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A INFLUÊNCIA SENSORIAL DAS CORES: ANÁLISE CROMÁTICA DA OBRA


CINEMATOGRÁFICA DE WES ANDERSON

Natália Manica Santos


Diego Piovesan Medeiros***

Resumo: A presente pesquisa sugere analisar a cor predominante de três


momentos dos filmes Viagem a Darjeeling (The Darjeeling Limited, 2007), Moonrise
Kingdom (2012) e O Grande Hotel Budapeste (The Grand Budapest Hotel, 2014), do
diretor Wes Anderson. A escolha se deu em decorrência da predominância de cores
constantemente atribuídas ao aspecto geral de sua obra, partindo da forma como
influenciam sensorialmente o espectador – que neste caso, é a autora –, sob a
recepção da mensagem transmitida entre as cenas de um filme. Com isso, este
artigo faz uma apresentação dos vínculos com o design e com o cinema,
observando sua relação como linguagem e como significado. Esta análise se deu
por meio de uma observação visual sobre três sequências de cada obra escolhida,
que equivale a uma pesquisa aplicada qualitativa exploratória. Assim, foi possível
observar a relação da psicologia das cores com a direção de arte do diretor em
questão.

Palavras-chave: Design. Cor. Cinema. Wes Anderson.

Introdução

A produção artística cinematográfica, a partir da técnica de reprodução de


imagens, exerce seu domínio de comunicação global como um artefato cultural ao
modo em que o cineasta deve, de acordo com Edgar-Hunt et. al (2013),
compreender como funciona essa linguagem, de que forma a tela se comunica com
as pessoas, como gradativamente se constrói o significado de pequenos elementos,
além de assumir o domínio sobre os pensamentos e sentimentos do público,
realizando, assim, uma troca de dados relevantes ao desenvolvimento social e
tecnológico contemporâneo.


Artigo apresentado ao Curso de Graduação em Design Gráfico da Faculdade Satc, como requisito
parcial à obtenção do título de Bacharel em Design Gráfico.

Graduanda do Curso de Graduação em Design Gráfico pela Faculdade Satc. E-mail:
nataliamanicas@gmail.com.
***
Prof. Dr. do Curso de Graduação em Design Gráfico da Faculdade Satc. E-mail:
diego.piovesan@gmail.com.
2

Compreende-se que o fenômeno cinematográfico se expande para além


da sala de cinema, onipresente na mídia como veículo publicitário, excedendo-se até
o campo educacional1. Ao considerar essa potencialidade de expressão, é possível
atribuir destaque a cineastas que se diferem pelo estilo atribuído às suas obras,
consagrando-se em inovação na abordagem visual de um roteiro original ou
adaptado.
Dentro da indústria cinematográfica, as linguagens visuais se equiparam
em técnica e fundamentos que o design gráfico também utiliza em seus projetos,
como o estudo da cor, bem como suas composições e interações, que formam uma
base desse entendimento. Para Ambrose e Harris (2009), no design, a cor carrega
um conjunto de significados e emoções como nenhum outro elemento consegue,
podendo chamar a atenção tanto no papel quanto na tela, e até mesmo em
prateleiras de supermercado, sendo a forma mais instantânea de comunicação não-
verbal.
Em diversos aspectos, a linguagem visual é um dos elementos de maior
percepção em um filme, sendo importante estabelecer o tom sob o qual as cenas
que compõem este conjunto serão absorvidas. Com essa abordagem, surge a
problemática de pesquisa: Como a cor, dentro da linguagem visual no cinema, pode
influenciar sensorialmente a recepção da mensagem transmitida entre cenas de três
filmes do cineasta Wes Anderson?
Visto isso, o estudo em questão refere-se a esse diretor estadunidense,
aclamado pela visão particular e de realidades inventadas2, com uma filmografia que
envolve a mistura certa de ingredientes para uma estética apurada em cada detalhe.
Anderson é reconhecido por sua maneira singular de enxergar o mundo.
A abordagem pessoal do cineasta representa a fórmula ideal para a criação de
universos fantásticos imaginados a partir do zero com o intuito de se tornarem
espaços inteiros. Cada cena proporciona o equilíbrio refletido na perfeita sincronia
de elementos que entram e saem dos quadros em alinhamento (MORISAWA, 2017).

1
MARÇAL, Carla. Cinema e educação: socialização, visões de mundo e subjetividades das
Juventudes. Rio de Janeiro: Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro, 2013. Disponível em:
<http://www.ufrgs.br/alcar/encontros-nacionais-1/9o-encontro-2013/artigos/gt-historia-da-midia-
audiovisual-e-visual/cinema-e-educacao-socializacao-visoes-de-mundo-e-subjetividades-das-
juventudes>. Acesso em: 11 dez. 2017.
2
MORISAWA, Mariane. O universo particular do cineasta Wes Anderson. VEJA.com. Disponível
em: <http://veja.abril.com.br/entretenimento/o-universo-particular-do-cineasta-wes-anderson/>.
Acesso em: 25 abr. 2017.
3

A expressão visual pode ser alterada de acordo com gênero e contexto


narrativo, além da identidade do próprio diretor. Do mesmo modo como o arranjo de
telas representa um padrão para cada autor e a informação que pretende comunicar,
as cores imergem em cada atmosfera inserida na realidade criada, respondendo em
tom emocional às mudanças ocorridas ao longo da história3.
Dessa forma, o estudo realizado apresenta a cor predominante em
momentos de três filmes pertencentes ao catálogo da obra de Wes Anderson, com o
objetivo geral de analisar a influência sensorial das cores a partir da recepção da
mensagem transmitida entre as cenas sob o ponto de vista do espectador, sendo
este a autora do artigo.
Para que o objetivo geral seja alcançado, foram traçados três objetivos
específicos: (i) apresentar a cor como linguagem visual no design e no cinema; (ii)
identificar a relação das cores com seus significados; (iii) apresentar o contexto
visual das obras de Wes Anderson.
A fim de que este estudo ganhe forma, a primeira parte deste artigo
aborda fundamentos da cor como linguagem, seu contexto com o design e com o
cinema. Para isso, foram utilizados autores como Farina et. al (2006), Fraser e
Banks (2007) e Ambrose e Harris (2009).
Após fundamentar conceitos, foi desenvolvida a metodologia de pesquisa
que se apresenta enquanto sua natureza como aplicada qualitativa exploratória, a
qual demonstra dados considerados em aspectos não métricos com uma análise de
modelos estimulantes à compreensão do problema. Por fim, foram apresentados
dados que concluem a abordagem de análise e validam os objetivos propostos.

