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João Oliveira

Apontamentos de

Estabilidade de Voo

Versão de 31 de Dezembro de 2015


Conteúdo

1 Conceitos introdutórios e notação 1


1.1 Equilíbrio e estabilidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 1
1.2 Referenciais e convenções . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 2
1.3 Características geométricas das asas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 3
1.4 Resultantes das forças aerodinâmicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 5
1.5 Coeficiente de sustentação e ângulo de ataque . . . . . . . . . . . . . . . . . 7

2 Equilíbrio, Estabilidade e Controlo Longitudinais 13


2.1 Voo de uma asa: equilíbrio e estabilidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 13
2.2 Sustentação e momento de picada de uma aeronave . . . . . . . . . . . . . . 19
2.3 Sustentação e momento de picada em função do ângulo de ataque . . . . 25
2.4 Equilíbrio, Estabilidade e Controlo Longitudinais . . . . . . . . . . . . . . . . 29

3 Estabilidade com Manche Livre e Forças de Controlo 36


3.1 Momento de charneira de superfície de controlo . . . . . . . . . . . . . . . . 36
3.2 Sustentação e momento de picada com manche livre . . . . . . . . . . . . . 38
3.3 Compensadores e equilíbrio com manche livre . . . . . . . . . . . . . . . . . 41
3.4 Equilíbrio com deflexão do compensador . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 42
3.5 Forças de Controlo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 43

4 Efeitos de superfícies hiper-sustentadoras e da propulsão na estabilidade


longitudinal 47
4.1 Influência de superfícies hiper-sustentadoras . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47
4.2 Influência da propulsão no equilíbrio e na estabilidade . . . . . . . . . . . . 49

5 Estabilidade Lateral-Direccional 52
5.1 Estabilidade direccional . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 52
5.2 Estabilidade lateral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 57

6 Equações do Movimento 69
6.1 Referenciais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 69
6.2 Ângulos de Euler e matrizes de rotação . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 70
6.3 Equações de Euler . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 75
6.4 Rotores em movimento . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 77
6.5 Sistemas de eixos do corpo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 77

i
7 Estados Estacionários e Manobras 81
7.1 Forças e momentos aplicados a uma aeronave . . . . . . . . . . . . . . . . . 81
7.2 Estados estacionários longitudinais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 85
7.3 Estados estacionários laterais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 88
7.4 Manobras . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 89
7.5 Manobra de descida-subida simétrica . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 89
7.6 Manobra de Viragem Estacionária . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95

8 Teoria para Pequenas Perturbações 100


8.1 Definição do estado estacionário . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 100
8.2 Linearização das equações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 102
8.3 Forma geral das equações . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 106

9 Derivadas de Estabilidade 108


9.1 Relações entre derivadas de estabilidade dimensionais e adimensionais . 108
9.2 Derivadas adimensionais relativas a movimento longitudinal . . . . . . . . 114
9.3 Derivadas relativas ao movimento lateral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 122

10 Estabilidade Dinâmica Longitudinal 131


10.1 Introdução . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 131
10.2 Sistemas de equações diferenciais ordinárias de 1ª ordem . . . . . . . . . . 131
10.3 Modos longitudinais: características típicas . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 135
10.4 Modos longitudinais aproximados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 144
10.5 Teoria Geral da Estabilidade Longitudinal Estática . . . . . . . . . . . . . . . 150
10.6 Efeito da posição do centro de massa . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 151
10.7 Efeito do Vento nos Modos Longitudinais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 154
10.8 Modos longitudinais em atmosferas estratificadas . . . . . . . . . . . . . . . 157

11 Estabilidade Dinâmica Lateral 160


11.1 Modos laterais . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 160
11.2 Modos laterais aproximados . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 168

12 Resposta à Actuação de Controlo 174


12.1 Matrizes e vectores de controlo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 174
12.2 Método das transformadas de Laplace . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 176
12.3 Resposta longitudinal . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 182
12.4 Resposta lateral . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 194
12.5 Resposta transiente a ailerons e rudder . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 200

13 Qualidades de Voo 205


13.1 Classificação de aeronaves e fases de voo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 205
13.2 Níveis de qualidades de voo . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 205
13.3 Aplicação dos critérios a um Cessna 182 . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 208

A Equilíbrio e estabilidade para configurações canard 211


A.1 Características das configurações canard . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 211
A.2 Equilíbrio e estabilidade . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 212
A.3 Condições de equilíbrio . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 215

Bibliografia 217

ii
Capítulo 1

Conceitos introdutórios e
notação

1.1 Equilíbrio e estabilidade


O nosso objectivo será analisar estados de equilíbrio do voo de aeronaves e a sua
estabilidade. Comecemos pois por recordar as noções de equilíbrio e estabilidade de
um sistema.
Um sistema num estado de equilíbrio permanece nesse estado se não houver per-
tubações pela acção de forças ou momentos. Habitualmente, a condição de equilíbrio
mecânico de um sistema é
X
F~ = 0
X
M~ =0

A estabilidade de um estado de equilíbrio pode ser estática ou dinâmica. Relati-


vamente à estabilidade estática, um estado de equilíbrio é estável se o sistema voltar
ao estado de equilíbrio após dele ser afastado; é instável se o sistema se continuar
a afastar do estado de equilíbrio após o afastamento inicial; e é neutro se após um
afastamento inicial, o sistema não tende nem a retornar ao equilíbrio nem a dele se
afastar.
A estabilidade dinâmica diz respeito ao modo como o sistema evolui depois de afas-
tado do estado de equilíbrio: um sistema dinamicamente estável tende assimpotica-
mente para o estado de equilíbrio, enquanto que um sistema dinamicamente instável

Equilíbrio Estável Equilíbrio Instável Equilíbrio Neutro

Figura 1.1: Estabilidade estática do equilíbrio.

1
1.0
4

0.5
2

0.5 1.0 1.5 2.0 2.5 3.0 0.5 1.0 1.5 2.0 2.5 3.0

-2
-0.5

Equilíbrio dinamicamente estável Equilíbrio dinamicamente instável

Figura 1.2: Estabilidade dinâmica do equilíbrio.

sofre oscilações com amplitude crescente ou afasta-se cada vez mais da posição de
equilíbrio.

1.2 Referenciais e convenções


Para se poder analisar o movimento de uma aeronave é necessário definir os refe-
renciais nos quais a análise será realizada. Considerar-se-á como referencial inercial
um referencial ligado à Terra. Os efeitos de curvatura da Terra serão desprezados e a
força gravítica terá sempre a direcção vertical.
Na figura 1.3 representa-se o referencial ligado à aeronave. Os eixos estão definidos
de forma que Cxz é o plano de simetria. O eixo Cx, ao longo da fuselagem, aponta
para o nariz da aeronave e Cz está dirigido «para baixo». Finalmente, o eixo Cy
é perpendicular ao plano de simetria, formando triedro directo com os outros dois
eixos.

Figura 1.3: Sistema de eixos ligado à aeronave.

~ são designadas por v


As componentes segundo x, y, z da velocidade linear v ~ =

2
(u, v, w). As componentes da velocidade angular são ω ~ = (p, q, r ). Assim, p é a
velocidade angular de rolamento (roll), q é a velocidade angular de picada (pitch) e r é
a velocidade angular de guinada (yaw).
As componentes segundo x, y, z das forças aplicadas à aeronave serão designa-
das simplesmente por F~ = (X, Y , Z), enquanto que as componentes dos momentos
são M~ = (L, M, N), sendo L o momento de rolamento, M: momento de picada e L o
momento de guinada.

1.3 Características geométricas das asas


1.3.1 Perfil da asa
Uma das principais características de uma asa é o seu perfil, que pode ser simétrico
ou ter curvatura.
No caso de um perfil simétrico, a linha média entre o intra dorso e o extra dorso
da asa é um segmento de recta.

Figura 1.4: Perfil simétrico (em cima) e perfil com curvatura positiva (em baixo). Na
figura, LE designa o bordo de ataque (leading edge) e TE o bordo de fuga (trailing
edge).

Para uma asa com perfil com curvatura, a linha média entre o intra dorso e o extra
dorso da asa é uma linha curva. A curvatura é positiva se a concavidade da linha média
está para baixo, e é negativa no caso oposto.

1.3.2 Planta da asa


A envergadura b e a corda c definem-se para uma asa de planta rectangular como
mostra a figura 1.5.

• c: corda (chord)

3
• b: envergadura (span)
• A: alongamento (aspect ratio)
• S: área da asa (em planta)

Figura 1.5: Envergadura b e corda c de uma asa de planta rectangular

O alongamento A pode ser definido por A = b/c, mas é preferível reescrever a


expressão fazendo uso da área da asa S:
b2
A= . (1.1)
S
Esta definição é válida também para asas não rectangulares.
No caso de uma asa com flecha, como aquela cuja planta está representada na
figura 1.6, a corda pode variar ao longo da envergadura. A corda do bordo marginal
(tip chord) é designada por ct e a corda da raiz da asa (root chord) por cr . A corda
média c̄ é calculada a partir da variação c(y) da corda ao longo da envergadura.
O ângulo de flecha (sweep angle) é designado por Λ e pode determinar-se para o
bordo de ataque, o bordo de fuga, a meia corda ou a qualquer outra fracção da corda.
O afilamento λ (taper ratio) é definido por
ct
λ= . (1.2)
cr

Figura 1.6: Asa de planta trapezoidal. ΛLE é o ângulo de flecha do bordo de ataque (LE:
leading edge), cr é a corda da raiz da asa e ct é a corda do bordo marginal da asa.

1.3.3 Ângulo de diedro


A figura 1.7 representa um avião com asas com ângulo de diedro Γ positivo.
Note-se que em inglês se usa dihedral para um ângulo de diedro positivo Γ > 0 e
anhedral para um ângulo de diedro negativo Γ < 0.

4
Figura 1.7: Ângulo de diedro.

1.4 Resultantes das forças aerodinâmicas


Se existe um escoamento em torno da asa, produzem-se forças e momentos aerodi-
nâmicos, que dependem de vários parâmetros. Um dos principais é o ângulo de ataque
do escoamento.

1.4.1 Ângulo de ataque


O ângulo de ataque, representado na figura 1.8, é o ângulo entre a linha de referên-
cia e a direcção do escoamento incidente. É designado por α.
Podem definir-se vários ângulos de ataque, dependendo da linha de referência que
se toma. Se a linha de referência é a linha de corda, temos o ângulo de ataque «geomé-
trico» da asa.

1.4.2 Sustentação, resistência aerodinâmica e momento de picada


As forças aerodinâmicas distribuem-se ao longo de todo o perfil. Este sistema de
forças distribuídas é equivalente a uma força resultante e a um momento resultante
(ver figura 1.9). Por conveniência, a força resultante é decomposta em duas direcções
perpendiculares: a componente na direcção da velocidade do escoamento é a resistên-
cia aerodinâmica (drag, D), a componente perpendicular à velocidade é a sustentação
(lift, L).
O centro de pressões é o ponto relativamente ao qual o sistema de forças aerodinâ-
micas é equivalente apenas a sustentação + resistência, não havendo momento resul-
tante. No entanto, o centro de pressões não é um ponto fixo, depende do escoamento
em torno do perfil alar. Em particular, a posição do centro de pressões desloca-se para
o bordo de ataque da asa à medida que o ângulo de ataque aumenta (ver figura 1.10).
A utilização prática do centro de pressões fica deste modo comprometida porque é
necessário calcular a sua posição sempre que se altera o ângulo de ataque da asa, o
que é deveras inconveniente.

Figura 1.8: Ângulo de ataque

5
é equivalente a

OU
L e D aplicados no centro de L, D e MP aplicados no ponto P
pressões (c.p.) (arbitrário)

Figura 1.9: As forças aerodinâmicas são equivalentes a resultante ou a resultante +


momento

Figura 1.10: O centro de pressões desloca-se para o bordo de ataque à medida que
aumenta o ângulo de ataque. Nota: O aumento de L e D com α não está representado.

6
Figura 1.11: Centro aerodinâmico

1.4.3 Centro aerodinâmico


De acordo com a teoria aerodinâmica de asas delgadas, existe um ponto fixo relati-
vamente ao qual o momento de picada M não depende do ângulo de ataque, e que se
encontra a 1/4 de corda. A esse ponto dá-se o nome de centro aerodinâmico. Numa
asa real o centro aerodinâmico não se encontra habitualmente no ponto xac = c̄/4.
Porém, esta é uma boa aproximação em muitos casos.
O momento de picada relativamente ao centro aerodinâmico Mac é constante, ou
seja, é independente do ângulo de ataque. O seu valor depende da curvatura do perfil.
Para um perfil simétrico, Mac = 0, para um perfil com curvatura positiva, Mac < 0, e
para um perfil com curvatura negativa, Mac > 0.
Podemos finalmente concluir que as forças aerodinâmicas aplicadas numa asa são
equivalentes a uma força resultante aplicada no centro aerodinâmico, decomposta em
sustentação L (perpendicular à velocidade) e resistência aerodinâmica D (na direcção
da velocidade), e um momento de picada Macw relativamente ao C.A. (ver figura 1.11).

1.5 Coeficiente de sustentação e ângulo de ataque


1.5.1 Coeficiente de sustentação de perfis
Para um escoamento de um fluido com massa volúmica ρ e velocidade V , a pressão
dinâmica define-se como:
1
pd = ρV 2 . (1.3)
2
Verifica-se experimentalmente que a sustentação e a resistência aerodinâmica de
uma asa são (aproximadamente) proporcionais à pressão dinâmica e à área da asa. Os
outros factores, tais como a geometria da asa (perfil e planta) e o ângulo de ataque, po-
dem ser incluídos num coeficiente adimensional. Definimos coeficiente de sustentação

7
Perfil simétrico Perfil com curvatura positiva

Figura 1.12: Variação do coeficiente de sustentação com o ângulo de ataque.

e coeficiente da resistência aerodinâmica como:


L L
CL = = 1 (1.4)
pd S 2
ρV 2 S

D D
CD = = 1 (1.5)
pd S 2
ρV 2 S

Habitualmente, convém distinguir os efeitos devidos apenas ao perfil (o que equi-


vale a considerar uma asa de envergadura infinita, em que o escoamento pode ser
considerado bidimensional) dos efeitos devidos ao alongamento, forma da asa, etc.
Usaremos para isso a notação L e CL para a sustentação e respectivo coeficiente adi-
mensional para asas finitas e ` e C` para os casos correspondentes a perfis («asas
infinitas»). É importante não confundir C` , que é o coeficiente de sustentação do per-
fil, com Cl que é o coeficiente do momento de rolamento e que será definido mais à
frente. Note-se ainda que C` se define como

`
C` = .
(1/2)ρV 2 c

A figura 1.12 mostra a variação do coeficiente de sustentação com o ângulo de


ataque, para asas com perfil simétrico e com curvatura positiva. A forma das curvas é
semelhante, mas os valores de C`max e de C`0 = C` (α = 0) são diferentes.
Na figura 1.13 mostra-se o efeito da curvatura do perfil na curva C` vs. α. A
forma das curvas é semelhante, sofrendo uma translação para cima quando a curvatura
aumenta. Por isso, quanto maior for a curvatura do perfil, maior é o valor de C`max e
de C`0 = C` (α = 0). As asas com curvatura positiva permitem ter sustentação com
ângulos de ataque nulos.
Após atingir o valor C`max , se o ângulo de ataque α continuar a aumentar, o coe-
ficiente de sustentação diminui: a asa entra em perda. Habitualmente vamos estar
interessados em que o ângulo de ataque esteja dentro da zona de variação linear do
C` com α, bem longe da zona de perda.
O declive da curva do C` em função do ângulo de ataque, constante na zona linear,

8
Figura 1.13: Efeito da curvatura do perfil na curva C` vs. α

é designada por C`α :


∂C`
C`α = .
∂α
Na teoria de perfis delgados o C`α tem um valor bem determinado: C`α = 2π rad−1 ≈
0.1097/o . Esta aproximação permite ter uma ideia dos valores típicos do C`α , mas para
perfis reais é necessário usar teorias mais exactas.
Em primeira aproximação pode afirmar-se que a sustentação de um perfil é causada
pela vorticidade do escoamento em torno do perfil (figura 1.14). Se uma aeronave
está inicialmente em repouso num fluido ideal, a vorticidade total é nula. Quando
a aeronave começa a voar, forma-se um vórtice que permanece ligado à asa e que
provoca sustentação e é libertado um outro vórtice, de vorticidade oposta, de modo
que a vorticidade total se mantenha nula, como representado na figura 1.15. Note-se
que a jusante da asa o escoamento é deflectido verticalmente para baixo (downwash),
como consequência do vortice ligado e portanto do aparecimento da sustentação. O
downwash será tanto maior quanto maior for a sustentação criada.

1.5.2 Coeficiente de sustentação de asas finitas


Numa asa infinita o escoamento pode ser considerado bidimensional e a única coisa
que interessa é o perfil. Numa aeronave real a asa é finita e perto do bordo marginal da
asa o escoamento torna-se tridimensional. Como a pressão é superior na parte inferior
da asa, o ar tende a deslocar-se da parte inferior para a parte superior e forma-se um
vórtice do bordo marginal. Este vórtice cria na asa um campo de velocidades verticais
para baixo que tem como efeito uma diminuição do ângulo de ataque efectivo na asa,
levando a uma diminuição da sustentação e também a uma diminuição do declive da
curva do coeficiente de sustentação vs. α.
A importância dos efeitos tridimensionais é tanto maior quanto menor for o alonga-
mento da asa. Entre os declives das curvas do coeficiente de sustentação com o ângulo
de ataque para asas finitas (CLα ) e para perfis ou asas infinitas (C`α ) verifica-se que:
• CLα < C`α

• CLα decresce mais para A menores

9
Figura 1.14: A sustentação de um perfil é causada pela vorticidade do escoamento em
torno do perfil. Fonte: Aircraft Flight, Barnard & Philpott

Figura 1.15: Vórtice ligado, vórtice libertado e downwash

10
Figura 1.16: Vórtice do bordo marginal. Fonte: Aircraft Flight, Barnard & Philpott

Figura 1.17: Variação do CL com α para asas com o mesmo perfil e alongamentos
diferentes

A figura 1.17 exemplifica a variação do coeficiente de sustentação para asas com o


mesmo perfil mas com alongamentos diferentes. É possível estabelecer relações mais
explícitas entre CLα e Clα em muitas situações. O caso mais simples é o de uma distri-
buição elíptica de sustentação, em que

A
CL α = C` α (1.6)
A+2
Na zona de linearidade com α, o coeficiente de sustentação é dado por

CL = CL0 + CLα α (1.7)

O coeficiente de resistência aerodinâmica (drag) pode ser dado através da polar:

CD = CD0 + CDi (1.8)


1
CDi = C2 (coeficiente de resistência induzida) (1.9)
π eA L

11
Figura 1.18: Ângulo de ataque em relação à linha de corda

Figura 1.19: Ângulo de ataque absoluto: medido em relação à linha de sustentação


nula

1.5.3 Ângulo de ataque absoluto


Na relação (1.7), exemplificada na figura 1.18, aparece o coeficiente de sustentação
para ângulo de ataque nulo, CL0 . Normalmente é conveniente medir os ângulos de
ataque em relação à linha de sustentação nula (l. s. n.), que é direcção do escoamento
correspondente ao ângulo de ataque que torna a sustentação nula (CL = 0), com o se
exemplifica na figura 1.19. Nesse caso, temos:

CL = CL0 + CLα α (1.10)


CL0
αL=0 = − (1.11)
CL α
αabs = α − αL=0 (1.12)
CL0
αabs = α + (1.13)
CL α

Os ângulo de ataque medidos relativamente à linha de sustentação nula são chama-


dos ângulos de ataque absolutos, αabs , relativamente aos quais se tem simplesmente:

CL = CLα αabs (1.14)


Note-se que o declive CLα não se altera, porque apenas foi feita uma mudança de
origem da curva.

12
Capítulo 2

Equilíbrio, Estabilidade e
Controlo Longitudinais

Neste capítulo pretendem-se estabelecer as condições de equilíbrio e estabilidade


para uma aeronave em voo rectilíneo. Trataremos apenas do equilíbrio e da estabi-
lidade longitudinais, isto é, relativos aos movimentos em que a aeronave se mantém
no seu plano de simetria. O equilíbrio e estabilidade laterais serão tratados noutro
capítulo.

2.1 Voo de uma asa: equilíbrio e estabilidade


Começaremos por determinar as condições para que uma asa com perfil com cur-
vatura positiva e sem torção possa voar em equilíbrio e verificar se esse equilíbrio é
estável.

2.1.1 Equilíbrio de uma asa voadora


As condições de equilíbrio a verificar são, no referencial da asa,
!
X ~
dV
F~ = m +ω~ ×V ~ =0 (2.1)
dt
!
X dH~G
~
MG = +ω ~
~ × HG = 0 (2.2)
dt
Vamos considerar o caso simples de um voo rectilíneo horizontal (p = q = r = 0),
com velocidade constante (u̇ = v̇ = ẇ = 0), e sem derrapagem (v = 0) de uma asa com
perfil com curvatura positiva e sem torção. Supomos que a asa dispõe de um sistema
de propulsão que lhe permite vencer a resistência aerodinâmica. Começaremos por
determinar que forças e momentos aerodinâmicos estão aplicados na asa.

Forças aerodinâmicas
As forças e momentos aerodinâmicos aplicados à asa voadora que se desloca com
velocidade V com um ângulo de ataque αw (medido relativamente à sua linha de sus-

13
Figura 2.1: Forças e momentos aerodinâmicos aplicados numa asa em voo com veloci-
dade V e ãngulo de ataque αw .

tentação nula) estão representados na figura 2.1, onde L designa a sustentação, D a


resistência aerodinâmica e Mac o momento de picada relativo ao centro aerodinâmico.
A distância (na direcção x) entre o bordo de ataque da asa e o centro de massa é
representada por hc̄. Dito doutro modo, h é a distância entre o bordo de ataque da asa
e o centro de massa, adimensionalizado pela corda média c̄. A distância (na direcção
x) entre o bordo de ataque da asa e o seu centro aerodinâmico, adimensionalizado
pela corda média c̄, é representada por hnw .
Para além das forças aerodinâmicas, estão também aplicadas à asa a força de pro-
pulsão, cuja linha de acção admitimos ser Gx, e o peso, cuja linha de acção é vertical.
Para pequenos ângulos de ataque α são válidas as seguintes aproximações:
• cos α ≈ 1
• sin α ≈ α
Estas aproximações são válidas se α2  1, com α em radianos. Note-se que 0.3 rad ≈
17◦ , pelo que esta aproximação é razoável para a maioria dos casos de interesse.
A componente segundo x das forças aerodinâmicas é, pela figura 2.1,

(FA )x = L sin αw − D cos αw ≈ Lαw − D. (2.3)

Supomos que a força de propulsão T é a necessária para garantir o equilíbrio na direc-


ção Cx:
T = D cos αw − L sin αw ≈ D − Lαw . (2.4)
Uma vez que a força de propulsão é determinada pelo piloto, esta condição pode ser
sempre verificada.
A componente segundo z das forças aerodinâmicas é

(FA )z = L cos αw + D sin αw . (2.5)

14
Dado que supomos que o ângulo de ataque é pequeno (α2  1) e que a resistên-
cia aerodinâmica é muito menor que a sustentação, podemos supôr que L cos αw 
D sin alphaw . A condição de equilíbrio para as forças segundo Gz é, para voo rectilí-
neo horizontal, X
Fz = 0 ⇒ W = L cos αw + D sin αw ≈ L. (2.6)
Concluímos que, de forma aproximada, para haver equilíbrio

L = W. (2.7)

Em voo rectilíneo horizontal a sustentação tem de igualar o peso da aeronave.

Momento de picada relativamente ao centro de massa


O momento de picada relativamente ao centro de massa é dado por

MG = Mac w + (hc̄ − hnw c̄) [L cos αw + D sin αw ] + zG [L sin αw − D cos αw ] (2.8)

Para pequenos valores do ângulo de ataque α,

MG = Mac w + (hc̄ − hnw c̄) [L + Dαw ] + zG [Lαw − D] (2.9)

Usando os coeficientes de sustentação (1.4) e de resistência aerodinâmica (1.5),


L D
CL = 1 , CD = 1 ,
2
ρV 2 S 2
ρV 2 S

e definindo o coeficiente do momento de picada relativamente ao centro de massa


como
M
Cm = 1 , (2.10)
ρV 2 S c̄
2
obtemos, para pequenos ângulos αw
zG
Cm = Cmac w + (h − hnw )CLw + [CLw αw − CDw ] (2.11)

Supondo agora que o centro de massa da asa voadora se encontra aproximadamente
no eixo x, ou seja, que (zG /c̄) e, atendendo a que αw é pequeno e a que habitualmente
em voo de cruzeiro CDw  CLw , o último termo pode ser desprezado face aos outros
dois. Obtemos então
Cmw = Cmac w + (h − hnw )CLw (2.12)

Sustentação e velocidade de equilíbrio


A condição (2.7) de equilíbrio para as forças segundo z permite encontrar um valor
para o coeficiente de sustentação que garante esse equilíbrio se a asa voar a uma
velocidade V :
W
L = W ⇒ CLw = 1 . (2.13)
2
ρV 2 S
No caso do momento de picada, a condição de equilíbrio é M = 0 ⇒ Cm = 0, pelo
que
Cmw = Cmac w + (h − hnw )CLw = 0. (2.14)

15
Figura 2.2: Variação de Cm com CL

Como CL > 0 e, para asas com curvatura positiva, Cmac w < 0, é sempre possível encon-
trar um valor de CLw que garante o equilíbrio do momento de picada:

−Cmac w
CLeq = ,
(h − hnw )

como se mostra na figura 2.2. A este valor CLeq corresponde uma velocidade de equilí-
brio dada por
W W
CL w = 1 ⇒ V2 = 1 .
2
ρV S ρCLw S
2 2
v
−Cmac w u −W (h − hnw )
u
CLeq = , logo Veq = t 1 . (2.15)
(h − hnw ) C
2 mac w
ρS

Na equação (2.15) os parâmetros que estão fixos em cada situação de voo são W , hnw ,
Cmac w , ρ e S. O único parâmetros que é fácil modificar é a posição do centro de massa,
h. Logo, na ausência de leme de profundidade ou superfícies de controlo equivalentes,
Veq fica determinada por h (posição do CM)!

2.1.2 Estabilidade do ponto de equilíbrio


A variação de Cm com CL é linear, como mostra a equação (2.12) e o ponto de
equilíbrio é aqele para o qual Cm = 0. Dado que o coeficiente de sustentação depende
do ângulo de ataque, o coeficiente do momento vai também depender de αw . Na zona
de linearidade, CLw = CLαw αw ⇒ Cm = Cmac w +CLαw (h−hnw )αw , como se representa na
figura 2.3. O valor de αeq é o que garante Cm = 0, e este valor por sua vez, determina
CLeq .
Para determinarmos se este ponto de equilíbrio é estável, vejamos o que acontece
se por alguma razão o ângulo de ataque for ligeiramente aumentado relativamente a
αeq . Como se pode verificar pela figura 2.4, se existir uma perturbação no voo que
fizer α aumentar, o coeficiente de sustentação CL aumentará também, o que leva a
uma resultante não nula na vertical, conduzindo a uma aceleração vertical para cima.

16
Figura 2.3: Variação de CL (esquerda) e Cm (direita) com αw

Figura 2.4: Efeito da variação de α no CL .

Figura 2.5: Efeito da variação de α no Cm .

17
Figura 2.6: Forma da variação de Cm com α desejável para se conseguir um voo em
equilíbrio estável.

Esta aceleração faz aparecer uma componente vertical da velocidade da asa, para cima,
que provoca uma diminuição do ângulo de ataque, o qual, por sua vez, implica uma
diminuição do CL e um retorno à situação inicial. Uma situação em tudo semelhante,
mas com os sentidos invertidos, aconteceria se a perturbação no voo fizesse diminuir
o ângulo de ataque. Conclui-se que, relativamente ao movimento na direcção vertical,
o voo é estável. (Uma análise mais pormenorizada será feita quando tratarmos da
estabilidade dinâmica e, em particular, do modo de periodo curto).
Na figura 2.5 representa-se o efeito sobre o momento de picada de um aumento do
ângulo de ataque. Verifica-se que um aumento de α leva a um aumento de Cm , o que
conduz a uma aceleração angular de picada q̇ > 0 e portanto ao aparecimento de uma
velocidade angular de picada q > 0, de modo que o bordo de ataque da asa levanta;
isto leva a um aumento ainda maior de α, que por sua vez faz Cm aumentar ainda mais
e o bordo de ataque levantar ainda mais etc. Produz-se um afastamento da situação
inicial, pelo que se conclui que o equilíbrio não é estável relativamente ao momento de
picada. Chegar-se-ía à mesma conclusão se inicialmente se admitisse uma diminuição
do ângulo de ataque.
Em resumo, conclui-se que uma asa pode voar em equilíbrio, mas esse equilíbrio
não é estável. Para se ter um ponto de equilíbrio estável a configuração projectada
deve conduzir a uma variação do Cm com α como mostrado na figura 2.6, cortando
o eixo dos α de modo a garantir o equilíbrio e com um declive negativo de modo a
garantir estabilidade. O valor de Cm para α = 0 terá então de ser positivo. A maneira
mais frequente de conseguir uma variação deste tipo é acrescentar um estabilizador
horizontal, e é este tipo de configuração que analisaremos em seguida.
Note-se, finalmente, que é possível projectar asas voadoras, mas é necessário nesse
caso usar asas com perfil, flecha e torção não habituais na maioria das aeronaves con-
vencionais.

18
2.2 Sustentação e momento de picada de uma aeronave
Vimos que uma asa voadora pode voar em equilíbrio, mas esse equilíbrio não é
estável. Uma maneira de resolver este problema é acoplar um estabilizador horizontal
à asa. Nas configurações convencionais a asa e o estabilizador estão ligados a uma
fuselagem, e o sistema de propulsão pode estar ligado à asa ou à fuselagem.
Note-se que, por enquanto, não nos vamos preocupar com o controlo da velocidade
de equilíbrio, que se consegue com um leme de profundidade (elevator).
O equilíbrio do voo e a sua estabilidade dependem da sustentação e do momento de
picada da aeronave. Por isso, começaremos por determinar as contribuições devidas à
asa+fuselagem, ao sistema de propulsão e ao estabilizador horizontal separadamente
e usaremos os índices wb (de wing-body), P (de propulsão) e t (de tail) para indicar as
respectivas contribuições.

2.2.1 Contribuição da asa + fuselagem


Os escoamentos em torno da asa e da fuselagem interferem mutuamente. No en-
tanto, a asa é a superfície sustentadora mais importante e a sua contribuição para L e
M é a mais importante. Por isso podemos admitir que a contribuição da asa+fuselagem
para a sustentação e o momento de picada é semelhante à da asa, variando apenas a
posição do centro aerodinâmico, o momento de picada relativamente ao CA e o declive
da curva CL vs. α:
• hnwb < hnw ≈ 0.25,

• CLαwb < CLαw ,


• Cmac wb < Cmac w < 0.
Para simplificar a escrita vamos usar a seguinte notação simplificada para o declive
da curva CL vs. α:
∂CL
a ≡ CLα = . (2.16)
∂α
Por exemplo, aw = CLαw e awb = CLαwb .
Como referido acima, admite-se que o coeficiente do momento de picada relativa-
mente ao centro de massa da aeronave tem a mesma forma da contribuição da asa:

Cmwb = Cmac wb + (h − hnwb )CLwb . (2.17)

Na zona de linearidade de CL com α podemos escrever

CLwb = awb αwb , (2.18)


Cmwb = Cmac wb + (h − hnwb )awb αwb . (2.19)

Note-se que αwb é medido relativamente à linha de sustentação nula da asa+fuselagem,


que não é a mesma que a linha de sustentação nula apenas da asa.

19
Figura 2.7: Efeito do downwash na velocidade do escoamento incidente no estabiliza-
dor

2.2.2 Contribuição do sistema propulsivo


O sistema propulsivo contribui para o momento de picada quer pelo momento cri-
ado pelas forção de propulsão, que é nulo se a linha de propulsão passa pelo CM,
quer pela interação aerodinâmica (perturbação no escoamento causada pela propul-
são). Dada a grande variedade de sistemas de propulsão, é difícil encontrar expressões
gerais. Habitualmente admite-se que a linha de propulsão passa pelo centro de massa
e sempre que seja necessário pode-se incluir um termo

CmP = (CmP )0 + (CmP )α αwb , (2.20)

admitindo que a variação do CmP com o ângulo de ataque é linear. Os coeficientes


(CmP )0 e (CmP )α terão de ser determinados em cada caso.

2.2.3 Contribuição do estabilizador


O estabilizador horizontal é uma superfície sustentadora, tendo a cauda isolada
tem um comportamento semelhante a uma asa. Porém, quanto montada numa aero-
nave, o escoamento incidente no estabilizador é alterado pela interferência da asa e da
fuselagem. O aspecto mais importante é o downwash.
~ representa a velocidade do escoamento incidente na asa, V
Na figura 2.7, V ~ 0 a ve-
locidade efectiva («média») do escoamento na cauda e V ~d a velocidade induzida pelo
downwash. A figura 2.7 permite concluir que o downwash conduz a uma diminuição do
ângulo de ataque efectivo no estabilizador e a uma alteração do módulo da velocidade
(que é habitualmente desprezável).

Sustentação do estabilizador
Definimos o ângulo de downwash ε como o ângulo que traduz a diminuição média
do ângulo de ataque local. Na figura 2.8 a sustentação Lt e a resistência aerodinâmica
Dt do estabilizador são definidos relativamente à direcção de V ~ 0 , que é a velocidade
efectiva («média») do escoamento na cauda.
A sustentação total é a componente ⊥ V ~ (velocidade incidente na asa) da força ae-
rodinâmica resultante. A contribuição do estabilizador horizontal para a sustentação
total é:
Lt cos ε − Dt sin ε ≈ Lt . (2.21)

20
Figura 2.8: Sustentação e resistência aerodinâmica na cauda e ângulos de ataque e de
downwash

Para a adimensionalização da sustentação da cauda usa-se a pressão dinâmica na


1
cauda ( 2 ρV 0 2 ) e a área do estabilizador (St ). Logo

Lt
CL t = 1 . (2.22)
2
ρV 0 2 St

No regime linear,
CLt = at αt . (2.23)
Note-se que at e αt devem ser medidos in situ, não com a cauda isolada. Deste modo
at inclui já os efeitos da interferência da asa e da fuselagem no escoamento incidente
no estabilizador.
A sustentação total da aeronave (L) é a soma da contribuição da asa+fuselagem, Lwb
e da contribuição da cauda, Lt :
L = Lwb + Lt . (2.24)
Para a adimensionalização da sustentação total convém ter em conta que a asa
constitui claramente a contribuição mais importante para a sustentação. Por isso (e
porque as contas ficam facilitadas) adimensionaliza-se a sustentação total pela área da
asa S ≡ Sw .
L Lwb Lt Lt
CL = 1 = 1 + 1 = CLwb + 1 . (2.25)
ρV 2S ρV 2S ρV 2S ρV 2S
2 2 2 2

Mas, tendo em conta (2.22),


2
1 1 V0 St 1 St

2
Lt = ρV 0 St CLt = ρV 2 S CL = ρV 2 S ηt CLt (2.26)
2 2 V S t 2 S
em que
2
V0

ηt ≡ . (2.27)
V
O módulo da velocidade é habitualmente pouco afectado pelo downwash, admitindo-se
normalmente que ηt ≈ 1. A sustentação total é então

St St
CL = CLwb + ηt CLt ≈ CLwb + CLt (2.28)
S S

21
Figura 2.9: Distâncias entre o centro aerodinâmica da cauda e o centro de massa da
aeronave.

Momento de picada relativo ao CM


A contribuição da cauda para o momento de picada relativamente ao centro de
massa da aeronave é (ver figura 2.9):

Mt = Mac t + lt [−Lt cos(αwb − ε) − Dt sin(αwb − ε)] +


zt [−Dt cos(αwb − ε) + Lt sin(αwb − ε)]

Consistentemente com a secção anterior, faremos as seguintes aproximações:


• (αwb − ε) pequeno, logo cos(αwb − ε) ≈ 1 e sin(αwb − ε) ≈ αwb − ε.

• Dt  Lt .
• zt  lt .
Além disso, se o perfil for simétrico, como é habitual, Mac t = 0.
Das aproximações anteriores conclui-se que na segunda parcela Lt cos(αwb − ε) 
Dt sin(αwb − ε). Além disso, a última parcela é desprezável face à segunda. Com estas
aproximações,
Mt = −lt Lt + Mac t . (2.29)
Mas, como
1 St
 
2
Lt = ρV S ηt CL t , (2.30)
2 S
o coeficiente adimensional da contribuição do estabilizador horizontal para o mo-
mento de picada total é

Mt lt St St
Cmt = 1 = −ηt CL + ηt Cmact . (2.31)
2
ρV 2 S c̄ c̄ S t S

Define-se razão de volume do estabilizador horizontal como


lt St
VH = . (2.32)
c̄ S

22
Figura 2.10: Distância entre o centro aerodinâmica do estabilizador e o centro de massa
lt ou o centro aerodinâmica l̄t da aeronave.

Assim, podemos concluir finalmente que

St
Cmt = −ηt VH CLt + ηt Cmact . (2.33)
S
O centro de massa (CM) de uma aeronave não é fixo, pelo que VH depende da po-
sição deste. Convém-nos explicitar a posição do CM nas nossas equações e para isso
introduzimos a distância entre os centros aerodinâmicos da asa+fuselagem e do esta-
bilizador horizontal, l̄t . Pela figura 2.10 vemos que

l̄t = lt + (h − hnwb )c̄. (2.34)

Definindo
l̄t St
V̄H = , (2.35)
c̄ S
podemos escrever
St
V̄H = VH + (h − hnwb ). (2.36)
S
A equação (2.33) pode então escrever-se numa forma que explicita a dependência da
posição do centro de massa:

St St
Cmt = −ηt V̄H CLt + CLt ηt (h − hnwb ) + ηt Cmact . (2.37)
S S
O momento de picada total é dado pela soma das várias contribuições, Cm = Cmwb +
Cmt + CmP . Substituindo as expressões de cada uma das contribuições, e notando que
CL = CLwb + ηt (St /S)CLt , obtém-se

St
Cm = Cmac wb + CL (h − hnwb ) − ηt V̄H CLt + CmP + ηt Cmact . (2.38)
S
Se, como é habitual, ηt ≈ 1 e o perfil dos estabilizadores é simétrico (Cmact = 0), a
expressão acima simplifica-se:

Cm = Cmac wb + CL (h − hnwb ) − V̄H CLt + CmP . (2.39)

23
Cmα e Ponto neutro
O coeficiente Cmα (pitch stiffness) é de grande importância para a estabilidade de
uma aeronave. Para o calcular derivamos (2.39):

∂Cm ∂Cmac wb ∂CLt ∂CmP


Cmα ≡ = + CLα (h − hnwb ) − V̄H + . (2.40)
∂α ∂α ∂α ∂α
Por definição de centro aerodinâmico,

∂Cmac wb
= 0. (2.41)
∂α
Logo
∂CLt ∂CmP
Cmα = CLα (h − hnwb ) − V̄H + . (2.42)
∂α ∂α
A condição de estabilidade é Cmα < 0. Ora, o valor de Cmα depende da posição do
CM. Logo, variando h podemos fazer Cmα positivo ou negativo. A posição do CM que
torna Cmα = 0 separa regiões de estabilidade e instabilidade.
O ponto neutro hn pode definir-se como posição que o CM do avião deveria ter para
que Cmα = 0. O ponto neutro é então o centro aerodinâmico do avião: o momento de
picada calculado relativamente a ele não depende do ângulo de ataque.
Para a determinação do ponto neutro basta colocar Cmα = 0 em (2.42), e resolver
em ordem a h, obtendo-se
!
1 ∂Cmac wb ∂CLt ∂CmP
hn = hnwb − − V̄H + . (2.43)
CLα ∂α ∂α ∂α

Substituindo na expressão de Cmα , obtém-se

Cmα = CLα (h − hn ). (2.44)

A margem estática Kn define-se como a distância (adimensional) entre o centro de


massa e o ponto neutro:
Kn = hn − h.
Logo, podemos escrever
Cmα = −CLα Kn . (2.45)
Daqui podemos concluir que
• Kn < 0 ⇒ Cmα > 0: a aeronave é instável.

• Kn > 0 ⇒ Cmα < 0: a aeronave é estável.


• Kn > 0 ⇒ h < hn : CM à frente do PN é estável.
Quando mais à frente do ponto neutro estiver o centro de massa, maior será a
margem estática e maior a estabilidade estática do avião, mas uma estabilidade estática
exagerada diminui manobrabilidade do avião.

24
Figura 2.11: Ângulos de ataque e sustentação na asa e no estabilizador.

Definição alternativa de ponto neutro


Por vezes define-se ponto neutro como a localização do CM para o qual
dCm
= 0. (2.46)
dCL
No entanto, esta definição só coincide com a anterior em algumas condições de voo
bem definidas (ex: voo de planeio de uma aeronave rígida a baixo número de Mach),
pois só nesse caso Cm e CL dependem apenas de α. Nesse caso,
 
∂Cm
dCm ∂α
=  ∂C 
dCL L
∂α

e portanto
dCm ∂Cm
=0⇒ = 0.
dCL ∂α
Mas tanto CL como Cm dependem não apenas de α mas também do número de
Mach (efeitos de compressibilidade) e da pressão dinâmica (efeitos aeroelásticos). A
definição da equação (2.46) é por isso, quando muito, uma aproximação (apesar de
muito usada e frequentemente útil).

2.3 Sustentação e momento de picada em função do ân-


gulo de ataque
Como habitualmente, vamos admitir que a aeronave está a voar com um ângulo de
ataque dentro da zona de linearidade, isto é, que as forças de sustentação e o momento
de picada total variam linearmente com o ângulo de ataque. Iremos determinar as
expressões para CL e Cm em função do(s) ângulo(s) de ataque, bem como expressões
para a posição do ponto neutro hn .

2.3.1 Coeficiente de sustentação total


Considere-se uma aeronave numa configuração convencional: asa + fuselagem +
estabilizador horizontal. Na figura 2.11 estão representados os ângulos de ataque na

25
Figura 2.12: Relação entre ângulos de ataque na asa e no estabilizador, e sustentação
no estabilizador.

asa e no estabilizador (tendo em conta os ângulos de incidência do estabilizador e o


ângulo de downwash) e as respectivas forças de sustentação. Como admitimos estar
na zona de linearidade, os coeficientes de sustentação na asa e na cauda são dados por

CLwb = awb αwb , (2.47)


CLt = at αt = at (αwb − it − ε). (2.48)

Na equação (2.48) usou-se a relação entre os ângulos de ataque absolutos na asa+fuse-


lagem αwb e no estabilizador αt ,

αt = αwb − it − ε, (2.49)

que se pode obter a partir da figura 2.12.


O ângulo de downwash é proporcional à sustentação criada pela asa. Por isso po-
demos admitir que varia linearmente com αwb :

∂ε
ε = ε0 + αwb = ε0 + εα αwb . (2.50)
∂α
Nesta equação ε0 é a contribuição do campo de velocidades induzido pela fuselagem e
pela torção da asa, não variando com o ângulo de ataque, e εα é contribuição da esteira
de vórtices do bordo de fuga, cuja intensidade é proporcional a CL , e portanto a αwb .
Escrevendo agora a equação (2.48) numa forma que explicita os termos constantes
e os que dependem de αwb , obtém-se

CLt = at [αwb (1 − εα ) − (it + ε0 )] . (2.51)

Usando (2.47) e (2.51) na equação para o coeficiente de sustentação total (2.28) obtém-
se uma expressão em função de αwb
St St
CL = awb αwb + at αwb (1 − εα ) η − at (it + ε0 ) η
S S
(2.52)
at S t St
 
= awb 1 + η(1 − εα ) αwb − at η(it + ε0 ).
awb S S

26
Figura 2.13: Curvas CL vs. αwb e vs. α absoluto da aeronave.

Podemos escrever a expressão anterior na forma

CL = CL0 + a αwb , (2.53)

com
at S t
 
a = awb 1 + (1 − εα )η , (2.54)
awb S
St
CL0 = −at (it + ε0 )η. (2.55)
S
Note-se que CL0 < 0 e que habitualmente podemos usar a aproximação η ≈ 1.
O ângulo de ataque absoluto da aeronave total, representado simplesmente por
α, é o ângulo de ataque do escoamento incidente medido relativamente à linha de
sustentação nula da aeronave. Assim,

CL = CL0 + aαwb = aα. (2.56)

Daqui podemos deduzir que

CL0 at St
α = αwb + = αwb − η(it + ε0 ). (2.57)
a a S
Como se pode constatar na figura 2.13, usar o ângulo de ataque absoluto implica ape-
nas a mudança da origem do referencial de modo a que a curva CL vs. α passe pela
origem, mas o declive CLα da curva permanece o mesmo.

2.3.2 Momento de picada total


O momento de picada total é dado pela equação (2.39). Podemos escrever CL e
CLt em função tanto de αwb . Além disso, o momento de picada devido ao sistema
de propulsão pode ser escrito como a soma de um termo constante e um termo que
depende de αwb . Admitimos que a variação com αwb é linear, pelo que

∂CmP
CmP = (CmP )0 + αwb . (2.58)
∂α

27
Habitualmente podemos desprezar esta contribuição. Quando for necessário incluí-la,
∂Cm
teremos de determinar (CmP )0 ) e ∂αP .
Substituindo em (2.39) as expressões de CL , dadas por (2.53), (2.54) e (2.55), de CLt ,
dada por (2.51), e de CmP , dada por (2.58), obtemos

Cm = Cm0 + Cmα αwb , (2.59)

em que o termo constante Cm0 é dado por

Cm0 = Cmac wb + at (it + ε0 )VH + (CmP )0 ,

e o declive Cmα (pitch stiffness) se pode escrever de duas formas equivalentes,

∂CmP
Cmα = a(h − hnwb ) − at V̄H (1 − εα ) + (2.60)
∂α
∂CmP
= awb (h − hnwb ) − at VH (1 − εα ) + . (2.61)
∂α
Muitas vezes é mais útil escrever Cm em função do ângulo de ataque absoluto α.
Para isso comecemos por escrever a relação do momento de picada devido ao sistema
de propulsão com α, que continua a ser linear mas em que o termo constante é dife-
rente:
∂CmP
CmP = (CmP )0 + αwb , (2.62)
∂α
em que (CmP )0 será determinado em cada caso. Agora podemos substituir em (2.39)
as expressões de CL , dada por (2.56), de CLt , dada por (2.51) juntamente com a relação
ente ângulos de ataque (2.57), e de CmP , dada por (2.62), obtendo

Cm = Cm0 + Cmα α, (2.63)

sendo o coeficiente Cm0 dado por

at S t
 
Cm0 = Cmac wb + at (it + ε0 )V̄H 1 − (1 − εα ) + (CmP )0 . (2.64)
a S
Note-se que Cmα é, tal como no caso anterior, dado por (2.60) ou (2.61).

Ponto neutro
Por definição de ponto neutro, Cmα = 0 quando h = hn . Usando (2.60),

∂CmP
a(hn − hnwb ) − at V̄H (1 − εα ) + = 0.
∂α
Resolvendo em ordem a hn obtemos

at 1 ∂CmP
hn = hnwb + V̄H (1 − εα ) + . (2.65)
a a ∂α
Note-se que com frequência a contribuição da propulsão pode ser desprezada.

