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Introdução
O significado do termo educação alicerça as suas origens no Latim. Dentro desta
etimologia, educação significa: criar, alimentar, extrair, conduzir, ou seja, o termo contém
a ideia de um desenvolvimento dirigido que se processa em função das virtualidades
endógenas mas condicionadas pelos seus contributos exógenos.
Este desenvolvimento processa-se em função das crianças e para que estas possam
beneficiar de um ensino de qualidade e justo é imprescindível que os professores
proporcionem um ensino individualizado, variando estratégias e diversificando
metodologias.
Esta condição torna-se mais exigente se a acção do professor se dirigir a crianças
portadoras de uma deficiência. Cabe então ao professor analisar todo o contexto escolar,
social e familiar, no sentido de promover a diferenciação pedagógica e assegurar, de facto,
a inclusão de crianças diferentes.
A escola do ensino regular abarca uma diversidade de alunos que devido às suas
características heterogéneas dificultam o, já por si, difícil processo de
ensino/aprendizagem. Não obstante, a diferenciação pedagógica a par da individualidade
que tem o Projecto Curricular de Turma, assim se pretende, deverão constituir-se como
factores facilitadores quer do processo de ensino/aprendizagem, quer da integração e,
consequentemente, da inclusão da criança diferente.
Numa altura em que, cada vez mais, se fala em escola inclusiva, é imperioso que esta
instituição, na pessoa do professor e dos demais funcionários, esteja preparada para
trabalhar com a diversidade de alunos que a frequentam.
É necessária uma mudança ao nível de mentalidades no que concerne à comunidade
escolar mas também à comunidade em geral.
Como tal, é fundamental que se aposte na formação dos professores e dos demais
funcionários/técnicos que participam no processo educativo da criança/jovem,
especialmente quando se trata de crianças com Necessidades Educativas Especiais
(NEE).
Dentro do grupo de alunos com NEE incluem-se os alunos com deficiência Mental, aos
quais nos reportaremos ao longo do nosso trabalho.
Estas crianças apresentam determinadas características e, na maioria das vezes,
dificuldades cognitivas que influenciam e, ao mesmo tempo, podem prejudicar a sua
aprendizagem. Para além destas dificuldades estes alunos poderão apresentar problemas
ao nível da autonomia pessoal e social, comunicação, relações sócio-afectivas, entre
outros.
Ao longo da reflexão, acerca desta problemática, que nos propusemos fazer, iremos não
só especificar algumas dessas características e dificuldades mas também tentar apresentar
algumas estratégias de actuação, que se devidamente adequadas, poderão ser um
contributo para melhorar o trabalho com estas crianças e ajudar o professor na sua prática
pedagógica.
1- Enquadramento teórico
1.1 - Deficiência mental
Para definirmos deficiência mental temos, obrigatoriamente, de pensar em quociente de
inteligência, na medida em que esta deficiência interfere directamente com o
funcionamento intelectual de qualquer ser humano.
Contudo, nem todos os seres humanos possuem um desenvolvimento intelectual igual
entre si, alguns sofrem de distúrbios intelectuais que advém de causas diversas.
Considerando as causas e os reflexos dos mesmos assim se identifica o tipo de deficiência
de que uma criança possa sofrer.
Desta forma, podemos então dizer que uma criança que apresente um funcionamento
mental geral abaixo da média, associado a problemas de comportamento adaptativo, que
se reflectem quer a nível académico, quer a nível social, e ainda se estes problemas
remontarem às primeiras fases de desenvolvimento que estamos perante um caso evidente
de deficiência mental.
Já Fonseca em (1989: 29) definia a criança deficiente como sendo “ a criança que se
desvia da média ou da criança normal em: 1) características mentais; 2) aptidões
sensoriais; 3) características neuromusculares e corporais; 4) comportamento emocional
e social; 5) aptidões de comunicação e 6) múltiplas deficiências, até de justificar e
requerer a modificação das práticas educacionais ou a criação de serviços de educação
especial no sentido de desenvolver ao máximo as suas capacidades” .
Segundo a American Association of Mental Retardition (A.A.M.R., 1992) a deficiência
mental define-se como funcionamento intelectual geral significativamente inferior à
média, que interfere nas actividades adaptativas e cognitivas.
A mesma fonte refere ainda que o estado de redução notável do funcionamento
intelectual, significativamente inferior à média, se associa em dois ou mais aspectos do
funcionamento adaptativo, tais como: comunicação, cuidado pessoal, competência
doméstica, habilidades sociais, utilização de recursos comunitários, autonomia, saúde e
segurança, aptidões escolares, lazer e trabalho.
1.2 - Inteligência
A estrutura da inteligência é explicada através de três teorias: monárquica, oligárquica ou
bifactorial e multifactorial.
A primeira defende que a inteligência é uma faculdade única ou unitária não composta
por outras faculdades inferiores e remonta ao século XIX.
