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à Equipe Interdisciplinar
Brasília-DF.
Elaboração
Produção
Apresentação.................................................................................................................................. 4
Organização do Caderno de Estudos e Pesquisa..................................................................... 5
Introdução.................................................................................................................................... 7
Unidade I
FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA.................................................................... 9
Capítulo 1
A base da formação interdisciplinar da neuropsicologia............................................ 9
Capítulo 2
As relações entre cérebro e funções executivas.......................................................... 14
Capítulo 3
As interfaces da neuropsicologia com a linguagem, a memória, as habilidades
sociais e a atenção............................................................................................................ 19
Unidade iI
OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA............................................................... 45
Capítulo 1
Neuropsicologia do desenvolvimento........................................................................... 45
Capítulo 2
Principais transtornos do neurodesenvolvimento....................................................... 52
Capítulo 3
Interfaces entre neuropsicologia e especialidades médicas....................................... 79
Unidade iII
NEUROPSICOLOGIA HOSPITALAR E NEUROPSICOLOGIA NA EDUCAÇÃO............................................... 85
Capítulo 1
O neuropsicólogo na instituição hospitalar................................................................. 85
Capítulo 2
Neuropsicologia e a educação....................................................................................... 91
Unidade iV
NEUROPSICOLOGIA NO ESPORTE E NEUROPSICOLOGIA FORENSE...................................................... 104
Capítulo 1
Neuropsicologia e esporte............................................................................................. 104
Capítulo 2
Neuropsicologia forense............................................................................................... 111
Referências................................................................................................................................. 125
Apresentação
Caro aluno
Conselho Editorial
4
Organização do Caderno
de Estudos e Pesquisa
A seguir, apresentamos uma breve descrição dos ícones utilizados na organização dos
Cadernos de Estudos e Pesquisa.
Provocação
Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes
mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor
conteudista.
Para refletir
Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa e reflita
sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. É importante
que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus sentimentos. As
reflexões são o ponto de partida para a construção de suas conclusões.
Atenção
5
Saiba mais
Sintetizando
6
Introdução
A neuropsicologia é uma disciplina científica que estuda as relações entre o cérebro e
as funções cognitivas, cujas características interdisciplinares estão em suas origens. Se
por um lado, ela utiliza o conhecimento das neurociências, o qual esclarece a estrutura
e o funcionamento cerebral, por outro, utiliza o conhecimento da psicologia, que ajuda
a identificar a organização do funcionamento mental e do comportamento humano.
7
cerebral e a explanação de como se procede na avaliação neuropsicológica infantil. O
segundo capítulo aborda os principais transtornos do neurodesenvolvimento, dentre
eles a deficiência mental, o transtorno do déficit de atenção e hiperatividade, a dislexia
do desenvolvimento e o transtorno do espectro do autismo. No terceiro capítulo serão
discutidas as interfaces entre a neuropsicologia e especialidades médicas, como a
neurologia e a psiquiatria.
A terceira unidade compõe-se de dois capítulos. O primeiro tem como tema a atuação
do neuropsicólogo na instituição hospitalar e abarca a atuação deste profissional em
situações como internação hospitalar e reabilitação neuropsicológica. O segundo
capítulo tem como tema a relação entre neuropsicologia e educação. Neste capítulo
são discutidos assuntos como as queixas escolares, a avaliação neuropsicológica na
educação, a interação entre neuropsicologia e aprendizagem e a identificação precoce
das dificuldades de aprendizagem.
A quarta e última unidade é composta de dois capítulos. O primeiro traz a interface entre
a neuropsicologia e o esporte. Nele são explanados os temas da interdisciplinaridade
no esporte e a influência de fatores de personalidade no desempenho das modalidades
esportivas. O segundo capítulo aborda a neuropsicologia forense. Nele serão apontados
os aspectos históricos da neuropsicologia forense e como se desenrola o processo de
perícia em saúde mental.
Objetivos
»» Evidenciar o caráter interdisciplinar da neuropsicologia.
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FORMAÇÃO E
DESENVOLVIMENTO DA Unidade I
NEUROPSICOLOGIA
Capítulo 1
A base da formação interdisciplinar da
neuropsicologia
Antecedentes históricos
Considerada uma disciplina científica que investiga as relações do cérebro com as funções
cognitivas, a neuropsicologia tem qualidades interdisciplinares desde suas origens.
Para desvendar o modo como estão ligados os processos mentais e o funcionamento
cerebral, esta disciplina utiliza conhecimentos das neurociências e da psicologia.
As neurociências evidenciam a estrutura e o funcionamento do cérebro, enquanto a
psicologia identifica a organização das operações mentais e do comportamento.
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UNIDADE I │ FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA
O trajeto histórico percorrido pela neuropsicologia pode ter seu início remetido aos
estudos dos antigos egípcios, que já mencionavam modificações comportamentais
decorrentes de ferimentos no crânio. Platão (428 a.C) formulou que a medula é uma
das partes mais importantes do corpo, encarando-a como uma continuação do cérebro.
Na Grécia antiga, Alcmeón de Crotona indicava que o cérebro era o órgão responsável
pela sensação e pensamento. Hipócrates, um século após Alcmeón, salientava que o
cérebro era responsável pela inteligência, sensação e emoção.
Broca apresentou, uma década mais tarde, casos de pacientes lesionados no terço
posterior do giro temporal superior esquerdo. Esses pacientes não apresentavam
prejuízos significativos na fala expressiva, no entanto tinham reduzida capacidade de
compreendê-la.
Ainda no século XIX houve a descrição do caso de Phineas Gage feita por John M.
Harlow (1848-1849). O paciente apresentava alterações comportamentais resultantes
de uma lesão frontal. Gage passou a ser irritadiço, irreverente, grosseiro e profano
características que não faziam parte do seu modo de agir usual. Além disso, ele
demonstrava pouco respeito pelas pessoas próximas e grande impaciência quando era
aconselhado ou via conflitados seus desejos.
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FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA│ UNIDADE I
De acordo com Salles, Haase e Malloy-Diniz (2016) o modelo das unidades funcionais
de Luria tem historicamente um valor importante, pois evidenciou a participação do
córtex pré-frontal nos processos cognitivos superiores, sendo que essa região do cérebro
era considerada, até então, uma parte silenciosa.
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UNIDADE I │ FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA
O livro redigido pelo autor brasileiro contou com a participação de nomes consagrados
como Critchley, Ajuriaguerra, Luria, Ingram e Hécaen.
Vale ressaltar que, atualmente, no Brasil não há curso de graduação que prepare o
profissional para atuar com neuropsicologia. A formação nessa área acontece em nível
de pós-graduação ou prática supervisionada.
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FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA│ UNIDADE I
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Capítulo 2
As relações entre cérebro e funções
executivas
Funções executivas
A neuropsicologia e as funções executivas se relacionam mais diretamente a partir da
avaliação neuropsicológica. A avaliação neuropsicológica das funções executivas (FEs)
iniciou-se a partir das observações de pacientes com lesões frontais e as modificações
nos comportamentos decorrentes dessas lesões.
Zelazo et al. (2003) citado por Salles, Haase e Malloy-Diniz (2016) abordam as FEs como
uma gama de processos que exercem controle cognitivo para direcionar e coordenar o
comportamento humano. Tal controle é exercido de maneira adaptativa, possibilitando
alterações rápidas e flexíveis diante das novas demandas oriundas do meio.
As FEs podem ser caracterizadas como uma capacidade de dar início a ações, planejar e
prever modos de resolução de problemas, envolvendo também a habilidade de antecipar
consequências e mudar as estratégias de maneira flexível.
De acordo com Lezac e colaboradores (2004), citados por Serafim e Saffi (2015), as FEs
podem ser desempenhadas de acordo com um encadeamento temporal de processos:
volição, planejamento, ação intencional e desempenho efetivo.
A ação intencional, por sua vez, efetiva-se quando o indivíduo pode iniciar, manter,
alternar e parar o desencadeamento de ações, sempre de modo integrado e ordenado.
Volição
Planejamento
Ação proposital
Desempenho efetivo
As FEs parecem melhorar na sequência ao longo dos anos. Os períodos que podem ser
destacados são: do nascimento aos dois anos, dos 7 aos 9 anos e um salto no final da
adolescência, entre 16 e 19 anos de idade.
Do nascimento até o primeiro ano de vida são observadas algumas formas iniciais
relativas às habilidades executivas, como a capacidade de regular o comportamento
em consequência aos estímulos ambientais e a capacidade de definir metas e executar
comportamentos voluntários com a intenção de atingi-las.
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UNIDADE I │ FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA
Cérebro e FEs
Zelazo e Muller (2002) dividem as funções executivas em “quentes” e “frias”. As primeiras
estão relacionadas aos aspectos emocionais e as segundas aos aspectos cognitivos.
As FEs “quentes” são ativadas por problemas que englobem a regulação do afeto e a
motivação. Já as FEs “frias” são ativadas por problemas abstratos e sem contexto.
No que se refere à relação entre FEs e estruturas cerebrais, Serafim e Saffi (2015)
apontam:
Luria (1981), citado por Serafim e Saffi (2015), afirma que as funções fundamentais do
córtex pré-frontal são controlar a situação global do córtex e direcionar o caminho dos
principais modos de atividade mental humana. Citando Dubois, Slachevsky, Litvan e
Pillon (2000), Serafim e Saffi (2015) apontam quais são as funções frontais:
a. Raciocínio abstrato.
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FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA│ UNIDADE I
b. Conceitualização.
c. Flexibilidade mental.
d. Programação motora.
e. Resistência à interferência.
f. Autorregulação.
g. Controle inibitório.
A seguir, serão listados outros instrumentos, indicando-se quais são as funções por eles
avaliadas.