28
Figura 2.14: As forças e momentos aerodinâmicos aplicados a uma aeronave podem
ser decompostos em: sustentação aplicada no ponto neutro e momento de picada
relativamente ao ponto neutro. (Fonte: [1])

Como vimos, o coeficiente de sustentação é dado em função do ângulo de ataque


absoluto por CL = CLα α, enquanto que o momento de picada, dado por (2.63), pode
tomar uma forma muito útil se usarmos a expressão para o ponto neutro:

Cm = Cm0 + Cmα α = Cm0 + CLα (h − hn )α. (2.66)

As forças (de sustentação) e momentos aplicados numa aeronave podem portanto ser
descritas através da força de sustentação aplicada no ponto neutro e do momento de
picada Cm0 relativamente ao ponto neutro, como representado na figura 2.14. Note-se
que a configuração analizada não inclui leme de profundidade (elevator) pelo que a
sua contribuição não foi incluída em (2.66).

2.4 Equilíbrio, Estabilidade e Controlo Longitudinais


2.4.1 Equilíbrio sem leme de profundidade
Para a configuração asa + fuselagem + estabilizador horizontal (fixo), as condições
de equilíbrio são L = W e M = 0.

W
L = W ⇒ CLeq = 1 . (2.67)
2
ρV 2 S

Como CL = aα, temos:


v
W
u
CLeq = aαeq Veq
u
e =t 1 . (2.68)
2
ρSCLeq

e também
Cm = Cm0 + (h − hn )CLα αeq = 0. (2.69)
Existe um ângulo de ataque de equilíbrio,

−Cm0
αeq = . (2.70)
(h − hn )CLα

29
Figura 2.15: A deflexão do leme de profundidade, δe , é positiva quando aumenta a
curvatura efectiva da cauda, aumentando a sustentação no estabilizador horizontal

Uma vez que todas as outras grandezas são constantes, αeq só pode variar mudando
h! Podemos alterar o ponto de equilíbrio (αeq e Veq ) mudando posição do CM, mas isso
é pouco prático e altera também curva Cm vs. α. Uma outra possibilidade é modificar
a configuração aerodinâmica. Para isso pode usar-se um estabilizador com ângulo de
incidência it variável, o que permite modificar o valor de Cm0 e desta forma alterar
o ângulo de ataque e, consequentemente, a velocidade de equilíbrio. Uma alternativa
mais frequente é usar um leme de profundidade (elevator) acoplado ao estabilizador.

2.4.2 Leme de profundidade


O efeito da deflexão do leme pode traduzir-se como o aumento da curvatura efectiva
do estabilizador. Como se mostra na figura 2.15, define-se a deflexão como positiva se
a curvatura do estabilizador aumenta (isto é, torna-se mais positiva), o que conduz a
um aumento da sustentação no estabilizador: δe > 0 se ∆Lt > 0.
Para garantir que o leme é sempre eficaz a deflexão máxima permitida não deve
ultrapassar certos limites. Para deflexões demasiado grandes o estabilizador poderia
entrar em perda e o leme deixaria de ser eficaz. Iremos sempre, além disso, admitir
que a relação entre δe e ∆Lt é linear (cfr. figura 2.16).
Uma variação da sustentação na cauda conduz a uma variação da sustentação total,
que é pequena quando comparada com a sustentação total e é dada por

∆CL = CLδe δe , (2.71)

em que, de acordo com a definição do sinal de δe ,

∂CL
CLδe ≡ > 0. (2.72)
∂δe

O momento de picada total irá também variar e esta variação não é desprezável face
ao momento total, o que permite ajustar o ponto de equilíbrio da aeronave. A variação
do momento de picada devido a uma deflexão δe do leme de profundidade pode ser
dada por
∆Cm = Cmδe δe , (2.73)
em que o coeficiente de proporcionalidade entre Cm e δe é negativo:

∂Cm
Cmδe ≡ < 0. (2.74)
∂δe

30
CLt = at αt CLt = at αt + ae δe

Figura 2.16: Sustentação na cauda sem (esquerda) e com (direita) deflexão δe do leme
de profundidade.

A sustentação e o momento de picada totais de uma aeronave dependem do ângulo


de ataque absoluto e de δe , e temos:
(
CL = CL (α) + CLδe δe ,
(2.75)
Cm = Cm (α) + Cmδe δe .

Na gama de valores de α em que a variação é linear, podemos escrever


(
CL = CLα α + CLδe δe ,
(2.76)
Cm = Cm0 + Cmα α + Cmδe δe .

Estas expressões são válidas quer para o caso de asas voadoras ou asas em delta,
em que o leme está montado na própria asa, quer quando a aeronave tem o leme
de profundidade montado num estabilizador horizontal. Neste último caso podem-se
determinar expressões para CLδe e Cmδe em função das características do leme, o que
faremos em seguida.

Eficácia de sustentação do leme de profundidade


A eficácia de sustentação do leme de profundidade, ae , mede a capacidade que o
leme tem para criar sustentação no estabilizador para uma dada deflexão δe :
∂CLt
ae = . (2.77)
∂δe
St
Uma vez que CL = CLwb + CL , a derivada CLδe é dada por
S t
∂CLwb St
CL δ e = + ae , (2.78)
∂δe S
∂CLwb
e, como para aeronaves com estabilizador horizontal ∂δe
≈ 0,

St
CLδe = ae . (2.79)
S
Para determinar a derivada Cmδe para aeronaves com estabilizador partimos de

Cm = Cmac wb + CL (h − hnwb ) − V̄H CLt + CmP ,

31
de onde se deduz
∂Cmac wb ∂CLt ∂CmP
Cmδe = + CLδe (h − hnwb ) − V̄H + . (2.80)
∂δe ∂δe ∂δe
| {z } | {z }
ae ≈0

∂Cmac wb St
Para aeronaves com estabilizador horizontal, ∂δe
≈ 0 e CLδe = ae S
. Logo,

St
 
Cmδe = −ae V̄H − (h − hnwb ) . (2.81)
S

2.4.3 Deflexão do leme de profundidade para equilíbrio


A partir do sistema de equações (2.76) podem-se determinar as condições de equi-
líbrio da aeronave que, para voo horizontal, são
(
Leq = W ,
(2.82)
Meq = 0.

O índice eq designa a situação de equilíbrio. Para designar o valor da deflexão do leme


de profundidade e ângulo de ataque e correspondente coeficiente de sustentação (e
de momento de picada) que permitem à aeronave voar em equilíbrio com uma certa
velocidade, usaremos o índice trim. (O índice trim refere-se ao equilíbrio numa certa
situação de voo.)
É conveniente usar as equações de equilíbrio (2.82) na forma adimensional

L W
 CLtrim = 1 eq = 1 ,


2 2
2
ρVtrim S 2
ρVtrim S (2.83)

C
mtrim = 0,

que nos permitem escrever, tendo em conta (2.76),


(
CLtrim = CLα αtrim + CLδe δetrim ,
(2.84)
0 = Cm0 + Cmα αtrim + Cmδe δetrim .

Estas são as equações de equilíbrio para αtrim e δetrim . Para as resolver podemos escrevê-
las na forma matricial:
CLα CLδe αtrim CLtrim
    
= . (2.85)
Cmα Cmδe δetrim −Cm0
A solução de (2.85) permite obter os valores do ângulo de ataque e da deflexão do leme
de profundidade que garantem o voo em equilíbrio à velocidade Vtrim :
CLtrim Cmδe + Cm0 CLδe

α = ,


 trim
det


(2.86)
C C + C C

L m L m

 δetrim = − α 0 trim α
.


det
em que det representa o determinante da matriz do sistema:

det = CLα Cmδe − Cmα CLδe . (2.87)

32
Embora o valor do determinante possa ser facilmente calculado conhecidas as de-
rivadas CLα , Cmα , CLδe e Cmδe , é muitas vezes útil usar expressões explícitas em função
das características da aeronave. Para aeronaves com cauda,

Cmα = CLα (h − hn ),
Cmδe = CLδe (h − hnwb ) − ae V̄H ,
St
CLδe = ae .
S
Logo,
h i
det = CLα CLδe (hn − hnwb ) − ae V̄H (2.88)
St
 
= a ae (hn − hnwb ) − V̄H . (2.89)
S

Variação da deflexão do leme com a velocidade


Como vimos,
CLα Cm0 CL Cmα
δetrim = − + trim .
det det
Mantendo constante a posição do centro de massa, h, a deflexão do leme de profun-
didade necessária para equilíbrio, δetrim , é uma função exclusiva de CLtrim (supondo que
não há efeitos aeroelásticos, de compressibilidade, etc.). Na figura 2.17 representa-se
a variação de δetrim com CLtrim para vários valores de h. Quando h = hn , verifica-se que
δetrim não depende de CLtrim e toma um valor constante. Para h < hn a variação é linear,
com declive negativo: δetrim diminui quando CLtrim aumenta, e é negativo para valores
elevados de CLtrim .
Interessa também estudar como varia a velocidade de equilíbrio com δetrim . Para
mais facilmente compararmos diferentes situações de voo, é conveniente usarmos a
velocidade equivalente (EAS), VE , definida por
s
ρ
VE = V, (2.90)
ρ0

em que ρ é a massa volúmica à altitude de voo e ρ0 é massa volúmica ao nível do mar


(SSL).
Em voo horizontal,
W W
CLtrim = 1 = 1 . (2.91)
2
2
ρV S ρ V 2S
2 0 E

Em situação de equilíbrio, a variação da deflexão do leme com a velocidade equivalente


é então
CL Cm 0 2wCmα 1
δetrim = − α − , (2.92)
det ρ0 det VE2
em que w = W /S é a carga alar.
Na figura 2.18 representa-se a variação de δetrim com VE para vários valores da mar-
gem estática Kn . Quando h = hn , Kn = 0 e δetrim é constante, não dependendo de VE .
Neste caso a velocidade de equilíbrio não pode ser determinada pela deflexão do leme

33
Figura 2.17: Variação de δetrim com CLtrim para vários valores da posição do centro de
massa h. (Fonte: [1])

de profundidade: não é possível usar esta superfície de controlo para alterar a veloci-
dade. Quando Kn > 0 ⇒ h < hn , δetrim é negativo para valores reduzidos da velocidade
e aumenta com VE . O declive da curva é maior para velocidades mais baixas, o que
significa que há maior sensibilidade do controlo com VE reduzido. Pelo contrário, para
velocidades maiores, pequenas variações de δetrim correspondem a grandes variações
de VE . à medida que aumenta a margem estática, a curva apresenta uma curvatura
maior e os valores de δetrim necessários para um dado valor de VE vão aumentando
(até atingir valores demasiado altos para garantir a eficácia do controlo). Vemos que
a manobrabilidade do avião e a sua capacidade de ser controlado diminuem quando
aumenta a margem estática.

34
∆e trim

5
Kn = 0.0
VE
Kn = 0.1 40 60 80 100

-5

-10

-15
Kn = 0.2
-20

-25

-30

Figura 2.18: Variação de δetrim com VE para margem estática Kn = 0, 0.1 e 0.2, para uma
aeronave com características baseadas num Cessna 182. (δetrim medido em graus e VE
em m/s.)

35
Capítulo 3

Estabilidade com Manche Livre e


Forças de Controlo

3.1 Momento de charneira de superfície de controlo


O controlo longitudinal de uma aeronave faz-se habitualmente por meio do leme de
profundidade (elevator). O compensador (trim tab) usa-se para facilitar a deflexão do
leme ou para manter o avião em equilíbrio (trim) sem necessidade de actuação do leme.
Nesta última função o compensador permite voar em equilíbrio mantendo o manche
livre.
Neste capítulo iremos determinar condições de equilíbrio e de estabilidade no caso
de voo com manche livre. Note-se que se o manche está livre, o leme também o es-
tará. Iremos também procurar determinar qual a força de controlo necessária para
estabelecer certa deflexão no leme ou certa velocidade de equilíbrio.

3.1.1 Momento de charneira


Para manter ou alterar a deflexão de uma superfície de controlo é necessário aplicar
um momento na charneira (dobradiça) que permita contrariar os momentos devidos
às forças aerodinâmicas.
A figura 3.1 representa uma parte de um estabilizador horizontal com um leme
de profundidade e um compensador (tab). Definimos Se como a área da parte do
leme a jusante da linha de charneira e c̄e como a corda média da parte do leme a
jusante da linha de charneira. O momento de charneira, isto é, o momento das forças
aerodinâmicas exercidas no leme calculado em relação à linha de charneira do leme
de profundidade, é designado por He . Supondo η ≈ 1, o coeficiente do momento de
charneira é
He
Che = 1 . (3.1)
2
ρV 2 Se c̄e
O sentido positivo de deflexão de δt > 0 é definido da mesma forma que para δe .
Assim, na figura 3.2, δe < 0 e δt > 0. Admitimos uma relação linear entre Che e αt , δe
e δt , pelo que
Che = b0 + b1 αt + b2 δe + b3 δt . (3.2)

36
Figura 3.1: Geometria do leme. (Fonte: Etkin)

Por definição,
∂Che ∂Che ∂Che
b1 = , b2 = , b3 = .
∂αt ∂δe ∂δt
Se o perfil do estabilizador for simétrico não há forças ou momentos aerodinâmicos
quando αt = 0 = δe = δt , pelo que nesse caso b0 = 0.
Na equação (3.2) e na definição de b1 o ângulo de ataque considerado é αt . Dado
que αt = αwb (1 − εα ) − (it + ε0 ) e que o ângulo de ataque absoluto da aeronave é
a S
α = αwb − at St (it + ε0 ), podemos escrever

at St
  
b1 αt = b1 α+ (it + ε0 ) (1 − εα ) − (it + ε0 )
a S
at St
 
= b1 (1 − εα )α − b1 (it + ε0 ) 1 − (1 − εα ) .
a S
Substituindo em (3.2) obtemos uma expressão para o coeficiente do momento de char-
neira em função do ângulo de ataque absoluto:

Che = Che0 + Cheα α + b2 δe + b3 δt , (3.3)

37
Figura 3.2: Deflexões do leme de profundidade e do compensador. (Fonte: Etkin)

com
at St
 
Che0 = b0 − b1 (it + ε0 ) 1 − (1 − εα ) , (3.4)
a S
Cheα = b1 (1 − εα ). (3.5)

3.2 Sustentação e momento de picada com manche livre


Na situação tratada na secção 2.4 supôs-se que o leme de profundidade estava fixo,
isto é, que a deflexão do leme permanecia constante, δe = constante. A condição que
vai ser considerada agora é a de leme completamente livre. Neste caso a deflexão do
leme é aquela que anula o momento de charneira, ou seja, aquela para a qual He = 0
(Che = 0).
Ambos os casos são ideais. O leme não está nunca completamente fixo tanto por-
que em muitas aeronaves é difícil manter o manche completamente fixo como porque
a estrutura das aeronaves não é totalmente rígida e existem sempre deformações que
alteram ligeiramente a posição do leme. Por outro lado o leme nunca está comple-
tamente livre porque existe sempre algum atrito, o que leva ao aparecimento de um
momento de charneira de atrito. No entanto estes casos ideais estão suficientemente
perto da realidade para podermos aplicar os resultados que obtemos.

3.2.1 Deflexão do leme com manche livre


Como vimos, a condição de manche livre é He = 0 a Che = 0. Vamos supor que δt
está fixo, mas que o leme está livre, pelo que usamos a notação δe = δefree . Da equação
(3.3) obtemos, para manche livre,

Che = Che0 + Cheα α + b2 δefree + b3 δt = 0. (3.6)

O leme de profundidade deflecte até He se anular e o valor de δefree é

1 
δefree = − Che0 + Cheα α + b3 δt . (3.7)
b2

38
3.2.2 Sustentação e momento de picada em função do ângulo de ata-
que
Tendo em conta a contribuição do compensador, a sustentação total é

CL = CLα α + CLδe δe + CLδt δt . (3.8)

No entanto a contribuição do compensador para a sustentação total é pequena, pelo


que CLδt é pequeno quando comparado com as outras derivadas e a última parcela é
habitualmente desprezada. Com manche livre a deflexão do leme verifica (3.7), donde
se conclui que o coeficiente de sustentação total no caso de voo com manche livre, que
vamos designar por CL0 , é dado por
1
CL0 = CLα α − CLδe

Che0 + Cheα α + b3 δt , (3.9)
b2
que se pode escrever na forma
CL0 = CL0 0 + CL0 α α (3.10)
com
CLδe
CL0 0 = −

Che0 + b3 δt , (3.11)
b2
CLδe
a0 = CL0 α = CLα − Cheα . (3.12)
b2
Num voo com manche livre a relação entre CL e α continua a ser linear, mas a linha de
sustentação nula altera-se (CL0 0 ≠ 0) e o declive da recta diminui (a0 < a).
Analogamente, para o momento de picada total relativo ao centro de massa temos

Cm = Cm0 + Cmα α + Cmδe δe + Cmδt δt . (3.13)

Dado que o compensador é normalmente pequeno, tanto a sustentação como o mo-


mento de picada adicionais criados pela deflexão δt são pequenos e, em primeira
aproximação, podemos fazer Cmδt ≈ 0 e desprezar o último termo. Usando (3.7),
obtemos
0 1 
Cm = Cm0 + Cmα α − Cmδe Che0 + Cheα α + b3 δt , (3.14)
b2
0
em que Cm designa o momento de picada total relativamente ao centro de massa para
voo com manche livre. A equação anterior tem a forma
0 0 0
Cm = Cm 0
+ Cm α
α, (3.15)

com

0
Cmδe 
Cm = Cm0 − Che0 + b3 δt , (3.16)
0
b2
0
Cmδe
Cm = Cmα − Cheα . (3.17)
α
b2
0
Tendo em conta que Cmδe , b2 e Cheα são negativos, |Cm α
| < |Cmα |. O declive da curva de
Cm com α é menos negativo e isto significa que, com manche livre, há uma diminuição
da estabilidade estática.

39
3.2.3 Sustentação na cauda e factor de manche livre
Pretende-se agora determinar a variação da sustentação na cauda com αt para uma
aeronave com um estabilizador horizontal com perfil simétrico (donde b0 = 0) e mu-
nido de um leme de profundidade. Supomos que existe um compensador, mas que a
sua contribuição para a sustentação é desprezável. Com manche livre

Che = Che0 + b2 αt + b2 δefree + b3 δt = 0,

pelo que
1
δefree = − (b1 αt + b3 δt ) .
b2
Então o coeficiente de sustentação na cauda é

∂CLt
CL0 t = at αt + ae δefree + δt
∂δt
1 ∂CLt
= at αt − ae (b1 αt + b3 δt ) + δt
b2 ∂δ
| {z t }
≈0

Logo,
ae b1 ae b3
 
CL0 t = at − αt − δt .
b2 b2
A variação com αt é linear e o declive da recta é dado por

∂CL0 t ae b1 ae b1
 
= at − = at 1 − = at F , (3.18)
∂αt b2 at b2

em que F é designado por factor de manche livre,

ae b1
F =1− . (3.19)
at b2

3.2.4 Ponto neutro de manche livre


O momento de picada total relativo ao centro de massa depende das contribuições
da asa e do estabilizador (ver equação (2.39)),

0 St lt 0
Cm = Cmac wb + CLwb (h − hnwb ) − C
S c̄ Lt
St
= Cmac wb + CLwb (h − hnwb ) − (h − hnwb )CL0 t − V̄H CL0 t .
S
Tendo em conta que (ver equação (2.28))

St 0
CL0 = CLwb + ηt C ,
S Lt
obtemos finalmente
0
Cm = Cmac wb + CL0 (h − hnwb ) − V̄H CL0 t . (3.20)

40
Derivando (3.20) em ordem a α, obtém-se

0
∂CL0 t
Cm = CL0 α (h − hnwb ) − V̄H . (3.21)
α
∂α
0
O ponto neutro de manche livre define-se-se como o ponto para o qual Cm α
= 0.
0 0
Logo, com CLα ≡ a e tendo em conta que

∂CL0 t ∂CL0 t ∂CL0 t ∂αt


= at F ⇒ = = F at (1 − εα ),
∂αt ∂α ∂αt ∂α

obtemos
F at
h0n = hnwb + V̄H (1 − εα ). (3.22)
a0
0
Pode-se obter facilmente uma expressão alternativa usando Cm α
= CL0 α (h − h0n ):
0
Cm 1 Cmδe
 
h − h0n = α
=C mα − Cheα
CL0 α a0 b2
1 Cmδe
 
= 0 a(h − hn ) − Cheα .
a b2

Usando as expressões para a0 , CLδe , Cmδe e Cheα , obtemos finalmente

ae b1 St
 
h0n = hn − 0 (1 − εα ) V̄H − (hn − hnwb ) . (3.23)
a b2 S

Dado que hn = hnwb + aat V̄H (1−εα ), pode-se mostrar sem dificuldade que (3.22) e (3.23)
são equivalentes.
A margem estática de manche livre define-se de forma análoga ao caso de manche
fixo:
Kn0 = h0n − h. (3.24)
Habitualmente h0n < hn o que implica Kn0 < Kn . Com manche livre verifica-se portanto
uma redução da estabilidade estática.

3.3 Compensadores e equilíbrio com manche livre


A condição de manche livre determina para a deflexão do leme de profundidade um
valor δefree ≠ δetrim . Sem compensador, a velocidade de equilíbrio fica determinada pela
condição de manche livre. O compensador permite alterar velocidade de equilíbrio
mantendo livre o leme de profundidade.
As condições de equilíbrio com manche livre são

C = Che0 + Cheα αfree + b2 δefree + b3 δt = 0,
 he


CL = CLα αfree + CLδe δefree + CLδt δt = CLtrim , (3.25)

 C =C +C α +C

δ + C δ = 0.
m m0 mα free mδe efree mδt t

A velocidade de voo pretendida, Vtrim , determina o valor de CLtrim . O sistema de equa-


ções (3.25) pode resolver-se para obter os valores de αfree , δefree e δt que satisfazem as

41
condições de equilíbrio para uma velocidade Vtrim . O sistema (3.25) pode ser resolvido
de forma aproximada supondo CLδt ≈ 0 e Cmδt ≈ 0, isto é, desprezando a contribuição
do compensador para a sustentação total e o momento de picada total. O compensa-
dor é importante apenas para garantir a condição de manche livre (primeira equação
do sistema (3.25)). Nesta aproximação as duas últimas equações conduzem a
(
CLα αfree + CLδe δefree = CLtrim
Cm0 + Cmα αfree + Cmδe δefree = 0

O sistema (3.3) é idêntico a (2.84), pelo que as soluções serão também idênticas ao caso
de manche fixo. Logo, nesta aproximação,
(
δefree = δetrim
(3.26)
αfree = αtrim

A condição de manche livre é (3.6):

Che0 + Cheα αfree + b2 δefree + b3 δttrim = 0,

e permite obter
1 
δttrim = − Che0 + Cheα αtrim + b2 δetrim . (3.27)
b3
Em conclusão, nesta aproximação (3.27) permite obter o valor de δttrim que faz δefree =
δetrim e αfree = αtrim . Substituindo as expressões para δetrim e αtrim , dadas por (2.86),
obtém-se
1

Cm0   a0 b 
2
δttrim = − Che0 + Cheα CLδe − b2 CLα − (h − h0n )CLtrim . (3.28)
b3 det det

Conclui-se que δttrim varia linearmente com CLtrim (mantendo h cte), e varia linearmente
com h.

3.4 Equilíbrio com deflexão do compensador


Note-se que o compensador pode ter uma deflexão não nula δt e a aeronave estar a
voar com manche fixo. Nesse caso as equações de equilíbrio são apenas

CL = CLα αtrim + CLδe δetrim + CLδt δt = CLtrim ,


(
(3.29)
Cm = Cm0 + Cmα αtrim + Cmδe δetrim + Cmδt δt = 0,

e a condição de manche livre, Che = 0, não se verifica. A solução do sistema é


  

 CLtrim Cmδe + Cm0 CLδe + CLδe Cmδt − CLδt Cmδe δt
α = ,

 trim


 det
  (3.30)

C C + C C + C C − C C δt

L m L m L m L m

α 0 trim α α δ δ α

 t t
δ .
etrim = −

det

42
Figura 3.3: Ligações entre manche e leme de profundidade. (Fonte: Etkin)

Os valores de equilíbrio αtrim e δetrim dependem da deflexão do compensador, δt . No


entanto, se pudermos admitir que o compensador tem uma contribuição desprezá-
vel para a sustentação total (CLδt ≈ 0) e para o momento de picada total (Cmδt ≈ 0),
obtemos a seguinte solução aproximada:

CLtrim Cmδe + Cm0 CLδe



 αtrim ≈


det


(3.31)
CLα Cm0 + CLtrim Cmα


 δetrim ≈


det
Nesta aproximação os valores de equilíbrio αtrim e δetrim não dependem da deflexão do
compensador, δt . Esta influi apenas no coeficiente do momento de charneira e, como
veremos, na força de controlo.

3.5 Forças de Controlo


Nesta secção pretende-se determinar a força necessária para deflectir o leme de
profundidade em função de CLtrim ou Vtrim .

3.5.1 Forças de controlo e momento de charneira


Vamos considerar uma aeronave com um estabilizador horizontal com leme de
profundidade e compensador. Admitimos que todos os elementos são rígidos e que o
atrito é desprezável.
A figura 3.3 representa esquematicamente as ligações entre manche e leme de pro-
fundidade. Estas ligações podem ser, como nas aeronaves mais antigas, puramente
mecânicas ou podem incluir sistemas hidráulicos, pneumáticos ou electrónicos. Em
qualquer dos casos podemos supor que a força que é necessário exercer no manche,
P , é proporcional ao momento de charneira He , isto é,

P = GHe . (3.32)

43
O coeficiente de proporcionalidade G é chamado factor de engrenagem (gear factor,
em m-1 ). O sentido da força P é definido como positivo se está dirigida para a cauda
do avião. Tendo em conta a definição (3.1) do coeficiente do momento de charneira,
1
P =G ρV 2 Se c̄e Che . (3.33)
2
Para prosseguir, é necessário encontrar uma expressão para Che em função de CLtrim
ou Vtrim . O coeficiente do momento de charneira pode ser dado pela equação (3.2):

Che = Che0 + Cheα α + b2 δe + b3 δt .

Como vimos anteriormente (equações (3.6) e (3.27)), quando δt = δttrim , o equilíbrio


atinge-se com manche livre, e nesse caso a força é nula:
1 
P = 0 ⇒ Che = 0 ⇒ δttrim = − Che0 + Cheα αtrim + b2 δetrim . (3.34)
b3
Consideremos agora o caso em que, mantendo a mesma velocidade de equilíbrio, δt ≠
δttrim . Como referido na secção 3.4, o equilíbrio neste caso é ainda definido, pelo menos
de forma aproximada, por α = αtrim e δe = δetrim , mas agora o momento de charneira
não se anula e a força não é nula. O coeficiente do momento de charneira pode então
escrever-se
Che = Che0 + Cheα αtrim + b2 δetrim + be δt ≠ 0, (3.35)
ou, usando (3.34),
Che = b3 (δt − δttrim ). (3.36)
Usando a expressão (3.28) para δttrim , obtém-se

Cm0   a0 b
2
Che = b3 δt + Che0 + Cheα CLδe − b2 CLα − (h − h0n )CLtrim . (3.37)
det det
Num voo horizontal o coeficiente de sustentação é dado por
W w
CLtrim = 1 = 1 , (3.38)
2
ρV 2 S 2
ρV 2

em que w = W /S é a carga alar. Substituindo (3.38) e (3.37) em (3.33) e ordenando os


termos de modo a pôr em evidência a dependência de V , obtém-se a expressão para a
força de controlo:
1
P = A + B ρV 2 , (3.39)
2
com
a0 b2
A = −G Se c̄e w (h − h0n ), (3.40)
det
Cm 0 
 
B = G Se c̄e b3 δt + Che0 + Cheα CLδe − b2 CLα . (3.41)
det
A é um termo independente da velocidade (depende de w e Kn0 ), enquanto que B entra
no termo relativo à dependência com a pressão dinâmica (com V 2 ).
Na figura 3.4 representa-se a variação da força de controlo com a velocidade. Da
análise da figura e das equações (3.39), (3.40) e (3.41) podemos concluir que a força de

44
Figura 3.4: Variação da força de controlo com a velocidade. (Fonte: Etkin)

controlo P é proporcional a Se c̄e (isto é, ao cubo da dimensão linear do avião), ao factor


de engrenagem G e à pressão dinâmica (P aumenta com ρ, diminuindo com altitude, e
é proporcional a V 2 ). A posição do centro de massa afecta apenas o termo constante (se
h diminui, P aumenta). A carga alar também afecta apenas termo constante (se carga
alar w aumenta, P aumenta). Finalmente, a variação da deflexão do compensador, δt ,
altera o valor de B. Deste modo altera a curvatura da parábola, controla a intersecção
com eixo V e portanto determina Vtrim , isto é, o valor de V para o qual P = 0.

3.5.2 Gradiente da força de controlo


O gradiente da força de controlo traduz a variação de P necessária para alterar a
velocidade V . Se o gradiente é grande, o controlo é pesado, ou seja, é preciso variar
muito a força para mudar a velocidade; se é pequeno, o controlo é leve e uma pequena
variação da força altera muito a velocidade.
O termo A depende da margem estática de manche livre, enquanto que B não de-
pende da posição do centro de massa mas depende da deflexão do compensador. As-
sim, se alteramos a posição do centro de massa de h = h1 para h = h1 + ∆h (se o
CM se deslocar para a cauda do avião) e ao mesmo tempo alteramos δttrim para manter
Vtrim constante, verifica-se que o gradiente diminui com Kn0 , como ilustra a figura 3.5.
Quando Kn0 = 0, A anula-se e o declive também se anula se mantivermos a condição de
Vtrim permanecer constante.
Para determinar o gradiente da força de controlo, deriva-se P em (3.39) em ordem
a V obtendo-se
1 dP
P = A + B ρV 2 ⇒ = BρV .
2 dV
Para valores típicos das derivadas de estabilidade o gradiente da força de controlo é
negativo e varia linearmente com V .

45
Figura 3.5: Variação da força de controlo com a velocidade V da aeronave para dife-
rentes valores de h, mantendo fixo o valor de Vtrim . (Fonte: [1])

Considere-se agora o caso de manche livre, em que P = 0. A deflexão do compen-


sador é δt = δttrim e determina a velocidade de equilíbrio Vtrim . Da equação (3.39) com
P = 0 segue-se que
A
B =−1 2
. (3.42)
2
ρVtrim
Logo, obtemos
dP A
 
= −2 . (3.43)
dV trim Vtrim
Usando expressão para A, obtém-se finalmente

dP a0 b2 1
 
= 2G Se c̄e w (h − h0n ) . (3.44)
dV trim det Vtrim

Conclui-se que quando o avião voa em equilíbrio com manche livre (sendo a força
de controlo nula por definição e a velocidade Vtrim determinada por δt = δttrim ), o
gradiente da força de controlo é proporcional ao cubo da dimensão linear do avião
(porque proporcional a Se c̄e ), à carga alar e à margem estática de manche livre Kn0 , e é
inversamente proporcional a Vtrim . Logo, o controlo do leme de profundidade é «mais
pesado» a baixa velocidade, quando o centro de massa está mais à frente (margem
estática maior) e com maior peso.

46
Capítulo 4

Efeitos de superfícies
hiper-sustentadoras e da
propulsão na estabilidade
longitudinal

4.1 Influência de superfícies hiper-sustentadoras


As superfícies hiper-sustentadoras são elementos que provocam alteração da con-
figuração das asas. Os seus efeitos na estabilidade de uma aeronave decorrem princi-
palmente da modificação dos valores de hnwb , Cmacwb e CLwb .

4.1.1 Influência dos flaps


Vamos considerar apenas o caso de flaps que cobrem parte da envergadura, no
bordo de fuga.
Os efeitos aerodinâmicos dos flaps estão esquematizados na figura 4.1. A distri-
buição de sustentação na asa é alterada e o ângulo de downwash aumenta (porque a
sustentação aumenta). Localmente, o efeito deflexão dos flaps é equivalente a aumen-
tar a curvatura da asa. Como se mostra nas figuras 4.2 e 4.3, isto conduz a variações na
sustentação da asa, no coeficiente do momento relativamente ao centro aerodinâmico

Figura 4.1: Efeitos aerodinâmicos. (Fonte: Etkin & Reid, Dynamics of Flight)

47
Figura 4.2: Efeitos da deflexão dos flaps. (Fonte: Etkin & Reid, Dynamics of Flight)

Figura 4.3: Efeito da deflexão dos flaps no coeficiente de sustentação (esquerda), ân-
gulo de downwash (centro) e coeficiente do momento de picada (direita). (Fonte: Etkin
& Reid, Dynamics of Flight)

da asa e no ângulo de downwash, resultando em

∆Cmwb = ∆Cmacwb + ∆CLwb (h − hnwb ), (4.1)


St
∆CL = ∆CLwb − at ∆, (4.2)
S
∆Cmt = at VH ∆. (4.3)

Dado que, como se referiu acima, o efeito da deflexão dos flaps é equivalente a
aumentar a curvatura do perfil, as variações ∆Cmacwb e ∆CLwb não dependem de α mas
apenas do ângulo de deflexão dos flaps. Admitiremos ainda que ∆hnwb é desprezável.
Neste caso, o único efeito que a deflexão dos flaps tem em CLα e em Cmα é devido à
variação do ângulo de downwash .
Recordando que
at St
 
CLα ≡ a = awb 1 + (1 − α ) ,
awb S
Cmα = a(h − hnwb ) − at V̄H (1 − α ),

conclui-se que
at St St
∆a ≡ ∆CLα = awb (−∆α ) = −at ∆α , (4.4)
awb S S
∆Cmα = (h − hnwb )∆a + at V̄H ∆α (4.5)
St
 
= −(h − hnwb ) + V̄H at ∆α . (4.6)
S
Como ∆a < 0 e ∆Cmα > 0, a deflexão dos flaps diminui a estabilidade.

48
Figura 4.4: Forças laterais no hélice devido a ângulo de ataque. (Fonte: [1])

4.2 Influência da propulsão no equilíbrio e na estabili-


dade
Há tipos de propulsão muito diversos (hélice, turboprops, jacto, etc.), pelo que é
difícil fazer tratamento exaustivo. Faremos uma referência apenas aos tipos de pro-
pulsão mais usados e mais estudados: hélice e jacto.
Formalmente, para descrever a influência da propulsão no equilíbrio e na estabi-
lidade de uma aeronave basta introduzir nas equações os termos Cm0P e ∂CmP /∂α
e incluir os efeitos indirectos da propulsão nos coeficientes da asa+fuselagem e da
cauda.

4.2.1 Propulsão a hélice


A força resultante da propulsão tem duas componentes: a força de propulsão T , ao
longo do eixo (não afecta Cmα ), e uma força NP , no plano do hélice.
A contribuição devido à força NP no plano do hélice é

xP SP
∆Cm = CNP , (4.7)
c̄ S
em que SP é a área varrida pelo hélice e

NP
CNP = 1 . (4.8)
2
ρV 2 SP

Para pequenos ângulos de ataque podemos admitir que CNP é proporcional αP .


Logo, NP contribui para Cm0P e para ∂CmP /∂α. Esta última contribuição pode ser esti-
mada a partir de (4.7):

xP SP ∂CmP SP xP ∂CNP ∂αP


∆Cm = CNP ⇒ = (4.9)
c̄ S ∂α S c̄ ∂αP ∂α
∂α
Se o hélice se encontra longe da asa, ∂αP = 1. A colocação mais comum do hélice é
perto da asa, o que induz upwash no hélice, caracterizado pelo ângulo de upwash P .
Deste modo,
∂αP ∂P
αP = α + P + cte ⇒ =1+ (4.10)
∂α ∂α

49
Figura 4.5: A direcção do escoamento incidente o do jacto não são iguais, o que provoca
uma força normal à linha de propulsão. (Fonte: [1])

Conclui-se portanto que a contribuição da propulsão para Cmα é

∂CmP SP xP ∂CNP ∂P


 
= 1+ (4.11)
∂α S c̄ ∂αP ∂α

Outros efeitos que a propulsão pode produzir são:


• Aumento da sustentação na asa (se escoamento a jusante do hélice incide sobre
a asa)
• Aumento do valor efectivo de at e ae (depende de quão afectada é a cauda pelo
escoamento induzido pelo hélice)
• Aumento do ângulo de downwash (difícil de estimar)

4.2.2 Propulsão a jacto


A influência da propulsão a jacto na derivada cmα decorre de vários efeitos. Dois
deles estão representados nas figuras 4.5 e 4.6.
Na figura 4.5 mostra-se que num motor a jacto a direcção do escoamento incidente
e a direcção do jacto podem não ser exactamente iguais, havendo uma variação do
momento linear do fluido na direcção normal ao escoamento. Como consequência,
existe uma força normal, representada na figura por Nj , a qual provoca um momento
de picada relativamente ao centro de massa do avião.
Outro efeito está representado na figura 4.6. O jacto, saindo do motor, vai-se pro-
gressivamente misturando com o ar circundante, criando uma zona de mistura que vai
aumentando de dimensões à medida que a distância à sa´da do motor aumenta. Para
esta zona de mistura contribuem tanto o jacto como o ar circundante. Neste, à medida
que parte do ar vai sendo integrado na zona de mistura, gera-se um escoamento na
direcção do jacto (designado por jet induced inflow) o qual altera o escoamento em
torno da cauda e deste modo o ângulo de ataque efectivo na cauda.

50
Figura 4.6: Jet induced flow: o diâmetro do jacto vai crescendo à custa de um fluxo de
ar do meio circundante, o que pode provoca uma alteração do escoamento incidente
na cauda. (Fonte: [1])

51
Capítulo 5

Estabilidade Lateral-Direccional

A maioria dos aviões tem um plano de simetria e é este tipo de aeronaves que
iremos ter em conta. Um movimento diz-se longitudinal se não altera a posição do
plano de simetria e lateral se altera o plano de simetria. Portanto, há movimento
lateral se existir derrapagem (sideslip), isto é, velocidade com componente segundo y,
ou velocidade angular de rolamento p (roll) ou velocidade angular de guinada r (yaw).
Habitualmente há acoplamento entre movimentos (e controlo) laterais.
Em voo rectilíneo estacionário simétrico as forças e momentos laterais são nulos.
Portanto, há equilíbrio para deflexão nula dos ailerons e do rudder, o que significa que
num voo rectilíneo simétrico o trim lateral está garantido. Por esta razão a posição do
centro de massa não é importante na estabilidade lateral-direccional.
A estabilidade estática lateral-direccional permite estabelecer condições para que,
após uma pequena perturbação que induza uma velocidade de derrapagem ou um ân-
gulo de pranchamento, o avião retorne à posição de voo simétrico com asas niveladas.

5.1 Estabilidade direccional


5.1.1 Condições de estabilidade
O ângulo de derrapagem β é o ângulo entre a velocidade da aeronave (airspeed) e o
plano de simetria. Como se pode constatar da figura 5.1,
v
β = arcsin . (5.1)
V
Num voo simétrico v = 0 e não existe derrapagem nem momento aerodinâmico de
guinada. Pelo contrário, num voo com derrapagem existe um momento aerodinâmico
de guinada N (ver figura 5.1). Para que um voo simétrico seja estável face a pequenas
perturbações da velocidade lateral, é necessário que N > 0 para β > 0. A condição de
estabilidade pode escrever-se como
∂N
>0 (5.2)
∂β
O coeficiente do momento de guinada define-se como
N
Cn = 1 , (5.3)
2
ρV 2 Sb

52
Figura 5.1: Voo com derrapagem.

em que b é a envergadura da asa. A condição de estabilidade para o estado não per-


turbado é !
∂Cn
Cnβ (β = 0) ≡ > 0. (5.4)
∂β β=0
Para simplificar a notação omitir-se-á a menção a β = 0 sempre que isso não conduzir
a ambiguidades.
A principal contribuição para Cnβ provém do estabilizador vertical (fin), e tem um
efeito estabilizador, isto é, se β > 0, o momento gerado pelo estabilizador vertical é
positivo. A fuselagem tem uma contribuição pequena, frequentemente desprezável,
mas tem um efeito desestabilizador. Estas contribuições estão representadas na figura
5.2
A contribuição do estabilizador vertical depende do escoamento que nele incide. O
ângulo de ataque efectivo no estabilizador vertical designa-se por αF e convenciona-se
que αF > 0 se provoca força de sustentação LF no sentido positivo de y (ver figura
5.3). Desta forma, omitindo a influência do(s) hélice(s), da asa e da fuselagem no
escoamento, αF = −β. Esta influência pode ser incluída através de um ângulo de
sidewash σ :
αF = −β + σ . (5.5)
O estabilizador vertical é uma superfície sustentadora, pelo que o coeficiente da força
aerodinâmica na empenagem vertical depende linearmente do ângulo de ataque αF e
da deflexão δr do leme de direcção (rudder),

CLF = aF αF + ar δr = aF (−β + σ ) + ar δr . (5.6)

Aqui, aF é o declive da curva de CL com α para o estabilizador vertical, dado por (5.7),

53
Figura 5.2: Forças aerodinâmicas devido a derrapagem.

Figura 5.3: Estabilizador vertical. (Fonte: [1])

54
e ar é eficiência do leme de direcção (rudder), dado por (5.8):

∂CLF
aF ≡ , (5.7)
∂αF
∂CLF
ar ≡ . (5.8)
∂δr

O momento de guinada devido à força aerodinâmica aplicada no estabilizador vertical


é (ver figura 5.3)
1
NF = −LF · lF = −CLF ρVF2 SF lF , (5.9)
2
em que VF é a velocidade do escoamento incidente no estabilizador vertical, SF é a
área do estabilizador vertical e lF é distância ao longo da direcção longitudinal entre o
centro aerodinâmico do estabilizador e o centro de massa (ou seja, é o módulo da coor-
denada x do centro aerodinâmico do estabilizador vertical). O coeficiente do momento
de guinada é
CLF 1 ρVF2 SF lF
 2
NF VF
Cn F = 1 = − 12 = −CLF VV . (5.10)
2
2
ρV Sb 2
2
ρV Sb V
em que se usou a razão de volume do estabilizador vertical, VV , é definida por

SF lF
VV = . (5.11)
Sb
Recordando a equação (5.6), obtém-se
2
VF

CnF = − [aF (−β + σ ) + ar δr ] VV . (5.12)
V
Derivando em ordem ao ângulo de derrapagem β, obtemos finalmente
 2 !
∂CnF VF ∂σ
= aF VV 1− . (5.13)
∂β V ∂β

O factor de sidewash ∂σ
∂β
é difícil de estimar pois depende da alteração do escoa-
mento devido à fuselagem e aos hélices. A asa têm também uma contribuição devida
ao escoamento assimétrico (importante para asas com alongamento pequeno e com
flecha). Com frequência desprezaremos este termo.
A razão de velocidades do escoamento incidente na asa e no estabilizador vertical
é VVF = 1, excepto se o estabilizador vertical estiver na esteira do hélice. Nesse caso
VF > V .
Em conclusão, a contribuição do estabilizador vertical para a derivada Cnβ é posi-
tiva, pelo que tem um efeito estabilizador, e é proporcional a aF e VV .

5.1.2 Controlo de guinada


O controlo de guinada é feito através do leme de direcção (rudder), como se mostra
na figura 5.4. Num voo simétrico com trajectória rectilínea a deflexão do rudder (δr ) é
nula. O rudder é importante quando se quer manter β ≠ 0, como nas situações de voo

55
Figura 5.4: A deflexão do leme de direcção rudder leva ao aparecimento de uma força
aerodinâmica no estabilizador vertical que provoca um momento de guinada.

com derrapagem (ex: aproximação à pista), quando um motor deixa de funcionar (OEI:
One Engine Inoperative) ou em manobras.
Atendendo a que
 CLF = aF (−β + σ ) + ar δr ,


 2
VF
 CnF = −CLF VV
 ,
V
conclui-se que
2
∂CnF VF

Cnδr = = −ar VV . (5.14)
∂δr V
Num voo com ângulo de derrapagem estacionário, β ≠ 0. Se apenas houver deflexão
do rudder e não existir deflexão dos ailerons,

Cn = Cnβ β + Cnδr δr .

Para que o movimento seja estacionário Cn = 0. Logo, obtemos

β Cn δ r
=− . (5.15)
δr Cnβ

Esta relação entre o ângulo de derrapagem e o ângulo de deflexão do rudder é apenas


aproximada porque a deflexão do rudder provoca também um momento de rolamento.
Este é compensado com os ailerons, o que provoca um momento adicional de guinada
e a consequente necessidade de alterar de δr .
A deflexão do leme de direcção implica um momento de charneira e a correspon-
dente força de controlo do rudder. Analogamente ao que acontece com o elevator, o
momento de charneira é
Chr = b1 αF + b2 δr , (5.16)

56
enquanto que a força de controlo é dada por

1
P = G ρVF2 Sr c̄r (b1 αF + b2 δr ) (5.17)
2
1
= G ρVF2 Sr c̄r [b1 (−β + σ ) + b2 δr ]. (5.18)
2

No caso de leme de direcção livre, Chr = 0 ⇒ δrfree = − bb12 αF .

b1 ar b1
   
CL0 F = aF αF + ar − αF = aF 1− αF (5.19)
b2 a b
| {z F 2 }
factor de rudder livre

5.2 Estabilidade lateral


Os movimentos de rolamento e guinada estão acoplados e a análise da estabili-
dade deve ser feita considerando os dois movimentos em conjunto. No entanto, pode
conseguir-se uma ideia aproximada acerca dos parâmetros de que depende a estabi-
lidade lateral considerando apenas o grau de liberdade de rolamento, como se fosse
independente da guinada.
Supomos um voo estacionário rectilíneo, horizontal e de asas niveladas. Existe
estabilidade de rolamento se, quando uma pequena perturbação conduzir a um ângulo
de pranchamento φ, o momento criado fizer a aeronave voltar a voo nivelado, ou seja,
Clφ < 0.

5.2.1 Efeitos que induzem derrapagem num voo com pranchamento


Num voo rectilíneo com ângulo de pranchamento φ a derrapagem pode iniciar-
se devido a um efeito dinâmico: o peso não se encontra no plano de simetria e tem
componente segundo y dada por W sin φ (ver figura 5.5). A aceleração lateral causada
por esta componente lateral do peso faz aparecer uma velocidade lateral, ou seja, uma
velocidade de derrapagem.
Existe também um efeito «geométrico», que decorre do eixo de rotação do avião
não ser a direcção da velocidade. Consideremos um voo rectilíneo horizontal em que
o avião tem um ângulo de ataque αx , como exemplificado na figura 5.6. Nesta situação
a velocidade do avião está no plano de simetria e vy = 0. Admitamos agora que uma
pequena perturbação faz o avião rolar em torno do eixo x, passando o avião a ter um
ângulo de pranchamento φ (figura 5.7). Se a perturbação não fez alterar a velocidade
linear do avião, então esta deixou de estar no plano de simetria e tem uma componente
segundo o novo eixo y, ou seja, existe uma velocidade de derrapagem.

5.2.2 Momento de rolamento para estabilidade


Para existir estabilidade lateral, a derrapagem deve induzir um momento de rola-
mento que volta a nivelar a aeronave.
Se considerarmos o efeito «dinâmico», a figura 5.5 permite concluir que se φ > 0
a derrapagem induzida é β > 0 e que o momento a criar para nivelar as asas deve ser
∆Cl < 0. Mas este momento deve depender da derrapagem criada, pelo que, na zona

57
Figura 5.5: Voo com pranchamento: o peso tem componente lateral não compensada
pela sustentação, o que induz derrapagem.

