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[...] para a CEPAL, se havia responsáveis pela miséria e pelo atraso das
populações periféricas, deveriam ser localizados nos latifúndios feudais ou
arcaicos, ou em quaisquer outras atividades pré-capitalistas associadas com o
imperialismo comercial. O subdesenvolvimento nada mais é, portanto, do que
a ausência de capitalismo e não o seu resultado. (MANTEGA, 1991:42)
ainda perdurava na primeira metade do século XX. Assim, para que o socialismo
pudesse ser futuramente atingido, “sem queimar etapas”, seria necessária uma revolução
nacional e democrática que implantasse o capitalismo plenamente no país. Então, o
PCB propunha a formação de uma “frente única antiimperialista e antifeudal”,
congregando grupos e classes diferentes da sociedade brasileira, para que se promovesse
a:
Todavia, Dias (1996) afirma que, em 1958, era evidente que “as metas de
dispêndio não seriam cumpridas”, pois a maior parte das “dotações do ano haviam sido
consumidas na manutenção do sistema já existente”. Lafer (1984: 48) realiza uma
avaliação bastante positiva da implementação do Plano de Metas. Mas, enquanto
demonstra por meio de porcentagens os avanços obtidos no interior de cada setor alvo
do planejamento governamental, o comentário que faz sobre a meta da educação é
muito vago; apenas menciona o aumento progressivo de “verbas orçamentárias
consignadas ao MEC” e o fato do governo ter deixado “subsídios importantes sobre o
problema que resultaram dos trabalhos do ENATEC (Grupo Executivo do Ensino e
Aperfeiçoamento Técnico)”, criado em 1959.
Aparentemente, o planejamento na área educacional havia sido realizado de
forma articulada ao plano global de desenvolvimento, já que a educação possuía lugar
próprio no Programa de Metas, fato que levou à suposição da existência de uma
interdependência entre política educacional e política econômica. Assim, muitos autores
encaminharam as suas análises sobre o período em questão no sentido de examinar em
que medida houve a mencionada correspondência, identificando as defasagens
educacionais frente ao quadro acelerado de transformações em que o país vivia. No
entanto, argumentamos que a crença do governo JK de que a mera expansão do capital
físico seria o fator sine qua non na promoção do desenvolvimento e, principalmente, o
caráter dependente do projeto de modernização em curso, levou a educação a ocupar um
lugar menos relevante, do que usualmente se acredita, no ideário do nacionalismo-
desenvolvimentista de Juscelino. Em depoimento aos pesquisadores do Centro de
Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil (CPDOC), da Fundação
Getúlio Vargas, como parte do projeto Memória do setor de energia elétrica,
desenvolvido pelo Centro da Memória da Eletricidade no Brasil, Lucas Lopes dizia
sobre a meta da educação que:
Essa meta não existiu nem nos primeiros momentos, mas na véspera da
divulgação do plano, Clóvis Salgado, que era muito amigo nosso, amigo do
Juscelino, e havia sido escolhido Ministro da Educação, insistiu: ´Não é
possível que não haja uma meta de educação!` Nós respondemos: ´Então,
Clóvis, escreva a meta de educação, porque estamos esgotados`. Não
sabíamos o que fazer com a meta de educação, não tínhamos preparo para
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Apesar do mea-culpa sobre o passado que realiza, Lucas Lopes (1991: 303)
continuava a afirmar, na entrevista, que não pode haver distribuição de renda que
prejudique a capacidade de crescimento do país, legitimando a antiga, mas ainda muito
em voga, teoria do “bolo”, isto é, que é necessário primeiro que este cresça para depois
dividi-lo. Para justificar a relação existente entre o crescimento econômico e a
concentração de renda no Brasil, era comum a realização do deslocamento das causas da
produção da miséria de um padrão de desenvolvimento bastante excludente para o
problema da qualificação adequada para o mercado de trabalho, através do
estabelecimento de um vínculo contínuo e linear entre industrialização, oferta de
empregos e capacitação. Casimiro (1986: 26) sublinha que a tendência de se
“autonomizar o trato da questão do emprego”, no que se refere “à própria dinâmica da
acumulação”, dificulta, e muitas vezes impede, “a percepção e compreensão da natureza
do trabalho, subordinado ao caráter contraditório, progressivo e antagônico do capital”.
Assim, muitos educadores que incorporaram a visão que condiciona o nível de
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de-obra não especializada [...]” para a execução das tarefas que promoveriam o
crescimento da economia destas nações. Posteriormente, esta tendência teria sido
alterada “da inversão em capital físico para a inversão em capital humano e da
mobilização da força muscular para a mobilização da capacidade mental dos países
subdesenvolvidos”, em função do vínculo direto e indireto que se passou a estabelecer
entre o aumento de produtividade e educação. O autor ainda estava reticente em relação
à este postulado, argumentando que a valorização do papel “ativo” da educação, em si
mesma, para a promoção do desenvolvimento econômico, desconsiderava a
complexidade dos fatores que atuavam como mediadores desta relação. Destacava,
também, o problema dos excedentes que poderia advir da capacitação indiscriminada de
pessoas, muitas vezes incompatível com as tendências reais do desenvolvimento de cada
país, ou seja, na busca por status social os indivíduos acabavam por ter suas
expectativas frustradas. Dessa forma, Mynt (1974) defendia, entre outras medidas, a
necessidade de “não menosprezar” o papel “passivo” da educação, isto é, a formação de
quadros que pudessem suprir o “vazio” existente na estrutura de determinadas
atividades econômicas.
Por outro lado, a proposta de expansão seletiva do sistema escolar pode ser
observada também entre os entusiastas da teoria do capital humano. Em um texto
escrito por Frederick Harbison (1974) para a Conferência sobre Crescimento e
Investimento em Educação, realizada em Washington, em 1961, no qual o autor
abordava a problemática educacional nos países periféricos e a questão do
desenvolvimento, enfatizava-se que um dos principais problemas dos países em
processo de crescimento econômico acelerado é o da “formação de capital humano”.
Assim, o planejamento que visasse a modernização dos países subdesenvolvidos deveria
considerar, além da criação de capital físico, as estratégias para promover o capital
humano, já que o último ocuparia função primordial na mudança de uma sociedade
estática para uma dinâmica. Contudo, a formação de recursos humanos deveria ocorrer
de forma equilibrada, para que os excedentes não se tornassem um risco para a
estabilidade social e política e a carência de profissionais um obstáculo para o
progresso. O talento continuaria determinando as possibilidades de acesso aos níveis
mais elevados de escolarização. No Brasil, a teoria do capital humano encontrou amplo
espaço no discurso que sustentou a política educacional tecnicista do governo militar,
após 1964.
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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
DIAS, José Luciano de Mattos et. al. Democracia e Planejamento Econômico. In: O
BNDES e o Plano de Metas. CPDOC/BNDES/FINAME/BNDESPAR. Editado pelo
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GÓES, Moacyr. Voz Ativa. In: CUNHA, Luiz Antônio e GÓES, Moacyr . O Golpe na
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MANFREDI, Sílvia Maria. Política: Educação Popular. São Paulo: Edições Símbolo,
1978.
VIEIRA, Evaldo. Estado e Miséria Social no Brasil - de Getúlio a Geisel. 4. ed. São
Paulo: Cortez, 1995.