Instrumento Função
Wisconsin Card Sorting Test (WCST)
Teste de trilhas coloridas Flexibilidade cognitiva
TrailMaking Test A e B
D2 – Teste de atenção concentrada – erros por ação
Controle inibitório
Stroop Test
Continuous Performance Test CPT-II
Subteste dígitos ordem direta e inversa (WISC-IV/WAIS-III)
Memória operacional
Aritmética (WISC-IV/WAIS-III)
Iowa Gambling Task
Children Gambling Task Tomada de decisão
DiceTask
Torre de Londres
Planejamento e solução de problemas
Torre de Hanoi
Semelhanças (WISC-IV/WAIS-III) Categorização
D2 – Teste de atenção concentrada
Teste de atenção concentrada
Teste de atenção alternada Controle atencional
Teste de atenção dividida
Teste de trilhas coloridas
Behavioral Assessment of the Dysexecutive Syndrome (BADS) Instrumentos de triagem e baterias de avaliação de múltiplas
Frontal AssessmentBatery (FAB) funções executivas
Fonte: Malloy-Diniz e colaboradores (2014) citados por Serafim e Saffi (2015).
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Capítulo 3
As interfaces da neuropsicologia com a
linguagem, a memória, as habilidades
sociais e a atenção
Linguagem
A primeira habilidade perceptual de um bebê não está relacionada diretamente com
uma habilidade grande de produzir sons. Do nascimento até mais ou menos o primeiro
mês, o som mais comumente emitido por um bebê é o choro, apesar de os bebês também
serem capazes de fazer sons de agitação, gorgolejo e satisfação.
Tal repertório de sons cresce em cerca de um ou dois meses, com a inclusão da risada
e do arrulho – os sons repetitivos de vogais. Sons como esse são comumente sinais de
prazer e podem ter bastante variação, incluindo aumentos e diminuições no volume ou
intensidade.
Os sons de consoante são emitidos apenas entre os seis ou sete meses, quando pela
primeira vez o bebê tem a capacidade muscular exigida para a combinação do som
de uma consoante com o de uma vogal. A partir dos seis meses há um acréscimo
importante na quantidade de combinações entre vogais e consoantes. Tal tipo de
vocalização é chamado de balbucio e é considerada metade dos sons emitidos pelos
bebês, descontado o choro.
Explicar o modo pelo qual uma criança se apropria da língua demonstrou ser uma
das tarefas mais instigantes da psicologia do desenvolvimento. As teorias iniciais da
linguagem baseavam-se ou na teoria da aprendizagem ou na ideia de que as crianças
aprendem a linguagem por imitação.
A imitação, claro, desempenha algum papel, pois a criança aprende a língua que ela ouve.
No entanto, apenas a imitação não pode explicar a completa aquisição da linguagem,
pois ela não responde à tendência geral das crianças em criar palavras e expressões que
nunca ouviram.
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UNIDADE I │ FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA
foram averiguar essa hipótese, constataram que os pais não faziam nada semelhante ao
que Skinner propunha. Os pais são notavelmente tolerantes com os variados tipos de
construção peculiares de significado, eles reforçam mais as frases com base em se ela é
verdadeira do que se é gramaticalmente correta.
As crianças menos expostas à linguagem em seus primeiros anos não superam o atraso
mais tarde constatado em seu vocabulário. Além da quantidade de linguagem direcionada
à criança, a qualidade da linguagem dos genitores também é fator importante no auxílio
dado à criança para esta compreender a língua.
No outro lado da arena teórica estão as teorias nativistas, que sustentam ser inata boa
parte do que a criança necessita para aprender a língua.
Uma autora expoente dessa perspectiva é Melissa Bowerman, que avalia que o início
da linguagem não necessariamente introduz novos significados para a criança. O que
ocorre é que esta linguagem incipiente é utilizada para se referir àqueles significados
que ela já formulou independentemente da linguagem. A autora também observa que
quando a criança começa a usar a linguagem para expressar as ideias que parcamente
compreende, o fato de criar estruturas linguísticas próprias ajuda a criança a
compreendê-las melhor.
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FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA│ UNIDADE I
Uma determinada língua tem certos padrões sonoros utilizados e regras que organizam
esses padrões, conhecidos como fonologia. O modo como a linguagem representa
o significado é chamado de semântica. Já as regras de uma língua usadas para a
combinação de palavras em frases é a sintaxe.
Neuropsicologia e Linguagem
Os componentes específicos da base neural da linguagem foram primeiramente
identificados por meio de estudos de distúrbios adquiridos de linguagem, intitulados
afasias.
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UNIDADE I │ FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA
As afasias são geradas por lesões encefálicas focais ocasionadas por doenças
cerebrovasculares (derrame), traumatismos cranianos e doenças degenerativas, como
as doenças de Alzheimer e Pick.
Os estudos iniciais também revelaram que a lesão em duas áreas específicas do cérebro,
conhecidas como área de Broca – região frontal lateral esquerda – e área de Wernicke
– lobo temporal superior posterior esquerdo – está vinculada a padrões diferentes de
distúrbio de linguagem.
Na afasia de Wernicke, os pacientes apresentam fala fluida e sem esforço, com melodia
e produzida em ritmo adequado, portanto bastante diferente da apresentada pelos
pacientes com a afasia de Broca. No entanto, o conteúdo da fala deles é, muitas vezes,
ininteligível, decorrente dos erros constantes na escolha de palavras e fonemas.
Capacidade de
Tipo de afasia Fala Compreensão Outros sinais Região afetada
repetição
Hemiparesia direita
Bastante preservada
(braço>perna); Córtex frontal posterior
Não fluente, com para palavras isoladas e
Broca Comprometida o paciente tem esquerdo e estruturas
esforço sentenças gramaticalmente
consciência do defeito e subjacentes
simples
pode estar deprimido
Fluente, Sem sinais motores;
Região do córtex superior
abundante, o paciente pode estar
Wernicke Comprometida Comprometida posterior e médio do lobo
bem articulada, ansioso, agitado,
temporal esquerdo
melódica eufórico ou paranoico
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FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA│ UNIDADE I
Malloy-Diniz, et al. (2010) salientam que a avaliação deve ser abrangente, incluindo
não só a análise de aspectos preservados, íntegros, mas também os comprometidos. As
informações de linguagem podem ser colhidas em observações diretas e em relatos do
paciente ou de familiares a respeito das habilidades/comprometimentos observados na
comunicação. Essa ampla gama de informações auxilia na formulação de hipóteses a
serem colocadas em prova para a indicação do diagnóstico.
Familiares e pessoas que convivem com o paciente ou conhecem sua história são fontes
importantes de informação. Malloy-Diniz, et al. (2010) destacam dois questionários:
o Índice de Efetividade Comunicativa e a Avaliação Funcional de Habilidades de
Comunicação para Adultos. O primeiro baseia-se
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UNIDADE I │ FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA
Memória e neuropsicologia
A memória é uma das mais intrincadas funções neuropsicológicas. Estudos apontam que
a memória não é unitária, mas, sim, é constituída por vários componentes, comandados
por processos baseados em circuitarias neurais diversificadas.
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FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA│ UNIDADE I
Alguns modelos têm sido usados para explicar os mecanismo da memória. As fases ou
estágios da memória estão associados ao modelo modal de memória.
O modelo modal de memória baseia-se na ideia de que a informação passa por uma
espécie de armazenador temporário sensorial e posteriormente segue sucessivamente
para um armazenador de curta duração e para um de longa duração, com capacidades
ilimitadas. O modelo foi bastante testado e parte dele refutado. A informação, constatou-
se, não precisa seguir por caminhos lineares. Outra constatação foi a de que o sistema
de curto prazo não é unitário, mas subdividido em sistemas específicos.
Outra abordagem, esta mais recente, é a de que a memória é formada por componentes
mediados de maneira independente por diversos módulos do sistema nervoso, mas isso
acontece cooperativamente.
Uma das contribuições mais fundamentais na distinção dos sistemas de memória ocorreu
a partir do caso HM. O caso foi descrito por Scoville e Milner em 1957 e apresentava um
homem com amnésia anterógrada profunda resultante da excisão cirúrgica bilateral do
hipocampo. Houve comprometimento da capacidade de registro de novas informações,
mas a memória retrógrada foi parcialmente preservada. A partir do caso os autores
propuseram a existência de uma dissociação cognitiva, o que contribuiu para novas
classificações de memória no que concerne aos sistemas paralelos distribuídos e aos
fatores de gradiente temporal.
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UNIDADE I │ FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA
com cinco tentativas de aprendizagem e repetição de palavras de uma lista, sendo que
ela é retomada após 30 minutos para verificar o nível de recordação do paciente.
Outro teste para a avaliação da memória episódica verbal é o California Verbal Learning
Test-II, existindo também na versão infantil (CVLT-C). Além de medir o grau geral
de lembrança nas tentativas de armazenamento e depois de um intervalo, o teste é
significativo na verificação de aspectos qualitativos do desempenho, por exemplo: tipos
de erros, estratégias de recordação e mecanismos e falhas da memória.
Testes de memória visuoespacial, como Figura Complexa de Rey, são importantes para
a detecção de déficits na memória visual. No entanto é preciso estar atento que existe
uma correlação razoável entre copiar adequadamente a figura e a capacidade para
resgatá-la, o que indica cuidado nas situações em que a cópia já apresenta resultados
abaixo do esperado.
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FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA│ UNIDADE I
Para se avaliar a memória operacional utiliza-se o teste dígitos, ordem direta e inversa,
da bateria Wechsler de inteligência.
