em relação aos seus próprios interesses ou de sociedades
com as quais se encontra em relação de domínio ou de grupo, como
em relação aos interesses dos titulares dos seus órgãos ou dos agentes
vinculados e dos colaboradores de ambos.
A obrigação de atuar no interesse do beneficiário último, trave mes­
tra das relações fiduciárias, impõe-se também, a título exemplificativo,
às entidades gestoras de fundos de investimento. Veja-se o disposto no
artigo 6 8 .7 1 do RJOIC:
310
§ 3 2 .“ R E L A Ç Õ E S DE C O N F IA N Ç A NO D IR E IT O DOS V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
A entidade gestora age de modo independente e no exclusivo inte­
resse dos participantes.
É no seio de ambos os preceitos que podemos encontrar não apenas o
embrião do dever de lealdade, como a sua dimensão ativa: obrigação de
atuar no interesse dos clientes^®“ e obrigação de atuar no interesse dos
participantes.
Como exemplo acabado de uma concretização do dever de lealdade
positivo, refira-se o dever de, no âmbito da atividade de intermediação,
evitar perdas financeiras dos clientes.
n. Como referimos introdutoriamente, é no campo da dimensão pas­
siva dos deveres de lealdade que o instituto assume uma maior densifica-
ção concretizadora.
O legislador português, por ascendência comunitária, positivou, nos
artigos 309.° e seguintes, um complexo regime de conflito de interesse
do qual se pode aduzir um vasto conjunto de condutas proibidas, dog­
maticamente dependentes dos deveres de lealdade, de entre as quais
destacamos’^®^:
- A obtenção de ganhos financeiros, em detrimento do cliente;
- O aconselhamento de investimento ou a prática de operações por
conta dos cHentes nos quais o intermediário detenha, direta ou indi­
retamente, interesses pessoais;
- A receção de benefícios, patrimoniais ou de outra natureza, com o
fim de privilegiar ou prejudicar os interesses de um cliente;
- Práticas concorrenciais com atividades desenvolvidas por clientes.
Não se desconhece, evidentemente, que o termo lealdade é empregue no artigo 304.°/2.
Porém, a forma confusa e pouco cuidada do texto legal desaconselha o seu tratamento, quando
não acompanhado de uma profunda descontração exegética, sistemática e teleológica, 0 que
extravasa o propósito do presente trabalho. Veja-se 0 estudo inicial de José Fazenda Mar­
tins, Deveres dos interm ediários financeiros, em especial, os deveres p ara com os clientes e 0 mercado,
7 CadMVM, 2000,330-349.
Sofia Leite Borges, O conflito de interesses na interm ediação finan ceira em Conflitos de interesses
no D ireito societário efinanceiro: um balanço a p a rtir da crisefinan ceira, Almedina, Coimbra, 2010,
316-425.
3II
 § 3 2 .“ R E L A Ç Õ E S D E C O N F IA N Ç A NO D IR E IT O DOS V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
DIREITO DOS VALORES MOBILIÁRIOS

confiança. Quer os advogados, quer as instituições de crédito e os analis­

126. Os gatekeepers
tas financeiros podem, dependendo, evidentemente, do exato contexto
que envolve a relação com os respetivos clientes, ser reconduzidos a este
I. Na já clássica definição de John CoíFee Jr., o conceito àe gatekeepei^^
refere-se a um intermediário, com forte reputação no mercado, que for­ universo.
nece serviços de verificação ou de certificação aos investidores^®^. Nestes
exatos termos, a definição apenas abrange a dimensão profilática da fun­
n. Os gatekeepers não desempenham uma função fiduciária’’®®, visto não
assumirem a obrigação de atuar, no âmbito dessa precisa posição jurídica,
ção, desconsiderando, consequentemente, o papel muitas vezes repre­
sentado por estes sujeitos no sentido de desvendar manipulações do mer­ no interesse de beneficiários específicos.
Mas o facto de não serem fiduciários não significa que a sua atuação
cado e demais atuações ilícitas^®^.
seja hvre: enquanto sujeitos mobiliários que são, estão sempre obri­
Quanto ao uso do termo investidores, também não será o mais ade­
gados a reger-se pelos omnipresentes princípios da integridade e da
quado, pense-se nos serviços prestados pelas agências de notação às enti­
transparência.
dades emitentes.
A exclusão dos guardiões do universo fiduciário impossibilita, à pri­
Como guardiões mobiliários entende-se todo o sujeito privado que
meira vista, a aplicação direta ou analógica do dever de lealdade, na
fornece serviços de verificação, certificação e controlo de legalidade, no
medida em que este se traduz numa subaltemização dos interesses pró­
âmbito da atividade mobiliária ou com ela relacionada.
prios em proveito dos interesses dos beneficiários. Na realidade, os gate­
Como exemplos clássicos de gatekeepers contam-se os auditores exter­
nos^®® e as agências de notação de risco^®®. A este núcleo duro, alguns
keepers apenas não estão sujeitos a deveres de lealdade positivos, mas o
mesmo já não se verifica em relação aos deveres de lealdade negativos,
autores acrescentam outros sujeitos: analistas financeiros, quando dis­
assentes grosso modo, nas anglo-saxónicas no conflict rule e no profit rule .
ponibilizam análises objetivas sobre, por exemplo, prospectos de inves­
Sem negar as especificidades de ambas as realidades, um tratamento
timento; instituições associadas à banca de investimento, quando for­
parcelarmente conjunto poderá fornecer importantes elementos práticos
necem pareceres sobre oportunidades de negócios mobiliários ou os
e dogmáticos que permitam fortalecer uma tão necessária sistematização
advogados, especialistas na área, sempre que apresentam pareceres jurí­
científica de uma área com uma importância real e jurídica incontornável.
dicos fundados’^®^.
A recondução destas posições ao universo dos guardiões mobüiário só
será possível na medida em que não consubstanciem efetivas relações de

Alguma doutrina nacional propõe a tradução direta para guardiões; Paulo Câmara,
O governo das sociedades em Portugal: um a introdução, 12 CadMVM, 1999, 45-55, 51 ou José
Ferreira Gomes, D a adm inistração à fiscalização das sociedades: a obrigação de vigilân cia dos órgãos da
sociedade anónim a, Almedina, Coimbra, 2015,464.12
John C CoíFee, Jr., Gatekeeper Failure and Reform : The Challenge o f Fashioning R elevant Reforms,
84 BU L Rev, 2004, 301-364,309.
Arthur B. Laby, D ifferentiating Gatekeepers, 1 Brook J Corp Fin & Com L, 2006,119-163,123.
Numa recente e polémica decisão, o N orth Caroline C ourt o f A ppeal veio considerar que
José Ferreira Gomes, A uditors as Gatekeepers: The European Reform o f A uditors’ L egal Regime
os auditores externos ocupam uma posição fiduciária em relação aos chentes auditados.
and the A m erican Influence, 11 Colum J Eur L, 2005, 665-703.
Commscope Credit Union v B utler & Burke, L L P , 764 SE 2d 642-652 (NC App, 2014).
Frank Partnoy, H ow and W hy Credit R atin g Agencies A re N ot L ike O ther Gatekeepers, University
G a b r ie la F ig u e ire d o Dias, Interesses e conflito de interesses em auditoria e m Conflito de interesses,
of San Diego, Research Paper n.°0 7 -4 6 , maio de 2006 (Net).
cit., 565-627.
Coffee, Jr., Gatekeeper Failure, cit., 309.
313
312
 AnexoI
Regulations - 17 CFR 230.901-905

§230,901 G eneral statem ent.

For the purposes only of section 5 of the Act (15 U.S.C. §77e), the terms
offer, offer to sell, sell, sale, and offer to buy shall be deemed to include offers
and sales that occur within the United States and shall be deemed not to include
offers and sales that occur outside the United States.

§230.902 D efinitions.

