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1ª DEFENSORIA PÚBLICA ESPECIALIZADA EM ATENDIMENTO DE INTERESSES COLETIVOS

PEDIDO DE SUSPENSÃO DE LIMINAR


- ART. 4º, LEI N.º 8.437/92 -

Processo Referência: Ação de Reintegração de Posse nº


0003713-43.2013.8.04.5400 da 2ª Vara da Comarca de
Manacapuru-AM.

Foro competente: Presidência do Egrégio Tribunal de Justiça do Estado do


Amazonas - art. 62, II, “a” da LCE nº 17/1997

Requerente: Defensoria Pública do Estado do Amazonas

Requerida: Agropecuária Exata Ltda.

Manaus, 23 de fevereiro de 2018.

Carlos Alberto Souza de Almeida Filho


Defensor Público

Rua 24 de maio, nº 321, Centro – CEP: 69010-080 - Manaus/AM Tel: 3236-3474 - E-mail:
dpeac@defensoria.am.gov.br

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1. DA QUALIFICAÇÃO DAS PARTES

1.1. DA REQUERENTE

A DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO DO AMAZONAS​, CNPJ nº


19.421.427/0001-91, presentada pelo Defensor Público titular da 1ª Defensoria
Pública Especializada em Atendimento de Interesses Coletivos - DPEAIC, cujo
titular assina a presente ação, com os seguintes endereços para intimação:

● Sede: Rua Maceió, n. 307, Nossa Senhora das Graças, CEP n. 69.053-135,
telefones: (92) 3633-2955, 3633-2986 ou 3234-3097;

● 1ª DPEAIC: Rua 24 de maio, n. 321, Centro, CEP n. 69.010-080, telefone


(92) 3236-3474.

1.2. DA REQUERIDA

AGROPECUÁRIA EXATA LTDA., ​pessoa jurídica de direito privado,


inscrito no CNPJ nº 34.587.402/0001-56, com sede na Rodovia Manoel Urbano,
Município de Manacapuru, Amazonas;

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2. DOS PEDIDOS

A Defensoria Pública do Estado do Amazonas, com fulcro no art. 4.º da Lei


nº 8.437/1992, bem como nos fundamentos fáticos-jurídicos e documentos em
anexo, vem perante Vossa Excelência solicitar a ​in continenti S
​ uspensão da
Medida Liminar concedida no bojo da Ação de Reintegração n.º
0003713-43.2013.8.04.5400, que corre na 2º Juízo da Vara da Comarca de
Manacapuru, até seu trânsito em julgado.

O presente pedido, que não resta prejudicado por quaisquer acepções de


coisa julgada - dada a perda de objeto de pedido anterior -, tem fulcro na
patente demonstração de ilegitimidade da medida concedida, no público e
notório dano à ordem pública, bem como no patente interesse público, dado que
as terras em litígio pertencem ao Estado do Amazonas, como resta demonstrado
nas páginas seguintes.

Pede-se, como corolário, a imediata expedição de comunicação ao juízo da


2º Juízo da Vara da Comarca de Manacapuru, para os fins de suspensão, bem
como a declaração de retorno às famílias esbulhadas às suas moradias e
respectivos lotes.

Alfim, pugna-se pela intimação pessoal da Defensoria Pública do Estado do


Amazonas, atribuindo a contagem em dobro de todos os prazos, conforme dispõe
o art. 128, I da LC nº 80/1994 e art. 186 do CPC.

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3. SÍNTESE DOS FATOS

Como é público e notório, acontece no presente momento a tragédia social


que fora anunciada pela Defensoria Pública, mormente quando decidiu realizar
Pedido de Suspensão Liminar n.º ​4004882-56.2017.8.04.0000, cujo intuito era
suspender as reintegrações de posses que estavam com data certa para ocorrer,
haja vista o impacto social e o agravamento do estado de vulnerabilidade dos
moradores que seriam afetados pelo cumprimento das ordens reintegratórias.