1 A COR COMO LINGUAGEM

A cor é um dos principais elementos registrados inicialmente ao observar


algo pela primeira vez. Segundo afirmação de Ambrose e Harris (2009), o homem já
evolui com determinada compreensão ao redor da cor, visto que os seus ancestrais
dependiam delas para saber o que consumir e evitar, e, assim, sobreviver.
A mais remota reflexão de que se tem ciência acerca das cores é de
autoria do filósofo grego Aristóteles. De acordo com Moraes (2007), ele foi o

3
CASTRO, Luiza de. O processo criativo da cor no cinema. Papo de Homem. Disponível em:
<https://papodehomem.com.br/o-processo-criativo-da-cor-no-cinema/>. Acesso em: 11 dez. 2017.
4

responsável pela inauguração do estudo propriamente estético sobre a arte. Para


tanto, segundo o autor, “Todos os homens desejam, por natureza, saber. Sinal disso
é o prazer das sensações; pois fora até do que há nelas de proveitoso, desejamo-las
por si mesmas, e mais do que todas as outras as sensações visuais” (Aristóteles
apud MORAES, 2007, p.19).
Conforme Fraser e Banks (2007), é possível que um esquema de cores
seja capaz de representar tanto um objeto específico, quanto abranger uma área
mais generalizada. Além disso, quando bem utilizadas, podem também disseminar
uma mensagem de forma tão direta quanto as próprias palavras em um anúncio, por
exemplo.

Figura 1 – Anúncio de campanha publicitária da marca Havaianas

4
Fonte: Adeevee, 2010 .

Como é possível observar na Fig. 1, as cores formam a peça desta


campanha publicitária desenvolvida pela agência AlmapBBDO 5 para a marca
brasileira de sandálias Havaianas, na qual o produto assume o papel de um rolo de
tintas, demonstrando representar a variada cartela de cores oferecida por ela.

1.1 A cor no design

Segundo Ambrose e Harris (2009), utiliza-se a cor de maneiras diversas a


fim de comunicar significados distintos capazes de produzir um forte impacto, ainda
que empregada sob abordagens mais simples. A partir do ato perceptivo, Pedrosa

4
Disponível em: <http://www.adeevee.com/2010/04/sao-paulo-alpargatas-havaianas-banana-taxi-
shoe-crank-perfume-spray-print/>. Acesso em: 3 set. 2017.
5
São Paulo Alpargatas Havaianas: banana, taxi, shoe, crank, perfume spray. Adeevee. Disponível
em: <http://www.adeevee.com/2010/04/sao-paulo-alpargatas-havaianas-banana-taxi-shoe-crank-
perfume-spray-print/>. Acesso em: 5 set. 2017.
5

(2012) aponta três características capazes de corresponder aos princípios básicos


da cor. São estas: matiz, luminosidade e croma.
Matiz determina a “Variedade do comprimento de onda de luz direta ou
refletida, percebida como vermelho, amarelo, azul e demais resultantes das misturas
dessas cores” (PEDROSA, 2012, p. 34). Já a luminosidade também pode ser
atribuída aos termos de valor ou brilho, os quais igualmente designam o índice
desse elemento em relação à cor.
A croma, por sua vez, indica o grau de saturação de uma cor, a
intensidade percebida sobre a mesma. De acordo com o autor (2012), é o estágio
que representa a sua pureza, visto que cada mudança realizada à cor pura reduz
instantaneamente a sua saturação.
Com o intuito de criar esquemas cromáticos agradáveis, predizer
interações entre as cores, bem como selecioná-las e combiná-las, necessita-se de
uma referência visual. De acordo com Fraser e Banks (2007), diversos sistemas de
cor foram idealizados a fim de que fosse possível obter esta guia, sendo estes com o
uso de formas básicas ou diagramas mais complexos.
Segundo Silva (2008), há dois tipos de processos que promovem a
sensação de cor: um chamado de aditivo, e o outro, de subtrativo. Isso significa que,
a partir do primeiro, a cor é gerada por meio da luz e criada com a mistura dos
comprimentos de ondas, enquanto no segundo, as cores são originárias da própria
natureza, baseando-se na reflexão e absorção de fótons, ou seja, quando o objeto
recebe luz, ela é em parte absorvida por ele e refletida em outra parte, surgindo,
então, a cor.

Figura 2 – Sistemas de cores RGB e CMYK

6
Fonte: Designers Brasileiros .

6
Disponível em: <https://designersbrasileiros.com.br/diferenca-entre-rgb-e-cmyk/>. Acesso em: 11
set. 2017.
6

Para a autora (2008), é fundamental compreender esses dois processos


para entender os sistemas de cores RGB e CMYK (Fig. 2), que são essenciais na
escolha e utilização correta de seus tons. É chamada de RGB a abreviação do
sistema formado por vermelho (red), verde (green) e azul (blue), sendo esse um
padrão de cores utilizado para projeções de luz, como monitores e telas de cinema,
por exemplo.
Já por meio do processo subtrativo, criou-se o sistema CMYK, utilizado
para impressão de materiais físicos. Este, por sua vez, é um padrão de três cores
(ciano, magenta e amarelo) e o preto, que, quando combinados, formam uma
variedade de cores (SILVA, 2008).
Nesse sentido, a cor pode tanto prover informações por si própria ou
auxiliar na transmissão de mensagens como artifício de codificação. Conforme
Ambrose e Harris (2009), ao organizar diferentes informações de modo que seja
possível tornar variados tipos de conteúdo reconhecíveis, a codificação das cores
assiste no rápido processamento do material a ser lido, sendo amplamente adotada
em artefatos como etiquetas de vestuário ou sinais de trânsito, por exemplo.
Para tanto, quando essa codificação é aplicada em indicação de função,
deve-se considerar a relevância na seleção de cores para cada item. Com isso, é
possível afirmar que uma etiqueta verde sobre um frasco de veneno é capaz de
provocar dissonância cognitiva pelo fato de que a percepção da cor (saudável e
natural) entra em conflito com o que é natural do veneno (perigoso e nocivo)
(AMBROSE; HARRIS, 2009).
O desenvolvimento de embalagens, por exemplo, é um dos ramos
pertencentes ao design gráfico, o qual, segundo Fraser e Banks (2007), refere-se,
neste caso, a gerar um sentimento em um meio de envolver um produto. Visto isso,
na maioria dos casos, o rótulo representa efetivamente o que está presente em seu
interior, atribuindo-lhe qualidades e valores únicos, mesmo que o conteúdo em si
encontre-se próximo à concorrência em relação ao mercado.
7