As used in Regulation S, the following terms shall have the meanings

indicated.
(a) Debt securities. “Debt securities” o f an issuer is defined to mean any
security other than an equity security as defined in §230.405, as w ell as the
following:
(1) Non-participatory preferred stock, which is defined as non-convertible
capital stock, the holders o f which are entitled to a preference in payment of
dividends and in distribution o f assets on hquidation, dissolution, or winding up
of the issuer, but are not entitled to participate in residual earnings or assets of
the issuer; and
(2) Asset-backed securities, which are securities of a type that either:
(i) Represent an ownership interest in a pool o f discrete assets, or cer­
tificates of interest or participation in such assets (including any rights
designed to assure servicing, or the receipt or timeliness o f receipt by

315
 D IR E IT O DOS V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
ANEXO I

holders O f such assets, or certificates o f interest or participation in such

(iii) Oversight by a governmental or self-regulatory body;
assets, o f amounts payable thereunder), provided that the assets are not
(iv) Oversight standards set by an existing body o f law;
generated or originated between the issuer o f the security and its affilia­
tes; or (v) Reporting of securities transactions on a regular basis to a govern­
mental or self-regulatory body;
(u) Are secured by one or more assets or certificates o f interest or par­
(vi) A system for exchange o f price quotations through common com­
ticipation m such assets, and the securities, by their terms, provide for
munications media; and
payments o f principal and interest (if any) in relation to payments or
(vii) An organized clearance and settlement system.
reasonable projections o f payments on assets meeting the requirements
(c) Directed selling efforts.
o f paragraph (a)(2)(i) of this section, or certificates o f interest or parti­
(1) “Directed selling efforts” means any activity undertaken for the purpose
cipations in assets meeting such requirements.
of, or that could reasonably be expected to have the effect of, conditioning the
(iii) For purposes o f paragraph (a)(2) o f this section, the term “assets”
market in the United States for any o f the securities being offered in reliance
means secunties, installment sales, accounts receivable, notes, leases or
on this Regulation S (§ 230.901 through §230.905, and Preliminary Notes).
o er contracts, or other assets that by their terms convert into cash over
a finite period o f time. Such activity includes placing an advertisement in a pubhcation “with a general
circulation in the United States” that refers to the offering o f securities being
(b) Designated offshore securities market. “Designated offshore securities
market means: made in rehance upon this Regulation S.
(2) Publication “with a general circulation in the United States”:
(1) The Eurobond market, as regulated by the International Securities
(i) Is defined as any publication that is printed primarily for distribution
Market Association; the Alberta Stock Exchange; the Amsterdam Stock
in the United States, or has had, during the preceding twelve months,
Exchange; the Australian Stock Exchange Limited; the Bermuda Stock
an average circulation in the United States o f 15,000 or more copies per
Exchange; the Bourse de Bruxelles; the Copenhagen Stock Exchange;
issue; and
the European Association o f Securities Dealers Automated Quotation,-
(ii) WiU encompass only the US. edition of any publication printing a
t e Frankfurt Stock Exchange; the Helsinki Stock Exchange; The Stock
separate US. edition if the pubhcation, without considering its US. edi­
Exchange o f Hong Kong Limited; the Irish Stock Exchange; the Istanbul
tion, would not constitute a pubhcation with a general circulation in the
Stock Exchange; the Johannesburg Stock Exchange; the London Stock
United States.
Exchange; the Bourse de Luxembourg; the Mexico Stock Exchange;
(3) The following are not “directed selhng efforts”:
the Borsa Valori di Milan; the Montreal Stock Exchange; the Oslo Stock
(i) Placing an advertisement required to be pubhshed under US. or
Exchange; the Bourse de Paris; the Stock Exchange o f Singapore Ltd.;
foreign law, or under rules or regulations o f a US. or foreign regulatory
the Stockholm Stock Exchange; the Tokyo Stock Exchange; the Toronto
or self-regulatory authority, provided the advertisement contains no
Stock Exchange; the Vancouver Stock Exchange; the Warsaw Stock
more information than legally required and includes a statement to the
Exchange and the Zurich Stock Exchange; and
effect that the securities have not been registered under the Act and may
(2) Any foreign securities exchange or non-exchange market designated
not be offered or sold in the United States (or to a US. person, if the
by the Commission. Attributes to be considered in determining whether
advertisement relates to an offering under Category 2 or 3 (paragraph
to designate an offshore securities market, among others, include:
(b)(2) or (b)(3)) in § 230.903) absent registration or an apphcable
(i) Organization under foreign law;
exemption fi-om the registration requirements;
(ii) Association with a generally recognized community o f brokers,
(ii) Contact with persons excluded from the definition o f “US. person”
dealers, banks, or other professional intermediaries with an estabh-
pursuant to paragraph (k)(2)(vi) o f this section or persons holding
shed operating history;
accounts excluded firom the definition o f “US. person” pursuant to
316

317
 D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
paragraph (k)(2)(i) of this section, solely in their capacities as holders of
such accounts;
(iii) A tombstone advertisement in any publication with a general circu~
lation in the United States, provided:
(A) The publication has less than 20% of its circulation, calculated by
aggregating the circulation of its U.S. and comparable non-U.S. edi­
tions, in the United States;
(B) Such advertisement contains a legend to the effect that the secu­
rities have not been registered under the Act and may not be offered
or sold in the United States (or to a U.S. person, if the advertisement
relates to an offering under Category 2 or 3 (paragraph (b)(2) or (b)
(3)) in §230.903) absent registration or an applicable exemption
from the registration requirements; and
(C) Such advertisement contains no more information than:
(1) The issuer’s name;
(2) The amount and title of the securities being sold;
(3) A brief indication of the issuer’s general type of business;
(4) The price of the securities;
(5) The yield of the securities, if debt securities with a fixed (non-
-contingent) interest provision;
(6) The name and address of the person placing the advertisement,
and whether such person is participating in the distribution;
(7) The names of the managing underwriters;
(8) The dates, if any, upon which the sales commenced and
concluded;
(9) Whether the securities are offered or were offered by rights
issued to security holders and, if so, the class of securities that are
entitled or were entitled to subscribe, the subscription ratio, the
record date, the dates (if any) upon which the rights were issued
and expired, and the subscription price; and
(10) Any legend required by law or any foreign or U.S. regulatory
or self-regulatory authority;
(iv) Bona fide visits to real estate, plants or other facilities located in the
United States and tours thereof conducted for a prospective investor by
an issuer, a distributor, any of their respective affiliates or a person acting
on behalf of any of the foregoing;
318
ANEXO I
(v) Distribution in the United States of a foreign broker-dealer’s quota­
tions by a third-party system that distributes such quotations primarily
in foreign countries if:
(A) Securities transactions cannot be executed between foreign bro­
ker-dealers and persons in the United States through the system; and
(B) The issuer, distributors, their respective affiliates, persons acting
on behalf o f any of the foregoing, foreign broker-dealers and other
participants in the system do not initiate contacts with U.S. persons
or persons within the United States, beyond those contacts exempted
under §240.15a-6 o f this chapter;
(vi) Pubhcation by an issuer of a notice in accordance with §230.135 or
§230.135c;
(vü) Providing any journalist with access to press conferences held out­
side o f the United States, to meetings with the issuer or selling security
holder representatives conducted outside the United States, or to writ­
ten press-related materials released outside the United States, at or in
which a present or proposed offering of securities is discussed, if the
requirements of §230.135e are satisfied; and
(viii) Publication or distribution o f a research report by a broker or dea­
ler in accordance with Rule 138(c) (§ 230.138(c)) or Rule 139(b) (§
230.139(b)).
(d) Distributor. “Distributor” means any underwriter, dealer, or other per­
son who participates, pursuant to a contractual arrangement, in the distribu­
tion o f the securities offered or sold in rehance on this Regulation S (§230.901
through §230.905, and Preliminary Notes).
(e) Domestic issuer/Foreign issuer. “Domestic issuer” means any issuer
other than a “foreign government” or “foreign private issuer” (both as defined
in §230.405). “Foreign issuer” means any issuer other than a “domestic issuer.”
(f) Distribution compliance period. “Distribution compliance period”
means a period that begins when the securities were first offered to persons
other than distributors in reliance upon this Regulation S (§ 230.901 through
§230.905, and Preliminary Notes) or the date o f closing o f the offering, w hi­
chever is later, and continues until the end of the period o f time specified in the
relevant provision of §230.903, except that:
(1) All offers and sales by a distributor of an unsold allotment or subs­
cription shall be deemed to be made during the distribution compliance
period;
319
 D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
(2) In a continuous offering, the distribution compliance period shall
commence upon completion o f the distribution, as determined and
certified by the managing underwriter or person performing similar
functions;
(3) In a continuous offering o f non-convertible debt securities offered
and sold in identifiable tranches, the distribution compliance period for
securities in a tranche shall commence upon completion o f the distri­
bution o f such tranche, as determined and certified by the managing
underwriter or person performing similar functions; and
(4) That in a continuous offering o f securities to be acquired upon the
exercise o f warrants, the distribution compliance period shall com­
mence upon completion o f the distribution o f the warrants, as deter­
mined and certified by the managing underwriter or person performing
similar functions, if requirements o f §230.903(b)(5) are satisfied.
(g) Offering restrictions. “Offering restrictions” means:
(1) Each distributor agrees in writing:
(i) That all offers and sales o f the securities prior to the expiration of
the distribution comphance period specified in Category 2 or 3 (para­
graph (b)(2) or (b)(3)) in §230.903, as appHcable, shall be made only
in accordance with the provisions o f §230.903 or §230.904; pursuant
to registration o f the securities under the Act; or pursuant to an available
exemption from the registration requirements o f the Act; and
(ii) For offers and sales o f equity securities o f domestic issuers, not to
ill hedging transactions with regard to such securities prior to
the expiration o f the distribution comphance period specified in Cate­
gory 2 or 3 (paragraph (b)(2) or (b)(3)) in §230.903, as applicable,
unless in compliance with the Act; and
(2) All offering materials and documents (other than press releases) used in
connection with offers and sales o f the securities prior to the expiration of
the distribution compliance period specified in Category 2 or 3 (paragraph
(b)(2) or (b)(3)) in §230.903, as applicable, shall include statements to the
effect that the securities have not been registered under the Act and may
not be offered or sold in the United States or to U.S. persons (other than
distributors) unless the securities are registered under the Act, or an exemp­
tion firom the registration requirements o f the Act is available. For offers and
sales o f equity securities o f domestic issuers, such offering materials and
documents also must state that hedging transactions involving those secu­
320
ANEXO I
rities may not be conducted unless in compliance with the Act. Such state­
ments shall appear:
(i) On the cover or inside cover page of any prospectus or offering circu­
lar used in connection with the offer or sale of the securities;
(ii) In the underwriting section of any prospectus or offering circular
used in connection with the offer or sale of the securities; and
(iü) In any advertisement made or issued by the issuer, any distributor,
any of their respective affiliates, or any person acting on behalf of any of
the foregoing. Such statements may appear in summary form on pros­
pectus cover pages and in advertisements.
(h) Offshore transaction.
(1) An offer or sale of securities is made in an “offshore transaction” if:
(i) The offer is not made to a person in the United States; and
(ii) Either:
(A) At the time the buy order is originated, the buyer is outside the
United States, or the seller and any person acting on its behalf reaso­
nably believe that the buyer is outside the United States; or
(B) For purposes of:
(1) Section 230.903, the transaction is executed in, on or through a
physical trading floor of an established foreign securities exchange
that is located outside the United States; or
(2) Section 230.904, the transaction is executed in, on or through
the facilities of a designated offshore securities market described
in paragraph (b) of this section, and neither the seller nor any per­
son acting on its behalf knows that the transaction has been pre-
-arranged with a buyer in the United States.
(2) Notwithstanding paragraph (h)(1) of this section, offers and sales of
securities specifically targeted at identifiable groups of U.S. citizens abroad,
such as members of the U.S. armed forces serving overseas, shall not be dee­
med to be made in “offshore transactions.”
(3) Notwithstanding paragraph (h)(1) of this section, offers and sales of
securities to persons excluded from the definition of “U.S. person” pursuant
to paragraph (k)(2)(vi) of this section or persons holding accounts excluded
from the definition of “U.S. person” pursuant to paragraph (k)(2)(i) of this
section, solely in their capacities as holders of such accounts, shall be dee­
med to be made in “offshore transactions.”
t
321
 D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
ANEXO I