Infelizmente, esse brado de socorro fora ouvido a destempo, quando as


casas dos moradores e agricultores já se encontram destruídas, plantações
dizimadas e anos de dedicação à preparação da terra, vilipendiadas e
desprezadas pela Requerida. A destruição e a tristereza era uníssona por aqueles
que vivenciavam aquela triste cena de um filme de terror.

No Tribunal, outra solução não existia, senão extinguir aquele pedido,


dada a perda do objeto, medida adequada para o caso. Porém os efeitos daquela
decisão de reintegração e posse, ainda vigente, continuam sendo o principal
motivo para vê-la suspensa, cujo fim é possibilitar aos que foram afetados pela
decisão.

Desta feita, segue este novo pedido, dado o seguimento da validade da


medida vergastada, sem que qualquer ação de interesse público contra ela se
volte.

Como já se relatou no PSL nº 4004882-56.2017.8.04.0000, ​o presente


pleito, decorre de fato público e notório, cuja reintegração de posse ocorrida na
suposta área pertencente à Requerida, fora de grande repercussão, eclodindo em
todas as mídias de comunicação social123.

A Moradia, apesar de direito fundamental (art. 6.º, CF) de toda pessoa


humana (art. 1º, III, CF) é palco de pouca efetividade, se tratando,
verdadeiramente, de bem escasso e, muitas vezes, inatingível pela população.

No caso dos autos, a situação é muito semelhante, porém com a

1
In:
http://www.reporter-am.com.br/reintegracao-de-posse-em-favor-da-agropecuaria-exata-deixa-dezenas-de-fam
ilias-no-relento-em-manacapuru/
2
In: http://blogdohiellevy.com.br/governo-vai-pedir-suspensao-de-reintegracao-de-posse-em-manacapuru/
3
In:
https://g1.globo.com/am/amazonas/noticia/policia-cumpre-reintegracao-de-posse-e-retira-familias-de-terreno-
no-interior-do-am.ghtml

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agravante da efetivação da ordem de reintegração de posse com base em


documentação que denota o evidente extrapolamento dos limites da área
supostamente pertencente à Requerida, onde findou por desabrigar inúmeras
famílias, colocando-as em estado de extrema vulnerabilidade, dado o desabrigo
aliado à falta de alternativas de moradia.

Importante aludir, ainda, que aliada ao cumprimento da desocupação fora


dos limites da área objeto dos autos, deve-se acrescer que a localidade não
pertence à Requerida, mas ao Estado do Amazonas, conforme se depreende da
Planta de Situação expedida pela Secretaria de Estado de Política Fundiária-SPF:

Ressalta-se, por fim, que o cumprimento das ordens de desocupação se


deu sem a existência de decisão de reintegração de posse, existindo tão somente
decisões de revigoramento dos mandados, estas acessórias àquela, mas que não
suprem irregularidade no início dos autos. Tais fatos estão esmiuçados abaixo:

Esta demanda fora ajuizada no dia 18 de março de 2013, discutindo


acerca da suposta turbação acontecida em 02.10.2010, pela Requerida no lote de
terra, situado à margem esquerda da Rodovia Manoel Urbano, com 6.506.108ha
(seis mil, quinhentos e seis hectares, dez ares e oitenta e quatro centiares),

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limitando-se ao Norte com a margem direita ao Igarapé do Acajatuba, a Leste


com terras de Ângelus Cruz Figueira, ao Sul com a Rodovia Manoel Urbano e
DER, e, a Oeste com as terras de Carlos Farias Bessa, zona rural, conforme
certidão emitida pelo Cartório do 2º Ofício da Comarca de Manacapuru.

Após recebê-la, o Juízo determinou a citação dos Assistidos, ora


substituídos pela Requerente, porém somente um deles, a Sr.ª Maria Áurea
Pacheco, às fls. 34 a 37, apresentou defesa individual buscando resguardar seus
interesses não tratando em nenhum momento dos interesses da Comunidade.