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UNIDADE I │ FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA
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FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA│ UNIDADE I
Os modelos incluem:
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UNIDADE I │ FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA
interesses sem, no entanto, ferir os interesses das demais pessoas, sempre controlando
a ansiedade.
O modo como os pais interagem e educam seus filhos é importante para que
comportamentos socialmente adequados ou inadequados sejam promovidos.
Especificamente, os comportamentos inadequados são caracterizados como déficits
comportamentais que prejudicam as relações sociais.
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FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA│ UNIDADE I
A promoção, por parte dos pais, dos comportamentos adequados nos filhos depende de
que eles mesmos emitam comportamentos adequados e demonstrem assertividade em
vez de agressividade.
Os pais são os agentes socializadores iniciais dos filhos e também podem ser os primeiros
modelos e incentivadores de comportamentos assertivos deles. Porém, para que isso
aconteça é necessário que os pais estejam de acordo com as práticas comportamentais
escolhidas pela família.
Os pais precisam também estar atentos ao cumprimento de promessas feitas, pois isso
dá para a criança confiança no relacionamento. Importante ainda é o estabelecimento
de regras, o que significa que os pais precisam dizer “não” para pedidos que estejam fora
dos combinados estabelecidos. Em relação a isso, os pais podem negociar possibilidades,
mas estando cientes da capacidade de compreensão da criança.
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UNIDADE I │ FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA
existe a noção de que a admissão de erros pode desencadear falta de respeito e perda
da admiração.
O THS está entre as técnicas mais eficazes e utilizadas para o tratamento de questões
psicológicas, para a melhoria do desempenho social e para a melhoria global da
qualidade de vida.
De acordo com Curran (1985), citado por Caballo (2016), as premissas do THS são:
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FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA│ UNIDADE I
quando se trabalha contato visual a pessoa pode ser orientada com relação a duração do
contato. A informação pode ser apresentada de diversas maneiras, como por meio de
representação de papéis, discussões, material escrito ou gravações em vídeo.
O treinamento em solução de problemas não tem sido feito de modo sistemático nos
programas de THS, apesar de se encontrar neles de modo implícito.
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UNIDADE I │ FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA
O THS ensina aos pacientes como atuar de maneira construtiva com as demais pessoas
e estabelecer com elas relações mais gratificantes.
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FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA│ UNIDADE I
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UNIDADE I │ FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA
As escalas MESSY não possuem ainda validação para a população brasileira. A primeira
delas é respondida pela própria criança ou adolescente e a segunda por professores
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FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA│ UNIDADE I
ou pais. Elas também são escalas de autoavaliação que usam de pontuação para que o
paciente indique a frequência na qual o comportamento acontece.
2. assertividade inapropriada;
3. comportamentos impulsivos;
4. autoconfiança excessiva, e
No que concerne ao transtorno bipolar e habilidades sociais, parece haver uma tendência
a um comportamento inibido e hiperviligante do paciente em relação ao meio ambiente.
As intervenções, portanto, precisam estar direcionadas ao tema, trabalhando com o
paciente que ele perceba seu modo de agir diante dessas situações, criando estratégias
para que possam lidar de maneira mais adaptada a elas.
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UNIDADE I │ FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA
Os sintomas depressivos mais salientados foram: dificuldade de sentir prazer nas coisas,
sentimento de serem falhas, criticadas e culpadas por tudo de mal que ocorre em suas
vidas, insatisfação com a aparência, perda do interesse por sexo, sendo que este último
foi bastante frequente nas adolescentes mais velhas.
Neuropsicologia e atenção
A atenção é, dentre todas as funções cognitivas, a que com maior frequência é
comprometida quando se considera as lesões cerebrais de modo global, independente
de onde estejam localizadas. A atenção pode ser também a única afetada em lesões mais
amenas, como os traumatismos cranianos leves.
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FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA│ UNIDADE I
Para uma pessoa estar atenta é necessário que as redes cerebrais difusas comuniquem-
se entre si, possibilitando que seu foco atencional esteja ocupado com dados relevantes
e ignore os irrelevantes.
De modo mais específico, a rede neuronal complexa vinculada a atenção está espalhada
pelo córtex pré-frontal e regiões subcorticais.
Um exemplo que pode ser dado é de uma pessoa com lesão bilateral que afete as áreas
occipital lateral e parietal posterior. Esse paciente manifestará a Síndrome de Balint
caracterizada pela simultagnosia que é a dificuldade de prestar atenção em vários
objetos, podendo prestar atenção em apenas um de cada vez.
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UNIDADE I │ FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA
A seletividade é importante pois o cérebro tem uma capacidade limitada, não sendo
possível processar todo o montante de informações que chega a ele. Dessa maneira, é
preciso focalizar os dados mais relevantes e necessários na situação, ignorando o que
pode distrair, seja interno ou externo.
Pelo fato de os sistemas de controle atencional estarem espalhados por todo córtex
cerebral, múltiplos são os fenômenos da atenção. Sendo assim, quando esses sistemas
são prejudicados por algum tipo de doença ou trauma, a consequência pode ser
derradeira para a pessoa.
Ainda na reabilitação do aspecto ativação, pode-se trabalhar com o paciente para que
ele aponte as cidades ou países que visitou, calculando a distância e tempo de percurso
em relação à sua cidade ou país de origem. O paciente pode ainda localizar a data atual
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FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA│ UNIDADE I
no calendário e verificar quanto tempo falta para seu próximo aniversário ou quanto
tempo passou desde seu último.
Outro exemplo de atividade é o paciente, enquanto estiver andando pela rua, selecionar
uma letra e tentar contar quantos carros que trafegam possuem aquela letra na placa.
Uma outra atividade que pode ser realizada para se trabalhar o aspecto da alternância é
ouvir duas ou mais músicas famosas ao mesmo tempo, respeitando as preferências do
paciente, e buscando o reconhecimento das duas. Pode-se pedir para que se identifique
quais as vozes e bandas estão interpretando essas canções.
Para o aspecto sustentação também pode ser realizada a leitura de longos textos
jornalísticos, com temas indicados pelo paciente. Posteriormente pode ser feito um
debate a respeito do que foi lido e pode ser questionado alguns detalhes da matéria.
41
UNIDADE I │ FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA
O paciente com dificuldade de sustentação pode ter benefícios com a diminuição dos
estímulos ambientais, como ruídos, presença de pessoas e distratores visuais. Com isso
ele pode melhorar seu desempenho em estudos e leituras, por exemplo.
Outro cuidado que precisa ser tomado em relação à avaliação da atenção está relacionado
ao entendimento de que a atenção envolve diferentes aspectos cognitivos que podem
necessitar de tarefas direcionadas para sua análise. A atenção sustentada, por exemplo,
exige testes mais duradouros.
Cabe ainda ressaltar que alguns autores consideram a atenção (ou pelo menos alguns
de seus aspectos) como uma função executiva, precisando, portanto, ser interpretada
em relação aos demais déficits que aparecem nas síndromes disexecutivas.
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FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA│ UNIDADE I
O Stroop é largamente utilizado na prática clínica por ser de fácil e rápida aplicação.
No entanto, apresenta como ponto negativo o fato de que, por ser rápido, não permite
a identificação de déficits atencionais mais leves, o que indica, portanto, baixa
sensibilidade para algumas situações.
O TAVIS-3 fornece escores de tempo médio de reação, número de erros por omissão e
número de erros por ação para cada um dos aspectos avaliados.
No CPT-II o paciente deve apertar o botão toda vez que aparecer uma letra, mas não
deve apertar quando aparecer o estímulo alvo, que é a letra “x”. Esse tipo de atividade
vem sendo especialmente utilizada em pacientes com TDAH.
A segunda versão do CPT fornece vários tipos de escores e também compara o paciente
avaliado com dois grupos normativos diferentes. O primeiro é de portadores de TDAH
e o segundo de controles normais.
Dentre os diferentes escores fornecidos pelo CPT-II estão: o número de erros por
omissão, o número de erros por ação, o tempo médio de reação, a medida de capacidade
de discriminação entre estímulo alvo e distratores, variação do tempo de reação ao
longo do tempo e ao longo dos diferentes blocos.
O teste de atenção concentrada (AC) baseia-se em uma tarefa com lápis e papel em que
o avaliado precisa marcar o estímulo alvo dentre vários outros estímulos distratores.
Esse é o padrão normalmente seguido por outros testes de cancelamento.
43
UNIDADE I │ FORMAÇÃO E DESENVOLVIMENTO DA NEUROPSICOLOGIA
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OS DIFERENTES
CAMPOS DE Unidade iI
ESTUDO DA
NEUROPSICOLOGIA
Capítulo 1
Neuropsicologia do desenvolvimento
Desenvolvimento cerebral
O tempo de gestação do bebê humano é de 38 semanas, cerca de 265 dias. As semanas são
divididas em três partes de duração desigual, caracterizadas por alterações específicas
no organismo em desenvolvimento.
Por volta de quatro dias depois da concepção, a massa de células, denominada blastócito,
inicia uma subdivisão, formando um círculo com duas camadas de células ao redor
de um centro oco. A camada mais externa constituirá as várias estruturas que darão
suporte ao organismo em desenvolvimento, enquanto a camada interna formará o
embrião. Assim que há o contato com a parede do útero a camada externa se decompõe
no ponto de contato. Espirais minúsculas se desenvolvem e prendem a massa celular
na parede uterina, em um processo denominado implantação. Quando a implantação
está finalizada, geralmente de 10 a 14 dias após a concepção, o blastócito pode ter 150
células.
45
UNIDADE II │ OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA
No fim do período embrionário, dedos, olhos pálpebras, nariz, boca e orelhas externas
rudimentares já estão presentes, assim como partes básicas no sistema nervoso. O
estágio embrionário se encerra quando a organogênese está completa e as células ósseas
iniciam seu processo de formação, geralmente em oito semanas depois da concepção.
