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The Song of David/ Amy Harmon
AVISO:
A tradução em tela foi efetivada pelo grupo de forma a propiciar ao leitor acesso
parcial à obra, incentivando-o à aquisição da obra literária física ou em formato e-book.
SINOPSE
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The Song of David/ Amy Harmon
PRÓLOGO
MOSES
MILLIE ME LIGOU ontem de manhã. Tag sumiu. Ele sumiu e Millie não
sabe onde procurá-lo, mesmo que isso fosse possível. Ele sabe que ela não
conseguiria ir atrás dele e isso não se parece com algo que Tag faria. Ele não
é cruel. Nunca foi.
Mas Tag é diferente. Tag era pra ser. Ele apenas era. Ele é um
redemoinho de vento, um tornado que você não pode controlar. Ele
simplesmente te suga, mas ao contrário de um desastre natural, ele não
cessa. Ele nunca te solta. E então de repente, sem avisar, ele faz isso. Ele te
solta.
Ele deixou Millie para trás. Ele deixou o Time Tag, seus negócios, seus
planos para um título na luta, tudo para trás. Ele me deixou para trás. E nada
disso fazia nenhum sentido. Se houve sinais, eu não os vi. E eu sou o cara
que deveria ver o que os outros não veem. Eu sou Moses Wright, médium,
artista, melhor amigo, e eu não vi os sinais.
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The Song of David/ Amy Harmon
CAPÍTULO UM
MOSES
TAG NÃO DEIXOU um bilhete e sua casa estava limpa. Mais do que
limpa.
Não parece que Tag estava nos fazendo jogar caça ao tesouro. Isso não era o
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estilo dele tampouco. Ele apenas não queria que o encontrássemos. E isso
me assustava pra cacete.
Quando perguntei para Millie se ela sabia alguma coisa sobre as fitas,
ela passou os dedos ao redor delas, surpresa, e então assentiu.
— O meu irmão Henry deve ter dado para ele. Ele tinha esse gravador
de fitas cassete no quarto dele desde sempre. Henry usava para fingir que
era um narrador de esportes e criar suas próprias partidas imaginarias. Ele
assistia aos jogos do meu pai e falava no gravador como se fosse Bob Costas
ou alguém do tipo. Antes de a minha mãe morrer ela comprou um gravador
digital para ele. Mas Henry guarda tudo. Ele deve ter dado isso para o Tag.
Tag gosta das coisas que ele pode tocar. Ele e Millie tinham isso em
comum. Ela precisava tocar para ver. Ele precisa tocar para se sentir
conectado. Eu podia o ver colocando as fitas no gravador e falando, levando
uma eternidade para chegar ao ponto. Contar estórias e rir desse jeito era
simplesmente uma grande piada. Eu tentei me sentir com raiva, mas eu sei
que a verdadeira razão para ele ter deixado as fitas foi por que era o único
jeito que ele tinha de deixar uma mensagem para Millie. O único jeito de
permiti-la a privacidade de ouvir o que quer que seja que ele tinha a dizer
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Ela assentiu.
— Os adesivos?
— Tag sempre presta atenção. Você acha que não porque ele é
desleixado. Ele é inquieto. Mas ele não deixa nada passar.
Ele não se desculpou por ter me atingido e ele não parecia querer
fazer aquilo de novo, o que era decepcionante.
Se ele não queria brigar então eu queria que ele fosse embora. Eu
imediatamente voltei a minha atenção para o desenho que estava
trabalhando. Eu sentia que a irmã dele estava aqui, bem além da minha
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— É isso que as pessoas dizem, não é? Elas dizem que você é louco.
Mas eu não acredito nisso, cara. Não mais. Você não é louco. Você tem
habilidades. Habilidades malucas.
certeza estou.
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— Ela está morta, não está? Você pode vê-la, então isso significa que
ela morreu.
Então Tag falou de mim para seu pai. E por alguma razão, desespero,
desânimo ou talvez apenas um desejo de aplacar seu filho inflexível, O
senhor de David Taggert contratou um homem e seus cachorros para
inspecionar a área que eu havia descrito. Os cães captaram o cheiro dela
rapidamente e eles encontraram seus restos. Bem desse jeito. Em uma cova
rasa amontoada com pedras e detritos, a um pouco mais de 45 metros de
onde eu havia pintado seu rosto sorridente em um viaduto, os restos de
Molly Taggert foram descobertos.
Essa foi a primeira vez que eu tinha feito alguma coisa desse tipo.
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habilidades, se é isso o que elas eram, tiveram um sentido. Mas Tag tinha
mais perguntas.
— É. Eu sei. – apontei para a longa cicatriz em seu braço. Não foi uma
dedução difícil. — E eu estou aqui porque faço pinturas de pessoas mortas e
assusto pra caralho todos os vivos com quem eu entro em contato.
Ele sorriu.
— O que você quer dizer? – eu não conseguia ver o futuro se era isso o
que ele queria dizer.
— Não. Eles não dizem nada mesmo. Eles apenas me mostram coisas.
Tenho certeza que eles gostariam que eu visse mais. Mas não é fácil assim. É
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— Sim?
— Não leve a mal... Mas se, você sabe, se houver mais e se não for
ruim, assustador e se não for o apocalipse zumbi. Se não for fogo e enxofre...
Pelo menos, não tanto quanto você pode dizer, então porque você fica? – sua
voz estava tão silenciosa e cheia de emoções que eu não tinha certeza se
alguma coisa que eu dissesse poderia ajuda-lo. Eu não tinha certeza se sabia
a resposta. Levou-me um minuto pensando, mas eu finalmente tinha a
resposta que era verdadeira.
— Nós não podemos fugir de quem somos Tag. Aqui, lá, na metade do
caminho através do mundo ou em uma clínica de psiquiatria na cidade de
Salt Lake. Eu sou o Moses e você é o Tag. E essa parte nunca muda. Então
nós descobrimos isso aqui ou descobrimos isso lá. Mas ainda teremos que
enfrentar. E a morte não vai mudar isso.
Assenti.
— Quando você sair, para onde você vai? – Tag me perguntou uma
noite no jantar, seus olhos na comida, seus braços na mesa.
Ele conseguia comer quase tanto quanto eu. E eu tinha certeza que os
funcionários da cozinha de Montlake desfrutariam de um descanso quando
fossemos embora.
Eu estive aqui por meses. Passei o Natal, o Ano Novo e fevereiro. Três
meses em uma instituição mental. E eu queria poder ficar.
— A minha família tem dinheiro. Não temos muito mais coisas, mas
temos toneladas de dinheiro. E você não tem merda nenhuma.
decidir que preciso ser esmagado. Vou contratar você para passar cada
minuto de vigília até que eu descubra como ficar sóbrio sem querer cortar
meus pulsos.
Tag riu.
perguntava como era possível uma criança difícil como Tag, uma pessoa que
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— Nós vamos continuar correndo Moses. É como você disse. Aqui, lá,
do outro lado no mundo? Não podemos escapar de quem somos. Então
ficaremos juntos até nos encontrarmos, tudo bem? Até descobrirmos como
lidar com isso. – foi isso o que ele disse. Foi isso o que fizemos. E Tag Taggert
se tornou o meu melhor amigo. Quando eu mais precisei dele, ele me
segurou e não me soltou.
A coisa que mais me assustava é que talvez ele tenha encontrado suas
respostas. Talvez ele saiba exatamente o que está fazendo. Exatamente
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quem ele é. Talvez ele tenha descoberto o mundo. Mas fizemos um acordo
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CAPÍTULO DOIS
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Caverna de homem é o termo que os americanos costumam usar para identificar um cômodo que seja
tipicamente masculino onde os homens podem assistir TV, jogar, beber, sem se preocupar com bagunça ou com as
mulheres.
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Mas eu não sou dono apenas do bar. O quarteirão inteiro é meu. O bar
na esquina, a pequena arena fechada onde lutas locais ocorrem todas as
noites de terça e uma vez por mês aos sábados, a academia ao lado da arena,
e no final do quarteirão, uma loja de artigos esportivos, cheio de
equipamentos e roupas do Tag Team com a minha etiqueta estampada em
cada superfície. Meu próprio apartamento e dois outros, ocupados por
pessoas de minha escolha, localizados em cima do ginásio de treinamento. O
quarteirão é meu mundo inteiro, um mundo de minha criação. E tudo está
conectado, cada negócio jogando para os outros.
Até mesmo o bar e a arena de luta estão ligadas, e nas noites quando
não há lutas, os assentos da arena são isolados por uma parede de metal
com portas sanfonadas, e o espaço torna-se um palco para uma sala secreta,
uma alcova privada preenchida com uma dúzia de pequenas mesas e
cabines, o bar facilmente acessível apenas ao virar da esquina, e garçonetes
mantendo-o confortável em seus assentos. Quatro noites por semana, a
pequena Arena é o lar de um tipo totalmente diferente de show, um tipo
completamente diferente de evento esportivo. Um pole é erguido no centro
do octógono e lutadores não são permitidos dentro, apenas uma mulher
após outra, girando e se contorcendo no pole no ritmo da música pulsante
que é silenciado de todo o resto do estabelecimento. Eu mantenho-o
elegante, tão elegante quanto um pole com strippers seminuas pode ser. As
meninas dançam, elas não ficam nuas e elas não se misturam além do palco.
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não tinha ganhado. Eu era um garoto rico, mas eu não era uma criança
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Aos vinte e seis anos, eu não tinha muito tempo ou espaço para errar.
Mas eu estava no caminho certo e o bar estava indo muito bem. A prova
disso estava ao meu redor quando eu entrei pela porta da frente naquela
segunda-feira à noite, a noite tipicamente mais lenta da semana, e encontrei
todos os bancos e mesas ocupados, para o feliz som de clientes relaxados. O
lugar cantarolava e meu coração aquecido com a música. Duas das minhas
garçonetes passaram por mim, vestidas como ring girls com shorts curtos e
top frente única do Tag Team, entregando bebidas em vez de anunciar
rounds. Elas me deram sorrisos idênticos e jogaram seus cabelos, quase
como se fosse parte da descrição do trabalho. Talvez devesse ser... ou talvez
fosse apenas senso comum. Você sempre sorri para o chefe.
— Não. Nada. Ela é linda. Ótima dançarina. Grande corpo. Ela esteve
na programação nas últimas duas semanas, embora você perdeu todas suas
apresentações. Ela está sempre no horário, nunca diz duas palavras. Ela
dança, não bebe, não flerta. Apenas como você gosta delas. - Mais uma vez
com o sorriso.
lo feliz.
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Não. Ela tinha, pelo menos, vinte e um. Essa era a minha regra. Apertei
os lábios e inclinei a cabeça, estudando-a. Ela trabalhou o pole, bem como
qualquer uma das outras meninas, talvez até melhor, mas a dança ela era
mais acrobática, mais atlética do que abertamente sexy. Os olhos dela
estavam fechados e ela tinha um suave sorriso nos lábios, que poderia ser
interpretado como sensual, especialmente considerando que ela estava
dançando para uma plateia majoritariamente de homens. Risque isso. Um
público todo de homens. Mas seu sorriso não era sensual. Era... sonhador,
como se ela estivesse imaginando que estava em outro lugar, uma pequena
bailarina girando no lugar dentro do globo de neve de uma criança,
dançando sozinha sem parar. Seu pequeno sorriso não se alterou, e seus
olhos permaneceram fechados, a curva pesada de seus cílios escuros
criando semicírculos de sombra em suas bochechas de porcelana.
a cada hora, com outros quinze minutos de intervalo entre elas, de nove à
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meia-noite. Afinal, era Utah e não Vegas. As dançarinas tinham folga duas, às
vezes três noites por semana, nas noites de luta e nas noites de clube,
quando o octógono era necessário para as lutas ou desmontado para criar
uma pista de dança. Com quatro dançarinas, agora, cinco, na minha folha de
pagamento, isso não era um trabalho em tempo integral de qualquer jeito. A
maioria das meninas tinham trabalhos do dia e agarravam as horas extras e
a boa remuneração anunciando os rounds e as lutas.
— Do quê?
— Da nova garota.
— Oito. – Oito semanas até que eu lutasse contra Bruno Santos. A luta
que me daria uma vaga para a luta do título em Vegas. A luta que iria
catapultar a marca Tag Team em salas de todos os EUA. Oito semanas de
foco, nada de distrações, e nenhuma decisão além da luta. Depois que eu
ganhasse a luta, eu iria enfrentar o que viesse a seguir. Depois que eu
ganhasse essa luta o mundo poderia acabar, por tudo o que importava.
Depois que ganhasse.
— Ei, chefe. Lou ligou avisando que estava doente hoje à noite. Ele
geralmente garante que as meninas cheguem aos seus carros. Você quer
fazer isso? Já que você está aqui?
— Algo parecido com isso; - disse Morg, e eu pude ver que ele estava
tentando não rir. — Ela mora perto e ela vai andando, no entanto. Lou
reclama sobre isso, mas é realmente apenas um quarteirão. Eu digo a ele
que vai fazer algum bem a sua bunda gorda.
— Lou não está esta noite. Tag irá acompanha-las até lá fora. Certo,
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chefe?
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— Lou?
