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HAITI:VLJQL¿FDGRKLVWyULFRUHDOLGDGHHSHUVSHFWLYDV
Resumo: 2WH[WRDQDOLVDRVLJQL¿FDGRKLVWyULFRVRFLDOHHFRQ{PLFRGRVDQRVGDRFXSDomRPLOLWDUGR+DLWLSHODVWURSDV
da Organização das Nações Unidas (ONU) em relação às condições de vida e soberania do povo haitiano. Para isso,
UHFRUUHDDVSHFWRVTXHPDUFDUDPDKLVWyULDGHVVHSDtVTXHQRDQRGHVHOHYDQWRXFRQWUDRSUHVVmRHDH[SORUDomR
OLYUDQGRVH GD HVFUDYLGmR H SRVWHULRUPHQWH HP FRQWUD R GRPtQLR IUDQFrV 'HPDUFD TXH VRE D OLGHUDQoD GH
ToussaintL’Ouverture e Dessalines, os jacobinos negros realizaram a primeira revolução negra de escravizados vitoriosa
na história da humanidade. Apresenta a trajetória política de motins, golpes e assassinatos de lideranças no contexto da
VLWXDomRHFRQ{PLFDHGHFRQVWLWXLomRGDVFODVVHVVRFLDLVTXHGL¿FXOWRXQR+DLWLDFRQVWUXomRGHXP(VWDGRGHPRFUiWLFR
UHVVDOWDQGR R SDSHO GRV 'XYDOLHU 'HVWDFD DLQGD R SDSHO PDLV UHFHQWH GDV OXWDV TXH FRORFDUDP$ULVWLGH H 3UpYDO QR
SRGHUPDVTXHSHUPDQHFHUDPFRPSROtWLFDVVXEVHUYLHQWHVDRV(8$TXHLQYDGLUDPRSDtVHPYiULRVPRPHQWRVGHVXD
KLVWyULD3RU¿PRWH[WREXVFDFRPSUHHQGHURVLJQL¿FDGRGDRFXSDomRPLOLWDUSHODVWURSDVGD0LQXVWDKFRPDQGDGDSHOR
H[HUFLWREUDVLOHLURTXHUHVSRQGHQGRDLQWHUHVVHVHFRQ{PLFRVLPSHULDOLVWDVDFLUURXDVFRQGLo}HVVRFLDLVGHSDXSHULVPR
aprofundadas com o terremoto de 2010.
Palavras-chave: Haiti, ONU, Brasil, ocupação militar, superexploração.
HAITI:KLVWRULFDOVLJQL¿FDQFHUHDOLW\DQGSHUVSHFWLYHV
Abstract:7KHSDSHUDQDO\]HVWKHKLVWRULFDOVRFLDODQGHFRQRPLFVLJQL¿FDQFHRI\HDUVRIPLOLWDU\RFFXSDWLRQRI+DLWL
by the troops of the United Nations - UN, to living conditions and sovereignty of the Haitian people. For this, it uses
the historical aspects that marked the history of this country, which in 1793 rose against oppression and getting rid of
exploitation of slavery and, later, in 1891, against French rule. Mark that, under the leadership of Toussaint L'Ouverture and
'HVVDOLQHVWKH%ODFN-DFRELQVKHOGWKH¿UVWEODFNHQVODYHGYLFWRULRXVUHYROXWLRQRIWKHKLVWRU\,WEULQJVSROLWLFDOWUDMHFWRU\
of riots, coups and assassinations of leaders that Haiti faced in the context of the economic situation and constitution of
social classes, which hindered the establishment of a democratic state, stressing the role of Duvalier. Also highlights the
more recent role of the struggles that put Aristide and Preval in power, but who remained subservient to US policies that
have invaded the country for several moments in its history. Finally, seeks to understand the meaning of military occupation
by the troops of MINUSTAH, headed by the Brazilian army, responding to imperialist economic interests, which incited
VRFLDOFRQGLWLRQVRISDXSHULVPGHHSHQHGZLWKWKHHDUWKTXDNH
.H\ZRUGV Haiti, UN, Brazil, occupation military, superexploração.
,1752'8d2 $UDXDTXHVWDLQRVFDUDtEDVVRFLHGDGHV
inteiras pagaram por aventura atroz.
