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Em 2017 estive no maior encontro de educação
montessoriana do mundo. Lá, foi lançado um
livro maravilhoso:
LarMontessori.com
Um abraço,
Gabriel Salomão
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Maria Montessori fala para Famílias, sem edição em
português
Crianças Obedientes Não Ficam Quietas – Lar Montessori
Conteúdo:
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Crianças
Obedientes Não
Ficam Quietas
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nossos desejos. Mas entender a vida é,
necessariamente, prestar atenção. É
necessário olhar a vida para compreender
suas leis. Elas não vêm num livro. Nem mesmo
os da Montessori darão conta de tudo. Será
necessário olhar a criança que existe. A criança
que está lá. É ela, e só ela, que pode nos
mostrar para onde aponta a trilha da vida.
A atividade que ela acabou de fazer com algum
interesse, aquela a que ela tem retornado de
vez em quando ao longo dos últimos dias, a
outra que a absorveu completamente antes de
ontem. Todas essas são plaquinhas, à beira da
estrada, indicando as regras da vida. Qualquer
coisa que pedirmos, dissermos, exigirmos, terá
de estar em consonância com as regras da
vida, ou, por motivo de força maior, não
seremos obedecidos (ainda bem!).
Quando Montessori falava da obediência, falava
de uma criança que obedecia com alegria e
rapidez, profundamente disciplinada e senhora
de si. Essa criança só é assim porque está na
trilha da vida. Porque não se perdeu dela.
Porque não está desesperada para voltar, ou
para permanecer, no curso correto de seu
desenvolvimento. Aí, muito mais que a
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Quando Nossos
Filhos Sabem Mais
do que Nós
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Colocar e tirar as calças não é importante pelas
calças. É importante pelo colocar e tirar. Pelo
fato de que colocando e tirando alguma coisa se
constrói na criança, que vai além da habilidade
sofisticada de colocar e tirar calças. Quando a
criança faz isso repetidamente, constrói
concentração, persistência, habilidade de lidar
com frustração e percebe a si mesma
conforme existe no mundo por meio de suas
ações.
Montessori sugere de novo e de novo: Nunca
ajude uma criança em alguma coisa que ela
acha que pode fazer sozinha. Repare: o foco
dessa frase não está no pode fazer sozinha,
mas no acha. Se ela acredita em si, nós
respeitamos essa confiança, e é porque nós
respeitamos e não ajudamos que essa
confiança pode se construir e ganhar firmeza,
ajudar a superar obstáculos e adotar novos
desafios.
É sobre isso, sobre esse misterioso trabalho
interior, que a criança sabe muito mais do que
nós.
Se nós permitirmos, por um par de horas, por
um dia, que a criança aja sem nossa
interferência, a não ser em momentos de
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Como Transformei
Gritos em Sorrisos
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talvez, funcionasse se eu olhasse assim para
as minhas crianças, e eu decidi tentar.
Claramente, funcionava. É fácil perceber que
uma criança se comporta mal quando está
sofrendo. É óbvio o suficiente: ela sente dor,
então provoca dor. Mas uma coisa é entender
isso intelectualmente. O cérebro dava conta do
recado. Outra coisa é o coração. Ele demora. O
coração age por hábitos, e meu desafio era
mudar o hábito.
Na busca por maneiras de mudar o hábito,
esbarrei no Zen Habits. E lá dentro, em um texto
que começava com uma frase que mudaria
minha vida:
Respire, sorria e vá devagar.
A frase é do monge vietnamita Thich Nhat Hanh.
E eu tomei aquilo como a bússula de minhas
ações. Decidi que por um semestre seguiria
essa orientação em tudo, o tempo todo. E
comecei a respirar, a sorrir, a ir devagar. Até
que a primeira criança se comportou diferente
do que eu gostaria.
Respirar uma vez é fácil. Mas eu queria
respirar, sorrir e ir devagar todas as vezes.
Encurtando outra história longa, eu me via em
Crianças Obedientes Não Ficam Quietas – Lar Montessori
2. Estudo
• Leia, assista e converse sobre
desenvolvimento infantil;
• Leia, assista e converse sobre emoções
humanas;
• Leia, assista e converse sobre
sofrimento e felicidade.