Figura 3 – Embalagens de suco da marca Do Bem

7
Fonte: Pedro Oliveira, 2015 .

Com a Fig. 3, nota-se que a marca Do Bem apresenta uma embalagem


diferenciada, fazendo uso de padrões, ilustrações e personagens no rótulo de seus
sucos de caixa, ao contrário de imagens ilustrativas da fruta que faz referência ao
sabor, como ocorre em embalagens concorrentes. Dessa forma, há distinção na
gôndola junto aos concorrentes, caracterizando a marca igualmente pelo conceito e
propósito atribuídos a ela8. Para os autores (2007), ao utilizar a cor cautelosamente,
é possível auxiliar na garantia de que ela não somente chame a atenção do cliente,
mas comunique a mensagem correta.
9
Dentro de um ambiente onde predomina o self-service – como
supermercados ou lojas de departamento – é possível observar, conforme Fraser e
Banks (2007), um país reduzido que contém as próprias estradas, mapas e
sinalizações, onde estes elementos trazem uma linguagem própria na qual a cor faz
parte da gramática.
A dificuldade de condução dentro de grandes edifícios, ainda, é
solucionada a partir do design como ponte para sinalizações, onde o uso da cor
também se mostra responsável pela orientação a visitantes assíduos ou àqueles que
adentram no prédio pela primeira vez.

7
Disponível em: <https://pdrooliveira.wordpress.com/2015/02/05/sucos-do-bem/>. Acesso em: 3 set.
2017.
8
Sucos Do Bem. Pedro Oliveira. Disponível em:
<https://pdrooliveira.wordpress.com/2015/02/05/sucos-do-bem/>. Acesso em: 5 set. 2017.
9
Serviço no qual o cliente atende a si mesmo conforme suas necessidades. AMORIM, Maria Marta
Amancio. Adequação nutricional do almoço self-service de uma empresa de Santa Luzia, MG.
Maria Marta Amancio Amorim; Roberto Gonçalves Junqueira; Lieselotte Jokl. Campinas: Revista
de Nutrição, 2005.
8

Figura 4 – Projeto de sinalização para o Centro de Design da Nissan

10
Fonte: Sinalizar , 2011.

A partir da Fig. 4, observa-se o conceito da sinalização presente no


Centro de Design da fabricante de automóveis japonesa Nissan. Desenvolvida pelo
Hiromura Design Office11, é baseada em uma linha singular que se estende ao longo
dos corredores e salas do complexo. As cores e pictogramas também são
responsáveis por identificar os diferentes ambientes desse centro ao demarcá-los.
Já em termos de advertência, por exemplo, nota-se o emprego do
vermelho em placas de aviso nas quais perigos potenciais são alertados. Isto se dá
à maneira que essa é uma cor intensa, estimulante e de alta visibilidade, permitindo
a prevenção do perigo por intermédio do leitor. Enquanto isso, o azul se contrapõe
ao vermelho, demonstrando menos ferocidade como uma cor relaxante, indicando a
ausência de perigo (FRASER; BANKS, 2007).
Percebe-se que a cor se constrói dentro de um processo de linguagem e
significado, o que também está presente em outras áreas, como o cinema.

1.2 A cor no cinema

Antes mesmo do som, o cinema ganhou cor. Até meados de 1930, a


técnica de pintura à mão, quadro por quadro, era amplamente utilizada pelos
diretores daquela época. Isso indica o quão influente demonstrou-se este item ao
público desde o princípio de sua aplicação, visto que se considerava pintar até meia
dúzia de cores em centenas de milhares de quadros ao observar a origem de filtros
de cor às telas (FRASER; BANKS, 2007).
10
Disponível em: <https://sinalizarblog.com/2011/05/09/nissan-signage/>. Acesso em: 3 set. 2017.
11
D’AGOSTINI, Douglas. Nissan signage. Sinalizar. Disponível em:
<https://sinalizarblog.com/2011/05/09/nissan-signage/>. Acesso em: 5 set. 2017.
9

Segundo os autores (2007), por volta de 1920, estúdios descobriram com


a Technicolor12 que o uso da cor permitia aumentar seu público, levando os diretores
a prontamente examinar novas possibilidades aos usos artístico e simbólico deste
componente sobre suas obras.
Ao final daquela década, este processo seria melhorado para que, em
1932, o espectro completo pudesse ser projetado com a câmara de três tiras –
evoluindo de um limitado processo de duas cores –, capaz de capturar uma cor
natural no filme. Com uma combinação apurada entre ciano, magenta e amarelo, a
empresa revelou o processo em Flores e Árvores (Flowers and Trees, 1932), um
curta-metragem da Disney13.
A partir do momento em que o cinema deixou de ser mera atração para
tornar-se uma arte, a maneira como cada história é contada tem obtido maior
atenção.

Figura 5 – Cena do filme O Mágico de Oz (The Wizard of Oz, 1939)

14
Fonte: The Telegraph, 2015 .

Conforme ilustrado na Fig. 5, o filme O Mágico de Oz (The Wizard of Oz,


1939) tem como um dos fatores principais de seu sucesso a inovação no uso da cor,
com base no reconhecimento de ser considerado o primeiro a melhor representar
este elemento na tela, ainda que não seja o primeiro filme colorido da história do
cinema (FERREIRA, 2015).

