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Georges Abboud
Mestre e Doutor em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – PUC-SP. Professor de
processo civil da PUC-SP e do programa de mestrado em Direito Constitucional do Instituto Brasiliense
de Direito Público – IDP-DF. Advogado e Consultor Jurídico. georges.abboud@neryadvogados.com.br
Introdução
Para comemorar os 25 anos da nossa Constituição Federal, escrevemos um artigo dando Parabéns à
Geni1, chamando a atenção para o fato de que tanto ela como a personagem da Ópera do Malandro são
defendidas ou atacadas ao sabor incerto das conveniências. Isto é, só a elogiamos quando
concordamos com ela; mais: só acreditamos na sua existência quando ela nos é útil.
Ao primeiro sinal de discordância com o documento fundamental da nossa democracia, não hesitamos
em defender qualquer perspectiva contrária à Constituição. Apelamos para a política, para a religião,
para a ideologia, ou até para a economia. Somos capazes, inclusive, de reescrever uma falsa história
que justifique o que queremos justificar.
Pode ser triste, mas é preciso admiti-lo: não pensamos a partir da Constituição, logo não consolidamos
um pensamento constitucional. Pelo contrário, acreditamos, em uma lamentável inconsciência, que a
Constituição Federal só vale quando nos interessa e que, se há algo de errado na nossa democracia, ela
é sempre uma das culpadas.
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Assim como a cidade da maldita Geni, somos cínicos, estratégicos. Convocamo-la à luta quando
ameaçados pelo zepelim da desordem, da desfaçatez. Nos outros dias da semana, a maldizemos, a
ignoramos e a esquecemos. Mas ela está lá, incômoda. É esse o problema.
Cinco anos mais tarde, ei-la com trinta anos. Se aos 25 anos a Constituição sofria injustamente ao
sabor de opiniões pouco preparadas. Hoje, aos 30, idade em que se esperava maturidade da população
para lidar com o instrumento básico da nossa democracia, pouco ou nada mudou. Negamo-nos a
admitir a sua importância, alimentando, sem parar, uma série de mitos sobre as suas vantagens e os
seus defeitos. Geni, agora balzaquiana, segue sendo apedrejada sem que se reconheça a sua
relevância.
Acontece que estes que vos falam continuam convictos de que a defesa da Constituição Federal de
1988 é, a um só tempo, a defesa do nosso processo civilizatório, bem como a condição necessária –
ainda que insuficiente – para estabilizar nossa democracia.
Agora, não falemos bem nem mal de nossa Geni. Vamos tomá-la por inteiro, encará-la de frente.
Levantemos o "véu diáfano da fantasia" e afirmemos a sua força de normajurídica. Da maior delas: pois
ela é a última barreira contra a barbárie e o primeiro convite ao diálogo.
Desfaçamos, como presente de aniversário, cinco mitos sobre a Constituição Federal de 1988.
1 1º mito: a Constituição Federal de 1988 é extremamente longa
Da minha aldeia vejo quanto da terra se pode ver do Universo...
Por isso a minha aldeia é tão grande como outra terra qualquer,
Porque eu sou do tamanho do que vejo
E não do tamanho de minha altura...
Alberto Caiero, Guardador de Rebanhos, VII
Costuma-se dizer, com toda a autoridade dos lugares-comuns, que a Constituição de 1988 não se
concretiza porque seria muito extensa, detalhista em exagero, analítica demais. Isso leva alguns a
afirmar que essa nossa Constituição "inchada" seria uma das razões para o atraso do Brasil, quando
não a maior delas.
Diversas mazelas do nosso cenário político são atribuídas ao tamanho do nosso texto constitucional.
Com frequência, a leitura de vários trechos de doutrina passa-nos a impressão pueril de que os EUA
são o que são e o Brasil é o que não é, porque a Constituição dos primeiros é pequena e a do segundo
é enorme.
Esse truísmo, nascido de juristas que têm fetiche por um constitucionalismo mais clean e minimalista,
leva-nos a crer que "quanto menos Constituição, melhor". Em uma dessas ironias impagáveis do
destino, essa obsessão pela pequenez cai por terra com a leitura da obra de Alexis de Tocqueville,
Democracia na América2, a qual deixaria claro, mesmo às mentes mais obtusas, as diferentes histórias
de cada documento.
A comparação da atual Constituição brasileira com a americana deve ser precedida por um mínimo
indispensável de contextualização histórica. Não há como comparar o nascimento de uma nação
pujante de refugiados religiosos, ao final do século XVIII, com uma dolorosa conciliação política, havida
no final do século passado, depois de trinta e tantos anos de um regime militar.
Mas é óbvio que, por conta das circunstâncias do seu surgimento, há alguns dispositivos na
Constituição Federal de 1988 que poderiam ser livrados do seu status constitucional, por exemplo, as
regras sobre usucapião, e a desnecessária manutenção em órbita federal do Colégio Pedro II,
encurtando, assim, o texto.
Entretanto, as dimensões da nossa Constituição devem ser medidas a partir do modelo brasileiro de
federação, que centraliza a maior parte das grandes decisões políticas na figura da União. Já a
Constituição norte-americana, além de dar maior protagonismo aos Estados, relegou a eles a
regulamentação de diversos temas e pormenores os quais, no Brasil, são objeto do próprio texto da
Constituição Federal.
Essas diferenças históricas e políticas fizeram com que, no modelo dos EUA, a Constituição Federal
fosse enxuta e, por consequência, para a sua higidez, as várias Constituições Estaduais fossem longas
e extremamente analíticas.Além disso, como se pode imaginar, as Constituições dos Estados norte-
americanos são infinitamente mais relevantes do que as dos Estados brasileiros.