Figura 5.6: Voo nivelado: vista de perfil (esquerda) e a partir da cauda (direita). A
velocidade do avião encontra-se no plano de simetria.

Figura 5.7: Voo com asas não niveladas, com ângulo de pranchamento φ. Agora a
velocidade não se encontra no plano de simetria e tem componente v segundo y.

58
de lineridade, ∆Cl = Clβ β e, tendo em conta o sinal pretendido para ∆Cl , conclui-se
que a condição para existir estabilidade lateral é Clβ < 0.
A mesma conclusão se obtém considerando o efeito «geométrico». De facto, num
voo nivelado com ângulo de ataque αx a velocidade do avião tem componentes

V cos αx
 
~ =
V 0 , (5.20)
V sin αx

enquanto que num voo não nivelado, com ângulo de pranchamento φ, tem componen-
tes
V cos αx
 
~ =  V sin αx sin φ  .
V (5.21)
V sin αx cos φ
~ segundo y, pelo que
Nos novos eixos há componente de V

v V sin αx sin φ
sin β = = = sin αx sin φ, (5.22)
V V
isto é, existe um ângulo de derrapagem que depende de φ. Esta derrapagem induz um
momento de rolamento que é proporcional ao ângulo de derrapagem β,

∆Cl = Clβ β, (5.23)

ou, usando (5.22),


∆Cl = Clβ β = Clβ arcsin(sin αx sin φ). (5.24)
Logo, quando as asas deixam de estar niveladas e existe um ângulo de pranchamento
φ é induzido momento de rolamento que é proporcional a

∂Cl ∂Cl ∂β sin αx cos φ


= = Cl β .
∂φ ∂β ∂φ (1 − sin2 αx sin2 φ)1/2

Se αx for pequeno, sin β = sin αx sin φ ⇒ β ≈ αx sin φ. Conclui-se que

∂Cl sin αx cos φ


= Clβ ≈ Clβ αx cos φ
∂φ (1 − sin2 αx sin2 φ)1/2

e, supondo αx > 0, o momento de rolamento induzido tem sinal de Clβ . Mas para haver
estabilidade lateral o momento de rolamento induzido deve contrariar o rolamento,
∂C
isto é, ∂φl deve ser negativo. Conclui-se então que, para haver estabilidade lateral, é
necessário que
Clβ < 0. (5.25)

5.2.3 «Efeito diedro»


A asa, a fuselagem e o estabilizador vertical contribuem para a derivada Clβ . A
contribuição mais importante é devida ao ângulo de diedro (é tão importante que Clβ
é por vezes chamada efeito diedro). O alongamento e afilamento da asa, bem como a
flecha também são importantes para Clβ . Um outro factor importante é a posição da
asa relativamente à fuselagem (asa alta ou asa baixa).

59
Figura 5.8: Efeito diedro: num voo nivelado sem derrapagem (figura de cima) a susten-
tação é igual em ambas as asas, enquanto que num voo com ângulo de pranchamento
(figura de baixo), para um avião com ângulo de diedro Γ > 0, a derrapagem induzida
leva a uma diferença de sustentação em cada uma das asas, que provoca um momento
de rolamento que tende a nivelar as asas.

Contribuição do diedro das asas


Quando as asas têm um ângulo de diedro, a existência de velocidade de derrapagem
leva a uma diferença na sustentação nas asas que provoca um momento de rolamento.
Este contraria o pranchamento inicial (ver figura 5.8) e tem por isso um efeito estabili-
zador.
Para determinar uma expressão aproximada para a contribuição do diedro das asas
para a derivada Clβ comecemos por notar que o ângulo de ataque numa asa depende
da razão entre a componente da velocidade perpendicular à linha de corda do perfil,
Vn , e a componente segundo a linha de corda do perfil. De forma aproximada,
Vn
α≈ . (5.26)
V
No caso de asas com diedro, a figura 5.9 permite constatar que a componente normal
da velocidade é, para a asa direita,

Vn = w cos Γ + v sin Γ ≈ w + vΓ , (5.27)

e para a asa esquerda,


Vn = w cos Γ − v sin Γ ≈ w − vΓ . (5.28)
Para pequenos ângulos de derrapagem, β = v/V ⇒ v = βV . Tendo em conta (5.26),
a variação de ângulo de ataque devido ao ângulo de diedro é, na asa direita ∆α =

60
Figura 5.9: Diferença de ângulo de ataque devido ao diedro.

+βΓ , enquanto que na asa esquerda é ∆α = −βΓ . Esta variação de ângulo de ataque
leva a uma diferença de sustentação entre a asa esquerda e a asa direita que gera um
momento de rolamento. Para perceber de que depende este momento, consideremos
uma pequena secção da asa a uma distância y da raiz (y é positivo para a asa direita e
negativo para a asa esquerda), de largura dy e com uma corda c. O perfil da secção é
caracterizado pela curva de sustentação com o ângulo de ataque, que representaremos
por a0 , que pode depender da posição y pois o perfil pode variar ao longo da asa. A
sustentação adicional criada devida à derrapagem pela secção considerada é
1
 
ρV 2 a0 ∆α c dy.
2
Como existem duas secções em posições simétricas ±y, para as quais δα = ±βΓ , a
contribuição delas para o momento de rolamento criado é
1
 
2
−2y ρV a0 (βΓ ) c dy. (5.29)
2
O momento de rolamento obtém-se integrando estas contribuições para toda a asa. O
coeficiente Cl é então
Z b/2
1 1
 
Cl = 1 (−2) ρV 2 βΓ a0 cydy. (5.30)
2
ρV 2 Sb 2 0

Note-se que tanto a corda c como a0 podem depender de y. A derivada Clβ obtém
imediatamente de (5.30) por derivação em ordem a β
Z b/2
  2
Clβ =− Γ a0 cydy. (5.31)
diedro Sb 0
Para irmos mais longe, temos de fazer alguma hipóteses sobre a asa. Admitindo
uma asa em que a0 é constante ao longo da envergadura e em que o afilamento é
linear, caso em que
(croot − ctip ) (1 − λ)
 
c(y) = croot − y = croot 1 − y , (5.32)
b/2 b/2
b
S = croot (1 + λ), (5.33)
2

61
Figura 5.10: Contribuição devida ao ângulo de flecha. Neste caso usamos o ângulo
de flecha Λ a 1/4 de corda. A distância medida ao longo da linha de 1/4 de corda é
designada por s, enquanto que y é a coordenada habitual.

o integral calcula-se facilmente e obtemos


  1 + 2λ
Cl β =− a0 Γ , (5.34)
diedro 6(1 + λ)
que, no caso de asas rectangulares, se reduz a
  a0
Cl β = − Γ. (5.35)
diedro 4
Na dedução destas expressões foram desprezados os efeitos tridimensionais do
escoamento, que são especialmente importantes para asas com alongamento pequeno.
A expressão (5.31) sobrestima a contribuição do diedro das asas para a derivada Clβ e
não deve ser usada quando se pretendem valores com alguma exactidão. No entanto,
podem-se tirar conclusões importantes, que são válidas em geral: esta contribuição
para Clβ é proporcional ao ângulo de diedro Γ e é negativa, como pretendido para
garantir a estabilidade.

Contribuição da flecha da asa

A flecha da asa contribui também para a derivada Clβ . A razão é que a sustentação
criada depende da velocidade perpendicular à linha de referência (num voo subsónico
usa-se a linha a 1/4 de corda). Num voo com derrapagem a componente da velocidade
normal à linha de referência é V cos(Λ−β) na asa direita e V cos(Λ+β) na asa esquerda
(cfr. figura 5.10). Considere-se uma secção da asa à distância s da raiz medida ao
longo da linha de referência. Sendo o coeficiente de sustentação da secção (com base
na velocidade a corda normais a linha de referência) dado por Cln , a sustentação da
secção da asa direita é
1
 
ρv 2 cos2 (Λ − β) c cos ΛCln ds
2

62
e a da secção correspondente da asa esquerda é
1
 
ρv 2 cos2 (Λ + β) c cos ΛCln ds.
2
Esta diferença de sustentações dá origem a um momento de rolamento

1
 h i
y ρv 2 cos2 (Λ + β) − cos2 (Λ − β) c cos ΛCln ds.
2
Tendo em conta que y = s cos λ ⇒ dy = ds cos λ, o coeficiente do momento de rola-
mento é dado por
Z b/2
1 1
 h i
2 2 2
Cl =1 ρv cos (Λ + β) − cos (Λ − β) C ln cy dy
2
ρv 2 Sb 2 0
Z b/2 (5.36)
1
=− Cln sin(2Λ) sin(2β) cy dy.
Sb 0

A derivada Clβ é calculada em β = 0:


!
∂Cl
Cl β = . (5.37)
∂β β=0

Por outro lado a sustentação total obtém-se por integração ao longo da envergadura
das contribuições das secções, e para β = 0 é
Z b/2
1 1 S
   
2 2
L=2 ρv cos ΛCln c dy = 2 ρv cos2 ΛCln ,
2
(5.38)
2 0 2 2
donde se conclui que
CL = Cln cos2 Λ. (5.39)
Podemos finalmente escrever
R  R 
b/2 b/2
 
0 cy dy C L 0 cy dy
Clβ = −  sin(2Λ) · 2 = −4CL tan Λ  . (5.40)
flecha Sb cos2 Λ Sb

Para uma asa com afilamento linear (5.32), obtém-se


  1 + 2λ
Cl β =− CL tan Λ. (5.41)
flecha 3(1 + λ)
Estes resultados são apenas qualitativamente correctos, mas permitem concluir que
a contribuição da flecha da asa para a derivada Clβ é proporcional a CL e a tan Λ e é
negativa, ou seja, tem um efeito estabilizador.

Contribuição da posição da asa na fuselagem


A posição da asa na fuselagem influencia o modo como a componente cruzada do
escoamento (devida à componente da velocidade segundo y) altera o ângulo de ataque
efectivo na asa. Na figura 5.11 comparam-se as configurações de asa baixa e asa alta.

63
Figura 5.11: Posição da asa na fuselagem

Para aviões com asa baixa, α é maior na asa esquerda, o que leva a um aumento
da sustentação na asa esquerda, e portanto a um momento de rolamento Cl > 0. Para
aviões com asa alta, α aumenta na asa direita, pelo que a sustentação aumenta na
asa direita, o que conduz a Cl < 0. Conclui-se que a posição de asa alta contribui
para a estabilidade lateral, enquanto que a asa baixa tem um efeito desestabilizador.
Habitualmente os aviões de asa baixa necessitam de maiores ângulos de diedro.
Como estimativa para as contribuição da posição da asa na fuselagem podem usar-
se os seguintes valores [3]:

 Asa alta : (Clβ )pos. asa = −0.00016/


Asa média : (Clβ )pos. asa = 0
Asa baixa : (Clβ )pos. asa = +0.00016/◦

Evidentemente que estes valores dão apenas uma indicação da ordem de grandeza
esperada para o efeito da posição da asa na fuselagem.

Contribuição do estabilizador vertical


A força lateral causada pela derrapagem é dada por:

1
LF = aF (−β + σ ) ρVF2 SF
2
O coeficiente do momento de rolamento respectivo é:
2
LF zF SF zF VF

∆Cl = 1 = aF (−β + σ ) .
2
2
ρV Sb Sb V

64
Figura 5.12: Posição do centro aerodinâmico do estabilizador vertical em relação ao
eixo x. (Fonte: [1])

Figura 5.13: Deflexão dos ailerons. (Fonte: [1])

Derivando em ordem a β obtemos a expressão da contribuição do estabilizador vertical


para a derivada Clβ :
∂σ SF zF VF 2
!  
∆Clβ = −aF 1 −
∂β Sb V
Esta contribuição é negativa, e portanto é estabilizadora, mas normalmente é muito
menor que as tratadas anteriormente, uma vez que tanto SF /S como zF /b são peque-
nos.

5.2.4 Controlo de rolamento


O controlo da velocidade angular de rolamento é feito pelos ailerons.
Por definição, a deflexão total dos ailerons é a média da deflexão de cada um (ver
figura 5.13):
1
δa = (δ1 + δ2 ). (5.42)
2
A deflexão dos ailerons é considerada positiva se o aileron da asa direita é deflectido
para baixo e o da asa esquerda deflectido para cima. (Esta é a convenção usada em [1];
muitos autores usam a convenção oposta.) Com esta convenção,

δa > 0 ⇒ Cl < 0 ⇒ Cl δ a < 0 (5.43)

65
Figura 5.14: Guinada adversa

Note-se que a deflexão dos ailerons produz também momento de guinada. Por isso a
derivada Cnδa não é nula.

Guinada adversa
No caso de ailerons simples (tipo flap), a sua deflexão para baixo leva a um aumento
de sustentação e de resistência induzida. Assim, δa > 0 leva a um aumento de resistên-
cia aerodinâmica na asa direita e a uma diminuição na asa esquerda. O diferencial de
resistência aerodinâmica provoca um momento de guinada positivo (nose-right). Ora,
normalmente δa > 0 usa-se para iniciar viragem à esquerda e o momento de guinada
provocado tem o efeito inverso, chamando-se por isso guinada adversa (aileron ad-
verse yaw). O efeito da guinada adversa é mais importante em aeronaves com grande
alongamento.
O efeito da guinada adversa é normalmente corrigido usando o rudder. Para mini-
mizar a necessidade de correcção é possível usar-se frise ailerons, spoilers ou ailerons
diferenciais. Também se pode recorrer ao acoplamento de ailerons e rudder.

Reversão dos ailerons (aileron reversal)


A deflexão de uma superfície de controlo (tipo flap) faz variar a carga aerodinâ-
mica aplicada. O seu centróide está localizado perto de c/2 para velocidades baixas e
desloca-se para trás quando velocidade aumenta (especialmente para velocidades su-
persónicas). Quando o centróide está atrás do eixo de torsão da asa, a deflexão de um
aileron provoca uma torsão na asa e esta conduz a uma variação do ângulo de ata-
que, com a consequente variação da sustentação. A torsão na asa, sendo causada pela
carga aerodinâmica devida à deflexão do aileron, é proporcional à pressão dinâmica.
Além disso, para uma deflexão igual nos ailerons esquerdo e direito, a torsão na asa
deverá ser antissimétrica. Assim, uma deflexão nos ailerons provoca um momento de
rolamento dado por

1
   
2
∆Cl = Clδa δa + ctorsão ρV δa ,
rígido 2

66
Figura 5.15: Perfil alar simétrico com um flap. A mola de torsão modela a rotação do
perfil quando sujeito a momentos aerodinâmicos. Se inicialmente ângulo de ataque é
nulo e se o flap for deflectido de um ângulo δ, o momento aerodinâmico criado leva o
perfil a rodar de um ângulo α. A mola de torsão provoca um momento contrário kθ α.
Em equilíbrio os dois momentos anulam-se.

em que ctorsão é um coeficiente de proporcionalidade positivo nos casos de interesse.


A derivada Clδa é então

1
   
Clδa = Clδa + ctorsão ρV 2 .
rígido 2
Quando a velocidade aumenta, |Clδa | diminui, podendo mesmo anular-se. A velocidade
para a qual Clδa = 0 é chamada velocidade de reversão VR ; nessa situação (Clδa )rígido +
ctorsão ρV 2 /2 = 0 e podemos escrever
!
  V2
Clδa = Clδa 1− 2 . (5.44)
rígido VR

Acima da velocidade de reversão, uma deflexão positiva dos ailerons conduz a uma di-
minuição de sustentação na asa direita, a um aumento de sustentação na asa esquerda,
e consequentemente a um momento de rolamento negativo (reversão do comporta-
mento habitual dos ailerons).
Para investigar quais as grandezas que influenciam a velocidade de reversão, consi-
deremos um modelo simples de um perfil alar simétrico montado numa mola de torsão
com constante kθ (modelando a torsão da asa real). Quando o flap tem uma deflexão
δ, o momento aerodinâmico criado leva o perfil a rodar de um ângulo α (figura 5.15.
Em equilíbrio
1
 
kθ α = ρV c 2 Cmδ δ.
2
(5.45)
2
Note-se que Cmδ é negativo, pelo que uma deflexão positiva do flap dá origem a uma
rotação nose-down e a uma diminuição do ângulo de ataque. O coeficiente de susten-
tação é
C` = C`α α + C`δ δ, (5.46)
e usando (5.45),  
1
 
2
ρV 2 c 2 Cmδ
C` = C`α + C`δ  δ. (5.47)

A velocidade de reversão atinge-se quando o coeficiente de sustentação não depende


da deflexão do leme, ou seja, quando o termo entre parêntesis em (5.47) se anula.

67
Obtemos então v
u 2kθ C`δ
VR = − . (5.48)
t
ρc 2 C`α Cmδ
Conclui-se que o quadrado da velocidade de reversão é proporcional à rigidez da asa
(pois kθ aumenta com a rigidez da asa) e inversamente proporcional à densidade do
ar. O aileron reversal é mais pronunciado para asas finas e flexíveis e para altitudes
maiores.

68
Capítulo 6

Equações do Movimento

Neste capítulo estabelecer-se-ão as equações que regem a dinâmica de um avião,


considerado como um corpo rígido. Na realidade um avião é um corpo deformável,
mas na maior parte das situações dinâmicas os efeitos da elasticidade não são muito
importantes e é possível, quando necessário, tratá-los como pequenas modificações
relativamente ao caso rígido.

6.1 Referenciais
Como referencial inercial vamos usar um referencial fixo na Terra (OxE yE zE ), de-
signado por FE . Uma vez que pretendemos analisar apenas o voo durante intervalos
de tempo relativamente curtos (da ordem de minutos), podemos desprezar a curva-
tura da Terra e considerar a aceleração da gravidade g ~ como vertical. O eixo OzE é
escolhido segundo a direcção e sentido da gravidade (é vertical e aponta para baixo). O
referencial (Cxyz) fixo no avião é designado por FB . Tem origem no centro de massa
da aeronave e move-se solidário com ela. A figura 6.1 representa os dois referenciais.
Qualquer dos referenciais pode ser usado para medir grandezas físicas. Assim,
podemos medir a velocidade do ar relativamente ao avião ou relativamente à Terra.
Por outro lado, os eixos e os vectores de base de qualquer dos referenciais pode ser
usado para escrever qualquer vector. Podemos, por exemplo, escrever a velocidade do
ar relativamente ao avião tanto no referencial do avião como no referencial da Terra.
Sempre que possa haver ambiguidades usaremos a notação

~ba
V

em que o expoente a identifica o referencial relativamente ao qual medimos o vector


e o índice b identifica o referencial no qual escrevemos as componentes do vector.
Exemplificando o uso da notação, a velocidade relativamente à Terra é V ~ E , e tanto
pode ser escrita no referencial da Terra, V ~E = (ẋ E , ẏ E , żE ), como no referencial do
E

~ E E E E
avião, VB = (u , v , w ). A velocidade do avião relativamente ao ar (airspeed), pode
ser designada simplesmente por V ~B = (u, v, w), escrita no referencial do avião. Note-
~ relativamente à Terra,
se que, se o vento tiver velocidade W

~E = V
V ~ +W
~.

69
Figura 6.1: Referencial inercial ligado à Terra, FE , de eixos (OxE yE zE ) e referencial
ligado ao avião, FB , de eixos (Cxyz).

6.2 Ângulos de Euler e matrizes de rotação


6.2.1 Definição dos Ângulos de Euler
Os ângulos de Euler permitem descrever a orientação relativa dos dois referenciais
(FE fixo na Terra e FB solidário com o avião). Existem muitas definições possíveis para
os ângulos de Euler, mas em aeronáutica são usados os ângulos de guinada (yaw),
picada/cabragem (pitch) e pranchamento ou rolamento (bank/roll) que definem três
rotações sucessivas.
A primeira rotação, em torno do eixo vertical fixo CzE , define o ângulo de guinada
ψ, como se mostra na figura 6.2. A segunda rotação, representada na figura 6.3, é
feita em torno do eixo Cy1 obtido após a rotação anterior, e define o ângulo de picada
(usa-se também cabragem quando o ângulo é negativo), θ. A terceira rotação faz-se em
torno do eixo Cx2 , como se mostra na figura 6.4 e define o ângulo de pranchamento
(ou rolamento) φ.

6.2.2 Matrizes de rotação


Para relacionar as componentes de um vector no sistema de eixos da Terra e no
sistema de eixos do avião temos de introduzir a matriz de rotação entre os dois sis-
temas de eixos. Uma matriz de rotação relaciona as componentes de um vector nos
sistemas de eixos antes e depois da rotação. Como os ângulos de Euler são definidos
como rotações em torno de sucessivos eixos coordenados, definiremos em primeiro
lugar as matrizes para rotações em torno de cada um dos eixos coordenados para os
ângulos mostrados na figura 6.5. Para uma rotação de um ângulo α em torno do eixo

70
Figura 6.2: Rotação que define o ângulo de guinada, em torno do eixo fixo vertical CzE .

Figura 6.3: Rotação que define o ângulo de picada, em torno do eixo Cy1 .

71
Figura 6.4: Rotação que define o ângulo de rolamento, em torno do eixo Cx2 ≡ Cx.

z z z

α γ

y γ y
β y
x x x

(A) (B) (C)

Figura 6.5: Rotações em torno de cada um dos eixos coordenados: (A) rotação em
torno de Ox; (B) rotação em torno de Oy; (C) rotação em torno de Oz.

72
Ox, a matriz de rotação é

1 0 0
 
Rx (α) = 0 cos α sin α  ; (6.1)
0 − sin α cos α

para uma rotação de um ângulo β em torno do eixo Oy a matriz de rotação é

cos β 0 − sin β
 
Ry (β) =  0 1 0 ; (6.2)
sin β 0 cos β

finalmente, para uma rotação de um ângulo γ em torno do eixo Oz a matriz de rotação


é dada por
cos γ sin γ 0
 
Rz (γ) = − sin γ cos γ 0 . (6.3)
0 0 1
Para obtermos a matriz de rotação do referencial fixo na Terra FE para o referen-
cial fixo na aeronave FB basta-nos aplicar multiplicar (da direita para a esquerda) as
matrizes correspondentes às rotações de guinada, picada e pranchamento:

RBE = Rx (φ) · Ry (θ) · Rz (ψ). (6.4)

Para transformar as componentes de um vector escritas no referencial da Terra para as


componentes do mesmo vector escritas no referencial do avião basta-nos multiplicar
pela matriz de rotaçao:
~B = RBE V
V ~E . (6.5)
A matriz RBE de rotação do referencial fixo na Terra FE para o referencial fixo na
aeronave FB que se obtém a partir de (6.4) e das matrizes (6.1), (6.2) e (6.3) é

RBE = Rx (φ) · Ry (θ) · Rz (ψ) =

1 0 0 cos θ 0 − sin θ cos ψ sin ψ 0


     
0 cos φ sin φ  ·  0 1 0  · − sin ψ cos ψ 0 =
0 − sin φ cos φ sin θ 0 cos θ 0 0 1

cos θ cos ψ cos θ sin ψ − sin θ


 
sin φ sin θ cos ψ − cos φ sin ψ sin φ sin θ sin ψ + cos φ cos ψ sin φ cos θ  . (6.6)
cos φ sin θ cos ψ + sin φ sin ψ cos φ sin θ sin ψ − sin φ cos ψ cos φ cos θ

Como exemplo, vamos determinar as componentes do peso no referencial do avião.


~ E = (0, 0, mg). Para obtermos as suas compo-
No referencial da Terra o peso é (mg)
nentes no referencial do avião usamos (6.5):
  
cos θ cos ψ cos θ sin ψ − sin θ 0
~ B = sin φ sin θ cos ψ − cos φ sin ψ
(mg) sin φ sin θ sin ψ + cos φ cos ψ sin φ cos θ   0 
  
cos φ sin θ cos ψ + sin φ sin ψ cos φ sin θ sin ψ − sin φ cos ψ cos φ cos θ mg
 
−mg sin θ
=  mg cos θ sin φ  .
 
mg cos θ cos φ

73
Também é possível definir a matriz de rotação inversa, do referencial fixo na aero-
nave FB para o referencial fixo na Terra FE :
−1
REB = RBE = Rz (−ψ) · Ry (−θ) · Rx (−φ).

Agora as rotações devem ser feitas pela ordem inversa e os ângulos são simétricos
dos ângulos da rotação inicial. A relação entre as componentes dos vectores nos dois
referenciais é
V~E = REB V
~B , (6.7)
sendo a matriz REB de rotação do referencial fixo na aeronave FB para o referencial
fixo na Terra FE dada por
−1
REB = RBE = Rz (−ψ) · Ry (−θ) · Rx (−φ) =

cos θ cos ψ sin φ sin θ cos ψ − cos φ sin ψ cos φ sin θ cos ψ + sin φ sin ψ
 
= cos θ sin ψ sin φ sin θ sin ψ + cos φ cos ψ
 cos φ sin θ sin ψ − sin φ cos ψ .
− sin θ sin φ cos θ cos φ cos θ
(6.8)

6.2.3 Velocidade e frequências angulares


A velocidade angular de um avião é habitualmente referida a partir das componen-
tes ao longo dos eixos coordenados do avião:

~ = p i~B + qj~B + r k
ω ~B . (6.9)

Por outro lado, da definição dos ângulos de Euler deduz-se que a velocidade angular
se pode escrever em função das frequências angulares ψ̇, θ̇ e φ̇. Para relacionar p, q e
r com as frequências angulares comecemos por notar que

ω ~1 + θ̇ j~2 + φ̇i~3 .
~ = ψ̇k (6.10)
B B B

Mas, pela definição dos ângulos de Euler:


~ ~

 i3B = iB ,



 j~2B = cos φj~B − sin φk
~B , (6.11)

~1 = cos θ(sin φj~B + cos φk~B ) − sin θ i~B .

k

B

Substituindo (6.11) em (6.10), obtém-se


~1 + θ̇ j~2 + φ̇i~3
~ = ψ̇k
ω B B B

= ψ̇[cos θ(sin φj~B + cos φk


~B ) − sin θ i~B ] + θ̇[cos φj~B − sin φk
~B ] + φ̇i~B

= (φ̇ − ψ̇ sin θ)i~B + (ψ̇ cos θ sin φ + θ̇ cos φ)j~B + (ψ̇ cos θ cos φ − θ̇ sin φ)k
~B .

Por comparação com (6.9), constata-se facilmente que





 p = φ̇ − ψ̇ sin θ,

q = ψ̇ cos θ sin φ + θ̇ cos φ, (6.12)


 r = ψ̇ cos θ cos φ − θ̇ sin φ.

74
Destas equações se vê que as velocidades angulares não se identificam com as corres-
pondentes taxas de variação dos ângulos de Euler: a velocidade angular de rolamento
não é igual à taxa de variação do ângulo de rolamento/pranchamento, e o mesmo se
pode dizer relativamento à picada e à guinada.

6.3 Equações de Euler


6.3.1 Equações do movimento
Considerando o avião como um corpo rígido e sendo F~ a resultante das forças
~ C o momento resultante relativo ao centro de massa C
exteriores aplicadas ao avião, M
~
do avião e HC o momento angular total relativamente a C, as equações do movimento
no referencial inercial FE são

d
 
~
F =m ~
(V )E
(6.13)
dt FE
d
 
M~C = (H~C ) (6.14)
dt FE

respectivamente para a dinâmica de translação e para a dinâmica de rotação.


O referencial do avião é um referencial em rotação com velocidade angular ω. ~ Por
isso, se os vectores V~E e H
~C estiverem escritos no referencial do avião, a equação da
dinâmica de translação é

d
 
˙
h i
(F~)B = m ~E)
(V ~ E )B + (ω)
= m (V ~ E )B ,
~ B × (V (6.15)
dt FE

enquanto que para a dinâmica de rotação temos

d
 
˙
h i
~ C )B =
(M ~C )
(H ~C )B + (ω)
= (H ~ C )B .
~ B × (H (6.16)
dt FE

São estas equações, em que as grandezas vectoriais estão expressas no referencial do


avião, que vamos procurar desenvolver e resolver.

6.3.2 Equações do movimento no referencial do avião


As forças externas aplicadas a uma aeronave incluem a força gravítica m(g) ~ B , as
forças aerodinâmicas, aqui designadas genericamente por A,~ e a força de propulsão T~.
Como vimos, no referencial do avião a força gravítica pode escrever-se

~ B = mg − sin θ i~B + cos θ sin φj~B + cos θ cos φk


~B

m(g) (6.17)

Por outro lado, podemos por enquanto agrupar as forças aerodinâmicas e de propulsão
sob uma designação genérica,

~ B + (T~)B = X i~B + Y j~B + Z k


(A) ~B . (6.18)

75
Note-se que, uma vez que as forças aerodinâmicas dependem tanto da velocidade como
da velocidade angular do avião, as forças X, Y e Z dependem das variáveis dinâmicas
~ e ω).
(V ~ Teremos também de incluir em X, Y e Z as forças de controlo.
Tendo em conta que no referencial do avião

~ B = p i~B + q j~B + r k
 (ω) ~B
~ E )B = uE i~B + v E j~B + w E k
 (V ~B

as componentes segundo x, y e z da equação da dinâmica de translação (6.15) são


X − mg sin θ = m(u̇E + qw E − r v E ),




Y + mg cos θ sin φ = m(v̇ E + r uE − pw E ), (6.19)

E E E

Z + mg cos θ cos φ = m(ẇ + pv − qu ).

O momento resultante das forças externas relativamente ao centro de massa C da


aeronave é
(M~ C )B = L i~B + M j~B + N k
~B , (6.20)
em que L, M, e N são chamados respectivamente momentos de rolamento, picada e
guinada. O momento angular relativamente a C é dado por
~C )B ] = [IB ][(ω)
[(H ~ B ]. (6.21)
A matriz de inércia é
Ixx −Ixy −Ixz
 
[IB ] = −Ixy Iyy −Iyz  , (6.22)
−Ixz −Iyz Izz
de inércia definidos por Ixx = (y 2 + z2 ) dm, Iyy =R (x 2 + z2 ) dm
R R
sendo osR momentos
2 2
Re Izz = (x + y R ) dm; e os produtos de inércia definidos como Ixy = xy dm, Ixz =
xz dm e Iyz = yz dm.
Substituindo todas estas expressões na equação da dinâmica de rotação (6.16) as
componentes segundo x, y e z são
L = Ixx ṗ − Iyz (q2 − r 2 ) − Izx (ṙ + pq) − Ixy (q̇ − r p) − (Iyy − Izz )qr ,




M = Iyy q̇ − Izx (r 2 − p 2 ) − Ixy (ṗ + qr ) − Iyz (ṙ − pq) − (Izz − Ixx )r p, (6.23)

2 2

N = Izz ṙ − Ixy (p − q ) − Iyz (q̇ + r p) − Izx (ṗ − qr ) − (Ixx − Iyy )pq.

Em resumo, temos nove equações diferenciais não lineares acopladas: três equações
(6.19) para a dinâmica de translação, três equações (6.23) para a dinâmica de rotação
e três equações (6.12) que relacionam as velocidades angulares com as frequências de
Euler.
As incógnitas são também nove: as três componentes da velocidade linear, as três
componentes da velocidade angular e os três ângulos de Euler: (u, v, w, p, q, r , ψ, θ, φ).
A resolução das equações permite obter cada uma destas incógnitas em função do
tempo, dadas as necessárias condições iniciais.
Para a resolução das equações, uma simplificação que é válida na maior parte dos
casos é a de considerar que a aeronave é simétrica, o que implica Ixy = 0 = Iyz .
Note-se que só é possível separar completamento o movimento longitudinal do mo-
vimento lateral se p = 0 = r , e isto exige φ = 0 (pois pelas equações (6.12) se vê que,
se φ ≠ 0, então q ≠ 0 ⇒ θ̇ ≠ 0 ⇒ r ≠ 0). Portanto, se as asas não estiverem niveladas
não é possível um voo com movimento apenas longitudinal.

76
6.3.3 Equações da trajectória
A trajectória (flight path) é definida no referencial solidário com a Terra, FE . Neste
referencial V~EE = (ẋ E , ẏ E , żE ) e V
~BE = (uE , v E , w E ). As velocidades uE , v E e w E são
obtidas pelas equações do movimento, e os vectores velocidade estão relacionados
por [V~EE ] = [REB ][V
~BE ]. Daqui obtém-se o sistema de equações diferenciais para as
coordenadas da trajectória.

ẋ E = uE cos θ cos ψ + v E (sin φ sin θ cos ψ − cos φ sin ψ)+


w E (cos φ sin θ cos ψ + sin φ sin ψ)
ẏ E = uE cos θ sin ψ + v E (sin φ sin θ sin ψ + cos φ cos ψ)+
w E (cos φ sin θ sin ψ − sin φ cos ψ)
żE = −uE sin θ + v E sin φ cos θ + w E cos φ cos θ

Conhecidas as velocidades e os ângulos de Euler em função do tempo, estas equações


podem facilmente ser integradas para se obterem as coordenadas da trajectória em
função do tempo.

6.4 Rotores em movimento


Mesmo desprezando os efeitos de elasticidade, um avião não é um corpo rígido. No
caso de propulsão a hélice, os hélices dos motores são partes em movimento rotativo,
como o são as turbinas e compressores no caso de propulsão a jacto. Quando esta-
belecemos as equações de Euler, admitimos que o avião era um corpo rígido, mas não
é difícil introduzir o efeito dos rotores nas equações, bastando somar ao momento
angular do avião o termo correspondente o momento angular dos rotores:
~C )B ] = [IB ][(ω)
[(H ~ rot ],
~ B ] + [h (6.24)
B

em que h ~ rot é momento angular dos rotores (devido ao seu movimento de rotação
B
~ B ] é momento angular do avião, já anteriormente conside-
relativo ao avião) e [IB ][(ω)
rado. É este momento angular total que deve ser usado na equação para a dinâmica de
rotação (6.16)
d
 
˙
h i
(M~ C )B = ~C )
(H ~C )B + (ω)
= (H ~ C )B
~ B × (H
dt FE

Quando a velocidade dos rotores é constante, é necessário apenas acrescentar os se-


guintes termos adicionais na equação dos momentos:

na equação segundo x, qhrot rot


z − r hy ;

na equação segundo y, r hrot rot


x − phz ;
na equação segundo z, phrot rot
y − qhx .

6.5 Sistemas de eixos do corpo


Qualquer sistema de eixos solidários com o corpo pode ser usado como referencial
FB . Na prática, os sistemas de eixos com utilidade seguem as seguintes regras:

77
Figura 6.6: Sistema de eixos em que o eixo Cx é a linha de sustentação nula do avião.
O ãngulo α entre a velocidade e a linha de sustentação nula é o ângulo de ataque
absoluto do avião.

• Os eixos Cx e Cz encontram-se no plano de simetria do avião,


• Cx aponta «para a frente»,
• Cz aponta «para baixo», e
• Cy forma com os anteriores um triedro directo.
O eixo Cy é portanto o eixo que é perpendicular ao plano de simetria e passa pelo
centro de massa. Quanto aos eixos Cx e Cz, existem muitas possibilidades de escolha.
Uma das possibilidades é escolher o eixo Cx na direcção da linha de sustentação
nula do avião, como se mostra na figura 6.6. Nesse caso, o ângulo de ataque do eixo
Cx é o ângulo de ataque da aeronave e o ângulo de subida (ou de rota) γ é dado por
γ = θ − α.
Uma outra escolha que apresenta vantagens, representada na figura 6.7, é a de usar
como Cx e Cz os eixos principais de inércia (num avião simétrico, a nossa escolha para
Cy garante que é sempre um eixo principal de inércia). Assim, Ixy = Ixz = Iyz = 0, e o
momento angular do avião (excluindo rotores) é apenas

 Hx = Ix p


Hy = Iy q

Hz = Iz r

o que traz simplicações consideráveis nas equações do movimento de rotação. Agora,


porém, αx ≠ α. O ângulo de subida é γ = θ − αx , mas é necessário conhecer a relação
entre α e αx , ou, equivalentemente, é necessário saber a relação entre o eixo dos x e a
linha de sustentação nula da aeronave.
Em estudos de estabilidade é frequente usar um outro sistema de eixos, conhecido
precisamente como sistema de eixos de estabilidade (xS , yS , zS ) e que se apresenta na
figura 6.8. O eixo Cx é aqui escolhido segundo a direcção do vector velocidade. A
grande vantagem é que por definição, w = 0, e portanto αx = 0. Este é o sistemas de
eixos que iremos usar mais frequentemente no estudo da estabilidade dinâmica.

78
Figura 6.7: Sistema de eixos em que os eixos Cx e Cz são eixos principais de inércia
do avião. O ângulo γ entre a velocidade e a horizontal é o ângulo de subida do avião.

Figura 6.8: Sistema de eixos de estabilidade: o eixo CxS coincide com a direcção da
velocidade do avião. Por definição αx = 0. O ângulo ξ é o ângulo entre o sistema de
eixos principal de inércia e o sistema de eixos de estabilidade.

79
Designando por ξ o ângulo entre os eixos de estabilidade e os eixos principais de
inércia, os novos momentos e produtos de inércia são

IxS = IxP cos2 ξ + IzP sin2 ξ,


IzS = IxP sin2 ξ + IzP cos2 ξ,
1
IxS zS = (IzP − IxP ) sin 2ξ.
2
Neste sistema de eixos o ângulo de subida coincide com o ângulo de picada: γ = θ.

80
Capítulo 7

Estados Estacionários e
Manobras

Num voo típico, um avião encontra-se habitualmente num estado estacionário:


subida ou descida com ângulo constante, voo de cruzeiro, volta coordenada, etc.
Interessa-nos caracterizar estes estados estacionários, que serão a base para o estudo
da estabilidade dinâmica para pequenas perturbações.
Alguns estados estacionários podem caracterizar-se por ser apenas longitudinais,
enquanto noutros entram também em jogo variáveis laterais. Vamos procurar carac-
terizar estes tipos de movimentos. Além disso trataremos de manobras estacionárias:
volta coordenada e manobra de descida-subida simétrica (pull-up).
Começaremos por caracterizar um pouco melhor as forças e momentos aplicados a
uma aeronave.

7.1 Forças e momentos aplicados a uma aeronave


Para além do peso, as forças e momentos aplicados a uma aeronave podem ter
origem aerodinâmica (sustentação, resistência aerodinâmica) ou ser forças e momen-
tos de controlo. Estes podem ser devidos à propulsão ou a modificação das forças e
momentos aerodinâmicos pela deflexão de superfícies de controlo, como o leme de
profundidade (elevator, ou em alternativa, stabilator), o leme de direcção (rudder) ou
os ailerons.
Para as forças e momentos usamos a seguinte notação: XA , ZA , ZA designam as
componentes aerodinâmicas das forças e LA , MA , NA designam as componentes aero-
dinâmicas dos momentos. As componentes devidas ao controlo são designadas por
um índice C: ∆XC , ∆YC , ∆ZC para as forças e ∆LC , ∆MC , ∆NC para os momentos. As
forças totais são então
 X = XA + ∆XC ,


Y = YA + ∆YC , (7.1)

Z = ZA + ∆ZC ,

81
e os momentos totais
 L = LA + ∆LC ,


M = MA + ∆MC , (7.2)

N = NA + ∆NC .

7.1.1 Variáveis dinâmicas e sua adimensionalização


Os momentos e forças aerodinâmicos dependem das variáveis dinâmicas: as ve-
locidades lineares u, v e w, e as velocidades angulares p, q e r . Com frequência é
conveniente usar estas variáveis na sua versão adimensional. As velocidades lineares
adimensionalizam-se dividindo pelo módulo da velocidade, isto é,
u v w
û = , v̂ = , ŵ = . (7.3)
V V V
As velocidades angulares adimensionalizam-se de modo diferente consoante são va-
riáveis laterais (p e r ) ou longitudinal (q):
b
p̂ = p , (7.4)
2V

q̂ = q , (7.5)
2V
b
r̂ = r . (7.6)
2V
Note-se que se os ângulos de derrapagem e de ataque são pequenos, então são
válidas as aproximações
v v
β = arcsin
≈ = v̂, (7.7)
V V
w w
α = arctan ≈ = ŵ. (7.8)
V V
Normalmente admite-se que as forças e momentos aerodinâmicos não dependem
das derivadas das variáveis dinâmicas, com uma excepção: podem depender de ẇ, ou
seja, de α̇. A adimensionalização da derivada temporal é feita dividindo pelo factor
2V /c̄, isto é,
ˆ = α̇ c̄ .
α̇ (7.9)
2V

7.1.2 Forças e momentos aerodinâmicos para o movimento longitu-


dinal
Relativamente ao movimento longitudinal, isto é, o que não altera a posição do
plano de simetria do avião, as forças e momentos aerodinâmicos relevantes são XA ,
ZA e MA que, se o movimento é verdadeiramente longitudinal, dependem apenas das
variáveis dinâmicas longitudinais, isto é, de u, w, q e ẇ:

 XA = Xu u + Xw w + Xq q + Xẇ ẇ,


ZA = Zu u + Zw w + Zq q + Zẇ ẇ, (7.10)

MA = Mu u + Mw w + Mq q + Mẇ ẇ,

82
Por definição, as derivadas (dimensionais) são

∂X ∂Z ∂M
Xu ≡ Zu ≡ Mu ≡
∂u ∂u ∂u
∂X ∂Z ∂M
Xw ≡ Zw ≡ Mw ≡
∂w ∂w ∂w
∂X ∂Z ∂M
Xq ≡ Zq ≡ Mq ≡
∂q ∂q ∂q
∂X ∂Z ∂M
Xẇ ≡ Zẇ ≡ Mẇ ≡
∂ ẇ ∂ ẇ ∂ ẇ
Com frequência é preferível usar coeficientes adimensionais em vez de forças e mo-
mentos dimensionais. Para o movimento longitudinal, os coeficientes adimensionais
das forças e momentos aerodinâmicos são

1
XA = ρV 2 S CxA , (7.11)
2
1
ZA = ρV 2 S CzA , (7.12)
2
1
MA = ρV 2 S c̄ CmA . (7.13)
2
A versão adimensionalizada de (7.10) é

ˆ
 CxA = Cxu û + Cxα α + Cxq q̂ + Cxα̇ˆ α̇,



ˆ
CzA = Czu û + Czα α + Czq q̂ + Czα̇ˆ α̇ (7.14)


C

= C û + C α + C q̂ + C α̇.
mA mu mα mq
ˆ mα̇ˆ

Note-se que as derivadas são obtidas derivando os coeficientes adimensionais em or-


dem às variáveis adimensionais, isto é,

∂Cx ∂Cx ∂Cx ∂Cx


Cxu ≡ , Cxα ≡ , Cxq ≡ , Cxα̇ˆ ≡ , etc.
∂ û ∂α ∂ q̂ ˆ
∂ α̇

Forças e momentos de controlo longitudinal


Para controlo longitudinal dispomos habitualmente de uma superfície de controlo
(leme de profundidade ou equivalente, cuja deflexão é δe ) e podemos também controlar
a potência desenvolvida pelo motor, sendo a posição relativa da manete de potência
dada por δT . Assim, temos

 ∆XC = Xδe δe + XδT δT ,




∆ZC = Zδe δe + ZδT δT , (7.15)

∆MC = Mδe δe + MδT δT .

83
Os coeficientes das forças e momentos de controlo longitudinal obtém-se por adimen-
sionalização das equações acima:


 ∆Cx = Cxδe δe + CxδT δT ,

∆Cz = Czδe δe + CzδT δT , (7.16)


 ∆C = C δ +C δ .
m mδe e mδT T

Tendo em conta (7.1) e (7.2), os coeficientes das forças e momento longitudinais


totais, incluindo controlo, são
ˆ + Cxδ δe + Cxδ δT ,



 Cx = Cxu û + Cxα α + Cxq q̂ + Cxα̇ˆ α̇ e T

ˆ
Cz = Czu û + Czα α + Czq q̂ + Czα̇ˆ α̇ + Czδe δe + CzδT δT , (7.17)


 C = C û + C α + C q̂ + C α̇ ˆ+C δ +C δ .

m mu mα mq mα̇ˆ mδe e mδT T

7.1.3 Forças e momentos aerodinâmicos para o movimento lateral


Para o movimento lateral, em que a posição do plano de simetria do avião é alterada,
as forças e momentos aerodinâmicos relevantes são YA , LA e NA , que dependem apenas
das variáveis dinâmicas longitudinais, isto é, de v, p e r :

 YA = Yv v + Yp p + Yr r ,


LA = Lv v + Lp p + Lr r , (7.18)

NA = Nv v + Np p + Nr r .

As derivadas (dimensionais) são


∂Y ∂L ∂N
Yv ≡ , Lv ≡ , Nv ≡ ,
∂v ∂v ∂v
∂Y ∂L ∂N
Yp ≡ , Lp ≡ , Np ≡ ,
∂p ∂p ∂p
∂Y ∂L ∂N
Yr ≡ , Lr ≡ , Nr ≡ .
∂r ∂r ∂r
Para o movimento lateral, os coeficientes adimensionais das forças e momentos
aerodinâmicos são
1
YA = ρV 2 S CyA , (7.19)
2
1
LA = ρV 2 Sb ClA , (7.20)
2
1
NA = ρV 2 Sb CnA . (7.21)
2
A versão adimensionalizada de (7.18) é

C = Cyβ β + Cyp p̂ + Cyr r̂ ,
 yA


ClA = Clβ β + Clp p̂ + Clr r̂ , (7.22)

 C = C β + C p̂ + C r̂ .

nA nβ np nr

84
Note-se que, tal como anteriormente, as derivadas são obtidas derivando os coeficien-
tes adimensionais em ordem às variáveis adimensionais, isto é,

∂Cy ∂Cy ∂Cx


Cyβ ≡ , Cyp ≡ , Cyr ≡ , etc.
∂β ∂ p̂ ∂ r̂

Forças e momentos de controlo lateral


Para controlo lateral as superfícies de controlo habitualmente disponíveis são o
leme de direcção (rudder, cuja deflexão é δr ) e os ailerons, cuja deflexão é dada por δa .
Assim, temos
 ∆YC = Yδa δa + Yδr δr ,


∆LC = Lδa δa + Lδr δr , (7.23)

∆NC = Nδa δa + Nδr δr .

Estas equações podem facilmente adaptar-se a outras configurações (como, por exem-
plo, um par adicional de ailerons). Note-se também que frequentemente se faz a apro-
ximação Yδa = 0, pois a força lateral devido à deflexão dos ailerons é praticamente
nula.
Os coeficientes das forças e momentos de controlo lateral obtêm-se facilmente pela
adimensionalização das equações acima:

 ∆Cy = Cyδa δa + Cyδr δr ,




∆Cl = Clδa δa + Clδr δr , (7.24)

∆Cn = Cnδa δa + Cnδr δr .

Tendo em conta (7.1) e (7.2), os coeficientes das forças e momento laterais totais,
incluindo controlo, são

C = Cxβ β + Cyp p̂ + Cyr r̂ + Cyδa δa + Cyδr δr ,
 y


Cl = Clβ β + Clp p̂ + Clr r̂ + Clδa δa + Clδr δr , (7.25)

 C = C β + C p̂ + C r̂ + C δ + C δ .

y nβ np nr nδa a nδr r

7.2 Estados estacionários longitudinais


Estamos agora em condições de abordar alguns estados estacionários. Começare-
mos por verificar em que condições é que podem existir estados estacionários longitu-
dinais «puros».
Por definição, num estado estacionário as derivadas temporais são nulas, isto é,
u̇ = 0 = v̇ = ẇ, ṗ = 0 = q̇ = ṙ e ψ̇ = 0 = θ̇ = φ̇. Se o estado estacionário
é longitudinal, são nulas as velocidades angulares laterais p = r = 0, bem como a
velocidade lateral (de derrapagem) v = 0, donde β = 0. Adicionalmente, se o estado
estacionário corresponder a um voo rectilíneo, não existe velocidade angular de picada,
q = 0. As equações do movimento de translação (6.19) reduzem-se então a

X − mg sin θ = 0,



Y + mg cos θ sin φ = 0, (7.26)

Z + mg cos θ cos φ = 0,

85
e as equações do movimento de rotação (6.23) a

 L = 0,


M = 0, (7.27)

N = 0.

