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FINS DAS PENAS

Relacionam-se com a temática da legitimação, fundamentação e função da intervenção da pena


estatal – a partir dos fins das penas pode discutir-se toda a teoria da lei penal.
 FD: à sombra do problema dos fins das penas, discute-se toda a teoria penal, nas suas
questões fulcrais da legitimação, fundamentação e função da intervenção penal estatal.
 MFP: A pena tem uma conotação mágica ou sagrada que lhe foi sempre conferida pelo
processo histórico e que ainda hoje persiste, revelando-se sempre como imposição de
um mal para a pessoa do criminoso e para a sua honra (não apenas para o seu
património).

Art. 40º CP
 Ponto de partida e chegada para a pergunta de qual a finalidade da aplicação de uma
pena.

Teorias Monistas
Perspetiva monista em que há só uma finalidade das penas

Teorias Retributivas / Absolutas


Extinção do mal que é o crime pelo mal que é a pena.
Justificam a pena pela compensação do mal do crime, independentemente de qualquer fim
pragmático.
 Ideia de pena como expiação – pena é uma retribuição que compensa o mal do crime.
 A pena é um castigo e nada mais que isso.

Teorias retributivas têm uma perspetiva retrospetiva.

Antiguidade Clássica: conversa entre Anaxágoras e Péricles em que se manifesta a conceção


retributiva

Idade Média: fundamento do juiz é a aplicação da justiça divina e na busca de uma


compensação por igualação – conceção cristã da responsabilidade ética individual

Kant: deveres impõe-se por si e justificam-se a si mesmos, sem fins extrínsecos.


 Penas são imperativos categóricos – mandamentos do cumprimento do dever.
 Contrato originário faz ceder liberdade e nessa assinatura também se sabe que há crime
e penas.
o Os crimes são mal necessários, aos quais se contrapõem as penas, que fazem
parte do contrato originário preservando a segurança.
o Crime e pena são sinalagmáticos: se todos conhecem o contrato originário e o
aceitam, então também se aceita a punição por penas.
o Deve aplicar-se o direito até às ultimas consequências.
 A pena não se aplica “para que” se atinja algo extrínseco à própria pena; a pena é
aplicada “porque” isso é o imperativo categórico.
 A pena é um imperativo categórico e mesmo que uma sociedade desaparecesse,
teria que o último condenado à morte ser executado para que “o sangue
derramado não caia sobre o povo que se decidiu pela não punição, porque então
seria considerado comparticipante nesta violação pública da justiça”
 A negação do direito alheio é sempre uma negação do Direito geral, o que abrange os
direitos dos próprios criminosos – crime era a negação da universalidade da lei,

Hegel: crime é negação do direito; pena é a negação da negação – servia para anular o crime e
revalidar a vinculatividade do Direito.
 A pena é mal necessário “porque” se praticou o crime.
 O crime permite revelar o Direito, pois quando se viola o Direito isso demonstra que ele
existe – havendo contradição com a Ordem Jurídica a pena vem reafirmá-la.
o Aplica-se a pena porque tem de ser afirmar a norma jurídica.
o A pena é negação do crime, constituindo uma reafirmação dialética do Direito.
o A pena é inerente ao conceito de crime, faz parte dele num sentido lógico.
 Pena é modo de honrar o criminoso e não como um instrumento ao serviço da
sociedade, através do qual a dignidade do criminoso como pessoa possa ser prejudicada.
 Não há um entendimento moral da pena, a qual deve pertencer exclusivamente à
racionalidade do Estado – objetividade do Direito, a partir das características da
generalidade e abstração da norma;
o A pena, tal como o crime, não vale em função do merecimento da vontade
nem dos autores do crime nem de quem impõe a pena, mas enquanto afirma
ou nega o Direito num plano das ideias e num plano meramente lógico.

Pena surge como entidade independente de fins – construções que vêm as penas como fins em
si mesmos e que não visam alcançar finalidades extrínsecas.
 Pena é justo equivalente do facto que se cometeu e da culpa do agente

Estas teorias vêm criar o conceito de que tem de haver culpa para haver pena – esse apelo à
ideia de culpa cabe no art. 40º/2.