Por volta da 23ª semana um número pequeno de bebês alcança a viabilidade, que é
capacidade de viver fora do útero.
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OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA │ UNIDADE II
Por volta dos 10 e 12 anos outro surto importante acontece. Nele, os lobos frontais do
córtex cerebral se tornam centrais nos processos de desenvolvimento. Como era de se
esperar, lógica e planejamento, duas funções cognitivas que evoluem bastante durante
o período, são executadas primariamente pelos lobos frontais (BEE e BOYD, 2011). A
memória é outra função que também apresenta melhora nesse contexto.
O segundo surto de crescimento cerebral inicia por volta dos 17 anos e permanece até o
começo da idade adulta. Nesse período os lobos frontais do córtex cerebral são o cerne
do desenvolvimento (DAVIES e ROSE, 1999 apud BEE e BOYD, 2011). Sendo assim,
não é de se espantar que adolescentes mais velhos tenham capacidades diferentes de
adolescentes mais novos ao lidar com questões que requerem essas funções cognitivas.
47
UNIDADE II │ OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA
A plasticidade está presente em algum nível durante todo o período de vida. É necessário
salientar que determinação entre idade e plasticidade são complexas. Do mesmo modo
que o cérebro tem maior plasticidade nos primeiros anos, ele também é mais vulnerável
à privação nessa etapa do que em etapas subsequentes da vida.
48
OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA │ UNIDADE II
A mielinização ocorre de modo mais veloz ao longo dos dois primeiros anos após o
nascimento e continua mais lentamente durante o período de infância e adolescência.
Partes do cérebro, por exemplo, relacionadas à visão estão maduras quando está
próximo o segundo aniversário.
Certos fatores e funções neuropsicológicas, que são geralmente o foco dos procedimentos
diagnósticos, podem ser avaliados nas interações fundamentais entre o comportamento,
a função e a área cortical envolvida.
49
UNIDADE II │ OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA
50
OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA │ UNIDADE II
Já em relação à análise qualitativa, os autores destacam que toda avaliação precisa levar
em consideração as características sócio-econômicas e o ambiente escolar e familiar do
avaliado.
Outros dados qualitativos podem ser percebidos no decorrer da execução das tarefas
pela criança. Entre esses dados estão o modo que ela interage, se estabelece diálogo
espontâneo, se mantém contato visual, se apresenta comportamento agitado ou apático,
como está o humor e como usa o material. Por fim, está a avaliação qualitativa. Nela são
observados aspectos particulares das funções neuropsicológicas destacados a seguir.
Função Observação
Atenção Se a criança se mostra dispersa. Nível de alerta. Orientação. Manutenção do estímulo e do interesse
Percepção Das diversas modalidades sensoriais
Associação Associação auditivo-visual – se associa um nome a um objeto. Associação visuomotora
Intenção Capacidade de se engajar ou iniciar uma atividade.
Tônus Tensão muscular e reações tônicas elementares
Motricidade Postura, gestos, preensão, repetição de movimentos
Imitação Capacidade de reproduzir ações ou gestos
Emoção Expressão da emoção e compreensão da emoção
Instinto Funções vitais elementares, como capacidade de controle esfincteriano, alimentação
Contato Atento ao outro, indiferente à presença do outro
Comunicação Se a criança se manifesta verbalmente, por meio de gestos ou se usa de outros meios
Regulação Se existe organização temporal da conduta
Cognição Atividade específica para o conhecimento do meio, se consegue perceber, elaborar, memorizar as informações
Fonte: Mello, Miranda, Muszkat, 2005.
51
Capítulo 2
Principais transtornos do
neurodesenvolvimento
Transtornos do neurodesenvolvimento
Deficiência mental
52
OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA │ UNIDADE II
53
UNIDADE II │ OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA
Existem vários outros aspectos que influenciam no comportamento adaptativo, tais como
capacidade intelectual, educação, motivação, socialização, aspectos da personalidade,
oportunidade vocacional, experiência cultural e condições médicas gerais, além de
transtornos mentais coexistentes.
Crianças com retardo mental podem ser distribuídas em dois subgrupos, de acordo com
a causa do retardo. O subgrupo menor, formado por cerca de 15 a 25% do total, abrange
crianças cujo retardo é em decorrência de um dano físico evidente. Neste grupo estão
elencadas as crianças com anomalias genéticas, como a Síndrome de Down.
A maioria das crianças com retardo mental não apresenta sinais óbvios de dano cerebral
ou outro transtorno físico. Nessas situações a causa do retardo é uma combinação
de condições genéticas e ambientais. Geralmente essas crianças estão inseridas em
famílias nas quais os pais têm baixos QIs ou doença mental, ou ainda a vida doméstica
é bastante desorganizada e com privação emocional ou cognitiva.
54
OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA │ UNIDADE II
55
UNIDADE II │ OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA
O TDAH tem início na infância e há exigência de que vários sintomas estejam presentes
antes dos 12 anos de idade. Isso evidencia a importância do quadro clínico substancial
ocorrer na infância.
Uma idade de início mais precoce do TDAH não é estabelecida em decorrência das
dificuldades do estabelecimento retrospectivo das dificuldades aparecidas no período,
pois as lembranças do adulto a respeito dos sintomas na infância tendem a não ser
confiáveis.
56
OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA │ UNIDADE II
de atenção, função executiva e memória, sabendo que tais testes não são sensíveis o
suficiente para servir como bases diagnósticas.
Quando do início da vida adulta, o TDAH está associado a um risco maior de tentativa
de suicídio, principalmente quando há transtornos de humor, da conduta ou por uso de
substância como comorbidades.
A maioria das pessoas adolescentes e adultas com TDAH não apresenta sintomas de
hiperatividade motora claros, mas as dificuldades de planejamento persistem, assim
como a inquietude, desatenção e impulsividade.
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UNIDADE II │ OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA
No que concerne aos fatores de risco e prognóstico, o TDAH está relacionado a menores
níveis de inibição comportamental, assim como de controle com base em esforço ou
contenção. Também se associa a menores níveis de afetividade negativa e/ou maior
busca por novidades. Todos esses traços podem predispor algumas crianças ao TDAH,
mas não são específicos do transtorno.
Em relação aos fatores ambientais, o baixo peso ao nascer, menos de 1.500 gramas,
oferece um risco de duas a três vezes maior para o TDAH, apesar de a maioria das
crianças com baixo peso ao nascer não desenvolverem o transtorno.
O TDAH não está associado a características físicas específicas, mesmo que taxas de
anomalias físicas menores, como palato bastante arqueado e baixa implantação de
orelhas, possam ter níveis aumentados.
Atrasos motores sutis e outros sinais neurológicos leves podem também ocorrer no
indivíduo com TDAH.
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OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA │ UNIDADE II
O TDAH está ligado ao desempenho escolar e sucesso acadêmicos reduzidos, bem como
rejeição social e, em adultos, piores desempenho, sucesso e assiduidade no campo
profissional.
As crianças com TDAH têm maior chance do que os pares de desenvolver transtorno
da conduta na adolescência e transtorno da personalidade antissocial na vida adulta,
aumentando, dessa maneira, a possibilidade de transtornos por uso de substâncias e
prisão.
O risco posterior para adultos com TDAH desenvolverem transtornos por uso de
substâncias é alto, ainda mais quando associados ao transtorno da conduta e antissocial.
Pessoas com TDAH são mais propensos a sofrerem lesões do que os colegas, assim como
acidentes e violações de trânsito são mais frequente em motoristas com o transtorno.
59
UNIDADE II │ OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA
Em relação aos diagnósticos diferenciais estão vários transtornos que serão explorados
a seguir.
Outro dado comparativo entre os dois transtornos é que o explosivo intermitente é raro
na infância. No entanto é preciso notar que ele pode ser diagnosticado na presença do
TDAH.
A atividade motora elevada que pode acontecer no TDAH precisa ser diferenciada do
comportamento motor repetitivo característico do movimento estereotipado e alguns
casos de transtorno do espectro autista.
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OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA │ UNIDADE II
Pessoas com TDAH e aqueles com transtorno do espectro autista apresentam desatenção,
disfunção social e comportamento de difícil manejo, mas a disfunção social e a rejeição
pelos pares encontradas no TDAH devem ser diferenciadas da falta de envolvimento
social, do isolamento e da indiferença a pistas de comunicação facial e de tonalidades
encontradas nos indivíduos autistas.
Crianças com o transtorno do apego reativo podem ter desinibição social, porém não
o grupo inteiro dos sintomas de TDAH, mostrando, ainda, outras características como
ausência de relações duradouras – que não são características dos indivíduos com
TDAH.
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UNIDADE II │ OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA
A diferenciação entre o TDAH e o transtorno por uso de substância pode ser dificultado
se a primeira apresentação dos sintomas do TDAH acontecer depois do início do abuso
ou uso frequente. Para evitar problemas no diagnóstico é preciso colher informações
por meio de pessoas próximas ou registros anteriores.
Quanto as suas causas, parece não haver dúvidas de que o TDAH tem uma multiplicidade
de fatores, com uma grande rede de aspectos neurobiológicos e ambientais atuando de
modo altamente complexo.
62
OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA │ UNIDADE II
O TDAH não tratado ao longo da vida tem um custo social considerável, envolvendo
baixo aproveitamento acadêmico, problemas de conduta, subemprego, acidentes
automobilísticos e problemas de relacionamento.