Não é por outra razão que a Constituição Estadual do Alabama é a maior constituição do mundo3.
Promulgada em 1901, a atual Constituição do Alabama (que está na sua sexta versão), conta com um
número total de 287 dispositivos, ao qual se deve acrescentar a sua surpreendente quantidade de
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comprova.
Isso, no entanto, não elimina o fato de que diversos países se desenvolveram social e economicamente
pela estruturação de redes de normas protetivas de direitos fundamentais, possibilitada pela exigência
do uso racional e controlado do poder político, o qual é, por sua vez, garantido pela separação de
poderes e inúmeros outros mecanismos previstos nas Constituições democráticas dotadas de força
normativa.
Descendo a um plano realista, esses críticos desconsideram que, além da quase centena de Emendas
Constitucionais, nossa Constituição é constantemente modificada de modo informal, por
inconstitucionalidades praticadas pelo Executivo, pelo Legislativo e pelo Judiciário, inclusive o próprio
STF. Entre os inúmeros exemplos possíveis, considere a Súmula Vinculante 5 (a falta de defesa técnica
por advogado no processo administrativo disciplinar não ofende a Constituição), que reduz o inciso LV
do art. 5º (LV – aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são
assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes).
É possível – quiçá provável – que aqueles que mais se queixam da rigidez da nossa Constituição sejam
simplesmente indivíduos frustrados com o fato de, por qualquer razão – principalmente inaptidão e
desarticulação política –, não conseguirem alterá-la a ponto de fazê-la a sua imagem e semelhança.
Não é só Narciso que acha feio tudo que não é espelho...
Pintar a Constituição brasileira com as cores de um Oblomov,6 que não sai do sofá, "travando", por
assim dizer, avanços na sociedade e na estrutura administrativa do Estado, não é nada mais do que um
mecanismo compensatório qualquer, que atribui o nosso fracasso pessoal e a nossa ineficiência política
e civilizacional a algo que está fora de nós e que – ironia das ironias – garante-nos as condições
mínimas para o sucesso.
O próximo mito é um desdobramento natural desse autoengano. Sigamos em frente.
3 3º mito: a Constituição de 1988 aprisiona as gerações futuras a essas ou àquelas pautas de
esquerda ou de direita
The whole modern world has divided itself into Conservatives and Progressives. The business of
Progressives is to go on making mistakes. The business of Conservatives is to prevent mistakes from
being corrected.
Todo o mundo moderno se divide entre Progressistas e Conservadores. O papel dos Progressistas é
cometer erros continuamente. O papel dos Conservadores é evitar que os erros sejam corrigidos.
Gilbert Keith Chesterton, Ilustrated London News, 1924.
Chesterton e sua pontaria infalível. A observação é mais do que válida para os tempos que correm, nos
quais as lutas de ânimos exaltados oferecem um espetáculo patético nas redes sociais.
Atingida onze vezes a cada dez nessa algazarra, a Constituição Federal – não obstante ser garantidora
de direitos e profundamente democrática – leva pancadas da direita e da esquerda. Isso quando os
seguimentos mais exagerados do espectro político não propõem, em um acesso de confiança
messiânica, a realização pura e simples de uma nova Assembleia Constituinte7.
A situação é muito lógica: sempre que os extremos da direita e da esquerda concordam em qualquer
coisa que seja, estamos próximos de uma péssima ideia. Façamos uma concessão aos jargões
simplificadores da vez. O trocadilho é inevitável, mas verdadeiro: menos Mises, menos Marx e mais
Constituição.
Esses seguimentos, caricatos cada qual a seu modo, querem uma nova Constituição, contudo, carecem
de legitimidade e sequer nos oferecem garantias de que o novo documento fundamental, que
"resolveria todos os problemas do Brasil contemporâneo", manteria importantes conquistas
democráticas, tais como a separação dos poderes e os direitos fundamentais já consagrados na nossa
ordem jurídica.
Na realidade, tanto a extrema esquerda como a extrema direita pensam a nova Constituição como a
materialização total das suas aspirações sociais e políticas. Ou seja, a Constituição ideal, para cada
uma delas, exclui o adversário político, elimina o dissenso e abole o caráter essencialmente dialético do
processo democrático.
Digamos com todas as letras: pretender uma Constituição perfeita, que nos agrade em tudo, é
pretender uma Constituição que elimine a diferença e o embate político. A Constituição perfeita não é
uma utopia ingênua, mas sim um totalitarismo ideológico. No Brasil, utopia é conseguirmos concretizar
ao menos os seis primeiros artigos da Constituição Federal de 1988.
É claro que essas visões políticas extremas e contrárias ao texto constitucional em momento algum se
debruçam sobre os limites desse novo poder constituinte. Mais precisamente, não nos esclarecem a
nós, cidadãos, se existiria alguma chance de os direitos hoje consagrados não serem suprimidos, ou se
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de fundamentação aos magistrados, agora esmiuçado no CPC, art. 489, § 1º, embora já estivesse
claramente expresso na CF, art. 93, IX. Mesmo com essas coincidências entre o texto constitucional e a
nova lei federal, em essência, do ponto de vista qualitativo, não houve melhora alguma.
Isso para não mencionar as diversas práticas que, cotidianamente, dão-se em total contraste com os
direitos fundamentais, apesar de sua farta enumeração no texto constitucional, v.g., determinações de
prisões temporárias e preventivas sem fundamentação, baixa deferência ao direito legislado, valoração
discricionária do acervo probatório, atuação inquisitorial do magistrado na produção de provas etc.