— Lou está doente, então eu vou andar com você até sua casa. - Eu
respondi lentamente, inundada com a realização chocante quando ela se
virou de frente para mim. Seus olhos estavam arregalados e fixos, e eu senti
uma pontada surpreendente em algum lugar atrás do meu coração. Ela tinha
olhos bonitos. Eles eram grandes e luminosos, cercados por cílios negros
que varreram seu rosto quando ela fechou os olhos. Mas eles estavam vagos,
e olhando para eles me fez inexplicavelmente triste. Então eu olhei para
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baixo, estudando sua boca e seu cabelo liso escuro que emoldurava seu
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rosto e caía sobre os ombros. Então ela sorriu, e a pontada no meu coração
cortou através do meu peito mais uma vez e roubou a minha respiração.
— Ah, a longa pausa. Eu sempre consigo isso. Minha mãe sempre disse
que eu era bonita. - disse ela secamente. — Mas apenas no caso eu não sou,
você vai prometer mentir para mim? Exijo detalhadas mentiras sobre minha
aparência. - Ela disse tudo isso naturalmente. Sem amargura. Somente
aceitação. — Então você ganhou o dever de levar a menina cega, hein? Você
não tem que me levar em casa. Eu cheguei aqui sozinha. Mas Morgan me
disse que é a regra com todas as meninas. Ele disse que o chefe insiste.
que eu disse a ela que meu nome era David. Ninguém mais me chama de
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sem nem mesmo ter tentando. Era o nome do meu pai. E o nome do pai dele.
E seu pai antes dele. David Taggert era um nome que carregava peso. E eu
senti esse peso ainda muito jovem. Então meus amigos tinham começado a
me chamar de Tag. Tag me libertou. Isto me permitiu ser jovem, de espírito
livre. Apenas a palavra em si trouxe à mente imagens de fugir. "Sou Tag...
você não pode me pegar”.
— Os calos são dos pesos. Barras. Esse tipo de coisa. - Eu soava como
um idiota. Como um idiota, aspirante a Rocky. Eu poderia muito bem gritar:
"Eu, Adrian!”
— Sim. Eu gosto.
Ela riu, e eu soltei todo o ar que eu estava segurando desde que ela
estendeu a mão em saudação. Seu riso não era juvenil e alto, tilintando e
doce. Era robusto, saudável, o tipo de riso que veio de sua barriga e não
tinha nada a esconder.
Eu meio que engasguei, meio ri, surpreendido mais uma vez. Mas ela
se manteve falando.
— Então, eu sei que você é grande, forte, raivoso e cheira bem. Você é
alto também, porque sua voz está vindo de cima. Você também é do Texas e
você ainda é jovem.
— Homens velhos não lutam. E a sua voz. Você estava cantando Blake
Shelton sob a sua respiração quando você se aproximou. Se você fosse mais
velho que você poderia cantar Conway Twitty ou Waylon Jennings.
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— Bem, se você olhar para fotos antigas... - Minha voz falhou sem jeito,
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percebendo que ela não conseguia realmente olhar para fotos antigas.
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— Eles tinham menos. Mas eles tiveram mais. Parece que as pessoas
tomavam mais cuidado com suas propriedades e suas aparências. As
mulheres usavam vestidos e os homens usavam ternos. As pessoas usavam
chapéus e luvas e estavam bem vestidos. A maneira como eles falavam era
diferente, mais cuidada, mais culta. Mesma língua, mas totalmente diferente.
Mesmo os edifícios e os móveis eram lindos, bem trabalhados, com atenção
aos detalhes. Eu não sei... O mundo tinha mais classe. Talvez fosse isso.
quando o mundo era mais bonito. Se eu fosse adivinhar, a minha casa não é
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tão adorável como era antes. Mas tudo parece incrível na minha cabeça.
Vantagens de ser uma garota cega.
— Você disse que trinta passos. O quê? Você conta passos? - Eu podia
ouvir a surpresa na minha voz e me perguntei se ela poderia também.
— Isso é incrível.
— Bem, eu cresci aqui e eu pude ver, uma vez. Eu ainda posso vê-lo
em minha mente. Seria mais difícil se eu tivesse que começar de novo em
um lugar totalmente novo.
— Onze.
Engoli em seco. Minha vida tinha mudado aos onze anos também. Mas
de um modo totalmente diferente. Antes que eu pudesse comentar, Amelie
parou.
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dela, se virou para um portão de ferro e parou quando seu bastão bateu
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contra ela. Ela soltou meu braço e afastou-se, sentindo o trinco do portão e
abrindo-o facilmente. A casa era velha, quase um século de idade, se não
mais velha, e ainda era imponente, embora o punhado de neve e a escuridão
escondessem o jardim e a fachada, o alpendre que rodeava a casa já tinha
visto dias melhores. Luz brilhou das janelas no andar de cima, e o barulho de
passos eram claros. Amelie parecia confortável percorrendo-os, então eu
fiquei perto do portão, esperando até que ela estava em segurança no
interior. Ela parou no meio do caminho e virou-se ligeiramente.
— Sim?
— Não há de quê.
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Moses
Millie pegou a fita do gravador, deslizando os dedos ao longo dos
botões até que ela alcançou o que ela procurava. Então ela apertou-o para
baixo e a voz de Tag cessou. Ela sentou-se agarrando o aparelho, como se
estivesse segurando a memória. A sala estava cheia de expectativa, com
antecipação. Eu tinha ouvido isso na voz de Tag, senti nos cuidados com que
ele se lembrava dos detalhes, e sentiu sua maravilha quando ele refez seus
passos. Ele me puxou para dentro, e por um momento eu tinha esquecido
onde eu estava. Mas agora eu me sentia estranho, intruso, e eu queria
colocar minhas mãos sobre meus ouvidos.
deveria falar, antes que ela me dissesse algo que ela preferisse manter em
particular, mas ela continuou de repente.
Eu ri novamente, imaginando onde ela estava indo com isso, mas feliz
em deixá-la fazer sua palestra. Perguntei-me brevemente se ela sabia que eu
era negro. Era meio que um sentimento incrível saber que, por uma vez, isso
realmente não importa.
única que conta, certo? Mas uma vez que Robin tentou me arrumar um
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encontro com um cara surdo, eu coloquei meu pé no chão. Não era por ele
ser surdo, exatamente, mas como ela pensava que nós iríamos nos
comunicar? Robin às vezes pensa que porque eu sou deficiente, só posso ter
encontros com caras com deficiência. Porque, claro, ninguém mais poderia
me querer, certo? – A voz de Millie ficou presa, e ela sorriu imediatamente,
rindo de si mesma. — Uh oh. Atingiu um nervo lá.
— Mas eu sabia que ele era bonito. Era pela forma como ele se
portava, a sua confiança, sua bondade. Eu pensei em perguntar às meninas
do trabalho sobre ele. Mas eu me acovardei. Eu não queria que elas rissem
de mim ou sentissem pena de mim. Eu disse a mim mesma que talvez
pudéssemos ser amigos. Ele parecia aberto a isso.
Eu não sabia o que dizer. Eu estava fascinado. Mas eu não sabia o que
dizer. Millie estava apenas sentada, segurando o gravador entre seus braços.
Então, sem mais comentários, ela colocou para tocar mais uma vez.
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CAPÍTULO TRÊS
TAG
O palco tornava-se um octógono na terça-feira para a noite da luta, e
na quarta-feira Amelie não estava na programação para dançar, o que
Morgan me informou logo que entrei, sorrindo como se tivesse realmente
escondendo algo de mim.
— Ela chegou aqui com sua bengala, parecendo mais Helen Keller que
Heidi Klum. Sem maquiagem, o cabelo num rabo de cavalo bagunçado,
vestindo um grande casaco e botas de neve. Meio desmazelada, sabe? Ela
disse que queria candidatar-se para o trabalho. Vince estava cuidando do
bar naquele dia, ele e eu pensamos que talvez você quisesse colocá-la na
vaga. Como você estava sendo um bundão com a gente, então nós dissemos,
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com certeza! Você me conhece. Estou sempre pronto para uma boa risada.
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— Ela foi boa o suficiente para que soubéssemos que você não estava
brincando com a gente. E ela parecia malditamente determinada. Animada
até. E, admito, pensei que seria engraçado.
— Hilariante!
irritado.
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— OK. Se você quiser mantê-la, isso é legal. Ela vai estar de volta na
quinta-feira, apenas caso você queira ter uma conversa com ela sobre ser
um pouco mais sexy. Você sabe, talvez dançar com os olhos abertos.
— Morg?
— Sim, chefe?
— Vá para casa.
— Você acha que é engraçado rir de uma menina cega. Esse tipo de
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coisa me preocupa, Morg. Faz-me pensar sobre que tipo de homem tenho
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para gerenciar o meu bar. Veja, há duas coisas que eu odeio. - Segurei meu
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Minha voz estava leve, minha postura relaxada, mas não quebrei o
contato visual com o meu bartender, e vi como Morgan baixou os olhos e se
moveu desconfortavelmente, como se esperando por mim para mudar de
idéia. Quando fiquei em silêncio, ele jogou sua toalha e estendeu a mão para
pegar a carteira e as chaves que ele mantinha escondido abaixo do balcão.
— Sou velho o bastante para ser seu pai, Tag. Seu pai era um dos meus
melhores amigos. Você precisa me mostrar um pouco mais de respeito. —
Morgan bufou, levando tudo claramente na brincadeira.
— Você vai ter que ganhá-lo, Morg. Concluindo, você não é meu pai,
você não é o meu melhor amigo, e eu não lhe devo merda nenhuma. Você
pode voltar amanhã, se for homem o suficiente para fazer alguns ajustes. Se
eu não o vir amanhã, vou entender, e vou estar à procura de seu substituto.
— Não
— Não bebo porque nunca fui capaz de descobrir como fazer as coisas
com moderação. Veja, eu não bebo. Eu fico bêbado. Sou tudo ou nada, o
tempo todo. Não posso fazer tudo, então não tenho que fazer nada, - Disse
em tom de conversa, perguntando pela minha necessidade em tranquilizá-
la. — Você quer outra coisa? Um refrigerante, água, algo não alcoólico? -
Mudei o assunto sem problemas.
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Significando que a bebida está logo à frente, em linha reta.
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suspenso, sobre a bebida, seu nariz tão perto do líquido efervescente que
afundaria se ele se movesse uma polegada.
Ela sentou-se e esfregou o nariz com sua mão direita, ainda segurando
a bebida sua esquerda:
— Não! Eu, hum, gosto do jeito como a bebida soa e a forma como meu
rosto se sente contra as bolhas. Não sabia que você ainda estava me
observando. - Houve um pouco de aço em sua voz, deixando-me saber que
meu olhar fixo não foi apreciado.
idiota.
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The Song of David/ Amy Harmon
— Você poderia abri-lo, por favor, e ler o total para mim? Vou ser
capaz de depositá-lo no caixa eletrônico na esquina se souber o valor.
— As telas de toque são ruins. Não posso sentir a tela com o toque.
Mas o ATM na esquina tem um teclado em braile, graças a Deus! Se o mundo
fosse muito plano, pessoas como eu deslizariam para fora. - Ela disse isso
alegremente, com humor, e eu sacudi a cabeça com espanto, enquanto ela se
empurrou para fora, na escuridão, balançando a porta fechada atrás dela.
Lutei contra a vontade de segui-la, para ter certeza que ela não seria
assaltada no ATM, seu cheque insignificante sendo roubado, e sua bengala
usada contra ela. O mundo era assustador para a maioria das pessoas. Para
Amelie era francamente letal. Ela era completamente vulnerável. “Se o
mundo for muito plano, pessoas como eu deslizarão para fora”.
E ainda assim ela não hesitou em tudo. Respeitei-a por isso, admirei-a,
então fiquei atrás do bar por vários longos segundos, mostrando calma
silenciosa, embora meu coração estivesse agitado e as palmas de minhas
mãos estivessem suando. O rosto da minha irmã passou pela minha mente.
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— Hey, Tag.
— Você vai ficar sozinho aqui por cerca de meia hora. Estarei de volta
para terminar a noite e ajudá-lo. Morgan teve que ir embora. Você vai ficar
bem?
— Sim, patrão. Nada demais. Tem sido meio lento durante toda a
noite.
Agarrei meu casaco e saí pela porta da frente sem dizer mais nada,
descendo a rua, correndo em direção ao caixa eletrônico na esquina.
Alcançando Amelie antes que ela tivesse atravessado meio quarteirão. Ela
ficou surpresa quando me aproximei dela, mas deu de ombros facilmente
quando citei novamente as regras.
Quando ela terminou, fui para o seu lado e ela ligou nossos braços do
mesmo jeito como tinha feito na noite anterior. Nós andamos em fácil
companheirismo, eu cantarolando suavemente, Amelie acompanhando
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— Ouça!
meu lado.
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Eu não tinha resposta para isso, mas ela parecia não precisar de uma.
— Oi, Henry. Sou David Taggert. Mas você pode me chamar de Tag. -
Ofereci. O garoto parecia mais nervoso que impressionado.
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Apelido de Mohammad Ali, que sempre aludia à sua grande boca e à cidade em que nasceu.
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— A próxima vez que vir você, ele vai saber tudo sobre você, seu
registro, e tudo sobre artes marciais mistas. Henry tem um cérebro
fenomenal, mas ele não é muito de conversa fiada. - Disse Amelie
suavemente. Ela mordeu o lábio inferior como se quisesse dizer algo mais e,
em seguida, endureceu como se estivesse decidindo ser melhor ficar quieta.
— Não sabia quem você era. Sinto-me estúpida agora. - Ela falou
timidamente.