A atenção não é resultado de uma única área cerebral, mas está ligada ao funcionamento
concentrado do cérebro oriundo dos processos interconectados dos sistemas de redes
neurais corticais e subcorticais. Dois sistemas atencionais principais estão ligados com
as principais funções da atenção:
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UNIDADE II │ OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA
em longo prazo dessa intervenção ainda não foi completamente determinado. Além
disso, há limitações importantes nessa modalidade de tratamento, pois há indivíduos
que continuam tendo prejuízos funcionais significativos.
Pesquisas como a de Daly, Creed, Xanthopoulos e Brown (2007) citados por Salles,
Haase e Malloy-Diniz (2016) evidenciam que intervenções psicossociais associadas com
a medicação mostram-se mais eficazes no tratamento do TDAH do que as intervenções
apenas medicamentosas.
Dislexia do desenvolvimento
A dislexia do desenvolvimento tem sido descrita desde meados de 1600 e tem como
característica um atraso na capacidade de aprendizagem da leitura.
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OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA │ UNIDADE II
Subtipo Características
Tem como padrão dificuldades na leitura oral de palavras pouco familiares. Estas dificuldades estão
Dislexia auditiva ou fonológica
relacionadas com a conversão letra-som, normalmente vinculada a uma disfunção no lóbulo temporal
Dificuldade na leitura relacionada a um problema visual, sendo assim há inabilidade de reconhecer palavras
Dislexia visual ou diseidética
como um todo – oriunda de déficit no processamento visual e de disfunções no lóbulo occipital
Os pacientes apresentam problemas dos dois subtipos anteriores, associados às disfunções dos lóbulos
Dislexia mista
pré-frontal, frontal, occipital e temporal
Uma das teorias mais atuais é a teoria do déficit fonológico. A dislexia é aqui relacionada
às dificuldades de consciência fonológica, ou seja, o estudante tem alterações na
percepção e manipulação de segmentos sonoros das palavras (CASTLES e COLTHEART,
2004; GOSWAMI e BRYANT, 1989 apud SALLES, HAASE e MALLOY-DINIZ, 2016).
De acordo com essa teoria, o cerne da dislexia estaria no processamento fonológico. A
hipótese que subsidia a teoria é a de que um rebaixamento da consciência fonológica
impede a conversão adequada dos sons da fala em letras, impossibilitando uma leitura
fluente.
Mais uma teoria que está bastante difundida é a teoria do processamento auditivo
rápido. Nesta teoria a autora indica que existe um déficit de processamento auditivo na
dislexia, mas essa dificuldade estaria ligada mais diretamente à inabilidade de processar
adequadamente dois ou mais sons de modo rápido e sequencial, o que levaria a uma
leitura lentificada.
Outra teoria que pode ser citada é a hipótese do duplo déficit. Nela o foco está em que o
problema da dislexia está vinculado à velocidade de nomeação. Nesta teoria os leitores
são classificados
65
UNIDADE II │ OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA
sem presença de alteração fonológica. Por fim, o subtipo duplo déficit relaciona-se tanto
a alteração fonológica quanto a de nomeação, ambas abaixo da média.
A investigação para o diagnóstico da dislexia deve contar com a avaliação das habilidades
de linguagem oral, de leitura e de escrita, além da indicação da defasagem entre o que
a criança deveria ter alcançado e o que ela alcançou no decorrer da sua alfabetização.
Autores como Dockrell e McShane (2000) citados por Miranda, Muszkat e Mello (2013)
apontam que a avaliação deve abranger o exame formal das habilidades cognitivas do
avaliado e de suas aquisições acadêmicas, sendo geralmente utilizada para confirmar
atrasos de desempenho.
O processo diagnóstico precisa servir para detectar as dificuldades, sua origem e por
que acontecem. A partir de todas essas informações, existe a possibilidade não apenas
de confirmar o diagnóstico de dislexia, como de verificar se existem comorbidades
ou um possível diagnóstico diferencial. Além disso, há a possibilidade de planejar
intervenções preventivas e terapêuticas baseado nas habilidades linguísticas e cognitivas
comprometidas e preservadas, de maneira a amenizar os problemas no desempenho
acadêmico.
66
OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA │ UNIDADE II
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UNIDADE II │ OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA
Os déficits na linguagem variam de acordo com os indivíduos. Pode ocorrer que pessoas
não apresentem qualquer tipo de fala, assim como as que têm atrasos na linguagem,
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OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA │ UNIDADE II
Quando há linguagem nas crianças pequenas com o transtorno, ela costuma ser
unilateral, sem reciprocidade social, utilizada mais para pedir ou classificar do que para
comentar, compartilhar sentimentos ou conversar.
Nos adultos que não têm deficiência intelectual ou atrasos de linguagem, os déficits
na reciprocidade socioemocional podem ser percebidos mais como dificuldades de
processamento e resposta a pistas sociais mais elaboradas, por exemplo, quando e de
que jeito entrar em uma conversa e o que dizer.
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UNIDADE II │ OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA
Transtornos da comunicação
A fala pode ser definida como a produção expressiva de sons. Nela estão contidas a
articulação, a fluência, a voz e a qualidade da ressonância de um indivíduo.
A linguagem, por seu turno, inclui a forma, a função e o uso de um sistema convencional
de símbolos, por exemplo, as palavras faladas, a linguagem de sinais, as palavras escritas
e figuras.
70
OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA │ UNIDADE II
A comunicação, por fim, inclui todo comportamento verbal e não verbal – seja ele
intencional ou não – que se relaciona de modo próximo com o comportamento, com as
ideias ou as atitudes das pessoas.
71
UNIDADE II │ OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA
Outros problemas que ocorrem no transtorno da linguagem são para recordar palavras
e frases novas e também dificuldades em seguir instruções com mais palavras e para
ensaiar encadeamentos de informações verbais, como recordar uma lista de compras.
Alguns outros dados que servem de apoio para o correto diagnóstico é que a pessoa
pode parecer tímida ou reticente em falar, além de preferir se comunicar apenas entre
os membros da família ou com pessoas conhecidas.
72
OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA │ UNIDADE II
Nas crianças com desenvolvimento típico aos quatro anos de idade a fala geral deve
ser compreensível. Aos dois anos apenas 50% da produção pode ser passível de
entendimento.
O transtorno da fala deve ser comparado com alguns diagnósticos diferenciais, como a
disartria e o mutismo seletivo.
73
UNIDADE II │ OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA
É importante notar que a disfluência está muitas vezes ausente na leitura oral, no ato de
cantar ou na conversa com objetos inanimados e animais de estimação.
Outra característica que serve de apoio ao diagnóstico é que o transtorno pode vir
acompanhado por movimentos motores, como o piscar de olhos, tiques, tremores
labiais ou faciais, movimentos descontrolados da cabeça, movimentos respiratórios e
mãos em punho.
O transtorno da fluência com início na infância ocorre até os seis anos de idade para 80
a 90% das pessoas afetadas. A idade de início varia dos dois aos sete anos.
A partir do momento em que a criança começa a perceber a sua dificuldade na fala, ela
pode desenvolver mecanismos de esquiva das disfluências e ter reações emocionais. Ela
pode ainda se esquivar de falar em público e passar a usar falas curtas e simples.
Há pesquisas de longo prazo que indicam de 65 a 85% de recuperação das crianças com
disfluência, sendo a gravidade do transtorno aos oito anos um preditor de recuperação
ou persistência na adolescência e fase adulta.
Em relação aos fatores de risco aponta-se que o risco de gagueira entre parentes
biológicos de primeiro grau de pessoas com o transtorno da fluência é mais de três
vezes maior do que o risco entre a população geral.
74
OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA │ UNIDADE II
Os déficits no transtorno da comunicação social não são melhor explicados por baixas
capacidades nos domínios da linguagem estrutural ou capacidade cognitiva.
Ao redor dos quatro ou cinco anos a maioria das crianças deve apresentar capacidades de
fala e linguagem capazes de garantir a percepção de déficits específicos na comunicação
social.
As formas mais amenas do transtorno podem não ficar evidenciadas antes do começo da
adolescência, período em que a linguagem e as interações sociais ficam mais complexas.
Entre os que têm melhoras substanciais, ainda assim os primeiros déficits na pragmática
podem resultar em prejuízos duradouros nas relações sociais e no comportamento,
como também na aquisição de outras habilidades relacionadas, como a expressão
escrita.
75
UNIDADE II │ OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA
Transtornos Motores
76
OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA │ UNIDADE II
O diagnóstico para qualquer dos transtorno de tique está baseado na presença de tiques
motores ou vocais, duração dos tiques, idade de início e ausência de qualquer causa
conhecida, como outra condição médica ou uso de substância.
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UNIDADE II │ OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA
Há dados que indicam que 50% a 75% dos transtornos mentais iniciam na infância e
adolescência (KESSLER et al., 2007 apud MACHADO et al., 2014). No Brasil é estimado
que a prevalência de transtornos mentais na infância e adolescência varie entre 7% e
20% a depender da região investigada, da exposição a fatores de risco e da metodologia
utilizada nos estudos.
78
OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA │ UNIDADE II
Capítulo 3
Interfaces entre neuropsicologia e
especialidades médicas
No entanto, existem outras condições a respeito das quais existem poucas publicações,
tais como as miopatias, distrofias miotônicas e canalpatias. Essa diferença faz com que
em relação às doenças mais conhecidas existam padrões cognitivo-comportamentais de
referência, enquanto que para as doenças menos conhecidas esses padrões não existem
ou ainda não foram formulados.