Estabelecidas essas premissas, passamos a esclarecer o quarto mito. Quando falamos em direitos
fundamentais, há um equívoco na afirmação de que a Constituição somente estabeleceu direitos e não
deveres. O estabelecimento de direitos e deveres deve ser visto em dupla dimensão, por assim dizer,
uma vez que todo direito fundamental é contramajoritário, vinculando tanto os particulares como os
poderes do Estado.11 Positivar um direito fundamental é, a um só tempo, também positivar um dever
de observância obrigatória e inegável, tanto para o Poder Público como para a sociedade civil12.
Essa ilusão de "muitos direitos e poucos deveres" deve ser desfeita, porque a Constituição
expressamente estabeleceu obrigações para o Poder Público, no intuito de racionalizar o poder, em
especial os arts. 37, caput, e 93, IX, da CF.
Assim, para o exercício do poder, é necessário a observância da legalidade, impessoalidade,
moralidade, publicidade e eficiência, em conjunto ao dever de fundamentação. Há, desse modo, no
nosso texto constitucional, a positivação clara de diversos deveres que, assim reunidos, permitem-nos
afirmar que há um verdadeiro dever de accountability imposto àquele que exerce o poder.
Segundo Samuel Issacharoff, a accountability é uma das chaves fundamentais para o regime
democrático. Para que uma determinada democracia seja legítima, é preciso que, por um lado, haja
competição pelo apoio político dentro das regras legais. É a disputa organizada pelo poder que
assegura, antes, a responsabilidade das elites políticas e, depois, a legitimidade no exercício da
autoridade estatal. Por outro lado, é também necessário que os julgamentos das pessoas, em uma
democracia consolidada, não sejam baseados em uma tabulação arbitrária de suas preferências
preexistentes, mas sim em uma avaliação do desempenho daqueles que exercem o poder a partir de
efetivos critérios de accountability.13 Provimentos estatais devem ser fundamentados em razões
públicas, não em insondáveis critérios voluntaristas de quem exerce o poder.
Dessa maneira, representação e accountability constituem aquilo que O’Donnell denomina de dimensão
republicana da democracia, consubstanciada em uma cuidadosa distinção entre as esferas do espaço
público e do privado em relação aos ocupantes de cargos públicos.14
Waldron salienta o laço intrínseco que há entre democracia e accountability, na medida que a relação
entre governadores e governados se dá de forma similar a um contrato de mandato/representação, em
que o representante/mandatário não só está vinculado à vontade do seu representado/mandante (uma
vez que cuida dos negócios do primeiro em seu próprio nome), como, também, tem o dever de prestar
contas de absolutamente tudo que lhe for solicitado, independentemente de haver ou não conflitos ou
dúvidas a respeito das suas atividades, do grau de conhecimento técnico necessário para compreendê-
las, do resultado das eleições ou de a questão precisar ser judicializada. A transparência (ou
publicidade dos negócios públicos) é, portanto, na visão de Waldron, a base de nossas atuais
concepções de democracia e de prestação de contas democrática.15
Por conseguinte, nos tempos que correm, há centenas de milhares de servidores públicos que podem:
a) prestar contas diretamente (presidente); b) prestar contas por meio de uma hierarquia (membros do
parlamento); c) prestar contas indiretamente (servidores públicos civis) ou d) não prestar contas
(membros do Poder Judiciário federal).16
Atualmente, o dever de accountability tem a mesma importância que a realização de eleições livres e
periódicas para sustentação da democracia.17 Nossa Constituição positivou todos os deveres e garantias
necessários para falarmos de um dever de accountability no Brasil. Na medida que o exercício do poder
precisa ser feito em estrita observância da legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência e que os atos administrativos e judiciais devem ser fundamentados, sob pena de nulidade,
está claramente colocado um feixe de deveres que poderia ser resumido na obrigatoriedade de
prestação de contas.
A prestação de contas democrática tem, como uma de suas facetas, a transparência e o livre acesso
dos governados às informações relativas às atividades do governo, pois só assim se poderá verificar se
os seus assuntos estão sendo conduzidos da maneira devida18. Caso o governo se recuse, por qualquer
motivo, a prestar as informações ou os esclarecimentos requeridos por qualquer cidadão, estará
descumprindo obrigações inerentes à relação jurídica que existe entre as partes, agindo de forma
insolente.19
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Por óbvio, sempre que o STF realiza controle de constitucionalidade e julga uma lei inconstitucional por
meio de ADin, ele está interferindo diretamente na esfera do Legislativo. Todavia, essa interferência
pertence a nossa engenharia constitucional. Tal controle, além de ter sido previsto pelo Poder
Constituinte Originário, é regulamentado pela lei nos termos da Constituição. Ocorre que as
interferências do Judiciário e, em especial, do STF em face do Legislativo e do Executivo, sem
autorização constitucional, configuram uma invasão pérfida de competência e uma quebra violenta da
separação de poderes, concretizando, assim, a faceta macro do ativismo.
Exemplo paradigmático de ativismo judicial é o posicionamento de parcela do STF, que subverteu o
texto constitucional a pretexto de construir um futuro melhor e combater a corrupção e as iniquidades
históricas do Brasil. Com efeito, o STF passou a julgar contra texto expresso da Constituição, mais
precisamente o inc. LVII do art. 5º da CF. Assim, de forma ativista, parcela do STF ignorou o sentido da
expressão "trânsito em julgado" transformando-o em sinônimo de recurso julgado em segunda
instância.24
Em suma, perante o conceito de ativismo apresentado, inexiste qualquer fundamento teórico ou
normativo que confirme qualquer assertiva no sentido de que a Constituição Federal autoriza o ativismo
judicial.