Críticas
1. Teoria parte de uma ideia de responsabilidade individual baseada no liberum arbitrium
indiferentiae que o conhecimento científico não permite comprovar – somente é
aceitável presumir que as pessoas são livres na medida em que a sociedade e o Direito
reconhecem a responsabilidade individual.
2. Pressuposto da retribuição é a culpa ética, surgindo como sua consequência
necessária. Não cabe ao Estado, num contexto de EDD, promover uma ética ou moral
em si mesmas, mas apenas, quando muito, na medida indispensável à preservação das
condições sociais de existência.
3. Retribuição conflitua com art. 18º/2 CRP – princípio da necessidade da pena que
postula que a pena só pode ser aplicada quando for necessária para a preservação da
sociedade.
4. Confusão concetual entre retribuição e reafirmação do Direito.1
5. Não pode ser considerada uma teoria dos fins das penas, pois a pena é considerada
como entidade independente de fins.

1
Não estando a reafirmação do Direito, em causa, se for articulada com um princípio liberal da
necessidade da pena, de adequação e proporcionalidade ao facto da mesma.
6. Não cabe na letra do art. 40º/1 em que a finalidade não é retributiva e aplica-se uma
pena “para que”.

Teorias Preventivas / Relativas


Pena é instrumento de prevenção da prática de crimes.
 A finalidade da pena é extrínseca.
 O mal da pena visa alcançar a prevenção.
o Figueiredo Dias: é instrumento político-criminal destinado a atuar no mundo e
intenta alcançar a prevenção ou a profilaxia criminal.

Teorias preventivas têm uma perspetiva prospetiva

Prevenção Geral
FD: Pena é instrumento de política criminal que visa atuar psiquicamente sobre a generalidade
das pessoas/comunidade, afastando-as da prática de crimes através da ameaça penal
estatuída pela lei, da realidade da sua aplicação e da efetividade da sua execução.

Prevenção geral negativa/Intimidação: receio da aplicação da pena impede as pessoas de


cometer crimes.
 Pena é concebida como intimidação da generalidade das pessoas.
 Linha de pensamento de Anselm von Feuerbach – doutrina da coação psicológica – a
pena serviria para impedir (psicologicamente) quem tivesse tendências contrárias ao
Direito de se determinar por elas.
 Justifica-se pelo fortalecimento dos juízos de valor social dos cidadãos, que depende da
cominação e aplicação de penas.

Prevenção geral positiva/Integração: pena existe para levar os cidadãos a confiar nas normas
gerais.
 Penas têm de demonstrar que a Ordem Jurídica é inquebrável.
 Penas visam conferir confiança à comunidade, para que as pessoas possam confiar no
Direito Penal.

Art. 40º/1 CP visa a proteção de bens jurídicos – promove uma atuação preventiva e liga
umbilicalmente à preservação dos bens.

Críticas
1. Configurar como a pena a partir de orientações pragmáticas e numa lógica de eficiência
viola a Dignidade da Pessoa Humana, que é tida como mero instrumento.
 A pessoa não é, em caso algum, um meio ao serviço de fins sociais.
2. Não se consegue justificar a atribuição da pena ao criminoso por algo que ele tenha feito
e com base na medida da gravidade do facto – a pena deixaria de poder ser vista como
consequência do crime.
3. Tendência para penas mais severas e longas, pois nunca se sabe qual o quantum de
pena que vai intimidar os sujeitos.
4. Baseia-se numa lógica de psicologia de multidões e de expetativas sociais.
5. Levado às últimas consequências poderia permitir a punição de pessoas que não
cometeram crimes apenas para serem exemplos.

Prevenção Especial
Pena surge como instrumento de prevenção individual – atuação sobre o agente que prevaricou
e focada nesse indivíduo. Intervenção sobre o cidadão delinquente, através da coação
psicológica, inibindo-o da prática de crimes ou eliminando nele a disposição para delinquir.
 Ideia da prevenção da reincidência.

Prevenção especial negativa – coação, segregação ou eliminação – defesa social através da


separação ou segregação do delinquente, visando neutralizar a sua perigosidade social.
 Intimidação individual.

Prevenção especial positiva – ressocialização, reintegração e socialização do agente.


 É indispensável ao Ordenamento Jurídico e surge em sintonia com a proteção dos bens.
 Só pode sofrer o mal da pena se daí surgir um sentido social positivo.
 Respeita o art. 18º/2 CRP pois reabilita o agente na sociedade, no sentido de se tornar
cidadão cumpridor do Direito.