(4) Notvãthstanding paragraph (h)(1) o f this section, publication or distri­

ties described in §230.902(a)(1), and the principal amount or principal
bution o f a research report in accordance with Rule 138(c) (§ 230.138(c')^
balance of its securities described in §230.902(a)(2), in the aggregate,
or Rule 139(b) (§230.139(b)) by a broker or dealer at or around the time of
is held of record by US. persons; and
an offenng m reliance on Regulation S (§§ 230.901 through 230.905) wiU
(iii) 20 percent or more of: The principal amount outstanding of its debt
not cause the transaction to fail to be an offshore transaction as defined in
this section. securities, the greater of liquidation preference or par value of its securi­
ties described in §230.902(a)(1), and the principal amount or principal
(i) Reporting issuer. Reporting issuer” means an issuer other than an invest­
balance of its securities described in §230.902(a)(2), in the aggregate,
ment company registered or required to register under the 1940 Act that:
is held of record by US. persons.
(1) Has a class o f securities registered pursuant to Section 12(b) or 12(g) of
(3) Notwithstanding paragraph (j)(2) of this section, substantial US. mar­
the Exchange Act (15 U.S.C. 781(b) or 781(g)) or is required to file reports
ket interest with respect to an issuer’s debt securities is calculated without
pursuant to Section 15(d) o f the Exchange Act (15 U.S.C. 78 o(d)); and
reference to securities that qualify for the exemption provided by Section
(2) Has filed all the material required to be filed pursuant to Section 13(a)
3(a)(3) of the Act (15 U.S.C. 77c(a)(3)).
or 15(d) o f the Exchange Act (15 U.S.C. 78m(a) or 78 o(d)) for a period of
(k) US. person.
at least twelve months immediately preceding the offer or sale o f securities
(l) “US. person” means:
made in reliance upon this Regulation S (§230.901 through §230.905, and
(i) Any natural person resident in the United States;
Preliminary Notes) (or for such shorter period that the issuer was required
to file such material). (ii) Any partnership or corporation organized or incorporated under the
laws of the United States;
(j) Substantial US. market interest.
(iii) Any estate of which any executor or administrator is a US. person;
(1) Substantial US. market interest” with respect to a class o f an issuer’s
equity securities means:
(iv) Any trust of which any trustee is a US. person;
(v) Any agency or branch of a foreign entity located in the United States;
(i) The securities exchanges and inter-dealer quotation systems in the
(vi) Any non-discretionary account or similar account (other than an
Umted States m the aggregate constituted the single largest market for
estate or trust) held by a dealer or other fiduciary for the benefit or
such class o f securities in the shorter o f the issuer’s prior fiscal year or the
account of a US. person;
period since the issuer’s incorporation; or
(vii) Any discretionary account or similar account (other than an estate
(u) 20 percent or more o f all trading in such class o f securities took place
or trust) held by a dealer or other fiduciary organized, incorporated, or
in, on or through the facilities o f securities exchanges and inter-dealer
(if an individual) resident in the United States; and
quotation systems in the United States and less than 55 percent o f such
(viii) Any partnership or corporation if:
tradmg took place in, on or through the facilities o f securities markets of
(A) Organized or incorporated under the laws of any foreign jurisdic­
a single foreign country in the shorter o f the issuer’s prior fiscal year or
tion; and
the period since the issuer’s incorporation.
(B) Formed by a US. person principally for the purpose of investing
(2) “Substantial US. market interest” with respect to an issuer’s debt secu­
rities means: in securities not registered under the Act, unless it is organized or
incorporated, and owned, by accredited investors (as defined in §
(i) Its debt securities, in the aggregate, are held o f record (as that term
230.501(a)) who are not natural persons, estates or trusts.
is defined in §240.12g5-l o f this chapter and used for purposes o f para­
(2) The following are not “US. persons”:
graph (j)(2) o f this section) by 300 or more US. persons;
(i) Any discretionary account or similar account (other than an estate
(ii) $1 bilhon or more of: The principal amount outstanding o f its debt
or trust) held for the benefit or account of a non-US. person by a dealer
securities, the greater o f liquidation preference or par value o f its securi-

