Professional Documents
Culture Documents
E SEMELHANÇAS
LEONARDO MIGUEL ALLES1
Resumo
A política externa do Brasil pauta-se por dois objetivos históricos: a busca pela
autonomia e pelo desenvolvimento econômico e social do país. Se esses objetivos
são basilares da diplomacia brasileira, a maneira como a sua persecução foi
realizada mudou ao longo do tempo. Não obstante, é preciso ressaltar que tanto a
política externa independente quanto a política externa do governo Lula possuem
muitas semelhanças na busca por essas duas metas. Semelhanças que serão
objeto de estudo do presente artigo.
Abstract
The brazilian foreign policy has been directed through two historical goals: the path
for greater autonomy and for social and economic development. As framework for
brazilian foreign policy, these two goals have been pursued in different ways
throughout history. The Independent Foreign Policy and the foreign policy of Lula da
Silva have similar guidelines to achieve both goals. This similarity will be the focus of
this article.
I) Introdução
1
Bacharel em Ciências Jurídicas e Sociais pela PUCRS, mestrando em Relações Internacionais pela
UFRGS.
2
Durante a presidência de Jânio, Afonso Arinos (01/1961 a 08/1961) foi o chanceler. O período
Goulart teve à frente do MRE os seguintes ministros: a) San Tiago Dantas (09/1961 a 07/1962);
Afonso Arinos (07/1962 a 09/1962); c) Hermes Lima (09/1962 a 06/1963); d) Lins e Silva (06/1963 a
08/1963); e e) Araújo Castro (08/1963 a 03/196).
1
econômico como metas de governo. Embora cada estágio da política externa passe
por uma conjuntura interna e externa diferentes, é possível identificar certas
continuidades e semelhanças na condução da diplomacia estatal.
Cumpre esclarecer que essas fases da política exterior nacional foram
escolhidas em razão das similitudes conjunturais tais como governo civil, expansão
econômica, aproximação do Brasil a países do Sul e atuação em órgãos
multilaterais.
Para comparar os dois momentos históricos, utilizar-se-á excertos de
discursos dos responsáveis pela política externa brasileira em ambos os períodos,
bem como indicadores econômicos e sociais para demonstrar os resultados obtidos
por cada gestão, sob à luz de conceitos-chave que serão apresentados na seção
seguinte.
5
O Brasil iniciara um processo de industrialização substitutivo de importações e
precisava exportar boa parte de sua produção em virtude do seu reduzido mercado
interno. Iniciativas do tipo ALALC (Associação Latino-Americana de Livre Comércio)
fracassaram, pois os demais países da região também haviam se engajado em
industrializações com elevado protecionismo estatal. Dessa forma, o reatamento de
relações diplomáticas com os países do Leste europeu (Albânia, Bulgária, Hungria,
Romênia e URSS) representou tanto atitude de autonomia quanto uma necessidade
de mercados consumidores para os produtos brasileiros4. Conforme Francisco
Clementino de San Tiago Dantas, acerca do reatamento com a URSS:
Foi com esse espírito que o Brasil buscou um forte protagonismo nos trabalhos
preparatórias que culminaram na Conferência das Nações Unidas sobre Comércio e
Desenvolvimento (UNCTAD). Eis as palavras de Araújo Castro:
A Interrupção da PEI
A PEI estava muito atrelada à conjuntura interna (tanto do viés política quanto
do econômico) que foi bastante volátil no período 1961-1964 (vide os indicadores
econômicos no anexo II). Jânio havia instituído um ortodoxo pacote econômico e
conseguira o reescalonamento da dívida externa. A renúncia do mandatário causou
uma crise institucional que quase desencadeou uma guerra civil, pois os grupos
conservadores do país não queriam que João Goulart assumisse o governo. A
solução conciliatória foi a instituição do parlamentarismo que perduraria até janeiro
de 1963.
7
O período Tancredo Neves registrou descontrole das contas públicas 6. No
final de 1962, foi instituído o plano Trienal, com o intuito de ajustar a economia do
país. O plano fracassou e os indicadores econômicos pioraram (vide anexo II).