— Por quê?
— Sim, estou.
— OK. Bem, isso é bom. Vou tentar ser mais profissional no futuro.
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Soltei sua mão e dei um passo para trás, minha mão alcançando a
porta. Ela inclinou a cabeça na direção do som que fiz ao me afastar. Eu
sabia que ela era a pessoa tecnicamente em desvantagem, mas dane-se se eu
não me sentia como o alvo de uma piada particular, pela forma como os seus
olhos nunca me observariam.
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Nessa situação, em nosso idioma, dizemos “não há de quê” ou “de nada”. Preferimos manter o original.
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Moses
A primeira fita terminou com o alto clique do botão play se
liberando, e exalei profundamente, como se tivesse sido liberado também.
Estava segurando a minha respiração por toda parte, com medo de relaxar,
eu me preocupei se iria perder as pistas, e não pegar o que Tag não estava
nos dizendo.
O problema era que ele parecia estar desnudando sua alma, não
deixando nada para fora de seus primeiros encontros, até mesmo os
detalhes que seria melhor não dizer.
piadas sobre loura ou sobre sua mãe, seriam piadas sobre uma stripper
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cega.
The Song of David/ Amy Harmon
— Robin disse que iria me ajudar. E ela teria. Ela teria me dado
uma aparência como um milhão de dólares. Mas no final, entrei na audição
parecendo uma mendiga. Uma mendiga cega. Ou pelo menos o que eu
imaginava ser uma mendiga cega. Caminhei pela rua, preparada para ser
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dispensada, minhas roupas que pouco lisonjeiras, meu cabelo uma bagunça.
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Eu não tinha ideia por que Tag incluiu essa parte da história nas
fitas. Vi como o rosto de Millie caiu como um castelo de cartas quando
ouvimos Tag contar a cena com Morgan. Queria lançar o gravador pela
janela e caçar meu melhor amigo, para que pudesse dar um soco e fazer
algum sentido para ele. Mas então, como Tag continuou falando, a expressão
de Millie se tornou pensativa e sua postura rígida relaxou, e de repente
percebi por que Tag compartilhou a história desconfortável. Tag confessou
os detalhes da contratação de Millie porque não queria que ela ouvisse de
outra pessoa e pensasse que ele brincou com ela. Tag claramente queria que
Millie soubesse que a primeira vez que ele a viu dançando, não tinha ideia
que ela era cega. Ele achava que ela era bonita.
— Você ouviu o que ele disse, Millie. Ele não sabia. Você o
convenceu que era normal. Ele achava que você era ainda melhor do que as
outras dançarinas. - Meu intestino se torceu novamente. Se Tag fosse
retornar, ele não teria sentido a necessidade de deixar isso claro ou livrar
Millie das fofocas.
que precisava esticar suas pernas. Ela teria que dançar no clube em algumas
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horas também, e eu estava feliz por ouvir isso, mesmo que ela só estivesse
seguindo a rotina. Seguir a rotina significa que você não desistiu ainda.
Desistir é o que te mata. E até agora, todo mundo estava mantendo as
aparências para Tag, todo mundo estava aparecendo para o trabalho,
fazendo o trabalho em seu ginásio, em seu bar, e em sua loja na esquina. Tag
pode ter abandonado seu mundo, mas se todos nós seguirmos a rotina,
talvez pudéssemos manter seu mundo até que ele voltasse. Eu não me
permitiria pensar algo diferente disso.
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CAPÍTULO QUATRO
TAG
MORGAN não voltou para o trabalho. Me certifiquei de estar no bar às
duas da tarde seguinte, pronto para me entender com ele ou substituí-lo, o
que tiver que ser será. Quando deram cinco e meia e ainda nenhum sinal do
meu gerente, eu o amaldiçoei e comecei a avaliar as opções na minha
cabeça. Eu tinha uma grande luta para me preparar, e eu não queria
trabalhar em turnos até tarde no bar a cada noite.
Foi por isso que eu contratei Morg. Eu queria entrar, fazer minha
rotina, bater em algumas peles, e voltar para o trabalho. Eu não queria
trabalhar quarenta horas por semana atrás do bar gerenciando no Place. Eu
já tinha muito no meu trabalho. Mas eu não queria constranger ou ferir o
orgulho de Morgan. Fiquei surpreso que ele não tinha aparecido.
para o outro.. Era interessante ver os irmãos juntos, um tão composto, tão
Página
Me perguntei onde estaria seus pais mas em seguida, decidi que não
era da minha conta.
Ele não tinha idade suficiente para estar no bar, mas desde que ele não
estivesse bebendo, coisa que eu ficaria de olho e contando que ele não
ficasse por muito tempo, eu não estava muito preocupado com isso.
— Sprite. Ele ama Sprite. – Ela parecia tão aliviada que pensei que ela
fosse começar a chorar, mas em vez disso ela virou-se para Henry, segurou
seu braço e instruindo-o suavemente.
— Henry, você ouviu isso? Sr. Tag, hum, Tag disse que você pode
assistir ao jogo com ele. - Henry deslizou sobre um tamborete, seus olhos
não deixavam a tela.
— Ele pode ficar sentado aqui, David? - Ela não parecia se sentir
confortável com meu nome e eu me perguntava o porquê.
— Ele está bem ai, pode ficar. Vou ficar de olho nele.
— Obrigada! Eu aprecio isso -, disse ela com firmeza. Com sua bengala
na mão, ela fez seu caminho dando a volta no bar e desapareceu no longo
corredor que levava para os banheiros e o vestiário dos funcionários. Eu
coloquei uma tigela de amendoins na frente de Henry, juntamente com uma
Sprite, mas pensei melhor, e substitui os amendoins por pretzels. Henry
68
poderia ser o tipo de garoto com alérgia a amendoins. Isso era tudo que eu
Página
Henry olhou nos meus olhos e sacudiu a cabeça, indicando que isso
não era verdade.
— Ele é o homem mais alto na NBA? – Eu sabia que isso não era
verdade.
— Você sabia que o nome dele foi inspirado em uma carne japonesa? -
Henry se vangloriou, puxando sua Sprite para ele e tomando um longo gole.
— Os Giants não fazem bons amigos. - Ele deu uma olhar desanimado
para seu copo.
— Você está falando sobre Shaq ou Kobe? Eles são ambos muito
grandes. - Eu tentei não rir, porque Henry não estava rindo.
— Eu não sei nada sobre isso. Olhe para mim e Axel. Nós dois somos
muito grandes.
Henry olhou para mim como uma coruja, como se eu tivesse acabado
de confirmar o seu ponto. Axel começou a rir, e eu ri com ele, mas Henry
não riu em tudo. Ele apenas colocou seus lábios inchados em torno de
seu canudo e bebeu sua Sprite como se estivesse morrendo de sede. Eu
esperei até que Axel voltasse sua atenção para Stormy, que tinha parado de
flertar enquanto ela esperava nas mesas.
***
Poucos minutos depois, eu olhei para cima para vê-los pairando perto
dos sacos de velocidade, Amelie segurando firmemente o braço de Henry,
Henry olhando como se ele estivesse prestes a fugir como um cão-guia
fugitivo e arrastando sua pobre irmã com ele. Eles estavam recebendo
72
alguns olhares estranhos. Henry com sua cabeceira louca, seu olhar de fulga
Página
The Song of David/ Amy Harmon
e suas mãos nervosas, já Amelie porque estava tão quieta, com os olhos fixos
à frente.
— Six-pé três, soca 215 muitas vezes mais comparado a Forrest Griffin
e Michael Bisping? - A voz de Henry levantou - no final, visando claramente
aprovação.
— Sim, ele fez, Henry. Está tudo bem. Isso é como lutadores falam, -
Amelie acalmou-o.
são apenas sobre como se proteger. Mas agora, eu vou apresentá-lo a minha
equipe.
Mas ele jogou tudo fora em seu último ano e terminou no Hospital
psiquiátrico depois de ter pulado de uma ponte drogado. Meu velho amigo,
Dr. Andelin, o tinha enviado para mim. Até agora, ele conseguiu ficar limpo e
me fixar diariamente. Eu estava aprendendo uma tonelada de coisas com
75
ele.
Página
The Song of David/ Amy Harmon
Há uma divisão para cegos atletas. Muito legal. Mas meu coração não estava
Página
The Song of David/ Amy Harmon
— Sim. Não ao menos que você esteja jogando com alguém enquanto
você está girando.
— Você não tem que socar qualquer coisa. Exceto, talvez, um saco.
Você acha que você gostaria de dar um soco naquele saco ali?
perguntei se ele era um autista. Por mais que ele possa cuspir trivia sobre
esportes ele parecia um livro de registro. Por outro lado, o garoto pediu
permissão para dizer bunda. Não é o que um adolescente faria.
A perna de Henry atirou para fora, como se fosse chutar uma porta
aberta, e balançou o saco para trás e bateu na perna levantada, derrubando
ele — Ele me pegou, Tag - ele gemeu, e Amelie engasgou. Eu acho que eu
estava errado.
— Levante-se amigo. Você chutou com força. Você tem que ver para
onde vai balançar e recuar um pouco, em tempo de chutes e socos.
— David?
Eu quase olhei em volta para ver com quem ela estava falando e, em
seguida, lembrei que era meu próprio nome. Parecia diferente em seus
lábios.
— Sim?
— Você é tão legal. Eu não esperava que você fosse ser tão bom.
— Por quê?
— Porque todas as meninas no bar são tão apaixonadas por você, elas
querem dormir com você, ou elas te odeiam, e mesmo assim elas ainda
querem dormir com você. Eu pensei que você fosse um daqueles tipos bad
boy.
— Oh, eu sou muito ruim. Eu apenas tento não ser um idiota para as
pessoas que não merecem. Eu acho que você poderia dizer que eu sou um
cara com um lado legal.
— Millie?
— Henry e Amelie não são nomes que vocês ouve todos os dias. Eles
soam tipo como nomes antiquados.
— Está certo. Nós ainda vamos parecer desse jeito por mais outros
cem anos. – Isso era um pensamento triste para Henry, mas para Amelie,
nem tanto.
80
— Não. Meu pai não está no quadro. Não falo com ele há anos. Minha
mãe morreu há um tempo. - Ela encolheu os ombros, a diversão
completamente arruinada pela realidade.
— Meu pai não lidou com isso muito bem, quando eu fiquei cega. Duas
crianças com problemas foi demasiados para ele, aparentemente.
Eu sentia isso quando via Moses segurar seu novo bebê pela primeira
vez. Ele e Geórgia eram tão felizes, tão merecedores de toda aquela alegria
em seus rostos que eu tinha transbordado e enchido o meu coração de
perguntas. Eu senti isso há dois anos atrás, quando tinha voltado na quinta
rodada para ganhar a minha primeira grande luta e eu realmente senti isso
uma grande quantidade de vezes ao longo dos últimos anos, vendo Moses
trabalhando, vendo as pessoas chorarem com seu dom. Mas a primeira vez
que esse sentimento tomou conta da minha respiraçao eu estava em Veneza.
Isso foi um ano depois de eu ter saído da Montlake, oito meses desde que
Moses e eu tinhamos virado o mundo. Eu estava tão triste e tão perdido por
tanto tempo que eu tinha me acostumado a não sentir mais nada.
Olhando para baixo para ver Amelie, seu rosto em forma de coração
Anderson, sua boca definia uma linha teimosa, eu tive esse sentimento
novamente. Ele correu através de mim, e pegando minha respiração com
ele.
vezes. Quero dizer, não é nenhum gourmet, mas é para nós dois, e nós
sobrevivemos eu posso verdadeiramente nunca saber se minha roupa esta
rasgada, ou se a casa está realmente limpa, ou se há uma mosca em minha
sopa, mas Henry cuida tão bem de mim como eu tenho cuidado dele.
Certo, era bastante óbvio quem jogava de mãe e quem jogava de filho.
Esta menina foi uma surpresa um minuto.
— Henry e eu somos uma equipe. Você tem Tag Team, certo? Você
entende.
— Oh sim?
— Ele são os olhos. Eu sou o coração. Ele são as mãos, e eu sou o chefe.
Isso é o que minha mãe costumava dizer.
83
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The Song of David/ Amy Harmon
Moses
Ele são os OLHOS e eu sou o coração. Ele são as mãos, e eu sou o chefe.
As palavras se repetiam em meus ouvidos. Millie parecia ser como Tag tinha
me descrito. Eu era os olhos e as mãos de um artista que podia ver o que os
outros não podiam, o que Tag não poderia. Mas ele era o líder, o cabeça e o
coração, e sua cabeça e seu coração tinha fornecido para os meus olhos e as
mãos e tempo outra vez. Tag era todo coração, e às vezes ele se colocava em
apuros, ele entra em apuros com muita frequência, mas ele nos tinha levado
na direção certa. Ele tinha tomado conta de mim. Eu não sabia se eu tinha
cuidado dele no entanto. Eu não pensava que precisava.
— Por que ele deixou, Moses? Onde ele foi? Ninguém o viu por duas
semanas. Ninguém sabe nada. Se ele estava caído por mim, como ele diz,
então por que ele me deixou assim? - Millie foi à beira das lágrimas e eu
tinha recorrido aos desenhos, meus dedos voando sobre um esboço no
papel, isso era louco eu não queria ouvir o meu melhor amigo dizendo
adeus.