322
323
 D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
or Other professional fiduciary organized, incorporated, or (if an indivi­
dual) resident in the United States;
(il) Any estate of which any professional fiduciary acting as executor or
administrator is a US. person if;
(A) An executor or administrator of the estate who is not a US. per­
son has sole or shared investment discretion with respect to the assets
of the estate; and
(B) The estate is governed by foreign law;
(iii) Any trust of which any professional fiduciary acting as trustee is a
U.S. person, if a trustee who is not a US. person has sole or shared invest­
ment discretion with respect to the trust assets, and no beneficiary of the
trust (and no settlor if the trust is revocable) is a U.S. person;
(iv) An employee benefit plan established and administered in accor­
dance with the law of a country other than the United States and custo-
mary practices and documentation of such country;
(v) Any agency or branch of a U.S. person located outside the United
States if:
(A) The agency or branch operates for valid business reasons; and
(B) The agency or branch is engaged in the business of insurance or
banking and is subject to substantive insurance or banking regula­
tion, respectively, in the jurisdiction where located; and
(vi) The International Monetary Fund, the International Bank for
Reconstruction and Development, the Inter-American Development
Bank, the Asian Development Bank, the African Development Bank, the
United Nations, and their agencies, affiliates and pension plans, and any
other similar international organizations, their agencies, affiliates and
pension plans.
(1) United States. “United States” means the United States of America, its
territories and possessions, any State of the United States, and the District of
Columbia.
324
r
ANEXO I
§230,903 OflFers or sales o f securities by the issuer, a distributor,
any o f their respective affiliates, or any person acting on b eh alf o f
any o f the foregoing; conditions relating to specific securities,
(a) An offer or sale o f securities by the issuer, a distributor, any o f their res­
pective affiliates, or any person acting on behalf o f any o f the foregoing, shall be
deemed to occur outside the United States within the meaning o f §230.901 if:
(1) The offer or sale is made in an offshore transaction;
(2) No directed selling efforts are made in the United States by the issuer, a
distributor, any o f their respective affiliates, or any person acting on behalf
o f any o f the foregoing; and
(3) The conditions o f paragraph (b) o f this section, as applicable, are
satisfied.
(b) Additional conditions
(1) Category 1. No conditions other than those set forth in §230.903(a)
apply to securities in this category. Securities are efigible for this category if:
(i)
The securities are issued by a foreign issuer that reasonably believes
at the commencement o f the offering that:
(A) There is no substantial U.S. market interest in the class o f securi­
ties to be offered or sold (if equity securities are offered or sold);
(B) There is no substantial U.S. market interest in its debt securities
(if debt securities are offered or sold);
(C) There is no substantial U.S. market interest in the securities to be
purchased upon exercise (if warrants are offered or sold); and
(D) There is no substantial U.S. market interest in either the conver­
tible securities or the underlying securities (if convertible securities
are offered or sold);
(ii)The securities are offered and sold in an overseas directed offering,
which means;
(A) An offering of securities o f a foreign issuer that is directed into
a single country other than the United States to the residents the­
reof and that is made in accordance with the local laws and customary
practices and documentation o f such country; or
(B) An offering of non-convertible debt securities o f a domestic issuer
that is directed into a single country other than the United States to
the residents thereof and that is made in accordance with the local
laws and customary practices and documentation o f such country.
325
 D IR E IT O DO S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
provided that the principal and interest o f the securities (or par value,
as apphcable) are denominated in a currency other than U.S. dollars
and such securities are neither convertible into U.S. doUar-denomi-
nated securities nor linked to U.S. dollars (other than through rela­
ted currency or interest rate swap transactions that are commercial
in nature) in a manner that iu effect converts the securities to U.S.
dollar-denominated securities.
(iii) The securities are backed by the full faith and credit o f a foreign gover­
nment; or
(iv) The securities are offered and sold to employees o f the issuer or its affi­
liates pursuant to an employee benefit plan established and administered
in accordance with the law o f a country other than the United States, and
customary practices and documentation o f such country, provided that:
(A) The securities are issued in compensatory circumstances for bona
fide services rendered to the issuer or its affihates in connection with
their businesses and such services are not rendered in connection
with the offer or sale of securities in a capital-raising transaction;
(B) Any interests in the plan are not transferable other than by w ill or
the laws o f descent or distribution;
(C) The issuer takes reasonable steps to preclude the offer and sale
o f interests in the plan or securities under the plan to U.S. residents
other than employees on temporary assignment in the United States;
and
(D) Documentation used in connection with any offer pursuant to the
plan contains a statement that the securities have not been registered
under the Act and may not be offered or sold in the United States
unless registered or an exemption from registration is available.
(2) Category 2. The following conditions apply to securities that are not eli­
gible for Category 1 (paragraph (b)(1)) o f this section and that are equity
securities o f a reporting foreign issuer, or debt securities o f a reporting
issuer or o f a non-reporting foreign issuer.
(i) Offering restrictions are implemented;
(ii) The offer or sale, if made prior to the expiration o f a 40-day distribu­
tion comphance period, is not made to a U.S. person or for the account
or benefit of a U.S. person (other than a distributor); and
(iii) Each distributor selling securities to a distributor, a dealer, as defi­
ned in section 2(a)(12) of the Act (15 U.S.C. 77b(a)(12)), or a person
326
ANEXO I
receiving a selling concession, fee or other remuneration in respect of
the securities sold, prior to the expiration o f a 40-day distribution com­
phance period, sends a confirmation or other notice to the purchaser
staring that the purchaser is subject to the same restrictions on offers
and sales that apply to a distributor.
(3) Category 3. The following conditions apply to securities that are not eh-
gible for Category 1 or 2 (paragraph (b)(1) or (b)(2)) of this section:
(i) Offering restrictions are implemented;
(ii) In the case o f debt securities:
(A) The offer or sale, if made prior to the expiration of a 40-day distribu­
tion comphance period, is not made to a U.S. person or for the account
or benefit o f a U.S. person (other than a distributor); and
(B) The securities are represented upon issuance by a temporary glo­
bal security which is not exchangeable for definitive securities until the
expiration o f the 40-day distribution comphance period and, for persons
other than distributors, until certification o f beneficial ownership o f the
securities by a non-US. person or a U.S. person who purchased securities
in a transaction that did not require registration under the Act;
(iii) In the case o f equity securities:
(A) The offer or sale, if made prior to the expiration o f a one-year distri­
bution comphance period (or six-month distribution comphance period
if the issuer is a reporting issuer), is not made to a U.S. person or for the
account or benefit o f a U.S. person (other than a distributor); and
(B) The offer or sale, if made prior to the expiration o f a one-year distri­
bution comphance period (or six-month distribution comphance period
if the issuer is a reporting issuer), is made pursuant to the following
conditions:
(1) The purchaser o f the securities (other than a distributor) certifies
that it is not a U.S. person and is not acquiring the securities for the
account or benefit o f any U.S. person or is a U.S. person who purcha­
sed securities in a transaction that did not require registration under
the Act;
(2) The purchaser o f the securities agrees to resell such securities
only in accordance with the provisions of this Regulation S (§230.901
through §230.905, and Preliminary Notes), pursuant to registration
under the Act, or pursuant to an available exemption from registra­
327
D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
tion; and agrees not to engage in hedging transactions with regard to
such securities unless in compliance with the Act;
(3) The securities o f a domestic issuer contain, a legend to the effect
that transfer is prohibited except in accordance with the provisions
o f this Regulation S (§§ 230.901 through 230.905, and Preliminary
Notes), pursuant to registration under the Act, or pursuant to an
available exemption from registration; and that hedging transactions
involving those securities may not be conducted unless in compliance
with the Act;
(4) The issuer is required, either by contract or a provision in its
bylaws, articles, charter or comparable document, to refuse to register
any transfer o f the securities not made in accordance with the provi­
sions o f this Regulation S (§§230.901 through 230.905, and Prelimi­
nary Notes), pursuant to registration under the Act, or pursuant to
an available exemption from registration; provided, however, that if
the securities are in bearer form or foreign law prevents the issuer of
the securities from refusing to register securities transfers, other rea­
sonable procedures (such as a legend described in paragraph (b)(3)
(iii) (B)(3) o f this section) are implemented to prevent any transfer
o f the securities not made in accordance with the provisions o f this
Regulation S; and
(iv) Each distributor selling securities to a distributor, a dealer (as defi­
ned in section 2(a)(12) o f the Act (15 U.S.C. 77b(a)(12)), or a person
receiving a selling concession, fee or other remuneration, prior to the
expiration of a 40-day distribution comphance period in the case o f debt
securities, or a one-year distribution compliance period (or six-month
distribution compliance period if the issuer is a reporting issuer) in the
case of equity securities, sends a confirmation or other notice to the pur­
chaser stating that the purchaser is subject to the same restrictions on
offers and sales that apply to a distributor.
(4) Guaranteed securities. Notwithstanding paragraphs (b)(1) through (b)
(3) of this section, in offerings o f debt securities fully and unconditionally
guaranteed as to principal and interest by the parent o f the issuer o f the
debt securities, only the requirements o f paragraph (b) of this section that
are applicable to the offer and sale o f the guarantee must be satisfied with
respect to the offer and sale of the guaranteed debt securities.
328
ANEXO I
(5) Warrants. An offer or sale o f warrants under Category 2 or 3 (para­
graph (b)(2) or (b)(3)) o f this section also must comply with the following
requirements:
(i) Each warrant must bear a legend stating that the warrant and the
securities to be issued upon its exercise have not been registered under
the Act and that the warrant may not be exercised by or on behalf o f any
U.S. person unless registered under the Act or an exemption from such
registration is available;
(ii) Each person exercising a warrant is required to give:
(A) Written certification that it is not a U.S. person and the warrant is
not being exercised on behalf o f a U.S. person; or
(B) A written opinion o f counsel to the effect that the warrant and the
securities delivered upon exercise thereof have been registered under
the Act or are exempt from registration thereunder; and
(iii) Procedures are implemented to ensure that the warrant may not be
exercised within the United States, and that the securities may not be delive­
red within the United States upon exercise, other than in offerings deemed
to meet the definition of “offshore transaction” pursuant to §230.902(h),
unless registered under the Act or an exemption from such registration is
available.
§230.904 Offshore resales.
(a) An offer or sale o f securities by any person other than the issuer, a dis­
tributor, any of their respective affiliates (except any officer or director who is
an afiiliate solely by virtue of holding such position), or any person acting on
behalf of any of the foregoing, shall be deemed to occur outside the United
States within the meaning o f §230.901 if:
(1) The offer or sale are made in an offshore transaction;
(2) No directed selling efforts are made in the United States by the seller, an
affiliate, or any person acting on their behalf; and
(3) The conditions of paragraph (b) o f this section, if applicable, are satisfied.
(b) Additional conditions
(1) Resales by dealers and persons receiving selling concessions. In the case
o f an offer or sale of securities prior to the expiration o f the distribution
compliance period specified in Category 2 or 3 (paragraph (b)(2) or (b)(3))
329
 d ir e it o d o s v a l o r e s m o b il iá r io s