Platão -> Protágoras: exemplo de racionalidade e de prevenção especial – toda a virtude se ensina e se
aprende.
 A punição deve ser para ensinar.
 Não se deve acrescentar um mal ao mal, deve querer produzir-se um bem.
o Pena retributiva visa produzir no futuro um mal e não um bem.
o Ao mal do ilícito junta-se o mal da pena.
o Deve é reabilitar-se para que no futuro haja um bem
 “Ninguém pune o delinquente só pela simples razão de que cometeu uma injustiça, a não ser
aquele que, como um animal irracional, se procura vingar; aquele que pretende punir de modo
racional não castiga por causa do ilícito já cometido – não faz com que o que esteja feito deixe
de estar – mas em vista do futuro, para que daí em diante o delinquente não volte a cometer
injustiças e também não os outros, que veem como ele é punido”

Kraus influencia este pensamento, bem como a Escola Correcionista, perfilhada por Levy
Maria Jordão.
 Todos os homens são suscetíveis de serem corrigidos e é isso que se devia fazer aos
delinquentes.

Críticas
1. A prevenção especial negativa viola a dignidade da pessoa humana e a
autodeterminação do indivíduo.
2. Quer a negativa quer a preventiva, a prevenção nunca pode ser tomada como a única
finalidade da pena, pois ela teria de ser prolongada até se ter a certeza que o agente
não cometeria novos crimes – levava ao instituto da pena absolutamente
indeterminada2

2
Não as do art. 83º e ss. CP – que são penas relativamente indeterminadas, mas, em que sabemos que a
pena vai acabar.
3. Crimes muito graves poderiam ficar impunes se não existisse perigo de reincidência e
crimes menos graves poderiam justificar a prisão perpétua ou a morte.
4. Investigação empírica não permite apoiar em dados absolutamente seguros a prognose
sobre a delinquência futura3

3ª via das consequências do crime: Restoractive Justice


Noção de justiça restaurativa, ONU: processo através do qual a vítima, ofensor e, quando
apropriado, outros indivíduos ou membros da comunidade afetados pela prática de um crime,
participam e decidem conjuntamente como lidar com os seus efeitos, auxiliados por um
terceiro imparcial.

Howard Zehr – ideia que a pena deve ter finalidades específicas de reparação
Braithwaue também adere a esta tese, influenciado por vir de Estados retributivos – o Estado
apropriou-se do crime e devolver-se o crime às pessoas.

Ideia de mediador penal – deve recentrar-se a noção de pena na vítima; noção de concertação
e reparação da vítima e do opressor
 Finalidade da pena pode ser a de operar a possível concertação entre o agente e a
vítima através da reparação dos danos – não apenas necessariamente patrimoniais,
mas também morais – causados pelo crime.
 Há diálogo entre a vítima, opressor e a comunidade afetada, numa lógica de
participação.
 Prática do crime gera práticas de responsabilização e reparação.

Claus Roxin: deve sempre acrescentar-se uma forma de reparação.


 §46 do CP alemão tem a ideia de mediação entre vítima e agressor.

Em Portugal não há ideia de mediação.


 Reparação existe em casos circunscritos: art. 72º/1/c; 74º/2; 206º; 368º-A/7 e 8
o Não existe uma ideia de justiça restaurativa, há apenas manifestações dessa
justiça em casos específicos.

3
MFP: E, aliás, a pena é criminógena, de modo que as próprias condenações aumentam as probabilidades
de reincidência.
Teorias Mistas
São teorias eclética ou unificadoras.
Dizem-nos que não pode haver um único fim da pena – já desde a obra de Beccaria que a isso
se apela: que defende que a pena só é legítima se for necessária (para o bem da sociedade).
 MFP: o “para que” pode ser resposta ao “porque” nos fins das penas

Crítica às teorias monistas


Roxin: Teorias monistas são altamente criticáveis individualmente – a realização estrita de um
só princípio ordenador tem forçosamente como consequência a arbitrariedade e a falta de
verdade.
Maria Fernanda Palma: Nenhuma das conceções sobre o fim das penas é por si mesmo, na
sua lógica, compatível com o Estado de Direito Democrático.
 Teorias não dão resposta satisfatória ao problema da legitimidade da pena.