Embora apresentada defesa por um dos comunitários, não houve qualquer


tomada de providências por parte do Juízo, no intuito de determinar a
apresentação de réplica e, quiçá, a designação de audiência preliminar. Por outro
lado, às fls. 41 a 43, a Requerida apresentou pedido de revigoramento de posse,
tendo em vista que não houve cumprimento do mandado reintegratório expedido
em maio/2010, ​in totum:​

No primeiro momento, o Juízo deferiu às fls. 45/46, o pedido de


revigoramento do mandado de reintegração de posse, contudo o Magistrado,
compulsando os autos, às fls. 75, ​percebeu a ausência de decisão
interlocutória que deferira o instituto possessório em favor da
Peticionante, ora requerida, razão pela qual julgou prejudicado o pedido de
revigoramento de posse, determinando, por oportuno, que fosse acostado aos
autos os documentos que não se encontravam no processo, incumbindo esse
ônus à Requerida, conforme decisão abaixo:

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Irresignada com tal decisão, a Requerida apresentou novo pleito,


requerendo expedição de mandado de reintegração de posse, em razão da alta
escala de desmatamento que, supostamente, aconteceu no local à época, o qual
colocaria em risco toda a coletividade e o meio ambiente. Diante disso, foram
juntadas algumas provas, conforme fls. 92 a 99, sendo o pedido deferido pela
MM Juíza às fls. 102.

Tendo em vista o deferimento da Reintegração, compareceram aos autos


as Associações de Moradores das Comunidade do Acajatuba, Comunidade São
Francisco e Ramal do Branco, onde apresentaram contestação afirmando que
apenas um dos vários moradores daquela região fora citado para compor o
litígio, deixando todos os demais sem comunicação acerca da demanda em
epígrafe, violando, desta feita, as garantias do devido processo legal, a ampla
defesa e contraditório.

Diante disso, no dia 21 de setembro de 2015 (fls. 459), o processo foi


chamado à ordem, a fim de que (1) fosse delimitada a área litigiosa, (2) fosse
oficiada à Secretaria de Meio Ambiente para que especifique o dano causado ao
ecossistema local, (3) fosse realizada a citação dos interessados na demanda, (4)
que o Requerente junte aos autos cópia da decisão liminar que fora deferida em
maio de 2010, mas que sumira da serventia e (5) que o Oficial de Justiça junte a
certidão de cumprimento ou não do mandado, ​in verbis:​

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Apesar desse imbróglio, a Requerida, interpôs Agravo de Instrumento,


oportunidade em que determinou-se o cumprimento da medida liminar, outrora
deferida, oportunidade em que o Juízo ​a quo, ​cumprindo a ordem superior,
determinou que se iniciasse o procedimento de cumprimento da ordem, por meio
de Reuniões de Planejamento junto ao Gabinete de Gestão Integrada -GGI, setor
responsável pela organização da estrutura mínima para efetivação da ordem
judicial, uma no dia 21 de setembro de 2017 e outra no dia 30 de novembro de
2017, onde culminou com a fixação dos dias 9 a 12 de janeiro de 2018, para o
cumprimento do mandado de reintegração de posse​.

Tais ordens foram cumpridas nos dias designados, porém sem a


observância da cautela e os limites da ordem, o que gerou várias repercussões,
dentre elas: (i) a desocupação de várias famílias de vários locais que não eram
objeto da demanda; (ii) desocupou área pertencente à Reserva de
Desenvolvimento Sustentável - RDS do Rio Negro; (iii) agravou o estado de
vulnerabilidade da população que residia naquela localidade; (iv) retirou a fonte
de sustento dos comunitários afetados pela ordem.

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4. DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS

4.1 DO INTERESSE DA DEFENSORIA PÚBLICA

Conforme bem estatui o art. 134 da Constituição Federal, incumbe à


Defensoria Pública a defesa, em todos os graus, dos necessitados. Desta forma,
como bem sói claro tanto da exposição fática, como do espeque documental, em
se tratando a causa de conflito com comunitários carentes, nos termos do art. 4º
da Lei Complementar Estadual nº 01/1990, tem-se como legítima a atuação da
Defensoria em seu favor.