Na realidade, o quinto mito é sustentado por dois enunciados performáticos25: a) ativismo judicial é
válido porque há déficit legislativo e b) ativismo judicial não seria um problema porque o Judiciário não
age de ofício, a própria Constituição impõe resposta judicial para toda e qualquer lesão ou ameaça a
direito (inc. XXXV do art. 5º da CF).
O primeiro enunciado não se sustenta porque, no Brasil, todos os três Poderes têm atuação deficitária.
Logo, o Legislativo poderia proferir determinadas decisões na jurisdição constitucional, em face da
inércia do STF? O Presidente da República poderia julgar algumas questões judiciais que estão com
pedido de vista por mais de uma década, a pretexto de haver déficit e omissão judicial sobre o tema?
Não. É simplesmente teratológico afirmar que não há ativismo judicial no Brasil, porque haveria
imperativo moral do Judiciário de agir em face de inércia dos demais Poderes. Em uma democracia,
além da inércia do Executivo e Legislativo, deve haver autorização constitucional para o Judiciário ter
legitimidade de atuar em lugar deles. Por consequência, nem a inércia do Legislativo e nem a CF
autorizam o agir ativista do Judiciário.
O segundo argumento – de que não haveria ativismo porque o Judiciário não age de ofício, logo, uma
vez provocado ele deve dar sua resposta – também é destituído de qualquer embasamento teórico ou
normativo. Trata-se de mais um lugar comum, um fraco álibi teórico para o julgador agir de forma
ativista. Em abstrato, o enunciado não está correto nem errado. De fato, existe a indeclinabilidade da
jurisdição. Ou seja, uma vez provocado, o Judiciário, obrigatoriamente, deve dar uma resposta. Ocorre
que, afirmar que sobre aquele tema o Judiciário não está autorizado a se imiscuir é uma resposta. Ou
seja, prestigiar em alguns temas o self-restraint, a inação respeitosa, é o posicionamento
constitucionalmente adequado em uma democracia.
Quando falamos em ativismo, falamos, obrigatoriamente, na extrapolação de limites no exercício da
atividade judicante. Esse é o motivo pelo qual Cross e Lindquist o descrevem como uma falha das
Cortes (e dos juízes) em “agir enquanto Judiciário”, passando a agir como se fossem do Judiciário (act
“like a judiciary”).26 O Judiciário, quando falha em agir como Judiciário, age como político, amigo,
inimigo etc. Esse agir é uma degeneração da primazia da lei, do dever de accountability e da separação
de poderes. Daí a inviabilidade de qualquer pensamento que associa ativismo ao texto constitucional de
1988.
Pela razão mencionada, usamos Agamben como epígrafe desse capítulo. Giorgio Agamben desenvolve
sua ideia de Estado de Exceção partindo da formulação de Carl Schmitt de que o soberano é aquele que
decide sobre o Estado de exceção.27 Para o jurista italiano, “o estado de exceção não é um direito
especial (como o direito de guerra), mas, enquanto suspensão da própria ordem jurídica, define seu
patamar ou conceito como limite”.28
O elemento "necessidade" é fundamental na teorização de Agamben, na medida que ele desenvolve
seu pensamento a partir do adágio latino necessitas legem non habet, ou seja, "a necessidade não tem
lei", que deve ser entendido em dois sentidos opostos: "'a necessidade não reconhece nenhuma lei’ e a
‘necessidade cria sua própria lei’”.29 Prossegue Agamben ressaltando que: “em ambos os casos, a teoria
do estado de exceção se resolve integralmente na do status necessitatis, de modo que o juízo sobre a
subsistência deste esgota o problema da legitimidade daquele”.30
Diante desse adágio latino, a necessidade que provoca a ruptura com a legalidade e abre o Estado de
Exceção não procura investigar o caráter lícito ou ilícito da hipótese. A necessidade “age aqui como
justificativa para uma transgressão em um caso específico por meio de uma exceção”.31 Por isso, o
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autor ensina que “o estado de exceção moderno, é, ao contrário, uma tentativa de incluir na ordem
jurídica a própria exceção, criando uma zona de indiferenciação em que fato e direito coincidem”.32
Para a perspectiva normativo-decisória, o juiz ativista é, com efeito, aquele que, na necessidade
artificialmente produzida por seus inacessíveis e incontroláveis critérios decisórios pessoais, fabrica seu
próprio direito para a sua visão de mundo e de justiça prevalecer. Ativismo é a ruptura do sistema
normativo legislado democraticamente e positivado. Toda decisão ativista é medida de exceção dentro
do sistema jurídico, porque suspende o direito positivo a partir de critérios não jurídicos,
independentemente de ter sido motivada por ideologias de esquerda ou de direita.
Conclusão: por que faz sentido defender a Constituição?
Depois disso tudo, por que defender a Constituição de 1988? Recebemos com frequência essa
pergunta. Muitas vezes ela vem acompanhada do seguinte complemento: "a Inglaterra, por exemplo, é
uma democracia, e sequer tem Constituição escrita".
Por se tratar de um artigo acadêmico, precisamos dar uma resposta erudita e fundamentada para tal
tipo de questionamento, por mais disparatada que seja a comparação.
De início, não se pode perder de vista que a história da Inglaterra tem características particularíssimas
as quais, do ponto de vista jurídico, conferiram a ela um sistema jurídico completamente distinto de
qualquer outro. Tome-se, por exemplo, a Revolução Gloriosa33-34, que não tem paralelos na história,
por não ter sido uma revolução, mas uma reforma para racionalização do poder político.