Em 1º de junho de 2004 aportaram em Porto
Príncipe as tropas da MINUSTAH (United Nations A busca pelo lucro, por rotas comerciais
Stabilization Mission in Haiti), coordenadas pelo vantajosas na África e na Ásia, a cristianização
Exército Brasileiro. Em 2014 completou dez anos de povos não-europeus marcou decisivamente
de ocupação militar e em 15 de outubro o Brasil D FRQTXLVWD GD $PpULFD 0RWLYRV HFRQ{PLFRV H
renovou o mandato da MINUSTAH na ONU. Nesses religiosos se misturavam com muita desenvoltura e
DQRVRTXHSURVSHURX"4XDODFRODERUDomRSDUD sem estranhamento.
a melhoria das condições de vida do povo haitiano?
O desejo do lucro, a cobiça, foi sem
$SyV R WHUUHPRWR TXH PDWRX FHUFD GH PLO
dúvida um dos motores da expansão:
SHVVRDV HP TXDO D VLWXDomR GD SRSXODomR" o dinheiro é o nervo das empresas,
Quais os interesses em torno da ocupação militar constatou, já no século XVI, o texto
QR+DLWL"4XDORVLJQL¿FDGRKLVWyULFR"(VVHGHEDWH português Jornada del rei D. Sebastião
VH LPS}H SHOD QHFHVVLGDGH GH R PXQGR UHÀHWLU H às partes da África. (AMADO;
analisar, do ponto de vista da soberania nacional, FIGUEIREDO, 1999, p. 14).
da solidariedade internacional ao povo haitiano
TXHUHDOL]RXDSULPHLUDUHYROXomRGHHVFUDYL]DGRV *UX]LQVNLGL]TXHHVVHSHUtRGRPDUFD
vitoriosa, e atualmente é o povo mais empobrecido o nascimento da Globalização.
das Américas. Marx (2013, p. 820) não tergiversa sobre
D IXQomR GD FRQTXLVWD GD $PpULFD H GR WUi¿FR GH
+$,7,VLJQL¿FDGRKLVWyULFROXWDVHSHUVSHFWLYDV HVFUDYL]DGRVHD¿UPDRVHJXLQWH
eSLFD RX WUiJLFD FRPR UHÀHWH *RUHQGHU A descoberta das terras auríferas e
(2004), símbolo do racismo da civilização ocidental argentíferas na América, o extermínio,
FRPR D¿UPD *DOHDQR RX LQVtJQLD GH a escravização e o soterramento da
população nativa nas minas, o começo
resistência da população negra como sustenta o
GD FRQTXLVWD H VDTXHLR GDV ËQGLDV
movimento negro brasileiro, a história do Haiti é
Orientais, a transformação da África
HPEOHPiWLFD GR SURFHVVR KLVWyULFR GH FRQTXLVWD numa reserva para a caça comercial de
exploração e escravização dos povos dos países SHOHVQHJUDVTXHFDUDFWHUL]DPDDXURUD
latino-americanos por parte das potências da era da produção capitalista. Esses
econômicas mundiais, bem como da luta contra processos idílicos constituem momentos
essas ações de dominação. Por isso, a história do fundamentais da acumulação primitiva.
Haiti é tão representativa para a história do Brasil >@QD,QJODWHUUDQR¿PGRVpFXOR;9,,
HVXDVFRQH[}HVVmRPDLVtQWLPDVGRTXHDPDLRU esses momentos foram combinados
parte da população brasileira a concebe. de modo sistêmico, dando origem ao
Além disso, como informa Grondin (1985) o sistema colonial, ao sistema da dívida
pública, ao moderno sistema tributário e
Haiti é um país negro e africano por excelência, o país
ao sistema protecionista. Tais métodos,
do vodu, do tambor, do créole, mas essencialmente
como por exemplo, o sistema colonial,
o país da primeira revolução nas colônias do Sul e a baseiam-se, em parte, na violência mais
primeira república negra do mundo. brutal.