Desta forma, a Instituição, que é essencial à função jurisdicional do


Estado, deve, a teor do que expõe o art. 4º, VII da Lei Complementar nº
80/1994, se utilizar de todos os instrumentos para propiciar a adequada tutela
dos interesses da comunidade atingida pelo iníquo ato de remoção, o que, ​in
casu​, exige o aparelhamento do presente Pedido de Suspensão de Liminar.

4.2 DO CABIMENTO DO PEDIDO PELA DEFENSORIA PÚBLICA

O pedido de suspensão de liminar encontra cabimento no art. 4º da Lei nº


8.437/1992, que franqueia sua propositura ao Ministério Público ou “​pessoa
jurídica de direito público interessada​”:

Art. 4° Compete ao presidente do tribunal, ao qual couber o


conhecimento do respectivo recurso, suspender, em despacho
fundamentado, a execução da liminar nas ações movidas contra o Poder
Público ou seus agentes, a requerimento do Ministério Público ​ou da
pessoa jurídica de direito público interessada​, em caso de
manifesto interesse público ou de flagrante ilegitimidade, e para evitar
grave lesão à ordem, à saúde, à segurança e à economia públicas.
(Grifo Nosso)

A despeito da ausência de menção expressa da Defensoria - o que se


explica tanto por sua inédita criação com a Carta de 88, como também pelo
nascimento de sua lei orgânica somente em 19944 - não se lhe exclui a
propositura do Pedido de Suspensão de Liminar, mormente após a edição da Lei
Complementar nº 132/2009, que conferiu nova redação à Lei Orgânica Nacional
da Defensoria Pública, sacramentando-lhe a tutela dos interesses coletivos ​lato
sensu:​

4
​Lei Complementar nº 80, de 12 de janeiro de 1994.

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Art. 4º São funções institucionais da Defensoria Pública, dentre


outras:

VII – promover ação civil pública e todas as espécies de ações
capazes de propiciar a adequada tutela dos direitos difusos, coletivos ou
individuais homogêneos quando o resultado da demanda puder
beneficiar grupo de pessoas hipossuficientes;

Desta forma, tanto por demandar defesa de interesses coletivos, como no


caso em tela, o que conecta a atuação da Defensoria Pública à do ​Parquet​; como
por ser, inexoravelmente, Pessoa Jurídica de Direito Público, haja vista, em visão
estritamente administrativa, ser órgão do Estado do Amazonas, representando o
que se vem alcunhando de Estado-Defensor, tem-se por cabível a atuação da
Defensoria quando de Públicos forem os interesses, coletivos ou não, que se
buscam resguardar. Outro não é o raciocínio da doutrina, com bem deixa assente
Elton Venturi:

“Nada obstante a inexistência de expressa previsão legal a respeito


da legitimidade ativa da Defensoria Pública para dedução dos pedidos de
suspensão, temos para nós que, enquanto Instituição ‘essencial à
função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a
defesa, em todos os graus, dos necessitados’ (art. 134 da CF), não pode
ser tolhida no seu direito de se servir da excepcional medida cautelar
para a salvaguarda dos interesses que deve resguardar.

De fato, não há razão de ordem técnica ou política suficiente para


evitar a dedução dos pedidos de suspensão pela Instituição que, aliás,
também foi recentemente inserida no rol dos legitimados ativos para a
promoção da ação civil pública em defesa dos interesses ou direitos
difusos, coletivos e individuais homogêneos (inc. II do art. 5.º da Lei
7.347/85, inserido pela Lei 11.448/2007).

A única restrição verdadeiramente pertinente em relação ao


requerimento de suspensão por parte da Defensoria diz respeito às suas
finalidades institucionais (defesa dos hipossuficientes), o que pode
gerar, empiricamente, algumas perplexidades derivadas da própria
indeterminação conceitual da expressão constitucionalmente utilizada
para definir as atividades da Instituição”.5

Então, a extensão de legitimidade compreendida pela doutrina, bem como


pelo atual conjunto lógico-sistemático da legislação, faz compreender que a
expressão “ações movidas contra o Poder Público ou seus agentes”, constante do

5
​VENTURI, Elton. ​Suspensão de liminares e sentenças contrárias ao Poder Público​. 2ª ed. São Paulo: Editora
Revista dos Tribunais, 2010, p. 86/87.