Apesar de a Inglaterra não possuir constituição escrita, talvez o constitucionalismo inglês seja o mais
consolidado das democracias, porque é fruto de progressivo desenvolvimento histórico daquela nação
no sentido da racionalização do poder político. Nessa perspectiva, o fenômeno inglês de democracia
consolidada sem texto constitucional escrito não apresenta evento similar na história. Bem vistas as
coisas, a experiência inglesa não depõe contra a importância da Constituição enquanto edifício político-
jurídico, bem o contrário!
Feito esse introito, por quais razões devemos defender a Constituição de 1988?
Poderíamos argumentar o fato de a Constituição possuir um texto generoso, acolhedor da dignidade
humana; de ela promover o pluralismo; de assegurar diversos direitos e garantias fundamentais; e de
permitir ao particular exercer em sua plenitude a liberdade de expressão.
Contudo, poderíamos responder à questão anterior com nova pergunta. Sem Constituição Federal, o
que temos em termos de progresso civilizatório? Ao final de todo embate no Brasil, como se pode
defender, com autoridade normativa, a igualdade entre homens e mulheres? A impossibilidade de pena
de morte? A abominação do racismo? A prisão somente fundamentada e mediante provas lícitas?
Poderíamos enumerar diversos outros pontos que deveriam ser conquistas civilizatórias de qualquer
democracia. Contudo, se, mesmo com uma Constituição estabelecendo claramente esses direitos e
garantias, eles são cotidianamente vilipendiados, sem ela, perdemos o próprio fundamento normativo
que nos permite afirmar que eles têm sido sistematicamente violados. Há alguma justificativa plausível
para arriscarmos esse retrocesso?
Em democracias precárias como a brasileira, caminhar fora da Constituição é sempre um atalho para a
barbárie.
Jürgen Habermas afirmava que o nacionalismo seria o mal do século, porque caracterizaria o estopim
dos diversos conflitos entre países europeus, inclusive as duas Guerras Mundiais. Nesse contexto, na
opinião de Habermas, o nacionalismo deveria ser substituído por um sentimento de patriotismo
constitucional. Isso porque o nacionalismo é ínsito a uma ideia de homogeneidade étnica e cultural. O
constitucionalismo, por sua vez, instituiu-se como instrumento racionalizador de poder, de feição liberal,
aberto ao multiculturalismo. Desse modo, o sentimento constitucional seria fundamental para assegurar
que, em uma sociedade multicultural, fosse possível estabelecer bases democráticas com o intuito de
assegurar a cidadania democrática para as pessoas, contemplando não apenas direitos liberais e
políticos, mas também sociais e culturais.35
Obviamente, não acreditamos que as Constituições serão eternas. O modelo de Constituição que hoje
conhecemos está fortemente atrelado à ideia de Estado Nação. Na medida que passa a haver
integração transnacional, as Constituições atuais obrigatoriamente precisam se abrir e dialogar umas
com as outras, sendo a Europa o modelo paradigmático dessa mudança.
Da mesma forma, a Constituição Federal não é a panaceia para solução de todos os males do Brasil. As
condições para o exercício da cidadania e para viver dignamente demandam uma atuação coordenada
da autonomia privada e pública. Mais precisamente, essas condições apenas se concretizam se a
autonomia pública pressupor a privada e vice-versa.36
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Dworkin, ao discorrer sobre democracia constitucional, expõe o pano de fundo da sociedade americana,
esclarecendo que os americanos têm vivido em situação deplorável do ponto de vista político,
discordando de praticamente todos os temas sensíveis acerca da nação.37
Esse completo dissenso presente na sociedade americana também é facilmente verificável na sociedade
brasileira. Aliás, o dissenso e a polarização têm sido características marcantes do debate político
brasileiro, bem como do embate entre Poderes Legislativo, Executivo e Judiciário.
Na visão dworkiana, essa discordância total e irracional também é extensível aos intelectuais que,
frequentemente, defendem com eloquência e clareza seu ponto de vista e acusam o ponto de vista
contrário com virulência, taxando-o até mesmo de desumano.38
Desse modo, para se falar de democracia, é imperioso restaurar a ideia de common ground entre
visões políticas antagônicas. O common ground é uma base comum, cuja existência é imprescindível
para que seja possível o tratamento de temas sensíveis em uma democracia, mais precisamente para
compreensão e debate de argumentos genuinamente políticos. Sem o common ground, as discussões
serão infrutíferas e pouco respeitosas.39 A premissa imprescindível para o common ground surgir é o
debate real de argumentos políticos genuínos. Ou seja, aceitar ouvir o argumento contrário e expor a
contrariedade, indicando pontos de discordância em virtude da convicção política e a demonstração
honesta de porque o argumento contrário estaria equivocado.40
O common ground é mais do que argumento teórico. Corretamente compreendido, ele constitui
elemento estruturante da democracia. Por maiores que sejam as discordâncias, não é crível que
discordemos de tudo o tempo todo. Devem haver conquistas do processo civilizatório que se tornaram
elementos integrantes dessa base comum de debate, por exemplo: crianças não devem ser torturadas,
não pode haver discriminação entre homem e mulher, Constituições democráticas devem ser
respeitadas por particulares e Poder Público, propostas de nova Constituinte por mais requintadas que
pareçam, não são mais do que golpes de Estado etc.
A Constituição de 1988 estabelece diversas premissas fundamentais para esse common ground.