Tratando-se de uma das primeiras regiões
FRQTXLVWDGD H FRORQL]DGD QD HUD PRGHUQD SHORV No Capital, Marx (2013, p. 823) deixa claro
europeus, o Haiti - integrante das ilhas caribenhas - TXHRWUDWDPHQWRGLVSHQVDGRDRVSRYRVDPHULFDQRV
desde cedo experimentou o genocídio e o etnocídio HDIULFDQRVDSyVDFRQTXLVWDGRVHXURSHXV
das populações autóctones e, também, após o
extermínio destas, a escravização dos africanos. >@HUDQDWXUDOPHQWHRPDLVWHUUtYHOQDV
&RPRD¿UPD*UX]LQVNLSHPUHODomRjV plantações destinadas exclusivamente à
Antilhas: exportação, como nas Índias Ocidentais
e nos países ricos e densamente
>@ p FRQKHFLGD D VpULH GH GHVJUDoDV povoados, entregues à matança e ao
TXH HQIUDTXHFHP H GHSRLV GL]LPDP VDTXHLR FRPR R 0p[LFR H DV ËQGLDV
os autóctones: epidemias e Orientais.
subalimentação, massacres e maus-
tratos, exploração desenfreada dos
sobreviventes, destruição do meio E continua ironizando a ética cristã e
ambiente e dos modos de vida SXULWDQD TXH GLVFXUVDYD VREUH R DPRU D 'HXV DR
tradicionais, deportações maciças. A PHVPR WHPSR HP TXH QD VXD FRQWULEXLomR DR
passagem de um século a outro será processo de dominação colonial, matava índios -
QDV LOKDV XP LQIHUQR TXH MRJDUi QR
nada civilizações e gerações indígenas.
homens, mulheres e crianças, indiscriminadamente.
No século XVI, a África Central era um Essa era a intenção dos colonizadores:
território de paz e as suas civilizações
H[SORUDU DV ULTXH]DV QDWXUDLV GHVGH RV PLQpULRV
eram felizes. Os comerciantes viajavam
PLOKDUHV GH TXLO{PHWURV GH XP ODGR (ouro, prata, etc.), especiarias, borracha etc.
a outro do continente sem serem passando pela monocultura do algodão, açúcar,
PROHVWDGRV$VJXHUUDVWULEDLVGDVTXDLV café, recorrendo à força de trabalho escravizada
RVSLUDWDVHXURSHXVD¿UPDYDPOLEHUDUDV indígena e africana. Moura (1994, p. 25), analisando
pessoas, eram meros simulacros; sobre
a situação dos escravizados destaca as condições
um campesinato, em muitos aspectos,
opressivas, de não ser dono do seu próprio corpo,
portanto, de não poder locomover-se livremente, e seu território. Para os europeus a Revolução Haitiana
DJLU FRPR DJHQWH SURGXWRU TXH FULDYD PHUFDGRULD representou uma humilhação imperdoável. Os ex-
colocando nela valor, escravizados da colônia francesa demonstraram na
SUiWLFD R TXH HUD DSHQDV R GLVFXUVR GH OLEHUGDGH
>@ R HVFUDYR FLUFXODYD FRPR igualdade e fraternidade da burguesia da França.
PHUFDGRULD LGrQWLFD jTXHOD D TXDO HOH
próprio produzia. E é nesse nível de (QTXDQWR HP 3DULV D JXLOKRWLQD
UHODo}HV HFRQ{PLFDV TXH R HVFUDYR p decepava as cabeças do jacobinos,
VRFLDOPHQWHFRLVL¿FDGR em São Domingos Dessalines e
seus companheiros continuavam a
Em 1697 a parte ocidental da Ilha - o Haiti defender, de armas na mão, o ideal
jacobino da liberdade e igualdade de
TXH HUD FRQWURODGD SHOD (VSDQKD SRU PHLR GR todos os homens. Eles, os jacobinos
SURFHVVR GH FRQTXLVWD IRL SDVVDGD SDUD R GRPtQLR QHJURV SHUPDQHFLDP ¿pLV DR HVStULWR
francês, tornando-se, no século XVIII e início do XIX, revolucionário da Convenção de
a colônia francesa mais próspera economicamente, 1789. A 29 de novembro de 1803, os
produzindo e exportando açúcar, anil, café, cacau, revolucionários negros divulgaram
uma declaração preliminar de
algodão, entre outros produtos; com uma população Independência. A 31 de dezembro, foi
HVFUDYL]DGDGHPDLVGHTXLQKHQWRVPLOHVFUDYL]DGRV lida a Declaração de Independência
a maioria africanos. O controle do Haiti, nesse GH¿QLWLYD 2 QRYR (VWDGR UHFHEHX QR
período, era realizado por apenas alguns milhares batismo, a denominação indígena de
de proprietários brancos e seus capatazes. Haiti. (GORENDER, 2004, p. 300).