3. Adote uma atitude
• Não tente mudar tudo de uma vez;
• Respire, sorria e vá devagar;
• Separe dois ou três minutos por dia só
para respirar, sem fazer nada;
• Quando não estiver irritada(o), observe
sua criança em paz;
• Tenha um local de refúgio - pode ser
uma janela, um cômodo, até o banheiro.
Um lugar para respirar.
• Atropele o que é urgente - não se deixe
iludir, poucas coisas são urgentes de
verdade, e quase nenhuma é mais
importante que a sua felicidade e a de
seus filhos, e a paz em sua casa.
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Se você também tem uma história sobre
transformar gritos em sorrisos, eu quero saber
qual é. Conte nos comentários. Se você ainda
está nos gritos, ou se está no pântano, você não
está sozinha(o), tem milhares de pessoas bem
intencionadas no mesmo pântano que você.
Vamos atravessar juntos, porque só assim vale
a pena.
Se você gostou deste texto, eu sugiro que você
procure por:
• A Arte da Felicidade, do Dalai Lama;
• Livros e vídeos do Thich Nhat Hanh;
• A Coragem de Ser Imperfeito, da Brené
Brown;
• Práticas de gratidão de
David Standahast;
• e leia os quatro ou cinco capítulos finais
do livro Mente Absorvente, de Maria
Montessori.
Crianças Obedientes Não Ficam Quietas – Lar Montessori
As Crianças
Obedecem Quem
Elas Admiram
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1. Primeiro Nível da Obediência
As crianças que estão no primeiro nível da
obediência obedecem de vez em quando, mas
não obedecem sempre. A obediência exige que
a criança abra mão do que ela gostaria de fazer,
para executar o que outra pessoa pediu. No
primeiro nível, a criança obedece quando a sua
vontade e a da pessoa que pediu são iguais, ou,
mais raramente, quando tem sucesso em
suplantar a sua vontade pela do outro.
É muito fácil para um adulto se incomodar com
a falta de constância na obediência da criança.
"Se ela consegue me obedecer de vez em
quando, por que não sempre? Ela só faz as
coisas quando quer!", é o que pensa o adulto. E
ele não sabe que está correto, mas que sua
raiva está mal colocada. Por enquanto, a
criança ainda não amadureceu o suficiente
para abrir mão de sua vontade pela vontade do
outro. Nesse período, precisamos ter paciência
e continuar a oferecer para ela um excelente
ambiente, um comportamento adulto paciente
e útil, e escolhas.
2. Segundo Nível da Obediência
O segundo nível da obediência me parece ser o
mais crítico de todos. Nele, a criança tem muito
mais sucesso em suprimir a sua vontade e
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chegam a esse ponto com suas crianças. Existe
um adulto que a criança gosta de obedecer.
A criança obedece com prazer os adultos que
ela admira. A obediência que a maioria dos
adultos conseguem vem da opressão, do medo,
da recompensa, ou da troca. Mas a obediência
que traz felicidade à criança não é essa. Ela
obedece feliz quando obedece porque admira.
Quem a criança admira?
O Adulto Admirável
O adulto que consegue compreender as
necessidades da criança, organizar para ela
um excelente ambiente, ter com ela um
comportamento elegante, cuidadoso, amoroso
e firme, que a ajuda a conquistar a própria
independência e que respeita sua necessidade
de trabalhar sozinha sem ser interrompida...
Esse é o adulto admirável. A criança olha para
esse adulto e pensa: "Ele é sábio. Ele me vê por
dentro. Se eu seguir o que ele pede, posso me
tornar alguém assim", e a criança obedece não
porque ela é menor e nós maiores, mas porque
nós somos fascinantes e ela deseja se
transformar em um adulto fascinante também.
Parar no segundo nível da obediência, como
quase todo mundo faz, leva a um mundo de
pessoas obedientes em excesso, que
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Vamos Esquecer os
Limites
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Algumas coisas não podem ser permitidas, é
claro. Não entregamos um facão a um bebê,
ainda que seu interesse seja enorme. Não
podemos permitir que nossas crianças puxem
as orelhas de um bicho de estimação, ainda que
isso pareça divertido, ou que belisquem a perna
de um colega, por mais frustrado que estejam.