Premissas essas que, inobstante a ideologia de cada um, deveriam ser respeitadas: 1) Separação de
Poderes; 2) Sufrágio universal; 3) pluralismo político e ideológico; 4) Consagração dos princípios
constitucionais, notadamente legalidade, dignidade humana, devido processo legal e isonomia; 5)
Positivação normativa dos direitos fundamentais e a vinculação substancial da sociedade e dos três
Poderes em relação a eles; 6) Dever de fundamentação e prestação de contas (accountability) dos atos
do Poder Público; 7) Instrumentos postos ao cidadão para correção das omissões legislativas; 8)
Instância contramajoritária de controle dos atos dos Poderes, em regra, exercida pela a própria
jurisdição constitucional; 9) Respeito ao pluralismo cultural, social e político e 10) Proteção das
minorias.
Ocorre que a Constituição de 1988 já mereceria proteção pelo simples fato de positivar a defesa da
dignidade humana.
Na visão de Dworkin, a dignidade humana apresenta-se em duas dimensões. A primeira dimensão é a
do valor intrínseco. Ou seja, cada vida humana tem uma espécie de valor objetivo especial. Nessa
dimensão objetiva, toda vida humana deve importar desde o seu nascimento, desenvolvimento e fim.
Trata-se de problema objetivo e não de importância subjetiva. Vale dizer, o sucesso ou o fracasso de
uma vida humana não é apenas importante para a própria pessoa que está vivendo a própria vida. O
fracasso de qualquer vida humana é importante por si mesmo, como um critério objetivo. Da mesma
forma que somos condicionados a combater a injustiça sempre que ela ocorra, devemos nos
condicionar a reprovar o desperdício da vida humana como algo ruim per se, pouco importando para
tanto se a vida envolvida é a nossa ou a de qualquer outra pessoa. Ou seja, a vida humana tem um
valor intrínseco per se.41
Essa primeira dimensão da dignidade humana é muito próxima ao tratamento normativo alemão acerca
da dignidade, cuja finalidade é a de impedir que o ser humano seja utilizado como objeto nos
procedimentos estatais42. Assim, na democracia constitucional, o resguardo da dignidade humana
constitui dever fundamental do Estado (dever jurídico fundamental). A dignidade humana é o
fundamento último e primeiro da soberania popular.43
Dito de outro modo, a dignidade humana constitui a norma fundamental do Estado e da própria
sociedade civil, inadmitindo qualquer tipo de restrição ou ponderação.44
Tanto em Dworkin quanto em Häberle o respeito e a atribuição de uma dimensão normativa à dignidade
humana constituem condição sine qua non para estruturação da democracia. Por conseguinte, não seria
nenhum exagero afirmarmos que, hoje, dignidade humana e democracia constituem elementos
inseparáveis. Essa conclusão deveria servir de alerta para os fervorosos ataques lançados à
Constituição Federal.
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A segunda dimensão da dignidade humana consiste na responsabilidade pessoal – cada pessoa teria
uma responsabilidade especial na realização do sucesso de sua própria vida. Tal responsabilidade inclui
realizar o julgamento de qual seria o ideal de uma boa vida para si próprio. Ninguém mais deve ter o
direito de impor a essa pessoa valores pessoais contra sua própria vontade. Ou seja, as escolhas éticas
do cidadão são escolhas legítimas dele, não podendo ser impostas por terceiros ou maiorias.45
Para Dworkin a dignidade nos assegura o direito de orientarmos nossas próprias vidas. Nós temos o
direito e a responsabilidade de decidirmos nossa religião, nosso casamento, nossas relações, nossos
empregos etc. Do mesmo modo, devemos concordar que há decisões que não podemos tomar por nós
mesmos. São decisões que o Estado deve tomar acerca de, por exemplo, direitos de propriedade,
regras de trânsito etc. A diferença entre essas duas categorias é a diferença entre ética e moralidade.
Nossas convicções éticas definem o que nós levamos em conta como ideal de boa vida para nós
próprios. Já nossos princípios morais definem nossas obrigações e responsabilidade para com as outras
pessoas. O princípio da responsabilidade pessoal permite que o Estado nos force a viver de acordo com
decisões coletivas (maioria) no que diz respeito à moralidade. Contudo, o Estado está proibido de nos
impor escolhas éticas de todo modo.46
Assim, a dignidade humana se resume a esses dois princípios: a) cada vida humana tem um valor
intrínseco objetivo; b) cada um tem responsabilidade pessoal na realização desse valor em sua própria
vida. Nessa perspectiva, precisamos redimensionar nosso pensamento e passar a crer que igualdade e
liberdade são sim valores conciliáveis.47
Precisamos compreender que viver bem é um common ground para todos e respeitar a nossa própria
humanidade é respeitar a humanidade como um todo.48 Conclusões assim são possíveis em virtude de
um aprendizado a ser tido a partir da história do nosso processo civilizatório. As Constituições, tais
como as conhecemos hoje, não surgiram por capricho de intelectuais, elas são respostas civilizatórias
para enfrentar e evitar tiranias e degenerações fascistoides de maiorias assim como assegurar a
proteção de indivíduos e minorias no intuito de conferir regras mínimas para construção de
democracias.
Não podemos abrir mão de defender a Constituição Federal de 1988, em seu 30º aniversário. Não
porque ela seja perfeita ou imaculada, mas porque ela ainda é – assim esperemos – um importante
marco no processo civilizatório brasileiro.
Fazemos esse esforço, para sermos honestos, com certa tristeza. O Brasil é essa terra paradoxal, em
que o óbvio passa por não dito, e o absurdo é o esperado. Assistimos em silêncio a essa loucura, não
por resignação, mas por comodismo, preguiça.