A presidência Goulart enfrentou dificuldades políticas além das econômicas,
seus projetos de cunho nacionalista e não socialista foram rejeitados pelas elites
rurais e urbanas, pois significariam alterar a estrutura da propriedade fundiária e
urbana do país (FAUSTO, 2008:448). Além disso, ao promulgar uma lei que reduzia
a remessa de lucros por parte de empresas transnacionais, Lei 4131/627, o
investimento externo direto decresceu (vide anexo II).
O golpe militar pôs fim à PEI, como medida de rechaço a tudo que poderia
guardar identidade com o regime anterior. Nesse sentido, a PEI foi substituída por
um novo alinhamento junto aos Estados Unidos. Somente a gestão Geisel retomaria
alguns princípios da PEI. O legado da PEI pode ser percebido na administração Lula
da Silva e de seu Chanceler Celso Amorim, conforme será examinado na próxima
seção.
6
Sobre as dificuldades institucionais e econômicas vividos pelo país, recomenda-se o capítulo 8
“Inflação, Estagnação e Ruptura: 1961-1964”, escrito por Marcelo de Paiva Abreu. In: Ordem do
Progresso.
7
Eis o inteiro teor do artigo da Lei 4131/62 que seria revogado pela Lei nº 4.390, de 29.8.1964,
promulgado sob a égide do governo militar. Art. 31. As remessas anuais de lucros para o exterior não
poderão exceder de 10% sobre o valor dos investimentos registrados.
8
O país intensificou as relações entre
países emergentes como anunciara Lula
“Aprofundaremos as relações com grandes
nações em desenvolvimento: a China, a
Índia, a Rússia, a África do Sul [...]” (LULA,
2003). Em 2003 foi criado o IBAS (Índia,
Brasil e África do Sul), grupo que congrega
as maiores democracias de suas respectivas regiões e com considerável poder
econômico. O governo Lula concedeu status de economia de mercado à China,
quando Hu Jintao esteve no Brasil, em novembro de 2004. Essa atitude brasileira
representou novas oportunidades comerciais para o comércio bilateral conforme as
curvas acima.
No primeiro mandato de Lula há um estreitamento das relações com países
africanos. O Brasil abre sua embaixada em São Tomé e Príncipe, único país da
CPLP (Comunidade de Países de Língua Portuguesa) com o qual não possuía
missão diplomática (BRASIL, 2006). Em novembro do mesmo ano, Lula realiza
visitas oficiais em São Tomé e Príncipe, Angola, Moçambique, Namíbia e África do
Sul. Conforme o mandatário, o estreitamento de laços com a África constitui “uma
obrigação política, moral e histórica”, posição bastante semelhante à de Jânio
Quadros. O Lula da Silva ainda realizaria visitas à Síria, Líbano, Emirados Árabes
Unidos, Egito e Líbia. Além disso, em 2005, foi realizada em Brasília a Cúpula
América do Sul Países Árabes.
A autonomia da política externa nacional também surge na priorização da
América do Sul pela administração Lula:
2 , 7
62,8
55,9 55,6
47,2 48,3
fluxo comercial, o que demonstra a competitividade
do país nos mercados em que passou a atuar. No
20 0 0 20 0 1 20 0 2 2 0Exportação
03 2 0 0 4 - US$
2 0 bilhões
05 2 0FOB
06 2 00 7 20 0 8 20 0 9
entanto, a crise financeira de 2008, que teve início Janeiro/Dezembro - 2000 a 2009
160,6 152,3
Alguns gráficos ao lado ilustram de forma clara a 118,5
137,8
96,7
Conjuntura favorável
13
população brasileira. Para Amado cervo, a gestão Lula caracteriza-se pela presença
indutora do Estado na economia “o paradigma logístico repõe em marcha a visão
dual de mundo dos cepalinos ortodoxos, porém o faz mediante adaptação da
política exterior à interdependência global do século XXI” (CERVO, 2008:88).
V) Conclusões
14
cresce, a inflação é baixa, o país apresenta-se ao mundo como um lugar propício a
investimentos. Talvez os melhores exemplos do reconhecimento da comunidade
internacional dessa conjuntura favorável são a realização da copa do mundo de
futebol, em 2014, e das olimpíadas, em 2016.
Ao que tudo indica a diplomacia brasileira atingiu um modelo sustentável de
práticas em prol do desenvolvimento econômico e social. Na arena internacional, a
opinião do Brasil é requerida com assiduidade, basta lembrar a presença do país em
reuniões do G-8, e da participação do país no G-20 financeiro, com o intuito de
resolver a crise global que assolou o mundo desde 2008.