Eu tinha chamado o pai de Tag, que chamou a sua mãe, que por sua
vez chamou suas duas irmãs mais jovens que estavam fora da escola. Millie
estava certa. Ninguém sabia nada.
Ninguém tinha visto ou ouvido falar dele desde que ele partiu.
— Será que ele disse ou fez qualquer coisa que mostrasse que ele
84
estava indo? Qualquer coisa que você possa pensar que possa nos dar uma
Página
— Não. Quero dizer, ele parecia cansado, o que era o contrário do que
é , Millie - Respondeu, interrompendo minha deprimente linha de raciocínio.
— Tag nunca parece cansado. Você já reparou que ele tem mais energia do
que qualquer um que eu já conheci? Mas ele estava cansado. Ele tinha
treinado tão duro para a luta de Santos. Um par de noites ele adormeceu no
sofá assistindo TV com Henry. Uma vez, eu o acordei a meia-noite, porque o
nosso sofá é pequeno e ele estava desconfortável. Ele estava desorientado e
tão fora de si que ele estava pronunciando poucas palavras. Se eu não o
conhecesse, eu teria pensado que ele estava bêbado. Mas ele não bebia. Ele
nunca esteve com uma cerveja o tempo todo eu o conheço. E ele estava
dormindo no sofá por três horas.
— Eu não queria que ele dirigisse, eu disse que ele estava com muito
sono para estar dirigindo. Mesmo que fosse apenas alguns quarteirões, mas
ele disse que estava bem. Acompanhei-o para fora para um cego guiando
outro cego. - Sua voz quebrou.
— Não. A última noite que o vi. . . ele e eu. . . - A voz de Millie sumiu
Essa é Georgia, pegava o touro pelos chifres. Era umas das coisas que
eu mais amava nela, uma das coisas que tinham nos salvado quando a nossa
própria história de amor teve algumas voltas trágicas.
um pouco louco. Ele realmente esperou para que o touro perseguisse ele e
Página
então ele perseguiu o touro e quando o touro chegou nele, ele agarrou-o
The Song of David/ Amy Harmon
pelos chifres e fez uma daquelas torções e rolamentos que cowboys fazem
em rodeios.
87
Página
The Song of David/ Amy Harmon
CAPÍTULO CINCO
Era apenas a alguns quarteirões e às vezes Millie andava com ele. Ele
Página
Robin disse que ele não tinha nenhum amigo que ela conhecesse.
Julgando pelos seus lábios, ele tinha chamado atenção de alguém. Eu disse
para Robin que tomaria conta disso. Ela pareceu um pouco surpresa e então
deu de ombros.
— Minha amiga.
Balancei a cabeça.
— Bem eles não te socam por aí a menos que você peça para que eles
façam isso. – eu adicionei pensando em todos os meus amigos na academia
que regularmente me davam tapas por aí.
— Eu disse pra ela que ela parecia um lutador de sumô. – Henry disse
suavemente.
— Você disse isso pra ela? – eu gritei. — Ah Henry. Não me diga que
você disse isso pra ela. – era tudo o que eu podia fazer para não rir.
Cobri minha boca para Henry não ver meus lábios tremendo.
Henry assentiu.
— Henry, por favor, cara. Você não gosta dela porque ela é poderosa. –
eu insisti.
— Então ela socou você quando você disse que ela parecia um lutador
de sumô.
— Porque você disse isso Henry? Ela obviamente não gostou. – eu não
conseguia pensar em uma garota que gostaria.
— Você está errado quanto a isso amigão. Ela é uma lutadora. Ela só é
um tipo diferente de lutadora.
— Sim.
— E ela tem sido legal com você? Antes de te dar um soco na cara eu
digo.
— É ela? – eu perguntei.
— Henry gosta de você. Ele te acha incrível. Ele me contou tudo sobre
você. – ambas as sobrancelhas se ergueram e eu tinha um pressentimento
de que era mais por Henry ter me contado do que o fato de que ele gostava
dela.
Ela olhou para Henry por um minuto, então sua expressão suavizou e
ela voltou a olhar para mim. Henry encostou a testa nos armários como se
toda essa conversa o deixasse tonto.
— Ele sente muito Ayumi. Ele não estava tentando inferir que você
parecia com um lutador de sumô. Ele estava tentado dizer pra você que ele
te admira do mesmo jeito que os japoneses admiram seus lutadores.
— De qualquer forma, ele acha que você é forte. Você obviamente sabe
como dar um soco. – apontei com o olhar para o rosto de Henry e Ayumi
enrubesceu em um profundo vermelho escarlate. Eu percebi que não
precisava dizer mais nada sobre esse assunto. Eu apenas esperava que ela
iria pensar antes de bater no pobre Henry de novo. Porque sendo menina ou
não, ela não podia simplesmente sair por aí socando as pessoas.
bar. Mas eu não me importava mesmo com isso e a razão andava ao meu
lado.
— Não. Eu não posso. Mas para a nossa sorte a minha mãe planejou
bem. Ela tinha uma apólice de seguro de vida, uma boa apólice e a casa era
dela, disponível e limpa. Esteve na família dela desde sempre. E o meu pai
deu uma bolada de dinheiro para ela, talvez você tenha ouvido falar sobre
ele. André Anderson? Ele jogava no time Gigantes de São Francisco. Ele era a
primeira base. Eu não sei o que ele está fazendo agora.
Amelie assentiu.
— Nós achamos que é por isso que Henry se tornou tão fissurado em
esportes. Ele tinha apenas cinco anos quando os meus pais se separaram.
Você sabe como os jogadores estudam um vídeo de uma partida? Bem, o
Henry sabe. A minha mãe tinha discos com tudo, todas as gravações dos
jogos do meu pai, tudo o que ela conseguiu pegar. Henry sentava e assistia
incansavelmente. Ele ainda assiste. Ele consegue narrar partidas inteiras. É
muita loucura!
Ela riu, uma erupção repentina, brilhante que criou uma pluma branca
no ar frígido e que me deixou encarando seu rosto jogado pra trás,
maravilhado, ainda que eu soubesse que eu iria tomar alguma coisa para me
esquentar. Era o meu bar, afinal de contas. Eu era seu empregador. Era a
porcaria do meu pole, pelo amor.
Seu sorriso tinha desaparecido, mas ela não parecia brava. Ela parou
de andar, sua bengala longa esticada como se ela estivesse levando um
animal de estimação imaginário. Então ela levantou a bengala longa e bateu
fortemente na calçada.
— Sim.
— Ser cega vem com uma bengala longa. Não com um Golden
Retriever fofo. Uma bengala longa. E essa bengala significa que eu posso
andar na rua sozinha. Encontrar o caminho até o mercado. Isso significa que
eu posso ir para a escola, para o trabalho, ir ao cinema, sair para comer.
Tudo sozinha. Essa bengala longa significa a liberdade para mim. – ela
respirou profundamente e eu segurei a minha respiração. — Eu acho que
simplesmente substituí a bengala por um pole, e quando eu danço, por
algumas horas, várias noites na semana, eu estou vivendo o meu sonho.
Mesmo que não pareça desse jeito pra você. A minha mãe não teria gostado
disso. Você tem razão nisso. Mas ela não está aqui. E eu tenho que fazer as
minhas próprias escolhas.
– David?
– Sim?
– E qual é?
– A forma que você fala Millie. Foi diretamente para o topo da minha
lista. Prometa-me que você nunca vai me chamar de Amelie de novo.
— Qualquer porcaria não tem o mesmo som que David, mas tudo bem.
– ela brincou.
Ela assentiu, rindo baixinho e dando uma chance para o meu apelido.
— Então Tag.
— Sim Millie?
— Agora?
— Na igreja?
— Na igreja.
— Ok.
— Sim. Porque eu presumiria algo mais? – ela disse sua voz baixa.
O portão abriu e sem se virar novamente para mim, ela entrou pela
porta, quase sem usar sua bengala.
105
Página
The Song of David/ Amy Harmon
CAPÍTULO SEIS
kilt na capa de um livro de romance, do tipo que a minha mãe costumava ler
e colecionar. Isso não importava. Millie não podia ver o meu cabelo longo ou
mesmo a forma com ele forma cachos na altura do meu colarinho. Ela não
podia ver o meu jeans pelo mesmo motivo, então eu não sabia por que me
importava.
— Oi Henry.
Henry encarou.
Disse o cara com um taco na mão e um cabeço que mais parecia uma
bucha queimada.
— Eu não o penteei.
— Sem a Amelie?
Amelie estava usando botas marrons e uma saia justa na cor caqui que
ia até os joelhos, um suéter vermelho justo e um cachecol peludo com listras
vermelhas, pretas e douradas. Eu me perguntei como nesse mundo ela tinha
conseguido combinar tudo isso. Julgando pelo cabelo de Henry, ele não seria
de muita ajuda.
duas vezes desde que a minha mãe faleceu e em ambas as vezes ele chorou o
tempo todo, então ela teve que colocar os cabelos cortados em um saquinho
plástico para que ele guardasse, apenas para que ele se acalmasse.
Eu estava levemente enojado e fiquei feliz por Millie não poder ver a
minha expressão.
— Presumo que sim, embora ele não me diga onde eles estão. Eu pago
a minha vizinha para vir limpar a casa uma vez por semana e ela também
não os encontrou.
— Bem, Henry disse que sim. Então vou seguir com isso. Mas não
iremos voltar com nenhum saco de cabelo pra casa.
A testa de Millie franziu e parecia que ela queria discutir, mas ao invés
disso andou na minha direção sem sua bengala longa que estava encostado
na parede e mudou de assunto.
Não mais do que alguns flocos de neve dispersos que caíam nas
montanhas e congelava os vales, a cidade de Salt Lake aproveitava o mais
suave inverno que já tivemos em anos e embora as temperaturas
110
frequência.
Página
The Song of David/ Amy Harmon
— Obrigada. Eu diria a mesma coisa, mas, bem, você sabe. Você tem
um cheiro bom, embora.
— É o meu favorito.
Enquanto chegávamos mais perto eu podia ver que a igreja era feita
de tijolinhos claros com uma torre branca pontuda e amplas janelas no topo.
Um riacho corria ao norte da igreja e Amelie e eu atravessamos uma ponte
112
— Não.
— Oh eu amo essa!
— É. É sim.
The Song of David/ Amy Harmon
— Você gostou? Agora você ouviu dois dos meus sons preferidos.
— Sim. Eu peguei você. Eu não posso acreditar que você aceitou vir.
Eu percebi que não estava não mais. Mas ela estava, seus lábios rosas
levemente entreabertos sobre dentes brancos, seus olhos em uma distância
que ela nunca veria. Eu sorri para ela, acomodando-a e suas mãos
imediatamente deslizaram para os meus lábios e seus dedos traçaram as
covinhas na minha bochecha. Eu sempre usei as covinhas como o meu
charme total. Quando seu dedo esquerdo deslizou para o entalhe do meu
queixo, seu sorriso cresceu ainda mais.
— Ah. Entendi. – uma mão subiu e traçou o meu nariz. — É isso o que
aconteceu aqui também? – ela perguntou, traçando o inchaço que eu
adquiria varias vezes.
— Cortes de cabelo com o Henry amanhã, né? Isso é muito fofo da sua
parte. Mas não corte tudo ok?
117
sotaque escocês, mas não consegui muito. O meu coração estava martelando
The Song of David/ Amy Harmon
MOSES
Ela era minha. A parte do meu mundo que estava intacto. Ela tinha
chegado na noite anterior com a bebê Kathleen e nós tínhamos reservado
um quarto de hotel, sem querer ficar no apartamento de Tag, embora eu
119
eu não queria dormir na cama de Tag apenas para fazer uma média como
corretor de imóveis para os compradores da cidade.
— Ele amava música. Você alguma vez o ouviu cantar? Eu amava ouvi-
lo cantar.
CAPÍTULO SETE
TAG
— Quer ver Robin ao invés disso? Ela ficaria feliz com isso, Henry. -
Millie o seguiu para fora, fazendo seu caminho na calçada com um franzido
entre suas sobrancelhas escuras. Ela agora segurava a porta do lado de
passageiro. Pude perceber que ela queira ir junto, mas Henry parecia não
querer.
— Isso é uma noite dos caras, certo Henry? Homens vão ao barbeiro.
Não num salão de beleza.
— Henry?
— Tim Lincecum, huh? Ele joga no Giants, não é? Seu time favorito,
certo?
122
As batidas desaceleraram.
***
Fomos na Toys “R” Us5 comprar as pipas. Eles têm a melhor seleção de
coisas para diversão, e nós não queríamos perder tempo. Henry levou uns
minutos escolhendo e ficou com a pipa de LeBron James6. Eu comprei a
única vermelha que achei, que era do Elmo kite7, um monstro feliz e
vermelho me encarando, com seu rosto peludo em forma de diamante.
Henry achou isso engraçado, o que tornou isso ainda melhor.
5
Rede de lojas de brinquedos.
6
Jogador de basquete norte-americano que joga pelo Cleveland Cavaliers da NBA.
123
Página
7
The Song of David/ Amy Harmon
Mas Henry pareceu não achar que era uma pergunta estúpida e voltou
para as pipas de novo. Ele puxou uma rosa brilhante e cintilante de uma
prateleira e me entregou.
— Okay. Não sei o que os árbitros da National Rugby League têm a ver
com Millie. Mas boa escolha.