Não temos senso prático. A defesa da atual Constituição é necessária, porque uma nova seria, com
toda a certeza, dado o ambiente de polarização extrema e virulenta dos tempos correntes, um convite
para a crise total e permanente da nação.
Na peça de Robert Bolton, O homem que não vendeu a sua alma (A man for all seasons), que serviu de
base para o clássico filme estrelado por Paul Scofield, Thomas More é surpreendido em sua casa,
durante o jantar, por um conhecido que, por ordens de Thomas Cromwell, o visitara para flagrar a sua
recusa em aceitar o casamento de Henrique VIII e Ana Bolena. More, um dos santos mais mundanos da
Igreja Católica, logo percebe a trapaça e, com vigorosa calma britânica, convida seu hóspede
inesperado a se retirar.
O espião aquiesce afobado, causando comoção entre os familiares de More. Seu genro, de
temperamento ardente, recomenda prendê-lo, antes que possa retornar ao rei e ao seu principal
chanceler. More se recusa. O coitado não violou nenhuma lei com essa visita. O marido da sua filha se
revolta e afirma, com todas as letras, que More seria capaz de dar até ao Diabo a cortesia da lei. More
provoca-o, dizendo que o jovem não hesitaria em acabar com todas as leis da Inglaterra para ir atrás
do Diabo. Mas, isso seria arriscado demais. Pois, como dissemos ao início, nesse mundo sem lei, de
cara a cara com o Diabo, "crês realmente que poderias resistir com bravura aos ventos que se
levantariam contra ti?"
É para isso que serve a Constituição. Resistamos.
1 ABBOUD, Georges. 25 anos da Constituição Federal: parabéns à Geni. Revista dos Tribunais, São
Paulo, n. 938, dez. 2013.
2 TOCQUEVILLE, Alexis de. Democracy in America and two essays on America. London: Penguin Books,
2003, passim.
https://www.revistadostribunais.com.br/maf/app/delivery/document 11/14
29/11/2018 Envio | Revista dos Tribunais
3 Sugerimos ao leitor a consulta, por si próprio, do site de importante empreitada acadêmica mundial,
do qual retiramos muitas das afirmações seguintes. Trata-se do Comparative Constitutions Project
([http://comparativeconstitutionsproject.org]). Nele, é possível ter acesso livre a anatomia de todas as
Constituições atuais, bem como as análises comparativas de alguns dos seus aspectos, em escala
mundial. Ferramenta indispensável para qualquer tipo de pesquisa que se queira fazer nesse campo.
4 Cf. MCMILLAN, Malcolm Cook. Constitutional development in Alabama 1798-1901: a study in politics,
the negro and sectionalism. Alabama: Auburn University Press, 1955, passim.
5 Ver, para esses três pontos, o Quarto Capítulo da obra de Zachary Elkins (The endurance of national
constitutions. New York: Cambridge University Press, 2009). Trata-se de um estudo sobre a
mortalidade das Constituições, consideradas em escala global, feito a partir dos dados colhidos pelo
Comparative Constitutions Project (ver nota 3). A iniciativa lembra, mutatis mutandis, o projeto de
estudo de Aristóteles, que pretendia comparar as diversas constituições das Cidades-Estado do mundo
grego, empreitada da qual só nos restaram as suas considerações sobre a Constituição de Atenas.
6 Personagem clássico da literatura russa do século XIX, Oblomov passa as primeiras 150 páginas do
romance homônimo de Ivan Goncharov sem sair da sua cama ou do sofá de sua sala. Apesar disso, o
incansável preguiçoso toca a vida de todos à sua volta com sua generosidade e nobreza de espírito.
Otto Maria Carpeaux, no terceiro volume da sua História da literatura ocidental, observa, com
sinceridade, que Oblomov é “o romance mais estático da literatura universal; o romance do infinito
enfado universal” (CARPEAUX, Otto Maria. História da literatura ocidental. 3. ed. Brasília: Senado
Federal, Conselho Editorial, 2008. v. III. p. 1796).
7 Para ilustrarmos alguns nomes: à direita, Eduardo Gianetti, Ricardo Bergamini, José Carlos Dias,
Modesto Carvalhosa, Flávio Bierrenbach e Jair Messias Bolsonaro, para ficarmos nos mais chamativos.
E, à esquerda Dilma Rousseff, Gleisi Hoffmann, Luís Inácio Lula da Silva, Celso Amorin, Luiz Carlos
Bresser-Pereira, i tutti quanti...Trata-se de um mantra repetido por intelectuais notáveis e líderes
populistas, o que demonstra a fragilidade da democracia brasileira.
8 KIRK, Russel. Edmund Burke: redescobrindo um gênio. São Paulo: É-Realizações, 2016. p. 316.
11 Cf. ABBOUD, Georges. STF vs. vontade da maioria: as razões pelas quais a existência do STF
somente se justifica se ele for contramajoritário. Revista dos Tribunais 921/191.
12 É lembrar o óbvio: a todo direito corresponde um dever. Nas palavras de Scruton: “um direito é
como um muro que define o meu território soberano: ao reivindicá-lo, estabeleço um veto sobre aquilo
que o outro pode fazer. Isso também explica a conexão direta entre direito e dever: a
incondicionalidade do direito é equivalente ao dever de respeitá-lo”.
13 ISSACHAROFF, Samuel. Fragile democracies: contested power in the era of constitutional courts.
Cambridge: Cambridge University Press, 2015. p. 244.