1R HQWDQWR HQTXDQWR HFORGLD D 5HYROXomR
Francesa de 1789 na Europa, no Haiti os Acerca dos líderes revolucionários, os
escravizados iniciavam um grande movimento em MDFRELQRVQHJURV&/5-DPHVSD¿UPD
busca de sua liberdade e da fundação de um país
livre e independente. Sob a liderança de Toussaint >@ ¿TXHL FRQYHQFLGR GH TXH QHQKXP
comandante miliar, ou estrategista,
L’Ouverture, a partir de 1791, os escravizados afora o próprio Napoleão, entre os anos
abandonam as plantations e matam os seus de 1793 e 1815, superou Toussaint
proprietários iniciando o processo de independência L’Ouverture e Dessalines.
da França.
Nas palavras de C. L. R. James (2010, p. Não obstante, após 1789, os revolucionários
15): IUDQFHVHV WHUHP GHFUHWDGR R ¿P GD HVFUDYLGmR
em seus territórios, não teve validade para a
Em agosto de 1971, passados dois VXD FRO{QLD QDV $QWLOKDV 1R GHFRUUHU GR FRQÀLWR
anos da Revolução Francesa e dos
VHXV UHÀH[RV HP 6mR 'RPLQJRV RV
contra a França a terra foi arrasada e um terço da
escravos se revoltaram. Em uma luta SRSXODomRDQLTXLODGD$SyVDJXHUUDQmRSRUDFDVR
TXH VH HVWHQGHX SRU GR]H DQRV HOHV HPSUHHQGHXVH XP EORTXHLR VDQJXLQiULR DR PDLV
derrotaram, por sua vez, os brancos UHFHQWHSDtVDXW{QRPRHOLYUHGD$PpULFDTXHQmR
ORFDLV H RV VROGDGRV GD PRQDUTXLD foi poupado nem por Simón Bolívar. Destruído pela
francesa de semelhantes dimensões guerra, com a população drasticamente reduzida, a
comandada pelo cunhado de Bonaparte.
A derrota da expedição de Bonaparte,
economia absolutamente desestruturada, a primeira
em 1803, resultou no estabelecimento de 5HS~EOLFDQHJUDGD$PpULFDWHYHPXLWDVGL¿FXOGDGHV
(VWDGR QHJUR GR +DLWL TXH SHUPDQHFH em manter a estabilidade política e, dessa forma, foi
até os dias de hoje. palco de uma série de ocupações e golpes militares
Essa foi a única revolta de escravos TXHFRQWULEXtUDPSDUDID]HUGR+DLWLXPGRVSDtVHV
bem sucedida da História, e as mais pobres do mundo (GALEANO, 2010, 1989;
GL¿FXOGDGHV TXH WLYHUDP GH VXSHUDU
colocam em evidência a magnitude dos
GORENDER, 2004).
interesses envolvidos. A transformação Várias potências europeias e os Estados
GRVHVFUDYRVTXHPHVPRjVFHQWHQDV Unidos da América (EUA) passaram a disputar o
tremiam diante de um único homem FRQWUROHGDH[FRO{QLDIUDQFHVDHTXHHQTXDQWRSDtV
branco, em um povo capaz de organizar independente não conseguia se livra da dependência
e derrotar as mais poderosas nações HFRQ{PLFD H GRV FRQÀLWRV LQWHUQRV SHOR SRGHU
HXURSHLDV GDTXHOHV WHPSRV p XP GRV
grandes épicos da luta revolucionária e Dessa forma, de 1915 até 1934 os EUA ocuparam
uma verdadeira façanha.
e governaram o Haiti com o intuito de fazer valer
o controle das plantations e do canal do Panamá
nas mãos do grande capital. Um alto funcionário
Em 1803-1804, derrotando as tropas de
GRJRYHUQRDPHULFDQRQmRH[LWRXHPMXVWL¿FDUHVVD
Napoleão Bonaparte, os haitianos formaram a
dominação por meio do discurso racista segundo o
primeira nação livre das Américas, pois apesar de os
TXDODSRSXODomRQHJUDQmRHVWDULDSUHSDUDGDSDUD
(8$ WHUHP FRQTXLVWDGR VXD LQGHSHQGrQFLD DQWHV
se autogovernar, pois prevaleceria a incapacidade
ainda conviviam com a escravidão em boa parte do
para a civilização (GALEANO, 2010).