79
UNIDADE II │ OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA
Categoria Objetivo
1 Identificação e descrição de mudanças cognitivas, comportamentais e emocionais
2 Determinar a correlação entre neuroanatomia e neurofisiologia com os resultados dos testes
Determinar se as discrepâncias entre o observado e o encontrado na avaliação estão associadas com doenças
3
neurológicas, psiquiátricas, transtornos do desenvolvimento ou outras patologias
4 Avaliar mudanças na evolução e sugerir um prognóstico
5 Oferecer informações para a reabilitação ou planejamento educacional
6 Avaliar a eficácia do tratamento medicamentoso e terapêutico
7 Oferecer à família informações a respeito das dificuldades cognitivas da crianças
É importante ressaltar que nem todas as crianças com doenças neuropsiquiátricas estão
habilitadas para a testagem neuropsicológica.
2. dificuldades de aprendizado;
3. transtornos do desenvolvimento;
9. avaliação da reabilitação.
80
OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA │ UNIDADE II
81
UNIDADE II │ OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA
vista que o hipocampo, localizado na área medial do lobo temporal, tem envolvimento
na cristalização da memória declarativa, a ELT é concomitante com alterações nessa
função cognitiva. Já a epilepsia do lobo frontal (ELF) é a segunda mais comum entre as
epilepsias focais, equivalendo a 20 a 30% dos casos.
O acidente vascular cerebral (AVC) é uma das causas de prejuízo cognitivo de enorme
prevalência epidemiológica, pois se trata de condição que afeta a população em geral,
especialmente os idosos. Boa parte dos conhecimentos em neuropsicologia deriva de
estudos com pacientes que tinham lesões vasculares cerebrais.
As afasias, apraxias, agnosias são resultados comuns entre os pacientes que sofreram
AVCs.
82
OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA │ UNIDADE II
A apresentação das tarefas é definida por uma ordem fixa, sendo que apenas dos testes
de atenção não são agrupados em sequência, pois servem como distratores para a
subescala de memória.
A pontuação das demais provas quando do acerto das primeiras tarefas tem como
resultado a diminuição do tempo geral de aplicação, estimulando o paciente a continuar
na prova, o que possibilita tanto a percepção de suas dificuldades quanto capacidades.
83
UNIDADE II │ OS DIFERENTES CAMPOS DE ESTUDO DA NEUROPSICOLOGIA
84
NEUROPSICOLOGIA
HOSPITALAR E Unidade iII
NEUROPSICOLOGIA
NA EDUCAÇÃO
Capítulo 1
O neuropsicólogo na instituição
hospitalar
3. suporte psicológico.
Nos dias de hoje, milhares de pessoas são vítimas de ocorrências que afetam o cérebro
primária ou secundariamente e como resultado podem ter sua vida comprometida.
85
UNIDADE III │ NEUROPSICOLOGIA HOSPITALAR E NEUROPSICOLOGIA NA EDUCAÇÃO
Por isso os cuidados iniciais oferecido a essas pessoas podem ser fundamentais para
preservar e proteger as funções cerebrais, impedindo danos permanentes.
A equipe de reabilitação pode propiciar uma avaliação funcional que ajude o paciente
nos seus déficits, oferecendo a ele treinamento e despertando seu engajamento nas
atividades práticas. Isso contribui para que se reduza os sentimentos de impotência e
incerteza do paciente.
A avaliação neuropsicológica, neste contexto, vai obter dados a respeito dos déficits, dos
recursos e das estratégias que estão sendo utilizadas pelo paciente ou que ele poderá
vir a ter. Assim, essas informações vão permitir a escolha das metas e dos métodos que
serão utilizados, por exemplo, pode-se definir entre restaurar uma função perdida pela
prática de treino e retreino ou compensá-la pelo uso de instrumentos externos, como
agendas e alarmes.
Os objetivos também devem ser formulados tendo em vista o curto, médio e longo prazo,
sendo todos coerentes com a idade, nível de atividade e participação, e, sobretudo, os
objetivos devem ser realistas de acordo com as características do paciente.
86
NEUROPSICOLOGIA HOSPITALAR E NEUROPSICOLOGIA NA EDUCAÇÃO │ UNIDADE III
Os autores sustentam que os variados modelos e teorias têm impacto sobre o processo
de reabilitação neuropsicológica, mas sublinham a importância do conhecimento de
cinco áreas:
a. Funcionamento cognitivo.
b. Emoção.
c. Interação social.
d. Comportamento.
e. Aprendizagem.
Reabilitação neuropsicológica
Ao serem examinadas as bases teóricas que fundamentam a prática da reabilitação
neuropsicológica, pode-se observar que a referência a modelos conceituais ocorreu
apenas nas últimas décadas.
87
UNIDADE III │ NEUROPSICOLOGIA HOSPITALAR E NEUROPSICOLOGIA NA EDUCAÇÃO
Tais tarefas incluíam utilizar o talão de cheques, fazer compras ou usar o transporte
público, sendo tudo isso considerado o alvo final do tratamento. Passou-se, então, da
ênfase da reabilitação dos processos cognitivos para a ênfase na importância das metas
funcionais.
Ainda na década de 1990 ficou evidenciado nos Estados Unidos que as despesas para a
manutenção dos pacientes internados na fase pós-aguda eram elevadíssimas. Por isso
a situação tornou-se praticamente a inversa dos anos anteriores, ficando o paciente
internado apenas semanas ou dias, mesmo que haja sequelas graves.
88
NEUROPSICOLOGIA HOSPITALAR E NEUROPSICOLOGIA NA EDUCAÇÃO │ UNIDADE III
De acordo com Kazdin e Hersen (1980) citados por Abrisqueta-Gomez et al. (2012)
os profissionais que usam a abordagem comportamental têm quatro características
principais:
89
UNIDADE III │ NEUROPSICOLOGIA HOSPITALAR E NEUROPSICOLOGIA NA EDUCAÇÃO
De acordo com Wilson (2002), citado por Abrisqueta-Gomez et al. (2012), os modelos
teóricos que embasam as abordagens comportamentais vêm de diferentes áreas
como a teoria da aprendizagem, neuroplasticidade, processamento da informação,
linguística, psiquiatria. Sendo assim, os modelos comportamentais são valiosos para
a reabilitação, pois ajudam na avaliação, tratamento e medição da efetividade que o
processo reabilitador está apresentado.
Modelo Característica
Identificar as forças e fraquezas cognitivas dos pacientes afetados por traumas encefálicos; utiliza os
Modelos cognitivos modelos do funcionamento cognitivo da linguagem, memória, do funcionamento executivo, da atenção e
da percepção
Trabalham com a adequação emocional e psicológica dos pacientes; auxiliam na identificação dos fatores
Modelos emocionais e psicossociais
relacionados à readaptação dos pacientes ao seu ambiente social
Modelos comportamentais Visam à melhoria dos comportamentos inadequados dos pacientes e dos seus déficits cognitivos
90
Capítulo 2
Neuropsicologia e a educação
Queixas escolares
Algumas crianças com QIs normais e funcionamento adaptativo adequado podem
apresentar dificuldades para aprender a ler, escrever ou fazer cálculos. O rótulo
comumente utilizado para caracterizar esses problemas é transtorno de aprendizagem.
Inicialmente esse tipo de busca pode até ser saudável, pois revela interesse e autonomia,
mas exige julgamento crítico. O problema está em acreditar que essas informações
encontradas são mais precisas do que um diagnóstico realizado por profissional
habilitado. Assim, existe o risco de não aderência ao tratamento ou distorções no modo
de encará-lo, caso seja o tratamento a recomendação do profissional da saúde.
Esses problemas indicam uma relação entre saúde e educação que tem sido mediada
principalmente pela neurociência, área que estuda o sistema nervoso sob diferentes
perspectivas, desde a molecular até a comportamental, em que a neuropsicologia se
aplica.
91
UNIDADE III │ NEUROPSICOLOGIA HOSPITALAR E NEUROPSICOLOGIA NA EDUCAÇÃO
92
NEUROPSICOLOGIA HOSPITALAR E NEUROPSICOLOGIA NA EDUCAÇÃO │ UNIDADE III
Fatores
Sociais Tipo de escola, disciplina, condições materiais, situações de risco
Psicológicos Falta de interesse e motivação, trauma de infância, problemas emocionais
Nutrição, sono, maturidade do sistema nervoso, características genéticas, afecções neurológicas, transtornos
Orgânicos
psiquiátricos
93
UNIDADE III │ NEUROPSICOLOGIA HOSPITALAR E NEUROPSICOLOGIA NA EDUCAÇÃO
A equipe conta sempre com a escola e a família para que acompanhem e desenvolvam
o potencial da criança, tendo como meta a aprendizagem que seja possível para ela. É
importante ressaltar que em certas condições os resultados obtidos serão os possíveis
e não os ideais.
94
NEUROPSICOLOGIA HOSPITALAR E NEUROPSICOLOGIA NA EDUCAÇÃO │ UNIDADE III
Neuropsicologia e aprendizagem
O conceito de dificuldades de aprendizagem (DA), inicialmente proposto por Samuel
Kirk em 1963, não tem, ainda hoje, consenso, seja em termos de elegibilidade ou de
identificação. No entanto, a condição de DA é comumente reconhecida como um
problema que pode provocar sérias dificuldades de adaptação à escola e, com frequência,
propaga-se ao longo da vida.
As pessoas com DA, que tenham um potencial intelectual mediano, sem entraves visuais
ou auditivos, motivados a aprender e integrantes de um processo de ensino eficaz para
a maioria, mostram dificuldades inesperadas em vários tipos de aprendizagem, de
acordo com Fonseca (2011), elas são:
96
NEUROPSICOLOGIA HOSPITALAR E NEUROPSICOLOGIA NA EDUCAÇÃO │ UNIDADE III
Para que se forme um bom leitor são necessárias habilidades que têm muitas
semelhanças com as capacidades formadoras de um bom ouvinte. Uma criança com
vocabulário empobrecido, habilidades sintáticas e semânticas fracas, incapacidade de
fazer inferências terá muita dificuldade de entender o que lê, pois já apresenta déficits
em entender o que ouve.