Franziu a testa, mas não deixou a mão cair. Ela enrolou seus dedos
contra meu couro cabeludo e puxou um pouco, testando o comprimento, e
fiz meu melhor para não começar a ronronar. Henry não. Deixou sua cabeça
cair no ombro dela e fechou os olhos, completamente domesticado.
124
Página
8
Campeonato do esporte Rugby League, também chamado de rugby de 13, que parece de certa forma com o
futebol americano (NFL).
The Song of David/ Amy Harmon
Millie jogou a cabeça para trás e riu, suas mãos caíram para o lado do
corpo.
— Nope. Entendi alto e claro. Temos para você uma rosa. Henry
escolheu.
— Porque tem um cheiro. Um sabor. Toda vez que provo algo rosa me
lembro da cor. Inunda minha memória por um segundo antes de perder isso
de novo.
meus bancos. Diz que é irritante não ter um descanso de braço. Mas Moses
não é um cara muito inteligente, na maioria das vezes. Eu nunca fui mais
Página
The Song of David/ Amy Harmon
grato por meu banco do que nesse momento, com Millie pressionada do
meu lado, com meu tríceps direito encostando contra seus seios cada vez
que eu me mexia. Ele cheirava como frutas. Morango ou melância.
Cheirando como... a cor rosa. O pensamento me fez sorrir. Ela parece como
rosa também. Rosa e suave e doce. Droga. Decidi agora então que rosa
também era minha cor favorita.
— Estou ouvindo!
compreendemos. E posso aceitar isso. É mais fácil que tentar entender tudo.
Página
The Song of David/ Amy Harmon
— Não ouvi nada. Mas senti alguma coisa. É difícil de descrever. Mas
senti algo como uma vibração. A maneira como suas pernas sentem quando
você está esperando o trem passar. Aquela sensação... sabe o que eu quero
dizer?
— Yeah. - Me senti estúpido quando disse isso, mas agora fiquei feliz
128
— Eu já estive por todo o mundo. Vi mais nos meus vinte e seis anos
que muita gente vê na vida toda. Muito mais.
— Não.
— Nunca pensei muito sobre viajar. Não era nem mesmo um sonho.
Página
perdido, um garoto rico, que não tinha a mínima idéia de quem era ou de
que fazer com o resto da minha vida.
Millie não respondeu. Considerando que ela não podia manter contato
visual, ela era a melhor ouvinte que já encontrei. Ela me lembrou um pouco
Moses, como absorvia tudo e não perdia nada. Millie fazia isso. E eu não
tinha certeza como me senti sobre isso. Não queria ela pendurada pelas
coisas erradas, pendurando suas esperanças em algo que eu não quis dizer,
e me sentindo responsável por tudo que saia da minha boca. Eu falava a
verdade com uma camada de besteiras, atiradas só para diversão. Era o
Texas em mim, parte do meu charme. Mas eu não podia ser dessa maneira
com Millie. Eu tinha que falar exatamente o que eu queria dizer, sempre. E
nem sei como eu sabia que isso seria o certo. Mas era. E senti essa
responsabilidade nas minhas entranhas.
pesado para combinar com pipas. — E então conheci Moses. Moses não
tinha nada, mas Moses sabia de tudo. Ele pintava expulsando sua dor. Era
assim que ele lidava. E me deixou ficar por perto. Me deixou entrar. E me
ajudou a ver. Nenhum de nós dois tinha para onde ir. Mas eu tinha dinheiro.
Meus pais ficaram aliviados em me ver sair de cena. Já estavam cansados. De
luto. Entregaram seus cartões de créditos e lavaram as mãos.
— Moses me disse uma vez que não podemos escapar de nós mesmos.
Você pode fugir, se esconder ou morrer. Mas aonde quer que você vá, isso
vai junto. Eu era vazio por dentro durante um longo tempo. E demorou para
descobrir o que me preenchia.
Sem pensar, estendi minha mão e peguei a sua que estava livre, o
gesto foi tão instintivo que segurei a mão dela antes mesmo de perceber o
que eu estava fazendo. Me esqueci de Elmo, a pipa e do carda. E ela também.
Por um minuto nós estávamos envoltos em lugares do passado e memórias
dolorosas. Agarrou minha mão, mas não continuou a falar, obviamente me
esperando terminar minha história.
— Ficamos viajando por mais uns cinco anos. Apenas nos movendo de
132
um lugar para o outro. E terminamos aqui uns anos atrás e finalmente senti
Página
The Song of David/ Amy Harmon
que era hora de ficar parado. Assim nossa jornada começou. E assim foi
onde terminou.
— E você se encontrou?
— Estou sempre procurando. Mas isso não é muito para mim. Sou do
tipo cara superficial.
Ela deu uma risadinha e deslizei minha mão sobre a sua, preocupado
de ter dado a impressão errada. Ela me deixou ir facilmente, mas algo
cintilou pelo seu lindo rosto, e me perguntei se eu estava sendo
completamente honesto depois de tudo.
Henry veio berrando pela grama, tentando me avisar, mas já era tarde
demais. Millie deve ter sentido falta da tensão em sua corda, pois guinchou e
tentou recuperar, se afastando de mim, enrolando e desenrolando,
esperando ter sorte e salvar a situação.
9
Palavra-código para emergência, usada em todo o mundo nas comunicações emitidas por tripulantes de
aeronaves ou de navios, quando estão em situação de risco.
The Song of David/ Amy Harmon
Moses
— Nós estávamos na Irlanda. - Eu disse quando Millie não fez nenhum
movimento para mudar a fita cassete. — Tag pode farejar uma luta. Esse é
seu poder secreto. - Isso e sua capacidade de ir para cama. Mas guardei isso
para mim mesmo. Ela não apreciaria essa habilidade, embora eu tivesse a
sensação que Millie sabia exatamente quem Tag era, com os defeitos e tudo.
Mas talvez porque ela não estava distraída pela maneira como outras
mulheres olhavam para ele, ela podia ver realmente quem era Tag, e me
pareceu interessante dela insistir em chama-lo pelo seu nome, invés do
apelido que ele usava para fazer charme por todo lado.
— Nessa época teve um combate de boxe entre dois lutadores que Tag
tinha ouvido falar e queria ver a luta. Andy Gorman e Tommy Boyle. Tag já
tinha encontrado com Andy, acredite ou não, quando pintei um retrato para
a mãe de Andy. Seu pai tinha falecido no ano anterior, e sua mãe estava
muito desesperada para fazer uma conexão. Andy pensou que eu era um
charlatão, foi disso que me chamou, e nos botou para correr. Tag falou me
defendendo, como sempre, e Andy quebrou seu nariz. Então quando Tag me
disse que ele queria presenciar tudo, não fiquei muito animado com a idéia.
Enfim. Andy ganhou a luta, no entanto. E foi uma grande vitória. Ele bateu
Boyle no primeiro round. Aparentemente as pessoas não ficaram muito
felizes com isso. Andy supostamente deveria ganhar, mas devia prolongar
um pouco a luta, esconder isso. Ele devia dinheiro para algumas pessoas. E
quando não fez o que foi dito, o encurralaram num beco atrás do local e
134
— Ele está se despedindo, Moses. Parece que ele está escrevendo suas
memórias ou algo assim.
CAPÍTULO OITO
Ela nunca queria ir de carro. Nem eu. As noites eram frias, mas não
muito frias, e eu mal podia esperar para que ela segurasse meu braço,
andasse ao meu lado e conversasse comigo. Eu a fazia rir e ela me fazia rir.
Ela me impressionava e eu não precisava tentar para impressionar ela.
136
— Sim. Eu me cortei.
psiquiátrica. A minha mãe chorou o meu pai tinha uma expressão de pedra.
Eles perderam uma filha e lá estava eu tentando morrer também. Eles me
Página
The Song of David/ Amy Harmon
disseram que eu era egoísta. E eu era. Mas eu não sabia como ser diferente.
Eles me deram tudo e tudo não era nunca o suficiente. E isso era
aterrorizante. O vazio é aterrorizante.
— Aham. Você precisa conhecer ele qualquer hora. Sua esposa Georgia
também. Eles são minhas pessoas preferidas do mundo inteiro.
— Eu adoraria.
ao redor da varanda e uma entrada privada ao lado para que Moses pudesse
pintar e conduzir seus negócios sem expor sua família e clientes um para o
Página
outro. Não se parecia em nada com a pequena e triste casa que levava um
The Song of David/ Amy Harmon
passado trágico que tinha visto dezoito meses antes quando Moses e eu
andamos pela cidade em busca de respostas e arrastando fantasmas. Muitos
fantasmas. Não levou muito tempo para que eu percebesse que não queria
ficar em Levan. Não levou muito tempo para Moses decidir que ele não iria
embora. Eu não teria ficado se fosse ele. Eu teria pegado Georgia e
encontrado um novo lugar para recomeçar. Mas às vezes a historia pode ser
magnética e Moses e Georgia, a história deles, a história deles era naquela
cidade.
E Moses não era o único que tinha um trabalho para manter. Georgia
não tinha dinheiro, treinou seus cavalos e era equino-terapeuta, usando
seus animais para se conectarem com as crianças e adultos de uma forma
que ajudava seus corpos e espíritos. A terra em que ela havia crescido se
misturou com a terra da avó de Moses, a terra que ela havia deixado para ele
e eu suponho que fazia muito sentido fazer com que isso funcionasse. Moses
sempre me dizia que você não pode escapar de si mesmo. Eu acho. Eu
apenas me sentia protetor do meu amigo. Eu queria que ele ficasse seguro,
feliz e que fosse aceito e eu me preocupava que as pessoas daquela pequena
cidade de Utah já haviam o apagado de lá. Mas o que eu sabia? Os meus
amigos estavam felizes. Então eu mantive meus medos para mim mesmo.
quanto Georgia era justa e que a seguia com os olhos aonde quer que ela
fosse. Ela me disse uma vez que o tinha domado direito ao lado de Moses,
embora nenhum dos dois soubesse que ela estava ativamente os
dominando.
— O que está rolando cara? – Moses não media as palavras. Ele nunca
media. Se você quisesse conhecer o Moses você tinha que prestar atenção,
porque ele não te dava muito. Você tinha que se forçar a entrar no espaço
141
dele e se recusar a sair quando ele tentasse te empurrar para fora. Foi isso o
Página
que eu tinha feito. Esse era o meu dom. Empurrar, lutar, apegar-se, agarrar,
The Song of David/ Amy Harmon
desgastar. Foi o que Georgia tinha feito também e ela pagou um preço. O
preço pelo amor de Moses e sua devoção era um bem alto. Mas ela pagou. E
em troca Moses a admirou e respeitou.
— O que você quer dizer? – eu fiz uma carranca para o meu melhor
amigo.
— Millie não é o tipo das garotas com quem você... Sai. – Moses
terminou a frase com uma palavra muito mais suave do que a que ambos de
nós dissemos mentalmente em sua longa pausa.
— Não?
Você tem uma capa invisível. Você tem vestido ela a sua vida inteira.
Página
The Song of David/ Amy Harmon
— Você quer a Millie? Você vai ter que tirar a sua capa em algum
ponto e se entregar baby. – Moses disse novamente, sua voz suave, seus
olhos suaves. — Submissão.
— Ela vê muitas coisas. Você que é o cego. Você é cego porque você
tem medo. E você tem medo porque já sabe que é tarde demais. E você
deveria ter medo cara. Ela não vai ser alguém fácil de amar. Ela é um pacote
de acordos. Ela e Henry. Mas que seja Tag. Você nunca foi de amar o amável.
Eu sempre fui menos amável cada vez mais e você praticamente se jogava
em mim. Eu não conseguia te sacudir pra fora. Você gosta de um desafio.
Inferno, você vive por isso.
— Você estava. Assim como eu estou. Você não está pronto? Justo. Mas
não a machuque.
— Porque você pode ser estúpido. – ele sorriu ironicamente para mim
por cima da pequena cabeça de sua filha e eu pensei onde eu poderia soca-lo
sem fazer com que ele a derrubasse.
— A mãe dela está morta. – era uma afirmação, não uma pergunta.
Moses nunca perguntava. Ele não precisava. Seu sorriso tinha sumido e seus
olhos tinham aquela expressão de quando ele estava vendo coisas.
145
Página
The Song of David/ Amy Harmon
— Ela não está esperando nenhum deles, né Moses? – Moses disse que
os espíritos começavam a pairar sobre seus entes queridos quando estes
estavam prestes a morrer, como se esperando por eles para leva-los para
casa.
Moses não ofereceu nada mais e eu deixei pra lá, acostumado com as
particularidades de Moses, com suas habilidades, acostumado com sua
relutância em expor.
MOSES
— Sim.
— Você. Ela se parece com você. Cabelos escuros, olhos azuis, uma boa
estrutura óssea. Eu sabia quem ela era no momento em que a vi. Mas você e
Henry estavam bem ali na minha frente. Não foi difícil fazer a ligação.
harmonização.
Página
The Song of David/ Amy Harmon
— É isso. – eu disse.