De certa forma, como devir histórico, portos, aeroportos, saúde e telefonia. Aí encontra-
a revolução negra haitiana vingou o infortúnio VHDVMXVWL¿FDWLYDVSDUDDRFXSDomRPLOLWDUGH
DIULFDQR GRV TXH IRUDP OHYDGRV j GD PLVpULD GR pelas tropas da Organização das nações Unidas
WUi¿FR QHJUHLUR H GD HVFUDYLGmR ( LVVR D KLVWyULD (ONU), aprovada pelo Conselho de Segurança.
dos escravocratas não podia suportar. O Haiti paga Em meio à crise estrutural do capital e às
até hoje pela ousadia. A represália econômica dos sucessivas crises conjunturais, em tempos cada vez
países onde ainda vigia a escravidão, a pesada dívida mais curtos, a estratégia dos capitalistas através das
externa imposta pela França, a devastação das novas formas de gestão e organização do trabalho
ÀRUHVWDVHPSREUHFLPHQWRGRVRORSHODPRQRFXOWXUD (reestruturação produtiva), do neoliberalismo,
OHYDUDPRSDtVDXPDVLWXDomRDRHQIUDTXHFLPHQWR é vital para o sistema a superexploração do
H JUDQGHV GL¿FXOGDGHV$V OXWDV LQWHUQDV H JXHUUDV trabalho, inclusive a descentralização da produção
civis geraram situações de grande estabilidade, com e da exploração da força de trabalho em níveis
motins e golpes de Estado. Após a revolução e ainda GH VHPLHVFUDYLGmR 1HVVH VHQWLGR p TXH VH SRGH
no século XX, o Haiti conviveu constantemente com compreender a conjuntura atual do Haiti. Almeida
golpes e assassinatos de governantes. GHQXQFLD DV FRQVHTXrQFLDV GHVVD SROtWLFD
dos EUA para o Haiti.
No século XX os protagonistas
mudaram, mas não a realidade de $WXDOPHQWH R GRPtQLR LDQTXH GD
pilhagem e miséria. Em plena ascensão HFRQRPLD KDLWLDQD p TXDVH DEVROXWR
imperialista, os EUA passaram a 89% das importações e 65% das
considerar a América Central e o exportações se realizaram com os EUA
&DULEHFRPRRVHX³TXLQWDO´DWUDYpVGD TXHDOLDGRFRPXPDSHTXHQDROLJDUTXLD
implementação da politica do “Big Stick” mestiça (menos de 5% da população) e
(grande tacão), sintetizada numa frase branca (pouco menos de 1%) oprimem e
do presidente Monroe: “A América para exploram a imensa maioria negra.
os americanos” e concretizada através Nas ultimas décadas, à tradicional
da invasão de vários países da região. produção de café, rum e tabaco, foram
(ALMEIDA, 2011, p. 27, grifo do autor). agregadas também indústrias de vestido
H GH EULQTXHGRV SDUD H[SRUWDomR
&RPR WHUULWyULR VRE R GRPtQLR H LQÀXrQFLD FRPR PDTXLODGRUDV QDV FKDPDGDV
norte-americana o Haiti foi palco de uma série de “zonas livres” de Porto Príncipe. Nelas
as empresas multinacionais pagam
JRYHUQRV DXWRULWiULRV TXH WHYH HP -HDQ )UDQoRLV salários de fome e ganham fortunas. O
Duvalier (o Papa Doc) o seu mais célebre TXH HVWi HP FXUVR p D LPSOHPHQWDomR
representante. GH XP SODQR HFRQ{PLFR QR +DLWL TXH
pagam salários de fome e ganham
Para se manter no poder, Duvalier fortunas. Para isso foi, foi aplicado um
submeteu o país à hegemonia norte- acordo de livre comercio por meio por
americana no Caribe: fez do Haiti meio da lei HOPE (Haitian Opportunity
um satélite incondicional do país do for Economic Enhancement), aprovada
Norte, chegando inclusive a vender- pelo congresso dos EUA. A lei abre
lhe seu voto – decisivo – na reunião da WRGDV DV EDUUHLUDV SDUD TXH RV GRLV
Organização dos Estados Americanos países possam realizar intercâmbios
TXHH[FOXLULD&XEDGD2($>@ comerciais livres sem pagar taxas
E com o apoio do governo americano, DOIDQGHJiULDV RX PHVPR TXDOTXHU
instalou no país um regime de terror. WD[D TXH R (VWDGR SRVVD FREUDU VREUH
(GRONDIN, 1985, p. 48). DV PHUFDGRULDV RX TXH WUDYH VXD OLYUH
circulação. (ALMEIDA, 2011, p.26, grifo
do autor)
$SyV D TXHGD GD GLWDGXUD 'XYDOLHU DV
lutas por democratização se seguiram e em 1990,
Descortinando a cena, revela-se a
elegeram, Jean-Bertrand Aristide, com 67% dos
perversidade da missão: diante da crise estrutural do
votos, ex-padre defensor da Teologia da Libertação.