Teoria da retribuição não nos serve, porque deixa na obscuridade os pressupostos da


punibilidade, porque não estão comprovados os seus fundamentos e porque, como profissão
de fé irracional e além do mais contestável, não é vinculante.
 Lógica retributiva está associada a um raciocínio ético e essa argumentação moral não
pode fundamentar a pena, pois o Estado só intervém na defesa de interesses e direitos.
o MFP: tendencialmente inconstitucional – art. 18º/2 CRP.
o Tem de haver noção de necessidade, proporcionalidade, o que pode não se
enquadrar com a lógica da retribuição.
o Choca com o princípio da necessidade da pena estatal.
 Conceção que não se preocupa com o efeito das penas mas com a razão de ser delas.
 Discussão mal colocada, pois encara a pena sem a sua dimensão histórica e não a
enquadra no Estado de Direito Democrático.
 Considera uma pena ética e não uma pena estatal – não parte da função estatal da pena
e das reflexões de qual a legitimidade do poder punitivo do Estado; não se pode
ultrapassar esse quadro que é o Estado que restringe direitos na pena.
 No geral, não se compatibiliza com a CRP e o EDD.

Teoria da prevenção especial não é idónea para fundamentar o direito penal, porque não pode
delimitar os seus pressupostos e consequências, porque não explica a punibilidade de crimes
sem perigo de repetição e porque a ideia de adaptação social coativa, mediante a pena, não se
legitima por si própria, necessitando de uma legitimação jurídica que se baseia noutro tipo de
considerações.

Teoria da prevenção geral encontra-se exposta a objeções semelhantes às outras duas: não
pode fundamentar o poder punitivo do Estado nos seus pressupostos, nem limitá-lo nas suas
consequências; é político-criminalmente discutível e carece de legitimação que esteja em
consonância com os fundamentos do ordenamento jurídico.
Roxin: tentativa de sanar defeitos justapondo as 3 conceções distinta tem de forçosamente
fracassar, já que a mera adição, não somente destrói a lógica imanente a cada conceção, como
aumenta o âmbito de aplicação da pena, a qual se converte assim num meio de reação apto
para qualquer realização.
 Efeitos de cada teoria não se suprimem, multiplicam-se.
 Teoria unificadora aditiva pode ser até perigosa.

Tem que se procurar a justificação para a aplicação de penas no que legitima o Estado a punir
os seus cidadãos – direito penal tem o fim de garantir a todos os cidadãos uma vida em comum
livre de perigos e isso resulta do dever que incumbe ao Estado de garantir a segurança dos seus
membros.
 Direito penal tem que assegurar os bens jurídicos, punindo a sua violação.

MFP: teorias não podem ser casadas, pois os seus princípios são logicamente incompatíveis –
na lógica exclusiva de cada uma das teorias não há compatibilidade.
 Nenhuma são compatíveis com a CRP e não são compatíveis entre si.

O ponto de partida da discussão tem de ser a realidade da pena e não aquilo que ela idealmente
deveria ser
 Qual a solução, à luz da CRP, para os fins das penas?

Claus Roxin
Pena tem finalidades preventivas e serve fins racionais – garante as funções de existência.
Divide a conceção em 2 momentos:
 Plano abstrato – pena serve fins de prevenção geral e visa a tutela de bens jurídicos
 Plano concreto de aplicação – prevenção geral e prevenção especial; lógica de evitar a
reincidência mas também atendendo à culpa

A culpa é pressuposto e limite inultrapassável da pena.


 Mas pode ser fixada pena abaixo do limite de culpa se isso for necessário para a
prevenção especial.

Medida da culpa não é dada por ponto exato da escala penal e tem de haver pena com base
numa moldura de culpa.
 Os limites de prevenção geral mínima têm de ser satisfeitos.
o O fim da prevenção geral da punição apenas se pode conseguir na culpa
individual.
 Na execução específica da pena atende-se a critérios de prevenção especial positiva.

Teoria unificadora dialética


Pena não pode ultrapassar a medida da culpa, que não serve para fundamentar o poder penal
do Estado mas sim para o limitar.
 Significa que o Estado não pode estender o seu poder penal, no interesse da prevenção
geral ou especial, para além do correspondente à responsabilidade de um homem
concebido como livre e suscetível de culpa.
o A culpa constitui um meio de manter dentro de limites aceitáveis os interesses
da coleticvidade face à liberdade individual
o Justifica a pena e a suportação da mesma não devido a um imperativo
categórico, mas porque, como membro da comunidade, tem de responder pelos
seus atos na medida da sua culpa, para a salvaguarda dessa comunidade.
o Deste modo não é utilizado como meio para os fins dos outros, mas antes
assume a sua responsabilidade pelo destino da comunidade e confirma a sua
posição de cidadão com igualdade de direitos e de obrigações.