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art. 4º da Lei nº 8.437/1992, não seja tão apertada, passando a abranger todas
as acepções de Estado, não apenas o Estado-Executivo ou o Estado-Juiz, mas
também o Estado-Defensor6, mesmo porque se a leitura da legitimidade fosse de
ser tão obtusa, nem mesmo ao ​Parquet​ ter-se-ia de admitir intervenção.

Por fim, afirme-se que a legitimidade da Defensoria Pública para


apresentação dos Pedidos de Suspensão de liminares decorre de sua função de
Estado Defensor que é ​Poder Público atuante em prol do povo
necessitado​, detentor de todo poder soberano, nos termos do ​artigo 1º,
parágrafo único, c/c art. 5º, LXXIV c/c 134, todos da Constituição - que
segue ​prequestionado​ para eventuais recursos.

4.3 DA FLAGRANTE ILEGITIMIDADE DAS MEDIDAS LIMINARES

Sabe-se que a definição de processo perpassa por várias perspectivas,


como a criação de normas jurídicas, como ato jurídico complexo ou como relação
jurídica. Porém a que mais se aproxima da ideia de processo, adotada pelo
CPC/15, conforme defende Fredie Didier7, é como ato jurídico complexo, o qual é
definido como sendo o suporte fático formado por vários atos jurídicos que
buscam um ato final, qual seja, uma sentença de mérito, conforme prelude o art.
4º do CPC, bem como o princípio da primazia das decisões de mérito.

Sendo um conjunto de atos jurídicos encadeados em busca de um termo


final, nada mais lógico que esse conjunto siga uma ordem, em prol da
organização dos autos, e facilitação da visualização dos documentos pelas partes
que integram a tridimensional relação processual (art. 238, CPC).

Apesar disso, o Juízo ​a quo​, talvez na transição dos autos físicos para os
autos virtuais, deixou de juntar documentos importantes para entendimento da
demanda, aliás, documentos imprescindíveis à validade de todos os demais atos
jurídicos subsequentes, não sendo possível suprir por meio de decisão judicial.

Os documentos a que se refere nos presentes autos são, no mínimo, dois,


a saber: (i) Documento de fls. 9; e (ii) Decisão Interlocutória que deferiu o
pedido de liminar possessória à Requerente.

(i) Documento de fls. 9: É uma verdadeira incógnita, pois a sua ausência


ainda não fora notado pelas partes dos autos, porém sendo observada por esta

6
​ALMEIDA FILHO, Carlos Alberto Souza; MAIA, Maurilio Casas. O Estado-defensor e sua legitimidade para os
pedidos de suspensão de liminar, segurança e tutela antecipada. Revista de Processo, vol. 239, p. 247-261,
Jan., 2015.
7
DIDIER JÚNIOR, FREDIE. ​Curso de direito processual civil: Introdução ao direito processual civil, parte geral e
processo de conhecimento​. 19 Ed. Jus Podivm, Salvador, p. 37.

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Peticionante por ocasião da realização da defesa das Comunidades que serão


afetadas pela decisão nestes autos. Tal fato se comprova abaixo:

Assim, por inexistir o documento, impede verificar se o conteúdo deste é


relevante ou não ao deslinde dos autos, podendo comprovar fatos que seriam
importantes para impedir a realização de medidas possessórias na presente
causa.

(ii) Decisão Interlocutória que deferiu o pedido de liminar possessória à


Requerida.

Desde o início da tramitação dos autos, questiona-se acerca da


inexistência de decisão que deferira a liminar possessória. Vários magistrados
convocados passaram por este Juízo, porém, até o presente momento, não
houve solução à problemática, uma vez que, até mesmo o próprio oficial de
justiça não possui, nem certidão e quiçá a decisão, informação esta extraída das
fls. 120, em petição protocolada por si, destinando ao Juízo que questionara
acerca da sua existência:

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Apesar de o Oficial de Justiça afirmar que entregou o mandado,


juntamente com a decisão, deixou de comprovar, por meio de protocolo, a sua
entrega, aliás, a comprovação é característica da administração burocrática,
típica em Estados Democráticos de Direito que possuam como fonte primária a
lei, o direito positivo.