— Eles podiam andar nas pontas dos pés atrás de você, mas os
gigantes são muito barulhentos. – Millie terminou, sorrindo. — Na estória os
gigantes se escondem onde se podia ver. Eles estão em todos os lugares que
você olha, mas estão camuflados nas árvores e prédios. Em uma imagem
você achava que estava olhando para um ancoradouro e então percebia que
tinha um gigante deitado na areia. Em outra imagem o gigante tinha formato
de um avião, deitado de costas, seus braços esticados para imitarem as asas,
seus pés virados para cima para simular a cauda. É um livro de encontrar as
figuras. Você sabe, tipo Onde está o Waldo, mas ao invés de minúsculas
figuras em camisetas listradas em vermelho e branco, os gigantes eram
enormes. Mas o artista os desenhou de tal forma que eles simplesmente se
misturam nas imagens.
que a minha bengala era um rastreador de gigantes. Ele andava por aí com
aquilo com os olhos fechados, derrubando e batendo nas coisas.
Página
The Song of David/ Amy Harmon
— Então porque você acha que a sua mãe queria que eu visse esse
livro? – eu perguntei, lembrando-me de sua insistência. — Ela ficava me
mostrando as páginas, as imagens. Ela queria me dizer algo.
— Meu pai foi embora. – Millie ponderou como se não estivesse certa
em como me responder, mas estava disposta a explorar a questão em voz
alta. — Nós paramos de ler aquele livro quando o meu pai foi embora. Ele
jogava para o time de São Francisco, então ele era um “Gigante”. – ela deu de
ombros como que para se convencer de que não tinha sido tão importante.
— Nós sabíamos onde todos os gigantes estavam escondidos no livro. Nós
os havíamos encontrado centenas de vezes. Mas nós não sabíamos onde um
gigante estava. Esse gigante desapareceu de repente. Eu me lembro de ouvir
a minha mãe ler isso para o Henry uma vez pouco depois de ele ter ido
embora. E ela começou a chorar.
Eu queria voltar atrás. Eu não queria mais falar sobre isso. Mas Millie
continuou.
gostava dos caminhões de lixo. – ela sorriu com isso e eu ri por entre os
Página
151
Página
The Song of David/ Amy Harmon
CAPÍTULO NOVE
ergueram as sobrancelhas e sorriram. Eles não foram muito sutis sobre seu
The Song of David/ Amy Harmon
fascínio com Millie, mas era impossível não ficar fascinado. Ela não havia
mostrado qualquer medo, e eu passei a maior parte do dia tentando não
olhar para ela, tentando não alimentar a curiosidade dos meus amigos.
— Como ter olhos. O cavalo sabia para onde ir e eu estava apenas para
o passeio, mas me senti bem.
— Claro que estava. Eu tenho medo o tempo todo. Eu estava com tanto
medo quanto na primeira vez quando perdi minha visão que por um tempo
eu sentei no meu quarto e toquei meu violão. Mas depois de um tempo, eu
percebi que se eu me permitisse estar com muito medo de fazer qualquer
coisa, que eu não seria apenas cega, assim como eu poderia estar morta. Isso
me assustou mais. A única coisa que eu posso ver sou eu, sabe? As coisas
acontecendo dentro de mim. Meus pensamentos, meus sentimentos, meus
medos, minhas falhas. Estas são as únicas coisas que eu vejo claramente. O
resto é um jogo de adivinhação. Ser cega força você chegar a um acordo com
você mesmo, eu acho.
— Bem, eu poderia listar as merdas de ser uma garota cega, mas isso
levaria o dia todo.
Página
The Song of David/ Amy Harmon
— As merdas?
— Sim. Todas as muitas coisas ruins sobre não ser capaz de ver – ela
disse naturalmente.
— O quê?
— Eu não posso ver o que VOCÊ está pensando. Eu não posso olhar
para o seu rosto e conseguir uma pista sobre o que está acontecendo em sua
cabeça. Isto é tão injusto. Eu realmente gostaria de ver o seu rosto. Apenas
só uma vez.
— Você sabe o que é pior? – ela atirou de volta, encorajada por minha
aparente falta de empatia.
— Eu disse para você, você só podia dizer um. Nós não queremos abrir
as comportas, Millie.
— Eu não posso dirigir. Eu não posso fugir. Eu posso andar, mas isso
não é a mesma coisa que apenas ficar atrás do volante e pegá-lo. Em vez
disso, eu tenho que confiar em malvados como você para me levar a lugares.
Eu odeio isso mais do que qualquer coisa – ela bufou.
considerando o meu tamanho, e puxei Millie para meu colo, ignorando a luz
Página
The Song of David/ Amy Harmon
— Eu peguei você, Millie. Eu tenho você. Isso vai ser divertido. Assim
como montar um cavalo com a Georgia segurando as rédeas.
— Está bem?
— Agora, eu vou estar aqui para dizer-lhe o que fazer, e irei ajudá-la a
dirigir, se você começar a nos colocar para fora da estrada.
nervosamente, mas ela não o fez. Ela ficou ouvindo atentamente. Dei-lhe
The Song of David/ Amy Harmon
— Como se sente?
— E dirigindo?
— Isso também. Tudo é mais fácil se você não lutar contra isso.
Ela riu e relaxou um pouco contra mim. Eu a beijei na testa onde ela
descansou contra a minha bochecha, e ela ficou imediatamente dura como
uma tábua mais uma vez.
— Eu teria dado um tapinha em suas costas, mas sua testa estava mais
perto. – eu disse lentamente. — Você está fazendo isso. Você está dirigindo.
— Oh você está voando, baby. Oito quilômetros por hora. Neste ritmo,
Página
vamos chegar em Salt Lake em dois dias, minhas pernas estarão dormentes,
The Song of David/ Amy Harmon
e Henry vai querer uma volta. Dê-lhe um pouco de gás. Vamos ver se
podemos empurrá-lo para dez.
— Oh sim. Foda, Boba Millie. ‘Goin’s ninety miles and hour down a
dead-end street,’ – eu cantei um pouco de Bob Dylan, me divertindo
completamente.
vontade de chorar.
Página
10Pole position é a posição de largada numa corrida automobilística. Danika Patrick, em 2013 foi a
primeira mulher a ganhar esta posição na Copa Nascar de automobilismo.
The Song of David/ Amy Harmon
***
Moses
HAVIA ALGO sobre o cheiro da academia. Tag adorava-o. Ele disse que
cheirava melhor do que o feno fresco, seios de uma mulher, e filé
combinados. E aquelas eram suas coisas favoritas. A academia de Tag
cheirava a suor, água sanitária, e uma pitada de amaciante. Eu não tinha
decidido porque o cheiro amaciante era tão proeminente até que eu percebi
que o calor e suor fez a ascensão do cheiro da roupa. Cheirava saudável,
transpirando sabão e boas intenções misturadas com uma boa dose de
testosterona e excesso de confiança. Cheirava como Tag.
Tag manteve música tocando o tempo todo, mas suas escolhas eram
interessantes, um pouco de Merle Haggard, um pouco mais de Metallica,
intercaladas com canções de Michael Jackson, Neil Diamond e The Killers,
apenas para animar as coisas. Ele tinha gostos ecléticos. Isso, e ele teve um
curto espaço de atenção.
159
academia e trabalhava fora, com Tag quase todos os dias. Isto foi confortável
The Song of David/ Amy Harmon
para mim, as pessoas, a atmosfera, tudo isso e quando eu entrei nas portas
dianteiras, fui recebido por todos os lados com entusiasmo e curiosidade
óbvia, o que era bastante normal para mim.
coisa. Axel não esperou por mim para começar a reunião improvisada. Ele
Página
The Song of David/ Amy Harmon
apontou para a parede, para uma agenda para o próximo mês, que foi toda
preenchida.
— Essa é a escrita de Tag. Ele deve ter vindo aqui em algum momento
na semana passada e escreveu nela. Ninguém o viu, e eu não achei nada
disso quando falamos pela primeira vez, Moses. A programação está sempre
atualizada, sempre escrita com um mês de antecedência. Não me ocorreu
que ele poderia entrar. – Axel deu de ombros. — Isso me fez sentir um
pouco melhor. Pelo menos ele não está deitado sobre o lado da estrada em
algum lugar, entende?
Aquiesço.
— Leo viu-o pela última vez, mas isso foi há quase três semanas atrás
agora. – disse Axel. Ele já me disse muito, mas uma recapitulação não faria
mal.
— Leo levou-o para o hospital para obter alguns pontos depois de ter
derrubado um bagunceiro no bar – eu resumi. — Leo também o levou de
volta para casa. Millie o viu depois disso. Ele passou a noite lá.
— O quê? – perguntei.
por ele.
Página
11No original a personagem falou feck em vez de fuck, assim mesmo não se expressando corretamente
o Moses entendeu o que ele queria dizer.
The Song of David/ Amy Harmon
— Liguei. Ele nunca apareceu lá, e ele nunca disse a eles que ele estava
vindo em primeiro lugar, então eles não estavam esperando-o.
— Ele estava indo de carro para Dallas? Isso é uma longa viagem. Dois
dias de viagem, em cada sentido. Finalmente. Muitos quilômetros para
cobrir. Você chamou a polícia rodoviária? – perguntou Mikey.
Eu balancei minha cabeça. — Sim. Mas eu acho que ele nunca teve a
intenção de ir a Dallas. Acho que ele estava apenas comprando o próprio
tempo. Esta papelada está datada seis dias atrás.
ninguém em particular.
Página
The Song of David/ Amy Harmon
— Tag fez Vince de gerente cerca de três semanas atrás, e Leo foi
promovido também. Mas Vince disse que o nome de Tag não está em
qualquer lugar na agenda de exercícios mais. Ele pensou que era apenas
porque Tag estava cansado de trabalhar tantas horas. Ele estava colocando
em um grupo com Morgan fora. – acrescentou Axel.
— Então, ninguém tem realmente falado com ele ou o visto por pelo
menos duas semanas, e Millie o viu pela última vez? – Axel reiterou,
passando as mãos pelos cabelos. Seu cabelo louro cortado não se moveu.
— Parece-me que seu advogado o viu pela última vez, – eu disse, ainda
enrolando os papéis agarrei em minhas mãos.
— Como está Millie? – perguntou Mikey. — O que ela diz sobre tudo
isso?
— Ela não está dizendo isso, mas eu tenho certeza que ela pensa que ela é a
Página
— Não. – Axel balançou a cabeça. — Não. Isso não faz nenhum sentido.
Eu vi seu rosto quando Henry entrou no bar naquela noite. Foi perto de
fechar, e eu estava permanecendo na companhia de Tag um pouco. Henry
veio voando pela porta, os pés descalços, não vestindo um casaco. Ele tinha
corrido todo o caminho lá, e ele estava pirando.
— Nós não sabemos. Você conhece Henry. Ele fala de esportes sem
importância. É muito duro para se comunicar com ele. Mas ele não parava
de dizer algo sobre Millie, e algo tinha, obviamente, colocado fora. Eu nunca
vi Tag parecer assim. Ele deixou Henry comigo e estava fora da porta em
cerca de dez segundos. Você não deixa uma menina que inspira esse tipo de
reação. Todos nós demos a Tag um momento ruim sobre suas mulheres.
Mas Millie é diferente.
CAPÍTULO DEZ
— Millie!
sangue que iam da porta até o andar de cima pelas escadas, um degrau
Página
Millie tinha fones de ouvido nas orelhas e sua cabeça balançava como
se ela estivesse apenas descansando ao invés de estar sangrando. Ela tinha
envolvido alguns dedos em uma toalhinha maltrapilha e estava apertando-
os bem forte. Seus olhos estavam abertos, encarando cegamente o nada e ela
167
— Amelie. – eu rosnei.
— David? – ela chorou, mas sua voz carregava mais surpresa do que
dor.
— A casa está um breu, há uma trilha de sangue por toda a escada até
aqui, esse banheiro faz parecer que você tentou se suicidar e você sentada
aqui tranquila ouvindo o seu iPod.
— Eu cortei o dedo. Eu não acho que está tão ruim assim. Está
latejando um pouco, mas é só isso. Estava sangrando muito então eu estou
apenas esperando parar um pouco para colocar um band-aid.
— Tarde demais.
— O quê?
— Você o assustou pra valer Millie. Henry foi até o bar de pijamas,
balbuciando alguma coisa sobre sangue e o número de pontos em uma bola
de baseball. Ele estava completamente apavorado. Eu achei que algo terrível
tinha acontecido com você. Eu não sabia o que iria encontrar. – De repente
eu senti o banheiro girar e sentei no vaso sanitário antes de desmaiar e criar
um outro tipo de emergência.
de espelho acima da pia. Eu podia ver onde Amelie tinha procurado pelas
digitais de sangue e os respingos nos itens que estavam derrubados nas
Página
The Song of David/ Amy Harmon
— O Axel estava no bar. Ele gosta de Axel então eu o deixei com ele até
que eu pudesse ver o que tinha acontecido. Você me assustou pra caramba
Amelie. – digitei uma mensagem no meu celular, um breve texto para Axel
dizendo que Millie estava bem e que eu iria voltar para buscar Henry em
breve.
— Shh Millie. Eu não estou bravo. Eu não estou bravo. Apenas... vem
aqui. – eu a peguei no colo e a posicionei em frente à pia, fazendo um
curativo em seu dedo. Havia sangue escorrido pelos seus braços e um pouco
em suas pernas também. Eu molhei a toalhinha que ela tinha usado para
estancar o fluxo de sangue, torcendo-o até que a água quente escorresse
limpa. Então a usei para gentilmente limpar o sangue de suas mãos,
tentando não notar a forma com que sua pele se arrepiava, eu continuei em
seus antebraços e então subi limpando um respingo em seu ombro
esquerdo e uma mancha em seu queixo. O banheiro era pequeno, o ato,
íntimo e a frustração e medo eu senti desaparecer junto com as manchas de
170
a pele dela e quando eu ajoelhei para limpar seu pé, ela colocou as mãos nos
The Song of David/ Amy Harmon
— Sim.