97
UNIDADE III │ NEUROPSICOLOGIA HOSPITALAR E NEUROPSICOLOGIA NA EDUCAÇÃO
98
NEUROPSICOLOGIA HOSPITALAR E NEUROPSICOLOGIA NA EDUCAÇÃO │ UNIDADE III
99
UNIDADE III │ NEUROPSICOLOGIA HOSPITALAR E NEUROPSICOLOGIA NA EDUCAÇÃO
Um processo de triagem bem estruturado permite que toda criança com dificuldade de
aprendizagem seja encarada como um indivíduo total, tendo em vista as características
específicas do seu perfil de desenvolvimento e de aprendizagem.
100
NEUROPSICOLOGIA HOSPITALAR E NEUROPSICOLOGIA NA EDUCAÇÃO │ UNIDADE III
humano. Cérebros imaturos são organizados por princípios particulares, que sofrem
influência do processo de maturação cerebral, da evolução no uso das estratégias
cognitivas e da aquisição de conhecimentos oriundos do ensino e da cultura.
Os pais têm papel fundamental em todo o processo relacionado não apenas a identificação
da DA como também na formulação das estratégias interventivas, pois são eles que
conhecem melhor seus filhos e podem perceber neles padrões de desenvolvimento
diferenciados dentro da mesma família.
Os pais podem perceber que um filho tem mais dificuldades de dominar o alfabeto do que
o outro, ou ainda que um tenha mais relutância em aprender a ler ou é mais distraído.
As preocupações dos pais em relação a essas questões precisam ser consideradas, pois
suas observações cotidianas permitem que eles notem sinais importantes, durante os
anos de pré-escola, que ajudarão na formulação diagnóstica.
Dentre estes sinais destacam-se alguns, que são, de acordo com Jansk e Hirsch (1972),
Lerner (2003) e Fonseca (2004) citados por Fonseca (2011):
»» esquecimento;
101
UNIDADE III │ NEUROPSICOLOGIA HOSPITALAR E NEUROPSICOLOGIA NA EDUCAÇÃO
»» confusão com pares de palavras que soam igual (ex.: nó-só; tua-lua);
Fonseca (2011) destaca ainda alguns sinais que precisam ser observados na criança
durante os primeiros anos da sua escolaridade, que são:
»» memória fraca;
»» dificuldades psicomotoras;
Todos os sinais anteriormente expostos podem ser identificados facilmente por pais e
professores, que precisam trabalhar em conjunto, pois apenas sua constante interação
e comunicação permitem que se encontrem alternativas de suporte pedagógico. Dessa
maneira, os efeitos das DA nas crianças poderão ser minimizados.
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NEUROPSICOLOGIA
NO ESPORTE E Unidade iV
NEUROPSICOLOGIA
FORENSE
Capítulo 1
Neuropsicologia e esporte
Interdisciplinaridade no esporte
Atualmente, tem sido amplamente divulgada a importância de se ter hábitos saudáveis
de vida como modo de combater os danos causados à saúde pelo modo como se vive nas
grandes cidades.
A concepção que envolve os hábitos saudáveis e qualidade de vida resulta num dos
elementos para que as pessoas se motivem em relação à prática de atividades físicas.
O exercício regular e controlado traz benefícios para a saúde do ser humano, como
redução dos níveis de ansiedade, estresse e depressão, melhorias no humor, aumento do
bem-estar físico e psicológico, melhor funcionamento orgânico geral, maior rendimento
no trabalho e disposição física e mental aumentadas.
A relação do exercício físico com a saúde das pessoas está, hoje em dia, bem embasada
e evolui a partir das pesquisas na área da medicina desportiva. Porém, considerando o
indivíduo um ser biopsicossocial, não se deve desprezar a importância dos conhecimentos
de outras disciplinas.
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NEUROPSICOLOGIA NO ESPORTE E NEUROPSICOLOGIA FORENSE │ UNIDADE IV
Neuropsicologia e esporte
As aplicações na neuropsicologia à pesquisa das práticas esportivas têm mostrado duas
vertentes de aplicação: a compreensão de aspectos neuropsicológicos relacionados ao
desempenho de atletas e as consequências das lesões cerebrais adquiridas, tendo em
vista o desempenho em modalidades esportivas com qualidades edemandas cognitivas
diferentes.
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UNIDADE IV │ NEUROPSICOLOGIA NO ESPORTE E NEUROPSICOLOGIA FORENSE
Na investigação das concussões nos esportes, Powell e Barber-Fross (1999) citados por
Malloy-Diniz et al. (2010) identificaram que nos Estados Unidos o principal responsável
pelos casos em alunos do ensino médio é o futebol americano (63,4%), seguido pela luta
livre (10,5%), o futebol (5,5%) e o basquete (5,1%), dentre outros.
No Brasil, existe uma falta de estudos epidemiológicos a respeito das concussões nos
esportes. Baseando-se na preferência do brasileiro pelo futebol é possível inferir que ele
é o esporte com maior índice de concussão nas diversas faixas etárias.
Atualmente, os testes evoluíram e, além dos típicos feitos com lápis e papel, existem
os computadorizados. A principal característica desses instrumentos é a capacidade de
identificar as menores alterações nas funções cerebrais, que podem não ser detectadas
por meio de exames de neuroimagem nas estruturas cerebrais.
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NEUROPSICOLOGIA NO ESPORTE E NEUROPSICOLOGIA FORENSE │ UNIDADE IV
Personalidade e esporte
Samulski (2002) explicita que há três diferentes hipóteses a respeito das relações entre
esporte e personalidade:
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UNIDADE IV │ NEUROPSICOLOGIA NO ESPORTE E NEUROPSICOLOGIA FORENSE
Ogilvie e Tutko (1971) citados por Samulski (2002) apontam algumas características
da personalidade de esportistas, como, por exemplo, que são pessoas motivadas para
o rendimento, que são pessoas organizadas e disciplinadas e que têm uma elevada
capacidade de autoconfiança. Além disso, os autores apontam também os “esportistas
com problemas” que têm características como ansiedade, medo do fracasso, tendência
para atitudes depressivas, sensibilidade exagerada diante do insucesso ou críticas.
Eysenck (1982), citado por Samulski (2002), avalia que os esportistas tendem a
apresentar um temperamento extrovertido, sendo que particularmente os esportistas
de rendimentos mais elevados têm taxas mais baixas de neurose, ansiedade e depressão
quando comparados aos não esportistas.
Outro autor, Sack (1980) citado por Samulski (2002) identifica diferenças entre
praticantes e não praticantes de esporte em jovens de 12 a 22 anos: os praticantes têm
motivação mais alta para o rendimento, são menos reservados e fechados, revelam
menor ansiedade, têm boa capacidade de adaptação social e mostram mais interesse
para atividades práticas do que teóricas.
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NEUROPSICOLOGIA NO ESPORTE E NEUROPSICOLOGIA FORENSE │ UNIDADE IV
Um instrumento que pode ser utilizado na identificação deste traço é a escala de busca
da sensação impulsiva.
Como resultado mais evidente do constructo “busca de sensação nos esportes” está que
a escolha da atividade esportiva está relacionada ao que ela pode promover em termos
de níveis de sensação, experiência e risco envolvido.
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UNIDADE IV │ NEUROPSICOLOGIA NO ESPORTE E NEUROPSICOLOGIA FORENSE
Em relação a esta última questão já foram dados alguns passos investigativos. De acordo
com Lage e colaboradores (2007), citados por Malloy-Diniz et al. (2010), há correlação
positiva entre impulsividade e número de erros de passe em jogadores de handebol.
Malloy-Diniz et al. (2010) analisam que o esporte deve ser entendido como um
contructo complexo, abarcador de inúmeros aspectos. Sendo assim, as avaliações
neuropsicológicas no esporte podem contribuir bastante na produção de conhecimento,
no diagnóstico de fatores de interferência no desempenho e na intervenção com uma
perspectiva de trabalho multidisciplinar.
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Capítulo 2
Neuropsicologia forense
Platão, filósofo grego, nascido em 428 a.C, descreveu a medula como sendo das partes
mais importantes do corpo, tendo-a como uma extensão do cérebro. Alcmeón de
Crotona, como já apontado, sugeria que o cérebro era importante para a sensação e
pensamento, garantindo que, para cada sensação havia no cérebro uma localização
específica.
Um século mais tarde, Hipócrates sustentava que o cérebro respondia pela inteligência,
sensação e emoção. Este autor diferenciava os quadros epilépticos das possessões
demoníacas. Galeno, 129 d.C, justificava que a sensação ocorria em função de uma
mudança qualitativa de um órgão dos sentidos, e que a percepção se fundamentava
como um estado de consciência dessa alteração.
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UNIDADE IV │ NEUROPSICOLOGIA NO ESPORTE E NEUROPSICOLOGIA FORENSE
No século XIX, Franz Josef Gall, definiu a diferença entre a substância branca e a
cinzenta do cérebro, explicitando a conexão dos quadros de afasia com lesões de lobo
frontal. Gall propôs 27 faculdades humanas ligadas a áreas cerebrais, inventando, dessa
maneira, a teoria geral da localização cerebral, também conhecida como frenologia.
Uma década mais tarde Wernicke apresentou casos de pacientes com lesões do terço
posterior do giro temporal superior esquerdo. Esses pacientes não tinham alterações na
fala expressiva, no entanto as lesões tinham como consequência a perda da capacidade
em compreendê-la.
Para Crawford, Parker e McKinlay (1994) citados por Serafim e Saffi (2015), de fato
a neuropsicologia passa a ser reconhecida por meio dos trabalhos de Alexander
Romanovich Luria, que inventou variadas técnicas para avaliar o comportamento de
pessoas afetadas por lesões cerebrais.