Dado que (
L = Lv v + Lp p + Lr r + Lδa δa + Lδr δr ,
N = Nv v + Np p + Nr r + Nδa δa + Nδr δr ,
e que v = p = r = 0, conclui-se que δa = 0 = δr . Logo Y = Yv v + Yp p + Yr r + Yδa δa +
Yδr δr = 0. Da segunda equação de (7.26) segue-se finalmente que sin φ = 0.
Em conclusão, só pode haver estados (estacionários) longitudinais para voo com
asas niveladas, i.e., com ângulo de pranchamento nulo. Se φ ≠ 0, passa a existir
acoplamento entre movimento longitudinal e lateral. Os estados estacionários longitu-
dinais possíveis são voos simultaneamente rectilíneos e com asas niveladas e podem
ser horizontais ou com ângulo de subida.

7.2.1 Voo com ângulo de subida constante


O estado estacionário longitudinal mais simples é o voo horizontal rectilíneo com
asas niveladas. No entanto, este já foi tratado anteriormente com pormenor. O estado
estacionário longitudinal que iremos tratar agora é o de um voo rectilíneo com ângulo
de subida constante. Como se afirmou acima, para ser estado estacionário longitudi-
nal, este voo terá de ser nivelado, ou seja, é necessário que φ = 0.
O eixo Cx é escolhido segundo a direcção da linha de sustentação nula do avião.
Suporemos que a linha de propulsão coincide com o eixo Cx (no caso mais geral existe
um ângulo constante entre a linha de propulsão e o eixo Cx, que aqui supomos nulo).
As forças aplicadas no avião estão representadas na figura 7.1. As componentes
das segundo x e z das forças aerodinâmicas e de propulsão são dadas por
(
X = T + L sin α − D cos α,
(7.28)
Z = −L cos α − D sin α.
De (7.26) com φ = 0 e de (7.27), as equações do movimento neste caso são

 T + L sin α − D cos α − mg sin θ = 0,




− L cos α − D sin α + mg cos θ = 0, (7.29)

M =0

Se α for suficientemente pequeno para podermos desprezar os termos em sin α, a


primeira equação é
T = D + mg sin θ (7.30)
e a intensidade da força de propulsão determina θ e deste modo o ângulo de subida
γ = θ − α. Esta é uma aproximação um pouco grosseira, mas permite perceber que o
ângulo de subida é determinado principalmente pela força de propulsão.
Numa aproximação menos grosseira, em que sin α ≈ α e cos α ≈ 1, teríamos

 T + Lα − D − mg sin θ = 0,


− L + mg cos θ = 0, (7.31)

M = 0.

86
Figura 7.1: Voo rectilíneo com ângulo de subida constante.

Na segunda equação o termo D sin α foi desprezado face aos outros dois. Adimensio-
nalizando (7.31), obtém-se

 CT + CL α − CD − CW sin θ = 0,


CL = CW cos θ, (7.32)

Cm = 0.

As duas últimas equações são idênticas às equações de equilíbrio habituais para voo
rectilíneo horizontal, mas com CLtrim = CW cos θ. Os valores de α e de δe resultam da
solução de (
CW cos θ = CLα αtrim + CLδe δetrim ,
(7.33)
0 = Cm0 + Cmα αtrim + Cmδe δetrim ,
ou seja,
(CW cos θ)Cmδe + Cm0 CLδe

 αtrim = ,



 det
(7.34)
C C + (C cos θ)C

L m W m

 δetrim = − α 0 α

 .
det
Como CLtrim = CW cos θ < CW (que é o valor de CLtrim para voo horizontal), o valor de
αtrim será menor e o de δetrim será maior (isto é, mais positivo ou menos negativo) que
para voo horizontal para a mesma velocidade. Isto deve-se a que agora a sustentação
tem de equilibrar apenas uma parte do peso, sendo a outra parte equilibrada por um
acréscimo da força de propulsão. A primeira equação de (7.32) é agora
CT = CD + CW sin θ − CL αtrim = CD + CW (sin θ − αtrim cos θ), (7.35)
e usando o valor de αtrim obtido acima (e calculando CD a partir de CL ou do ângulo
de ataque), o valor de CT necessário para garantir um ângulo de subida θ pode ser
determinado.

87
Em conclusão, a velocidade e o ângulo de subida são determinados pelo sistema
(7.32) e controlados por δe e pela força de propulsão.

7.3 Estados estacionários laterais


O estado estacionário lateral que vamos tratar é a derrapagem estacionária. A volta
coordenada é também um estado estacionário lateral, mas iremos descrevê-la como
manobra estacionária.

7.3.1 Derrapagem estacionária


Tal como anteriormente, «estacionária» implica que as derivadas temporais são
nulas (excepto, evidentemente, ẋE ). Num voo apenas de derrapagem, as velocidades
angulares devem também ser nulas:

p = 0 = q = r. (7.36)

As equações do movimento lateral são (para aeronaves simétricas):

 Y + mg cos θ sin φ = m(v̇ + r u − pw) = 0,




L = Ixx ṗ − Izx (ṙ + pq) − (Iyy − Izz )qr = 0,

N = Izz ṙ − Izx (ṗ − qr ) − (Ixx − Iyy )pq = 0.

Tendo em conta (7.36) e o anulamento das derivadas temporais, obtemos

 Y + mg sin φ cos θ = 0,


L = 0,

N = 0.

Recordando (7.18) e (7.23), as forças e momentos aerodinâmicos são dados por

 Y = Yv v + Yp p + Yr r + Yδr δr = Yv v + Yδr δr ,


L = Lv v + Lp p + Lr r + Lδr δr + Lδa δa = Lv v + Lδr δr + Lδa δa ,

N = Nv v + Np p + Nr r + Nδr δr + Nδa δa = Nv v + Nδr δr + Nδa δa .

Obtem-se então o sistema de equações para a derrapagem estacionária:

 Yv v + Yδr δr + mg cos θ sin φ = 0




Lv v + Lδr δr + Lδa δa =0

Nv v + Nδr δr + Nδa δa =0

Este sistema pode escrever-se na forma matricial. Dada a velocidade de derrapagem,


obtemos os valores das deflexões dos ailerons e do leme de direcção, bem como do
ângulo de pranchamento necessários para a manobra.

Y δr 0 mg cos θ δr Yv
    
 Lδr Lδa 0   δa  = −  Lv  v. (7.37)
N δr Nδa 0 sin φ Nv

88
Note-se que as equações (7.37) podem também ser escritas na forma adimensional:

Cyδr 0 CW cos θ δr Cyβ


    
 Cl δ Cl δ a 0   δa  = −  Clβ  β. (7.38)
r
Cnδr Cnδa 0 sin φ Cn β

A relação entre as derivadas dimensionais e as derivadas dos coeficientes adimensio-


nais será tratada mais à frente.
Alguns casos particulares de especial interesse são os de voo com vento lateral e
de voo na situação de One engine inoperative (OEI). No caso de One engine inoperative
(OEI) a propulsão não é simétrica e há forças adicionais de resistência do(s) motor(es)
parado(s). Por este motivo gera-se um momento de guinada devido à propulsão, NT ,
que é necessário adicionar às equações acima. O momento total de guinada passa a
ser não nulo: N = NT .

7.4 Manobras
As manobras efectuadas pelos aviões são em geral não estacionárias. Com frequên-
cia nas manobras os efeitos aerodinâmicos transientes são importantes e os ângulos
de guinada e rolamento (e até de picada) podem ser elevados. Como não são estados
de equilíbrio, também não faz sentido falar de estabilidade das manobras, embora a
estabilidade da aeronave seja relevante para a capacidade de efectuar manobras facil-
mente e com segurança.
Existem, porém, algumas manobras que podem ser consideradas estacionárias e
que iremos considerar em seguida: a manobra de descida-subida simétrica, ou pull-up
simétrico, que é uma manobra longitudinal, e a viragem estacionária, ou volta coorde-
nada, que é uma manobra lateral.

7.5 Manobra de descida-subida simétrica


A manobra longitudinal que vamos considerar é a manobra de descida-subida (pull-
up) simétrica. A figura 7.2 representa esta manobra na situação em que o avião se
encontra no ponto mais baixo da trajectória. A trajectória de voo é circular num plano
vertical, pelo que existe uma aceleração normal. Além disso, existe uma velocidade
angular de picada q. Em rigor esta manobra não é estacionária porque as componen-
tes do peso quer segundo a velocidade quer perpendicular a ela não são constantes
durante o movimento. No entanto, considerando uma vizinhança próxima do ponto
mais baixo da trajectória podemos desprezar essa variação da direcção das forças e
considerar a manobra como simétrica.
Define-se factor de carga n como a razão entre a sustentação e o peso da aeronave:

L
n= a L = nW . (7.39)
W
Logo, na direcção vertical L − W = (n − 1)W = (n − 1)mg, e a aceleração normal é

L−W
an = = (n − 1)g. (7.40)
m

89
Figura 7.2: Manobra de pull-up simétrico.

Seja δe a deflexão do leme necessária para um voo rectilíneo estacionário com velo-
cidade V . Na manobra de pull-up a deflexão deverá ser diferente: δe + ∆δe . Por outro
lado, se a força de controlo que é necessário exercer para equilíbrar o avião é P num
voo rectilíneo estacionário, numa manobra de pull-up deverá ser P + ∆P . Pretende-
mos determinar os valores dos acréscimos ∆δe e ∆P . Normalmente estes acréscimos
expressão-se em função da aceleração normal, medida em g. Define-se assim deflexão
do leme de profundidade por g como

∆δe
, (7.41)
n−1
e força de controlo por g como
∆P
. (7.42)
n−1
A aceleração numa manobra de pull-up é a aceleração centrípeta do movimento
circular com velocidade V e raio R (ver figura 7.3):

V2 V
an = = q2 R ⇒ q= ⇒ an = qV (7.43)
R R
Logo, a velocidade angular de picada é dada por

an (n − 1)g
q= = . (7.44)
V V

7.5.1 Equações de equilíbrio dinâmico


Como existe velocidade angular de picada q, o escoamento visto pela aeronave é
curvo, o que provoca alteração no campo de pressões e nas forças e momentos ae-
rodinâmicos relativamente à situação em que q = 0. Representando por ∆CL e ∆Cm
a variação dos coeficientes de sustentação e do momento de picada quando q ≠ 0,
podemos escrever (
CLtotal = CLvoo horizontal + ∆CL ,
(7.45)
Cmtotal = Cmvoo horizontal + ∆Cm .

90
Figura 7.3: Manobra de pull-up simétrico: aceleração normal e factor de carga n.

Se q, ∆α e ∆δe forem «pequenos», os coeficientes CL e Cm dependem linearmente


das variáveis dinâmicas, que neste caso incluem a velocidade angular de picada:
(
CLtotal = CLα (α + ∆α) + CLq q̂ + CLδe (δe + ∆δe ),
Cmtotal = Cm0 + Cmα (α + ∆α) + Cmq q̂ + Cmδe (δe + ∆δe ),
sendo
∂CL ∂Cm
CLq = , Cmq = .
∂ q̂ ∂ q̂
Tendo em conta que num voo horizontal CLvoo horizontal e Cmvoo horizontal devem verificar (2.76),
obtemos (
∆CL = CLα ∆α + CLq q̂ + CLδe ∆δe ,
(7.46)
∆Cm = Cmα ∆α + Cmq q̂ + Cmδe ∆δe .
A equação (7.44) permite escrever a velocidade angular de picada q̂ como
1
qc̄ (n − 1)g c̄ mg 2 ρS c̄ CW
q̂ = = = (n − 1) 1 = (n − 1) , (7.47)
2V 2V 2 2
ρSV 2 2m 2µ

tendo sido usados o coeficiente adimensional do peso, CW , e a razão de massa, µ,


definidos respectivamente por
mg
CW = 1 , (7.48)
2
ρV 2 S
m
µ= 1 . (7.49)
2
ρS c̄

91
Na descida-subida estacionária não há aceleração angular. Por isso, Cmtotal = 0 im-
plica ∆Cm = 0. Por outro lado, os coeficientes de sustentação verificam
L
CLtotal = 1 , (7.50)
2
ρV 2 S

W
CLvoo horizontal = 1 = CW , (7.51)
2
ρV 2 S

L−W (n − 1)W
∆CL = 1 = 1 = (n − 1)CW . (7.52)
2
ρV 2 S 2
ρV 2 S

Das equações de equilíbrio dinâmico deduz-se portanto que


CW

 ∆CL = (n − 1)CW = CLα ∆α + CLq (n − 1) 2µ + CLδe ∆δe



(7.53)
 CW
 ∆Cm = 0 = Cmα ∆α + Cmq (n − 1) + Cmδe ∆δe



Na forma matricial:
 
CLq
#  ∆α  
CLα CLδe C 1 −
"
n−1 W 2µ 
·  ∆δ  =  . (7.54)

Cmq
Cmα Cmδe e
−C W
n−1 2µ

A deflexão adicional do elevator necessária para que se dê a manobra de pull-up é


" #
∆δe CW 1  
=− Cm α − CLq Cmα − CLα Cmq . (7.55)
n−1 det 2µ

O acréscimo no ângulo de ataque pode ser dado por


" #
∆α 1 CW ∆δe
= CW − CLq − CLδe , (7.56)
n−1 CL α 2µ n−1

ou ainda por " #


∆α CW 1  
= Cmδe − CLq Cmδe − CLδe Cmq . (7.57)
n−1 det 2µ

7.5.2 Ponto e margem de manobra


O acréscimo de deflexão ∆δe depende da posição do centro de massa por via das
derivadas Cmα , CLq e Cmq . Explicitando apenas a contribuição de Cmα e fazendo uso de
(2.44) obtemos
" ! #
∆δe CW 1 CLα Cmq
=− CLα (h − hn ) 1 − CL +
n−1 det 2µ q 2µ
!
CW CLα (2µ − CLq ) Cm q
=− h − hn + . (7.58)
2µ det 2µ − CLq

92
Figura 7.4: (Fonte: Etkin & Reid, Dynamics of Flight)

Define-se ponto de manobra (hm ) como a posição do centro de massa para a qual
∆δe
n−1
= 0. Assim,
!
∆δe CW CLα (2µ − CLq ) Cmq
=− h − hn + = 0,
n−1 2µ det 2µ − CLq

e conclui-se que o ponto de manobra é dado por

Cmq (hm )
hm = hn − . (7.59)
2µ − CLq (hm )

Na equação (7.59) explicitou-se a dependência de CLq e Cmq relativamente à posição


do centro de massa. Na maioria dos casos pode-se simplicar a equação (7.59) pois
CLq  2µ. Além disso, em aeronaves com cauda a variação de Cmq com h é pequena.
A variação de ∆δe com h é aproximadamente linear e a posição do ponto de manobra
pode ser aproximada por
Cmq
hm = hn − . (7.60)

Em função do ponto de manobra, a deflexão (adicional) do leme por g vem dada
por
∆δe CW CLα (2µ − CLq )
=− (h − hm ) . (7.61)
n−1 2µ det
Define-se margem de manobra com controlo fixo como (hm − h). Na hipótese de que
a variação de CLq e Cmq com h pode ser desprezada, a deflexão do leme por g varia
linearmente com a margem de manobra. O declive da recta é proporcional a CW .

93
7.5.3 Força de controlo por g e ponto de manobra de manche livre
Como vimos, para realizar a manobra de pull-up é necessária uma deflexão adicio-
nal de leme de profundidade. A esta deflexão adicional corresponderá uma força de
controlo adicional, que vamos determinar de seguida.
A força de controlo depende do momento de charneira, pelo que
1 1
P = GSe c̄e ρV 2 Che ⇒ ∆P = GSe c̄e ρV 2 ∆Che (7.62)
2 2
Mas, em voo rectilíneo e estacionário,

Chevoo rectilíneo = Che0 + Cheα α + b2 δe + b3 δt .

na manobra de pull-up teremos

Chetotal = Chevoo rectilíneo + ∆Che , (7.63)

em que ∆Che depende não apenas de α e δe , mas também da velocidade angular de


picada q̄, dado que esta modifica o escoamento em torno do avião:

∆Che = Cheα ∆α + Cheq q̄ + b2 ∆δe . (7.64)

Usando as expressões (7.56) e (7.47) para substituir ∆α e q̂, respectivamente, obtém-se


" #
∆Che Cheα Cw ∆δe CW ∆δe
=− CW − CL q − CLδe + Cheq + b2
n−1 CLα 2µ n−1 2µ n−1
!
CW h i ∆δe Cheα CLδe
=− (2µ − CLq )Cheα + Cheq CLα + b2 −
2µCLα n−1 CL α

Finalmente, usando (7.61) e tendo em conta que


Cheα CLδe a0 b2 Cheα CLδe
a 0 = CL α − ⇒ = b2 − ,
b2 CLα CLα

conclui-se que
∆Che CW a0 b2
=− (2µ − CLq )(h − h0m ). (7.65)
n−1 2µ det
Na equação (7.65) introduziu-se o ponto de manobra com manche livre, h0m , definido
por !
0 det Cheα Cheq
hm = hm + 0 + (7.66)
a b2 CLα 2µ − CLq
A equação (7.62) permite determinar a força de controlo por g, representada por Q:
∆P 1 ∆Che
Q= = GSe c̄e ρV 2
n−1 2 n−1
1 1 a0 b2
= −GSe c̄e ρV 2 CW (2µ − CLq )(h − h0m )
2 2µ det
W a0 b2
= −GSe c̄e (2µ − CLq )(h − h0m )
S 2µ det

94
Figura 7.5: Força de controlo por g: dependência da posição do centro de massa.
(Fonte: Etkin & Reid, Dynamics of Flight)

Em função da carga alar (wing loading) w = W /S, a força de controlo por g vem
dada por
a0 b2
Q = −GSe c̄e w (2µ − CLq )(h − h0m ). (7.67)
2µ det
Podemos concluir que Q aumenta linearmente com h à medida que o CG se desloca
para a frente, é proporcional à carga alar w, é proporcional a (Se c̄e ), i.e., ao cubo das
dimensões lineares da aeronave, e é independente da velocidade do avião, V .
Na figura 7.5 mostra-sea dependência da força de controlo por g com a posição do
centro de massa da aeronave.

7.6 Manobra de Viragem Estacionária


Define-se volta coordenada como uma manobra de viragem em que a velocidade
angular de viragem é vertical e constante e em que a força resultante não tem compo-
nente lateral (no referencial do avião). Note-se que por vezes se considera que numa
volta coordenada a derrapagem é nula, o que é apenas aproximadamente verdade.
Habitualmente φ é grande, pelo que existe acoplamento entre equações longitudi-
nais e laterais. As outras variáveis (ângulos de ataque, ângulo de subida, etc.) são
pequenas e podemos linearizar as equações nessas variáveis. Por exemplo, são válidas
as aproximaçõescos θ ≈ 1 e sin θ ≈ θ.
As componentes da velocidade angular obtém-se aplicando a matriz de rotação ao
~
vector ω:
p 0 − sin θ
     
 q  = RBE  0  =  cos θ sin φ  ω (7.68)
r ω cos θ cos φ

95
~ é vertical e a
Figura 7.6: Viragem estacionária com subida. A velocidade angular ω
aceleração centrípeta está no plano horizontal.

96
Figura 7.7: Forças numa manobra de viragem estacionária. No plano yz a resultante
da sustentação e do peso é a aceleração centrípeta.

ou seja,
 p = −ω sin θ


q = ω sin φ cos θ (7.69)

r = ω cos φ cos θ

Comecemos por determinar as equações do movimento de translação segundo y


e z, que dependem das forças aerodinâmicas aplicadas. O sistema de eixos de esta-
bilidade é o mais adequado neste problema. O eixo Gx é definido como estando na
direcção da projecção da velocidade no plano de simetria e portanto αx = 0 = w.
Admitiremos também que não há vento. As equações do movimento de translação
segundo y e z são então
(
Y + mg cos θ sin φ = m(v̇ + ur − pw) = mur
Z + mg cos θ cos φ = m(ẇ + vp − qu) = m(vp − qu)

Numa volta coordenada o ângulo de derrapagem é quase nulo, pelo que podemos
supor v pequeno, e portanto u ≈ V . Além disso, se v e p são pequenos, podemos
desprezar o produto vp. Logo, o sistema pode aproximar-se por
(
Y ≈ −mg sin φ cos θ + mr V = 0
(7.70)
Z ≈ −mg cos φ cos θ − mqV

Note-se que Y = 0 pela definição de volta coordenada, e que Y = 0 ⇒ Cy = 0.

97
rV 

0 = −mg sin φ cos θ + mr V ⇒ sin φ = 
g cos θ  ωV

⇒ tan φ = .
r 
 g
r = ω cos φ cos θ ⇒ cos φ =


ω cos θ
O factor de carga (vertical) nz é a razão entre a força vertical e o peso, donde
Z qV (ω sin φ cos θ)V
nz = − = cos φ cos θ + = cos φ cos θ + =
mg g g
cos θ
= cos φ cos θ + sin φ tan φ cos θ = = cos θ sec φ
cos φ
Para eixos de estabilidade Z = −L, pelo que
L
n= = nz = cos θ sec φ (7.71)
W
O incremento do coeficiente de sustentação relativamente ao valor necessário para um
voo estacionário rectilíneo é
L − mg
∆CL = 1 = (n − 1)CW . (7.72)
2
ρV 2 S
Este incremento é conseguido à custa da contribuição da velocidade angular de picada
e dos incrementos ∆α e ∆δe relativamente aos valores de equilíbrio para voo rectilíneo
horizontal.
Consideremos agora as equações para o movimento de rotação. Para uma aeronave
simétrica as equações dos momentos são
L = Ix ṗ − Izx ṙ + qr (Iz − Iy ) − Izx pq + qh0z − r h0y




 M = Iy q̇ + r p(Ix − Iz ) + Izx (p 2 − r 2 ) + r h0x − ph0z
 N = I ṙ − I ṗ + pq(I − I ) − I qr + ph0 − qh0

z zx y x zx y x

Num estado estacionário as derivadas temporais são nulas. Por outro lado as veloci-
dades angulares sopõem-se pequenas e pode-se desprezar os termos quadráticos (qr ,
pq, r p, p 2 e r 2 ). Finalmente, desprezam-se as contribuições dos rotores. Conclui-se
portanto que L = M = N = 0 ⇒ Cl = Cm = Cn = 0.
Tendo em conta (7.25), as equações para o movimento lateral direccional são


 0 = Cl = Clβ β + Clp p̂ + Clr r̂ + Clδr δr + Clδa δa

0 = Cn = Cnβ β + Cnp p̂ + Cnr r̂ + Cnδr δr + Cnδa δa

 0 = C = C β + C p̂ + C r̂ + C δ

y yβ yp yr yδr r

Para o movimento longitudinal as equações são


(
∆CL = CLα ∆α + CLq q̂ + CLδe ∆δe = (n − 1)CW
Cm = Cmα ∆α + Cmq q̂ + Cmδe ∆δe = 0

em que, tal como no caso da manobra de pull-up, ∆α e ∆δe são os incrementos do


ângulo de ataque e da deflexão do elevator relativamente ao caso de voo rectilíneo
estacionário (em equilíbrio).

98
Usando (7.69) para escrever todas as velocidades angulares em função de ω, as
equações na forma matricial para as variáveis laterais são

Cyβ Cyδr 0 β Cyp Cyr


     
sin θ ωb
 
 Clβ Clδ Clδa · δr = Clp Clr ·
     × , (7.73)
r
− cos φ cos θ 2V
Cnβ Cnδr Cnδa δa Cnp Cnr

e para as variáveis longitudinais são

CLα CLδe ∆α CLq ωc̄ 0


       
· =− × sin φ cos θ + . (7.74)
Cmα Cmδe ∆δe Cmq 2V (n − 1)CW

O incremento da deflexão do leme de profundidade pode obter-se resolvendo a equa-


ção (7.74), obtendo-se

1 ωc̄ ωc̄
    
∆δe = Cmα −CLq sin φ cos θ + (n − 1)CW + CLα Cmq sin φ cos θ
det 2V 2V
1 ωc̄
   
= sin φ cos θ Cmq CLα − Cmα CLq + (n − 1)CW Cmα
det 2V
( )
1 n2 − 1 C W  
= cos θ Cmq CLα − Cmα CLq + (n − 1)CW Cmα .
det n 2µ

Nas equações acima usou-se

ωc̄ (g tan φ/V )c̄ mg ρS c̄ sin2 φ


sin φ = sin φ = 1 =
2V 2V 2
ρV 2 S 2 × 2m cos φ

CW 1 C W n2 − 1
= (1 − 2 )n = .
2µ n 2µ n

A expressão para ∆δe pode também escrever-se como


 
Cmα + n+1
2µn
cos θ C mq
C L α
− Cm α
C Lq
∆δe = −(n − 1)CW . (7.75)
CLα Cmδe − CLδe Cmα

Note-se a semelhança desta expressão com a obtida para o caso da manobra de pull-up.
Resolvendo o sistema (7.73) podem-se encontrar os valores da deflexão dos ailerons
e do rudder necessários para que se realize a volta coordenada, bem como o valor do
ângulo de derrapagem (que é habitualmente quase nulo).

99
Capítulo 8

Teoria para Pequenas


Perturbações

No capítulo 6 deduziram-se as equações gerais do movimento de uma aeronave.


Estas equações são não lineares, mas é possível encontrar soluções particulares para
alguns estados estacionários, como foi feito no capítulo 7. Interessa saber se esses es-
tados estacionários são estáveis para pequenas perturbações das variáveis dinâmicas.
Para isso é necessário estabelecer as equações que regem a evolução temporal dessas
pequenas perturbações. Começaremos por linearizar as equações do movimento e em
seguida tendo em conta as equações do movimento do estado estacionário, obteremos
um sistema de equações diferenciais lineares para as pequenas perturbações.

8.1 Definição do estado estacionário


As variáveis dinâmicas vão ser decompostas na soma do valor que assumem no
estado estacionário com o valor da pequena perturbação. Usaremos o índice 0 para
identificar as variáveis do estado estacionário.
O estado estacionário relativamente ao qual vamos procurar estabelecer as equa-
ções de evolução das pequenas perturbações é o correspondente a um movimento
rectilíneo uniforme sem derrapagem e com asas niveladas. Logo, são nulas a acelera-
ção linear (u̇0 = v̇0 = ẇ0 = 0), a velocidade angular p0 = q0 = r0 = 0, a velocidade
lateral (v0 = 0) e o ângulo de pranchamento (φ0 = 0). Vamos além disso usar ângulo
de rumo nulo: ψ = 0 (é sempre possível sem perda de generalidade).
Usaremos um sistema de eixos de estabilidade, pelo que o eixo Cx tem a direcção
de V~0 (o que é sempre possível porque v0 = 0). Logo, w0 = 0, o que implica que αx = 0,
pelo que θ0 coincide com o ângulo de subida.
Admitiremos que o efeito dos rotores é desprezável. Esta hipótese é válida se o
avião está em voo planado ou se o momento angular de cada rotor é pequeno ou ainda
se os rotores são simétricos e rodam em sentidos opostos.
Se existir vento com velocidade constante, a velocidade do avião relativamente à
Terra é V ~E = V~ +W~ e, dado que v0 = 0 = w0 , conclui-se que v0E = Wy e w0E = Wz . A
influência do vento na dinâmica será tratada mais à frente. Por enquanto admitir-se-á
que não existe vento, pelo que V ~E = V
~ , donde uE = u, v E = v e w E = w.

100
Finalmente, no estado estacionário temos δa = 0 e δr = 0 (mas, evidentemente,
δe ≠ 0).

8.1.1 Notação para estado estacionário e perturbação


As variáveis dinâmicas vão ser decompostas na soma do valor que assumem no
estado estacionário com o valor da pequena perturbação. Por exemplo, representando
por x o valor total de uma determinada variável, o seu valor no estado estacionário é
x0 e o valor da perturbação é ∆x. Logo, x = x0 + ∆x. No caso em que x0 = 0, a variável
total é x = ∆x. Neste caso usaremos apenas x para a perturbação.
Tendo em conta o estado estacionário definido acima, a velocidade linear é

 u = u0 + ∆u,


v ≡ ∆v, (8.1)

w ≡ ∆w.

Por sua vez, a velocidade angular é

 p ≡ ∆p (p0 = 0),


q ≡ ∆q (q0 = 0), (8.2)

r ≡ ∆r (r0 = 0),

e os ângulos de Euler são


 ψ ≡ ∆ψ (ψ0 = 0),


θ = θ0 + ∆θ, (8.3)

φ ≡ ∆φ (φ0 = 0).

Dado que, por hipótese, ∆θ é pequeno, podemos usar as aproximações habituais:


cos ∆θ ≈ 1 e sin ∆θ ≈ ∆θ. Logo,

sin(θ0 + ∆θ) = sin θ0 cos ∆θ + cos θ0 sin ∆θ ≈ sin θ0 + ∆θ cos θ0 ,


cos(θ0 + ∆θ) = cos θ0 cos ∆θ − sin θ0 sin ∆θ ≈ cos θ0 − ∆θ sin θ0 .

8.1.2 Equações para o estado estacionário


Substituindo as definições do estado estacionário nas equações gerais do movi-
mento (6.19), (6.23) e (6.12), obtemos para a dinâmica de translação as equações

 X0 − mg sin θ0 = 0,


Y0 = 0,

Z0 + mg cos θ0 = 0.

Para as equações da dinâmica de rotação temos

 L0 = 0,


M0 = 0,

N0 = 0.

101
Por sua vez, as equações da trajectória do estado estacionário são simplesmente

 ẋE0 = u0 cos θ0 ,


ẏE0 = 0,

żE0 = −u0 sin θ0 .

8.2 Linearização das equações


Como foi visto acima, supomos que as perturbações são pequenas e por isso pode-
mos desprezar os termos quadráticos (isto é, todos aqueles em que aparecem produtos
das variáveis da perturbação) face aos termos lineares.
Para linearizar as equações do movimento para pequenas perturbações é necessário
substituir todas as variáveis de estado pela soma da contribuição do estado estacio-
nário com a da perturbação. Em seguinda usamos as equações do estado estacionário
para eliminar os termos que contenham apenas contribuições do estado estacionário.
Finalmente, desprezamos os termos quadráticos nas pequenas perturbações.

8.2.1 Forças e momentos aerodinâmicos


As forças e os momentos aerodinâmicos são função das variáveis de estado. Para
pequenas perturbações, as variáveis de estado longitudinais são ∆u, w, q e a derivada
temporal ẇ (∆u̇ e q̇ não são relevantes). As variáveis de estado laterais são v, p e r .
Supomos que as perturbações nas forças e momentos dependem linearmente das
variáveis de estado. Admitimos ainda que em configurações simétricas as forças e mo-
mentos laterais só dependem das variáveis laterais e desprezamos a contribuição das
variáveis laterais (assimétricas) para as forças e momentos longitudinais (simétricas).
Assim, admitimos que as forças e momentos longitudinais dependem linearmente de
∆u, w, q, ẇ e que as forças ou momentos laterais dependem linearmente de v, p, r .

∆X = Xu ∆u + Xw w + Xẇ ẇ + Xq q + ∆Xc (8.4)


∆Y = Yv v + Yp p + Yr r + ∆Yc (8.5)
∆Z = Zu ∆u + Zw w + Zẇ ẇ + Zq q + ∆Zc (8.6)

∆L = Lv v + Lp p + Lr r + ∆Lc (8.7)
∆M = Mu ∆u + Mw w + Mẇ ẇ + Mq q + ∆Mc (8.8)
∆N = Nv v + Np p + Nr r + ∆Nc (8.9)

Habitualmente a dependência da força segundo x em q e ẇ pode ser desprezada. Isso


significa que Xẇ ≈ 0 e Xq ≈ 0. Também não vamos considerar a variação da densidade
ρ com a altitude.

8.2.2 Linearização das equações longitudinais


O movimento longitudinal é aquele em que o plano de simetria do avião não se
altera. As equações longitudinais a linearizar são as equações de translação segundo
x e z e a equação do movimento de rotação segundo y.

102
Equação do movimento de translação segundo x
Comecemos pela linearização da equação do movimento de translação segundo x,

X − mg sin θ = m(u̇E + qw E − r v E ).

Substituindo todas as variáveis como a soma da contribuição do estado estacionário


com a da perturbação, obtém-se

(X0 + ∆X) − mg sin(θ0 + ∆θ) = m(u˙0 + ∆u̇ + qw − r v) (8.10)

Dado que sin(θ0 + ∆θ) ≈ sin θ0 + ∆θ cos θ0 e tendo em conta as equações do estado
estacionário,

(X − mg sin θ0 ) +∆X − mg cos θ0 ∆θ = m( u̇0 +∆u̇ + qw − r v). (8.11)


| 0 {z } |{z}
=0 (Est. estacionário) =0

A linearização implica que qw ≈ 0 e que r v ≈ 0, pelo que

∆X − mg cos θ0 ∆θ = m∆u̇. (8.12)

Por outro lado, desprezando os termos que incluem as derivadas Xq e Xẇ , a equação
(8.4) reduz-se a
∆X = Xu ∆u + Xw w + ∆Xc , (8.13)
donde:
Xu ∆u + Xw w + ∆Xc − mg cos θ0 ∆θ = m∆u̇
ou, resolvendo para a aceleração ∆u̇,

Xu Xw ∆Xc
∆u̇ = ∆u + w + −g cos θ0 ∆θ + . (8.14)
m m m

Equação do movimento de translação segundo z


De forma análoga, usando as equações do estado estacionário e linearizando a equa-
ção segundo z
Z + mg cos θ cos φ = m(ẇ E + pv E − quE ),
se chega a:
∆Z
ẇ =
− g sin θ0 ∆θ + u0 q. (8.15)
m
Desenvolvendo ∆Z de acordo com (8.6) obtém-se

Zu Zw Zẇ Zq ∆Zc
ẇ = ∆u + w+ ẇ + q − g sin θ0 ∆θ + u0 q + , (8.16)
m m m m m
e resolvendo em ordem a ẇ, obtém-se finalmente:
 
Zu Zw mu0 + Zq mg sin θ0 ∆Zc
ẇ = ∆u + w+ q− ∆θ + . (8.17)
m − Zẇ m − Zẇ m − Zẇ m − Zẇ m − Zẇ

103
Equação do movimento de rotação segundo y
A equação do movimento de rotação em torno de y é

M = Iyy q̇ − Izx (r 2 − p 2 ) − Ixy (ṗ + qr ) − Iyz (ṙ − pq) − (Izz − Ixx )r p.

No caso de uma aeronave com um plano de simetria Ixy = 0 = Iyz e a sua linearização
conduz a
∆M
q̇ = . (8.18)
Iy
Usando (8.8) e (8.17), obtém-se finalmente
"
1 Mẇ Zu Mẇ Zw
  
q̇ = Mu + ∆u + Mw + w+
Iy m − Zẇ m − Zẇ
! #
Mẇ (mu0 + Zq ) Mẇ mg sin θ0 Mẇ ∆Zc
Mq + q− ∆θ + ∆Mc + . (8.19)
m − Zẇ m − Zẇ m − Zẇ

Fecho do sistema de equações


Obtivemos até ao momento três equações, mas temos como variáveis ∆u, w, q e
∆θ. A quarta equação pode obter-se da linearização de

q = ψ̇ cos θ sin φ + θ̇ cos φ,

sendo simplesmente
∆θ̇ = q. (8.20)

Resumo das equações longitudinais para pequenas perturbações


Escrevendo o sistema de equações (8.14), (8.19), (8.17) e (8.20) na forma matricial,

 Xu Xw 
 
m m
0 −g cos θ0  
 
∆u̇   ∆u
(mu0 +Zq )
    
Zu Zw mg sin θ
− m−Zẇ 0 
    
m−Zẇ m−Zẇ m−Zẇ
    
 ẇ    w 
 =   . (8.21)
          
 q̇   1 M + Mẇ Zu 1 Mẇ Zw Mq Mẇ (mu0 +Zq ) −Mẇ mg sin θ0  
    
   Iy u m−Zẇ Iy
Mw + m−Zẇ Iy
+ Iy (m−Zẇ ) Iy (m−Zẇ )  
q 

    
 
∆θ̇ ∆θ
0 0 1 0

No sistema de equações acima omitiu-se o vector das variáveis de controlo, dado


por
"  #T
∆Xc ∆Zc 1 Mẇ ∆Zc

, , ∆Mc + ,0 (8.22)
m m − Zẇ Iy m − Zẇ
As equações linearizadas para o «flight path» são

∆ẋE = ∆u cos θ0 + w sin θ0 − u0 ∆θ sin θ0 , (8.23)


∆żE = −∆u sin θ0 + w cos θ0 − u0 ∆θ cos θ0 . (8.24)

104
8.2.3 Linearização das equações laterais
O processo de linearização das equações laterais é idêntico ao das equações longi-
tudinais. Da equação para o movimento de translação segundo y obtemos a aceleração
v̇, enquanto que ṗ e ṙ se obtêm das equações para o movimento de rotação segundo x
e z, respectivamente. A quarta equação, necessária para fechar o sistema de equações,
pode obter-se da linearização da primeira e terceira equações de (6.12), que conduz a
φ̇ = p + r tan θ0 .
Para exemplificar o procedimento vamos obter a equação para ṗ. partimos da pri-
meira equação do sistema (6.23):

L = Ixx ṗ − Iyz (q2 − r 2 ) − Izx (ṙ + pq) − Ixy (q̇ − r p) − (Iyy − Izz )qr .

Recordando que, para aviões com plano de simetria, Ixy = 0 = Iyz e que no estado
estacionário se tem L0 = 0, a linearização desta equação conduz a

∆L = Ixx ṗ − Ixz ṙ . (8.25)

Esta equação depende de ṙ , pelo que necessitamos de usar simultaneamente a equação


que resulta de linearizar a terceira equação do sistema (6.23), ou seja,

∆N = Izz ṙ − Ixz ṗ.

Tendo em conta (8.9), podemos escrever

Ixz Nv Np Nr ∆Nc
ṙ = ṗ + v+ p+ r+ . (8.26)
Izz Izz Izz Izz Izz

Substituindo em (8.25) e tendo em conta que ∆L é dado por (8.7), vem


!
2 Ixz Np
Ixz Ixz Nv Ixz Nr Ixz ∆Nc
       
Ixx − ṗ = Lv + v + Lp + p+ Lr + r + ∆Lc + .
Izz Izz Izz Izz Izz

Para simplificar a escrita desta equação definimos


2 2
Ixz Ixx Izz − Ixz
Ix0 = Ixx − = , (8.27)
Izz Izz
0 Ixz Ixz
Ixz = = 2 . (8.28)
Izz Ix0 Ixx Izz − Ixz

Note-se que para eixos principais de inércia Ixz = 0, então Ix0 = Ixx e Ixz 0
= 0. Com
estas definições a equação pode escrever-se

Lv Lp Lr ∆Lc
       
0 0 0 0
ṗ = + I N
xz v v + + I N
xz p p + + I N
xz r r + + Ixz ∆Nc . (8.29)
Ix0 Ix0 Ix0 Ix0

De forma análoga procederíamos para deduzir a equação para ṙ , sendo conveniente


definir igualmente
2
Ixx Izz − Ixz
Iz0 = . (8.30)
Ixx
Para eixos principais de inércia teríamos Iz0 = Izz .

105
Resumindo na forma matricial o sistema de equações diferenciais de primeira or-
dem para a evolução das pequenas perturbações laterais, obtém-se
 
Yv Yp Yr
 
m m m
− u0 g cosθ0  

   
  v 
         
   Lv 0 Lp 0 Lr 0
 ṗ   I 0 + Izx N 0 + Izx Np 0 + Izx Nr 0
 
   x v Ix Ix
 
 p 
 =  . (8.31)
 ṙ  
         
   I 0 L + 0v N 0 N p 0 N
 
 r 
   zx v Iz
Izx Lp + Iz0 Izx Lr + Iz0r 0  
  
φ̇  
φ
0 1 tan θ0 0

O vector das variáveis de controlo


T
∆Yc ∆Lc ∆Nc
    
0 0
, + Izx ∆Nc , Izx ∆L c + , 0 (8.32)
m Ix0 Iz0

foi omitido também aqui.


Para completar as equações para o «flight path», a equação linearizada para ∆yE é

∆ẏE = u0 ψ cos θ0 + v. (8.33)

Esta equação só é necessária para perturbações laterais e para perturbações longitudi-


nais reduz-se a ∆ẏE = 0.
Finalmente, a linearização da equação de (6.12) que se refere à velocidade angular
de guinada, r = ψ̇ cos θ cos φ − θ̇ sin φ, leva a

ψ̇ = r sec θ0 . (8.34)

8.3 Forma geral das equações


Como vimos, podem existir perturbações puramente longitudinais se o avião tiver
um plano de simetria, se não houver efeitos giroscópicos do rotor. As condições para a
existência de perturbações puramente laterais são as referidas, mas é necessário ainda
que não existam acoplamentos aerodinâmicos cruzados, isto é, se as forças e momen-
tos longitudinais não dependerem das variáveis laterais e se as forças e momentos
laterais não dependerem das variáveis longitudinais.
As equações para as pequenas perturbações têm, em ambos os casos, a mesma
forma matricial
ẋ = Ax + Bc. (8.35)
Esta equação matricial representa um sistema de equações diferenciais lineares de 1ª
ordem, em que a matriz do sistema A é determinada a partir de (8.21) para perturações

106
longitudinais,
 Xu Xw 
m m
0 −g cos θ0
 
 
 
Zu Zw (mu0 +Zq ) mg sin θ0 
− m−Zẇ 

m−Zẇ m−Zẇ m−Zẇ

 
A=  , (8.36)
       
Mẇ Zu Mẇ Zw Mẇ (mu0 +Zq ) −Mẇ mg sin θ0 
1 1 1

 Iy Mu + m−Zẇ Mw + Mq +

Iy m−Zẇ Iy m−Zẇ Iy (m−Zẇ ) 
 
 
0 0 1 0

e a partir de (8.31) para perturbações laterais,


 
Y Yp Yp
 
v
m m m
− u0 g cos θ0
 
 
      
 Lv 0 Lp 0 Lr 0
 I 0 + Izx N + Izx Np + Izx Nr 0

 x v Ix0 Ix0


A= . (8.37)
      
 I 0 L + N0v

0 Np 0 Nr

 zx v Iz
Izx Lp + Iz0
Izx Lr + Iz0
0 

 
 
0 1 tan θ0 0

A matriz B e o vector c são a matriz e o vector de controlo, a determinar a partir


das mesmas equações. O vector de estado x é, para perturbações longitudinais, x =
[∆u w q ∆θ]T , a para parturbações laterais, x = [v p r φ]T .
O nosso objectivo é resolver o sistema ẋ = Ax + Bc em ambos os casos, mas para
isso temos de saber determinar todos os termos das matrizes A e B e do vector c.

107
Capítulo 9

Derivadas de Estabilidade

Neste capítulo pretende-se calcular as derivadas de estabilidade que figuram nas


equações para pequenas perturbações. Em primeiro lugar estabelecer-se-ão as rela-
ções entre as derivadas dimensionais e as adimensionais, para em seguida se procurar
encontrar expressões que permitam calcular ou, pelo menos, obter uma estimativa,
para as derivadas de estabilidade adimensionais.

9.1 Relações entre derivadas de estabilidade dimensio-


nais e adimensionais
As equações do movimento (para pequenas perturbações) foram escritas na forma
dimensional, usado as derivadas de estabilidade na forma dimensional. Porém, as
derivadas são normalmente obtidas na forma adimensional, por exemplo, por meio de
testes de modelos em túnel aerodinâmico. Torna-se por isso necessário relacionar as
derivadas de estabilidade dimensionais com as adimensionais.

9.1.1 Derivadas de estabilidade dimensionais e adimensionais


As forças e momentos longitudinais correspondentes a pequenas perturbações são
dados por (8.4), (8.6) e (8.8), sendo as derivadas calculadas no estado estacionário.
Exemplificando com a equação (8.6),

∆Z = Zu ∆u + Zw w + Zẇ ẇ + Zq q + ∆Zc ,

se usarmos o índice 0 para identificar o estado estacionário, as derivadas de estabili-


dade são
!
∂Z ∂Z ∂Z ∂Z
     
Zu = , Zw = , Zq = , Zẇ = .
∂u 0 ∂w 0 ∂q 0 ∂ ẇ 0

As forças e momentos laterais correspondente à pequena perturbação são dados por


(8.5), (8.7) e (8.9), sendo também aqui as derivadas calculadas no estado estacionário.
As variáveis dinâmicas são adimensionalizadas, no caso de pequenas perturbações,
usando a velocidade do estado estacionário, isto é, V = u0 . Logo, as velocidades

108
adimensionais são
u v w
û = , v̂ = , ŵ = ,
u0 u0 u0

e as velocidades angulares adimensionais são


p q r
p̂ = 2u0 , q̂ = 2u0 , r̂ = 2u0 .
b c̄ b

Finalmente, adimensionaliza-se a derivada temporal do ângulo de ataque, tendo em


conta (7.9), como
ˆ = α̇ .
α̇ 2u0

Os coeficientes adimensionais longitudinais são definidos por (7.11), (7.12) e (7.13).


Em termos das variáveis dinâmicas, os coeficientes Cx , Cz e Cm são dados por (7.14),
sendo as derivadas calculadas no estado estacionário. Assim, por exemplo,
ˆ
Cz = Czu û + Czα α + Czq q̂ + Czα̇ α̇,

em que
!
∂Cz ∂Cz ∂Cx ∂Cz
     
Czu = , Czα = , Czq = , Czα̇ = .
∂ û 0 ∂α 0 ∂ q̂ 0
ˆ
∂ α̇ 0

Os coeficientes adimensionais laterais são definidos, por sua vez, por (7.19), (7.20)
e (7.21) e são dados, em termos das variáveis dinâmicas adimensionais laterais, por
(7.22). De novo, as derivadas são calculadas no estado estacionário.
De seguida vamos estabelecer a relação entre as derivadas dimensionais e adimen-
sionais.