FAUSTO, Boris. História do Brasil. 13. ed. São Paulo: EDUSP, 2008.
Sites Consultados:
http://www.desenvolvimento.gov.br/sitio/interna/interna.php?area=5&menu=1161
http://www.desenvolvimento.gov.br/sitio/interna/interna.php?area=5&menu=571
http://www.secom.gov.br/
17
Anexo I
ANO EXP IMP Saldo (*) Corrente (*) EXP IMP EXP IMP
196
0,4 - 0,4 0,4 0,00 0,00 -60,00 -
1
196 563.050,0
2.252,6 29,7 2.222,9 2.282,3 0,19 0,00 -
2 0
Bulgária 196
1.165,9 510,5 655,4 1.676,4 0,08 0,04 -48,24 1.618,86
3
196
3.549,7 1.971,9 1.577,8 5.521,6 0,25 0,18 204,46 286,27
4
196
4.114,7 3.650,9 463,8 7.765,6 0,32 0,28 -48,96 -46,13
0
196
4.305,2 1.536,5 2.768,7 5.841,7 0,31 0,12 4,63 -57,91
1
196
Hungria 2
3.042,8 1.030,8 2.012,0 4.073,6 0,25 0,08 -29,32 -32,91
196
5.965,9 1.300,4 4.665,5 7.266,3 0,42 0,10 96,07 26,15
3
196
6.635,7 2.724,7 3.911,0 9.360,4 0,46 0,25 11,23 109,53
4
196
1.256,2 1.716,0 -459,8 2.972,2 0,10 0,13 715,18 90.215,79
0
196
1.950,7 614,2 1.336,5 2.564,9 0,14 0,05 55,29 -64,21
1
196
Romênia 2
3.295,8 2.017,1 1.278,7 5.312,9 0,27 0,15 68,95 228,41
196
6.378,0 2.346,7 4.031,3 8.724,7 0,45 0,18 93,52 16,34
3
196
5.448,5 829,0 4.619,5 6.277,5 0,38 0,08 -14,57 -64,67
4
196
13.346,5 14.758,5 -1.412,0 28.105,0 1,05 1,14 259,33 1.487,62
0
196
19.229,0 16.035,0 3.194,0 35.264,0 1,37 1,24 44,08 8,65
1
196
URSS 2
39.007,1 27.593,9 11.413,2 66.601,0 3,21 2,12 102,86 72,09
196
40.107,5 31.396,1 8.711,4 71.503,6 2,85 2,43 2,82 13,78
3
196
37.146,1 21.151,1 15.995,0 58.297,2 2,60 1,95 -7,38 -32,63
4
Fonte: Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior - MDIC
Secretaria de Comércio Exterior - SECEX
Departamento de Planejamento e Desenvolvimento do Comércio Exterior - DEPLA
Anexo II
18
Variação de reservas (US$ 106) 281 -307 63 43 -113
Dívida externa registrada total (US$ 106) 2372 2835 3005 3089 3160
Inflação (%) 29,5 33,2 49,4 72,8 91,8
Fonte: Abreu, 1990, p. 403-404.
19
Anexo III
mar/0 Variação
Indicador jan/03 9 (%)
PIB – Produto Interno Bruto (R$ bilhões de 2.269, 2.889, 27
2008)
Balanço de pagamentos (saldo mensal – 41 72
713 940 32
US$ milhões)
Balança comercial (saldo mensal – US$ 1.155 3.712 221
milhões)
Superávit primário (% do PIB acumulado em 3,71 3,29 -11
12 meses)internacionais (US$ milhões)
Reservas 201.94
37.652 436
1
Investimento estrangeiro direto 16.020 41.601 160
(acumulado em 12 meses – US$ milhões)
Investimento brasileiro no exterior 2.654 15.611 488
(acumulado em 12 meses – US$ milhões)
Risco-Brasil (pontos-base) 1.439 355 -75
Juros Selic (% a.a.) 25 10,25 -59
Crédito total (% do PIB) 21,8 42,5 95
Dólar comercial (R$) 3,44 2,21 -36
Inflação IPCA (% a.m.) 2,25 0,48 -79
Cesta básica (R$) 207 204 -1
Emprego (milhões de postos formais) 28,7 39,1 36
20
Anexo IV
21