O IMPÉRIO E AS PRIMEIRAS TENTATIVAS a Assembléia Legislativa aprovou a primeira lei sobre
DE a instrução pública nacional do Império do Brasil,
ORGANIZAÇÃO DA EDUCAÇÃO NACIONAL estabelecendo que “em todas as cidades, vilas e (1822-1889) lugares populosos haverá escolas de primeiras letras que forem necessárias” Maria Isabel Moura Nascimento[1] A mesma lei estabelecia o seguinte: os presidentes de província definiam os ordenados dos Este período histórico foi determinado professores; as escolas deviam ser de ensino mútuo; pelas transformações ocorridas no século XVIII os professores que não tivessem formação para desencadeadas a partir da Revolução Francesa ensinar deveriam providenciar a necessária (1789) e da Revolução Industrial iniciada na preparação em curto prazo e às próprias custas; Inglaterra, que abriram o caminho para o avanço do determinava os conteúdos das disciplinas; devem ser capitalismo para outros paises. No início do século ensinados os princípios da moral cristã e de doutrina XIX, a hegemonia mundial inglesa na área econômica da religião católica e apostólica romana; deve ser amplia-se com a conquista de novos mercados. A dada preferência aos temas, no ensino de leitura, França, por outro lado, sob o comando de Napoleão sobre a Constituição do Império e História do Brasil. Bonaparte, passava a lutar pelo domínio de outros Os relatórios do Ministro do Império Lino países, inclusive Portugal. Em 1808, a família real Coutinho de 1831 a 1836 denunciaram os parcos portuguesa transferiu-se para o Brasil, para fugir do resultados da implantação da Lei de 1827, mostrando ataque francês. A presença da corte portuguesa no o mau estado do ensino elementar no país. Brasil, com todo o seu aparato, propiciou o Argumentava que, apesar dos esforços e gastos do desencadeamento de transformações na Colônia. Estado no estabelecimento e ampliação do ensino Neste processo, foram abertos os portos brasileiros elementar, a responsabilidade pela precariedade do ao comércio exterior acabando com o monopólio ensino elementar era das municipalidades pela português. Para suprir as carências oriundas do longo ineficiente administração e fiscalização, bem como período colonial foram criadas várias instituições de culpava os professores por desleixo e os alunos por ensino superior, “com a finalidade estritamente vadiagem. Admitia, no entanto, que houve abandono utilitária, de caráter profissional, visando formar os do poder público quanto ao provimento dos recursos quadros exigidos por essa nova situação.” (WEREBE, materiais, como os edifícios públicos previstos pela 1994). Assim, foram criados diversos cursos de nível lei, livros didáticos e outros itens. Também apontava superior: na Academia Real da Marinha (1808), o baixo salário dos professores; a excessiva Academia Real Militar (1810), Academia Médico- complexidade dos conhecimentos exigidos pela lei e cirúrgica da Bahia (1808) e Academia Médico- que dificultavam o provimento de professores; e a cirúrgica do Rio de Janeiro (1809). inadequação do método adotado em vista das Após três séculos de domínio político e condições particulares do país. exploração econômica do Brasil por parte de Podemos observar, nos relatórios do Portugal, que manteve durante todo o período ministro, que o entusiasmo inicial com a instrução colonial uma posição parasitária em relação à popular esbarrava não somente nas condições reais produção brasileira, com o novo contexto da do país, mas no discurso ideológico do governo que economia mundial, de expansão do capitalismo, que dizia estar preocupado em levar a instrução ao povo, impunha uma nova postura dos paises em relação à sem providenciar, todavia, os recursos para criar as produção e a comercialização, já não era possível condições necessárias para a existência das escolas e suportar domínio de Portugal, que onerava os para o trabalho dos professores. produtos brasileiros na disputa por mercados e O Ato Adicional de 6 de agosto de 1834 onerava a aquisição de mercadorias estrangeiras instituiu as Assembléias Legislativas provinciais com necessárias para o consumo interno no Brasil. o poder de elaborar o seu próprio regimento, e, Diante do enfraquecimento econômico e desde que estivesse em harmonia com as imposições político de Portugal e o contexto de contradição gerais do Estado, caber-lhe-ia legislar sobre a divisão entre a política econômica portuguesa e a política civil, judiciária e eclesiástica local; legislar sobre a econômica internacional ocorreu a conquista instrução pública, repassando ao poder local o direito brasileira de sua autonomia política e econômica. A de criar estabelecimentos próprios, além de Independência brasileira foi conquistada em 1822, regulamentar e promover a educação primária e com base em acordos políticos de interesse da classe secundária. Ao Governo Central ficava reservado o dominante, composta da camada senhorial brasileira, direito, a primazia e o monopólio do ensino superior. que entrava em sintonia com o capitalismo europeu. Graças à descentralização, em 1835, surgiu a A Assembléia Constituinte e Legislativa primeira escola normal do país, em Niterói. instalada após a proclamação da Independência para Baseado nessa Lei, cada província passava legar nossa primeira Constituição, iniciou os a responder pelas diretrizes e pelo funcionamento trabalhos propondo uma legislação particular sobre a das suas escolas de ensino elementar e secundário. instrução, com o objetivo de organizar a educação Logo se defrontaram, porém, com as dificuldades nacional. para dar instrução de primeiras letras aos moradores A Constituição[2] outorgada em 1824, que dos lugares distantes e isolados. Neste período, o durou todo o período imperial, destacava, com acesso à escolarização