9.1.2 Derivadas longitudinais


Derivadas da força segundo z
1
A relação entre a força segundo Z e o respectivo coeficiente é Z = 2
ρV 2 SCz . A
velocidade da aeronave é
V 2 = u2 + v 2 + w 2 .
No estado estacionário, u = u0 , v0 = 0, e w0 = 0. Logo,
! ! !
∂V 2 ∂V 2 ∂V 2
= 2u0 , = 0, = 0.
∂u 0 ∂v 0 ∂w 0

A derivada relativamente a u é

∂Z ∂ ∂ 11 1 ∂Cz
          
Zu ≡ = = ρV 2 SCz
2
ρV S (Cz )0 + 2
ρV S
∂u0 ∂u 0 ∂u 2 2 0 2 0 ∂u 0
1 1 ∂Cz 1 ∂Cz
   
= ρ(2u0 )S (Cz )0 + ρu20 S = ρu0 S (Cz )0 + ρu20 S . (9.1)
2 2 ∂u 0 2 ∂u 0

109
No estado estacionário: Z0 = −mg cos θ0 . Logo:

Z0 −mg cos θ0
(Cz )0 = 1 = 1 = −CW0 cos θ0 . (9.2)
2
ρSu20 2
ρSu20

Por outro lado,

∂ uu0
! 
∂Cz ∂ û ∂Cz ∂Cz 1
      
Czu = = = = Cz . (9.3)
∂u 0 ∂u 0 ∂ û 0 ∂u 0
∂ û 0 u0 u

Finalmente, substituindo (9.2) e (9.3) em (9.1), obtém-se


1
Zu = −ρu0 S cos θ0 CW0 + ρSu0 Czu . (9.4)
2
A derivada relativamente a w calcula-se de forma semelhante:

∂Z ∂ 1 ∂ 1 1 ∂Cz
          
Zw ≡ = ρV 2 SCz = ρV 2 S ρV 2 S (Cz )0 +
∂w 0 ∂w 2 0 0 ∂w 2 2 0 ∂w 0
1 1 ∂Cz 1 ∂Cz
   
= ρ(2 w0 )S (Cz )0 + ρu20 S = ρu20 S . (9.5)
2 |{z} 2 ∂w 0 2 ∂w 0
0

Note-se que

∂ uw0
! 
∂Cz ∂ ŵ ∂Cz ∂Cz 1 ∂Cz
        
= = = .
∂w 0 ∂w 0 ∂ ŵ 0 ∂w 0
∂ ŵ 0 u0 ∂ ŵ 0

 
∂Cz
Por outro lado, para pequenas perturbações ŵ = α, pelo que ∂ ŵ
≡ Czα . Por substi-
0
tuição em (9.5) conclui-se de que

1
Zw = ρSu0 Czα . (9.6)
2
O cálculo da derivada relativamente a ẇ faz-se da mesma forma.

∂Z ∂ 1
   
Zẇ ≡ = ρV 2 SCz
∂ ẇ 0 ∂ ẇ 2 0
∂ 1 1 ∂Cz 1 ∂Cz
        
= ρV 2 S (Cz )0 + ρV 2 S = 0 + ρu20 S (9.7)
∂ ẇ 2 0 2 0 ∂ ẇ 0 2 ∂ ẇ 0

Para pequenas perturbações ŵ = w/u0 = αx , donde ẇ = u0 α˙x . Por outro lado,


ˆ x = α̇x c̄/(2u0 ). Logo,
α̇

∂Cz 1 ∂Cz 1 c̄ ∂Cz c̄


     
= = = Czα̇ ,
∂ ẇ 0 u0 ∂ α̇ 0 ˆ
u0 2u0 ∂ α̇ 0 2u20

obtendo-se finalmente
1
Zẇ = ρS c̄Czα̇ . (9.8)
4

110
Por fim, calcula-se a derivada relativamente a q:
!
∂Z ∂ 1
 
Zq ≡ = ρV 2 SCz =
∂q ∂q 2 0
"0  # ! !
∂ 1 1 ∂Cz 1 ∂Cz
 
ρV 2 S (Cz )0 + ρV 2 S = 0 + ρu20 S . (9.9)
∂q 2 0
2 0 ∂q 0
2 ∂q 0

Tendo em conta que q̂ = q c̄/(2u0 ), tem-se


! !
∂Cz c̄ ∂Cz c̄
= = Czq , (9.10)
∂q 0 2u0 ∂q 0 2u20

pelo que facilmente se obtém


1
Zq = ρu0 S c̄Czq . (9.11)
4

Derivadas da força segundo x


Para o cálculo das derivadas da força segundo x procede-se de forma idêntica ao
caso anterior, mas agora X = 12 ρV 2 SCx .
A derivada relativamente a u é:

∂X ∂ 1
   
2
Xu ≡ = ρV S Cx
∂u 0 ∂u 2 0
∂ 1 1 ∂Cx 1 ∂Cx
        
2 2 2
= ρV S (Cx )0 + ρV S = ρu0 S (Cx )0 + ρu0 S .
∂u 2 0 2 0 ∂u 0 2 ∂u 0

Note-se que agora X0 = mg sin θ0 , o que implica Cx0 = CW0 sin θ0 , e por outro lado,

∂ uu0
! 
∂Cx ∂ û ∂Cx ∂Cx 1
      
= = = Cx .
∂u 0 ∂u 0 ∂ û 0 ∂u 0
∂ û 0 u0 u

O resultado final é
1
Xu = ρu0 S sin θ0 CW0 +
ρSu0 Cxu . (9.12)
2
Para as outras derivadas procede-se exactamente como para o caso das derivadas
da força segundo z, obtendo-se:

1
Xw = ρSu0 Cxα , (9.13)
2
1
Xẇ = ρS c̄Cxα̇ , (9.14)
4
1
Xq = ρu0 S c̄Cxq . (9.15)
4

111
Derivadas do momento de picada

Para o cálculo das derivadas do momento de picada, partimos de M = 21 ρV 2 S c̄Cm .


A única diferença face aos cálculos anteriores é que o momento de picada no estado
estacionário M0 = 0, donde (Cm )estado estacionário = 0, obtendo-se agora

1
Mu = ρSu0 c̄Cmu , (9.16)
2
1
Mw = ρSu0 c̄Cmα , (9.17)
2
1
Mq = ρSu0 c̄ 2 Cmq , (9.18)
4
1
Mẇ = ρS c̄ 2 Cmα̇ . (9.19)
4

9.1.3 Derivadas laterais


Derivadas do momento de rolamento
A relação entre o momento de rolamento L e o seu coeficiente adimensional Cl é
1
L = 2 ρV 2 Sb Cl . No estado estacionário, as variáveis dinâmicas são nulas: v0 = 0 e
p0 = r0 = 0. Além disso, o momento de rolamento no estado estacionário é nulo,
L0 = 0, e portanto Cl0 = 0.
Começamos por calcular a derivada em ordem a v.

∂L ∂ 1
   
2
Lv ≡ = ρV SbCl
∂v 0 ∂v 2 0
∂ 1 1 ∂Cl 1 ∂Cl
        
2 2 2
= ρV Sb Cl0 + ρV Sb = 0 + ρu0 Sb . (9.20)
∂v 2 0 2 0 ∂v 0 2 ∂v 0
Recorde-se que, para pequenas perturbações
v v
β = arcsin ≈ = v̂,
V u0

pelo que
∂Cl ∂ v̂ ∂Cl 1
     
= = Cl .
∂v 0 ∂v 0 ∂ v̂ 0 u0 β
Por substituição em (9.20), deduz-se facilmente que

1
Lv = ρu0 Sb Clβ . (9.21)
2
O cálculo da derivada em ordem a p é semelhante:
! " # ! !
∂L ∂ 1 1 ∂C 1 ∂Cl
  
l
Lp ≡ = ρV 2 Sb Cl 0 + ρV 2 Sb = 0 + ρu20 Sb ,
∂p 0 ∂p 2 0
2 0 ∂p 0
2 ∂p 0

112
mas agora p̂ = p/(2u0 /b), pelo que
! ! !
∂Cl ∂ p̂ ∂Cl b
= = Cl .
∂p 0 ∂p 0 ∂ p̂ 0
2u0 p

O resultado final é então


1
ρu0 Sb2 Clp .
Lp = (9.22)
4
Finalmente, para a derivada em ordem a r temos

∂L ∂ 1 1 ∂Cl 1 ∂Cl
          
Lr ≡ = ρV 2 Sb Cl 0 + ρV 2 Sb = 0 + ρu20 Sb ,
∂r 0 ∂r 2 0 2 0 ∂r 0 2 ∂r 0

e, como r̂ = r /(2u0 /b),

∂Cl ∂ r̂ ∂Cl b
     
= = Cl ,
∂r 0 ∂r 0 ∂ r̂ 0 2u0 r

obtendo-se por fim


1
Lr = ρu0 Sb2 Clr . (9.23)
4

Derivadas do momento de guinada


1
Para as derivadas do momento de guinada partimos de N = 2 ρV 2 Sb Cn . No estado
estacionário N0 = 0 ⇒ Cn0 = 0.
De forma análoga ao caso do momento de rolamento, obtém-se

1
Nv = ρu0 Sb Cnβ , (9.24)
2
1
Np = ρu0 Sb2 Cnp , (9.25)
4
1
Nr = ρu0 Sb2 Cnr . (9.26)
4

Derivadas da força lateral


1
Finalmente, para as derivadas da força lateral usamos Y = 2 ρV 2 S Cy . No estado
estacionário Y0 = 0 ⇒ Cy0 = 0. De forma análoga aos casos anteriores obtemos

1
Yv = ρu0 S Cyβ , (9.27)
2
1
Yp = ρu0 Sb Cyp , (9.28)
4
1
Yr = ρu0 Sb Cyr . (9.29)
4

113
Figura 9.1: Voo rectilíneo com ângulo de subida constante.

9.2 Derivadas adimensionais relativas a movimento lon-


gitudinal
Na fase de projecto é importante dispor de expressões aproximadas para as de-
rivadas de estabilidade adimensionais em função das características das aeronaves.
Procuraremos encontrar estas expressões tratando separadamente, como é habitual,
os casos de movimento longitudinal e movimento lateral.
Recorde-se que as derivadas são calculadas no estado estacionário e que este é
definido aqui como um voo rectilíneo uniforme, donde p0 = 0 = q0 = r0 , e sem
derrapagem, isto é, com v0 = 0. Usamos eixos de estabilidade, pelo que w0 = 0, ou
seja, (αx )0 = 0.
Num movimento puramente longitudinal, interessam-nos apenas as forças segundo
x e z e o momento de picada. As forças e momentos longitudinais dependem da
sustentação L, da resistência aerodinâmica D e da força de propulsão T .
Admitimos que a linha de propulsão coincide com o eixo x. Por outro lado, como
usamos eixos de estabilidade, (αx )0 = 0. As perturbações ao estado estacionário são,
por hipótese, pequenas, pelo que a velocidade segundo w será pequena ou seja αx 
1. Logo, cos αx ≈ 1 e sin αx ≈ αx . As equações para as forças segundo x e z no caso
de um voo rectilíneo, nivelado e com ângulo de subida são dadas por (7.28). Usando
as aproximações acima e adimensionalizando as equações, obtemos
(
Cx = CT + CL αx − CD ,
(9.30)
Cz = −(CL + CD αx ).

9.2.1 Derivadas em ordem ao ângulo de ataque


Pretendemos encontrar expressões para as derivadas Cxα , Czα e Cmα .

114
Por definição, a derivada Cxα , calculada no estado estacionário, é

∂Cx
 
Cxα ≡ .
∂α 0
Mas, da primeira equação de (9.30),

∂Cx ∂ ∂CT ∂CL ∂CD


         
= (CT + CL αx − CD ) +(CL )0 + (αx )0 − .
∂α 0 ∂α 0 ∂α ∂α ∂α 0
| {z 0} | {z 0
}
=0 =0⇐(αx )0 =0

Para evitar ambiguidades usaremos a notação CL1 ≡ (CL )0 para o coeficiente de susten-
tação no estado estacionário. De igual forma, designaremos por CD1 o coeficiente da
resistência aerodinâmica no estado estacionário. Obtém-se então
∂CD
 
Cxα = CL1 − ≡ CL1 − CDα . (9.31)
∂α 0
Se o coeficiente de resistência estiver relacionado com o coeficiente de sustentação
através da polar CD = CD0 + CL2 /(π Ae), então

∂CD 2CL0
 
CDα ≡ = CL ,
∂α 0 π Ae α
e este valor de CDα pode ser usado em (9.31).
Para calcular a derivada Czα no estado estacionário partimos da definição

∂Cz
 
Czα =
∂α 0
e da segunda equação de (9.30), o que leva a

∂Cz ∂
   

=− (CL + CD αx ) = − CLα + CDα αx + CD 0 = −(CLα + CD1 ).
∂α 0 ∂α 0

Em conclusão, pode-se escrever

Czα = −(CLα + CD1 ). (9.32)

Resta-nos determinar a derivada Cmα . Mas o seu valor é dado, como se sabe, por

Cmα = a(h − hn ).

9.2.2 Derivadas em ordem à velocidade longitudinal


As derivadas em ordem a u traduzem as alterações de forças e momentos quando
varia a velocidade horizontal, supondo α, T , etc. constantes.
Os coeficientes CL e CD dependem de u devido a efeitos de compressibilidade (isto
é, dependem do número de Mach Ma), a efeitos aeroelásticos (isto é, dependem da
pressão dinâmica pd = 1/2ρV 2 ) e à interacção da propulsão com a airframe (asa e
fuselagem), especialmente no caso de propulsão a hélice.

115
Se CLu e CDu forem conhecidos, as derivadas calculam-se facilmente a partir de
(9.30):

Cxu = CTu − CDu (9.33)


Czu = −CLu (9.34)

Caso contrário, é necessário determinar todas as contribuições separadamente. Por


exemplo, para a derivada Cxu teríamos
! 
∂Cx ∂Cx ∂Ma ∂Cx ∂pd ∂Cx ∂CT
          
Cxu ≡ = + + .
∂ û 0 ∂Ma 0 ∂ û 0 ∂pd 0 ∂ û 0 ∂CT 0 ∂ û 0
| {z }
CTu

   
∂Ma ∂p
As derivadas ∂ û e ∂ ûd podem calcular-se facilmente, mas não as derivadas de
0 0
Cx em ordem a Ma, pd e CT .

Derivada CTu
A derivada CTu é necessária para calcular Cxu a partir de (9.33). De acordo com a
definição, CT = 1/2 TρV 2 S , donde

∂T
∂CT ∂u 2T ∂V
= 2
− 3
.
∂u 1/2 ρV S 1/2 ρV S ∂u

Ora, tendo em conta que V = u2 + v 2 + w 2 e que no estado estacionário V = u0 ,
 
∂T
∂CT ∂CT 2T
   
∂u 0
CTu = = u0 = − ,
∂ û 0 ∂u 0 1/2 ρu0 S 1/2 ρu20 S

e chegamos finalmente a  
∂T
∂u 0
CTu = − 2CT0
1/2 ρu0 S
∂T
O cálculo da derivada ∂u
depende do tipo de voo. Para voo planado, T = 0 pelo que

CTu = 0. (9.35)

Para voo com propulsão constante (boa aproximação para aviões a jacto em voo de
cruzeiro),
∂T
= 0,
∂u
e conclui-se imediatamente que
CTu = −2CT0 . (9.36)
Para voo com potência constante (boa aproximação para aviões com propulsão a hélice
com velocidade constante, em voo de cruzeiro),
T0 V0
T V = cte = T0 V0 ⇒ T = .
V

116
Logo
∂T T 0 V0 T0 −T0
   
=− =− ⇒ CT u = − 2CT0 .
∂u 0 V2 0 V0 1/2 ρu20 S
Conclui-se portanto que
CTu = −3CT0 . (9.37)
Resta-nos calcular CT0 . Se admitirmos que no estado estacionário a força de propul-
são e a velocidade são aproximadamente colineares, e usando eixos de estabilidade, o
equilíbrio na direcção x exige

CT0 = CD0 + CW0 sin θ0 .

Para voo horizontal, em que θ0 = 0, obtemos simplesmente CT0 = CD0 .

9.2.3 Derivadas em ordem à velocidade angular de picada


As derivadas em ordem a q são calculadas mantendo constantes α e as outras
variáveis.
A contribuição mais importantes é a da cauda; a contribuição da asa é menos impor-
tante e mais difícil de estimar. É prática corrente estimar a contribuição da asa como
10% da contribuição da cauda (i.e., a derivada total ≈ 1.1× contribuição da cauda).
Recorde-se que, de acordo com (9.10),
!
2u0 ∂Cz
Czq = .
ĉ ∂q 0

Por outro lado, (9.30) permite relacionar Czq com CLq :


! !
∂Cz ∂CL
Cz = −(CL + CD αx ) ⇒ =− , (9.38)
∂q 0 ∂q 0

e portanto
Czq = −CLq . (9.39)

Contribuição da cauda
As contribuições da cauda para as derivadas em ordem a q devem-se principalmente
à variação do ângulo de ataque efectivo na cauda, ∆αt , causada pela velocidade angular
de picada q.
Admitimos que a sustentação na cauda Lt se altera instantaneamente quando αt
varia. A figura 9.2 permite concluir que ∆αt = qlt /u0 . A variação do coeficiente de
sustentação da cauda devida à velocidade angular de picada é

qlt St St qlt
∆CLt = at ∆αt = at ⇒ ∆CL = ∆CLt = at .
u0 S S u0

A contribuição da cauda para a derivada de CL em ordem a q é então


!
∂CL St lt
= at .
∂q tail S u0

117
Figura 9.2: Variação do ângulo de ataque na cauda devido à velocidade angular de
picada. (Fonte: [1])

Usando (9.38) conclui-se que


!
  2u0 ∂CL 2u0 St lt
CLq = = at ,
tail c̄ ∂q tail
c̄ S u0
 
que se pode escrever na forma mais compacta CLq = 2VH at . A contribuição da
tail
cauda para a derivada Czq é portanto
 
Czq = −2VH at . (9.40)
tail

Para determinar a contribuição da cauda para Cmq , partimos de

lt ∂Cm lt
∆Cm = −VH ∆CLt = −at VH q ⇒ = −at VH .
u0 ∂q u0

Tendo em conta a adimensionalização da velocidade angular de picada,


  2u0 ∂Cm 2u0 lt
Cmq = =− at VH .
tail c̄ ∂q c̄ u0

Conclui-se finalmente que


  lt
Cmq = −2VH at . (9.41)
tail c̄

118
Figura 9.3: A velocidade angular produz uma distribuição de velocidades normais à
asa que é equivalente a ter uma curvatura adicional na asa. (Fonte: [1])

Figura 9.4: Dependência do centro de massa. (Fonte: [1])

Contribuição da asa
Como se afirmou acima, é frequente estimar a contribuição da asa como 10% da
contribuição da cauda. No entanto, especialmente para asas com flecha elevada ou
alongamento pequeno esta contribuição pode ser mais importante e nesse caso é ne-
cessário uma estimativa mais exacta.
Como se ilustra na figura 9.3, a velocidade angular é equivalente a uma curvatura
adicional da asa. Para determinarmos essa curvatura, impomos a condição de que
a componente normal à asa da velocidade do escoamento deve igualar a velocidade
adicional induzida por q na asa real:

∂z ∂z qx q
u0 = qx ⇒ = ⇒z= x2.
∂x ∂x u0 2u0

Asa equivalente, que produz uma distribuição de velocidades normais equivalente, tem
pois um arco parabólico.
A velocidade angular q é definida relativamente ao centro de massa do avião. Por
isso, como se ilustra na figura 9.4, a contribuição da asa para CLq e Cmq depende da
posição do centro de massa. Se o centro de massa se desloca de A para B, o ângulo de
ataque efectivo na asa induzido pela velocidade angular de picada varia:

qc̄
∆α = − ∆h.
u0

119
Figura 9.5: Variação de Cmq com h. (Fonte: [1])

A esta variação corresponde uma variação do coeficiente de sustentação:

qc̄
∆CL = CLα ∆α = −CLα ∆h = −2CLα q̂∆h.
u0

Derivando em ordem a h obtemos

∂CL ∆CL ∂ 2 CL ∂
= = −2CLα q̂ ⇒ = −2CLα ⇒ CL = −2CLα ⇒ CLq = −2CLα (h−h0 ).
∂h ∆h ∂h∂ q̂ ∂h q

A contribuição da asa para o coeficiente do momento de picada é

Cm = Cmac + CL (h − hnw ).

Derivando em ordem a h obtém-se


∂Cmac ∂Cmac
Cmq = + CLq (h − hnw ) ⇒ Cmq = − 2CLα (h − h0 )(h − hnw )
∂ q̂ ∂ q̂

A variação de Cmq com h é quadrática e está representada na figura 9.5. Pode-se


escrever na forma
Cmq = Cmq − 2CLα (h − h̄)2 .
Na aproximação da teoria linear
p bi-dimensional de asas finas, para voo supersónico,
2
h0 = h̄ = 1/2, e Cmq = 2/(3 Ma − 1), enquanto que para voo subsónico: h0 = 3/4,
h̄ = 1/2 e Cmq = 0.

9.2.4 Derivadas em ordem a α̇


Os coeficientes de sustentação e do momento de picada dependem de α̇ porque
quando o ângulo de ataque varia a distribuição de pressões na asa e na cauda não se
ajusta instantaneamente ao valor de equilíbrio (enquanto α varia o escoamento deixa
de ser estacionário).
A contribuição da asa para as derivadas pode ser calculada a partir da resposta
em frequência de uma asa com movimento oscilatório harmónico. No entanto, pode
também estimar-se como sendo 10% da contribuição da cauda. Para esta última, o
efeito mais importante é o de lag-of-downwash.

120
Contribuição da cauda (atraso no downwash)
Quando o ângulo de ataque α se modifica, o escoamento em torno de todas as
superfícies do avião altera-se. Esta alteração não é instantânea e só se faz sentir na
cauda passado algum tempo porque a vorticidade do bordo de fuga é convectada pelo
escoamento. O atraso é da ordem de ∆t ≈ lt /u0 . O ângulo de downwash na cauda
no instante t, ε(t), corresponde ao ângulo de ataque que existia na asa no instante
(t − ∆t). Dado que ε = ε0 + εα αwb , a diferença ∆ε entre o ângulo de downwash que
existe no instante t e o que existiria se αwb fosse constante é dado por

∆ε = [ε0 + εα αwb (t −∆t)] − [ε0 + εα αwb (t)] = εα [αwb (t −∆t) − αwb (t)]
lt
≈ −εα α̇∆t = −εα α̇
u0
Devido ao atraso no downwash o ângulo de ataque na cauda, αt = αwb − ε − it , tem
uma variação
lt
∆αt = −∆ε = εα α̇ ,
u0
do qual resulta uma variação no coeficiente de sustentação da cauda
lt
∆CLt = at αt = at εα α̇
u0
e a correspondente variação no coeficiente de sustentação total,
St lt St
∆CL = ∆CLt = at εα α̇ .
S u0 S
ˆ = α̇ c̄/(2u0 ),
Tendo em conta que α̇
∂Cz 2u0 ∂Cz 2u0 ∂(−CL )
Czα̇ = = = .
ˆ
∂ α̇ c̄ ∂ α̇ c̄ ∂ α̇

A contribuição da cauda para a derivada em ordem a α̇ ˆ é então



Czα̇ tail = −2at εα VH . (9.42)

Contribuição da cauda para Cmα̇


Contribuição da cauda para Cmα̇ deduz-se facilmente da variação do coeficiente de
sustentação da cauda devido ao atraso no downwash,
lt
∆Cm = −VH ∆CLt = −VH at εα α̇
u0
Devido à adimensionalização,

ˆ = α̇c̄ ⇒ Cmα̇ = ∂Cm = 2u0 ∂Cm ,


α̇
2u0 ˆ
∂ α̇ c̄ ∂ α̇
de que resulta
 lt
Cmα̇ tail = −2at εα VH . (9.43)

121
Figura 9.6: Geometria e forças laterais devidas à derrapagem. (Fonte: [5])

9.3 Derivadas relativas ao movimento lateral


9.3.1 Derivadas em ordem ao ângulo de derrapagem
As derivadas Clβ e Cnβ já foram tratadas nas secções 5.2.3 e 5.1.1, respectivamente.
As estimativas obtidas para as contribuições da cauda são razoavelmente exactas, mas
para as contribuições da asa e da fuselagem os resultados que se obtém com as ex-
pressões deduzidas são menos exactos. Quando é necessário ter estimativas precisas
é preferivel usar resultados obtidos em ensaios em túnel aerodinâmica ou usando [2].
Resta-nos determinar a derivada Cyβ .

Derivada Cyβ
Normalmente a derivada Cyβ é negativa e pequena. As contribuições mais impor-
tantes são da fuselagem e do estabilizador vertical.
A contribuição da cauda deve-se à força de sustentação no estabilizador vertical
gerada pela derrapagem, dada por
2
SF VF
  
Cy = −aF (β − σ ) .
cauda S V
Admitindo que VF /V = 1, obtém-se
!
  ∂σ SF
Cyβ = −aF 1− . (9.44)
cauda ∂β S
∂σ
Note-se que ∂β
é difícil de estimar.

122
Figura 9.7: Variação do ângulo de ataque local devido à velocidade angular de rola-
mento. (Fonte: [1])

9.3.2 Derivadas em ordem a p


Devido ao rolamento, o escoamento em torno de todas as superfícies aerodinâmicas
é afectado. Dá-se uma alteração do ângulo de ataque local, que conduz a uma alteração
na distribuição de pressões, e uma modificação da esteira de vórtices atrás da asa. A
distribuição de vorticidade passa a ser assimétrica relativamente a x, o que provoca o
aparecimento de sidewash no estabilizador vertical.
A figura 9.7 mostra a variação do ângulo de ataque local devido à velocidade angular
de rolamento. Na cauda essa variação é

pz ∂σ
∆αF = − +p .
u0 ∂p

Na asa, a variação é nula na raiz, toma o valor


py
∆α = (9.45)
u0
ao longo da asa, na coordenada y, e atinge o valor máximo

pb
∆α = (9.46)
2u0
na ponta da asa.

123
Figura 9.8: Distribuição de sustentação devido à velocidade angular de rolamento.
(Fonte: [1])

Derivada Cyp
2u0
Usando a altura «média» do estabilizador zF , e p = b
p̂,
!
2u0 zF ∂σ 2zF ∂σ
∆αF = − p̂ + p̂ = − + p̂
b u0 ∂ p̂ b ∂ p̂
!
2zF ∂σ
∆CyF = aF ∆αF = aF − + p̂ (9.47)
b ∂ p̂
Para a aeronave completa:
!
SF SF 2zF ∂σ
∆Cy = ∆CyF = aF − + p̂
S S b ∂ p̂
!
  SF 2zF ∂σ
Cyp = −aF − (9.48)
tail S b ∂ p̂

Derivada Clp (damping in roll)


Para a derivada Clp a contribuição mais significativa é a da asa. Devido ao rolamento
a distribuição de sustentação na asa é assimétrica porque o ângulo de ataque aumenta
na asa direita e diminui na asa esquerda. Consequentemente, é criado um momento
de rolamento L que é proporcional a p̂ e tem o sinal negativo (faz subir a asa direita).
Pode obter-se uma estimativa da derivada Clp a partir da distribuição de sustentação
ao longo da envergadura. Considere-se uma aeronave a voar com velocidade longitudi-
nal u0 e velocidade angular de rolamento p. Desprezando os efeitos tridimensionais,
a variação devida a p da sustentação numa secção arbitrária da asa a uma distância y
do centro de massa e de largura dy é

1
 
2
Clα ∆α ρu0 c(y)dy.
2

124
A variação do ângulo de ataque ∆α é dada por (9.45), a derivada Clα é a correspondente
ao perfil da secção da asa em consideração e c(y) é a respectiva corda. A contribuição
desta secção para o momento de rolamento é
py 1
  
2
dL = −y Clα ρu0 c(y)dy.
u0 2
O momento total obtém-se por integração ao longo de toda a envergadura da asa:
Z Z b/2 Z b/2
L = dL = 2 −y d(Sustentação) = − Clα py 2 u0 c(y)dy.
0 0

O coeficiente do momento de rolamento é dado por


Z b/2
2p
Cl = − Clα y 2 u0 c(y)dy.
u0 Sb 0
Confirma-se que Cl é negativo e proporcional a p, correspondendo a um amorteci-
mento do movimento de rolamento. Segue-se que a derivada Clp é dada por
Z b/2
∂Cl 2u0 ∂Cl 4
Clp = = =− 2 C`α y 2 c(y)dy.
∂ p̂ b ∂p Sb 0

Se aproximarmos C`α de cada perfil pelo valor da derivada para a asa inteira, isto é,
admitindo que C`α ≈ CLα w = aw , obtém-se

4aw b/2 2
Z
Cl p = − y c(y)dy. (9.49)
Sb2 0
Na dedução destas expressões desprezaram-se os efeitos tridimensionais devidos ao
vórtice de bordo marginal e efeitos induzidos, que para esta derivada são importantes.
É possível calcular o integral admitindo uma forma determinada da asa, mas os resul-
tados obtidos serão pouco exactos. Por exemplo, para uma asa com afilamento linear,
o integral pode exprimir-se facilmente em termos do afilamento λ, obtendo-se
aw 1 + 3λ
Clp = − . (9.50)
12 1 + λ
Para asas rectangulares a expressão anterior reduz-se a clp = −aw /6. Para se obterem
melhores aproximações podem usar-se os métodos recomendados em [2].
A discussão anterior sobre a relação entre Cl e p pressupõe que a velocidade angu-
lar de rolamento é suficientemente pequena para que a variação do ângulo de ataque
não leve parte da asa a entrar em perda. Para velocidades angulares de rolamento su-
ficientemente elevadas, a parte da asa mais perto da ponta entra em perda (ver figura
9.9), a assimetria na distribuição de sustentação diminui, o momento de rolamento L
diminui e |Clp | diminui. Se uma parte importante da asa está em perda, Clp pode até
mudar de sinal, situação que leva à autorotação da asa (cfr. spin).

Derivada Cnp
A derivada Cnp é uma derivada cruzada e conduz a acoplamento entre rolamento e
guinada. As principais contribuições são da asa e da empenagem vertical. Esta última
contribuição estima-se a partir da força lateral.

125
Figura 9.9: Distribuição do coeficiente de sustentação quando parte da asa entrou em
perda. (Fonte: [1])

A contribuição da asa deve-se a dois factores. O primeiro é a variação do perfil de


resistência com o ângulo de ataque local da asa (se p > 0, na asa direita α aumenta, o
que implica um aumento da resistência aerodinâmica induzida, enquanto que na asa
esquerda α diminui e em consequência a resistência aerodinâmica diminui também,
o que em conjunto leva a um momento de guinada N > 0 (nose-right) e portanto a
∆Cnp > 0). O outro factor é a variação da inclinação da sustentação nas asas, que se
ilustra na figura 9.10. Se p > 0, devido à variação do ângulo de ataque local, na asa
direita a força de sustentação inclina para a frente, enquanto que na asa esquerda a
inclinação da força de sustentação é para trás. Logo existe um momento de guinada
N < 0 e esta contribuição para Cnp é proporcional ao coeficiente de sustentação da
asa. Em [4] sugere-se a seguinte aproximação: (Cnp )asa ≈ −CL /8. Evidentemente que
melhores aproximações se conseguem usando os métodos sugeridos em [2].
A contribuição da cauda depende da força lateral que o rolamento provoca no esta-
bilizador vertical,
SF lF
(∆Cn )tail = −∆CyF
S b
e ∆CyF pode obter-se de (9.47), pelo que
!
2zF ∂σ
(∆Cn )tail = +aF − p̂VV .
b ∂ p̂

A contribuição da cauda para a derivada Cnp é então


!
  2zF ∂σ
Cnp = aF − VV . (9.51)
tail b ∂ p̂

126
Figura 9.10: Variação da inclinação da sustentação nas asas quando há rolamento,
devido à variação do ângulo de ataque. (Fonte: [1])

9.3.3 Derivadas em ordem a r


A velocidade angular de guinada provoca alterações no escoamento que são gran-
des se a asa tem ângulo de flecha elevado. A componente normal a 1/4 de corda da
velocidade varia da raiz para a ponta da asa e aumenta na asa esquerda enquanto que
diminui na asa direita, como se ilustra na figura 9.11. Portanto, as forças e momen-
tos aumentam na asa esquerda e diminuem na asa direita. Existe também o efeito de
sidewash.

Contribuição da cauda para a derivada da força lateral


A variação do ângulo de ataque efectivo na cauda devido à velocidade angular de
guinada é
r lF ∂σ lF ∂σ
 
∆αF = +r =r + .
u0 ∂r u0 ∂r
Em função da velocidade angular de guinada adimensional, r̂ ,

2u0 lF b ∂σ 2lF ∂σ
   
∆αF = r̂ + = r̂ + .
b u0 2u0 ∂ r̂ b ∂ r̂

A força lateral devida a esta variação do ângulo de ataque é

SF SF lF ∂σ
 
(Cy )tail = aF ∆αF = aF r̂ 2 + ,
S S b ∂ r̂

127
Figura 9.11: Variação da componente da velocidade perpendicular a uma asa com
flecha. (Fonte: [1])

128
Figura 9.12: Devido à velocidade angular de guinada, a velocidade do escoamento
incidente na asa direita é diminuida e na asa esquerda é aumentada (para r > 0).

donde se deduz a contribuição da cauda para Cyr ,

SF lF ∂σ
 
(Cyr )tail = aF 2 + . (9.52)
S b ∂ r̂

Derivada Clr
A derivada Clr é uma derivada cruzada e por isso contribui para o acoplamento
entre guinada e rolamento.
A contribuição da asa deve-se ao diferencial de sustentação entre as duas asas cau-
sado pela diferente velocidade efectiva. Como se ilustra na figura 9.12, para r > 0 a
velocidade efectiva na secção de largura dy que se encontra a uma distância y da raiz
é V − r y na asa direita e V + r y na asa esquerda. Como a sustentação é proporcional
à pressão dinâmica (e por isso ao quadrado da velocidade), a sustentação será maior
na asa esquerda e menor na asa direita, o que conduz a um momento de rolamento

1 1
 
2 2
yCL ρ(V + r y) − ρ(V − r y) c(y) dy.
2 2
(aproximando o coeficiente de sustentação do perfil, C` , pelo coeficiente de sustenta-
ção da asa, CL , isto é, C` ≈ CL ). O coeficiente do momento de rolamento obtém-se
integrando em y e adimensionalizando:
Z b/2 Z b/2
1 1 4r
Cl = 1 CL y ρ(4V r y) c(y) dy = CL c(y) y 2 dy. (9.53)
2
ρV 2 Sb 0 2 V Sb 0

Dado que r̂ = (r b)/(2V ),


Z b/2
8r̂
Cl = CL c(y) y 2 dy,
Sb2 0

a contribuição da asa para a derivada Clr é


Z b/2
8
c(y) y 2 dy.

Clr asa = CL (9.54)
Sb2 0

129
Esta contribuição é positiva e proporcional a CL . Se a asa tiver um afilamento linear, o
integral calcula-se facilmente e obtém-se
 CL 1 + 3λ
Cl r asa = . (9.55)
6 1+λ
Como habitualmente, esta expressão não é exacta devido às aproximações realizadas
na sua dedução, mas permite estabelecer o sinal da derivada e a sua proporcionalidade
com o coeficiente de sustentação.
A contribuição da cauda é devida à força lateral na cauda que o movimento de
guinada provoca, e pode estimar-se de forma semelhante às outras contribuições da
cauda, obtendo-se
SF zF lF ∂σ
 
(Clr )tail = aF 2 + . (9.56)
S b b ∂ r̂
Esta contribuição é também positiva.

Derivada Cnr (damping-in-yaw)


A derivada Cnr deve ser sempre negativa para existir amortecimento do movimento
de guinada.
A contribuição da asa deve-se ao aumento da resistência induzida na asa esquerda,
que resulta do aumento da sustentação já discutido acima, e à sua diminuição na asa
direita, e provoca N < 0. A contribuição da cauda deve-se à força lateral na cauda
que o movimento de guinada provoca e pode determinar-se a partir do momento de
guinada que esta força gera, obtendo-se

lF ∂σ
 
(Cnr )tail = −aF VV 2 + . (9.57)
b ∂ r̂
Ambas as contribuições são negativas, como pretendido para que exista amorteci-
mento em guinada.

130
Capítulo 10

Estabilidade Dinâmica
Longitudinal

10.1 Introdução
Neste capítulo dar-se-á início ao estudo da estabilidade dinâmica de uma aeronave.
Abordar-se-ão métodos de resolução das equações para pequenas perturbações (sem
controlo). Em seguida estudar-se-ão as características habituais das soluções e, a par-
tir destas, definir-se-ão os «modos» típicos para perturbações longitudinais. Por fim,
pretende-se encontrar expressões aproximadas para os modos longitudinais. Os mo-
dos laterais serão tratados no capítulo seguinte.
As equações do movimento para pequenas perturbações foram deduzidas no capí-
tulo 8 supondo que o estado estacionário é um voo rectilíneo uniforme (com aceleração
linear e velocidade angular nulas, sem derrapagem e com asas niveladas) e foram usa-
dos eixos de estabilidade, em que o eixo Cx é paralelo à velocidade da aeronave.
Por enquanto não vamos estar interessados na resposta à actuação das superfícies
de controlo. Por isso o sistema de equações (8.35), que pretendemos resolver, toma a
forma
ẋ = A x. (10.1)
Este é um sistema de equações diferenciais ordinárias lineares de 1ª ordem com coefi-
cientes constantes.
Recorde-se que para o movimento longitudinal a matriz A é dada por (8.36) e que o
vector de estado é x = [∆u w q ∆θ]T .

10.2 Sistemas de equações diferenciais ordinárias de 1ª


ordem
Uma equação diferencial linear de primeira ordem
dx
ẋ = ax a = a dt (10.2)
x
tem soluções da forma:
x(t) = x0 eλt (10.3)

131
desde que λ = a. Note-se que x0 é o valor de x para t = 0. No caso de um sistemas de
equações diferenciais
ẋ = A x, (10.4)
as soluções são da forma
x(t) = x0 eλt , (10.5)
sendo x0 o vector de estado inicial, isto é, para t = 0. Dado que a derivada temporal
do vector de estado é
ẋ = λx0 eλt ,
substituindo em (10.4) temos

λx0 eλt = A x0 eλt ⇒ λx0 = A x0 .

Esta última equação pode escrever-se

(A − λI)x0 = 0 (10.6)

que é a equação aos valores próprios da matriz A. Esta equação só tem soluções não
triviais (isto é, não identicamente nulas) se

(A − λI) = 0. (10.7)

Esta é chamada a equação característica do sistema e permite determinar os valores


próprios λ da matriz A.
Uma matriz N × N tem N valores próprios λ1 , . . . , λN . A cada valor próprio λk
corresponde um vector próprio x0k . Admitindo que todos os vectores próprios são
diferentes, a solução geral de (10.4) é sobreposição das soluções correspondentes a
cada valor/vector próprio:
N
X
x(t) = x0k eλk t . (10.8)
k=1

(Este resultado generaliza-se facilmente ao caso degenerado de dois ou mais valores


próprios iguais, mas nas situações que nos interessam isto não se verifica.) Uma matriz
4 × 4 tem 4 valores próprios, pelo que a solução geral vai ser

x(t) = x01 eλ1 t + x02 eλ2 t + x03 eλ3 t + x04 eλ4 t .

Note-se que, como (10.6) é uma equação homogénea, os vectores próprios determinam
apenas uma direção, isto é, estão definidos a menos de uma constante multiplicativa.
Essas constantes (uma para cada vector próprio) podem ser definidas à custa das con-
dições iniciais.

10.2.1 Modos do sistema


A matriz do sistema, A, é uma matriz real (todos os seus elementos são números
reais). Pode mostrar-se que os valores próprios de uma matriz real são ou números
reais ou pares de valores próprios complexos conjugados. Para uma matriz 4×4 temos
as seguintes possibilidades: 4 valores próprios reais, ou 2 valores próprios reais e um
par de complexos conjugados, ou 2 pares de valores próprios complexos conjugados.

132
Cada par de valores próprios complexos conjugados, representados aqui por λ1 e
λ2 , podem ser escritos como

λ1 = n + iω ⇒ x1 = a1 eλ1 t = a1 e(n+iω)t (10.9)


λ2 t (n−iω)t
λ2 = n − iω ⇒ x 0 = a2 e = a2 e (10.10)

As constantes a1 e a2 são complexas conjugadas porque correspondem a vectores


próprios de valores próprios complexos conjugados. Podemos por isso escrevê-las
como

a1 = aeiϕ ,
a2 = ae−iϕ .

A soma dos modos correspondentes a um par de valores próprios complexos conjuga-


dos é

x1 + x2 = a1 eλ1 t + a2 eλ2 t
= a eiϕ e(n+iω)t + ae−iϕ e(n−iω)t
 
= a ent eiϕ eiωt + e−iϕ e−iωt
 
= a ent ei(ωt+ϕ) + e−i(ωt+ϕ)
= 2a ent cos(ωt + ϕ).

Conclui-se que a soma das duas soluções complexas conjugadas correspondentes a


valores próprios complexos conjugados é afinal um único modo real oscilatório.
Em resumo, podemos afirmar que os modos possíveis no caso presente, em que
a matriz do sistema é real são os seguintes: se dois valores próprios são complexos
conjugados, obtemos um modo oscilatório com frequência angular ω, período T =
2π /ω e amplitude variando exponencialmente (aumenta se n > 0), o que corresponde
a um modo instável, diminui se n < 0, o que corresponde a um modo estável); se
um valor próprio é real, obtemos um modo aeλt cuja «amplitude» aumenta se λ > 0
(instável) e diminui se λ < 0 (estável). A figura 10.1 ilustra os modos descritos.
Em qualquer dos casos um modo é dinamicamente estável se a sua amplitude dimi-
nui ao longo do tempo, ou seja, se Re(λ) < 0. Pelo contrário, se Re(λ) > 0 a amplitude
aumenta ao longo do tempo e o modo é instável.
Alguns parâmetros importantes que caracterizam os modos são o tempo necessário
para a amplitude passar a metade/dobro (t1/2 ou t2 ) e, quando o modo é oscilante, o
período (T ) e o número de ciclos necessário para a amplitude passar a metade/dobro
(N1/2 ou N2 ).

1 log 1/2 log 2


en t1/2 = ⇒ t1/2 = = (10.11)
2 n |n|
log 2 log 2
en t2 = 2 ⇒ t2 = = (10.12)
n |n|
t1/2 t2
N1/2 = ou N2 = (10.13)
T T

133
Figura 10.1: Modos com valor próprio real: instável (a) e estável (b); Modos correspon-
dentes a pares de valores próprios complexos conjugados: instável (c) e estável (d).
Fonte: [1].

134
Outros parâmetros importantes são a frequência natural, definida por
p
ωn = ω2 + n2 , (10.14)

e o factor de amortecimento, dado por


n
ζ=− . (10.15)
ωn

No caso de modos estáveis,

log 2
t1/2 = ,
|ζ|ωn
p
ω log 2 log 2 1 − ζ 2
N1/2 = = .
2π |ζ|ωn 2π |ζ|

10.2.2 Critério de estabilidade de Routh


Um sistema tem modos instáveis se a equação característica det(A − λI) = 0 tiver
pelo menos uma raiz com parte real positiva. Para sistemas de 4ª ordem, como no caso
vertente, a equação característica é um polinómio de grau 4, que podemos escrever
como
Aλ4 + Bλ3 + Cλ2 + Dλ + E = 0. (10.16)
Existem formas de determinar se uma equação característica tem todas as raízes com
parte real negativa (isto é, se o sistema é estável) sem ter de as calcular. Uma dessas
formas é a utilização do critério de Routh-Hurwitz: aplicado a sistemas de 4ª ordem,
afirma que uma condição necessária e suficiente para que todas as raízes tenham parte
real negativa é que se verifique simultaneamente
• B > 0,
• D > 0,
• E > 0,
• R = D(BC − AD) − B 2 E > 0 (R é o discriminante de Routh).
Estas condições são válidas se A > 0 e delas se deduz que C > 0.
Com frequência em aeronáutica E > 0 e R > 0 representam casos críticos significa-
tivos. Se uma configuração de uma aeronave é estável e um parâmetro de projecto é
alterado de forma que passa a haver uma instabilidade, se apenas E passa a negativo,
uma raiz real passa de negativa a positiva; se apenas R passa a negativo, a parte real
de um par de raízes complexas conjugadas passa de negativa a positiva. As superfícies
E = 0 e R = 0 definem fronteiras entre regiões de estabilidade e instabilidade.

10.3 Modos longitudinais: características típicas


Começaremos por determinar os modos longitudinais num caso concreto e usar as
propriedades dos modos obtidos para definir características típicas para estes modos.
Os passos a seguir na determinação dos modos de uma aeronave são:

135
Tabela 10.1: Características do Cessna 182

S = 16.17 m2 c̄ = 1.49m W = 11787 N


Ix = 1285.0 kg m2 Iy = 1824.4 kg m2 Iz = 2666.2 kg m2
Ixz = 0 kg m2

Tabela 10.2: Derivadas adimensionais do Cessna 182


CD CL CT Cm
û 0 0 -0.096 0
α 0.121 4.41 – -0.613
q̂ 0 3.9 – -12.4
ˆ
α̇ 0 1.7 – -7.27
(Fonte: [5])

1. Cálcular as derivadas dimensionais (conhecidas as adimensionais)

2. Cálcular os elementos da matriz A


3. Determinar as soluções da equação característica (valores próprios de A)
4. Para cada valor próprio determinar o respectivo vector próprio (a menos de uma
constante multiplicativa)

10.3.1 Exemplo: Cessna 182 Skylane


Para exemplificar a aplicação dos passos referidos, vamos determinar os modos
longitudinais de um Cessna 182 Skylane que se encontra em voo horizontal a 5000
ft, com velocidade u0 = 67.08m/s (Ma = 0.201). O estado estacionário caracteriza-
se por θ0 = 0, CL1 = 0.307 e CD1 = 0.032. De acordo com a atmosfera padrão, ρ =
1.055 kg/m3 .
Na tabela 10.1 apresenta-se algumas características do Cessna 182 usado neste
exemplo e na tabela 10.2 apresentam-se as derivadas de estabilidade adimensionais.
Com estes valores e usando as expressões deduzidas no capítulo 9, podemos determi-
nar o valor das derivadas adimensionais segundo os eixos x e z:

Cxu = CTu − CDu = −0.096,


Cxα = CL1 − CDα = 0.186,
Cxq = 0,
Cxα̇ = 0,
Czu = −CLu = 0,
Czα = −(CLα + CD1 ) = −4.442,
Czq = −CLq = −3.9,
Czα̇ = −CLα̇ = −1.7.

136
As derivadas dimensionais podem agora ser calculadas:

1
Xu = ρu0 SCW0 sin θ0 + ρu0 SCxu = −54.9456 Ns/m,
2
1
Zu = −ρu0 SCW0 cos θ0 + ρu0 SCzu = −351.485 Ns/m,
2
1
Mu = ρu0 c̄SCmu = 0,
2
1
Xw = ρu0 SCxα = 106.457 Ns/m,
2
1
Zw = ρu0 SCzα = −2542.38 Ns/m,
2
1
Mw = ρu0 S c̄Cmα = −524.002 Ns/m,
2
1
Xq = ρu0 S c̄Cxq = 0,
4
1
Zq = ρu0 S c̄Czq = −1666.89 Ns,
4
1
Mq = ρu0 S c̄ 2 Cmq = −7915.44 Ns/m,
4
1
Xẇ = ρS c̄Cxα̇ = 0,
4
1
Zẇ = ρS c̄Czα̇ = −10.8307 Ns/m,
4
1
Mẇ = ρS c̄ 2 Cmα̇ = −69.1756 Ns/m.
4
Estamos agora em condições de calcular todos os elementos da matriz do sistema, que
neste caso é dada por (8.36). Nas condições de voo indicadas,

−0.0457289 0.0885998 0
 
−9.81
 
 
 −0.289913
 −2.09701 65.1123 0 

A= .
 
 0.0109923 −0.207702 −6.80735 0 
 
 
0 0 1 0

estando todos os termos calculados no Sistema Internacional de unidades.


A equação característica, det(A − λI) = 0, é agora

λ4 + 8.95009λ3 + 28.2319λ2 + 1.4905λ + 0.816844 = 0.

Tendo em conta que A, B e D são positivos, e que

E = 0.816844 > 0,
R = D(BC − AD) − B 2 E = 308.96 > 0,

os critérios de estabilidade permitem afirmar que todos os modos vão ser estáveis.