A segunda, bifactorial, defende a existência de um factor geral, «G», denominado de
inteligência geral e um factor específico, «S», constituído pela capacidade concreta para
cada tipo de actividade. Esta teoria, defendida por Spearman (cit. por Bautista, 1997),
define a inteligência como um conjunto formado pelo factor «G» e os factores «S».
Thurstone (cit. por Bautista, 1997), no que refere à teoria multifactorial, defende que a
inteligência é constituída por um conjunto de factores independentes entre si.
Segundo o autor existem treze factores, dos quais os seis primeiros são considerados
capacidades primárias: compreensão verbal, fluência verbal, factor espacial, factor
numérico, factor memória e factor raciocínio ou indução.
Com base nestas teorias podemos considerar que a inteligência se apresenta numa
concepção determinista, considerando-a de forma estática e reduzindo a capacidade
mental a um número.
Ao falarmos de Quociente de Inteligência (Q.I.) devemos atender a que, aparentemente,
duas pessoas possuem um Q.I. igual, contudo têm diferentes capacidades de resposta e de
adaptação ao meio.
Segundo Sainz e Mayor (1989, cit. por Pacheco 1997: 209) a inteligência pode ser
definida como: “ capacidade para aprender, capacidade para pensar abstractamente,
capacidade de adaptação a novas situações, … [e ainda como] conjunto de processos
cognitivos como memória, caracterização, aprendizagem e solução de problemas,
capacidade linguística ou de comunicação, conhecimento social, …” .
Assim sendo, poderemos dizer que a inteligência é a capacidade que nos permite adaptar,
realizar, resolver problemas, interpretar futuros estímulos para modificar
comportamentos, acumular conhecimentos ou mesmo responder a itens num teste de
inteligência.
Todavia, esta posição nem sempre foi aceite da mesma forma, houveram opiniões
distintas, como o caso de Binet (1905, cit. por Vieira e Pereira, 2003) que considerava a
inteligência como um fenómeno unitário, singular indivisível, considerando, no entanto,
a inteligência como um feixe de tendências.
Por sua vez, Wechsler (1994, cit. por Vieira e Pereira, 2003) apresenta uma opinião
controversa, entendendo o fenómeno da inteligência como um fenómeno agrupado,
composto por muitas aptidões mentais distintas.
Todavia, estudos realizados desde Patton (1986, cit. por Vieira e Pereira, 2003: 42) até
Edwards e Scannel (1968, cit. por Vieira e Pereira, 2003: 42) realçam a importância de
se ter em consideração dois aspectos fundamentais da inteligência: “ o potencial inato do
indivíduo e a expressão funcional do potencial como capacidade utilizável e utilizada” .
Os mesmos autores ainda reforçam a ideia de que o potencial inato é fisiológico enquanto
que os aspectos funcionais são comportamentais.
CLASSIFICAÇÃO EDUCATIVA
Níveis de DM:
Educável- Capaz de aprender matérias académicas (leitura, escrita e matemática).
Treinável- Capaz de aprender as tarefas necessárias na vida diária (comer sozinho, vestir-
se, cuidar da sua higiene pessoal).
Grave e profunda- Não é capaz de valer-se por si mesmo, inclusive nas AVD`s e
comunicação a nível funcional.
COMPORTAMENTOS ADAPTATIVOS
Ligeiro:
Idade pré-escolar (0-5 anos)
Maturação de desenvolvimento:
- pode desenvolver aquisições de comunicação e sociabilidade;
- atraso mínimo nas áreas sensório-motoras;
- não se distingue da criança normal senão numa idade mais avançada.
Idade escolar (6-21 anos)
Educação e treino:
- pode aprender aquisições académicas até ao 6º ano;
- não pode aprender assuntos de nível secundário;
- precisa de educação especial ao nível do secundário.
Idade adulta/Ajustamento social:
- capaz de ajustamento social e vocacional;
- precisa frequentemente de supervisão perante situações económicas e sociais
sofisticadas.
Moderado:
Idade pré-escolar (0-5 anos)
Maturação de desenvolvimento:
- pode aprender a falar e a comunicar;
- reduzida consciência social;
- desenvolvimento motor satisfatório;
- pode beneficiar de treino nas áreas de auto-suficiência;
- pode ser orientado com uma supervisão moderada.
Idade escolar (6-21 anos)
Educação e treino:
- pode aprender aquisições académicas funcionais até ao 4º ano de escolaridade integrado
em educação especial. Idade adulta/Ajustamento social
- apto para ocupações qualificadas;
- precisa de orientação em situações que exijam o mínimo de aquisições.
Severo:
Idade pré-escolar (0-5 anos)
Maturação de desenvolvimento:
- desenvolvimento motor pobre;
- a fala é mínima;
- não beneficia do treino nas áreas de auto-suficiência;
- poucas aquisições na área da comunicação.