12
Empresa pioneira na reprodução cromática “natural” em filmes. BOEHS, Gustavo Eggert. A
estereoscopia na linguagem cinematográfica: uma análise histórica de diferentes elementos da
linguagem fílmica. Gustavo Eggert Boehs; Milton Luiz Horn Vieira. São Carlos: RUA – Revista
Universitária do Audiovisual, 2013.
13
Os 100 anos do Technicolor: saturação e sutileza nas telas de cinema. O Globo. Disponível em:
<https://oglobo.globo.com/cultura/filmes/os-100-anos-do-technicolor-saturacao-sutileza-nas-telas-de-
cinema-16650173>. Acesso em: 22 ago. 2017.
14
Disponível em: <http://www.telegraph.co.uk/film/the-wizard-of-oz/making-of-facts-trivia/>. Acesso
em: 21 ago. 2017.
10

Para Coutinho (2005), toda arte é, sobretudo, uma forma de percepção.


Nesse sentido, a linguagem cinematográfica permite a exposição de detalhes como
nenhuma outra é capaz, contribuindo de maneira construtiva à noção perceptiva do
homem a partir da observação necessária para compreendê-la.
Essa representação de imagens possui uma capacidade de significação,
cujas cenas consagram-se em receber dados originários da imaginação, revelar
marcas de experiências anteriores, produzir pensamentos e ideias, bem como
provocar a movimentação de sentimentos (MUNSTERBERG, 1983).
O autor (1983) enfatiza, ainda, que o objetivo principal do cinema obriga-
se em refletir emoções, sendo os personagens, acima de tudo, sujeitos de ensaios
emocionais como alegria, dor, amor, ódio, entre outros. Visto isso, encarregam-se de
conferir ao filme o seu próprio valor e significado, traduzindo o ato de assisti-lo em
uma prova de profunda humanidade.

Figura 6 – Cartaz do filme O Fabuloso Destino de Amélie Poulain (Le Fabuleux


Destin d'Amélie Poulain, 2001)

15
Fonte: CineMaterial .

A Fig. 6 ilustra esta reflexão de emoções a partir do cartaz de O Fabuloso


Destino de Amélie Poulain (Le Fabuleux Destin d'Amélie Poulain, 2001), o qual
representa, segundo Stamato et. al (2013), a dominância dos tons de vermelho na
exposição da história dos personagens femininos dentro do enredo, enquanto o
verde determina os momentos de impessoalidade no filme.

15
Disponível em: <https://www.cinematerial.com/movies/le-fabuleux-destin-damelie-poulain-i211915>.
Acesso em: 11 dez. 2017.
11

Ao estabelecer tal relação para além da obra em si, unindo-se aos demais
meios de divulgação utilizados para promover um filme, é possível notar a presença
da cor não somente como artifício visual, servindo também de mecanismo para a
formação de novas sensações diante de seu espectador.

2 A COR COMO SIGNIFICADO

A cor estabelece significados originados a partir de associações culturais


e sociais, possibilitando interpretações distintas àqueles que vivem em diferentes
países e carregam valores culturais capazes de produzir variadas conotações a
partir da mesma cor.
Segundo Ambrose e Harris (2009), em países ocidentais, por exemplo, é
comum relacionar o vermelho ao sinal de perigo, assim como o mesmo é capaz de
sugerir festividade quando combinado ao ouro, pois estas cores costumam estar
unidas em cartões e decorações de Natal. Por outro lado, nos países orientais, a
mesma cor sugere boa sorte, riqueza e pureza, assim como no Ocidente associa-se
a morte ao preto, enquanto no Oriente, a cor que denota luto é o branco.
Este é um elemento fundamental ao design devido à sua capacidade de
provocar reações emocionais no leitor. Para os autores (2009), consequentemente,
as cores tendem a ser representadas com o uso de palavras emotivas, sendo a
maioria delas associadas a adjetivos específicos.

Figura 7 – Anúncio de campanha publicitária do banco Itaú

16
Fonte: Prêmio Renato Castelo Branco - ESPM, 2013 .

Ao longo de sua história, o banco Itaú realizou alterações em sua marca e


serviços com o intuito de construir uma imagem confiável ao público. Para tanto, de

16
Disponível em: <http://prcb.espm.br/2013/leia-para-uma-crianca>. Acesso em: 11 set. 2017.
12

acordo com Blasque e Pinho (2013), a cor como informação obteve um papel
essencial para o registro de conceitos em associação à marca, pois, devido ao uso
desse recurso, a empresa alcançou uma imagem lembrada da união de suas
qualidades na difusão de campanhas publicitárias (Fig. 7) ao cotidiano da
população.
O uso do laranja, que faz parte da identidade visual do banco, imprime,
conforme os autores (2013), as sensações de força, luminosidade, alegria e energia,
integrando a cor às características da marca. Contribuindo com esta opinião, Strunck
(2003) afirma que as cores são determinantes para a identificação de uma marca,
sendo que, geralmente, o símbolo ou o logotipo são esquecidos, ao contrário das
cores aplicadas.
O processo argumentativo da cor como informação começa a partir desse
ponto, enquanto as campanhas publicitárias sugerem atributos relacionados ao
banco que, aos poucos, se ligam às cores utilizadas pela empresa (BLASQUE;
PINHO, 2013).
Para Farina et. al (2006), a cor é uma linguagem própria do indivíduo sob
a qual ele reage de acordo com as suas condições físicas e influências culturais. De
modo geral, recorda-se de cores mais impressivas no subconsciente, as quais, como
sensação, remetem a um alerta que fora recebido em determinada circunstância.
Dessa forma, são fixadas mais facilmente, porém, não existe uma cor que esteja
propriamente acompanhada de tal característica.