14 O’DONNELL, Guilhermo. Democracia delegativa? Novos Estudos CEBRAP, n. 31, out. 1991. p. 32.
20 KIRK, Russel. Edmund Burke: redescobrindo um gênio. São Paulo: É realizações, 2016. p. 316.
21 Esse conceito está largamente desenvolvido em: ABBOUD, Georges. Processo constitucional
brasileiro. 2. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2017. n. 10.2 e 10.3. Cf. também: ROOSEVELT,
Kermit. Judicial activism is not a useful concept. In: BERLATSKY, Noah. Judicial activism: opposing
viewpoints. Estados Unidos: Greenhaven Press, 2012. p. 57. KMIEC, Keenan D. The origin and current
meanings of judicial activism. California Law Review. 1441 (2004). Disponível em:
[scholarship.law.berkeley.edu/californialawreview/vol92/iss5/4]. LEISHMAN, Rory. Against judicial
activism: the decline of freedom and democracy in Canada. MacGill-Queen’s University Press, passim.
BANDOW, Doug. The public opposes judicial activism because it does not understand the issue. In:
BERLATSKY, Noah. Judicial activism: opposing viewpoints. Estados Unidos: Greenhaven Press, 2012. p.
144-145. WOLFE, Christopher. Judicial activism: bulwark of Freedinir Precarious Security. New York:
Rowman & Littlefield Publishers, 1997. p. 1 et seq.
22 Esse messianismo judicial é elucidado por MÄUS, Ingebor. O Judiciário como superego da sociedade:
o papel da atividade jurisprudencial na “sociedade órfã”. Novos Estudos Cebrap, n. 58, 2000.
23 Cf. Ver: ABBOUD, Georges. Submissão e juristocracia. Revista de processo, v. 258, p. 519-527,
2016. Sobre tema, ver: TASSINARI, Clarissa. A supremacia judicial consentida: uma leitura da atuação
do Supremo Tribunal Federal a partir da relação direito-política. Tese de doutorado apresentada no
programa de doutorado em direito da UNISINOS, 2016.
24 Cf. HC 126.292/SP – ADC 43/44. A respeito do tema, conferir: CARVALHO FILHO, Antônio; SOUSA,
Diego Crevelin de. Execução provisória da pena: qual é o momento em que se esgota a instância
recursal em 2º grau de jurisdição.Revista eletrônica Consultor Jurídico. Disponível em: [http://
emporiododireito.com.br/leitura/abdpro-33-execucao-provisoria-da-pena-qual-e-o-momento-em-que-
se-esgota-a-instancia-recursal-em-2-grau-de-jurisdicao].
25 ABBOUD, Georges. Processo constitucional brasileiro, cit., n. 10.2.7, p. 1182 et seq. ALBUQUERQUE
SANTOS, Maira Bianca Scavuzzi de. O déficit democrático das decisões fundadas no critério de justiça:
a justiça como subterfúgio performático para o ativismo. Dissertação em direito – PUC-SP. São Paulo:
2017. p. 115.
27 SCHMITT, Carl. Teología política. Teólogo de la política. México: Fondo de Cultura Económica, 2001.
I. p. 21.
34 WOOLRYCH, Humphry W. The life of the right honourable Sir Edward Coke. Lord Chief of Justice of
the King’s Bench. London: J. & W. T. Clarke Law Booksellers and Publishers, 1826. MATTEUCCI, Nicola.
Organización del poder y libertad: história del constitucionalismo moderno. Madrid: Editorial Trotta,
1998. n. 4. p. 79-80. Interessante abordagem desse fascinante episódio histórico também pode ser
encontrada em: CASTRO NEVES, José Roberto de. Como os advogados salvaram o mundo. A história da
advocacia e sua contribuição para a humanidade. Nova Fronteira. 2018. p. 127-145.
35 HABERMAS, Jürgen. Realizações e limites do Estado nacional europeu. In: BALAKRISHNAN, Gopal
(Org.). Um mapa da questão nacional. Rio de Janeiro: Contraponto, 2000. p. 305-306.
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29/11/2018 Envio | Revista dos Tribunais
37 DWORKIN, Ronald. Is democracy possible here? Principles for a new political debate. Princeton:
Princeton University Press, 2006. p. 1.
38 DWORKIN, Ronald. Is democracy possible here? cit., p. 5. Para uma análise acerca da
impossibilidade de aceitação de outro ponto de vista ou da realização de debate, merece destaque a
obra de LILLA, Mark. The shipwrecked mind: on political reaction. New York: New York review books,
2016, passim.
42 HÄBERLE, Peter. A dignidade humana como fundamento da comunidade estatal. In: SARLET, Ingo
Wolfgang (Org.). Dimensões da dignidade: ensaio de filosofia do direito e direito constitucional. Porto
Alegre: Livraria do Advogado, 2005. p. 100.
43 HÄBERLE, Peter. A dignidade humana como fundamento da comunidade estatal, cit., p. 133. Ver:
NERY JUNIOR, Nelson; ABBOUD, Georges. Direito constitucional brasileiro. São Paulo: Revista dos
Tribunais, 2017. n. 1.15.1. p. 140.
44 HÄBERLE, Peter. A dignidade humana como fundamento da comunidade estatal, cit., p. 128-129.
47 Nas palavras de Francisco Motta: “Dworkin acredita que nenhum governo é legítimo sem que
endosse dois princípios: 1) governo deve demonstrar igual interesse pelas pessoas que estão sob o seu
domínio; 2) o governo deve respeitar a responsabilidade e o direito dessas pessoas de eleger o que é
valioso para elas” (MOTTA, Francisco. Ronald Dworkin e a decisão jurídica. Salvador: JusPodivm, 2017.
p. 26).
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