Aplicação da pena serve para a proteção subsidiária e preventiva, tanto geral como individual,
de bens jurídicos e de prestações estatais, através de um processo que salvaguarde a autonomia
da personalidade e que, ao impor a pena, esteja limitado pela medida da culpa.

Faria Costa
Teoria neoretributiva
 Culpa é fundamento da pena, num encontro entre Direito Penal e Filosofia .
 Retribuição é expressão das ideias de responsabilidade e igualdade.
 Pena não deve ser valorada como um mal, pois ela retrata a pluralidade axiológica
positivamente relevante.
 “a pena a aplicar tem que ser envolvida pelo olhar que quer ver o pretérito” – vê o facto
criminoso na contextualização com o seu passado e é por isso que se aplica pena.

Sousa e Brito
Pena retributiva é a que mais serve para finalidades de prevenção especial – que deve ter
primazia sobre a prevenção geral.
 Medir a pena pela culpa pode ser incompatível com exigências de prevenção especial.
 A medida da culpa nunca pode ser ultrapassada.

Pena visa retribuir a culpa e é atribuída em função da culpa (art. 71º/1), mas a culpa sendo
fundamento ou pressuposto essencial, e por isso limite da pena, só é retribuída na medida
necessária à proteção dos bens jurídicos.
 É impossível obedecer à proibição de a pena ultrapassar a medida da culpa – ou ao
comando equivalente de a manter dentro da medida da culpa – sem medir a pena pela
culpa.
o Medir a pena pela culpa é o conteúdo essencial da ideia de retribuição.

Todo o direito penal não é mais do que um elaborado sistema de escolher a culpa que se pune e
de medir a pena pela culpa.

Nem a teoria da prevenção especial nem a da prevenção geral determinam a escolha e a medida
das prestações de prevenção especial devidas pelo criminoso em termos idênticos entre si ou
idênticos com a determinação que resulta da reparação da culpa no direito penal de Estado de
Direito. Por outro lado, só estes últimos respeitam o princípio constitucional da culpa.

As teorias da pena como prevenção de crimes futuros não podem recuperar o conceito de pena
como “expressão de um juízo de valor moral de quem pune”, de que fala von Lisxt. Não pode
recuperar um autêntico juízo de desvalor ético do julgador, mas apenas os juízos morais de
desvalor da maioria da comunidade como elementos de facto que contribuem positivamente
para a prevenção geral.
 A teoria da retribuição pretende, porém, medir à partida a culpa do agente e não
recuperar os juízos de culpa da comunidade como critério da prevenção geral.

Caráter jurídico da reparação da culpa pela pena e a sua fundamentação ética pressupõe o
postulado da liberdade humana.

Pelo art. 40º/2 e pelos comandos constitucionais, a reparação da culpa é o único dos fins de
pena que é específico da pena.
 Pena retributiva é a que melhor serve as exigências de prevenção especial – a prevenção
especial é que dá conteúdo material à reparação da culpa, de acordo com o seu
fundamento racional.

Culpa determina limite máximo possível da pena.


 Nem toda a culpa tem de ser punida, só aquela necessária punir, na falta de outro meio,
para defender a ordem dos bens jurídicos.
 Não se nega que a pena seja meio de defesa dos bens jurídicos, apenas nega que seja
adequadamente definida através desse conceito.

Figueiredo Dias
Natureza exclusivamente preventiva das finalidades da pena
Finalidade visada pela pena é a da tutela necessária dos bem jurídico-penais no caso concreto.
 Não numa perspetiva retrospetiva, face a um crime já verificado, mas com um
significado prospetivo, pela necessidade da tutela da confiança e expetativas da
comunidade na manutenção da vigência da norma violada.

Finalidade primária é o restabelecimento da paz jurídica comunitária abalada pelo crime.

Existe uma medida ótima de tutela dos bens jurídicos e das expetativas comunitárias, não
podendo ser excedida (princípio da necessidade) por considerações de qualquer tipo,
nomeadamente exigências de prevenção especial.
 Essa medida ótima não fornece ao juiz um quantum exato da pena.
 Abaixo do ponto ótimo ideal existirão outros em que aquela tutela é ainda efetiva e
consistente.
o Isto até se alcançar um limiar mínimo de defesa do ordenamento jurídico,
abaixo do qual já não é comunitariamente suportável a fixação da pena sem
se pôr irremediavelmente em causa a sua função tutelar de bens jurídicos.