— Prática.
— Mas é claro. – ela sorri, mas sua voz era quase como um sussurro,
quase como se ela também estivesse com medo de dissipar o ar carregado
que zunia ao nosso redor. Fiquei em pé deixando apenas alguns centímetros
de distância entre nossos corpos.
A minha voz era suave, até mesmo mais suave do que as minhas mãos
tinham sido ao limpar o sangue do corpo dela.
— Quando eu tinha dezoito anos. Ela já estava doente havia dois anos.
Mas ela sabia que tinha que ser forte até o fim. Eu tive que ser emancipada
para poder ser a guardiã legal de Henry.
tenha sido o suficiente. Talvez tenha sido mesmo porque ela não esperou
para que os meus lábios respondessem.
Seus lábios eram suaves, sua boca era levemente doce e por alguns
segundos eu estava consciente de todos os pequenos detalhes, o raspar do
meu queixo com a barba por fazer em sua bochecha macia enquanto a
minha boca sussurrava sobre a dela, o sedoso calor de sua respiração
engatando em antecipação, uma mexa do cabelo dela fazendo cócegas no
meu rosto enquanto eu aplicava uma gentil pressão em seus lábios. E então
ela se inclinou para mim voraz, pedindo mais e os detalhes ficaram turvos
com a inebriante experiência de desejar e ser desejado.
— Tudo bem. Ele tem passado por maus bocados. Ele não tem
nenhuma razão para esperar boas notícias, pobre criança. – eu disse com a
voz baixa para que somente ele ouvisse. Axel assentiu novamente e,
soltando a minha mão, saiu pela porta se despedindo de Henry que levantou
a mão, mas não moveu a cabeça do ombro de Millie.
— Sim. Henry está bem. E você? – sua voz estava tímida. Eu não
respondi de imediato e ela me esperou, escutando eu lavar as mãos e
desligar a água antes de finalmente responder.
— Obrigada David. Eu não sei por que você é tão bom pra gente. Mas
você é. E eu não vou questionar isso. Eu vou ser apenas grata. – senti a
pressão de seu corpo contra minhas costas enquanto seus braços se
apertaram ao meu redor brevemente. Então ela deu um passo para trás,
soltando-me e eu me entreguei ao desejo que me incendiou como um
maçarico, apenas para praguejar pelo calor, virando-me para ela, fechando a
porta e a empurrando contra ela.
— Droga Millie! – eu rosnei em seu cabelo. — Porque você tem que ser
tão doce droga? – meus lábios estavam em sua testa, em sua bochecha,
esfregando o nariz em seu pescoço antes de encontrar sua boca e eu me
esquecer de ser gentil.
Ela se igualou ao meu fervor, mordendo meu lábio inferior antes que
eu lambesse o interior de sua boca e senti um tremor percorrer seu corpo.
Eu queria sentir sua pele nua na minha, deitá-la no chão e jogar nossas
roupas pro lado, mas eu contive minhas mãos acima da sua cabeça ao invés
disso, segurando a porta para que eu não a tocasse, para que eu não
começasse algo que eu não me importava em terminar. E eu terminaria se
eu começasse. Se eu a visse deitada em baixo de mim outra vez, seus cabelos
espalhados ao redor de sua cabeça e corpo, suas mãos me puxando para ela,
eu terminaria. E eu não podia chegar lá. Ainda não. Talvez nunca. Porque,
179
fodidamente CEGA, não era o tipo de garota com quem você cedia por
The Song of David/ Amy Harmon
diversão. Ela não era o tipo de garota que você brincava. Eu tinha flertado.
Eu tinha. Mas eu não tinha prejudicado. Ela disse que não precisava de
garantias, mas com toda a certeza do inferno ela precisava. Com toda a
certeza do inferno ela merecia isso. E eu não tinha chegado lá ainda. O meu
corpo sim. O meu corpo tinha chegado lá inúmeras vezes. O meu corpo
estava correndo em círculos em volta do meu coração, furioso comigo,
zombando de mim, suplicando para que eu seguisse com o programa.
Eu meio ri, meio rosnei pela sua insolência e beijei o topo de sua
cabeça. A risada fez a bola de tensão no meu estomago explodir e eu exalei
aquilo em um longo suspiro.
— Não Millie. Eu não sou virgem. Não sou há muito tempo. Você é? –
eu repeti a pergunta.
— Não.
180
— Me entregam?
— Sim. Nunca jogue pôquer coração. – dei um passo para trás, meus
braços pendendo para o lado, imitando a postura dela. Eu puxei Millie para
frente para que eu pudesse abrir a porta em que ela ainda estava apoiada.
— Ele nunca, jamais contatou vocês? Nem mesmo depois que a mãe de
vocês faleceu?
182
Página
The Song of David/ Amy Harmon
CAPITULO 11
MOSES
Eu nunca conheci meu pai. Nunca conheci minha mãe, se for falar a
verdade. Eu sabia quem ela era embora. Sabia seu nome, sua vida, família,
pontos fracos. Seu nome era Jennifer Wright, cabelos loiros, olhos azuis,
garota branca com vício em crack. Ela me teve, ela me deixou, e ela morreu.
Tivemos um relacionamento de três dias que não incluíram troca de
informações importantes, e ela era a única que sabia quem meu pai era. Ele
tinha pele escura, que herdei bastante, e isso era tudo que eu tinha.
Millie sabia quem seu pai era. Ele sabia quem ela era. Sabia onde
estava. Mas ele escolheu se distanciar dela e de seu filho, e me perguntei se
isso não seria pior. O mais provável é que meu pai nem tinha a menor idéia.
Mais provável que não tinha escolhido me abandonar. Eu poderia dar a ele
pelo menos o benefício da dúvida. Henry e Millie não tinham esse luxo.
Pisei para fora da sala quando Tag desceu correndo pela casa,
183
seguindo um rastro de sangue. Isso fez minhas mãos coçarem e minha nuca
quente, suas descrições e sentimentos me lembraram do tempo que
Página
caminhei pela minha própria casa para encontrar a tragédia que se atingira.
The Song of David/ Amy Harmon
Além disso, eu tinha notado o calor na pele de Millie e a maneira como seu
dedo pairou sobre os botões do gravador, como se estivesse se preparando
dar stop quando as coisas ficassem pessoais demais. Georgia me seguiu do
quarto, embora Millie deve ter nos escutado, e não parou. Até Henry
desocupou a sala com a gente, nos arrastando para a cozinha. Ele não disse
nada sobre a ausência de Tag, sem questionamentos, e me perguntei o
quanto Millie disse a ele. E não estava ouvindo as fitas de Tag. Quando não
estava na escola, se sentava com fones de ouvido na cabeça, ouvindo
podcasts12, assistindo vídeos do youtube, ou no seu quarto jogando Xbox, se
encasulando em suas próprias atividades.
12
Página
É uma forma de transmissão de arquivos multimídia na Internet criados pelos próprios usuários. Onde
disponibilizam listas e seleções de músicas ou simplesmente conversam. Pense no podcast como um blog, só que
ao invés de escrever, as pessoas falam.
The Song of David/ Amy Harmon
— Bem, Kathleen está com fome e chili dogs não estão no seu menu. -
Georgia replicou, colocando Kathleen no assento sobre o balcão e cavocando
um saco transbordando por todos os lados, procurando algo para alimentá-
la. Kathleen soltou um berro de impaciência.
— Uhh não. Não parece. Não mesmo. - Gaguejei, não sabendo mais o
que falar.
— Ela pode até não se parecer com você. Mas definitivamente tem sua
disposição ensolarada. - Georgia zombou, mas se inclinou para mim quanto
deixei cair um beijo em seus lábios. Não machucou nada meus sentimentos
que minha garota bebê de covinhas se parecia mais com a mãe.
— Vê? - Ele segurava uma foto em sua mão, e acenou para meu rosto.
— Não me pareço com meu pai também.
— Você está certo. Você e Millie se parecem mais com sua mãe. - Disse,
entregando a foto de volta. Eu não gostava de fotos. Fotos raramente dizem
a verdade. Elas eram como lascas de ouro no isopor, fazendo as coisas
parecerem brilhantes e luminosas, disfarçando a fragilidade por baixo. Uma
foto pode valer mais que mil palavras, mas ainda assim não valiam porra
nenhuma.
186
— Isso porque passamos mais tempo com ela. - Henry disse sério,
como se fosse um conhecimento comum, como se as semelhanças fossem
Página
The Song of David/ Amy Harmon
— Então se eu passar mais tempo com Kathleen, você acha que ela vai
começar a se parecer comigo? - O perguntei, tirando o foco para longe da
foto do pai.
— Ouviu isso, Georgia? Henry espera que sim. - Cantei. — Acho que
isso significa que o pai do bebê é um homem lindo.
— Se ela se parecer com você, todos saberão que você é o pai dela. -
Henry disse perfeitamente com a voz no mesmo tom, e olhos solenes. — E
isso vai fazê-la feliz.
— É por isso que vou para a academia. Quero parecer que nem Tag. -
Acrescentou para ninguém em particular. Largou a foto e colocou chilli nos
quatro pratos, entregando um para mim e colocando o de Georgia longe do
187
alcance de Kathleen. Antes dele comer, levou o quarto prato para a sala de
Página
estar, e nós ouvimos a pausa na fita e Millie e agradecendo seu irmão. Henry
The Song of David/ Amy Harmon
voltou para dentro da cozinha sem o chilli, sem nenhuma palavra, e partiu
para seu jantar. Ficamos todos em silêncio assim que a voz de Tag retomou
seu conto.
***
TAG
coisas. Sempre fui mais físico, mas inclinado a abraçar do que segurar, mais
a tocar do que falar, embora eu faça ambos.
Página
The Song of David/ Amy Harmon
Nunca conheci alguém como ela, mas sentia como se sempre a tivesse
conhecido. E desde o momento que olhei para seu rosto e senti um choque
de ode-à-alegria13 e puta-merda, fiquei caindo, caindo, caindo, incapaz de
me parar, incapaz de desviar o olhar, impotente de fazer a coisa mais
inteligente. E a coisa mais inteligente, era tipo ficar longe. Mas ninguém
nunca me acusou de ser particularmente inteligente. Ela estava parada,
perfeitamente imóvel no centro da sala lotada, pessoas pulando e balançado
ao seu entorno, seus olhos abertos e cegos. Mas abertos. Sua calma chamou
meu olhar. Sua postura de bailarina, reta e inflexível, queixo alto, mãos
soltas do seu lado. Ela estava esperando alguma coisa. Ou apenas
absorvendo tudo. Eu não sabia, mas não pude desviar o olhar. Todo mundo
agitado ao seu redor e quase ninguém parecia vê-la, exceto poucos que
189
atiraram um exasperado olhar para seu rosto sério assim que passavam
13
Página
Ode à Alegria ou Hino à Alegria é o nome de um poema de Friedrich Schiller e cantado no quarto movimento da
9.ª sinfonia de Beethoven. O poema faz uma verdadeira exaltação à fraternidade humana e nos faz vislumbrar no
futuro um mundo onde seremos um só povo.
The Song of David/ Amy Harmon
espremido por ela, e depois percebiam que ela não era “normal” e saiam
rapidamente. Por que ninguém a viu, mas ela foi a primeira coisa que vi? Seu
vestido azul. Um pálido azul bebê que fez seus olhos da mesma cor. Seu
cabelo brilhando, lábios vermelhos, segurando sua bengala como uma
stripper segurando seu poli, balançando ao som da música como se quisesse
dançar. Ela nunca deve ter ido nesse bar antes. Eu teria notado ela.
Já fazia quase uma semana desde nosso beijo. Millie tinha trabalhado
seus turnos, como de costume, e foi ela mesma sorrindo, calma e serena,
modesta e independente. Achei que com certeza eu devia dar explicações.
Alguma tranquilização. Mas Millie parecia inalterada. Ou talvez ela tenha
apenas entendido. Eu não sabia, mas fiquei simultaneamente grato e
ofendido que não fez nenhuma tentativa de me rebaixar. Em vez disso,
caminhei para sua casa, como fiz uma dúzia de vezes antes, e conversamos
como velhos amigos, embora me encontrei olhando por mais tempo para
ela, olhando sua boca, pensando nela quando não estávamos juntos. Estar
com Millie me estragou um pouco. Eu nunca tive que guardar meus
sentimentos ou controlar minha expressão. Eu podia olhar para ela como
um homem olha uma amante, e ela não tinha idéia. Não tinha idéia que
estava a observado agora, embora esperasse como o inferno que ela viesse
para mim.
Peguei sua bengala e coloquei de lado. Então coloquei minha mão na sua
cintura, e coloquei sua mão na minha. Eu era um garoto rico, não era? Minha
Página
The Song of David/ Amy Harmon
E eu acreditei nele.
— Ela não vai me deixar ir. - Cantei. — Ela não vai me deixar ir14.
Cantei com ela, meus lábios contra os cabelos de Millie. Ela inclinou o
rosto para cima, ouvindo enquanto nos movemos. Em seguida a canção se
transformou em outra, depois outra, três, quatro e então outra. Tinha que
fazer uma nota pelas dicas do meu DJ. Ele sabia o que estava fazendo. E eu
sabia cada palavra de cada canção.