137
Tabela 10.3: Vectores próprios obtidos para o Cessna 182

Fugóide Período curto


Módulo Fase (ϕ) Módulo Fase (ϕ)
∆û 1.0 0º 0.0065 -37.7º
α = ŵ 0.045 179.1º 1.0 0º
q̂ 0.0030 -1.8º 0.0564 129.8º
∆θ 0.0175 -99.2º 0.0107 -17.8º

As raízes da equação característica, que são os valores próprio de A, são

λ1,2 = −0.0220954 ± 0.169956i (modo fugóide)


λ3,4 = −4.45295 ± 2.82492i (modo de período curto)

Obtemos dois pares de raízes complexas conjugadas, pelo que vamos ter dois modos
oscilatórios, normalmente conhecidos por modo fugóide e modo de período curto.
Podemos determinar a frequência, o período, t1/2 e N1/2 para ambos os modos. Para
o modo fugóide temos

2π log 2
ωf = |Im(λ1,2 )| = 0.17 rad/s, Tf = = 37.0 s, t1/2 = = 31.4 s,
ωf |n|
t1/2
nf = Re(λ1,2 ) = −0.022 s-1 , N1/2 = = 0.85.
Tf

Por sua vez, para o modo de período curto obtém-se

2π log 2
ωpc = |Im(λ2,3 )| = 2.82 rad/s, Tpc = = 2.22 s, t1/2 = = 0.156 s,
ωpc |n|
t1/2
npc = Re(λ2,3 ) = −4.45 s-1 , N1/2 = = 0.07.
Tpc

Verifica-se que o modo fugóide tem um período mais longo, da ordem das dezenas
de segundos, e é fracamente amortecido. Pelo contrário, o modo de período curto
tem um período de poucos segundos, fazendo jus ao nome, e é muito amortecido.
Estas características são típicas destes modos e são comuns para muitas aeronaves e
condições de voo.

Determinação dos vectores próprios


Como se viu anteriormente, os vectores próprios x0 são as soluções da equação
(A − λI)x0 = 0 e são determinados a menos de uma constante multiplicativa. Na
tabela 10.3 apresentam-se os valores próprios obtidos no exemplo presente para os
dois modos oscilatórios (normalizando os resultados obtidos de forma que o valor
inicial do modo com maior amplitude seja 1).

138
1.0 u

Θ
0.5

t
50 100 150 200

-0.5

-1.0

Figura 10.2: Oscilações do modo fugóide para um Cessna 182 nas condições de voo
descritas no texto.

10.3.2 Modo fugóide


Os dados da tabela 10.3 permitem obter a evolução temporal de cada uma das
variáveis dinâmicas longitudinais no modo fugóide:

∆û = (∆û)inicial e−0.022t cos(0.17t) (10.17)


 
−0.022t
α = (∆û)inicial × 0.045 e cos 0.17t − 179.1◦ × (π /180◦ ) (10.18)
 
q̂ = (∆û)inicial × 0.0030 e−0.022t cos 0.17t + 1.8◦ × (π /180◦ ) (10.19)
 
∆θ = (∆û)inicial × 0.0175 e−0.022t cos 0.17t + 99.2◦ × (π /180◦ ) (10.20)

A figura 10.2 apresenta esta mesma evolução de forma gráfica. Pode-se constatar que
o modo fugóide apresenta variações grandes da velocidade longitudinal u, e variações
desprezáveis do ângulo de ataque α, da velocidade angular de picada q e do ângulo de
picada θ. O ângulo de ataque oscila aproximadamente em oposição de fase com a ve-
locidade longitudinal, enquanto que as oscilações do ângulo de picada estão atrasadas
de aproximadamente 90◦ .
Para se obter a trajectória do avião, parte-se das equações linearizadas para o «flight
path», que neste caso são

∆ẋE = ∆u (10.21)
∆żE = w − u0 ∆θ = u0 α − u0 ∆θ (10.22)

Após a substituição de (10.17) em (10.21) e de (10.18) e (10.20) na equação (10.22), a

139
xE - t u0 zE

4
5

2
t
50 100 150 200
t -5
50 100 150 200

-2 -10

Figura 10.3: Variações da posição em xE e zE relativamente ao estado estacionário no


modo fugóide, para o exemplo do Cessna 182.

integração das equações conduz a

ent n cos(ωt) + ω sin(ωt)


 
∆xE = (∆û)inicial (10.23)
n2 + ω 2
para a perturbação na coordenada xE devida ao modo fugóide, e a

u0 nt
h
∆zE = e (∆û) inicial × 0.045n cos(ωt + ϕα ) + 0.045ω sin(ωt + ϕα )
n2 + ω 2 i
− 0.0175n cos(ωt + ϕθ ) − 0.0175ω sin(ωt + ϕθ ) (10.24)

para a correspondente perturbação na coordenada zE (em que ϕα e ϕθ são os valores


da tabela 10.3). Note-se se xE = (xE )0 + ∆xE , sendo (xE )0 = u0 t. Por outro lado,
zE = (zE )0 + ∆zE , mas a cota (zE )0 é constante no estado estacionário e podemos
escolher a origem do sistema de eixos de forma a tornar (zE )0 = 0.
A variação de ∆xE e ∆zE está representada na figura 10.3. Neste exemplo as va-
riações na altitude do avião estão desfazadas das variações na posição longitudinal
de aproximadamente 90◦ . O período das oscilações é o do modo fugóide e elas são
pouco amortecidas. A figura 10.4 representa a posição do centro de massa do avião
nu referencial centrado no sistema de eixos de estabilidade do estado estacionário (e
que se desloca com velocidade (u0 , 0, 0) relativamente à Terra). Pode observar-se que
quando o avião desce a sua velocidade aumenta, enquanto que quando ele sobe a sua
velocidade diminui. O mesmo se pode observar na figura 10.5, em que se mostra a
variação da velocidade longitudinal total uE , comparando-a com a variação na altitude
do avião. Como o modo é pouco amortecido, esta conversão entre energia cinética e
potencial e feita mantendo a energia mecânica total do avião aproximadamente cons-
tante. Esta constatação está na base da aproximação mais simples ao modo fugóide, a
aproximação de Lanchaster, como veremos mais à frente.

140
z
15

10

0 x - t u0

-5

-10

-15
-15 -10 -5 0 5 10 15

Figura 10.4: Modo fugóide: posição do centro de massa do avião no referencial do


estado estacionário.

10.3.3 Modo de período curto


Com os dados da tabela 10.3 pode-se obter a evolução temporal de cada uma das
variáveis dinâmicas longitudinais no modo de período curto:

◦ π
 
−4.45t
∆û = αinicial × 0.0065 e cos 2.82t − 37.7
180
α = αinicial e−4.45t cos(2.82t)
π
 
−4.45t ◦
q̂ = αinicial × 0.0564 e cos 2.82t + 129.8
180
π
 
∆θ = αinicial × 0.0107 e−4.45t cos 2.82t − 17.8◦
180
Na figura 10.6 esta mesma evolução é representada de forma gráfica. Pode-se constatar
que o modo fugóide apresenta variações grandes do ângulo de ataque α, e variações
desprezáveis da velocidade angular de picada q e do ângulo de picada θ. A variação
da velocidade longitudinal ∆u é também desprezável e toma valores tão pequenos que
nem foi representada na figura.
As equações da trajectória podem obter-se de forma semelhante à descrita para o
modo fugóide. A figura 10.7 apresenta as variações da posição em xE e zE relativa-
mente ao estado estacionário. As variações na posição longitudinal são desprezáveis,
tal como as variações na velocidade longitudinal representadas na figura 10.8. As úni-
cas variações importantes são da altitude do avião, mas as oscilações são fortemente
amortecidas, como é próprio deste modo.

141
uE
68.0

67.5

67.0

66.5
t
50 100 150 200
zE

t
50 100 150 200

-5

-10

Figura 10.5: Variação da velocidade longitudinal total uE para o modo fugóide,


comparando-a com a variação na altitude do avião, já mostrada na figura 10.3. Indica-
se a velocidade do estado estacionário, u0 = 67.08 m/s.

142
1.0 Α

q
0.8
Θ

0.6

0.4

0.2

t
0.5 1.0 1.5 2.0 2.5

-0.2

Figura 10.6: Oscilações das variáveis dinâmicas no modo de período curto.

-zE
10
xE - t u0
t 8
0.5 1.0 1.5 2.0 2.5
-0.0002 6
-0.0004
4
-0.0006
2
-0.0008

-0.0010 t
0.5 1.0 1.5 2.0 2.5
-0.0012 -2

Figura 10.7: Variações da posição em xE e zE relativamente ao estado estacionário no


modo de período curto, para o exemplo do Cessna 182.

143
uE
67.20

67.15

67.10

67.05

t
0.0 0.5 1.0 1.5 2.0 2.5

Figura 10.8: Variações da velocidade longitudinal uE relativamente ao estado estacio-


nário no modo de período curto, para o exemplo do Cessna 182.

10.4 Modos longitudinais aproximados


Nesta secção procuraremos deduzir expressões aproximadas para os modos longi-
tudinais. Estas expressões facilitam os cálculos para a obtenção dos valores próprios
e permitem perceber mais facilmente quais são os factores mais importantes que de-
terminam os valores do período e factor de amortecimento de cada modo.

10.4.1 Modo fugóide aproximado


Como vimos, o modo fugóide caracteriza-se por oscilações de ∆u com pequena
variação de α, q e ∆θ.

Aproximação de Lanchester
A aproximação mais simples ao modo fugóide foi desenvolvida por Lanchaster logo
no início do séc. XX.
Nesta aproximação admite-se que as perturbações do ângulo de ataque são nulas.
Usando eixos de estabilidade, α = 0. Além disso admite-se que a linha de acção da
força de propulsão é o eixo Cx, ou seja, αT = 0; e que T = D, o que garante o equilíbrio
das forças em x.
Uma vez que L é perpendicular à velocidade e por isso não realiza trabalho, que,
se T = D, o trabalho das forças tangenciais não conservativas se anula, e que a única
força que produz trabalho (o peso) é conservativa, conclui-se que nesta aproximação
há conservação da energia mecânica. A origem do referencial FE é definida de forma
que V = u0 quando zE = 0 (isto é, a altitude de referência é a correspondente ao estado
estacionário). Pela conservação de energia mecânica,

1 1
E= mV 2 − mgzE = cte = mu20 ⇒ V 2 = u20 + 2gzE . (10.25)
2 2

144
Mas, como α = 0, CL = CL1 = CW0 . Note-se que no modo fugóide q é suficientemente
pequeno para não alterar significativamente o valor de CL . Então,
1 1 1
L= ρV 2 SCW0 = ρu20 SCW0 + ρ2gzE SCW0 = W + kzE , (10.26)
2 2 2
em que se define k = ρSgCW0 .
A equação do movimento segundo z pode escrever-se W − L cos θ = mz̈E . Mas,
dado que θ0 = 0 e que no modo fugóide as oscilações ∆θ são desprezáveis, θ  1,
cos θ ≈ 1. Usando (10.26) a equação do movimento toma a forma de uma equação de
movimento harmónico simples,

mz̈E + kzE = 0, (10.27)

para oscilações verticais de frequência


s
k
ω= . (10.28)
m
Pela conservação de energia conclui-se que há também oscilações em V = u0 + ∆u.
O período das oscilações é
s
2π m m
r
T = = 2π = 2π . (10.29)
ω k ρSgCW0
1
Usando CW0 = mg/( 2 ρu20 S), obtém-se finalmente
√ u0
T =π 2 . (10.30)
g

O período depende apenas de u0 e não depende nem das características da aeronave,


nem de ρ (nem, por isso, da altitude).
Para verificarmos até que ponto a aproximação de Lanchester dá resultados fiáveis,
comparemos o valor do período obtido usando esta aproximação com o valor exacto
obtido anteriormente para o Cessna 182:
• Texacto = 37 s,
• Taprox = 30.3 s.
Tendo em conta que a aproximação de Lanchaster permite obter valores razoávelmente
aproximados para o período (o erro é, neste caso, inferior a 20%), mas não há amor-
tecimento das oscilações. Necessitamos, pois, de outra aproximação que nos permita
determinar de forma aproximada o factor de amortecimento.

Modo fugóide: outra aproximação (com amortecimento)


Para esta aproximação usar-se-á uma abordagem diferente: fazemos as aproxima-
ções directamente nas equações do movimento para pequenas perturbações de modo
a obter um sistema de ordem inferior à inicial.
As aproximações que serão feitas decorrem das características do modo fugóide:
q e ∆θ são pequenos e podem ser desprezados nas equações. Além disso, como o

145
estado estacionário é um voo horizontal, θ0 = 0. Omitindo os termos de controlo, as
equações para o movimento longitudinal são:

Xu Xw
∆u̇ = ∆u + w + −g cos θ0 ∆θ
m m | {z }
≈1
Zu Zw Zẇ Zq
ẇ = ∆u + w+ ẇ + q −g sin θ0 ∆θ + u0 q
m m |m{z } |m
| {z }
≈0
{z }
≈0 ≈0
∆M 1
q̇ = ≈ (Mu ∆u + Mw w)
|{z} Iy Iy
≈0

∆θ̇ = q

Com as aproximações indicadas anteriormente, e escrevendo as equações na forma


matricial, temos
  Xu Xw
∆u̇ 0 −g
  
m m
∆u
    
 ẇ   Zu Zw
    
u 0  w 
  m m 0  
 =  .
 0  M
    
   u Mw 0 0  q 
 

    
∆θ̇ 0 0 1 0 ∆θ

Este sistema de equações diferenciais ordinárias pode ser resolvido de forma análoga
ao sistema completo. Admitindo soluções na forma x = x0 eλt ⇒ ẋ = λx, obtém-se


 ∆u̇ = λ∆u,

ẇ = λw,


 ∆θ̇ = λ∆θ,

e substituindo nas equações anteriores vem


  Xu Xw  Xu Xw
λ∆u 0 −λ 0
    
m m
−g ∆u m m
−g ∆u
       
  Z Zw
   Z Zw
 
 λw   u u0 0  w 
   u
−λ u0 0  w 
 
  m m   m m 
 =  ⇒   = 0.
       
  q   Mu q
 0  M Mw 0 0     Mw 0 0 
  
   u 
       
λ∆θ 0 0 1 0 ∆θ 0 0 1 −λ ∆θ
(10.31)
A equação característica para o modo fugóide aproximado é
X Xw

u −λ 0 −g
m m


Zu Zw
− λ u 0

m m 0
= 0,


Mu M 0 0

w



0 0 1 −λ

146
e daqui se deduz

u0 g
   
(−u0 Mw ) λ2 + gMu + (Mw Xu − Mu Xw ) λ + (Mw Zu − Mu Zw ) = 0. (10.32)
| {z } m |m
A
| {z } {z }
B C

Obtemos portanto uma equação característica que é de 2ª ordem, o que mostra que o
sistema aproximado é também de 2ª ordem. Note-se que a equação se pode escrever

B C
Aλ2 + Bλ + C = 0 ⇒ λ2 + λ+ = 0.
A A
Num sistema de 2ª ordem, a frequência natural e factor de amortecimento de um
modo oscilante podem obter-se facilmente a partir da equação característica. Se λ1 =
n + iω e λ∗
1 = n − iω são soluções de

λ2 + (B/A)λ + (C/A) = 0,

então
2
(λ − λ1 )(λ − λ∗
1 ) = λ + (B/A)λ + (C/A).

Mas

(λ − λ1 )(λ − λ∗
1 ) = 0 ⇒ (λ − (n + iω)) (λ − (n − iω)) = 0

⇒ λ2 − 2nλ + (n2 + ω2 ) = 0
⇒ λ2 + 2ζωn λ + ω2n = 0,

em que se usou n = −ζωn e ωn = (n2 + ω2 ). Conclui-se imediatamente que

C
ω2n =, (10.33)
A
B
2ζωn = . (10.34)
A
A frequência natural e factor de amortecimento para o modo fugóide aproximado
podem determinar-se usando A, B e C definidos na equação (10.32), obtendo-se

g Zw
 
ω2n = − Zu − Mu , (10.35)
mu0 Mw
−1/2 
1 g Zw gMu 1 Mu
   
ζ=− Mu − Zu + Xu − Xw . (10.36)
2 mu0 Mw u0 Mw m Xu

Para muitas aeronaves e situações de voo é possível fazer ainda a aproximação Mu = 0.


Nesse caso, os valores para a frequência natural e o factor de amortecimento são dados
por

gZu
ω2n = − , (10.37)
mu0
gZu −1/2 Xu
s
1 Xu u0
 
ζ=− − =− − . (10.38)
2 mu0 m 2 mgZu

147
Note-se que, se Czu ≈ 0, e com θ0 = 0,

1
Zu = −ρu0 SCW0 cos θ0 + ρu0 SCzu = −ρu0 SCW0
2
A frequência natural será nesta aproximação dada por

g(−ρu0 SCW0 ) 2g 2 √ g
ω2n = − = 2 ⇒ ωn = 2 .
mu0 u0 u0

Note-se que recuperamos a aproximação de Lanchester para o período:

2π √ u0
Tn = = 2π .
ωn g

Para se verificar de que depende o factor de amortecimento consideremos o caso


de um jacto. Sendo a propulsão aproximadamente constante, tem-se CTu = −2CT0 . Por
outro lado CT0 ≈ CD1 . Desprezando as derivadas de CD , CL e Cm em ordem a u,

Cxu ≈ CTu = −2CT0 = −2CD1

Supondo θ0 = 0, de (9.12) e (9.4) obtém-se

Xu = 1/2 ρu0 SCxu = −ρu0 SCD1 ,


Zu = −ρu0 SCW0 = −ρu0 SCL1 .

O factor de amortecimento é então:


s
Xu u0 1 CD1
ζ=− − =√ ,
2 mgZu 2 CL1
ou seja, é proporcional ao inverso da razão L/D:

1
ζ∼ .
L/D

Conclui-se que o amortecimento da fugóide se degrada quando melhora a eficiência


aerodinâmica pelo aumento de L/D. Um amortecimento da fugóide demasiado baixo
pode dificultar a pilotagem do avião, especialmente se o piloto está a voar por instru-
mentos. Os sistemas de aumento de estabilidade permitem eliminar este problema.
Na tabela 10.4 comparam-se os valores exactos obtidos para o período e o factor
de amortecimento do modo fugóide com os valores obtidos para a aproximação de
Lanchester e a segunda aproximação feita. Neste caso Cmu = 0 (cfr. tabela 10.2), pelo
que se usaram as expressões (10.37) e (10.38). Em ambas as aproximações o valor
do período é semelhante e apresenta um erro relativo inferior a 20% relativamente ao
valor exacto. O factor de amortecimento só pode ser calculado mediante a segunda
aproximação, e o valor obtido tem um erro relativo da ordem dos 14%. Isto mostra que
estas aproximações são razoáveis desde que não seja necessário grande precisão.

148
Tabela 10.4: Comparação entre as aproximações e o valor exacto para o modo fugóide

Factor de
Período (T ) amortecimento (ζ)
Valor exacto 37.0 s 0.129
Aproximação de Lanchester 30.4 s —
Aproximação com amortecimento 30.6 s 0.111

10.4.2 Modo de período curto aproximado


O modo de período curto caracteriza-se por ∆u ≈ 0. Por isto para se obter o
modo aproximado ignorar-se-á a equação em x, que determina a evolução de ∆u.
Admitir-se-á ainda que Zẇ  m, pelo que (m − Zẇ ) ≈ m, e também que Zq  mu0 ,
donde (Zq + mu0 ) ≈ mu0 . Finalmente, usar-se-á o facto de que o estado estacionário
corresponde a um voo horizontal, pelo que θ0 = 0.
As equações para o movimento longitudinal (omitindo os termos de controlo) são

Xu Xw
∆u̇ = ∆u + w + −g cos θ0 ∆θ [equação ignorada]
m m  
Zu Zw mu0 + Zq mg sin θ0
ẇ = |{z} + m − Zẇ w + m − Zẇ q − m − Zẇ ∆θ
∆u
m − Zẇ
≈0 | {z } | {z } | {z }
≈Zw /m ≈u0 ≈0 (θ0 ≈0)
" ! !
1 Mẇ Zu Mẇ Zw Mẇ (mu0 + Zq )

q̇ = Mu + ∆u + Mw + w + Mq + q
Iy m − Zẇ |{z} m − Zẇ m − Zẇ
≈0 | {z } | {z }
Mẇ Zw /m Mẇ u0
#
Mẇ mg sin θ0
− ∆θ
m − Zẇ
| {z }
≈0 (θ0 ≈0)

∆θ̇ =q

Com as aproximações indicadas a 2ª e a 3ª equações dependem apenas de w e q e suas


derivadas. Desta forma, obtém-se o sistema de equações:
   Zw  
ẇ m
u0 w
 = i   ,

 h i h
q̇ I
1
Mw + MẇmZw
y I
1
Mq + Mẇ u0
y
q

cuja equação característica é


Zw


m
−λ u0

= 0.

h i h i
I Mw + MẇmZw
1 1
Mq + Mẇ u0 − λ

y Iy

149
Tabela 10.5: Comparação entre os valores exactos e aproximados obtidos para o modo
de período curto.

λ T (s) ζ t1/2 (s) N1/2


Exacto −4.45295 ± 2.82492i 2.2242 0.844 0.156 0.07
Aproximado −4.49906 ± 2.8647i 2.1933 0.8435 0.154 0.07

Desenvolvendo o determinante, a equação característica toma a forma


" #
Z 1 1 Zw
   
2 w
λ − + Mq + Mẇ u0 λ − Mw u0 − Mq = 0. (10.39)
m Iy Iy m
| {z } | {z }
B C

De (10.33) e de (10.34) com A = 1, obtém-se


s
1 Zw
p  
ωn = C = − Mw u0 − Mq , (10.40)
Iy m
 
Zw 1
B m
+ Iy
Mq + M ẇ u 0
ζ= √ = r  . (10.41)
2 C 1 Zw
2 Iy Mw u0 − m Mq

As expressões (10.40) e (10.41) são válidas se o período curto for um modo oscilatório.
Nesse caso as soluções da equação característica (10.39) são um par de raízes comple-
xas conjugadas, e como o modo é oscilatório existe ωn e ζ. No entanto, para certos
valores das derivadas de estabilidade a equação (10.39) pode ter duas raízes reais. Os
modos deixam de ser oscilatórios, não se define ωn nem ζ e é necessário calcular as
raízes da equação.
Na tabela 10.5 apresentam-se os resultados obtidos por intermédio da aproxima-
ção acima e comparam-se com os valores exactos anteriormente obtidos para o modo
de período curto. Os resultados da aproximação são muito satisfatórios neste caso.
Geralmente esta aproximação de período curto dá resultados muito aproximados do
valor exacto para uma grande gama de aeronaves e de condições de voo.

10.5 Teoria Geral da Estabilidade Longitudinal Estática


A estabilidade dinâmica pressupõe a existência de estabilidade estática. Podemos
usar os critérios de estabilidade dinâmica para recuperar os critérios de estabilidade
estática.
Para existir estabilidade dinâmica é necessário que a parte real das raízes da equa-
ção característica seja negativa. A equação característica é, como vimos, det(A − λI) =
Aλ4 + Bλ3 + Cλ2 + Dλ + E = 0.
Pelo critério de Routh, uma das condições de estabilidade é E > 0. Mas E obtém-se
do polinómio característico fazendo λ = 0, pelo que E = det A. Supondo que o voo é
horizontal, θ0 = 0. Faremos ainda a simplificação adicional de admitir que Zẇ e Zq são

150
desprezáveis. Então,
Xu Xw


m m
0 −g




Zu Zw
u0 0


m m
E = det A =

=

    
Mẇ Zu Mẇ Zw
1 1 1

Iy Mu + m Mw + Mq + Mẇ u0 0

Iy m Iy



0 0 1 0
g
= [Zu Mw − Zw Mu ] .
mIy

A condição de estabilidade dinâmica implica então que


g
E= [Zu Mw − Zw Mu ] > 0 ⇒ Zu Mw − Zw Mu > 0.
mIy

Mas, tendo em conta que


1
Zu = −ρu0 SCW0 + ρu0 SCzu ,
2
1
Zw =
ρu0 SCzα ,
2
1
Mu = ρu0 c̄SCmu ,
2
1
Mw = ρu0 c̄SCmα ,
2
a condição de estabilidade é

(Czu − 2CW0 )Cmα − Cmu Czα > 0.

Se Czu ≈ 0 ≈ Cmu , a condição acima é apenas

−2CW0 Cmα > 0 ⇒ Cmα < 0. (10.42)

Obtemos assim uma das condições de estabilidade estática como consequência das
condições necessárias e suficientes para estabilidade dinâmica.

10.6 Efeito da posição do centro de massa


Várias derivadas longitudinais dependem da posição do centro de massa, como por
exemplo, Cmα , Cmq e CLq . Consequentemente, os modos longitudinais dependem de
h. Para exemplificar essa dependência calcularam-se as raízes da equação caracterís-
tica completa para os modos longitudinais de um Cessna 182 nas condições de voo
anteriormente descritas, para várias posições do centro de massa.
Habitualmente a variação das derivadas Cmq e CLq com h é menos importante que
a variação de Cmα . Por isso neste exemplo supomos que apenas Cmα depende de h, e
usamos a bem conhecida expressão Cmα = CLα (h − hn ) = −CLα Kn .

151
Raízes para −0.1 < Kn < 0.5 Comportamento perto da origem
Ω Ω
0.4

5
0.2

n n
-8 -6 -4 -2 -0.6 -0.4 -0.2 0.2

-0.2
-5

-0.4

Figura 10.9: Localização das raízes λ = n + iω da equação característica longitudinal


exacta de um Cessna 182. A vermelho: raízes para −0.1 < Kn < 0; a azul: raízes para
0 < Kn < 0.5.

As raízes da equação característica longitudinal exacta de um Cessna 182 foram cal-


culadas para margens estáticas no intervalo −0.1 < Kn < 0.5. Na figura 10.9 apresenta-
se a localização das raízes, e o comportamento perto da origem. Verifica-se que para
Kn < 0 existem raízes com parte real positiva, que correspondem a modos instáveis.
Na figura 10.10 mostra-se a localização das raízes para margem estática positiva
e distinguindo o modo fugóide do modo de período curto. Para 0.5 ≥ Kn ≥ 0.08 as
raízes correspondem às características habituais dos modos: o modo fugóide é osci-
latório (pares de raízes complexas conjugadas) e pouco amortecido (a parte real das
raízes está próximo da origem); o modo de período curto é oscilatório (pares de raízes
complexas conjugadas), é muito amortecido (parte real negativa de valor elevado) e
tem frequência elevada. No entanto, para o modo de período curto a sua frequência
diminui à medida que a margem estática diminui, e anula-se para Kn = 0.08. Nessa
altura passamos a ter duas raízes reais positivas e o modo deixa de ser oscilatório.
Para margem estática na gama 0.08 > Kn ≥ 0.0019 o modo fugóide continua a ser
oscilatório mas a frequência vai-se aproximando de zero; por sua vez, as raízes reais
correspondentes ao modo de período curto afastam-se, uma delas aumentando e a
outra diminuindo de valor. Finalmente, para 0.0019 > Kn ≥ 0 o modo fugóide deixa
de ser oscilatório e passamos a ter duas raízes reais, aproximando-se uma delas da
origem.
Finalmente, na figura 10.11 mostra-se a localização das raízes para margem estática
negativa. Observa-se que, à medida que a margem estática se torna mais negativa, a
raiz real positiva, que corresponde a um modo instável, se torna mais positiva. Por
outro lado, uma das raízes reais correspondente ao modo fugóide e uma das raízes
reais correspondente ao modo de período curto aproximam-se e tornam-se iguais para
Kn ≈ −0.03. Para valores mais negativos de Kn estas raízes passam a ser um par de
raízes complexas conjugadas, correspondendo a um modo oscilatório. A quarta raíz,
não mostrada na figura, é real e toma valores crescentemente negativos à medida que
Kn se torna mais negativo.

152
Fugóide Período curto
Ω Ω
0.2

5
0.1

n n
-0.07 -0.06 -0.05 -0.04 -0.03 -0.02 -0.01 -6 -4 -2

-0.1
-5

-0.2

Figura 10.10: Localização das raízes da equação característica longitudinal exacta de


um Cessna 182 para 0 < Kn < 0.5, para o modo fugóide (esquerda) e o modo de
período curto (direita). A azul: raízes para 0.5 ≥ Kn ≥ 0.08; a verde: raízes para
0.08 > Kn ≥ 0.0019; a vermelho: raízes para 0.0019 > Kn ≥ 0.

0.3

0.2

0.1

n
-1.0 -0.8 -0.6 -0.4 -0.2 0.2
-0.1

-0.2

-0.3

Figura 10.11: Localização das raízes da equação característica longitudinal exacta de


um Cessna 182 para Kn < 0. Para 0 > Kn > −0.03: a vermelho, «modo fugóide»; a
azul, »modo de período curto». Para −0.03 ≥ Kn ≥ −0.1, a verde, modo oscilatório; a
laranja, raiz real.

153
10.7 Efeito do Vento nos Modos Longitudinais
O vento pode influenciar a dinâmica de uma aeronave de várias formas, especial-
mente se existe turbulência atmosférica ou se o vento apresenta gradientes espaciais.
Entre estes incluem-se as correntes verticais ascendentes (térmicas), os downbursts e
os gradientes devido à camada limite atmosférica. No que se segue abordar-se-á ape-
nas efeito do vento de frente ou vento de cauda num voo horizontal na camada limite
atmosférica.
~ só
Supomos que o vento é horizontal, isto é, que no referencial FE fixo na Terra W
tem componente horizontal. Na camada limite atmosférica a variação da velocidade
do vento com a altitude tem a forma W = khn , em que W é a velocidade do vento,
h é altura acima do solo e k e n são constantes que dependem das características do
terreno. A velocidade do vento aumenta com a altitude, e por isso n > 0.

10.7.1 Equações do movimento para pequenas perturbações na pre-


sença de vento
O estado estacionário é o definido na secção 8.1, isto é, um voo horizontal nivelado
com velocidade u0 . Assim, u̇0 = v̇0 = ẇ0 = 0, p0 = q0 = r0 = 0, v0 = 0, θ0 = 0 e φ = 0.
Além disso, supomos sem perda de generalidade que ψ0 = 0. Usaremos um sistema
de eixos de estabilidade, pelo que w0 = 0, ou seja, αx = 0 no estado estacionário.
A diferença relativamente ao caso tratado no capítulo 8 é que agora a velocidade do
vento não é nula.  E

 u = u + Wx

~ =V
V E ~ +W ~ ⇒ v E = v + Wy

 E

w = w + Wz
Assim, as equações linearizadas (8.12), (8.15), e (8.24) dependem agora da velocidade
relativa à Terra e não apenas do velocidade relativa ao ar. As equações (8.18) e (8.20)
permanecem iguais. O sistema de equações no referencial do avião é agora
  


 ∆X − mg∆θ = m ∆u̇E + qWz − r Wy


 ∆Z = m(ẇ E + pWy − quE0 )




∆M = Iy q̇ (10.43)


∆θ̇ = q






 ∆ż = w E − uE ∆θ

E 0

A última equação é importante porque as velocidades relativas a FE dependem da


velocidade do vento e este depende da altitude, e portanto da coordenada zE . De
facto, como a velocidade do vento depende da altitude, as componentes Wi = Wi (zE )
dependem também da altitude.
Vamos tratar apenas o caso de vento na direcção do movimento do avião (vento de
frente ou de cauda) e em que não existe vento lateral. No referencial da terra
~ E = (W (zE ), 0, 0).
W (10.44)

Definindo a posição vertical da aeronave no estado estacionário por zE0 e supondo


que durante a fase de voo em consideração zE não varia muito relativamente a zE0 ,

154
podemos desenvolver W (zE ) em série de Taylor e tomar apenas o termo linear:

dW
W (zE ) = W0 + ∆zE = W0 + Γ ∆zE , (10.45)
dze

em que W0 = W (zE0 ) e
dW
Γ ≡ . (10.46)
dze
No referencial fixo na Terra, a velocidade do vento é então

W W0 + Γ ∆zE
   
W~E =  0  =  0 ,
0 0

~ B = [Wx , Wy , WZ ]T vem dado por


e no referencial do avião W

W cos θ W0 + Γ ∆zE W0 + Γ ∆zE


     
~ B = LBE W
W ~E =  0 ≈ 0 ≈ 0 . (10.47)
W sin θ (W0 + Γ ∆zE )∆θ W0 ∆θ

Usando (10.47) podemos escrever

d d
u̇E = [u + Wx ] = [(u0 + ∆u) + (W0 + Γ ∆zE )] = ∆u̇ + Γ ∆żE (10.48)
dt dt
d d
ẇ E = [w + Wz ] = [w + (W0 ∆θ)] = ẇ + W0 ∆θ̇ (10.49)
dt dt
Substituindo (10.48) na primeira equação de (10.43) e (10.49) na segunda e na quinta
equações de (10.43), obtém-se

∆X − mg∆θ = m(∆u̇ + Γ ∆żE )






∆Z = m(ẇ + W0 ∆θ̇ − quE0 )






∆M = Iy q̇


∆θ̇ = q





∆żE = (w + W0 ∆θ) − uE0 ∆θ = w + (W0 − uE0 )∆θ

Mas uE0 = u0 + W0 ⇒ W0 − uE0 = −u0 , pelo que se pode simplificar o sistema:

∆X − mg∆θ = m(∆u̇ + Γ ∆żE ) = m[∆u̇ + Γ (w − u0 ∆θ)]






∆Z = m(ẇ + W0 ∆θ̇ − quE0 ) = m(ẇ − qu0 )






∆M = Iy q̇


∆θ̇ = q





∆żE = w + (W0 − uE0 )∆θ = w − u0 ∆θ

155
Conclui-se que o sistema de equações se pode escrever como

∆X
− Γ w − (g − Γ u0 )∆θ = ∆u̇



m






 ∆Z + qu = ẇ



 0
m

(10.50)
 ∆M


= q̇


Iy








 q = ∆θ̇

Comparando estas equações com (8.12), (8.15), (8.18) e (8.20), constata-se que a
única diferença ocorre na primeira equação: o 2º termo é novo e no 3º termo aparece
uma parcela adicional. Desenvolvendo ∆X, ∆Z e ∆M e procedendo como no capítulo
8, chega-se a um novo sistema de equações diferenciais em que a única diferença
relativamente ao sistema (8.21) é o aparecimento dos termos referidos. Logo, o novo
sistema de equações é
 
 Xu Xw 
 
m m
−Γ 0 (−g+Γ u0 ) cos θ0  
 
∆u̇   ∆u
    
   Zu Zw (mu0 +Zq ) mg sin θ0  
  
 ẇ   m−Zẇ m−Zẇ m−Zẇ
− m−Zẇ 
 w 

 =  ,
          
M (mu +Z )
   −Mẇ mg sin θ0
  
 q̇   1 M + Mẇ Zu 1 Mẇ Zw
Mw + m−Z 1
Mq + ẇ m−Z0ẇ q  q 
  Iy u m−Zẇ Iy Iy Iy (m−Zẇ )

  
    
 
∆θ̇ ∆θ
0 0 1 0

em que se omitiu o vector das variáveis de controlo por questão de espaço.

Alterações na dinâmica da aeronave


As contribuições explícitas do vento nos modos longitudinais são apenas as in-
dicadas. No entanto, existem muitas alterações à dinâmica longitudinal devidas ao
gradiente de vento que não estão explícitas e que se devem à variação da pressão dinâ-
mica quando a aeronave altera a sua atitude. Por exemplo, se α varia e a cauda desce,
a velocidade na cauda diminui, e Lt diminui, donde |Cmα | diminui; ou se φ ≠ 0 e a asa
direita desce, a sustentação da asa direita diminui e a da asa esquerda aumenta o que
provoca um aparecimento de Clφ e Cnφ .
Excluindo as contribuições implícitas, a única alteração que se verifica é na matriz
do sistema para o movimento longitudinal. A matriz é semelhantes, com as alterações:

Xw Xw
 
é substituído por −Γ
m m

−g é substituído por −g + Γ u0

Logo, para os modos longitudinais aproximados apenas o modo fugóide é afectado


pelo gradiente de vento, bastando usar os novos termos da matriz na determinação
das raízes da equação características ou da frequência natural e do factor de amorte-
cimento.

156
10.8 Modos longitudinais em atmosferas estratificadas
Numa atmosfera estratificada a densidade varia com a altitude, isto é, ρ = ρ(zE ).
Dado que no modo fugóide há variações apreciáveis de zE , os gradientes de ρ influen-
ciam este modo. Quando o avião desce, a densidade aumenta e há um acréscimo de
sustentação, acontecendo o inverso quando o avião sobe. Esta variação da sustentação
e das outras forças aerodinâmicas com zE influencia principalmente as características
da fugóide, sendo modo de período curto menos afectado.

10.8.1 Modificação das Equações do Movimento


Numa atmosfera estratificada um estado estacionário tem de ser um voo horizontal
(altitude constante). A sustentação, bem como a resistência aerodinâmica e o momento
de picada, dependem de ρ e portanto da altitude. Para incluir este efeito nas equações
para pequenas perturbações é necessário incluir a equação para żE nas equações da
dinâmica e explicitar a dependência de forças e momentos em zE .
Das equações para o flight path, a equação linearizada para zE é:

∆żE = −∆u sin θ0 + w cos θ0 − u0 ∆θ cos θ0 .

Num voo horizontal:


∆żE = w − u0 ∆θ.
Explicitando a dependência das forças e momentos longitudinais com zE , obtém-se

∆X = Xu ∆u + Xw w + +Xz zE + ∆Xc ,

∆Z = Zu ∆u + Zw w + Zẇ ẇ + Zq q + Zz zE + ∆Zc ,

∆M = Mu ∆u + Mw w + Mẇ ẇ + Mq q + Mz zE + ∆Zc ,

onde
∂X ∂Z ∂M

Xz = , Zz = , Mz = .
∂zE 0 ∂zE 0 ∂zE 0
Comecemos por calcular a derivada Zz . Dado que Z = 12 ρV 2 SCz ,
" #
∂Z ∂Z ∂ρ 1 2 ∂Cz ∂ρ
= = V S Cz + ρ
∂zE ∂ρ ∂zE 2 ∂ρ ∂zE

Admitindo que a densidade varia exponencialmente com a altitude (exacto para atmos-
fera isotérmica):
∂ρ
ρ = ρ0 eκzE ⇒ = κρ (10.51)
∂zE
Desprezando as variações de Cz com ρ (isto é, supondo que CL não depende de ρ),
∂Z 1
= V 2 SCz κρ.
∂zE 2
A derivada é calculada no estado estacionário, donde
∂Z = κ 1 ρu2 S(Cz )0 = κZ0 = −κmg.

Zz = 0
∂zE 0 2

157
Procedendo de forma análoga, mostrar -se-ia que

Xz = κX0 ,
Mz = κM0 .

Mas, no estado estacionário, X0 − mg sin θ0 = 0, pelo que, num voo horizontal, X0 =


0 ⇒ Xz = 0. Por outro lado, Mz = κM0 = 0.
As equações longitudinais para pequenas perturbações a um voo horizontal numa
atmosfera estratificada são então
 Xu Xw 
  m m
0 −g 0  
 
∆u̇   ∆u

 
( mu0 +Zq )
 
  Z u Z w Z z
0
  
   m−Z ẇ m−Z ẇ m−Z ẇ m
 
 ẇ   
 w 
 
    
     
= 1

Mẇ Zz  , (10.52)
 q̇   Qu Q Q 0
 
   w q Iy m−Zẇ  
 q 

   
   
 ∆θ̇    ∆θ 

   0
 0 1 0 0 
  
    
 z
z˙E

E
0 1 0 −u0 0

em que se omitiram os termos de


 controlo e se usaram as seguintes abreviaturas:

1 Mẇ Zu 1 Mẇ Zw 1 Mẇ (mu0 +Zq )
Qu = Iy Mu + m−Zẇ ; Qw = Iy Mw + m−Z ẇ
; Q q = Iy
M q + m−Zẇ

10.8.2 Estimativa para a variação do período do modo fugóide


Do sistema de equações (10.52) é possível calcular a frequência e factor de amor-
tecimento do modo fugóide usando os métodos habituais. Para que se possa saber
em que circunstâncias é importante usar esta correcção convém começar por obter
uma estimativa da variação do período. A estimativa mais simples é a baseada na
aproximação de Lanchester.
Nas hipóteses da aproximação de Lanchester há conservação de energia e verifica-
se (10.25), pelo que V 2 = u20 + 2gzE . A equação (10.26) tem de ser modificada, porque
agora a sustentação é !
1 ∆ρ
L = ρ0 1 + V 2 SCW . (10.53)
2 ρ0
Mas, usando (10.51),
∆ρ 1 ∂ρ
= zE = κzE .
ρ0 ρ0 ∂zE
Logo, tendo em conta (10.25), após linearização das equações obtém-se

L = W + kzE + κW zE . (10.54)

Daqui, obtém-se
mz̈E = W − L = −(k + k0 )zE , (10.55)

158
em que k0 = κW e k = ρgSCWp 0
. Esta equação corresponde a um movimento harmónico
0
simples com período T = 2π m/(k + k0 ). O período T do modo fugóide que se obtém
na aproximação de Lanchester é dado pela equação (10.29). Assim, obtemos
s s
T0 k 1
= F, com F = 0
=
T k+k 1 + k0 /k

Mas, usando os valores de k e k0 ,

k0 κW κu20 1
= = ⇒ F=r
k CW0 ρ0 gS 2g κu20
1+ 2g

O factor de correcção F depende apenas de κ e u0 . O período é menor do que para


uma atmosfera uniforme e a correcção é mais importante para maiores velocidades.

10.8.3 Exemplos de variação do modo fugóide


Exemplo 1: Cessna 182
Voo horizontal a 5000 ft, com velocidade u0 = 67m/s.
Determinação de uma estimativa para κ:
h1 = 1200 m ρ1 = 1.0900 kg/m3 ;
h = 1500 m ρ0 = 1.0900 kg/m3 ;
h2 = 1800 m ρ2 = 1.0269 kg/m3 .
Logo, obtém-se
ρ2 − ρ1
κ= = 9.9392 × 10−5 /m
−(h2 − h1 )ρ0

T 0 /T ζ 0 /ζ
Aprox. Lanchester 0.98881 —
Cálculo exacto 0.99466 0.98472

Exemplo 2: Boeing 747


Voo horizontal a 40000 ft, com velocidade u0 = 265.5m/s.
Determinação de uma estimativa para κ:
h1 = 12000 m ρ1 = 0.31194 kg/m3
h2 = 12300 m ρ2 = 0.29758 kg/m3 ;
ρ2 − ρ1
κ= = 1.53448 × 10−4 /m
−(h2 − h1 )ρ1
Estimativa com base na aproximação de Lanchester: F = T 0 /T = 0.802756.
Comparando estes dois exemplos constata-se que para voos a maior altitude e,
principalmente, a maior velocidade, o factor de correcção é maior e os efeitos da estra-
tificação da atmosfera são importantes. Quando a velocidade é baixa a estratificação da
atmosfera não altera significativamente nem o período nem o factor de amortecimento
da fugóide.

159
Capítulo 11

Estabilidade Dinâmica Lateral

11.1 Modos laterais


A determinação dos modos laterais de uma aeronave faz-se da mesma forma que
para os modos longitudinais: em primeiro lugar calculam-se as derivadas dimensio-
nais (conhecidas as adimensionais), em seguida calculam-se os elementos da matriz A
(neste caso, a matriz para as equações do movimento lateral) e determinam-se as solu-
ções da equação característica, que são os valores próprios de A; finalmente, para cada
valor próprio determina-se o respectivo vector próprio (a menos de uma constante
multiplicativa).
O sistema de equações que rege a evolução das pequenas perturbações do movi-
mento lateral, na ausência de controlo, pode ser escrito na forma ẋ = Ax, sendo o
vector de estado x = [v p r φ]T e a matriz do sistema dada por (8.37). Tal como
no caso de modos longitudinais, supõe-se que a solução da equação do movimento é
da forma x = x0 eλt e, substituindo na equação, obtém-se (A − λI)x0 = 0. Os valores
próprios da matriz, λ, são obtidos pela equação característica det(A − λI) = 0, e x0 são
os vectores próprios correspondentes. Como exemplo, vamos em seguida determinar
os modos laterais de um Cessna 182.

11.1.1 Exemplo: modos laterais de um Cessna 182


Os modos laterais de um Cessna 182 serão determinados para a mesma situação de
voo para o qual se calcularam os modos longitudinais: voo horizontal a 5000 ft, com
velocidade u0 = 67.08m/s (Ma = 0.201).
As características geométricas do Cessna 182 estão resumidas na tabela 10.1. Na
tabela 11.1 apresentam-se as derivadas adimensionais da força lateral e do momento
de rolamento e de guinada em ordem a β, p e r .

160
Tabela 11.1: Derivadas adimensionais laterais (por radiano). Fonte: [5]

Cy Cl Cn
β -0.393 -0.0923 0.0587
p̂ -0.075 -0.484 -0.0278
r̂ 0.214 0.0798 -0.0937

As derivadas dimensionais laterais, calculadas no Sistema Internacional, são:


1
Yv = ρu0 SCyβ = −224.9 kg s−1
2
1
Yp = ρu0 SbCyp = −235.5 kg m s−1
4
1
Yr = ρu0 SbCyr = 671.99 kg m s−1
4
1
Lv = ρu0 SbClβ = −579.67 kg m s−1
2
1 −1
Lp = ρu0 Sb2 Clp = −16676.8 kg m2 s
4
1 −1
Lr = ρu0 Sb2 Clr = 2749.6 kg m2 s
4
1
Nv = ρu0 SbCnβ = 368.6 kg m s−1
2
1 −1
Np = ρu0 Sb2 Cnp = −957.88 kg m2 s
4
1 −1
Nr = ρu0 Sb2 Cnr = −3228.54 kg m2 s
4
Usando as derivadas acima, determinam-se todos os termos da matriz do sistema,

−0.1872 −0.1960 −67.27 9.81


 
 
 
−0.4511 −12.978 2.1398 0 
 
A=  ,

 0.13827 −0.3593 −1.211 0 
 
 
0 1 0 0

calculada em SI. A equação característica det(A − λI) = 0 conduz a uma equação qua-
drática:
λ4 + 14.3764λ3 + 28.3543λ2 + 139.089λ + 2.45636 = 0.
Mais uma vez podemos recorrer aos critérios de estabilidade, e como

E = 2.45636 > 0,
R = D(BC − AD) − B 2 E = 36843.8 > 0,

concluimos que todos os modos vão ser estáveis.

161
Tabela 11.2: Características de cada modo
Modo Período (s) t1/2 (s) N1/2
Espiral — 39.1 —
Rolamento — 0.053 —
Rolamento holandês 1.967 1.03 0.525

Tabela 11.3: Vectores próprios laterais obtidos para o Cessna 182. representa-se tam-
bém o ângulo de guinada ψ, que se obtém a partir de (8.34)

Espiral Rolamento Rolamento holandês


Módulo Fase
β = v̂ 1 0.22004 1 0º
p̂ -0.0149 1 0.035 178.2º
r̂ 0.12038 0.02785 0.046 -80.5º
φ 0.84249 -0.0768 0.0107 76.3º
ψ -83.049 -0.0262 0.849 99.5º

As raízes da equação características são os valores próprio de A:

λ1 = −0.0177239 s−1 (modo espiral)


λ2 = −13.018 s−1 (modo de rolamento)
−1
λ3,4 = −0.670368 ± 3.19323 i (s ) (modo de rolamento holandês)

Na tabela 11.2 apresentam as características dos modos laterais correspondentes. Dois


dos valores próprios são reais e negativos, pelo que os modos correspondentes são
estáveis. O modo correspondente à raiz mais perto da origem é chamado de modo
espiral e o outro modo é chamado de modo de rolamento, por razões que veremos
mais à frente. Os outros dois valores próprios constituem um par de raízes complexas
conjugadas, e o modo correspondente é oscilante. Como a parte real destas raízes é
negativa, este modo, habitualmente chamado de rolamento holandês, é também es-
tável. Na tabela 11.3 apresentam-se os resultados obtidos para os vectores próprios
correspondentes aos modos laterais do Cessna 182, considerando que o valor mais
elevado é unitário.

