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BRASIL. Lei 11.343 de 23 de agosto de 2006.

Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2004-2006/2006/lei/l11343.htm>.

Marina Vanelli1

Histórico

Oriunda do projeto de lei nº 115, cuja autoria é do Senado Federal, a


Lei de Drogas institui o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas e
regula a repressão às drogas, de um modo geral. O relatório do projeto destaca os
avanços com relação aos regramentos anteriores (Lei nº 6.368, de 1976 e Lei nº
10.409, de 2002), em especial a mudança de uma abordagem " médico-policial",
para um tratamento complexo relacionado com o bem-estar social, além de outros
aspectos. Menciona a distinção entre os criminosos e os usuários ou dependentes, e
entre aqueles, distingue o pequeno do grande traficante.

Princípios, Diretrizes e Objetivos que Permeiam as Políticas Públicas

Cita-se, a exemplo dos princípios regentes do Sisnad, presentes no


art. 4º: "o respeito aos direitos fundamentais da pessoa humana, especialmente
quanto à sua autonomia e à sua liberdade" e “o reconhecimento da intersetorialidade
dos fatores correlacionados com o uso indevido de drogas, com a sua produção não
autorizada e o seu tráfico ilícito". No que se refere aos objetivos, constantes no art.
5º, tem relevância "o reconhecimento da intersetorialidade dos fatores
correlacionados com o uso indevido de drogas, com a sua produção não autorizada
e o seu tráfico ilícito". Ainda no tocante aos aspectos estruturais da lei, o art. 19
estabelece que " as atividades de prevenção do uso indevido de drogas devem
observar" determinados princípios e diretrizes, a exemplo, do "reconhecimento do
uso indevido de drogas como fator de interferência na qualidade de vida do indivíduo
e na sua relação com a comunidade à qual pertence" e da "adoção de conceitos
objetivos e de fundamentação científica como forma de orientar as ações dos

1
Bacharel de Direito pela Unoesc. Aluna do Modulo I da Esmesc- Extensão de Itajaí.
serviços públicos comunitários e privados e de evitar preconceitos e estigmatização
das pessoas e dos serviços que as atendam".
Em que pese os tópicos supramencionados sejam cruciais, dois
dispositivos merecem uma atenção mais detida. São eles: o art. 28 e o art. 33.
O cerne do art. 28 está na expressão "consumo pessoal". Sobre tal
artigo o STF já se pronunciou no sentido de que ele não representa hipótese de
abolitio criminis e que houve apenas despenalização.2
O art. 33, caput, por sua vez trata do tráfico, com as suas formas
equiparadas no §1º. Já no §3º figura o chamado tráfico privilegiado e assim dispõe:
"oferecer droga, eventualmente e sem objetivo de lucro, a pessoa de seu
relacionamento, para juntos a consumirem". O entendimento da Corte Suprema é no
sentido para a proibição judicial de eventos públicos de defesa da legalização ou da
descriminalização do uso de entorpecentes ofende o direito fundamental de
reunião.3

Pontos para se debater, refletir e melhorar

Se os avanços são notáveis a partir da comparação da lei atual com


suas antecessoras, também é inegável que existem falhas que ainda precisam ser
sanadas. E os estudiosos de várias áreas não hesitam em apontá-las.
Felipe Martins4 considera que há uma violação ao princípio da
legalidade, uma vez que o rol das drogas lícitas ou não é estabelecido através de
uma portaria da ANVISA. Ele ainda ressalta que o fato de agentes de policia e
delegados decidirem quem é usuário ou traficante que gera muita injustiça, tornando
a política de repressão é um fracasso. Segundo sua opinião, ter a saúde pública
como bem jurídico tutelado pela lei de drogas evidencia atitude demagógica do
Estado. Ao tratar da internação compulsória, que volta e meia entra na pauta de
discussão, fere os direitos dos dependentes e os deveres dos profissionais de
saúde, como por exemplo, o dever de guardar sigilo. É radical ao afirmar que o
Estado lucra com o dinheiro do tráfico, caso contrário ele já teria acabado. Finaliza

2
RE 635.659, de São Paulo.
3
ADI 4274
4
Advogado. Palestra: Dependência Química e Lei de Drogas- EMERJ.Disponível
em:<https://www.youtube.com/watch?v=VI_rFRcCSxY>.
sua explanação com a advertência de que o direito penal, no que se refere às
drogas, vem sendo usado como primeira racio.
Chamando atenção para a história das drogas, Tiago Luís5 relata
que “o racismo, a discriminação e o preconceito orientam a política antidrogas desde
o seu início. As drogas não foram criminalizadas por conta de seu potencial lesivo,
mas sim por causa de determinados grupos sociais que utilizavam essas drogas”.
Nas palavras de Rubens Roberto Casara6, o proibicionismo presente
na lei de drogas é incompatível com políticas públicas que visem a manutenção de
uma vida digna.

Conclusão

Por tudo o que foi exposto, fica evidente que se trata de lei um tanto
vaga, fato que dificulta a sua eficácia. Inspirada em ideologias ainda muito
arraigadas ao senso comum negativo e difundidas por quem detém o poder, seja
político ou midiático, a mudança real se torna um processo difícil.
O leigo diz que o usuário é bandido e que sustenta o tráfico. O
combate ao tráfico é tratado como heroico pelos programas sensacionalistas.
Exerce-se a desinformação da população. Com esse conjunto de fatores, o que
realmente importa fica em segundo plano. Debates que poderiam gerar soluções
são abafados.
A regulação da produção e da venda pelo Estado, poderia se
mostrar mais efetiva que a repressão. Os que sofrem com o uso e o abuso
problemático das drogas contrariam com uma rede de proteção mais eficiente e
condizendo com os parâmetros basilares do Sistema Nacional de Políticas Públicas.
A dinâmica da lei permite que pessoas sem o preparo necessário
enquadre no tipo penal de tráfico, aquilo que poderia ser tido como uso, amparado
pela multiplicidade de verbos presentes no art. 33. Isso acaba afetando de
sobremaneira o sistema carcerário.

5
Delegado. Palestra: Drogas: Legalização mais controle. Disponível
em:<https://www.youtube.com/watch?v=hLIuRPANOnU>.
6
Juiz de Direito.Drogas: dos perigos da proibição à necessidade de legalização. Disponível em:<
https://www.youtube.com/watch?v=78vDG4IiXGY>.
No plano de fundo da lei está um ranço de exclusão velada, que
autoriza a perpetuação do status quo. Uma rotulação disfarçada que divide o mundo
entre bons e maus. Uma guerra autorizada, estatizada e sem propósito.

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