Não se pode permitir que, intencionalmente, a
criança jogue copos e copos de vidro ao chão.
Mas à parte dessas poucas coisas que fazem
mal à criança, a outro ser vivo, ou ao ambiente,
não há muito que não possa ser permitido.
Por vezes, atitudes de nosso filhos nos
assustam. Algumas coisas que eles fazem
parecem tão inadequadas que precisam ser
impedidas. Pode ser vestir várias camisetas
uma sobre a outra, pode ser trocar de roupa
várias vezes seguidas, talvez seja abrir todas
as gavetas de um dos móveis da casa – ou de
um cômodo! – ou tirar todas as frutas da
fruteira. Fomos acostumados à interpretação
de que essas ações são impróprias, devem ser
interrompidas. Mas e se interpretássemos de
outra maneira?
E se, em lugar de impedir, nós observássemos.
Se, talvez, ensinássemos a fazer a mesma
coisa com um grau de refinamento maior, ou,
que, sabe, ensinássemos a criança a terminar
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autodisciplina, a perseverança... todas as
bases para o desenvolvimento da
personalidade e do caráter são lançadas pela
ação, pelo movimento e pela conquista da
independência.
Por isso, vale a pena que façamos o exercício
constante de esquecer os limites.
Principalmente os que se formaram dentro de
nós, e que não nos permitem ver a ação da
criança pelo que ela realmente é. Assim, pelo
esquecimento dos limites, abrimos uma nova
trilha para nossas crianças, desempenhando
um papel que se transforma também. Se antes
nós interrompíamos e ensinávamos, agora nos
tornamos companheiros e ajudantes da vida.
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Este texto foi baseado no texto Your Child
Learns from His Sorroundings, do livro “Maria
Montessori Speaks to Parents”, de Maria
Montessori.
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Geralmente, não sentimos raiva de repente.
Quase sempre, são gotas de incômodo, que se
acumulam, uma a uma, até tudo transbordar e
despejarmos nosso excesso de sentimentos
nos outros, fazendo com que eles também
venham a transbordar no futuro.
A chave de tudo o que este texto ensina é parar
nas primeiras gotas.
Quando você perceber que há uma gota caindo,
pare bem aí. Deixe ela cair, se for o caso, mas
pare bem aí. Um copo d'água, uma respiração
profunda, uma caminhada e uma parada na
janela ou na varanda. Dê-se trinta segundos
(dois minutos, se alguém puder olhar as
crianças), mas nesses trinta segundos, sinta o
ar nas suas narinas, a água na sua garganta ou
o vento no seu rosto. Então, pegue um papel e
uma caneta.
No papel, enumere uma lista em branco, assim:
1.
2.
3.
4.
5.
Em seguida, pense em uma coisa boa sobre seu
filho. Qualquer coisa. Anote na lista:
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É só isso. É simples assim, mesmo. O desafio
não é o exercício. O desafio é fazer. Parar nas
primeiras gotas, trinta segundos, enumerar a
lista, trinta segundos, e uma coisa boa de cada
vez. Respirar. Permitir as novas cinco gotas
boas.
Este exercício é o mais simples que conheço
para transformação de relações, e funciona
para nos relacionarmos com crianças ou com
adultos. O desafio é fazer. Quando está muito
difícil e eu demoro para achar cinco coisas,
aumento o número. Em um dia muito difícil,
cheguei a dezoito. Em dezoito gotas boas, eu
estava bem, e podia ficar em paz de novo.
A raiva não vai sumir da sua vida, nem a
decepção, a vergonha ou a tristeza. Mas se você
puder perceber nas primeiras gotas, e lembrar
de Cinco Coisas Boas, então haverá mais cinco
suportes para você ficar em pé de novo, sorrir
de novo, amar de novo. E esse amor não vai ser
só uma ideia. O amor vai ficar com você, nas
suas ações, mesmo quando não estiver tudo
bem.
Se você usou este exercício e foi útil para você,
por favor, leve adiante, divida com amigos,
parentes, até com seus filhos se eles já tiverem
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