11.1.2 Características típicas de cada modo


A análise das soluções obtidas permite determinar as características típicas dos
modos laterais.

Modo espiral
A figura 11.1 representa a variação dos ângulos de guinada, derrapagem e prancha-
mento no modo espiral do Cessna 182, obtidos a partir da tabela 11.3. Constata-se

162
80

60
ÈΨÈ

ÈΒÈ
40
ÈΦÈ

20

t
0 50 100 150 200

Figura 11.1: Modo espiral: variação dos ângulos de guinda, derrapagem e prancha-
mento.

1.0
Β

0.8 p

r
0.6

0.4

0.2

t
50 100 150 200

Figura 11.2: Modo espiral: variáveis dinâmicas

facilmente que o ângulo de guinada tem a variação mais importante. O modo espiral é
caracterizado por ter derrapagem «pequena» e ângulo de rolamento «pequeno» com-
parados com ψ, pelo que é uma viragem com pranchamento (banked turn) com raio
variável.
As variáveis importantes para a determinação das forças e momentos aerodinâmi-
cos são β, p e r , que estão representadas graficamente para o modo espiral na figura
11.2. Da tabela 11.3 vem β : p̂ : r̂ = 1 : −0.0149 : 0.120. Ora, β já tinha módulo
«pequeno» (comparado com ψ). Conclui-se portanto que todas as variáveis dinâmicas
envolvidas têm módulo pequeno e as forças e momentos por elas criados têm intensi-
dade pequena; daí que o modo seja «fraco», com constantes de tempo grandes. Se for
estável, o modo espiral converge lentamente; se for instável, o modo espiral diverge
lentamente.

163
x100

140

120

100

80

60

40

20

0 y
0 10 20 30 40 50

Figura 11.3: Trajectória no modo espiral, no exemplo do Cessna 182 e com ângulo de
guinada inicial ψinicial = 20º.

As equações para a trajectória (flight path) relevantes para modos laterais são
∆ẋE = ∆u cos θ0 + w cos θ0 − uo ∆θ sin θ0 , (11.1)
∆ẏE = u0 ψ cos θ0 + v. (11.2)
Para o modo espiral,
ψ = (ψ)inicial eλS t ,
!
β
v = u0 β = (ψ)inicial eλS t ,
ψ

e sendo ∆u = 0 = w e θ0 = 0, obtém-se ∆ẋE = 0, donde xE = u0 t. Por outro lado,


 
β
u0 ψ (ψ)inicial
yE = e λS t .
λS
A trajectória no modo espiral do Cessna 182, em que o valor próprio é λS =
−0.0177239 s-1 e supondo um ângulo de guinada inicial de ψinicial = 20º, está re-
presentada na figura 11.3 para os primeiros 180 s. Neste exemplo este modo é estável,
pelo que se observa uma lenta aproximação do avião à trajectória não perturbada, isto
é, com yE = 0 (note-se a diferença de escalas nas abcissas e nas ordenadas).

Convergência de rolamento
O modo de rolamento tem um valor próprio real e habitualmente negativo e com
valor absoluto grande, sendo a constante de tempo associada, τ = −1/λ, pequena. É

164
1.0
Φ
Β
0.8
p
Ψ
0.6 r

0.4

0.2

t
0.2 0.4 0.6 0.8 1.0

-0.2

Figura 11.4: Modo de rolamento: representação da evolução temporal das variáveis


dinâmicas e dos ângulos de pranchamento e guinada.

por isso um modo estável, com grande atenuação, e é chamado de convergência de


rolamento.
A partir da tabela 11.3 determinam-se facilmente as relações entre ângulos (β, φ
e ψ) e entre variáveis dinâmicas (β,p̂ e hatr ) e a sua evolução temporal está repre-
sentada na figura 11.4. Verifica-se que o modo de rolamento é caracterizado aproxi-
madamente por derrapagem «pequena» e um ângulo e velocidade angular de guinada
«pequenos». A principal variável dinâmica é a velocidade angular de rolamento, o que
justifica o nome dado ao modo.
A componente mais importante para as forças aerodinâmicas é Clp p̂ (e é estabiliza-
dora porque Clp < 0). A contribuição de Clr r̂ é desprezável. Este modo é estável, com
constantes de tempo pequenas e muito atenuado.

Modo de rolamento holandês


O terceiro modo que se obteve para o Cessna 182 é uma oscilação lateral e corres-
ponde ao modo conhecido como dutch roll.
Na figura 11.5 pode ver-se a evolução temporal das variáveis dinâmicas e dos ângu-
los de pranchamento e de guinada. Embora neste exemplo β seja a variável predomi-
nante, como se pode confirmar na tabela 11.3, habitualmente no modo de rolamento
holandês todas as variáveis dinâmicas têm ordem de grandeza semelhante e contri-
buem para o movimento.
A figura 11.6 representa a trajectória seguida pelo centro de massa do avião no
exemplo em estudo para o modo de rolamento holandês. Observa-se que a trajectória
seguida é oscilatória, mas centrada em torno de yE = 0. O centro de massa do avião
segue uma trajectória aproximadamente rectilínea.
Na figura 11.7 apresenta-se um gráfico paramétrico da variação de φ e ψ, a que
corresponde o movimento da ponta da asa do avião. Neste exemplo as oscilações em
φ são muito menores que as oscilações em ψ, mas observa-se que a ponta da asa
vai descrevendo uma elipse cada vez mais apertada, com oscilações amortecidas de
amplitude cada vez menor.

165
1.0
Β
Φ
p
0.5 r
Ψ

t
2 4 6 8 10

-0.5

-1.0

Figura 11.5: Variáveis dinâmicas no modo de rolamento holandês.

x100
10

y
-4 -2 0 2 4

Figura 11.6: Modo dutch roll: trajectória

166
Ψ
20

10

100 Φ
-40 -30 -20 -10 10 20

-10

-20

-30

Figura 11.7: Modo dutch roll: gráfico paramétrico da variação de φ e ψ (movimento da


ponta da asa).

Figura 11.8: Movimento esquemático de um avião no modo de rolamento holandês.


(Fonte: [4])

167
O movimento de um avião no modo de rolamento holandês está esquematizado na
figura 11.8.

11.2 Modos laterais aproximados


Como se sabe, a matriz do sistema (para modos laterais) é dada por
 
 Yv Yp Yr

m m m
− u0 g cos θ0
 
      
 Lv 0 L p 0 L 0
 0 + Izx N 0 + Izx Np
r
0 + Izx Nr 0

 Ix v Ix Ix


A =  .
 
    
 I 0 L + N0v Np Nr
 
0 0
 zx v Iz
I L
zx p + Iz0
Izx r L + Iz0
0 

 
 
0 1 tan θ0 0
Para simplificar a escrita das expressões vamos usar as seguintes abreviaturas:
Yv
Yv = , (11.3)
m
Yp
Yp = , (11.4)
m
Yr
Yr = − u0 , (11.5)
m
Lv 0
Lv = 0 + Ixz Nv , (11.6)
Ix
Lp 0
Lp = 0 + Ixz Np , (11.7)
Ix
Lr 0
Lr = 0 + Ixz Nr , (11.8)
Ix
0 Nv
Nv = Ixz Lv + 0 , (11.9)
Iz
0 N p
Np = Ixz Lp + 0 , (11.10)
Iz
0 Nr
Nr = Ixz Lr + 0 . (11.11)
Iz
A matriz A pode então escrever-se como
Yv Yp Yr g cos θ
 
 Lv Lp Lr 0 
A= .
 Nv Np Nr 0 
0 1 tan θ 0
Tendo em conta que se pode normalmente fazer a aproximação Yp ≈ 0,
Yv − λ 0 Yr g cos θ
 
 L v L p − λ L r 0 
A − λI =  ,
 Nv Np Nr − λ 0 
0 1 tan θ −λ

168
e a equação característica do sistema completo, no caso de modos laterais, é dada por

det(A − λI) = λ4 + Bλ3 + Cλ2 + Dλ + E = 0, (11.12)

em que os coeficientes do polinómio são definidos por

B = −Lp − Nr − Yv ,
C = −Lr Np + Lp Nr − Nv Yr + Lp Yv + Nr Yv ,
D = −Lv Np Yr + Lp Nv Yr + Lr Np Yv − Lp Nr Yv − gLv cos θ − gNv sin θ,
E = g(Lv Nr cos θ − Lr Nv cos θ − Lv Np sin θ + Lp Nv sin θ).

Com base nestas expressões pode-se encontrar uma aproximação para o modo espiral.

11.2.1 Aproximação para o modo espiral


No modo espiral a raiz real está perto da origem (λS  1). Por isso, na equação
característica podemos desprezar os termos em λ2 , λ3 e λ4 , obtendo

E
Dλ + E = 0 ⇒ λS = − .
D
O coeficiente D pode ser escrito como

D = (−Lv Np + Lp Nv )Yr + (Lr Np − Lp Nr )Yv − g(Lv cos θ + Nv sin θ).

Tendo em conta a definição (11.5) e os valores típicos para uma aeronave, Yr = Yr /m−
u0 ≈ −u0 . Por outro lado, comparando os valores numéricos, |Yv | = |Yv |/m  |Yr | ≈
u0 (usando o exemplo do Cessna 182, Yv = −0.187203/s, Yr = −67.2737 m/s ≈ −u0 =
−67.05m/s). Logo, o termo (Lr Np − Lp Nr )Yv pode ser desprezado em na expressão
de D, obtendo-se

D ≈ (Lv Np − Lp Nv )u0 − g(Lv cos θ + Nv sin θ),

e obter então a raiz aproximada do modo espiral:

g(Lv Nr cos θ0 − Lr Nv cos θ0 − Lv Np sin θ0 + Lp Nv sin θ0 )


λS = − . (11.13)
(Lv Np − Lp Nv )u0 − g(Lv cos θ0 + Nv sin θ0 )

Se o estado estacionário corresponde a um voo horizontal, em que θ0 = 0, e expressão


anterior simplifica-se:
g(Lv Nr − Lr Nv )
λS = − . (11.14)
(Lv Np − Lp Nv )u0 − gLv
Para obter o resultado desta aproximação ao exemplo do Cessna 182, comecemos

169
por usar as definições (8.27)–(8.28) e (11.3)–(11.11), obtendo-se
2
Ix Iz − Izx
Ix0 = = 1284.97 kg m2 ,
Iz
2
Ix Iz − Izx
Iz0 = = 2666.18 kg m2 ,
Ix
0 Izx
Ixz = 2 = 0,
Ix Iz − Izx
Yv
Yv = = −0.187203 s-1 ,
m
Yp
Yp = = −0.196006 m s-1 ,
m
Yr
Yr = − u0 = −67.2737 m s-1 ,
m
Lv
Lv = 0 + Ixz 0
Nv = −0.451115 m-1 s-1 ,
Ix
Lp
Lp = 0 + Ixz 0
Np = −12.978 s-1 ,
Ix
Lr
Lr = 0 + Ixz 0
Nr = 2.1398 s-1 ,
Ix
Nv
Nv 0
= Ixz Lv + 0 = 0.13827 m-1 s-1 ,
Iz
N p
Np 0
= Ixz Lp + 0 = −0.359271 s-1 ,
Iz
Nr
Nr 0
= Ixz Lr + 0 = −1.21092 s-1 .
Iz
A raiz aproximada do modo espiral, que se obtém de (11.14), pode comparar-se
com o valor exacto obtido anteriormente:
λS (exacto) = −0.0177239 s−1 ,
λS (aprox) = −0.0176542 s−1 ,
concluindo-se que, neste caso, esta é uma boa aproximação para o modo espiral. Esta
conclusão pode generalizar-se, porque esta aproximação do modo espiral conduz habi-
tualmente a resultados muito próximos do valor exacto obtido por cálculo dos valores
próprios da matriz total do sistema.
O modo espiral é com frequência instável. Habitualmente isso não causa dificulda-
des no voo, porque este é um modo lento e não é difícil ao piloto efectuar as correcções
necessárias. No entanto, interessa usar os critérios de estabilidade para determinar
condições a verificar caso se pretenda que o modo seja estável. Como se referiu atrás,
uma condição necessária para a estabilidade no caso de uma equação característica de
4ª ordem, como (11.12), é E > 0:
h i
E = g (Lv Nr − Lr Nv ) cos θ + (Lp Nv − Lv Np ) sin θ) > 0
Substituindo na equação acima as expressões para os termos (11.3) a (11.11) e as ex-
pressões para as derivadas de estabilidade obtemos a condição de estabilidade:
(Clβ Cnr − Clr Cnβ ) cos θ0 + (Clp Cnβ − Clβ Cnp ) sin θ0 > 0. (11.15)

170
No caso em que o estado estacionário é um voo horizontal, θ0 = 0 e a condição
simplifica-se:
Clβ Cnr − Clr Cnβ > 0. (11.16)

11.2.2 Aproximação para o modo de rolamento


Modo de rolamento: aproximação 1
No modo de rolamento a principal variável dinâmica é p. É um movimento quase
unidimensional de rolamento em torno de x. Por isso, a aproximação mais simples
consiste em considerar v = 0 = r . A 2ª equação do sistema é então

ṗ = Lp p. (11.17)

Logo, o valor próprio para o modo de rolamento nesta aproximação é


Lp 0
λR = Lp = + Ixy Np . (11.18)
Ix0
Comparando com o valor exacto anteriormente obtido para o exemplo do Cessna 182,
esta aproximação, apesar de muito simples, dá resultados bastante aproximados:

λR (aprox) = −12.9783 s−1 ,


λR (exacto) = −13.018 s−1 .

No entanto, noutras situações e para outras aeronaves os resultados não são tão satis-
fatórios e é necessário recorrer a outras aproximações.

Aproximação para os modo de rolamento e espiral


Nesta aproximação pretende-se encontrar um sistema de 2ª ordem cujas raízes
sejam os valores próprios correspondentes aos modos espiral e rolamento.
Admitiremos que o estado estacionário é um voo horizontal, pelo que θ0 = 0. Para
simplificar a primeira equação lateral faremos a hipótese de que a força lateral to-
tal é apenas devida à derrapagem (mv̇ = Yv v) e que a força lateral devida ao rola-
mento é desprezável (ou seja, desprezamos Yp /m). Logo, a componente lateral do
peso deve ser anulada pela força lateral produzida pela taxa de guinada r . Admitindo
que Yr /m  u0 , a equação

Yv Yp Yr
 
v̇ = v+ p+ − u0 r + g cos θ0 φ
m m m
reduz-se a
−u0 r + g φ = 0. (11.19)
Logo, o sistema de equações é:

0 = −u0 r + g φ



 ṗ = Lv v + Lp p + Lr r



 ṙ = Nv v + Np p + Nr r


φ̇ = p

171
Na forma matricial, escreve-se
  
0 0 0 −u0 g v
 
 ṗ  L Lp Lr 0 p 
   v  .
 ṙ  =  (11.20)
  Nv Np Nr 0  r 
φ̇ 0 1 0 0 φ

A equação característica é

0 0 −u0 g

Lv (Lp − λ) Lr 0

= 0, (11.21)
Nv Np

(Nr − λ) 0
0 1 0 −λ

que se pode escrever como uma equação de 2ª grau,

CSR λ2 + DSR λ + ESR = 0, (11.22)

sendo os coeficientes de (11.22) dados por

CSR = u0 Nv , (11.23)
DSR = u0 (Lv Np − Lp Nv ) − gLv , (11.24)
ESR = g(Lv Nr − Lr Nv ). (11.25)

Comparando os resultados exactos para o exemplo do Cessna 182 com os obtidos


com este modo «rolamento + espiral» e com as aproximações anteriores, temos, para
o modo espiral,

λS (exacto) = −0.0177239 s−1


λS (aprox. S) = −0.0176542 s−1
λS (aprox. S+R) = −0.0181258 s−1

e para o modo de rolamento,

λR (exacto) = −13.018 s−1


λR (aprox. R) = −12.9783 s−1
λR (aprox. S+R) = −14.6094 s−1

Ambas as raízes aproximadas têm valores próximos dos exactos. Em geral esta aproxi-
mação (S+R) dá resultados aceitáveis para ambos os modos e frequentemente constitui
uma melhoria face à aproximação de rolamento mais simples anteriormente apresen-
tada. Neste exemplo esta aproximação não melhora os resultados anteriores.

11.2.3 Modo de rolamento holandês aproximado


Este modo é difícil de aproximar porque todas as variáveis são importantes. No
entanto, tendo em conta que no exemplo do Cessna 182 as variáveis com menor am-
plitude eram p̂ e φ, podemos simplificar as equações admitindo que um movimento

172
Tabela 11.4: Valores próprios, período e N1/2 exactos e aproximados para o modo de
rolamento holandês.
λDR T (s) N1/2 (ciclos)
Valor Exacto −0.670368 ± i3.19323 1.97 0.525
Aproximação −0.699063 ± i3.00234 2.09 0.47

de guinada/derrapagem sem rolamento (movimento «plano»), com p = 0 = φ. Além


disso, admitimos Yr desprezável. As equações do movimento são então

Yv Yp Yr
 
v̇ = v+ p + − u0 r + g cos θ0 φ ,
m m |{z} | m {z |{z}
≈0 ≈0
}
−u0

Lv Lp Lr
     
0 0 0
ṗ = + Izx Nv v + + Izx Np p + + Izx Nr r ,
Ix0 Ix0 Ix0

Nv Np Nr
     
0 0 0
ṙ = Izx Lv + 0 v+ Izx Lp + 0 p + Izx Lr + 0 r,
Iz Iz |{z} Iz
≈0

φ̇ = p + tan θ0 r .

A segunda equação pode ser ignorada pois, com as aproximações anteriores, a primeira
e a terceira equação constituem um sistema fechado:
 Yv
 v̇ = v − u0 r ,


m
Nv Nr
  
 ṙ = Izx0 0
Lv + 0 v + Izx Lr + 0 r .


Iz Iz

Usando (11.3), (11.9) e (11.11), temos

v̇ = Yv v − u0 r ,
(
(11.26)
ṙ = Nv v + Nr r .

A equação característica do sistema aproximado é

λ2 − (Yv + Nr )λ + (Yv Nr + u0 Nv ) = 0. (11.27)

A comparação para o exemplo do Cessna 182 dos valores próprios exactos para
o modo de rolamento holandês com as raízes de (11.27) encontra-se na tabela 11.4.
Constatamos que neste caso esta aproximação é razoável tanto para o período como
para o factor de amortecimento. Note-se, no entanto, que esta aproximação nem sem-
pre dá valores aceitáveis para o factor de amortecimento.

173
Capítulo 12

Resposta à Actuação de Controlo

12.1 Matrizes e vectores de controlo


As equações do movimento para pequenas perturbações têm a mesma forma tanto
para perturbações longitudinais como para perturbações laterais:

ẋ = A · x + B · c.

Aqui x é o vector de estado, A é a matriz do sistema, B é a matriz de controlo e c é o


vector de controlo, diferentes para movimento longitudinal e movimento lateral.
O vector de controlo é dado por c = [∆δe ∆δP ]T para o movimento longitudinal
e c = [∆δa ∆δr ]T para o movimento lateral. A matriz de controlo B não foi ainda
determinada para nenhum dos dois casos.
Para encontrar os elementos da matriz B para um movimento longitudinal parte-se
da definição (8.22):
 ∆Xc 
m
 
 ∆Zc 
 m−Zẇ 
B·c= h ,
 i
 1 ∆Mc + Mẇ ∆Zc 
 Iy m−Zẇ 
0
em que
 ∆XC = Xδe ∆δe + XδP ∆δP ,


∆ZC = Zδe ∆δe + ZδP ∆δP ,

∆MC = Mδe ∆δe + MδP ∆δP .

Como é habitual, supôs-se que a relação entre as variáveis de controlo e as forças e


momentos é linear. Fazendo as substituições necessárias, obtém-se:
X
 
Xδe δP

 m m 

 Zδ e Zδ P "
 ∆δe #
m−Zẇ m−Zẇ
B·c= ,
 

 Mδ e Mδ P Mẇ ZδP  ∆δP
 I +IM ẇ Zδe
+ Iy (m−Zẇ ) 
 y y (m−Zẇ ) Iy 
0 0

174
ou seja, a matriz B para o movimento longitudinal é
X
 
Xδe δP

 m m 

 Zδ e Zδ P 

m−Zẇ m−Zẇ
B= . (12.1)
 
 Mδe MδP Mẇ ZδP 
 I +IM ẇ Zδe
+ Iy (m−Zẇ ) 
 y y (m−Zẇ ) Iy 
0 0

As derivadas de controlo são obtidas a partir das derivadas adimensionais por:

1 1
X δe = ρu20 SCxδe , XδP = ρu20 SCxδP ,
2 2
1 1
Zδe = ρu20 SCzδe , ZδP = ρu20 SCzδP ,
2 2
1 1
Mδe = ρu20 S c̄Cmδe , MδP = ρu20 S c̄CmδP .
2 2
A matriz B para o movimento lateral obtém-se de forma análoga. Da definição do
vector das variáveis de controlo para perturbações laterais (8.32) obtém-se
∆Yc
 
m
 
 ∆Lc 0
 Ix0 + Izx ∆Nc 

B·c=
 .
0
Izx ∆Nc 
 ∆Lc + Iz0 

0

Por outro lado:


 ∆YC = Yδa ∆δa + Yδr ∆δr ,


∆LC = Lδa ∆δa + Lδr ∆δr ,

∆NC = Nδa ∆δa + Nδr ∆δr .

Fazendo as substituições necessárias, obtém-se:


 Yδ a Yδ r 
m m
 "
 Lδa 0 Lδr 0
Nδr  ∆δa
#
 Ix0 + Izx Nδa + Izx

Ix0
B·c=  ,
I Lδ + Nδ0a N  ∆δ
 0 0
 zx a Iz
Izx Lδr + Iδz0 r 
 r

0 0

ou seja, a matriz B para o movimento lateral é


 Yδ a Yδ r 
m m
 
 Lδa 0 Lδr 0
 Ix0 + Izx Nδa + Izx Nδr 

Ix0 ,
B= (12.2)
I Lδ + Nδ0a Nδr 
 0 0
 zx a Iz
Izx Lδr + Iz0 

0 0

175
sendo as derivadas dimensionais de controlo dadas por

Yδ = 1/2 ρu20 SCyδ , (12.3)


Lδ = 1/2 ρu20 SbClδ , (12.4)
Nδ = 1/2 ρu20 SbCnδ , (12.5)

em que δ designa genericamente δa ou δr .

12.2 Resolução de equações diferenciais ordinárias não


homogéneas: método das transformadas de Laplace
12.2.1 Transformadas de Laplace
A Transformada de Laplace L x(t) de uma função x(t) define-se como
Z +∞
x(s) ≡ L x(t) = x(t)est dt.
0

A notação x(s) é muitas vezes usada em vez de L x(t). Se xe−st → 0 quando t → +∞,
mostra-se facilmente que
L ẋ(t) = −x(0) + sx(s).
A transformada de Laplace inversa é dada por
Z γ+iω
1
x(t) = lim est x(s)ds
2π i ω→∞ γ−iω

onde γ é um número real maior que a parte real qualquer dos pólos de x(s). Habi-
tualmente a transformada de Laplace inversa é calculada não pela definição mas por
outros métodos incluindo o método das fracções parciais, a aplicação do teorema da
expansão de Heaviside e o uso de tabelas.
Pelo Teorema da expansão de Heaviside afirma-se que, se x(s) pode ser escrito
como o quociente de dois polinómio na forma

N(s)
x(s) = , (12.6)
D(s)

em que D(s) é um polinómio de grau n e N(s) é um polinómio de grau inferior a n, e


designando por ar (n = 1, . . . , n) as raízes de D(s), de modo que

D(s) = (s − a1 )(s − a2 ) · · · (s − an ),

então a transformada de Laplace inversa de x(s) é


n 
(s − ar )N(s)
X 
x(t) = ear t . (12.7)
r =1
D(s) s=ar

176
12.2.2 Resolução de sistemas de equações diferenciais não homogé-
neas e funções de transferência
Comecemos por considerar uma equação diferencial ordinária não homogénea

ẋ = ax(t) + bc(t), (12.8)

em que a e b são constantes e c(t) é uma função dada. Se a condição inicial é x(0) = 0,
a aplicação da transformada de Laplace conduz a
b
sx(s) = ax(s) + bc(s) ⇒ x(s) = c(s), (12.9)
s−a
e a solução obtém-se por inversão da transformada de Laplace.
Analogamente, se a um sistema de equações

ẋ = A · x(t) + B · c(t)

aplicarmos a transformada de Laplace, obtemos

sx(s) = A · x(s) + B · c(s), (12.10)

e a transformada de Laplace do vector de estado x(t) é dada por

x(s) = (sI − A)−1 · B · c(s).

Logo, obtemos
x(s) = G(s) · c(s), (12.11)
em que a matriz G(s), de elementos Gij (s), é dada por

G(s) = (sI − A)−1 · B. (12.12)

As soluções do sistema são obtidas por inversão da transformada de Laplace:

x(t) = L−1 x(s) = L−1 [G(s) · c(s)]. (12.13)

De (12.11) obtém-se a resposta da i-ésima variável de estado:


X
x i (s) = Gij (s)c j (s).
j

A resposta a uma «soma» de entradas é a soma das respostas individuais a cada uma
das entradas.
Quando dois sistemas estão em série, a entrada do segundo é a resposta do pri-
meiro. Conclui-se portanto que

x 1 = G1 (s)c(s),
x 2 = G2 (s)x 1 (s) = G2 (s)G1 (s)c(s).

Logo, a função de transferência total é o produto das funções de transferência


x 2 (s)
G(s) = = G2 (s)G1 (s).
c(s)
Pode-se generalizar este resultado para um número arbitrário de sistemas em série.

177
Matriz das funções de transferência
A matriz das funções de transferência G é dada por (12.12). Mas

adj(sI − A)
(sI − A)−1 = , (12.14)
det(sI − A)

em que adj(sI − A) é a matriz adjunta de (sI − A), isto é, a transposta da matriz dos
cofactores. Sendo f (s) = det(A − sI) o polinómio característico do sistema e n a sua
dimensão, det(sI − A) = (−1)n f (s). Logo

1
G(s) = adj(sI − A) · B. (12.15)
(−1)n f (s)

Os elementos da matriz das funções de transferência são então dados por

(−1)n [adj(sI − A) · B]ij Nij (s)


Gij (s) = = .
f (s) (s − λ1 )(s − λ2 ) · · · (s − λn )

Aqui, Nij (s) representa um polinómio em s e λ1 , . . . , λn são os valores próprios do sis-


tema. Os valores próprios podem ser reais e nesse caso aparece um termo (s − λk ) no
polinómio característico (o que leva a sistema de 1ª ordem); ou pares de raízes comple-
xas conjugadas (λk , λk+1 ), que conduzem a termos (s−λk )(s−λk+1 ) = (s 2 +ak s+bk ) no
polinómio característico (e portanto o sistema é de 2ª ordem). Os elementos da matriz
das funções de transferência são produtos de termos de 1ª ordem e de 2ª ordem.
Podemos analisar separadamente a resposta de cada um dos subsistemas. Habitu-
almente analisam-se respostas a entradas do tipo impulso e escalão ou a resposta em
frequência.

12.2.3 Resposta a impulso e a escalão


Resposta a impulso
Se a função cj (t) é um impulso, pode ser representada por um delta de Dirac:

cj (t) = δ(t). (12.16)

Mas pode mostrar-se que δ̄(s) = 1. Por isso

x̄i,j (s) = Gij (s)c̄j (s) = Gij (s)δ̄(s) = Gij (s). (12.17)

Designamos por h(t) a resposta a impulso, isto é,

hij (t) = L−1 x̄i,j (s) = L−1 Gij (s).

Mas
Z +∞
1 1
Z
hij (t) = L−1 Gij (s) = Gij (s) est ds = Gij (iω) eiωt dω. (12.18)
2π i C 2π −∞

Se o sistema é estável, os pólos de Gij estão no semi-plano esquerdo e o contorno C


do integral pode ser o eixo imaginário (s = iω), o que justifica a última igualdade.

178
hHtL
1.0

0.8

0.6

0.4

0.2

t
1 2 3 4 T

Figura 12.1: Sistemas de 1ª ordem: resposta a impulso.

Para um sistema de 1ª ordem,


1
G(s) = .
s−λ
Neste caso, o integral pode calcular-se facilmente,
1 +∞ 1
Z
h(t) = eiωt = eλt .
2π −∞ iω − λ
Se o sistema é estável, λ é negativo e, com T = −1/λ,
h(t) = e−t/T . (12.19)
Na figura 12.1 representa-se a função h(t) de (12.19), isto é, a resposta a um im-
pulso unitário de um sistem de 1ª ordem, para 0 < t < 4T . Está também indicado o
valor 1/e, que se atinge para t = T .
Para um sistema de 2ª ordem:
1

se ζ < 1


1  (s − n)2 + ω2

G(s) = 2 =
s + 2ζωn s + ω2n  1
se ζ > 1


(s − n)2 − ω2

p
em que ω = ωn |1 − ζ 2 | e n = −ζωn . A resposta a impulso pode também aqui
calcular-se facilmente, obtendo-se
1 nt
h(t) = e sin(ωt) se ζ < 1, (12.20)
ω
1 nt
h(t) = e sinh(ωt) se ζ > 1. (12.21)
ω
As funções (12.20) e (12.21), que correspondem à resposta a um impulso unitário
de um sistema de 2ª ordem, estão representadas na figura 12.2 para factores de amor-
tecimento ζ = 0.1; 0.3; 0.5; 0.7; 1.2; 2.0. Para ζ < 1 a resposta é oscilatória, enquanto
que para ζ > 1, após um aumento inicial a função tende para 0 sem oscilar.

179
hHtL Ωn

0.8

0.6

0.4

0.2
t Ωn
0.5 1.0 1.5 2.0 2 Π
-0.2

-0.4

-0.6

Figura 12.2: Sistemas de 2ª ordem: resposta a impulso (azul: ζ = 0.1; roxo: ζ = 0.3;
laranja: ζ = 0.5; castanho: ζ = 0.7; preto: ζ = 1.2; vermelho: ζ = 2.0).

Resposta a escalão
Um escalão corresponde à função de entrada cj (t) ser uma função de Heaviside,

cj (t) = H(t).

Tendo em conta a transformada de Laplace da função de Heaviside, obtemos

c j (s) = H(s) = 1/s.

Designando por Aij (t) a resposta a escalão,

Gij (s)
x i,j (s) ≡ Aij (s) = Gij (s)H(s) = .
s

Mas, como hij (t) = L−1 Gij (s) tem-se que hij (s) = Gij (s), donde

hij (s)
Aij (s) = .
s
Logo, pelas propriedades da transformada de Laplace
Zt
Aij (t) = hij (τ)dτ.
0

Note-se que para t ≤ 0, se tem hij (t) = 0 e Aij (t) = 0.


Para um sistema de 1ª ordem, usando (12.19) obtém-se
 
Aij (t) = T 1 − e−t/T . (12.22)

Na figura 12.3 representa-se a função A(t) de (12.22), que corresponde à resposta de


um sistema de 1ª ordem a um escalão unitário.

180
AHtL
T
1.0

0.8

0.6

0.4

0.2

t
1 2 3 4 T

Figura 12.3: Sistemas de 1ª ordem: resposta a escalão

Para um sistema de 2ª ordem, usando (12.20) se ζ < 1 e (12.21) se ζ > 1, obtém-se

1 n
  
nt
Aij (t) = 2 1 − e cos(ωt) − sin(ωt) se ζ < 1, (12.23)
ω ω
1 n − ω (n+ω)t n + ω (n−ω)t
 
Aij (t) = 2 1 + e − e se ζ > 1. (12.24)
ω 2ω 2ω
As funções (12.23) e (12.24), que correspondem à resposta a um escalão unitário de
um sistema de 2ª ordem, estão representadas na figura 12.2 para factores de amorte-
cimento ζ = 0.1; 0.3; 0.5; 0.7; 1.2; 2.0. Para ζ < 1 a resposta é oscilatória, enquanto que
para ζ > 1, a função tende sem oscilar para o valor limite.
O ganho estático K é o valor assimptótico de A quando t → ∞. Pelo teorema do
valor final,
lim A(t) = lim sA(s) = lim G(s), (12.25)
t→+∞ s→0 s→0

concluindo-se que
K = lim G(s). (12.26)
s→0

Resposta em frequência
Neste caso, a entrada é uma função oscilatória. A representação complexa de uma
entrada com frequência ω é

Aj
cj (t) = Aj eiωt ⇒ c j = .
s − iω
A resposta da variável xi será dada por

Aj
x i (s) = Gij (s).
s − iω

181
Ω2 AHtL

1.5

1.0

0.5

t Ωn
0.5 1.0 1.5 2.0 2 Π

Figura 12.4: Sistemas de 2ª ordem: resposta a escalão (azul: ζ = 0.1; roxo: ζ = 0.3;
laranja: ζ = 0.5; castanho: ζ = 0.7; preto: ζ = 1.2; preto: ζ = 2.0).

Pode mostrar-se que a resposta estacionária (para t → ∞) é dada por

xi (t) = Gij (iω) Aj eiωt = Gij (iω)cj (t) = |Gij (iω)|eiϕ cj (t).

Aqui usou-se a forma polar,

Gij (iω) = |Gij (iω)|eiϕ ,

em que |Gij (iω)| é o ganho total e ϕ é a diferença de fase entre a entrada e a resposta
em frequência do sistema.

12.3 Resposta longitudinal


12.3.1 Funções de transferência
Como vimos, a resposta do sistema a uma entrada obtém-se por inversão de (12.11).
Para o movimento longitudinal a matriz das funções de transferência (12.12) pode ser
representada por

Guδe (s) GuδP (s)


 

−1
Gwδe (s) GwδP (s)
G(s) = (sI − A) · B = 
 Gqδe (s)
,
GqδP (s) 
Gθδe (s) GθδP (s)

e portanto
∆u(s)
 
Guδ (s) GuδP (s) 
 
 w(s)  G e (s)

∆δe (s)
 
  wδe GwδP (s) .
x(s) =  =
 
 q(s)   Gqδe (s) GqδP (s) 
∆δP (s)
Gθδe (s) GθδP (s)
 
θ(s)

182
Resposta longitudinal: resposta ao elevator
Como já vimos, devido à linearidade do sistema, resposta a uma «soma» de entradas
é a soma das respostas individuais a cada uma das entradas. Vamos por isso analisar
separadamente a resposta a uma variação da deflexão do leme de profundidade e a
uma variação da força de propulsão.
Começando pela resposta do sistema a uma variação da deflexão do leme de pro-
fundidade, em que ∆δP = 0 e portanto ∆δP = 0,

Guδe (s)
 
∆u(s)
 
  G

 w(s)  ∆δe (s)  wδe (s)
  

 = G(s)
   =
  ∆δe (s). (12.27)
 q(s) 

0 G (s)

   qδe 
 
θ(s) Gθδe (s)

As funções de transferência podem ser representadas genericamente na forma

∆u(s) Nuδe (s)


= Guδe (s) = ,
∆δe (s) f (s)

w(s) Nwδe (s)


= Gwδe (s) = ,
∆δe (s) f (s)

q(s) Nqδe (s)


= Gqδe (s) = ,
∆δe (s) f (s)

θ(s) Nθδe (s)


= Gθδe (s) = ,
∆δe (s) f (s)

em que Nuδe (s), Nwδe (s), Nqδe (s) e Nθδe (s) são polinómios que se obtém em cada caso
mediante a equação (12.27).

Resposta à variação na propulsão


A resposta à variação na propulsão throttle obtém-se fazendo ∆δe = 0:

∆u(s)
 
 
 w(s)  0
 
−1 
 = (sI − A) B . (12.28)
 
 q(s) 

  ∆δP (s)
θ(s)

As funções de transferência obtém-se de forma análoga ao caso anterior.

12.3.2 Resposta longitudinal: exemplo do Cessna 182


Como exemplo, vamos determinar a resposta longitudinal de um Cessna 182 nas
condições de voo já referidas em exemplos anteriores: voo horizontal a 5000 ft com
velocidade u0 = 67m/s. As caracerísticas da aeronave neste voo já foram referidas

183
Tabela 12.1: Derivadas adimensionais
CD CL CT Cm
û 0 0 -0.096 0
α 0.121 4.41 – -0.613
q̂ 0 3.9 – -12.4
ˆ
α̇ 0 1.7 – -7.27
δe 0 0.43 – -1.122

anteriormente. Na tabela 12.1 apresentam-se as derivadas adimensionais, incluíndo as


derivadas de controlo longitudinal.
A partir dos dados fornecidos podemos calcular as derivadas adimensionais se-
gundo os eixos e as respectivas derivadas dimensionais:
1
Cxδe = CTδe − CDδe = 0 ⇒ Xδe = ρu20 SCxδe = 0,
2
1
CZδe = −CLδe = −0.43, ⇒ Zδe = ρu20 SCzδe = −16510.7 N/rad
2
1
Cmδe = −1.122, ⇒ M δe = ρu20 S c̄Cmδe = −64342.9 Nm/rad
2
A matriz do sistema é a mesma que foi calculada anteriormente,
0.0885998 0
 
−0.0457289 −9.81
 
 
 −0.289913
 −2.09701 65.1123 0 

A= ,
 
 0.0109923 −0.207702 −6.80735 0 
 
 
0 0 1 0

e a matriz de controlo é
0 2.943
 
 
−13.6184 0 
B= .
 
−34.7508
 0 

0 0
Para a determinação dos elementos da matriz de controlo admitimos que

XδP = 0.3mg,
ZδP = 0 = MδP .

Note-se que os elementos das matrizes estão calculadas em SI.


A equação característica é

det(sI − A) = 0 ⇒ f (s) = s 4 + 8.950s 3 + 28.232s 2 + 1.490s + 0.8168 = 0,

cujas raízes, já calculadas anteriormente, são

s1,2 = −0.0220954 ± 0.169956i; s3,4 = −4.45295 ± 2.82492i

184
Uma vez que:

(s − s1 )(s − s2 ) = s 2 + 0.04419s + 0.0293734,


(s − s3 )(s − s4 ) = s 2 + 8.9059s + 27.809,

o polinómio característico escreve-se:

f (s) = s 2 + 0.04419s + 0.0293734 s 2 + 8.9059s + 27.809


 
(12.29)

As funções de transferência relativamente a δe são obtidas fazendo δP = 0 e resol-


vendo
∆u(s) Guδe (s)
   
  
 w(s) 
  
∆δe (s) Gwδe (s)
−1
 = (sI − A) · B  =  · ∆δe (s),
   
 q(s) 

0  Gqδe (s) 
 
 
θ(s) Gθδe (s)
ou seja,
 ∆u(s) 
Guδe (s)
 
 ∆δe (s) 
 w(s)  
G

 wδe (s)
 ∆δ (s)  
 e 
 q(s)  = =
 Gqδe (s) 
   
 ∆δe (s)   
 
θ(s)
∆δe (s)
Gθδe (s)
s + 0.0457289 −0.0885998 0 9.81 0
   
   
 0.289913
 s + 2.09701 −65.1123 0 
 −13.6184
 
= · .
 −0.0109923 0.207702 s + 6.80735 0  −34.7508
   
   
0 0 −1 s 0

obtendo-se
∆u(s) Nuδe (s) 687.134 + 132.216s − 1.20659s 2
= Guδe (s) = = 2 , (12.30)
∆δe (s) f (s) (s + 0.04419s + 0.0293734)(s 2 + 8.9059s + 27.809)

w(s) Nwδe (s) −100.301 − 107.71s − 2356.03s 2 − 13.6184s 3


= Gwδe (s) = = 2 , (12.31)
∆δe (s) f (s) (s + 0.04419s + 0.0293734)(s 2 + 8.9059s + 27.809)

q(s) Nqδe (s) s(−4.10893 − 71.6334s − 34.7508s 2 )


= Gqδe (s) = = 2 , (12.32)
∆δe (s) f (s) (s + 0.04419s + 0.0293734)(s 2 + 8.9059s + 27.809)

θ(s) Nθδe (s) −4.10893 − 71.6334s − 34.7508s 2


= Gθδe (s) = = 2 . (12.33)
∆δe (s) f (s) (s + 0.04419s + 0.0293734)(s 2 + 8.9059s + 27.809)

Para se obter a função de transferência do ângulo de ataque, note-se que α = w/u0 ,


pelo que
α(s) 1 w(s) 1
Gαδe (s) = = = Gwδe (s). (12.34)
∆δe (s) u0 ∆δe (s) u0

185
Outras funções de transferência importantes são as do ângulo de subida,

∆γ = ∆θ − ∆α ⇒ Gγδe = Gθδe − Gαδe , (12.35)

e do factor de carga. Este é definido por nz = −Z/W , e a variação do factor de carga


para pequenas perturbações é

∆Z 1  
∆nz = − =− Zu ∆u + Zw w + Zq q + Zẇ ẇ + Zδe ∆δe .
W W
Logo, a função de transferência para o factor de carga é

∆n̄z 1  
Gnδe = =− Zu Guδe + Zw Gwδe + Zq Gqδe + Zẇ Gẇδe + Zδe . (12.36)
∆δ̄e W

As funções de transferência relativas a δP podem ser calculadas de maneira análoga


a partir de (12.28), obtendo-se neste caso
∆u(s) NuδP (s) 81.8126s + 26.2055s 2 + 2.943s 3
= GuδP (s) = = 2 , (12.37)
∆δP (s) f (s) (s + 0.04419s + 0.0293734)(s 2 + 8.9059s + 27.809)

w(s) NwδP (s) −3.70171s − 0.853214s 2


= GwδP (s) = = 2 , (12.38)
∆δP (s) f (s) (s + 0.04419s + 0.0293734)(s 2 + 8.9059s + 27.809)

q(s) NqδP (s) 0.245053s + 0.0323505s 2


= GqδP (s) = = 2 , (12.39)
∆δP (s) f (s) (s + 0.04419s + 0.0293734)(s 2 + 8.9059s + 27.809)

θ(s) NθδP (s) 0.245053 + 0.0323505s


= GθδP (s) = = 2 . (12.40)
∆δP (s) f (s) (s + 0.04419s + 0.0293734)(s 2 + 8.9059s + 27.809)

De igual modo, GαδP (s) = GwδP (s)/u0 e GγδP = GθδP − GαδP .

Resposta a um variação da deflexão do leme de profundidade do tipo escalão


Comecemos por determinar a resposta a uma variação da deflexão do leme de pro-
fundidade do tipo escalão, admitindo que δe aumenta de 1◦ , isto é, que ∆δe = 1◦ =
0.01745 rad.
∆δ 0.01745
Dado que ∆u(s) = Guδe ∆δe (s) e que neste caso ∆δe (s) = s e = s
rad,

687.134 + 132.216s − 1.20659s 2 0.01745 rad


∆u(s) = (12.41)
(s 2 2
+ 0.04419s + 0.0293734)(s + 8.9059s + 27.809) s

Aplicando a transformada inversa a (12.41) obtém-se

∆u(t) = 14.6818 + e−4.45295t [−0.001338 cos(2.82492t) + 0.01744 sin(2.82492t)]


− e−0.0220954t [14.68 cos(0.169956t) + 2.234 sin(0.169956t)], (12.42)

calculado em SI. O primeiro termo oscilatório tem a frequência e amortecimento do


modo de período curto, enquanto que o segundo termo oscilatório tem a frequência e
amortecimento do modo fugóide.
Do mesmo modo se procede para determinar as outras variáveis em função de t.

186
Du HmsL Du HmsL
25 25

20 20

15 15

10 10

5 5

t t
0 1 2 3 4 5 0 50 100 150 200

DΑ HºL DΑ HºL
t t
1 2 3 4 5 50 100 150 200

-0.5 -0.5

-1.0 -1.0

-1.5 -1.5

-2.0 -2.0

-2.5 -2.5

DΓ HºL DΓ HºL
t 5
1 2 3 4 5
-2
t
50 100 150 200
-4
-5
-6

-8 -10

-10
-15

Figura 12.5: Resposta longitudinal a escalão: evolução da velocidade longitudinal, do


ângulo de ataque e do ângulo de subida após uma variação da deflexão do leme de
profundidade de ∆δe = 1◦ para os primeiros 5 s (esquerda) e para os promeiros 200 s
(direita).

187
Na figura 12.5 está representada a evolução da velocidade longitudinal, do ângulo
de ataque e do ângulo de subida após uma variação da deflexão do leme de profun-
didade de ∆δe = 1◦ . Está representada a evolução inicial, para os primeiros 5 s, e a
evolução para os primeiros 200 s. Na evolução inicial verifica-se que só α varia sig-
nificativamente, sendo as oscilações amortecidas rapidamente. Constata-se portanto
que o movimento inicial é dominado pelo modo de período curto. Após os primeiros
segundos subsistem oscilações de u (e de α, com menos amplitude). Estas oscilações
são pouco amortecidas: o movimento é dominado pelo modo fugóide.
O novo estado estacionário atinge-se após um tempo suficientemente grande para
todas as oscilações serem amortecidas. Relativamente ao estado estacionário inicial,
as variações da velocidade longitudinal, do ângulo de ataque e do ângulo de subida
são

lim ∆u = lim s Guδe (s) ∆δe (s) = 14.68m/s


t→+∞ s→0
lim ∆α = lim s Gαδe (s) ∆δe (s) = −1.83o
t→+∞ s→0
lim ∆γ = lim s Gγδe (s) ∆δe (s) = −3.20o
t→+∞ s→0

A variação da deflexão do leme de profundidade resulta, neste exemplo, em vari-


ações significativa de u, de α e do ângulo de subida. A variação tanto da velocidade
longitudinal como do ângulo de ataque são típicos, mas a variação do ângulo de subida
pode ser mais ou menos acentuada, dependendo da aeronave e da situação de voo.

Resposta à actuação do throttle


Para determinar a resposta a uma variação da força de propulsão procede-se de
forma análoga, usando agora as funções de transferência (12.37)–(12.40). Na figura
12.6 representa-se a evolução da velocidade longitudinal, do ângulo de ataque e do ân-
gulo de subida após uma variação da força de propulsão correspondente a ∆δP = 1/6
(incremento na força de propulsão de 0.05W ). Observam-se oscilações de u com valor
médio nulo, com a frequência do modo fugóide e pouco amortecidas, sendo α apro-
ximadamente constante. O ângulo de subida γ oscila e tende para valor estacionário
γ = 2.86º. Verifica-se, pois, que o principal efeito da variação da força de propulsão é
a alteração do ângulo de subida.