Prevenção geral positiva fornece uma moldura de prevenção dentro da qual atuam
considerações de prevenção especial, que determinam a medida concreta da pena.

Função da culpa no sistema punitivo reside numa incondicional proibição do excesso – a culpa
não é fundamento da pena, mas constitui o seu pressuposto necessário e o seu limite
inultrapassável.
 Estabelece um máximo de pena ainda compatível com as exigências de preservação da
dignidade da pessoa e de garantia do livre desenvolvimento da sua personalidade nos
quadros próprios dum EDD.
 É barreira intransponível ao intervencionismo punitivo estatal e um vetor incondicional
aos apetites abusivos que ele possa suscitar.
o Limiar da pena concreta é sempre a culpa – nunca a pode exceder, mesmo que
as exigências de culpa excedam o ponto ótimo social, nunca pode ultrapassar a
medida da culpa. Mas não pode descer abaixo do limiar mínimo.

Legitimação da pena tem duplo fundamento: prevenção e culpa.


 Toda a pena que responsa adequadamente às exigências preventivas e não
exceda a medida da culpa é uma pena justa.

Modelo de relação entre art. 40º/1 e 2:


Culpabilidade não tem papel determinante na decisão sobre o “se” da pena, apenas opera a
posteriori na determinação da medida judicial concreta e apenas para evitar que se ultrapasse
um certo ponto-limite ainda justificável preventivamente ou, quando muito, uma certa moldura
entre um máximo e um mínimo baseada em critérios de culpabilidade média, para evitar
excessos preventivos. Culpabilidade é princípio restritivo funcionando no quadro da prevenção.

Crítica MFP:
 Razões de ordem sistemática – art. 71º CP; não se pode dizer que a culpa não
fundamenta, embora isso não signifique que se ceda às teorias retributivas
 Razões e ordem constitucional – art. 1º CRP e DPH

Maria Fernanda Palma


Há uma ligação visceral da reflexão sobre os fins das penas às teorias sobre o fundamento e a
legitimidade do Estado.
 Vem desde os tempos do contratualismo e expressou-se na ideia da necessidade da
pena – legitimidade da pena é com referência na necessidade da proteção da liberdade
de cada cidadão.
 Visão MFP: a partir da visão democrática do legislador do CP de 19824 com a reforma de
1995 e introdução do art. 40º5

Apela aos princípios do Retribucionismo


 1º princípio: não há pena sem crime – nua penna sine crimen
 2º princípio: sempre que há crime tem de haver pena

O 2º princípio é inconstitucional, mas o 1ª tem proteção constitucional e está consagrado,


decorrendo da liberdade e igualdade – art. 27º e 13º.

A substituição psicológica da vingança privada que a pena assegura enquanto retribuição


racionaliza-se através de 2 princípios constitucionais:

4
CP democrático que sucedeu a um CP do séc. XIX – que sobreviveu a vários regimes – código de Melo
Freire e de grande pendor liberal.
Este CP de 1982 é inspirado no projeto de Eduardo Correia, cujo teor era muito revolucionário para a
época, tendo um espírito de prevenção especial, humanismo e etc.
Figueiredo Dias transpôs algumas ideias para o CP 1982
5
Art. 40º CP foi introduzido com a revisão de 1995 como norma orientadora quanto às penas, numa fase
em que se pretendeu ultrapassar as rotinas judiciais retributivas.
 Princípio da culpa – deriva da DPH (art. 1º CRP)
 Princípio da necessidade da pena (art. 18º/2 CRP)

A retribuição justifica-se racionalmente, na verdade, por basear a pena no significado ético-


jurídico do facto praticado.
 Mas, a retribuição excederá a legitimidade do jus puniendi do Estado quando
prosseguir como um fim em si a expiação moral do delinquente, ultrapassando a
medida necessária para a reafirmação do Direito.

Retribuição ancora-se na necessidade social em dois planos:


 Nível do controlo das emoções geradas pelo crime – da pacificação social
 Nível da proteção perante o delinquente.

A pena retributiva só é, deste modo, legítima se for necessária preventivamente.


 A prevenção geral e a prevenção especial só se legitimam, como fins das penas, através
da pena da culpa.
 Também a culpa funciona como fundamento, ou, pelo menos, como limite da pena
preventiva.
 A retribuição e a prevenção articulam-se obrigatoriamente com os princípios
constitucionais.