FDSLWDOLVPRQDTXDOKiXPDJXHUUDHQFDUQLoDGDSRU
Entretanto, Aristide foi deposto sete meses depois
mercados, as tropas asseguram a segurança das
SRU XP JROSH PLOLWDU TXH UHVXOWRX QD PRUWH GH
HPSUHVDV PXOWLQDFLRQDLV TXH VH LQVWDODP QR SDtV
cinco mil pessoas. O imperialismo estadunidense,
para garantir a superexploração da força de trabalho
através do presidente Bill Clinton, propôs acordo
mais barata das Américas, principalmente nas 18
para derrubar a ditadura, com o retorno de Aristide
]RQDV IUDQFDV TXH HVWmR VHQGR LQVWDODGDV TXH
à presidência, e invade o país novamente em 1994,
tem como principais norte-americanas. Condições
sob a condição da aplicação do neoliberalismo.
ideais para os capitalistas, péssimas condições de
René Préval, eleito e apoiado por Aristide, foi
trabalho e de salários. Salário mínimo menos de 110
o responsável por conduzir o processo, realizando
dólares por mês, jornada de trabalho de até 12h/dia,
privatização de estatais, derrubando as barreiras
sem nenhum direito respeitado, como por exemplo
alfandegárias e elaborando um projeto com 18 zonas
pagamento de rescisões de contratos. Nesse sentido
francas no país. Em 2006 anunciou a privatização de
TXHHPKRXYHXPDLPSRUWDQWHOXWDSHORVDOiULR
mínimo de 200 gourds. A pobreza é lucrativa para Em meio a sucessivas crises intra-
os imperialistas. Por seu turno, Préval cumpre o burguesas, mobilizações e pressões populares
papel de um governo títere dos EUA, aceitando contra as medidas neoliberais, o Haiti foi invadido
incondicionalmente os ditames neoliberais. Almeida por tropas de vários países sob a bandeira da ONU
(2014) analisa a exploração do trabalho no Haiti com e devido à situação internacional, das guerras no
a implantação das multinacionais. Oriente Médio conduzidas pelo governo Bush, o
comando da MINUSTAH coube ao Brasil.
Essas multinacionais podem produzir Nesse aspecto, cabe de início um
no Haiti, pagando duas vezes menos
DRVWUDEDOKDGRUHVTXHQD&KLQDDXPD TXHVWLRQDPHQWR TXDQWR DR SDSHO TXH FXPSUH R
distância da costa dos EUA doze vezes Brasil nesta ocupação militar. Em primeiro lugar,
menor. Podem pagar três vezes menos a subserviência do país aos interesses e ditames
TXH DRV WUDEDOKDGRUHV EUDVLOHLURV D estadunidense, aceitando colocar tropas militares
XPD GLVWkQFLD TXDVH VHLV YH]HV PHQRU
num país empobrecido. Em segundo lugar, o papel
da costa dos EUA.
Nas fábricas existe uma organização do TXH XP JRYHUQR RULXQGR GD WUDGLomR GD HVTXHUGD
trabalho moderna, os módulos. Grupos brasileira aceita cumprir esse papel abjeto, passando
de trabalhadores fazem, por exemplo, SRU FLPD GD VREHUDQLD GDTXHOH SDtV Utilizando-
uma camisa, com cada um fazendo se das relações amistosas Brasil/Haiti, levando
uma parte. Como ganham por tarefa,
se impõe a disciplina do patrão pelos o futebol brasileiro, através da seleção, amada
SUySULRV WUDEDOKDGRUHV TXH FREUDP pelos haitianos, escondem os reais objetivos, nada
TXDOTXHUXPTXHVHDWUDVH QREUHV1R%UDVLODLGHLDGLYXOJDGDpTXHHVWiHP
$V IiEULFDV Wr[WHLV WrP SHTXHQD missão de paz, solidariedade e desenvolvem ações
exigência de capacitação tecnológica humanitárias.