era precário ou inexistente, respeito à educação: “A instrução primária é gratuita tanto por falta de escolas, quanto de professores. para todos os cidadãos.” Para dar conta de gerar Para atender a demanda de docentes, uma lei especifica para a instrução nacional, a saíram os decretos para criação das primeiras escolas Legislatura de 1826 promoveu muitos debates sobre normais no Brasil[3] , com o objetivo preparar a educação popular, considerada premente pelos professores para oferecer a instrução de primeiras parlamentares. letras. Assim, em 15 de outubro de 1827, Graças à descentralização da educação através do Ato Adicional, em 1835 surgiu a denominado Republicano com a libertação dos primeira Escola Normal do país, em Niterói. escravos para atender às demandas do mercado Em seguida outras Escolas Normais foram criadas internacional. E, paralelo a isso, são incentivados os visando melhorias no preparo do docente. Em 1836 discursos e pequenas ações para acabar com o foi criada a da Bahia, em 1845 a do Ceará e, em 1846, analfabetismo no país. a de São Paulo. No final do Império, o quadro geral Em 1837, na cidade do Rio de do ensino era de poucas Instituições Escolares, com Janeiro foi criado o Colégio Pedro II, onde funcionava apenas alguns liceus províncias nas capitais, colégios o Seminário de São Joaquim. O Colégio Pedro II privados bem instalados nas principais cidades, fornecia o diploma de bacharel, título necessário na cursos normais em quantidade insatisfatórias para as época para cursar o nível superior. Foram também necessidades do país. Alguns cursos superiores quem criados nessa época colégios religiosos e alguns garantiam o projeto de formação (médicos, cursos de magistério em nível secundário, advogados, de políticos e jornalistas). Identificando o exclusivamente masculinos. O colégio de Pedro II era grande abismo educacional entre a maioria da freqüentado pela aristocracia, onde era oferecido o população brasileira que, quando muito, tinham uma melhor ensino, a melhor cultura, com o objetivo de casa e uma escola, com uma professora leiga para formar as elites dirigentes. Por este motivo, era ensinar os pobres brasileiros excluídos do interesse considerado uma escola modelo para as demais no do governo Imperial. país. A presença do Estado na educação BIBLIOGRAFIA no período imperial era quase imperceptível, pois AZEVEDO, Azevedo de. A Cultura estávamos diante de uma sociedade escravagista, Brasileira. 5ª. Ed., revista e ampliada. São Paulo. autoritária e formada para atender a uma minoria Melhoramento, Editora da USP, 1971. encarregada do controle sobre as novas gerações. COSTA, Emília Viotti da .Da Monarquia à Ficava evidenciada a contradição da lei que República: Momentos Decisivos.Livraria Editora propugnava a educação primária para todos, mas na Ciências Humanas. Segunda Edição.São Paulo, 1979. prática não se concretizava. O governo imperial atribuía às províncias “[...]a responsabilidade direta FAORO, Raymundo. Os Donos do pelo ensino primário e secundário, através das leis e Poder.Formação do Patronato Político Brasileiro. 7ª. decretos que vão sendo criados e aprovados, sem que Ed. Rio de Janeiro:globo, 1987. seja aplicado, pois não existiam escolas e poucos HOBSBAWM, Eric J. A Era dos Impérios eram os professores.”(NASCIMENTO,2004, p. 95). 1875-1914. São Paulo:3ª ed., Paz e Terra, 1992. Em 1879, a reforma de Leôncio de HOLANDA, Sergio Buarque de Holanda. O Carvalho instituiu a liberdade de ensino, o que Brasil Monárquico. Tomo II; declínio e queda do possibilitou o surgimento de colégios protestantes e império. Rio de Janeiro : Bertrand Brasil,1997. positivistas. Em 1891, Benjamim Constant, baseado nos ensinamentos de Augusto Comte, elaborou uma NASCIMENTO, Maria Isabel M. A Primeira reforma de ensino de nítida orientação positivista, Escola de professores dos Campos Gerais-PR, Tese defensora de uma ditadura republicana dos (Doutorado), Universidade Estadual de Campinas- cientistas e de uma educação como prática UNICAMP- Faculdade de Educação, 2004. neutralizadora das tensões sociais. RIBEIRO, Maria Luiza Santos.História da O mundo desenvolvido caminhava para Educação Brasileira: A organização uma organização econômica que era considerada Escolar. Campinas, SP:Autores Associados, 2003. “mundial”, onde o ideal para os teóricos idealizadores desta economia era assegurar a divisão WEREBE, Maria José Garcia. 30 Anos internacional do trabalho para que “[...] garantisse o Depois - Grandezas e Misérias do Ensino no Brasil. crescimento máximo da economia.[...] não tinha São Paulo, Ática, 1994. sentido tentar produzir bananas na Noruega, pois XAVIER, Maria Elizabete S. Prado. Poder elas podiam ser produzidas muito mais barata em político e educação de elite. 3.ed., São Paulo: Cortez: Honduras.” (HOBSBAWM, 1992, p.66) Autores Associados, 1992. O liberalismo econômico impunha as regras e tudo o que era possível para demonstrar que esta prática era melhor para economia mundial. Nesta perspectiva os conflitos estavam estabelecidos: a Industrialização e a Depressão “[...]formaram-nas num grupo de economias rivais, em que os ganhos de uma pareciam ameaçar a posição de outras. A concorrência se dava não só entre empresas, mas também entre nações.” (HOBSBAWM, 1992, p.68) Com o protecionismo industrial (retirei vírgula) estabelecido, as bases industriais do mundo, adequaram-se e para isso fez se necessário incentivar as poucas industriais nacionais para este novo modelo e para produzirem com vistas ao mercado interno. Era preciso mão-de-obra preparada, escolarizada e o Brasil, com sua economia baseada na agricultura, na exploração bruta do trabalho, não atingia as exigências dos interesses externos. Diante de muitos conflitos[4] , o Brasil passa a ser