A«t (15
as U.S.C.
use 77b(a)(12)), or a person receiving a*selling
” =“ ““■ ■ of th,
concession, fee or
ther remuneration m respect of the securities offered or sold:
(i) Neither the seller nor any person acting on its behalf knows that the
offeree or buyer of the securities is a U.S. person; and
(u) If the seller or any person acting on the seUer’s b eh alf knows that

u s
U.S.C. 77b(a)a2)). or ,s a parson recoiving a selUng concession, fee(15or
Other remuneration m respect of the securities sold, the seller or a per
son acting on the seUer’s behalf sends to the purchaser a confirmation or
other notice stating that the securities may be offered and sold during ÍNDICE DE JURISPRUDÊNCIA
the distribution compHance period only in accordance with the provi­
sions of this Regulation S (§230.901 through §230.905, and Prelimi­
nary Notes); pursuant to registration of the securities under the Acf or
Portugal
of th ^A c^ available exemption fi-om the registration requirements
RLx 16-dez.-2009 (Fernando Estrela), proc. n.°5523/07.8TFLSB.L1.
(2) Resdes by certain affiliates. In the case of an offer or sale of securities RLx 29-jun.-2007, proc. n.°12421/01.7(A)TDLSB.
by an officer or director of the issuer or a distributor, who is an affiliate of RLx 2-jul.-2009 Qoão Carrola), proc. n.°12800/01.0TDLSB.
he issuer or distnbutor solely by virtue of holding such position, no selling RPt 12-abr.-2012 (Leonel Serôdio), proc. n.°9836/09.6TBMAI.P1.
concession, fee or other remuneration is paid in connection with such offer
or sale other than the usual and customary broker’s commission that would
be received by a person executing such transaction as agent.
União Europeia

§230.905 Resale lim itations.