Luria concebia o sistema nervoso central como organizado em rede e participante ativo
nas funções superiores (percepção, memória, gnosias, praxias), tendo em vista que
tais funções se estruturam como complexos sistemas, o que resulta em uma interação
dinâmica dos vários sistemas entre si.
Luria formulou a teoria do sistema funcional em que os termos “função”, “localização”
e “sintoma” foram revisados. O termo “função” foi trocado por sistema funcional, pois
se refere a uma gama de áreas trabalhando juntas para atingirem o objetivo final.
Os achados de Luria não apenas contribuíram para o entendimento do funcionamento
cerebral, mas também ajudaram no desenvolvimento de formas para se avaliar as
possíveis disfunções cerebrais.
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NEUROPSICOLOGIA NO ESPORTE E NEUROPSICOLOGIA FORENSE │ UNIDADE IV
Sendo assim, a avaliação neuropsicológica constrói uma lente por meio da qual a
natureza e a dinâmica dos processos cognitivos e afetivo-emocionais são constituídas
na sua relação com o cérebro. De acordo com Lezak e colaboradores (2006) citados
por Serafim e Saffi (2015) o percurso da investigação neuropsicológica envolve a
determinação da função cerebral inferida a partir da manifestação do comportamento.
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UNIDADE IV │ NEUROPSICOLOGIA NO ESPORTE E NEUROPSICOLOGIA FORENSE
No campo forense a avaliação neuropsicológica está inserida na fase pericial. Esta fase
usa de conhecimentos técnico-científicos para o esclarecimento de pontos considerados
importantes para o procedimento processual.
O procedimento pericial deve ser pautado nos quesitos formulados pelos agentes
jurídicos (juiz, promotor, procurador, delegado, advogado), devendo o perito investigar
o funcionamento mental do indivíduo avaliado para a ação judicial de qualquer natureza
(civil, trabalhista, criminal). Tal se dá pelo exame da personalidade e das funções
cognitivas do periciando.
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NEUROPSICOLOGIA NO ESPORTE E NEUROPSICOLOGIA FORENSE │ UNIDADE IV
A avaliação forense pretende estabelecer as possíveis causas que fizeram com que uma
pessoa adotasse condutas incompatíveis com as normas sociais vigentes ou a fazer algo
que colocasse dúvidas quanto a sua verdadeira capacidade de autonomia, levantando
receios quanto a sua saúde mental.
A perícia pode ainda servir para a verificação de possíveis danos psíquicos oriundos
de uma experiência traumática vinculada à violência. Em tais casos são investigados
os seguintes sistemas: neuropsicológico, psicossensorial, expressivo, afetivo, cognitivo,
vivencial e político.
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UNIDADE IV │ NEUROPSICOLOGIA NO ESPORTE E NEUROPSICOLOGIA FORENSE
Cumprindo todos esses itens, o perito leva ao juiz um conhecimento técnico embasado
para que ele possa decidir no âmbito do processo. O perito pode ser visto como um
auxiliar da Justiça, capaz e competente para esclarecer um fato de acordo com seus
conhecimentos científicos e técnicos.
A atuação em interface com a justiça exige alguns quesitos por parte dos profissionais
peritos que, de acordo com Hilsenroth e Stricker (2004) citados por Serafim e Saffi
(2015), são: qualificação e competência, conhecimento das normas jurídicas e seleção e
utilização adequadas de instrumentos psicológicos. A constituição do processo pericial
pode ser esquematizada seguindo o fluxograma abaixo:
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NEUROPSICOLOGIA NO ESPORTE E NEUROPSICOLOGIA FORENSE │ UNIDADE IV
Entrevista psicológica
Justiça civil
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UNIDADE IV │ NEUROPSICOLOGIA NO ESPORTE E NEUROPSICOLOGIA FORENSE
Justiça Trabalhista
O perito poderá ser requisitado também para atuar em situação de acidente de trabalho
com efeitos psicológicos, neurológicos ou psiquiátricos, além de avaliar a presença de
possíveis sequelas psíquicas para a concessão de indenização.
Todos esses casos são de grande importância por serem imprescindíveis para que o
indivíduo possa obter benefícios previdenciários ou ingressar em certa vaga de emprego,
isto pela avaliação admissional. Tal tipo de avaliação consiste no exame das condições
psíquicas do trabalhador para que exerça o posto profissional ao qual se candidatou.
Direito administrativo
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NEUROPSICOLOGIA NO ESPORTE E NEUROPSICOLOGIA FORENSE │ UNIDADE IV
Simulação de déficits
Tipo Descrição
Simulação pura A pessoa finge um transtorno que não existe
Simulação parcial O paciente exagera de forma consciente os sintomas de fato existentes
Falsa imputação O indivíduo descreve sintomas que não são compatíveis com a patologia alegada
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UNIDADE IV │ NEUROPSICOLOGIA NO ESPORTE E NEUROPSICOLOGIA FORENSE
Quadro Descrição
Perda da memória que geralmente está relacionada a acontecimentos recentes, não resultante de
transtorno mental orgânico e muito grave para ser considerada como expressão de esquecimento ou de
F44.0 – Amnésia dissociativa
fadiga. A amnésia costuma estar relacionada a eventos traumáticos, como acidente ou lutos imprevistos
e é do tipo parcial ou seletiva com mais frequência.
A fuga apresenta todas as características de uma amnésia dissociativa, mas também apresenta um
F44.1 – Fuga dissociativa
deslocamento motivado além do habitual.
Presença de diminuição significativa ou ausência dos movimentos voluntários, assim como da reatividade
F44.2 – Estupor dissociativo normal a estímulos externos, sem que os exames clínicos e complementares indiquem evidências de
uma causa física
Perda transitória da consciência da própria identidade, associada a uma conservação perfeita da
F44.3 – Estados de transe e possessão consciência do meio ambiente. Devem ser incluídos aqui apenas os estados de transe involuntários e não
desejados, excluídos aqueles de situações admitidas no contexto cultural ou religioso do sujeito
Perda da capacidade de mover uma parte ou a totalidade do membro ou dos membros. Pode haver
F44.4 – Transtornos dissociativos do
semelhança estreita com quaisquer variedades de ataxia, apraxia, acinesia, afonia, disartria, discinesia,
movimento
convulsões ou paralisia
Os movimentos observados no curso das convulsões dissociativas podem se assemelhar muito àqueles
F44.5 – Convulsões dissociativas observados no curso das crises epiléticas, mas a mordedura de língua, os ferimentos por queda e a
incontinência urinária são raros
Os limites das áreas cutâneas anestesiadas correspondem mais a concepções pessoais do paciente do
F44.6 – Anestesia e perda sensorial
que a descrições científicas. Do mesmo modo, pode haver perda de um dado tipo de sensibilidade, com
dissociativas
conservação de outras sensibilidades, não correspondendo a nenhuma lesão neurológica conhecida.
Slick, Sherman e Iverson (1999) citados por Souza, Machado e Quintas (2013) criaram
um procedimento para avaliar a presença de simulação. O instrumento chama-se
Simulação da Disfunção Neurocognitiva (SDN) e é composto de quatro critérios:
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NEUROPSICOLOGIA NO ESPORTE E NEUROPSICOLOGIA FORENSE │ UNIDADE IV
O primeiro envolve testes que foram desenvolvidos especialmente para tal propósito,
chamados de testes de reconhecimento da escolha forçada. Algumas dúvidas a respeito
desses procedimentos têm sido levantadas na literatura, de modo que o teste mesmo
possa servir para que as pessoas aprendam a manipular os resultados sem serem
detectados ou, ainda mais grave, aprendam como enganar as próprias medidas de
identificação de simulação.
Jovens infratores
No direito penal, para que o indivíduo seja considerado responsável por um delito, são
necessárias três condições fundamentais: 1 - ter praticado o delito, 2 - no período do
delito ter o entendimento da característica criminosa da ação e 3 - no período do delito
ter sido livre na escolha entre consumar ou não o delito.
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UNIDADE IV │ NEUROPSICOLOGIA NO ESPORTE E NEUROPSICOLOGIA FORENSE
Convém destacar que na escolha dos métodos a serem utilizados nas avaliações são
consideradas, além das características do que se pretende avaliar, as especificidades
dos próprios testes utilizados.
Alguns dados epidemiológicos indicam que 96% dos internos da Fundação CASA são
do sexo masculino, sendo que 80% deles não frequentavam a escola, 86% sofreram
violência doméstica, 63% apresentaram transtorno de conduta na infância e 3% eram
agressores sexuais. A média de idade desses jovens é de 16 anos.
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NEUROPSICOLOGIA NO ESPORTE E NEUROPSICOLOGIA FORENSE │ UNIDADE IV
Conclusão
A neuropsicologia, como ciência que estuda as relações entre cérebro e funções
cognitivas, tem caráter interdisciplinar desde sua construção, pois reuniu diversas
áreas do conhecimento para fundamentar sua própria metodologia e conceitos.
O estudo das relações entre cérebro e funções cognitivas tem um importante marco no
século XIX com as pesquisas de Gall, Broca e Harlow, este último relatando o famoso
caso Phineas Gage.
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UNIDADE IV │ NEUROPSICOLOGIA NO ESPORTE E NEUROPSICOLOGIA FORENSE
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Referências
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Ferreira.; NITRINI, Ricardo.; CARAMELLI, Paulo.; JUNIOR, Antônio Lúcio Teixeira.;
OLIVEIRA, Rodrigo Grassi.; CHRISTENSEN, Christian Haag.; BRANDÃO, Lenisa.;
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