É por conta da Administração Burocrática, fruto da legalidade, do


positivismo jurídico, que o documento escrito encontra grande aceitabilidade
tanto pela sociedade, quanto no meio jurídico. Inclusive, o famoso jargão jurídico
“o que não consta nos autos, não consta no mundo”, encontra base a partir
dessa ideia posta.

Não obstante, tal jargão é indispensável ao deslinde de demandas, sob


pena de discricionariedade do julgador, já que adotará qualquer fato estranho ao
processo para fundamentar suas decisões, o que é vedado pela atual sistemática,
baseada no contraditório efetivo.

No caso dos autos, verificando a inexistência de decisão liminar de


reintegração de posse, não há fundamento para revigoramento de mandado de
reintegração de posse, haja vista que inexiste decisão de reintegração de posse
antecedente. Logo, como poderia haver derivação de um “nada jurídico”?

Portanto, a inexistência da decisão interlocutória mácula o tramitar da


demanda, impedindo a validade dos autos desde o momento do seu sumiço,
passível, inclusive, de correição parcial, em razão da gravidade desta situação
peculiar. Assim, demonstrada a gravidade da situação, bem como a possibilidade

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da repercussão processual da ausência dessa decisão, vem essa Defensoria


Pública buscar a regularidade dos autos, solicitando sejam os autos chamado à
ordem.

4.4 DO MANIFESTO INTERESSE PÚBLICO

A Jurisdição possui um papel de destaque na sociedade, em especial com


relação à pacificação de conflito e efetivação dos direitos e garantias
fundamentais.

Apesar do fim almejado pelo Poder Judiciário seja a pacificação da


sociedade, por meio do proferimento de decisões de mérito que ponham fim aos
conflitos, é imprescindível a observância das garantias fornecidas pelo Estado
Democrático de Direito, como o devido processo legal, o contraditório, a ampla
defesa, a duração razoável do processo, a publicização dos atos processuais e,
não menos importante, a incólume da marcha processual para demonstrar que
cumprira o passo a passo estabelecido pelo Poder Legislativo.

Impende salientar, que tais passos são indispensáveis para prestação de


contas com o titular do povo, a fim de demonstrar que vem cumprindo com as
diligências mínimas para efetivar ordens judiciais.

É com base nesse aspecto que se observa o interesse público. É de


interesse comum que o Poder Judiciário não negligencie para com os atos
processuais, os documentos carreados nos autos, as garantias processuais das
partes, já que aos olhos da sociedade, este Poder é o responsável pelo efetivo
contraditório;

No caso dos autos, infelizmente, o brilhantismo do todo não fora


observado pelo Juízo ​a quo,​ uma vez que há indícios sérios e graves nos autos
que demonstram a inobservância do cumprimento dos atos mínimos e
obrigatórios pelos órgãos de execução, tais como, manter incólume os atos
processuais e documentação carreado nos autos.

Ao compulsar os autos é facilmente perceptível que documentos estão


faltando, dois, no mínimo,o primeiro, a decisão interlocutória que deferira a
liminar possessória ao Requerido; o segundo, de fls. 9, a Requerente não sabe
informar qual o documento, mas que é de suma importância para o exercício do
contraditório pela outra parte.

O Contraditório só é efetivo se a parte contrária tiver acesso a todos os


documentos colacionados pela parte contrária, sob pena de inviabilização e

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oferecimento de um contraditório deficiente, o que não é compatível com a


Magna Carta.

Assim, verificado o manifesto interesse público na demanda, pugna-se


pelo cumprimento dos deveres mínimos nos autos, determinando a instauração
de incidente de restauração de autos para que se oportunize às populações
afetadas pelos autos sejam efetivamente defendidas, com o devido e substancial
contraditório.

4.5 DA GRAVE LESÃO À ORDEM PÚBLICA

Como já demonstrado no PSL n.º ​4004882-56.2017.8.04.0000​, o


cumprimento da ordem de reintegração de posse afetaria ordem pública, posto
que as comunidades lá viventes se encontravam há mais de década residindo e
produzindo na área, não tendo agora para onde ir.