Domingues, TJE n.°C-282/10,24-jan.-2012.
Impact, TJE n.°C-268/06,15-abr.-2008.
Von Colson etKamann, TJE n.°14/83,10-abr.-1984.
Equity securities of domestic issuers acquired firom the issuer, a distributor, Marleasing, TJE n.°C-106/89,13-nov.-1990.
ToTn om " transaction subject to the conditions of Pfeiffer, TJE n.°C-397/01 a C-403/01,5-out.-2004.
I Z ^f “restricted securities” as defined in Pupino, TJE n.°C-105/03,16-jun.-2005.
§ . 4. Resales of any of such restricted securities by the offshore purcha-
Römer, TJE n.“ C-147/08,10-mai.-2011.
be made in accordance with this Regulation S (§230.901 through §
, and Preliminary Notes), the registration requirements of the Act or
an exemption therefirom. Any “restricted securities,” as defined in §230.144,
Canadá
t at are equity securities of a domestic issuer will continue to be deemed to be
restricted securities, notwithstanding that they were acquired in a resale tran­
saction made pursuant to §230.901 or §230.904.
Hodgkinson v Simms [1994] 3 SCR 377.
Mclnerney v MacDonald [1992] 2 SCR 138.
RvNef/[2002] 3 SCR 631.
330
331
 D IR E IT O DO S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
Estados-Unidos
Alfadda v Fenn, 935 F 2d 475-480 (CA 2 (NY), 1991).
American Banana Co v United Fruit Co, 213 US 347-359 (US, 1909)
Anheuser-Busch Companies, Inc v Summit Coffee Co, 858 SW 2d 928-945 fTex A dd-
-Dallas, 1993).
BerschvDrexel Firestone, Inc, 519 F 2d 974-999 (CA NY, 1975).
Bersch v Drexel Firestone, Inc, 389 F Supp 446-465 (SDNY, 1974).
Butte Min. Pic v Smith, 76 F 3d 287-292 (CA 9 (Mon), 1996).
Commscope Credit Union v Butler & Burke, LLP, 764 SE 2d 642-652 fNC Ann
2014). ^ Tri-Star Farms Ltd v Marconi, Pic, 225 F Supp 2d 567-582 (WD Pa, 2002).
Continental Grain (Australia) Pty Ldt v Pacific Oilseeds, Inc,
592 F 2d 409-422
(CA Minn, 1979).
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370 371
INDICE ONOMÁSTICO
Acharya, Viral V. - 76
Adams, Jr., John M. -161
Aheame, Alan G. - 249
Albrecht, Achim - 53
Albuquerque, Pedro de - 284,303
Alces, Kelli A .-307
Aldave, Barbara Bader - 268
Ahneida, António Pereira de - 52,198
Almeida, Carlos Ferreira de - 29,134,
135, 137, 139, 146, 148, 149, 204,
205,232
Amorosino, Sandro - 54, 206
Amzalak, Moses Bensabat -183,184
Anabtawi, Iman -242
Anand, Anita 1. - 240
Anders - 66
Andrews, Edward L. -194
Angel, James J. -262
Angel, Marc - 219
Annunziata, Filippo - 54
Anthero, Adriano - 51,197
Antunes, José Brito -109
Antunes, José Engrácia - 28,52
Apolinário, Marisa - 216
Araújo, Fernando - 24,243, 246
Amdt -64
Arnold, Thurman - 298
Ascensão, José de Ohveira - 27, 198,
200
Assies, Paul H. - 53
Assmann, Heinz-Dieter - 23, 53, 64,
65,204
Aurélio, Mirone -201
Ausubel, Lawrence M. - 269
Awrey, Dan - 242
Badon-Pascal, Edouard -188
Bainbridge, Stepehn - 268
Baker, John H. - 300
Balling, Morten -108
Bandeira, Gonçalo S. de Melo - 263,
266
Barbash, Barry P. -74
Barber, Bernard - 282
Barber, Brad M. - 250
Barberis, Nicholas - 247, 248, 249,
250
Barbosa, Diogo Miranda -125
Barnard, Jayne W. - 254
Barrales, Edgar Ortega - 262
373
 DIREITO DOS VALORES MOBILIÁRIOS
Barrett, W. Brian - 97
Barry, Christopher B. - 275
Bastos, Miguel Brito - 265
Bates, George E. - 72, 96
Bebchuk, Lucian A. - 70
Belhs, Maurizia de - 54
Benartzi, Shlomo - 250
Benick, Christoph - 204, 244, 245
Benjamin, Joanna - 54,193
Bennett, James C. - 47
Beny, Laura Nyantung - 268, 270
Berardino, Libonati - 201
Beraud, Stephane - 91
Bernasconi, Christophe - 87, 92
Betlem, Gerrit - 235
Beyerle, Franz - 288,301
Bhupathi, Tara - 262
Birks, Peter - 296
Bishop, Carter G. - 306
Blakesley, Christopher L. -153
Boeckman, Philip - 56
Bondi, Bradley J. - 268
Bonneau, Thierry - 56
Borges, José Ferreira - 51,123,197
Borges, Sofia Leite - 311
Bom, Gary B .- 152
Bom, Michael - 88
Bomet, Jean-Pierre - 54
Botosan, Christine A. - 276
Boxberger - 66
Bozérian, Jules François Jeannotte - Chmiel, Michael J. - 268
59,188
Brilmayer, Lea -152
Brito, Maria Helena - 85, 86, 88, 89 Coelho, José Pinto -197
Bröcker, Norbert - 44, 204
Bronze, Fernando José - 229
Brown, Nathan D. - 262
374
Brown, Stephen J. - 275
Bmdney, Victor - 270, 271
Bmhn, Miriam - 252
Buchère, Ambroise - 26, 27,188,189
Buck-Heeb, Petra - 31,41,53,214,240
Bülow, Christoph von - 65
Bumke, Christian - 240,242, 252,257
Bunte, Hermann-Josef- 33, 54
Buxbaum, Hannah L. -151
Calcagno, Riccardp -255
Câmara, Paulo - 28, 32, 34, 52, 134,
135, 143, 200, 201, 232, 240, 267,
274, 306,312
Canotilho, J. J. Gomes -141
Cardoso, José Luís -185
Carlton, Dennis W. - 270
Carney, William J. - 71
Carswell, John - 66
Camso, Daniela - 222
Case, Stephen H. - 73
Castelo, Higina Orvalho - 282
Castro, Carlos Osório de - 52,134,
200, 274
Catarino, Luis Guilherme - 52,198,
207
Cavanagh, Christhoper -192
Chae, Joon - 276
Chalmers, Damian -238
Chang, Young -156
Choi, Stephen J. - 55,156,158,163,172
Codorniz, Gabriela - 55
Coffee, Jr., John C. - 241
CoíEnières, Antoine -188
Colangelo, Anthony J. -151,152
Coler, William N. -194
Colin, Paul - 54,193
ColHns, Alexis L. - 261
Collins, J. Michael - 254
Combat, F.-J. -189
Conaglen, Matthew - 299,300,302
Cooley, Thomas F. - 76
Cordeiro, A. Barreto Menezes - 70,
168, 193, 224, 274, 282, 284, 285,
288,291, 292,303,309
Cordeiro, Antonio Menezes - 27, 30,
35, 36, 39, 45, 47, 49, 52, 113, 10,
199, 201, 202, 204, 205, 209, 211,
214, 217, 224, 225, 226, 229, 243,
251,260, 283,303,304
Correia, António Ferrer -197
Correia, Luis Brito -198
Costa, José de Faria - 266
Costa, Ricardo -306,307
Costi, Renzo - 43,54
Couret, Alain - 30,54, 62
Courtois, Alphonse -188
Coval, Joshua D. - 249
Cox, Charles C. - 55, 268, 269
Cox, James D. - 55
Cmz, Ricardo -130
Cunha, A. Correia da - 52,198
Cunningham, Lawrence A. - 245
Dale, Richard - 66
Dalloz, Armand - 59
Dalloz, Désiré - 59, 62
Damro, Chad -154
Davies, Gareth - 238
Deguée, Jean-Pierre - 88
Delebecque, Philippe - 62
Deloison, Georges -189
INDICE ONOMÁSTICO
DeMott, Deborah A. - 292, 300, 303,
306
Devos, Diego - 88
Diamond, Douglas W - 276
Dias, Gabriela Figueiredo - 306, 307,
313
Dias, Rui Pereira - 85
Douglas, William O. - 72, 96
Duarte, Innocencio de Sousa - 51,196
Duarte, Rui Pinto - 201
Dunham, Douglas -179
Easly, David - 276
Easterbrook, Frank H. - 294,297
Eichengreen, Barry - 97
Einsele, Dorothee - 224
Eizirik, Nelso - 55
Eleswarapu, Venkat R. - 276
Enriques, Lucas -108
Estey, Wade -154
Evans, William - 287
Fama, Eugene F. - 245, 246, 247, 249
Fanto, James A. - 254
Faria, José Angelo Estrella - 91, 93
Faure, Edgar - 59
Faure, Michael G. - 268
Feinstein, Charles H. - 98
Feis, Herbert - 97
Ferran, Eilis - 54,193
Ferrarini, Guido A. - 267
Ferreira, Amadeu José - 28, 52, 132,
135,137,196,199,200, 232,274
Ferreira, Eduardo Paz - 129,141, 205,
274
Figueiredo, Mário Augusto Jorge de -
197
375
DIREITO DOS VALORES MOBILIÁRIOS
Finn, Paul D. - 299,300
Finnerty, Joseph E. - 246
Fischel, Daniel R. - 270, 294, 297
Fishlow, Albert - 97
Fogarty, Kevin S. - 268
Fonseca, Rui Guerra da -141-142,143
Fonseca, Tiago Soares da -168
Fortuno, José Antonio Torrente - 183,
184,185
Foschini, Marcello - 201, 206
Frada, Manuel Cameiro da - 307
Franco, António de Sousa - 130, 134,
141, 204,205
Frankel, Tamar - 281, 293, 294
Franklin, Mitchell - 71,298
Freese, Günter - 308
Freire, Mário - 274
Frémery, A. -189
Frey, Bruno S. - 98
Friedman, Howard M. - 268
Fronasier, RafFaello - 267
Fuller, GeoiErey - 56
Fung, Great M. - 294
Gabriel, Henry Deeb - 91
Garman, E. Thomas - 254
Garnel, Vera Ulrich -110
Garrett, Ray - 71
Gatti, Matteo -108,121, 220
Gehlmann, Gregory A. - 72
Gerber, David J. -153
Germain, Michel - 62
Giannelli, Andrea - 54, 206
Gibbons, Michael Redmond -161,163
Gibney, Mark P. -152
Ginsburg, Douglas H. - 247
376
Giuseppe, Auletta - 201
Gjyshi, Rigers - 55
Gold, Andrew S. - 284, 292
Gombola, Michael - 75
Gomes, Fátima - 266
Gomes, José Ferreira - 312
Gomes, Nuno Sá -129
Gonçalves, Luís da Cunha - 51,197
Goode, Roy - 88,193
Gordon, Jeffrey N. - 294
Goshen, Zohan - 245
Gould, Alyse L. - 262
Grant, Richard W. -159
Greenber, David M. - 74
Greene, Lawrence M. - 74
Gregory, William - 306
Griever, WiUiam L. - 249
Groß, Wolfgang - 53
Grossman, Emiliano - 221
Grundmann, Stefan - 289,301
Grünewald, Barbara - 33,53,214, 243
Guimarães, Maria Raquel -148
Guiné, Orlando Vogler - 306
Gullifer, Louise - 55,193
Guzman, Andrew T. -156,172
Hacker, Robert C. -159
Hacking, David Lord -152
Hamdani, Assaf- 70
Hanks, Sara -163
Hanna, John - 96
Hansen, Jesper Lau - 267
Happ, Wilhelm - 65
Harris, Ron - 68,69
Hatzopoulos, Vassilis - 56
Hazen, Thomas Lee - 55
Healy, Paul M. - 275
Hein, Jan von - 284
Heinrich, Tobias A. - 41,65
Heinsius, Theodor - 64
Hemptenmacher, Theodor -191
Herlands, William B. - 73
Hildebrandt, Mireille -153
Hillgruber, Christian - 237
Hirte, Heribert - 41,65
Hixson, Kathleen -152
Ho, Look Chan - 54,193
Holbrook, Timothy R. -153
Holdsworth, William S. - 68
Höpfher, Clemens - 236
Hoppit, Julian - 66
Hopt, Klaus J. - 41,190,191,240,252
Horn, Arno - 64
Houin-Bressand, Caroline - 54
Hudson, Alastair - 34,55,69,193
Hunt, Bishop C. - 69
Huston, Sandra J. - 255
Ibrahim, Darian M. - 306
Illingworth, Patricia M. L. - 294
Iwai, Katsuhito - 294
Jackson, Jaime M. -163
Jaretzki, Jr., Alfred - 73
Jennings, R. Y. -153
Johnson, Lyman P. Q. -75
Jones, Gareth - 296
Jones, Leonard A. -194
Jordan, Cally - 56
Jordan, Jon B. -163
Jorgensen, Bryce L. - 254
Judge, Kathryn - 242
Juglar, Clément - 26
ÍNDICE ONOMÁSTICO
Just - 64
Justo, Antöiüo Santos - 284
Kahn, Julius -191
Kahneman, Daniel - 247,248
Kanda, Hideki - 88,91
Kaplan, Juhe L. -163
Karahan, Davud - 53
Karmel, Roberta S. - 70,121,161, 220
Kayserhng, Mayer -183
Keblond, Patrick - 221
Keijser, Thomas - 91,92
Kein, April - 248
Kellenbez, Hermann -183,185
Keller, Andrew J. - 262
KeUer, Ehsabeth - 72
Kerr, Ian M. -154
Kim, Jinhee - 254
King, Hugh -153
Kirchler, Erich - 248
Kitch, Edmund -162
Klein, Linda Schmid - 254
Knetsch, Jack L. - 247,248
Kniehase, Martin - 33, 41, 210, 219,
240
Knops, Kai-Oliver - 41
Kokkinis, Andreas - 69
Korff, Niklas - 41
Krell, Ulrich M. -190
Kreuzer, Karl - 88
Krug, Anita K. - 73
Kucher, Marcel - 98
Kuklin, Bailey H. - 300
Kümpel, Siegfried - 39,42,53,240
Laby, Arthur B. - 74,75,294,295,299,
312
377
 D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S
IN D IC E O N O M ÁST IC O