Idade escolar (6-21 anos)
Educação e treino:
- pode falar ou aprender a comunicar;
- pode ser treinado nos hábitos de higiene;
- não aprende as aquisições académicas funcionais;
- beneficia de hábitos de treino sistemático.
Idade adulta/Ajustamento social
- pode contribuir parcialmente em tarefas completamente supervisionadas;
- pode desenvolver comportamentos de auto-protecção em envolvimentos controlados.
Profundo:
Idade pré-escolar (0-5 anos)
Maturação de desenvolvimento:
- grande atraso;
- capacidades mínimas para funcionar nas áreas sensório-motoras;
- necessita de cuidados maternais.
Idade escolar (6-21 anos)
Educação e treino:
- regista-se algum desenvolvimento sensório-motor;
- raramente beneficia de treino na área da auto-suficiência;
- necessita de cuidados permanentes.
Idade adulta/Ajustamento social:
- algum desenvolvimento motor e da fala;
- incapaz de auto-manutenção;
- precisa de cuidados de supervisão permanentes.
A área de maior desenvolvimento das crianças deficientes é a do domínio
comportamental, uma vez que, o potencial inato é fisiológico e os aspectos funcionais são
comportamentais.
São estes comportamentos que, definidos por Grossman (1983: 157, cit. por Vieira e
Pereira, 2003: 43) como “ a eficácia ou o grau com que o indivíduo encontra o padrão de
independência pessoal, responsabilidade social esperada para a sua idade e grupo
cultural” , ajudam a criança a adaptar-se às situações quotidianas.
Assim sendo, os professores e educadores deverão centrar-se sobretudo no domínio
comportamental, uma vez que, é neste campo que ocorrem o diagnóstico e a intervenção
educativa.
Considerações finais
De acordo com o Parecer elaborado pelo Conselho Nacional de Educação (1999) “ a
maioria das crianças e jovens com necessidades educativas especiais é constituída por
aqueles que apresentam dificuldades de aprendizagem e/ou problemas de
comportamento, de socialização ou de saúde que não se relacionam com qualquer
deficiência” .
Os alunos com deficiência mental apresentam dificuldades ao nível da aprendizagem,
contudo, a escola do ensino regular deve estar preparada para os receber.
O ensino inclusivo, tão referenciado pelo Despacho Conjunto 105/97, requer o empenho
e esforço de todos os intervenientes no processo educativo, escola, família e comunidade,
em trabalho de parceria.
O Ministério da Educação, ECAE´s e órgãos de gestão e administração das escolas
deveriam trabalhar de uma forma articulada, de modo a proporcionar formação aos
professores que trabalham com alunos com deficiência mental, promovendo acções de
sensibilização e de formação acerca das temáticas relacionadas com esta problemática.
Por sua vez, os professores e técnicos que trabalham com a criança deveriam trabalhar
em parceria, uma vez que as medidas de comportamento adaptativo, para estas crianças,
não podem ser administradas directamente em gabinetes, devem sim resultar de uma série
de observações em diferentes contextos e durante períodos consideráveis de tempo, por
parte desses intervenientes.
As escolas do ensino regular deveriam estar munidas de recursos humanos e materiais
que auxiliassem a integração e aprendizagem deste alunos, nomeadamente, professores
de apoio especializados, psicólogos, terapeutas, entre outros técnicos que possam
contribuir para melhorar as práticas pedagógicas do professor que trabalha com estas
crianças.
Com a realização deste trabalho percepcionamos que os alunos com deficiência mental
apresentam um conjunto de características específicas que dificultam a sua integração na
escola e consequentemente a sua aprendizagem, por tal, pretendemos, de alguma forma,
poder contribuir para promover a inclusão, facilitar a avaliação de diagnóstico, melhorar
as práticas pedagógicas (a nível pessoal e profissional) e fomentar o sucesso educativo da
criança portadora de deficiência mental.
Todavia não podemos nunca esquecer que de nada vale este empenho por parte do
professor se o aluno não tiver uma participação activa no processo, na medida em que, é
fundamental “ reforçar as capacidades do sujeito para gerir ele próprio os seus projectos,
os seus processos, as suas estratégias” (Perrenoud, 1999: 97).
Só através do conhecimento do historial clínico e do processo de desenvolvimento da
criança portadora de deficiência mental, das causas e das características típicas dessa
deficiência e das possibilidades de educabilidade se poderá elaborar, em consciência, um
Plano Educativo Individual e consequentemente um Programa Educativo, que se ajuste
às suas necessidades e contribua para uma efectiva aprendizagem e desenvolvimento de
competências e capacidades garantindo-lhe, assim, o sucesso.
Autoria:
Prof. Fernanda Ferreira
Prof. Marília Dias
Prof. Pedro Santos
Data: Fevereiro de 2006