Resposta em frequência
Na figura 12.7 apresenta-se a resposta em frequência para os modos longitudinais
do Cessna 182. A resposta nas variáveis ∆u e γ, que definem a trajectória da aeronave,
são dominadas pelo pico nas baixas frequências devido ao modo fugóide — recorde-se
que as frequências naturais para este exemplo do Cessna 182 são ωn = 0.17 rad/s
para o modo fugóide e ωn = 5.27 rad/s. Devido ao fraco amortecimento deste modo o
pico é bem marcado. Pelo contrário, o pico correspondente ao modo de período curto
é pouco pronunciado, quase imperceptível, nas respostas de ∆u e γ. Para frequências
maiores o ganho decresce rapidamente e a resposta torna-se desprezável. A fase ϕuδe
é aproximadamente nula para baixas frequências, decresce rapidamente de cerca de
180º perto da frequência natural do modo fugóide (o que é típico para um modo pouco
amortecido, cuja raiz tem parte real negativa mas pequena) e volta a decrescer, embora
menos, perto da frequência natural do modo de período curto (o que também é típico

188
Du HmsL

t
50 100 150 200

-1

DΑ HºL

0.05

t
50 100 150 200

-0.05

DΓ HºL

t
50 100 150 200

Figura 12.6: Evolução do velocidade longitudinal, do ângulo de ataque e do ângulo de


subida após uma variação tipo escalão da força de propulsão.

189
para modos muito amortecidos, cuja raiz está longe do eixo real). A fase ϕγδe tem
um comportamento semelhante embora para frequências baixas tome valores perto
de −150º.
As respostas das variáveis w e q, relacionadas com a atitude do avião, tomam va-
lores grandes quer para frequências próximas da frequência natural do modo fugóide,
quer para frequências maiores, próximas da frequência natural do modo de período
curto. O comportamento de |Gwδe | para ω entre 0.1 e 0.3 ilustra a situação em que
a função de transferência tem um polo e um zero próximos. A variação da fase, com
uma diminuição abrupta seguida de um crescimento igualmente rápido, é igualmente
típico dessa situação. Para frequências acima da frequência natural do modo de pe-
ríodo curto o ganho diminui rapidamente também neste caso.

12.3.3 Resposta longitudinal: modos aproximados


Pretende-se, para cada um dos modos aproximados (fugóide e de período curto),
resolver as equações do movimento (com controlo) pelo método das transformadas de
Laplace e determinar as funções de transferência.

Modo fugóide
As equações para o modo fugóide aproximado (incluindo termos de controlo) são
Xu Xw Xδe X δP
∆u̇ = ∆u + w + −g∆θ + δe + δP
m m m m
Zu Zw Zδ Zδ
ẇ = ∆u + w + u0 q + e δe + P δP
m m m m
0 = Mu ∆u + Mw w + Mδe δe + MδP δP

∆θ̇ = q
Considerando apenas a variação da deflexão do leme de profundidade, e aplicando a
transformada de Laplace, obtemos, na forma matricial,
  Xu Xw
s∆u 0 −g ∆u
   
Xδe 
m m
      m 
 sw   Zu Zw
 w  
     
Zδe 
 m m
u0 0    
+ m 

=  ∆δe ,
  
0 · q M
 q  
     
  u Mw 0 0  M δe 
  
  
    
s∆θ 0 0 1 0 ∆θ 0

ou, deixando no 2º membro apenas a parte de controlo,


  
s − Xmu − Xmw 0 g ∆u
 
Xδe 
 m 
  
 
 Z u

Z
  w   Zδ 
 − s− m w
−u0 0  e 

m    m 
=  ∆δe (12.43)

  
 q  

M
 
 −Mu
 −Mw 0 0 
   δe 


   
0 0 −1 s ∆θ 0

190
ÈGu ∆e È ju ∆e

150
100 100
50
1 0
-50
0.01 -100
-150
Ω Ω
0.1 1 10 100 0.1 1 10 100

ÈGw ∆e È jw ∆e

100.0
50.0 150

10.0
5.0 100

1.0
50
0.5
Ω Ω
0.1 1 10 100 0.1 1 10 100

ÈGq ∆e È jq ∆e
10.0
5.0 150
100
2.0
50
1.0
0
0.5
-50
0.2
-100
0.1
-150
Ω Ω
0.1 1 10 100 0.1 1 10 100

ÈGΓ ∆e È jΓ ∆e

150
10
100
50
1
0
0.1 -50
-100
0.01
-150
Ω Ω
0.1 1 10 100 0.1 1 10 100

Figura 12.7: Resposta longitudinal em frequência: ganho total |G(iω)| (esquerda) e


fase ϕ (direita) da velocidade longitudinal, da velocidade w segundo z, da velocidade
angular q e do ângulo de subida γ em função da frequência angular ω.

191
Resolvendo este sistema em ordem a ∆u/∆δe , w/∆δe , q/∆δe e ∆θ/∆δe obtemos as
funções de transferência Guδe , Gwδe e Gθδe :
 Xu

X
−1  Xδe 
Guδe (s) s− − mw 0 g
   
∆u/δe m
       m 
 G    Zδ 
  wδe (s)  − Zmu Zw
  
 w/δe s− −u0 0  e

m  m 
x(s) =  = = ·

    
 q/δe   Gqδe (s)  
  
−Mu −Mw 0 0 M δe 
  
    
   
θ/δe Gθδe (s) 0 0 −1 s 0

Começando por Guδe ,


∆u(s) a1 s + a0
= Guδe = , (12.44)
∆δe (s) f (s)
em que os coeficientes são

Xu X δe
 
a1 = u0 Mδe − Mw − gMδe , (12.45)
m m
Zw Zδ
 
a0 = g Mδe − Mw e . (12.46)
m m
O polinómio característico para o modo fugóide aproximado é

f (s) = As 2 + Bs + C, (12.47)

sendo os coeficientes A, B e C dados por

A = −u0 Mw (12.48)
u0
B = gMu + (Xu Mw − Mu Xw ) (12.49)
m
g
C= (Zu Mw − Mu Zw ) (12.50)
m
A função de transferência Gwδe é dada por

w(s) b2 s 2 + b1 s + b0
= Gwδe = , (12.51)
∆δe (s) f (s)

em que os coeficientes são:

b2 = u0 Mδe

b1 = u0 Mu e
m
Zδe Zu
 
b0 = g Mu − Mδe
m m
Finalmente,
θ(s) c2 s 2 + c1 s + c0
= Gθδe = , (12.52)
∆δe (s) f (s)

192
em que os coeficientes são

c2 = M δ e
Xδ Zδ Xu Zw
 
c1 = Mu e + Mw e − Mδe +
m m m m
Xu Z w Xw Zu Zδe Xw Xu Xδe Zu Zw
     
c0 = M δ e − + Mu − Mw + Mw − Mu
m m m m m m m m m m

Modo de período curto aproximado


O sistema de equações para o modo aproximado de período curto (incluindo termos
de controlo) é
   Zw   
ẇ u0 w Zδe 
m m
 = i   +  Mδ e
  ∆δe
Mẇ Zδe
 h i h
1 Mẇ Zw 1 +
q̇ I
Mw + m I
Mq + Mẇ u0 q Iy Iy m
y y

As funções de transferência obtém-se aplicando a transformada de Laplace e usando


os métodos descritos acima.
Notando que q = s∆θ, obtém-se:
as s + a0
Gwδe = , (12.53)
f (s)
b1 s + b0 Gqδe
Gθδe = = , (12.54)
sf (s) s

sendo o polinómio característico

f (s) = s 2 + c1 s + c0

e os coeficientes dados por

Zδe
a1 = , (12.55)
mu0
Mδe Mq Zδe
a0 = u0 − , (12.56)
Iy Iy m
Mδe Mẇ Zδe
b1 = + , (12.57)
Iy Iy m
Zδe Mw Zw Mδe
b0 = − , (12.58)
m Iy m Iy
" #
Zw 1  
c1 =− + Mq + Mẇ u0 , (12.59)
m Iy
1 Zw
 
c0 =− Mw u0 − Mq . (12.60)
Iy m

193
12.4 Resposta lateral
As funções de transferência para o movimento lateral obtêm-se da mesma forma
que para o movimento longitudinal, resolvendo a equação das trasforlsdas de Laplace:
 
v(s) " #
 p(s)  δa (s)
(sI − A) ·  r (s)  = B · .
 
  δr (s)
φ(s)

A matriz das funções da transferência é

Gvδa (s) Gvδr (s)


 
Gpδa (s) Gpδr (s) 
G(s) = (sI − A)−1 · B = 

, (12.61)
 Gr δa (s) Gr δr (s) 
Gφδa (s) Gφδr (s)

e portanto
∆v(s)
 
Gvδ (s) Gvδr (s) 
 
 p(s)   G a (s)

∆δa (s)
 
  pδa Gpδr (s)  .
x(s) =  =
 
 r (s)   Gr δa (s) Gr δr (s) 
∆δr (s)
Gφδa (s) Gφδr (s)
 
φ(s)
A matriz de controlo para o movimento lateral é dada por (12.2).
As funções de transferência podem escrever-se na forma genérica

Nvδa (s) Nr δa (s)


Gvδa = Gr δa =
f (s) f (s)
Nvδr (s) Nr δr (s)
Gvδr = Gr δr =
f (s) f (s)
Npδa (s) Nφδa (s)
Gpδa = Gφδa =
f (s) f (s)
Npδr (s) Nφδr (s)
Gpδr = Gφδr =
f (s) f (s)

em que no numerador está um polinómio em s e em denominador se encontra o poli-


nómio característico do sistema (lateral), f (s).

12.4.1 Exemplo do Cessna 182


Na tabela 12.2 encontram-se as derivadas adimensionais relativas às variáveis de
controlo lateral do Cessna 182 na situação de voo descrita anteriormente. O polinómio
característico é dado neste caso por

f (s) = s 4 + 14.3764s 3 + 28.3543s 2 + 139.089s + 2.45636 (12.62)

194
Tabela 12.2: Derivadas adimensionais relativas às variáveis de controlo lateral do Ces-
sna 182 (em rad-1 )

Cy Cl Cn
δa 0 0.229 -0.0216
δr 0.187 0.0147 -0.0645

A partir de (12.61) podemos determinar os numeradores das funções de tranferência,


obtendo-se

Nvδa = 820.301 + 5515.15s + 214.91s 2 ,


Nvδr = −156.702 + 9164.55s + 769.54s 2 + 5.97581s 3 ,
Npδa = s(610.505 + 97.675s + 75.0855s 2 ),
Npδr = s(−268.978 − 17.7672s + 4.8199s 2 ),
Nr δa = 86.7425 − 15.0761s − 71.9142s 2 − 3.41333s 3 ,
Nr δr = −38.5688 − 12.6251s − 135.096s 2 − 10.1926s 3 ,
Nφδa = 610.505 + 97.675s + 75.0855s 2 ,
Nφδr = −268.978 − 17.7672s + 4.8199s 2 .

Resposta a uma deflexão tipo escalão dos ailerons


δa
Neste caso δa (s) = s
. Pelo teorema do valor final,

lim xi (t) = sGiδa δa (s) = Giδa δa . (12.63)


t→∞

Daqui podemos determinar os valores estacionários para que tendem as variáveis di-
nâmicas laterais após a deflexão dos ailerons de δa = 1◦ :

820.301 + 5515.15s + 214.91s 2


lim v(t) = lim δa = 5.83m/s
t→∞ s→0 s 4 + 14.3764s 3 + 28.3543s 2 + 139.089s + 2.45636
s(610.505 + 97.675s + 75.0855s 2 )
lim p(t) = lim δa = 0
t→∞ s→0 s 4 + 14.3764s 3 + 28.3543s 2 + 139.089s + 2.45636
86.7425 − 15.0761s − 71.9142s 2 − 3.41333s 3
lim r (t) = lim δa = 0.616rad/s
t→∞ s→0 s 4 + 14.3764s 3 + 28.3543s 2 + 139.089s + 2.45636
610.505 + 97.675s + 75.0855s 2
lim φ(t) = lim δa = 4.34rad
t→∞ s→0 s 4 + 14.3764s 3 + 28.3543s 2 + 139.089s + 2.45636
Na figura 12.8 encontra-se a resposta do ângulo de derrapagem, das velocidades
angulares de rolamento e guinda e do ângulo de pranchamento à aplicação de aile-
rons (δa = 1◦ ) nos primeiros segundos (gráficos da esquerda) e a evolução posterior,
nos primeiros 200 s (gráficos da direita). Nos primeiros segundos as variáveis de es-
tado oscilam com um período perto de 2 s, que corresponde ao período do modo de

195
ΒHºL
ΒHºL
5
1.2
4
1.0

0.8 3

0.6 2
0.4
1
0.2

t t
2 4 6 8 10 50 100 150 200

p HradsL p HradsL

0.08 0.08

0.06 0.06

0.04 0.04

0.02 0.02

t t
1 2 3 4 5 50 100 150 200

r HradsL r HradsL
0.05 0.6
0.04 0.5
0.03
0.4
0.02
0.3
0.01
t 0.2
1 2 3 4 5
-0.01 0.1
-0.02 t
50 100 150 200

Φ HºL
Φ HºL
20

200
15

150
10
100
5
50

t
1 2 3 4 5 t
50 100 150 200

Figura 12.8: Resposta à aplicação de ailerons (δa = 1◦ ) nos primeiros segundos (es-
querda) e evolução posterior, nos primeiros 200 s (direita). Estão representadas as
evoluções do ângulo de derrapagem, das velocidades angulares de rolamento e gui-
nada e do ângulo de pranchamento.

196
rolamento holandês. Após os primeiros segundos as oscilações são amortecidas e a
resposta passa a ser dominada pelo modo espiral. A velocidade angular de rolamento
tende para zero e as outras variáveis tendem para valores fixos seguindo uma evolução
aproximadamente exponencial.

Resposta a uma deflexão tipo escalão do rudder


Daqui podemos determinar os valores estacionários para que tendem as variáveis
dinâmicas laterais após a deflexão dos ailerons de δa = 1◦ :
Dado que δr (s) = δsr , e que pelo teorema do valor final,

lim xi (t) = sGiδr δr (s) = Giδr δr , (12.64)


t→∞

os valores dos estados estacionários para que tendem as variáveis de estado após
deflexão do rudder de δr = 1◦ são
156.702 + 9164.55s + 769.54s 2 + 5.97581s 3
lim v(t) = lim δa = −1.11m/s
t→∞ s→0 s 4 + 14.3764s 3 + 28.3543s 2 + 139.089s + 2.45636
s(268.978 − 17.7672s + 4.8199s 2 )
lim p(t) = lim δa = 0
t→∞ s→0 s 4 + 14.3764s 3 + 28.3543s 2 + 139.089s + 2.45636
38.5688 − 12.6251s − 135.096s 2 − 10.1926s 3
lim r (t) = lim δa = −0.274rad/s
t→∞ s→0 s 4 + 14.3764s 3 + 28.3543s 2 + 139.089s + 2.45636
268.978 − 17.7672s + 4.8199s 2
lim φ(t) = lim δa = −1.91rad
t→∞ s→0 s 4 + 14.3764s 3 + 28.3543s 2 + 139.089s + 2.45636
Na figura 12.9 encontra-se a resposta do ângulo de derrapagem, das velocidades
angulares de rolamento e guinda e do ângulo de pranchamento à aplicação do rudder
(δr = 1◦ ) nos primeiros segundos (gráficos da esquerda) e a evolução posterior, nos
primeiros 200 s (gráficos da direita). Também neste caso nos primeiros segundos a
resposta é oscilatória com um período de cerca de 2 s, ou seja, o período do modo de
rolamento holandês. A evolução posterior das variáveis de estado segue uma varia-
ção aproximadamente exponencial negativa; p tende para zero e as outras variáveis
tendem para valores fixos.
Analisando os estados estacionários que se obtém após aplicação de um escalão
quer nos ailerons quer no leme de direcção, podemos concluir que em ambos os casos
limt→∞ p(t) = 0 e que β, r e φ tendem para valores finitos. Para valores «normais»
de δ, esses limites são elevados e por isso a teoria linear só é válida para δ muito
reduzidos. Além disso, para valores elevados de φ há acoplamento entre movimento
lateral e longitudinal. Por estas razões a resposta para t grande não pode ser tratada
convenientemente pela teoria linear.

12.4.2 Funções de transferência para os modos laterais aproximados


Vamos obter as funções de transferência para os modos aproximados espiral +
rolamento e rolamento holandês. Trata-se em ambos os casos de resolver
" #
δa (s)
(sI − A) · x(s) = B
δr (s)

197
ΒHºL
ΒHºL
1.4 1.5
1.2
1.0
1.0
0.8 0.5
0.6
t
0.4 50 100 150 200
0.2 -0.5
t
2 4 6 8 10

p HradsL p HradsL

t t
1 2 3 4 5 50 100 150 200
-0.01 -0.01

-0.02 -0.02

-0.03 -0.03

-0.04 -0.04

-0.05 -0.05

r HradsL r HradsL

t
0.01 50 100 150 200
-0.05
t
1 2 3 4 5
-0.10
-0.01
-0.15
-0.02
-0.20
-0.03
-0.25
-0.04

Φ HºL Φ HºL
t t
1 2 3 4 5 50 100 150 200
-20
-2
-40
-4
-60

-6 -80

-8 -100

Figura 12.9: Resposta à aplicação do leme de direcção (δr = 1◦ ) nos primeiros segundos
(esquerda) e evolução posterior, nos primeiros 200 s (direita). Estão representadas as
evoluções do ângulo de derrapagem, das velocidades angulares de rolamento e guinada
e do ângulo de pranchamento.

198
para as aproximações espiral+rolamento e rolamento holandês.
Usar-se-ão as abreviaturas

Yδ = (12.65)
m
Lδ 0
Lδ = 0 + Izx Nδ (12.66)
Ix
0 Nδ
Nδ = Izx Lδ + 0 (12.67)
Iz
em que δ = δa ou δr , conforme o caso.

Aproximação espiral/rolamento
Incluíndo os termos de controlo na equação (11.20) e aplicando a transformada de
Laplace, obtemos
  
0 0 u0 −g v(s) Yδ Yδr "
 
 −Lv (s − Lp )  p(s)   L a #
 −L r 0 

= a
 δ  δa (s)
Lδr 
(12.68)
−Nv −Np (s − Nr ) 0   r (s)  Nδa Nδr  δr (s)
0 −1 0 0 φ(s) 0 0
O polinómio característico é
f (s) = CSR s 2 + DSR s + ESR
em que as constantes CSR , DSR e ESR são dadas por
C = u0 Nv ,
D = u0 (Lv Np − Lp Nv ) − gLv ,
E = g(Lv Nr − Lr Nv ).
As funções de transferência são obtidas a partir de (12.68), resultando
Gvδ = Nvδ /f (s), Nvδ = a3 s 3 + a2 s s + a1 s + a0 ,
Gφδ = Nφδ /f (s), Nφδ = b1 s + b0 ,
Gr δ = Nr δ /f (s), N r δ = d2 s 2 + d1 s + d0 ,
Gpδ = Npδ /f (s), Npδ = s Nφδ ,
com os coeficientes das equações anteriores dados por
a0 = g(Lr Nδ − Lδ Nr ),
a1 = Yδ (Lp Nr − Lr Np ) − u0 (Lδ Np − Lp Nδ ) + Lδ g,
a2 = −Yδ (Lp + Nr ) − u0 Nδ ,
a3 = Yδ

b0 = u0 (Lδ Nv − Lv Nδ ) + Yδ (Lv Nr − Lr Nv ),
b1 = Yδ Lv

d0 = g(Lδ Nv − Lv Nδ ),
d1 = Yδ (Lv Np − Lp Nv ),
d2 = Yδ Nv .

199
Aproximação de rolamento holandês
O sistema de equações para o modo aproximado de rolamento holandês é, incluindo
os termos de controlo,
" #
(s − Yv ) u0 v(s) 0 Y δr δa (s)
   
= , (12.69)
−Nv (s − Nr ) r (s) Nδa Nδr δr (s)

O polinómio característico é

f (s) = s 2 − (Yv + Nr ) s + (Yv Nr + u0 Nv )

e as funções de transferência são

Gvδa = Nvδa /f (s), Nvδa = −u0 Nδa ,


Gr δa = Nr δa /f (s), Nr δa = Nδa s − Yv Nδa ,
Gvδr = Nvδr /f (s), Nvδr = Yδr s − (Yδr Nr + u0 Nδr ),
Gr δr = Nr δr /f (s), Nr δr = Nδr s − (Nδr Yv − Yδr Nv ).

12.5 Resposta transiente a ailerons e rudder


Os estados estacionários laterais são pouco frequentes. Por outro lado, é impor-
tante estudar a resposta transiente, que aparece em manobras, etc.
Começaremos por estudar resposta a escalão (ailerons ou rudder) imediatamente
após a sua aplicação, isto é, para t = 0+ .

12.5.1 Resposta Inicial


Em t = 0, todas as variáveis laterais são nulas. Logo, as equações do movimento
são apenas
 v̇ = Yδr δr


ṗ = Lδa δa + Lδr δr (12.70)

ṙ = Nδa δa + Nδr δr

Daqui pode concluir-se que a taxa de derrapagem inicial só depende da deflexão do


leme de direcção, sendo v̇ > 0 se δr > 0.
˙
~ = ṗ i~ + ṙ k.
A aceleração angular inicial, t = 0+ , é ω ~ Como em t = 0, ω
~ = 0, a
direcção de ω˙
~ define a direcção inicial do eixo de rotação da aeronave. O ângulo do
eixo de rotação inicial com eixo x é

ξ = tan−1 (12.71)

Admitirmos como válida a simplificação Lδr = 0 = Nδa (isto é, os ailerons produ-
zem um movimento de rolamento puro e o rudder um movimento de guinada puro).
Partindo de (12.70) e tendo em conta as definições (12.65), (12.66) e (12.67), obtém-se,
no caso de resposta a rudder (δa = 0):
r ṙ Nδr Nδ /I 0 1 Ix
tan ξR = = = = 0 r z = 0 = , (12.72)
p ṗ Lδ r Izx Nδr Iz 0Izx Izx

200
e no caso de resposta a aileron (δr = 0):
Izx
tan ξA = . (12.73)
Iz
A resposta para eixos principais de inércia, isto é, quando Izx = 0, é, como seria de
esperar,
Ix
Rudder: tan ξR = = ∞ ⇒ ξR = 90o
Izx
Izx
Ailerons: tan ξA = = 0 ⇒ ξA = 0
Iz
Se os eixos de estabilidade do avião forem diferentes dos eixos principais de inércia,
a rotação faz-se em torno de um eixo que depende do ângulo  entre os dois sistemas.
Os valores de IxS , IzS e IzS xS são dados por
IxS = IxP cos2  + IzP sin2 
IzS = IxP sin2  + IzP cos2 
1
IxS zS = (IzP − IxP ) sin 2
2
Como exemplo, admita-se que IxP /IzP = 0.4 (caso de jacto de transporte) e  = 20o
(ângulo de ataque elevado). Com estes dados podemos calcular ξA e ξR . Na figura
12.10 estão representados estes ângulos. O gráfico da figura 12.11 representa ξA e
ξR em função do ângulo . Dos gráficos podemos concluir que após deflexão dos
ailerons a aeronave passa a ter movimento de rolamento em torno de um eixo entre
o eixo principal xP e x (tendência a rolar em torno do eixo principal de inércia); após
deflexão do rudder a aeronave passa a ter movimento de guinada em torno de eixo
diferente de zP e z (e mais afastado de zP ).

12.5.2 Soluções para Valores Elevados dos Ângulos


A análise anterior referiu-se à resposta para t = 0+ , isto é, imediatamente após a
deflexão dos ailerons ou rudder. Para saber o que acontece em instantes posteriores é
necessário resolver as equações exactas, não-lineares, o que se afigura difícil em geral.
Existe uma abordagem que estabelece um compromisso razoável entre a exactidão das
soluções encontradas e a dificuldade para as obter. Consiste em usar uma representa-
ção linear para as forças de inércia e aerodinâmicas, na hipótese de que as variações
das velocidades e velocidades angulares são pequenas, e em usar uma descrição exacta
para as forças gravíticas, uma vez que os ângulos de pranchamento, picada e guinada
podem ser grandes.
As equações do movimento são agora, para as variáveis longitudinais,
∆X
u̇ = − g sin θ
m
∆Z
ẇ = − g(1 − cos θ cos φ) + u0 q
m
∆M
q̇ =
Iy
θ̇ = q cos φ

201
Figura 12.10: Resposta inicial...

Figura 12.11: ângulos ξA e ξR em função do ângulo  entre os eixos do corpo e os eixos


principais de inércia.

202
e para as variáveis laterais,

∆Y
v̇ = + g cos θ sin φ − u0 r
m
∆L 0
ṗ = 0 + Izx ∆N
Ix
∆N 0
ṙ = 0 + Izx ∆L
Iz
θ̇ = p + (q sin φ + r cos φ) tan θ
ψ̇ = (q sin φ + r cos φ) sec θ

Estas equações podem ser resolvidas numericamente (usando, por exemplo, um mé-
todo Runge-Kutta).
Nas figuras 12.12 apresentam-se os resultados da integração numérica das equa-
ções para uma deflexão dos ailerons de -15º para um Boeing 747 em voo de cruzeiro a
40000 ft com Ma = 0.8.
Observa-se que a velocidade angular de rolamento p aumenta rapidamente e em
consequência, o ângulo de pranchamento φ aumenta (e quase linearmente com o
tempo). O ângulo de derrapagem β, a velocidade ãngular de guinada r e o ângulo
de guinada ψ permanecem pequenos. O aumento de φ leva a uma diminuição da com-
ponente vertical de L e por isso a um ângulo de picada θ negativo e a um aumento de
∆u. Note-se que ao fim de 30 s ∆u ≈ 0.1u0 o que implica que a aproximação linear
começa a não ser válida. Por outro lado p = 0.05rad/s ⇒ p̂ = 0.01, pelo que se justifica
ter desprezado as forças aerodinâmicas e inerciais não-lineares.

203
Figura 12.12: Evolução das componentes da velocidade (em cima), da velocidade angu-
lar (a meio) e dos ângulos de rolamento, picada e guinada (em baixo).

204
Capítulo 13

Qualidades de Voo

Qualidades de voo são as características de estabilidade e de controlo importantes


para a impressão que o piloto forma da aeronave. Os factores que influenciam essa
impressão são a dinâmica longitudinal e lateral do avião, a força de controlo necessária
e os gradientes da força de controlo. As qualidades de voo esperadas pelo piloto
dependem do tipo de aeronave e da fase de voo em que se encontra.
Para que um avião tenha boas qualidades de voo é necessário não só que as forças
máximas que é necessário aplicar para controlar o avião tenham valores aceitáveis,
mas também que as forças a aplicar durante a maior parte do voo sejam nulas.

13.1 Classificação de aeronaves e fases de voo


A impressão que um piloto forma de uma aeronave depende muito do tipo de ae-
ronave: é muito diferente pilotar um jacto militar, um avião de linha aérea ou uma
avionete de recreio. Por isso é necessário calssificar as aeronaves em classes de acordo
com as suas características. A tabela 13.1 mostra a classificação habitualmente usada.
As classes de aeronaves dependem da dimensão e peso da aeronave, mas também da
manobrabilidade esperada durante os voos típicos a efectuar.
A fase de voo em que o avião se encontra é também muito importante para definição
das qualidades de voo. É classificada em três categorias, descritas na tabela 13.2.
Durante a maior parte do tempo de voo as aeronaves permanece na fase de voo de
categoria B e por isso esta categoria é particularmente importante no que diz respeito
às qualidades de voo. Nas outras fases de voo é esperada uma maior intervenção
do piloto e por isso as características esperadas podem degradar-se um pouco sem
prejuízo das qualidades de voo.

13.2 Níveis de qualidades de voo


13.2.1 Escala de Cooper Harper e níveis de qualidades de voo
Como se afirmou anteriormente, as qualidades de voo são aquelas características de
estabilidade e controlo importantes para a impressão que o piloto forma da aeronave.
Esta impressão é evidentemente subjectiva. A escala de Cooper-Harper, apresentada

205
Tabela 13.1: Classes of aircraft (source: [4])
Class I Small, light airplanes (such as light utility, primary trainer, and
light observation craft)
Class II Medium-weight, low-to-medium maneuverability airplanes (such
as heavy utility / search and rescue, light or medium transport
/ cargo / tanker, reconnaissance, tactical bomber, heavy attack
and trainer for Class II)
Class III Large, heavy, low-to-medium maneuverability airplanes (such as
heavy transport / cargo / tanker, heavy bomber, and trainer for
Class III)
Class IV Heavy maneuverability airplanes (such as fighter/interceptor, at-
tack, tactical reconnaissance, observation and trainer for Class
IV)

Tabela 13.2: Flight phase categories


Category A Nonterminal flight phases that require rapid maneuvering, pre-
cision tracking or precise flight path control, such as air-to-air
combat, in-flight refueling (receiver) , terrain-following, and close
formation flying (applies only to military aircraft).
Category B Nonterminal flight phases that are normally accomplished using
gradual maneuvers and no precision tracking, although accurate
flight path control may be required. Includes climb, cruise, loiter,
descent, in-flight refueling (for tanker) and aerial delivery.
Category C Terminal flight phases requiring gradual maneuvers but precise
flight path control. Include takeoff, catapult takeoff, approach,
wave-off/go-around, and landing.

206
Handling Qualities Rating Scale
Aircraft Pilot
Adequacy for Selected Demands on the Pilot in Selected
Characteristics Rating
Task or Required Operation* Task or Required Operation*

Excellent, highly Pilot compensation not a factor for desired


performance
1
desireable

Good, negligible Pilot compensation not a factor for desired


2
deficiencies performance

Fair - Some mildly Minimal pilot compensation required for desired


3
unpleasant deficiencies performance

Yes
Minor but annoying Desired performance requires moderate pilot
4
deficiencies compensation
Is it satisfactory No Deficiencies Moderately objectionable Adequate performance requires considerable
without warrant 5
improvement?
deficiencies pilot compensation
improvement.
Very objectionable but Adequate performance requires extensive pilot
6
tolerable deficiencies compensation
Yes
Adequate performance not attainable with
Major deficiencies maximum tolerable pilot compensation 7
Is adequate Controllability not in question
No
performance Deficiencies Considerable pilot compensation is required for
attainable with a require Major deficiencies 8
control
tolerable pilot improvement.
workload? Intense pilot compensation is required to retain
Major deficiencies 9
control
Yes

No
Is it Improvement Control will be lost during some portion of the
controllable?
Major deficiencies 10
Mandatory required operation

* Definition of required operation involves designation of flight phase


Pilot Decisions
and/or subphases with accompanying conditions.

Figura 13.1: Escala de Cooper-Harper. Fonte: Wikipedia, https://en.wikipedia.


org/wiki/Cooper-Harper_rating_scale.

na figura 13.1, permite quantificar essa impressão subjectiva. A partir das respostas
dos pilotos as aeronaves são classificadas de 1 (melhor) a 10 (pior).
As qualidades de voo são habitualmente definidas em termos dos três níveis apre-
sentados na tabela 13.3. A escala de Cooper-Harper pode relacionar-se com os níveis
de qualidades de voo de acordo com o apresentado na tabela 13.4.
Os níveis de qualidade de voo e a escala de Cooper-Harper são estabelecidos através
das impressões e opiniões dos pilotos. A relação entre estes níveis de qualidades de
voo e parâmetros de controlo e estabilidade objectivos e mensuráveis é difícil e muitas
vezes vaga, sendo difícil estabelecer critérios muito estritos relativamente aos valores
que os parâmetros podem tomar. No entanto, apresentar-se-ão em seguida os valores
que são habitualmente seguidos para relacionar os níveis de qualidades de voo e a
frequência natural e o factor de amortecimento dos modos.

13.2.2 Qualidades de voo longitudinais


Na tabela 13.5 indicam-se os limites para o factor de amortecimento corresponden-
tes a cada nível de qualidades de voo. Note-se que para uma aeronave ser de nível 2,
basta o modo fugóide ser estável, e para ser de nível 3 o modo fugóide pode até ser
inastável, bastando que t2 seja suficientemente elevado para que o avião seja contro-
lável.

207
Tabela 13.3: Flying qualities levels
Level 1 Flying qualities clearly adequate for the mission flight phase
Level 2 Flying qualities adequate to accomplish the mission flight phase but
with some increase in pilot workload and/or degradation in mission
effectiveness
Level 3 Flying qualities such that the airplane can be controlled safely but pi-
lot workload is excessive and/or mission effectiveness is inadequate.

Tabela 13.4: Relação entre os níveis de qualidades de voo e a escala de Cooper-Harper


Level 1 Cooper-Harper scale = 1–3.5
Level 2 Cooper-Harper scale = 3.5–6.5
Level 3 Cooper-Harper scale = 6.5–9+

Os valores limite para o factor de amortecimento do modo de período curto para


cada nível de qualidades de voo estão indicados na tabela 13.6. Neste caso, para os
níveis 1 e 2 existe um valor máximo e um valor mínimo para o factor de amortecimento.

13.2.3 Qualidades de voo laterais


Para descrever as qualidades de voo do modo de rolamento convém definir a cons-
tante do modo como τ = −1/λ. A dependência temporal do modo é então e−t/τ :
quanto menor o valor de τ, mais amortecido é o modo e mais rapidamente decresce a
perturbação.
Na tabela 13.7 apresentam-se as qualidades de voo do modo de rolamento em ter-
mos da constante de tempo τ.
Relativamente ao modo de rolamento holandês as qualidades de voo estão repre-
sentadas na tabela 13.8. Neste caso interessam não só os valores do factor de amorte-
cimento e da frequência natural, mas também o produto ζωn .

13.3 Aplicação dos critérios a um Cessna 182


Como exemplo, vamos aplicar estes critérios ao Cessna 182, na situação de voo já
descrita anteriormente.

Tabela 13.5: Limites para as qualidades de voo para o modo fugóide


Nível 1 ζ > 0.04
Nível 2 ζ>0
Nível 3 t2 > 55 s

208
Tabela 13.6: Limites para o factor de amortecimento do modo de período curto
Categorias A e C Categoria B
Níveis Mínimo Máximo Mínimo Máximo
1 0.35 1.30 0.30 2.00
2 0.25 2.00 0.20 2.00
3 0.15 — 0.15 —

Tabela 13.7: Valor máximo da constante para o modo de rolamento


Level
Categoria da fase de voo Classe 1 2 3
A I, IV 1.0 1.4
II, III 1.4 3.0
B Todas 1.4 3.0 10
C I, II-C, IV 1.0 1.4
II-L, III 1.4 3.0

Tabela 13.8: Valores mínimos da frequência natural e do factor de amortecimento para


o modo de rolamento holandês
Níveis Fase de Voo Classe Min ζ Min ζωn Min ωn
1 A I, IV 0.19 0.35 1.0
II, III 0.19 0.35 0.4
B Todas 0.08 0.15 0.4
C I, II-C
IV 0.08 0.15 1.0
II-L, III 0.08 0.15 0.4
2 Todas Todas 0.02 0.05 0.4
3 Todas Todas 0.02 — 0.4
(Nota: ωn em rad s-1 )

Tabela 13.9: Valor mínimo para o tempo para a amplitude aumentar para o dobro (t2 )
para o modo espiral
Classe Fase de Voo Nível 1 (s) Nível 2 (s) Nível 3 (s)
I e IV A 12 12 4
BeC 20 12 4
II e III Todas 20 12 4

209
Tabela 13.10: Valores calculados para o Cessna 182 para os modos longitudinais
Modo T (s) t1/2 (s) N1/2 ωn (rad/s) ζ
Fugóide 37.0 31.4 0.85 0.171 0.128
Período Curto 2.22 0.156 0.070 5.268 0.845

Tabela 13.11: Valores calculados para o Cessna 182 para os modos laterais
Modo Período (s) t1/2 (s) N1/2 ωn (rad/s) ζ −1/λ (s)
Espiral — 39.1 — 56.4
Rolamento — 0.053 — 0.0768
Rolamento holandês 1.967 1.03 0.525 3.26 0.205

Classe da aeronave: o Cessna 182 é uma aeronave ligeira, pelo que é de classe I,
como se pode constatar consultando a tabela 13.1.
O avião encontra-se em voo de cruzeiro, pelo que a fase de voo é de categoria B (cfr.
tabela 13.2).

13.3.1 Modos longitudinais


Na tabela 13.10 resumem-se os resultados obtidos para o período, t1/2 , N1/2 , a
frequência natural e o factor de amortecimento para os modos longitudinais do Cessna
182. Começando pelo modo fugóide, como ζ = 0.128 > 0.04, a aeronave é de Nível
1. Para o modo de período curto, como ζ = 0.845, valor que está entre 0.30 e 2.00,
a aeronave é também de Nível 1. Conclui-se portanto que nesta situação de voo a
aeronave é de Nível 1 para ambos os modos.

13.3.2 Modos laterais


Na tabela 13.11 apresentam-se os valores de t1/2 e da constante τ = −1/λ para os
modos espiral e de rolamento, bem como do período, de t1/2 , de N1/2 , da frequência
natural e do factor de amortecimento para o modo de rolamento holandês.
Verifica-se que τ = −1/λ = 0.0768 < 1.0 para o modo de rolamento, concluindo-se
da tabela 13.7 que também para este modo, nesta situação de voo, o Cessna 182 é de
Nível 1. Relativamente ao modo espiral, verifica-se que o modo é estável e por isso é
de Nível 1 (os valores da tabela 13.9 referem-se ao tempo para a amplitude aumentar
para o dobro, ou seja, admitindo que o modo é instável).
Finalmente, para o modo de rolamento holandês, da tabela 13.11 tira-se que ωn =
3.26rad/s > 0.4rad/s e ζ = 0.205 > 0.08. Por outro lado, ζωn = 0.670 > 0.15.
Comparando com os valores da tabela 13.8, conclui-se que a aeronave é de Nível 1
também para o modo de rolamento holandês, nesta situação de voo.

210
Apêndice A

Equilíbrio e estabilidade para


configurações canard

Neste capítulo pretende-se estudar o equilíbrio e a estabilidade de configurações


canard.

A.1 Características das configurações canard


Dá-se o nome de configurações canard àquelas em que o estabilizador é montado
à frente da asa e é usual referirmo-nos ao estabilizador dessas configurações como
canard.
Desde o início da aviação foram usadas configurações canard (figura A.1) como
forma de estabilizar o vôo. No entanto, a escolha desta configuração deveu-se princi-
palmente por razões de segurança: o piloto estava mais longe do início do avião e no
caso de queda o canard amortecê-la-ia.
Actualmente as configurações canard são usadas para garantir a estabilidade da
aeronave e para controlo longitudinal (de picada). O canard pode também ser usado
para gerar sustentação, embora este fim seja secundário face aos outros.

Figura A.1: Os primeiros aviões tinham uma configuração canard: Flyer, dos irmãos
Wright (Kitty Hawk, 1903), à esquerda; e 14-Bis, de Santos Dumont (Paris, 1906), á
direita.

211
O canard pode ser fixo (não usado para controlo, apenas para estabilidade), fixo
mas com elevators que permitem controlo longitudinal (esta configuração é semelhante
ao de estabilizador na cauda + leme de profundidade) ou ser totalmente móvel, sendo
neste caso o controlo longitudinal efectuado por deflexão de todo o canard (é uma
configuração semelhante a stabilator).
As vantagens das configurações canard face às configurações convencionais in-
cluem uma maior manobrabilidade, maior dificuldade do avião entrar em perda e
maiores valores de CLmax (sem flaps). Por outro lado, as configurações canard apre-
sentam também algumas desvantagens, como uma maior distância entre os centros de
massa do combustível e da aeronave, o que pode levar a maiores variações do centro
de massa em voo, e uma diminuição de visibilidade. Além disso a aerodinâmica de
uma configuração canard é mais complicada que a de uma configuração convencional
e o dimensionamento do canard é crítico: é fácil fazer mau projecto.

A.2 Equilíbrio e estabilidade


iremos estudar uma configuração em que o canard é a única superfície estabili-
zadora e a única superfície para controlo longitudinal. Supomos também um canard
móvel, sem elevator.
Usaremos a seguinte notação:

• ic : ângulo de incidência do canard, é variável;


• ic positivo se Lc > 0;
• hc̄: posição do CM, medida a partir do bordo de ataque da asa;
• hc̄ pode ser negativo se estiver à frente do bordo de ataque da asa;

• hnwb c̄: posição do CA da asa;


• lc : distância entre CA do canard e CM;
• l̄c : distância entre CA do canard e CA da asa.

A.2.1 Sustentação e momento de picada


A interacção aerodinâmica entre canard e asa é complexa. O canard está na zona
de upwash da asa, a asa está na zona de downwash do canard e o vórtice do bordo
marginal do canard tem efeito de upwash na asa. O efeito global destas interações nos
ângulos de ataque efectivos é que αwb < αc . Modelamos este efeito por meio de um
ângulo de upwash ε no canard.
Da figura A.2 podemos determinar a relação entre os ângulos de ataque do canard
e da asa, o ângulo de upwash ε e o ângulo de incidência do canard,

αc = αwb + ε + ic . (A.1)

Vamos admitir que o ângulo de upwash varia linearmente com αwb ,

ε = ε0 + εα αwb , (A.2)

212
Figura A.2: Relação entre ângulos de ataque da asa e do canard e distâncias entre o
centro aerodinâmico do canard e o centro aerodinâmico da asa (lc ) e o centro de massa
(l̄c ).

e a relação entre αc e αwb é

αc = αwb (1 + εα ) + (ε0 + ic ). (A.3)

A figura A.2 permite ainda relacionar as distâncias entre o centro aerodinâmico do


canard e o centro aerodinâmico da asa (lc ) e entre o centro aerodinâmico do canard e
o centro de massa (l̄c ). Note-se que h pode ser negativo se o centro de massa estiver à
frente da asa.

lc Sc l̄c Sc Sc
lc = l̄c + (h − hnwb )c̄ ⇒ = + (h − hnwb ) . (A.4)
c̄S c̄S S
Analogamente ao que fizemos para configurações convencionais, podemos definir as
razões de volume do canard como
lc Sc
Vc = , (A.5)
c̄S
l̄c Sc
V̄c = , (A.6)
c̄S
e de (A.4) a relação entre elas é

Sc
Vc = V̄c + (h − hnwb ) . (A.7)
S
A velocidade do escoamento incidente no canard V 0 e na asa V diferem tanto na
direcção (pelo ângulo de upwash) como no módulo. No entanto, o módulo das duas
velocidades é habitualmente muito semelhante, pelo que admitiremos que V 0 ≈ V .
A sustentação do canard é então adimensionalizada pela pressão dinâmica da asa
e pela área do canard. No caso do momento de picada usamos ainda a corda média do
canard, c̄c .
Lc
CLc = 1 , (A.8)
2
ρV 2 Sc
Macc
Cmacc = 1 . (A.9)
2
ρV 2 Sc c̄c

213
Figura A.3: Forças e momentos aerodinâmicos aplicados na asa e no canard.

Na figura A.3 representam-se as forças e momentos aerodinâmicos aplicados na asa


e no canard. Admitindo que os ângulos de ataque e o ãngulo de incidência do canard
são pequenos, a sustentação total é dada por

L = Lwb + Lc (A.10)

e o respectivo coeficiente de sustentação é


L Sc
CL = 1 = CLwb + CLc (A.11)
2
ρV 2 S S

Na zona de linearidade entre o coeficiente de sustentação e o ângulo de ataque,

CLwb = awb αwb , (A.12)


CLc = ac αc = ac αwb (1 + εα ) + ac (ε0 + ic ). (A.13)

Logo:
Sc Sc
 
CL = awb + ac (1 + εα ) αwb + ac (ε0 + ic ). (A.14)
S S
Esta relação pode ser escrita de forma mais simplificada como
Sc
CL = a αwb + ac (ε0 + ic ), (A.15)
S
em que
Sc
a = awb + ac(1 + εα ). (A.16)
S
Para o momento de picada, a figuraA.3 permite escrever

M = Macc + lc Lc + Macwb + (h − hnwb )c̄Lwb (A.17)

A adimensionalização do momento de picada total relativamente ao centro de massa é


M
Cm = 1 ,
2
ρV 2 S c̄

pelo que
Sc cc lc Sc
Cm = Cmacc + CLc + Cmacwb + (h − hnwb )CLwb . (A.18)
S c̄ c̄S

214
O canard pode ter uma contribuição para a sustentação e por isso o seu perfil pode
ter curvatura positiva, sendo Cmacc ≠ 0, pelo que mantemos este termo. Usando (A.7)
obtém-se
Cm = Cmac + V̄c CLc + (h − hnwb )CL , (A.19)
com
S c cc
 
Cmac = Cmacc + Cmacwb . (A.20)
S c̄
Finalmente, usando (A.15), (A.12) e (A.13), obtém-se:

Cm = Cm0 + Cmα αwb , (A.21)

em que

Sc
 
Cm0 = Cmac + ac (ε0 + ic ) (h − hnwb ) + V̄c (A.22)
S
= Cmac + ac (ε0 + ic )Vc (A.23)

Cmα = a(h − hnwb ) + V̄c ac (1 + εα ) (A.24)

A.2.2 Ponto neutro


Por definição, no ponto neutro Cmα = 0, e (A.24) mostra que a sua posição, hn , é
dada por
ac
hn = hnwb − V̄c (1 + εα ). (A.25)
a
A equação (A.24) permite ainda escrever

Cmα = a(h − hn ) = −a Kn , (A.26)

em que a margem estática Kn = hn − h é definida da forma habitual.

A.3 Condições de equilíbrio


As expressões deduzidas são válidas tanto para canards fixos como para canards
com ângulo de incidência variável. No caso de canard móvel, controlo longitudinal é
realizado fazendo variar ic . No caso de um canard com ângulo de incidência fixo e com
leme de profundidade, é necessário acrescentar o termo de controlo correspondente.

A.3.1 Canard móvel


A sustentação total é dada por (A.15). Supondo ε0 = 0, temos:

CL = CLα αwb + CLic ic (A.27)

com: 
 CLα ≡ a

∂CL Sc (A.28)
 CLic ≡
 = ac
∂ic S

215
Das equações (A.21), (A.23), (A.22) e (A.24), com ε0 = 0, o momento de picada é

Cm = Cmac + Cmα αwb + Cmic ic (A.29)

em que 
 Cmα = a(h − hn )

Sc (A.30)
 
 Cmic = ac Vc = ac
 (h − hnwb ) + V̄c
S
As equações de equilíbrio são
(
CL = CLtrim
Cm = 0

Logo:
CL = CLα αwb + CLic ic = CLtrim
(
(A.31)
Cm = Cmac + Cmα αwb + Cmic ic = 0
As soluções de (A.31) determinam os valores de αwb e ic de equilíbrio:

 CLtrim Cmic + Cmac CLic
 αwbtrim =


det

(A.32)
CL Cmac + CLtrim Cmα


=− α

ictrim


det
em que det = CLα Cmic − Cmα CLic . Note-se que como ic é variável, não é útil usar o
ângulo de ataque absoluto da aeronave, pois ele varia com ic . É preferível usar αwb .

A.3.2 Configuração com canard fixo e elevator


A análise da configuração com canard com ângulo de incidência fixo e leme é seme-
lhante á análise da configuração com estabilizador horizontal e leme de profundidade.
Representando por δe a deflexão do leme, pode-se admitir que a relação entre a sus-
tentação no canard e δe é linear: CLc = ac αc + ae δe .
A dedução das expressões para o ângulo de ataque absoluto da aeronave α e para
Cm0 , CLδe e Cmδe no caso de canard fixo com elevator fica como exercício.

216
Bibliografia

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Wiley and Sons, 3rd edition, 1996.
[2] R. D. Finck. USAF Stability and Control Datcom. Technical Report AFWAL-TR-83-
3048, Air Force Wright Aeronautical Laboratories, 1978.
[3] Barnes W. McCormick. Aerodynamics, Aeronautics and Flight Mechanics. John Wiley
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[4] Robert C. Nelson. Flight Stability and Automatic Control. McGraw-Hill, 2nd edition,
1998.

[5] Jan Roskam. Airplane Flight Dynamics and Automatic Flight Controls, Part I. DAR-
corporation, 2003.

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