Laibson, David - 248 MacChesney, Alfred Brunson - 72, 73 Michie, Ranald - 66,186 Nussbaum, Arthur -191
Landis, James M. - 72, 96 Macey, Jonathan R. - 71 Miller, Geoffirey P. - 71 O’Hara, Maureen - 276
Lanenbach, Markus - 53 Machado, João Baptista - 229 Miller, Paul B. - 284,302 O’Rourke, Collin M. - 254
Langenbucher, Katja - 53,192 Machado, Miguel Pedrosa - 267 Mirowski, Philip - 68 Odean, Terrance - 250
Langevoort, Donald C. - 75,167, 268 Maciejovsky, Boris - 248 Mister, James F. -194 Olavo, Fernando -197
Lansdale, Jr., Daryl L. -163 Magalhães, José Maria Vilhena Barbosa Mitchell, Catherine - 300 Oliveira, Ana Perestrelo de - 52,304
Lash, Kurt T. - 70 de - 52,197 Mitchell, Lawrence E. - 71,268 Ohveira, Jorge Costa -129
Lee, Hei Wai - 75 Mahoney, Paul G. - 71 Mitchell, Olivia S. - 252,253, 255 Oliveira, Tânia -199
Lee, Sidney -186 Maier, Harold G. -152 Mofslqr, James S. - 74 Opitz, Georg - 64,191
Lefebvre, Pierre - 59 Maitland, Frederic William - 68 Möllers, Thomas M. J. - 65 Otero, Paulo -142,146,207
Lefèvre, Henri - 26,189 Malkiel, Burton G. - 247 Mollot, Françoise Étienne -188 Oulds, Mark K. - 39,40,41, 240
Leger, Claire - 268 Maltez, Susana - 222 Moloney, Niamh - 56, 108, 115, 121, Ozkok, Zeynep -112
Lehmann, Matthias - 41,44, 64, 224 Mandell, Lewis - 254 154, 268
Leib, Ethan J. - 284 Markham, Jerry W. - 55 Moncada, Luis S. Cabral de - 205 Painter, Richard W. -179
Leitão, Luís Menezes - 296 Marques, José Dias - 225 Moniz, Ana Raquel Gonçalves -146 Palepu, Krishna G. - 275
Leite, Nuno Rocha -110 Marques, Mafalda Gouveia - 274 Montagu, Gerald - 54,193 Palmer, George E. - 73
Leland, Hayne E. - 270 Martin, Didier - 54 Montamal, Henri -189 Pan, Eric J .- 121, 220
Lemke, Thomas P. -163 Martinez, Pedro Romano - 45, 226 Monti, Giorgio - 238 Pananis, Pano - 269,272
Lenenbach, Markus - 41,53, 244 Martins, José Fazenda - 311 Monticone, Chiara - 255 Panasar, Raj - 56
Lener, Raffaele - 54, 206 Massari, Jai - 74 Mooney, Charles - 91 Parchmovsky, Gideon - 245
Lepper, Mark Re - 248 Matos, André Salgado -146 Mooney, Jr., Charles W. - 91 Parrish, Austen L. -153
Lev, Efrat - 73 Matta, José Caeiro da - 51,124,197 Morais, Jorge Alves - 52 Partnoy, Frank - 312
Lieberman, Julia R. -184 Mayer, David N. - 70 Morais, Luís Silva - 205 Partsch, Philippe-Emmanuel - 56
Lima, Joana Matos - 52 McCabe, Douglas - 262 Moreira, Vital -141 Patricio, J. Simões - 205
Lin, Tom C. W. - 261 McCormick, Roger - 55 Moreno, Carlos Botelheiro -125 Patterson, Margaret - 68
Liu, Feng-Ying - 75 McGowan, Michael J. - 261 Morgenstern, Marc H. -156,159 Paul, Helen J. - 66
Lofchie, Steven D. - 268 McGuiness, Christine A. - 267 Morison, Francis J. - 73 Payne, Jennifer - 55
Löhnig, Martin - 289, 291, 301,302 McKendrick, Ewan -193 Morse Jr., John Torrey -194 Pech, Laurent - 238
Long, J. Bradford De -249 McKight, Andrew - 213 Mortimer, Thomas -181,186 Pelkmans, Jacques -103
Longstreth, Bevis -155 McKinney, Richard J. - 164 Moskowitz, Tobias J. - 249 Pena, Nuno Ricardo da -132, 251
Loomis Jr., Philip A. - 72,159 McLachlin, Beverly M. - 294 Munhoz, Eduardo Secchi - 55 Penteado, Mauro Rodrigues - 55
Lopez-de-Silanes, Florencio - 252 Mendelson, Morris - 270 Murphy, Antoin E. - 60 Pereira, José Nunes -132, 251
Lord, Charles G. - 248 Mendes, Paulo de Sousa - 267 Peres, Raiil - 83
Lowenfels, Lewis D. -163 Merkt, Hanno -214 Nabasque, Hervé le - 30, 54, 62 Petram, Lodewijk -182,185
Luhmann, Niklas - 282 Meron, Theodor -153 Nagy, Donna M. -163 Pierce, Edward L. -194
Lusardi, Annamaria - 252, 253, 255 Merville, Anne-Dominique - 54 Niccolò, Salanitro - 201 Pimentel, Diogo Sampaio - 51,196
Lwowski, Hans Jürgen - 33, 54 Micheler, Eva - 91