Figura 8 – Cena do filme A Lista de Schindler (Schindler’s List, 1993)

17
Fonte: Mundo de Cinema, 2015 .

Em A Lista de Schindler (Schindler’s List, 1993), de Steven Spielberg, a


história sobre o Holocausto é retratada primariamente em preto e branco. Porém, um
de seus episódios mais simbólicos se faz na menina de casaco vermelho que

17
Disponível em: <http://mundodecinema.com/vermelho/>. Acesso em: 11 set. 2017.
13

caminha em meio ao caos de uma invasão nazista (Fig. 8), a qual marca um ponto
de virada no enredo, e que, de acordo com o diretor18, representa o derramamento
de sangue ocorrido durante a Segunda Guerra Mundial a partir do constraste
causado pelo uso da cor vermelha.
Atualmente, compreende-se que os processos intelectuais do homem não
afastam completamente as sensações visuais de seu raciocínio. Do mesmo modo
como as cores percebidas pela visão são consequência da sensibilização dos olhos
para determinados comprimentos de onda, a sensação visual chega até a percepção
repleta de associações psicológicas (BARROS, 2011).
Estas, por sua vez, são identificadas por Heller (2013) a partir da
psicologia das cores, em estudos nos quais as cores e sentimentos demonstram
combinar-se por questão de vivências manifestadas pelo ser humano, sob as quais
são ocasionalmente relacionadas e se mantêm presentes na linguagem e
pensamento dos indivíduos.
Santaella e Nöth (2005) afirmam que não existem imagens como
representações visuais que não tenham sua origem a partir de figuras presentes na
mente de quem as produziu, havendo dois domínios para os quais são divididas; o
primeiro é o de representações visuais nas quais as imagens cinematográficas estão
inseridas – como desenhos, pinturas e fotografias –, enquanto o segundo encontra-
se no domínio imaterial das imagens presentes no imaginário19.
Em busca de retomar os conceitos apresentados até o momento, os
capítulos a seguir abordam uma análise de três obras cinematográficas de Wes
Anderson, nos quais serão estudadas as composições de cores apresentadas pelo
cineasta junto à reflexão de seus significados para cada conjunto de cenas exibido.

3 METODOLOGIA DE PESQUISA

A fim de elucidar os métodos necessários para a validação da pesquisa,


esta se enquadra em propriedade de pesquisa aplicada qualitativa exploratória, de
modo que permite, conforme Deslauriers (1991), produzir informações aprofundadas
18
OLIVEIRA, Daniel. Cenas inesquecíveis: A Lista de Schindler. Cinéfilo em Série. Disponível em:
<http://www.cinefiloemserie.com.br/2014/03/cenas-inesqueciveis-lista-de-schindler.html>. Acesso em:
11 set. 2017.
19
Termo geralmente não definido de forma inflexível, que acaba incluindo diversas noções e
conceitos usuais, tais como: a fantasia, o fictício, o irreal, etc. COELHO, Teixeira. Dicionário crítico
de política cultural: cultura e imaginário. São Paulo: Iluminuras, 1997.
14

e ilustrativas capazes de lançar novas organizações de dados, enquanto se


preocupa em proporcionar familiaridade com o objeto de estudo, visando conceber a
análise subsequente com maior exatidão (GIL, 2007).
Com isso, para Goldenberg (1997), a pesquisa qualitativa aborda
aspectos reais sem a possibilidade de representatividade numérica, situando-se na
compreensão e explicação atribuídas à dinâmica das relações sociais. Para tanto,
segundo Gil (2007), a pesquisa exploratória analisa exemplos capazes de estimular
essa compreensão.
Esta pesquisa se caracteriza como analítica em seus procedimentos,
trazendo os conceitos abordados na fundamentação, para análise das obras de Wes
Anderson. Para tal fim, serão analisados três momentos de cor20 dos filmes Viagem
a Darjeeling (The Darjeeling Limited, 2007), Moonrise Kingdom (2012) e O Grande
Hotel Budapeste (The Grand Budapest Hotel, 2014), relacionando os conceitos de
linguagem e significado tratados pelos autores Santaella e Nöth (2005), Fraser e
Banks (2007) e Ambrose e Harris (2009).
Reforça-se que o objetivo deste artigo é analisar a influência sensorial das
cores a partir da recepção da mensagem transmitida entre as cenas de um filme sob
o ponto de vista do espectador, que este em questão, é a autora do artigo. Na
primeira parte será apresentado um breve resumo da cinematografia de Wes
Anderson, tendo sua segunda parte, características da imagem fílmica do cineasta
e, em seguida, uma leitura dos filmes selecionados sob a ótica fundamentada neste
artigo.

4 WES ANDERSON: UM PERCURSO DE ANÁLISE

Wesley Wales Anderson é um cineasta norte-americano nascido na


cidade de Houston, Texas. Durante a infância, começou a organizar e escrever
peças de teatro elaboradas e fazer filmes Super-8, demonstrando o seu interesse
por performance e cinema desde cedo21.
O primeiro trabalho como diretor, Bottle Rocket (1994), foi exibido no
Sundance Film Festival, onde foi recebido com sucesso e seguido de sua versão

20
Sequência de cenas com a predominância de uma cor específica.
21
O fantástico mundo do Wes Anderson. Mistura Urbana. Disponível em:
<http://misturaurbana.com/2014/03/o-fantastico-mundo-do-wes-anderson/>. Acesso em: 3 out. 2017.
15

longa-metragem (Pura Adrenalina, 1996), que alcançou o público cult com fãs de
alto-perfil – incluindo o aclamado diretor Martin Scorsese –, sendo Anderson o
vencedor da categoria Best New Filmmaker no prêmio MTV Movie Awards mais
tarde naquele ano.
Assim, Wes Anderson provou que poderia trabalhar dentro do sistema de
estúdio de Hollywood e ainda ser capaz de criar filmes distintos e intencionalmente
peculiares22. Atualmente, conta com nove filmes entre curtas e longas-metragens em
sua carreira, aos quais, além de diretor, executou os encargos de produtor, roteirista
e até mesmo ator em alguns deles, que tiveram lançamento entre 1996 e 2014: Pura
Adrenalina (Bottle Rocket, 1996), Três É Demais (Rushmore, 1998), Os Excêntricos
Tenenbaums (The Royal Tenenbaums, 2001), A Vida Marinha Com Steve Zissou
(The Life Aquatic With Steve Zissou, 2004), Viagem a Darjeeling (The Darjeeling
Limited, 2007), Hotel Chevalier (2007), O Fantástico Sr. Raposo (Fantastic Mr. Fox,
2009), Moonrise Kingdom (2012) e O Grande Hotel Budapeste (The Grand Budapest
Hotel, 2014). O cineasta também é responsável pela direção de comerciais
atribuídos a marcas de renome internacional, tais como: American Express, AT&T,
IKEA, H&M, Hyundai, SoftBank, Sony, Stella Artois e Prada.
Com o intuito de obter um melhor entendimento acerca do estilo abordado
na obra cinematográfica do diretor, a subseção seguinte destaca elementos
característicos de suas criações.