Agora, como ainda sobeja hígida a liminar vergastada, os efeitos nocivos à


população e ao Estado não mais precisam ser estimados, pois estão patentes em
todos os noticiários locais8, como é público e notório:

A polícia cumpriu reintegração de posse, na manhã desta terça-feira (9),


em uma a área localizada na estrada de AM 352 Manacapuru/Novo
Airão, em um trecho com extensão do km 7. Mais de 50 casas,
plantações e outras benfeitorias estão na área marcada para ser
desapropriada. Ao todo, 180 famílias que possuem lotes de terras na
área de propriedade particular.
(...)
As 180 famílias estão alojadas na área que atinge parte da comunidade
do Acajatuba na estrada Manuel Urbano e entre os km 07 e 19, lado
direito sentido Manacapuru Novo Airão.9

Reintegração de posse em favor da Agropecuária Exata deixa


dezenas de famílias no relento em Manacapuru

Um contingente policial da Polícia Militar do Amazonas, cumpriu nesta


quinta-feira, 12, na AM 352 – rodovia que liga o município de
Manacapuru a Novo Airão -, na altura do km 7, o segundo dia de
despejo de dezenas de famílias que assistiram paralisadas, com
irremediável tristeza, a demolição de suas humildes casas construídas
para viver com a família.

A decisão foi do desembargador Ari Jorge Moutinho da Costa em favor


da empresa Agropecuária Exata Ltda. de Otavio Raman Neves, dono do

8
E em relatório da SPF feito na área.
9
​In.:
<​https://g1.globo.com/am/amazonas/noticia/policia-cumpre-reintegracao-de-posse-e-retira-famili
as-de-terreno-no-interior-do-am.ghtml​>

Rua 24 de maio, nº 321, Centro – CEP: 69010-080 - Manaus/AM Tel: 3236-3474 - E-mail:
dpeac@defensoria.am.gov.br

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1ª DEFENSORIA PÚBLICA ESPECIALIZADA EM ATENDIMENTO DE INTERESSES COLETIVOS

Grupo Raman Neves de Comunicação (Jornal Amazonas em Tempo e TV


em Tempo).

Mais de 80 casas, plantações e outras benfeitorias foram destruídas por


determinação da Justiça.10
(grifo nosso)

As inúmeras famílias simplesmente não têm para onde ir, pois o anunciado
do cumprimento de uma liminar ​inaudita altera pars é patente: o prejuízo social
é evidente.

Agora, que o drama das famílias já chamou atenção, inclusive, da


Ouvidoria Agrária Nacional11, o Governo o Estado do Amazonas resolveu tomar
pé diretamente da situação, acabando por identificar aquilo que a Comissão
Pastoral da Terra já denunciava, que as terras reintegradas não são da
Agropecuária Exata, mas sim do Estado do Amazonas, como se atesta do Mapa
em Anexo12, expedido pela Secretaria de Política Fundiária do Estado do
Amazonas.

Portanto, dada tal demonstração de ilegitimidade da medida, deve ser


suspensa a liminar concedida.

10
In.:
<​http://www.reporter-am.com.br/reintegracao-de-posse-em-favor-da-agropecuaria-exata-deixa-d
ezenas-de-familias-no-relento-em-manacapuru/​>
11
In.:
<​http://www.tjam.jus.br/index.php?option=com_content&view=article&id=10200:presidente-do-tj
am-recebe-representantes-de-entidades-ligadas-a-questao-fundiaria-e-lideres-comunitarios-de-ma
nacapuru-am&catid=33:ct-destaque-noticias&Itemid=1331​>
12
Link para acesso do mapa integral:
<​https://drive.google.com/open?id=192UugP3TqUOOyIJCtUwOxevGGPLjqcBz​>

Rua 24 de maio, nº 321, Centro – CEP: 69010-080 - Manaus/AM Tel: 3236-3474 - E-mail:
dpeac@defensoria.am.gov.br

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