378
379
 D IR E IT O D O S V A L O R E S M O B IL IÁ R IO S IN D IC E O N O M Á ST IC O

Pina, Carlos Costa - 53,204, 275, 279 Rotunda, Ronald D. -159 Shleifer, Andrei - 247,249,252 Temin, Peter - 98
Pina, Cláudia Verdial - 263 Rüthers, Bernd - 236 Shulman, Harry -161 Tennekoon, Ravi C. -154,164
Pinheiro, Luís de Lima - 85,88 Side, Mark A. - 75 Thaler, Richard H. - 247, 248, 249,
Pinto, Frederico da Costa - 135, 137,
Sandberg, Stevan -156 Silberman, Linda J. -158 250
218, 219, 232, 263, 266, 267, 269,
Sandler, Austin J. - 262 Silva, F. V. Gonçalves da -198 Than, Jürgen - 64
270, 272 Santos, Hugo Moredo - 260, 274,306 Silva, João Calvão da - 53, 204, 208 Thevenoz, Luc - 91
Pinto, Paulo Mota - 303,304 Santos, Rute Martins - 263 Silva, Miguel Moura e - 236 Thomas, Barbara S. -156
Planas, Javier Alvarando -183,185 Saraiva, Rute - 53, 206 Silva, Paula Costa e - 23, 34, 40, 42, Thomas, J. Woodrow - 73
Ponet, David L. - 284 Savla, Jyotu - 254 45,53,200,201, 202,209,211, 274 Thompson, Rex - 276
Porta, Rafael La -252 Scherer, Peter - 64 Süva, Pedro Alexandre Tavares da - Todd, Geoffirey - 69
Pritchard, Adam - 55 Schimansky, Herbert - 33,42,54, 149 Tohns, Richard B. - 73
219, 240 Silver, Carole B. - 75 Toniolo, Gianni - 98
Quackenbos, Ellen -179 Schlitt, Michael - 53, 64, 214,243 Simonton, Thomas C. -194 Tracy, John E. - 72,73
Schneider - 65 Sinden, J. A. - 247 Turch, Andrew F. - 283
Ramalho, Maria do Rosário Palma - Schüppen, Matthias - 251 Smith, D. Gordon - 292,294,299,306 Turlington, Edgar - 96
226 Schütze, Rolf A. - 23,53 Smith, Richard B. - 73 Tversky, Amos - 247,248
Ramos, Maria Elisabete - 266, 267 Schwarcz, Steven L. - 73, 241, 242 Smith, Russell A. - 72
Redinha, Maria Regina -148 Schwark, Eberhard - 42, 54, 63, 65, Sommer, Jr., A. A. - 240 Ulrich, Ruy Ennes - 51,197,198
Reiffen, David - 68 190,191, 204, 240,269 Sorhaindo, Benoit - 254 Utset, Manuel A. - 242
Reis, António Cunha - 251 Schwintowski, Hans-Peter - 41, 54, Sousa, Fernando Freire de -130 Vasconcelos, Pedro Pais de - 204,306
Reuveni, Erez -158,159,173,175 192 Sousa, Marcelo Rebelo de -146 Vauplane, Hubert de - 54
Ribstein, Larry E. - 75,306 Scott, Austin W. - 298, 299,301 Sousa, Miguel Teixeira de - 229 Vaz, Manuel Afonso - 205
Richardson, Matthew P. - 76 Scott, Joanne -153 Souza Jr., Francisco Sátiro de - 55 Vega, Joseph de la - 181,183,184,185,
Riesser, Jakob - 64 Scott, Kenneth E. - 269 Souza, José Mamoco e - 51,197 186
Ritz - 64 Scott, William Robert - 67 Sowards, Hugh L. - 74 Veiga, Alexandre Brandão da - 148,
Robson, Peter -103 Seiler, Oliver - 33,41, 210, 219 Steinberg, Marc I. - 55,163 149
Rockness, Howard - 75 Seligman, Joel - 72 Steinmeyer - 65 Veil, Rüdiger - 56,95,240, 244
Rockness, Joanne - 75 Seneuil, J. G. Courcelle -189 Stephan, Paul B. -152 Veil, Rüdiger - 56, 95, 240, 244
Rodrigues, Sofia Nascimento -143 Sergi, Gregory M. - 73 Strompka, Piotr - 282 Veloso, José Antôiüo - 266
Rogers, Kevin - 294 Serota, Michael - 284 Stutz, Amy E. - 267 Venkataraman, Kumar - 276
Rohall, Peter John Michael -161,163 Sewell, Martin - 245 Summers, Lawrence H. - 249 Ventoruzzo, Marco - 266
Romano, Roberta - 75 Seyhun, H. Nejat - 75 Sushka, Marie Elizabeth - 97 Verdelho, Pedro - 266
Rosa, Carlos Alberto -125 Sfameni, Paolo - 54, 206 Svensson, Naomi L. -153 Verrecchia, Robert E. - 276
Ross, Lee - 248 Sheehy, Benedict - 67 Vicente, Dário Moura - 222
Rossbach, Oliver - 214 Shepherd, John C. - 292,295,296 Takehara, Derek - 220 Vidal, Emmanuel - 59,61
Rost, Birgit - 240 Shiller, Robert J. - 247 Tavares, José -197 Vüla, Gianluca la - 35
Telles, José Homem Correia - 49 Villiers, Janice D. - 294
t.

380
r
'i
i. 381
 d ir e it o d o s v a l o r e s m o b il iá r io s

Vishny, Robert - 252

Wiley, John - 76
Vokuhl, Nikolai - 244
Wiihs, Lauren W. - 255
von Kopp-Colomb - 64
Wilmarth, Jr., Arthur E. - 76
Voß - 64
Wiston-Glynn, A. W - 59
Wittig, Arne - 39,42,53, 240
Wählers, Christiane - 244
Wolff, Samuel -161,163,164
Waldmann, Robert J. - 249 Wood, Phihp R. - 213
Walker, George K. -152
Wordsworth, Charles - 68
Walter, Ingo - 76
Wright, Joshua D. - 247
Warnock, Francis E. - 249
Warren III, Manning Gilbert - 98, 99 Zaring, David - 240
Weber, Martin - 248 INDICE IDEOGRÁFICO
Zeising - 64
Weinrib, Ernest J. - 293,297 Zetzsche, Dirk A. - 221 abuso de informação privilegiada, 266 - - Direito especial, 216
Weinstein, Neil D. - 248 Zia, Bilal - 252
Weitnauer - 66 - - Direito fragmentário, 217
Zimmer, Daniel - 54, 65, 269 bens mobiliários, 224 - - Direito privado regulado, 214
Wermert, Georg -191
Zimmermann, Reinhard - 222 - - Direito técnico, 217
Código do Mercado de Valores Mobi- - classificação, 201
hários, 129 - - Direito comercial, 201
Código dos Valores Mobiliários, 28 - - Direito da economia, 204
- alterações, 139 - Direito dos mercados finan­
- estrutura, 137 ceiros, 206
- fontes, 137 ■definição, 40, 42
- Grupo de Trabalho, 29,134 Direito comparado, 59
- propósitos, 135 - - Direito alemão, 63
Código Ferreira Borges, 123 - Direito angolano, 79
Código Veiga Beirão, 124 - Direito brasileiro, 77
Compagnie du Mississipi, 60 - Direito cabo verdiano, 80
Constituição, 141 - - Direito estado-unidense, 70
---- Blue Sky Lam, 71
dever de lealdade, 306 ---- Securities Act, 1933,72
Direito bancário, 209 ---- Securities Exchange Act,
Direito das sociedades comerciais, 210 1934,72
Direito dos contratos financeiros, 212 - Direito francês, 59
Direito dos títulos de crédito, 210 --- Direito guineense, 81
Direito dos valores mobiliários Direito inglês, 66
- caracterização, 214 ---- Bubble Act, 1720, 67
— Direito comunitarizado, 219 - Direito macaense, 82
382

383
 DIREITO DOS VALORES MOBILIÁRIOS
Direito moçambicano, 83
— Direito timorense, 84
Direito são tomense, 84
- Direito europeu, 95
Diretrizes de coordenação. educação dos investidores, 252
102
Diretrizes de harmonização estudo do Direito dos valores mobihá-
de 1- Geração, 104
Diretrizes de harmonização
de 2 Geração, 112
-
Diretrizes de harmonização
de 3* Geração, 118
- - Livro Branco para a realização
do mercado interno (1985),
103
Livro Branco - PoHtica no do-
mínio dos serviços financei- ESMA, 121
ros para o período 2005-2010 extraterritorialidade do Direito esta-
(2005), 116
Plano de Ação para os Servi-
ços Financeiros (1999), 108
- - reforma do Sistema de Super-
visão, 120
- - Regulamentos de 1® Geração,
119
— Relatório Lamfalussy (2001),
109
--Relatório Larosière (2009),
117
- - Relatório Segré (1966), 99
- Direito institucional, 36
- Direito material, 34
- Direito regulatório, 38
- unidade, 39
Direito internacional privado, 85
- Código dos Valores Mobiliários, gatekeepers, 312
85
384
ín d ic e i d e o g r á f ic o
- Convenção de Haia, 87 informação, 276 relações de confiança, 281,302
-■Convenção de Genebra, 91 interpretação, 229 - doutrinas unitárias, 283, 291
- coirforme com as diretrizes, 235 — teoria do enriquecimento
economia comportamental, 247 - elemento histórico, 230 sem causa, 295
- elemento sistemático, 233 — teoria do escopo, 294
eficiência do mercado, 243 - elemento teleológico, 235 — - teoria do poder, 293
- letra da lei, 229 — teorias do interesse
rios - 181
---- Ciência Jurídica angló-
- Alemanha, 190 John 'La.vf, 59 fona, 298
—Estados Unidos da América
---- Ciência Jurídica germâ­
- França, 188 manipulação do mercado, 263 nica, 300
- Inglaterra, 192 mercados - 24 -no Direito dos valores mobihá-
- José da Veiga, 182 metodologia, 46 rios, 310
- Portugal, 196
— autonomia dogmática, 199 negócios fiduciários, 287 situação mobiliária, 226
- Thomas Mortimer, 186
soft lavo, 148
princípio da integridade, 260 South Sea Bubble, 66
princípio da transparência, 274
do-unidense, 151 proteção dos investidores, 251 teoria do mercado eficiente, 245
- Conduct Test, 172
- Dodd-Frank Act, 179
- Effects Test, 168
- fundamentos, 154
- Morrisonv National Australia Bank,
177
- Securities Act, 1933,160
- Securities Exchange Act, 167
- Regulation S, 161,164
facto mobiliário, 228
fontes legislativas mobiliárias, 144
fontes infra-legislativas mobiliárias,
146
funcionalização, 239, 250,256
385