4.1 Características da imagem fílmica

O público do cineasta não é formado a partir de grandes bilheterias ou


renomadas premiações, o que mantém sua base fiel de admiradores é a visão de
um mundo fantástico projetado segundo a sua própria criatividade. Para Lopes
(2014), grande parte do que torna um filme de Anderson tão memorável são os
detalhes do projeto de produção, ou aparência geral da obra. Aqui, é possível incluir
adereços, cenários, design, vestuário, entre outros.
A simetria (Fig. 9) é um dos mais reconhecidos atributos da estética de
sua obra, na qual o meticuloso posicionamento de personagens, cenários e demais
elementos visíveis ao espectador é bastante específico do deadpan, uma forma de

22
Wes Anderson. Rotten Tomatoes. Disponível em:
<https://www.rottentomatoes.com/celebrity/wes_anderson/>. Acesso em: 25 abr. 2017.
16

humor inexpressivo característico do diretor, haja vista que o mesmo afirmara ter
optado pela carreira na arquitetura caso não obtivesse sucesso no cinema.

Figura 9 – Cena do filme Viagem a Darjeeling

23
Fonte: Pravia Magazine, 2016 .

Outro dos mais visíveis e distintivos traços da estética de seu trabalho são
os esquemas de cores que, conforme Oliveira (2016), remetem a uma forte
reverência por tons saturados ou pastel, conforme ilustrado pela Fig. 10, para cujo
cineasta aplica uma abundante dose de significado implícito, modificando o caráter
de interpretação do público em relação aos mundos criados por ele.

Figura 10 – Cena do filme Moonrise Kingdom

24
Fonte: Focus Features .

De acordo com Oliveira (2016), a minuciosidade ao imprimir a sua técnica


em cada obra também revela inúmeros tracking shots, nos quais a câmera se move
em faixas em um deslizamento de cenário a cenário, estabilizada e movimentada
sobre trilhos em torno de um ou mais espaços, com o objetivo de ilustrar um
ambiente ou personagem.

23
Disponível em: <http://pravia.com.mx/mural/cine/la-simetria-en-el-cine-de-wes-anderson/>. Acesso
em: 11 mai. 2017.
24
Disponível em: <http://focusfeatures.com/>. Acesso em: 11 mai. 2017.
17

Wes Anderson demonstra um caráter importante à tipografia e às


passagens de texto sobre suas produções, visto que, além da utilização para
créditos e títulos, é aplicada também a transições (Fig. 11), nas quais muitas delas
apresentam o texto enquadrado em adereços, livros, locais, cartas, edifícios, entre
outros (OLIVEIRA, 2016).

Figura 11 – Transição utilizada no filme O Grande Hotel Budapeste

25
Fonte: Pinterest .

Ainda segundo o autor (2016), é possível considerar a direção artística do


cineasta uma própria arte em si, de modo que as caracterizações carregadas de
fantasia traduzem as particularidades de suas produções, com cenários fictícios (Fig.
12) desenvolvidos exclusivamente para as gravações de Moonrise Kingdom (2012) e
O Grande Hotel Budapeste (The Grand Budapest Hotel, 2014), por exemplo.

Figura 12 – Miniatura utilizada nas gravações do filme O Grande Hotel Budapeste

26
Fonte: Flickr .

25
Disponível em: <https://br.pinterest.com/>. Acesso em: 7 nov. 2017.
26
Disponível em: <https://www.flickr.com/photos/modelsnprops/13239245155/>. Acesso em: 11 mai.
2017.
18

Além disso, não é unicamente por meio dos signos utilizados que torna
explícita a sua paixão pelas artes. De fato, cria constantes referências à literatura,
fotografia, música, entre outros.
Wes Anderson também demonstra certa paixão por eras passadas e
romantização de períodos sociais e culturais já inexistentes. Oliveira (2016) observa:
“essa idealização nostálgica é, não só transportada para a estética (visual, musical e
textual) das suas obras, mas também para os seus protagonistas, que têm tantas
inclinações anacrônicas quanto o próprio realizador”.
Para tanto, cada filme dirigido por Anderson é, de acordo com o autor
(2016), “um puro e inocente regresso à saudade de um lugar, uma pessoa, um
sentimento, uma arte que já não lá está – ou provavelmente até nunca esteve – mas
que carrega consigo o melancólico charme de outros tempos”.

4.2 Análise das cores e suas sensações

Ao retomar os estudos de Coutinho (2005), notam-se as manifestações


artísticas especialmente como condições de percepção, conferindo à linguagem
cinematográfica permitir com que detalhes sejam expostos ao espectador como
nenhuma outra forma de expressão é capaz. Desse modo, a análise subsquente
propõe uma observação visual sobre três momentos dos filmes Viagem a Darjeeling
(The Darjeeling Limited, 2007), Moonrise Kingdom (2012) e O Grande Hotel
Budapeste (The Grand Budapest Hotel, 2014), dirigidos pelo cineasta Wes
Anderson.
Para a construção deste estudo, as cenas foram escolhidas com base nas
diferentes circunstâncias entre os espaços de tempo analisados dentro da história,
bem como a sua relevância para o enredo, organizadas cronologicamente em anexo
à extração da cor predominante em cada sequência a fim de definir a sensação
geral sob a qual o espectador percebe este conjunto.