SDUD D PmR GH REUD R TXH WRUQD
desnecessário investir em educação Do total dos recursos destinados à missão
pública e formação técnica. As militar, 85% é consumido pelos militares e polícias.
HPSUHVDV QmR SDJDP XP VDOiULR TXH Há denúncias até de comandantes brasileiros da
corresponda ao valor necessário para missão sobre a opressão e repressão ao povo
reprodução normal da mão de obra. haitiano, a exemplo, as denúncias de massacres
Os haitianos podem morrer jovens,
FRPRRVHVFUDYRVSRUTXHVmRPmRGH em Cité Soleil, os assédios, prostituição e estupros
obra barata e abundante, fácil de ser às mulheres, inclusive menores etc. Em 2007, 108
substituída. As empresas têm a sua soldados das tropas do Sri Lanka foram expulsos do
disposição um exército industrial de SDtVRTXHGHXYLVLELOLGDGHjTXHVWmRSRUpPQDGD
reserva de 80% de desempregados. Se garante as punições.
XPWUDEDOKDGRU¿FDUGRHQWHQmRJDQKD
nada. Se morrer, pode ser substituído de Esse processo histórico de dominação
imediato por outro haitiano faminto. imperialista na formação do Haiti conduziu o país
As multinacionais não pagam nenhuma a situação econômica, política e social dramática.
GDV FRQTXLVWDV GRV VpFXORV ;,; H ;; Com 8,1 milhões de habitantes, 80% vivem abaixo
como férias, décimo terceiro salário, da linha da pobreza, 75% das moradias não
aposentadoria. Não pagam praticamente
QHQKXPLPSRVWRDRHVWDGRTXHSRUVXD possuem saneamento básico (esgoto, coleta de lixo,
vez não precisa assegurar saúde nem água potável), 80% estão desempregados, 58% da
educação ao povo. Os trabalhadores população é subnutrida, 45% analfabetos, renda per
moram ao lado das empresas, podendo capta 15% da média dos países latino americanos.
ir a pé para o trabalho. Se alguém morar Correu o mundo as imagens das bolachas de terra
longe, vai a pé assim mesmo. Os bairros
não têm rede de esgotos ou água (manteiga, açúcar, água e terra), demonstrando a
potável, menos ainda energia elétrica. VLWXDomR GD IRPH TXH YLYHP 2 SDtV RFXSD R
A situação do proletariado haitiano pode no ranking do Índice de Desenvolvimento Humano
ser comparada a dos antigos escravos. (IDH), num total de 186 países (dados de 2015).
Na verdade, em termos econômicos tem Não obstante essa situação, em 2010 o
aspectos ainda piores. Um estudioso
Haiti foi atingido por um terremoto de magnitude 7
haitiano fez uma comparação incrível:
HVWXGRX RV JDVWRV TXH RV ID]HQGHLURV na escala RichterTXHPDWRXPLOSHVVRDV
tinham com os escravos no passado e os mil feridos e 1 milhão de desabrigados, deixando o
TXHRVEXUJXHVHVWrPFRPRVRSHUiULRV país devastado.
QR +DLWL KRMH &KHJRX j FRQFOXVmR TXH
os escravos custavam mais. &21&/862
$LQGD TXH GH IRUPD EUXWDO D FODVVH
GRPLQDQWHGRSDVVDGRWLQKDTXHVHID]HU
responsável da moradia, alimentação e Após 10 anos de ocupação militar e 5 anos
VD~GH GRV HVFUDYRV R TXH KRMH QmR p DSyV R WHUUHPRWR QR +DLWL TXH DSURIXQGRX DLQGD
cobrado das multinacionais no Haiti. A PDLVDPLVpULDQRSDtVQRPRPHQWRHPTXHGHEDWH
EXUJXHVLD QR +DLWL QmR WrP VHTXHU RV se a renovação da permanência da MINUSTAH no
gastos mínimos dos donos de escravos
SDtV p QHFHVViULR TXH RV EUDVLOHLURV HQWLGDGHV
do passado, em pleno século XXI.
(ALMEIDA, 2011, p. 28). PRYLPHQWRV UHÀLWDP H RSLQHP VREUH DV WURSDV