Lógica do sistema de fazer depender o “se” da punição da necessidade preventiva, entendida


nos termos da prevenção geral positiva, a que acresceria a prevenção especial, e remeter as
razões de censurabilidade pessoal do agente relacionadas com a sua capacidade concreta de
motivação ou apenas com a motivação pelo cumprimento do dever medianamente exigível
para o papel acessório de limite formal da medida da pena.

Figueiredo Dias redigiu o artigo no sentido de uma exclusiva fundamentação preventivo-geral


da decisão de punir – nunca há lugar ao afastamento da pena perante a persistência das
exigências mínimas de prevenção geral, mesmo que as exigências de culpa apontassem para um
limite inferior, fixando abaixo dos mínimos de prevenção a culpabilidade do agente.
 Leitura tem dificuldades sistemáticas.

CP estabelece que a culpa do agente é o critério fundamental da medida da pena, que justifica
a sua variação entre o máximo e o mínimo (art. 71º CP), o que coloca logo a objeção do critério
da medida judicial da pena poder ser de natureza diversa do fundamento legal da punição.
Questiona-se também como é que a culpabilidade do agente, que é um elemento do conceito
de crime e um pressuposto essencial de toda a atribuição de responsabilidade (nullum crimen
sine culpa), patente na teoria geral do crime (art. 3º/2, 17º, 35º, 37º), pode ser reduzida a
critério restritivo, acessório, de uma responsabilidade baseada na prevenção geral positiva
(proteção de bens jurídicos e promoção da segurança geral) coadjuvada pela prevenção
especial.

Princípio da culpa é expressão de uma consideração plena da igual dignidade da pessoa bem
como da igual consideração dos interesses de todos e da justa oportunidade de cada pessoa
de orientar o seu comportamento pelas normas penais – art. 1º, 13º e 27º CRP
 Dimensão que nada tem a ver com a ideia de retribuição, mas sim com a ideia de uma
relação punitiva justa a partir de comportamentos que só são verdadeiramente dignos
de tutela penal porque os seus autores tiveram as devidas condições para se
reconhecerem como responsáveis, tendo, assim, cabimento um juízo de censura pessoal
pela prática de certos comportamentos.

No art. 40º, não cabe só uma perspetiva de satisfação do interesse geral da comunidade ou
mesmo de uma necessidade objetiva de proteger bens, mas, cabe também a consideração de
um certo nível de desvalor da ação e de uma exigibilidade média de um outro comportamento
a quem viola uma norma.
 Exigibilidade ética de certos comportamentos não é algo posterior às decisões
legislativas de incriminação, mas a própria consideração da atribuição de uma censura
pessoal, que é condição da legitimidade constitucional da incriminação de certos
comportamentos, ou da sua negação, num plano abstrato-normativo.

Modelo de relação entre art. 40º/1 e 2:


Culpabilidade opera desde logo, à partida, condicionando os critérios de necessidade, não a
partir de uma ideia retributiva mas a partir da consideração do merecimento da conduta do
agente.
 A culpabilidade não restringe a necessidade da pena mas apenas a reconfigura,
estabelecendo um limite inultrapassável, não podendo a pena concreta nem a decisão
de punir superar esse limite.
o A moldura penal é fixada em função desse limite.
o A prevenção geral e a especial podem determinar uma pena, mas nunca
superior a esse limite de culpabilidade.
o E as razões de prevenção geral ou especial não poderão justificar a punição se
a culpabilidade for excessivamente baixa.
 Culpabilidade não funciona de forma independente a considerações de prevenção
especial e geral, porque estas afetam o merecimento do comportamento.
o Prevenção é princípio restritivo funcionando no quadro dos limites máximo e
mínimo de culpabilidade que o comportamento justifica.

Merecimento do agente na prática do facto condiciona a fundamentação da pena


restritivamente, tal como as considerações de prevenção.

Conceção segunda a qual a culpa é fundamento da própria pena.


 Culpa deve superar a lógica da vingança privada e é fundamental num EDD – pena é
necessária porque o agente agiu com culpa.
o O agente tinha alternativas de comportamento, mas decidiu agir assim, tendo
culpa na violação da norma penal.

Prevenção geral e especial são admissíveis desde que atendendo à medida da culpa.
 Culpa condiciona critérios de necessidade de pena, de merecimento devido à conduta
do agente.
o Nunca é retributiva

Suportada pelo Acórdão STJ, 21/3/1990, Manso Preto

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