4.2.1 Viagem a Darjeeling

Ambientada na Índia, a trama é desenvolvida a partir de uma viagem


entre três irmãos (Peter, Francis e Jack) que procuram reerguer seus laços
19

familiares em uma busca espiritual naquele excêntrico país, algum tempo após a
morte do pai.
Contornado de imprevistos, o percurso é tomado pelas crises internas de
cada um dos protagonistas que, apesar dos obstáculos que encontram pelo
caminho, conseguem alcançar o objetivo em comum de encontrar sua mãe, reclusa
nas montanhas do Himalaia sem nenhum contato com os filhos.
Segundo os estudos de Munsterberg (1983), no cinema, os personagens
encarregam-se de conceder à obra o seu próprio valor e significado, submetidos a
experiências emocionais que vão da alegria ao ódio. Nesse sentido, nota-se que as
cores em destaque na Fig. 13 apresentam-se, sobretudo, em seu figurino, bem
como no ambiente dentro do qual interagem.

Figura 13 – Dois momentos de cor em Viagem a Darjeeling

Fonte: Da autora (2017) a partir do filme Viagem a Darjeeling (The Darjeeling Limited, 2007).

As narrações ocorridas no trem onde os protagonistas viajam têm seu


início e fim expostos sob a cor azul. Aqui, eles dividem suas angústias e geram
novos conflitos, como a relação amorosa entre Jack e Rita – uma comissária de
bordo –, além do término conturbado com sua ex-namorada. A sequência de cenas
(vide Fig. 13) também mostra a dificuldade de Peter em aceitar a perda de seu pai e
a chegada de um filho, bem como o desafio que Francis encontra em reunir os
irmãos novamente, no qual persiste em falhar.
20

Para tanto, a cor predominante nesse período de tempo expõe, conforme


Bellantoni (2005), um sentido penetrante de melancolia, podendo representar
igualmente a impotência explícita na incapacidade dos personagens perante o
controle dos próprios sentimentos, o que acaba por contribuir em levá-los a posterior
expulsão da locomotiva.
Com o avançar da história, o amarelo se destaca no momento em que os
irmãos finalmente concluem a busca pela mãe (vide Fig. 13) em um mosteiro
indiano, onde retomam o contato com sua espiritualidade. Para a autora (2005), esta
é uma cor contrária; ao mesmo tempo em que um ambiente no qual predomina pode
trazer ansiedade, ela também é identificada pelo sol, em um sentido no qual
representa poderosa energia vital, a exuberância em si, sempre clamando por
atenção.
Visto isso, o dado momento divide-se entre o desentendimento com a
mãe na procura incessante pela explicação de seu abandono, junto ao equilíbrio que
enfim encontram os personagens, apesar de não conseguirem trazê-la de volta a
suas vidas, em uma sequência de angústia e aceitação.
Já em relação ao luto exposto pelos personagens em dois momentos do
filme, a Fig. 14 apresenta as cores predominantes nas cenas retratadas
especialmente a partir das vestes exibidas pelos personagens, que se encontram,
primeiramente, a caminho do funeral de um menino indiano que não sobrevive a um
acidente no rio onde seus irmãos conseguem ser resgatados pelos viajantes.

Figura 14 – O luto em Viagem a Darjeeling

Fonte: Da autora (2017) a partir do filme Viagem a Darjeeling (The Darjeeling Limited, 2007).
21

O momento é seguido da experiência vivida por eles no trajeto ao funeral


do pai (vide Fig. 14), lembrança reproduzida em seu país de origem, reforçando os
estudos de Ambrose e Harris (2009), os quais afirmam que enquanto as
manifestações de condolências em países orientais são representadas pelo branco,
no Ocidente utiliza-se o preto em exposição ao luto.

4.2.2 Moonrise Kingdom

O filme conta a história de dois jovens na década de 1960, que se


apaixonam e pactuam em fugir secretamente para a região selvagem da ilha onde
vivem. Enquanto as autoridades locais e seus responsáveis tentam capturá-los de
volta, uma forte tempestade prepara-se fora da costa, transtornando a comunidade
da pacífica ínsula.

Figura 15 – Três momentos de cor em Moonrise Kingdom

Fonte: Da autora (2017) a partir do filme Moonrise Kingdom (2012).


22

A Fig. 15 expõe três momentos de cor para análise do filme em questão,


sendo o primeiro uma apresentação dos personagens e da pequena ilha localizada
na costa da Nova Inglaterra. Sob tons de amarelo, os jovens Sam e Suzy vivem a
expectativa de um reencontro e o desenrolar de seu plano de fuga.
Segundo afirmação de Bellantoni (2005), esta cor encontra-se suscetível
a reproduzir diferentes significados, podendo relacionar-se aqui à inocência e
elegância na narração da história vivenciada pelos protagonistas.
Já o laranja predomina em instantes que antecedem a prática do plano, a
lembrança do primeiro encontro entre os dois e sua preparação para a fuga,
interagindo junto ao amarelo na reprodução do que, segundo a autora (2005),
aquela década representa em si, trazendo exuberância e jovialidade ao segundo
momento de cor apresentado (vide Fig. 15).
Conforme a tempestade se aproxima da ilha, o marrom domina a
sequência de cenas (vide Fig. 15) até o momento em que o local é assolado pela
fúria da natureza. De acordo com Heller (2013), na psicologia das cores, esta é a cor
mais frequentemente rejeitada, sendo, na realidade, o resultado da mistura de todas
as cores.
No entanto, para o sentido psicológico, o marrom é indiscutivelmente uma
cor, pois apresenta simbologia própria e não é igual a nenhuma das outras. Seu
emprego é geralmente associado a conceitos encarados de maneira negativa. Além
disso, para a autora (2013), é inevitável sua relação à sujeira, sob a qual o lugar
encontra-se repleto com a passagem da forte chuva.

4.2.3 O Grande Hotel Budapeste

A história acontece no período entre as Duas Grandes Guerras, onde o


concierge de um hotel europeu (Monsieur Gustave) passa a conhecer o novo
mensageiro (Zero) e ambos se tornam amigos. Um idoso autor (Wilkinson) relembra
de tais acontecimentos a partir do encontro com o então jovem empregado, já em
idade mais avançada como dono do estabelecimento, ocorrido anos antes do relato.
Então inexperiente, Zero é educado por M. Gustave, que se torna
herdeiro de uma famosa obra renascentista após a morte de uma hóspede
frequente, a idosa Madame D., desagradando aos filhos dela, especialmente Dmitri.
23

Com o resgate do quadro, acusado de um crime que não cometeu, o


concierge passa a ser perseguido por um assassino profissional (Dafoe), e conta
com o apoio de Zero e da namorada do mensageiro (Agatha) para provar a própria
inocência e retornar ao hotel.
As mudanças ocorridas em aspecto emocional ao decorrer do filme
reforçam os pressupostos de Barros (2011), para os quais a sensação visual das
cores chega até a percepção tomada por ligações psicológicas. Anderson faz uso
dessa proposição visual, destacando as emoções de cada momento a partir da
distinção de valores observada em suas cores predominantes.

Figura 16 – Três momentos de cor em O Grande Hotel Budapeste

Fonte: Da autora (2017) a partir do filme O Grande Hotel Budapeste (The Great Budapest Hotel,
2014).

Para Bellantoni (2005), pela tendência de enxergá-lo primeiro, o vermelho


provoca a ilusão de avançar em direção ao espectador. Devido a essa qualidade
visualmente agressiva, pode manipular o senso de espaço, sendo capaz também de
24

fazer com que algo pareça se mover mais rápido. Aqui, enfatiza-se a hipótese de
Fraser e Banks (2007) sobre o emprego dessa cor em sinalizações de aviso onde
perigos mais suscetíveis de existir são alertados.
Ele predomina no momento em que é iniciada a experiência profissional
de Zero (Fig. 16), quando o mensageiro corre incessantemente pelos corredores do
hotel atrás de satisfazer as necessidades dos hóspedes e de seu superior com
prontidão, atento em efetuar todas as atividades conforme as regras.
Em outro momento, o azul, por sua vez, silencioso e distante, é uma cor
para pensar, e não para agir. Segundo estudos de Bellantoni (2005), um ambiente
azul é capaz de tornar as pessoas passivas e introspectivas. No filme em questão,
ele prevalece durante a fase em que M. Gustave encontra-se recluso (vide Fig. 16),
presente tanto na pintura das paredes da prisão onde está situado, quanto nas
listras das vestes dos prisioneiros. Em tal circunstância, o concierge concentra-se
em escapar do local com o auxílio de cúmplices que encontra em uma das celas.
Nos últimos momentos da trama, Agatha adentra sorrateiramente ao hotel
com o disfarce de estar distribuindo confeitos do local onde trabalha, enquanto
busca o valioso quadro escondido por M. Gustave. Após um grande conflito armado
entre Dmitri e as autoridades locais, a jovem acaba por encontrar o registro que
torna o – agora antigo – concierge herdeiro de tudo o que pertencia à Madame D.
Como se pode analisar a partir da Fig. 16, esta cena atende aos
pressupostos de Heller (2013) sobre a psicologia das cores, para os quais a cor rosa
simboliza a força dos fracos, como o encanto e a amabilidade, além da sensibilidade
e sentimentalidade, traduzidas especialmente pelo casal de jovens aflitos que se
abraçam em meio às caixas de doce após a confusão.

4.3 Percepções finais

A partir da pesquisa apresentada, foi percebido pela autora que é possível


apropriar-se da cor em benefício de criar uma narração por meio desta, a qual,
conforme estudos de Ambrose e Harris (2009), pode ser utilizada de várias maneiras
com o intuito de comunicar significados distintos capazes de produzir impacto
emocional sobre um público.
Wes Anderson expõe este elemento visual especialmente sobre os traços
da estética de sua obra, para o qual Oliveira (2016) afirma induzir doses dotadas de
25

significado implícito, o que transforma o modo de interpretação do espectador em


relação aos mundos criados pelo cineasta.
Dessa forma, obtém-se a cor como componente fundamental na vida das
pessoas, a qual é reconhecida por Ambrose e Harris (2009) como um dos principais
elementos historiados na percepção visual de algo pela primeira vez, haja vista que
o próprio homem teve sua evolução com certa concepção acerca da cor.

5 CONCLUSÃO

Com base na exposição deste estudo, pode-se compreender como as


cores se comportam de acordo com o uso ao qual são aplicadas sobre diversos
suportes de comunicação; neste caso, especificamente, no meio cinematográfico.
Desse modo, torna-se reconhecida como um artifício capaz de produzir implicações
psicológicas sobre o homem, bem como transformar a sua percepção visual em
emoção.
A partir da análise de três filmes do cineasta Wes Anderson, foi possível
concluir que o diretor apresenta um estilo original reconhecido, sobretudo, por meio
do expressivo caráter visual de sua obra. Esta, por sua vez, reafirma os conceitos
obtidos com a pesquisa ao proporcionar emoções fundamentadas na predominância
de uma cor específica para certos momentos de cada longa-metragem, sendo
identificada visualmente sob a leitura que se deu ao decorrer das cenas escolhidas
para auxílio desta análise.
O presente trabalho cumpre seu objetivo geral, pois, conforme a
discussão acerca da exibição desses dados, nota-se a influência das cores sobre o
homem em uma contínua relação pela qual se pode exercer determinado controle,
contribuindo amplamente com organismos comunicativos destinados a transmitir
uma mensagem a alguém.
Assim, com a apresentação dos objetivos específicos que tratam da cor
como linguagem visual no design e no cinema, identificação da relação das cores
com seus significados e o contexto visual das obras de Wes Anderson, é possível
afirmar que a cor é provida de capacidade para intervir no vínculo de um indivíduo
junto a suas formas de expressão, percepção e comunicação com o mundo.
Com isso, propõem-se uma estrutura estabelecida entre o estudo da cor e
outros segmentos que possam se beneficiar de seu uso a fim de entregar
26

informações sobre um produto ou serviço a algum público específico, conectando-se


a ele por meio deste recurso visual e seu caráter capaz de despertar emoções a
partir do ato perceptivo.

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