14
Música “Trouble” do cantor Ray LaMontagne.
The Song of David/ Amy Harmon
— Tag! Quero minha vez! Quem diria que você sabe dançar, baby? -
Balbuciou, toda pegajosa e perfume de baunilha. Ela se aconchegou do meu
lado e abraçou meus bíceps, como se eu já não estivesse dançando com
outra mulher.
— Ela vai ficar bem, Tag. - Brittney cantarolou. Ela estava obviamente
bem ciente que Millie era cega.
A sua mão ainda estava na minha, mas nossos corpos não estavam
mais alinhados pela dança. Eu não queria sair da pista. Não queria ter agido
como se a interrupção de Brittney fosse nada. O DJ fez o que podia, me
dando três músicas sensuais na sequência. Talvez pensando que estava me
ajudando de novo colocando Justin Timberlake a toda, Sexy Black fazendo
meus dentes vibrarem e incitando as pessoas a irem até o chão, criando uma
barreira entre Millie e eu do resto da audiência, embora não tanto. Eu
precisava de uma desculpa para puxar Millie para perto novamente, e não
tinha certeza se ela estaria disposta a entrar na dança se esfregando e
moendo como JT exigia. Dei um passo para ela para nossos corpos se
tocarem, e coloquei meus lábios nos seus ouvidos para que pudesse me
ouvir por cima da música.
— Yeah. Estão.
bartender parecia ter tudo na mão. Millie ficou parada esperando por mim,
segurando sua bengala, e agarrei seu casaco e nós saímos pela porta dos
Página
The Song of David/ Amy Harmon
— Pelo que?
— Eu sei.
— E isso te incomoda?
Engoli em seco.
pele brilhar.
Página
The Song of David/ Amy Harmon
— Brittney foi rude. E ela foi rude por causa de quem eu sou, não por
causa de quem você é. Entende isso, certo?
— Todos quem?
Eu ri disso.
— Por quê?
— Por você gastar seu tempo comigo. Dançando comigo. Indo embora
comigo. Você me acompanha para casa todas as noites.
Esperei.
— Admito. Sou um pouco confusa, David. - Sua voz era suave, mas não
tímida. Millie não era tímida, e eu adorava isso nela.
— Então é por isso que Moses e Georgia não queriam o nome Kathleen
Taglee? Fiquei tão magoado.
— Querido. Amado.
— Humm. Por que você não? - Puta merda. Eu tinha de parar de fazer
isso.
198
15
Nativos ou residentes do estado de Utah dos EUA.
The Song of David/ Amy Harmon
— Trabalho?
— Te levo.
casaco e puxou seu cabelo da gola, e observei, com meu intestino agitado.
The Song of David/ Amy Harmon
Não gostava dela caminhado sozinha para casa as onze da noite. Ela ajeitou
sua bengala e segurou a garrafa de água vazia na sua frente, obviamente
querendo que eu pegasse. Assim que fiz, minha mão roçou a sua e nós dois
pulamos como se não estivéssemos passado a última hora dançando, com
nossos corpos pressionados juntos.
— Sobre o quê?
Henry: Amelie está em casa. Seu rosto está triste. Mohammed Ali
praticava abstinência seis meses antes de suas lutas.
201
Página
The Song of David/ Amy Harmon
CAPITULO DOZE
TAG
16
Manobra comum do wrestling (estilo de luta livre) realizada em pé. A ideia é ganhar uma posição vantajosa sobre
o oponente ao colocar a sua cabeça embaixo do cotovelo/tríceps e se mover para o lado ou para trás.
The Song of David/ Amy Harmon
forma, que era terrível, toda vez que ele tentava executar um movimento.
Sua mandíbula estava tensa, seus movimentos desengonçados, e parecia que
estava à beira de lágrimas.
17
Também conhecido como baiana, é uma das derrubadas mais populares do wrestling (estilo de luta livre).
The Song of David/ Amy Harmon
— Henry, supero você uns quarenta e cinco quilos. Você não pode
lutar comigo, garoto!
— Você vai ter que me explicar qual é o problema, Henry. -Tirei a mão
de sua cabeça e deixei ele vir de volta para mim. Quando começou a
esmurrar meu peito, envolvi os braços em torno dele, prendendo os seus.
Imediatamente começou a me dar cabeçadas, embora o topo de sua cabeça
mal alcançasse meu queixo. Joguei minha cabeça para baixo, prendendo a
sua entre meu rosto e ombro, da maneira como os pugilistas faziam quando
estavam tentando enrolar, e tentando recuperar seu fôlego, e eu estava
tentando os dois enquanto me esforçava para descobrir o porquê de Henry
estar com tanta raiva de um jogador de basquete 2,31m de altura.
— Yeah. Ele está. Você sabia que o avô do Manute Bol tinha quarenta
esposas? - Quase comecei a rir. A forma como Henry se comunicava era
frustrante.
— O quê? Eu não...
205
— Vai se ferrar, Tag. - Henry disse, muito claro, tão simples, que quase
aplaudi sua resposta direta sem complicações. Mas a celebração morreu na
minha garganta assim que eu registrei o que ele disse e a finalidade com que
ele disse isso. Henry continuou caminhando na direção de sua casa, e só
assisti ele ir embora.
***
Bati na porta dos Anderson um pouco depois das sete num domingo
ao anoitecer, mas tive que ter persistência até alguém atender. Eu quase
tinha desistido, quando Henry abriu a porta e hesitou, como se não tivesse
certeza se me recebia ou não.
— Posso entrar?
The Song of David/ Amy Harmon
— Em que round nós estamos então, cara? Não acho que posso ir a
cem rounds com você. Desisto. Você venceu.
— Amelie é especial. Ela não é como as outras garotas. Ela não é como
qualquer uma das garotas que já gostei. E eu gosto dela, Henry. Gosto muito
dela. Mas tem uma responsabilidade extra que vem ao amar alguém que vai
precisar de você de diferentes maneiras, quem você vai confiar de diferentes
maneiras. Eu tenho que ter certeza se estou pronto para ter essa
responsabilidade. Você entende?
207
18
Página
O personagem usa originalmente a expressão “tap-outs”, que no mundo da luta aqui no brasil quer dizer “bater”,
gíria essa que significa desistir de uma luta quando se entende por demasiado o dano físico prestes a ser imposto.
A maneira mais comum de fazê-lo é bater três vezes com a palma da mão no chão ou no corpo do adversário.
The Song of David/ Amy Harmon
Henry começou a sorrir, seus olhos foram para mim antes ceder,
fazendo sons de porcos.
— Você que é! - Ri com ele. — Acho que essa é a primeira vez que ouvi
você fazer uma piada! - Fui na sua direção arremessando meu braço ao
redor de seu pescoço, mas ele executou um duck-under e foi para as minhas
pernas, assim como Cory tinha o ensinado. Gritei me inclinando sobre ele e
envolvendo meus braços ao redor de seu magro traseiro, levantando suas
pernas do chão, com seus braços ainda enrolados na minha coxa, o deixando
pendurado de cabeça para baixo.
— St. Pierre! - Rugi, balançando ele mais para alto. — Diga Tag é o
melhor lutador no universo.
19
Termo usado no UFC (Ultimate Fighting Championship) para elencar os melhores lutadores, independente da
categoria de peso, do mundo. Atualmente quem está em primeiro lugar é o brasileiro José Aldo.
The Song of David/ Amy Harmon
Millie pelos pulsos e a puxou para frente. Robin moveu as mãos de Millie
para cima e para baixo sobre seu corpo, com naturalidade, a permitindo
Página
The Song of David/ Amy Harmon
— Eu desejaria poder tocar Tag assim. Desejaria que fosse okay pedir
coisas como isso. Quero dizer, já senti ele sorrir... mas eu queria sentir o
resto do seu corpo. - Millie deixou escapar, como se essa confissão estivesse
transbordando.
— Estou tentando não ser, Robin. Sei que ele tem braços fortes. Sei
que tem covinhas nas bochechas e uma covinha no queixo. Sei que ele tem
um nariz um pouco torto. Sei que seu corpo é duro e seus lábios macios. E eu
sei que tem mãos grandes e calejadas.
20
The Song of David/ Amy Harmon
Desejei mais do que qualquer coisa que Robin não esteja entre nós
nesse momento. Desejei poder andar até lá, colocar meus braços ao redor de
213
Mas ali, ouvindo confessando, eu não podia ignorar isso mais. Não
podia. Não podia fingir que eu tinha mais tempo para decidir. O tempo
esgotou, e eu tinha que escolher.
Millie me chamou naquela noite e limpei todo o sangue de sua pele dei
um beijo inocente. Inocente Millie. Mas não era inocente em tudo. Ela sabia o
214
imperdoável, ela tinha dito, me provocando. Beijar uma garota cega não era
imperdoável. Ama-la não era imperdoável também. Mas ama-la e
desaponta-la... isso era imperdoável para mim. Isso foi imperdoável. Essa foi
a parte com que lutei.
A música retornou, mas dessa vez a melodia era mais lenta, mais
triste, uma música para ouvir ao invés de dançar. Era a música de Damien
Rice chamada “The Blower’s Daughter”, e me agradou que Millie soubesse
disso também, a descoberta me fez sentir esperança em um “se-nós-
amavámos-a-mesma-música-nossos-corações-devem-se-corresponder” de
alguma maneira. Me levantei, grato pelo barulho da música encobrir minha
subida, mas Robin virou a esquina antes que eu pudesse dar o primeiro
passo.
— Quero que você grite nas escadas. Diga a ela que estou aqui. Diga
que estou descendo. - Mandei.
— Você está certa sobre mim, sabe. - Disse, dando uma resposta
indireta. — Eu gosto de mulheres. Gosto muito. Especialmente mulheres
bonitas. E nunca estive interessado em ter somente uma. Nunca tive uma
namorada. Nunca houve uma garota que manteve minha atenção. Até agora.
Eu não podia prometer um futuro sem merdas. Não podia nem mesmo
prometer que não ia causar alguma. Não consigo alterar meu DNA, e eu
tinha certeza que havias fitas embebecidas disso. Mas eu estava
determinado a proteger Millie o máximo que podia. Lancei um olhar por
cima do ombro e assenti com a cabeça uma vez para a protetora prima de
Millie, uma confirmação de que eu já tinha sido avisado por ela, e Robin
fechou a porta, nos dando a privacidade de que eu não tinha oferecido a elas.
seus ombros em desordem. Mas ela não alisou para baixo ou puxou suas
Página
— David? - Arriscou suavemente. O fato de que ela sabia que era eu,
me fez ficar de novo tonto.
— Sou o único cara que faz tanto barulho quando vem descendo os
degraus? - Eu propositalmente fiz barulho da segunda vez.
Fiquei a um passo dela e estendi a mão, tomando umas das suas nas
minhas.
— Accidental Babies.
— É outra música de Damien ... e acho que gosto dela ainda mais. - Ela
Página
sussurrou de volta.
The Song of David/ Amy Harmon
Finalmente, como se ela não pudesse resistir mais, levantou suas mãos
da minha cintura. Dedos trêmulos e mãos espalmadas deslizaram pelo meu
abdômen, subindo para meu peito, passando pelos ombros, progredindo
lentamente, como se ela memorizasse cada movimento. Então tocou meu
rosto e seus polegares encontraram a fenda no meu queixo, da mesma
maneira quando eles traçaram pela primeira vez meu sorriso. Hesitante,
puxou meu rosto para baixo, na sua direção. Um batimento cardíaco antes
que nossas bocas se tocaram, suaves palavras vibraram contra meus lábios.
219
Página
The Song of David/ Amy Harmon
CAPITULO TREZE
Moses
Sentei na varanda da casa de Millie com Kathleen num balanço de
ferro forjado que provavelmente estava lá desde que a casa foi construída
há mais de um século. Eu tinha abandonado a audição dos cassetes
completamente. Tag não estava segurando nada. Cada detalhe, cada
pensamento, cada sentimento era colocado para fora.
Henry tinha recuado para o seu quarto. Já era tarde e estávamos todos
cansados. Mas Millie não conseguia parar de ouvir, e eu não poderia culpá-
la. O barulho da fita rolando era vivificador, e eu queria apenas saltar à
frente, e me ater a última fita, mas não tinha esse direito. E conhecendo Tag,
sabia que não seria tão fácil.
repente sentado na varanda da frente, podia ouvir cada palavra mais uma
Página
The Song of David/ Amy Harmon
vez, e ouvia como meu amigo se esforçou para colocar em palavras o que eu
só poderia descrever com tinta.
Então percebi que Millie tinha mudado a cassete. Era apenas a voz de
Tag que vinha através da janela, nada mais, e amaldiçoei mais uma vez.
TAG
221
— Tenho medo do escuro, então acho que vou ter que esperar até de
manhã. - Sussurrei. Estava tentando fazê-la rir, mas de alguma forma as
palavras soaram verdadeiras e eu estremeci, grato que ela não podia ver-me
fazê-lo. Mas ela estava muito em sintonia com as nuances da voz de uma
pessoa para perder isto. Ela endureceu um pouco. Senti apenas um tremor
que percorreu seus braços, até as mãos descansando em meu peito.
— Entendo. Não vou fazer você dormir comigo no meu caixão então.
Concordei com a cabeça e beijei sua testa porque ela era tão séria e
doce.
— Mais embaixo.
Engoli em seco quando suas mãos deslizaram pelo meu peito e meu
peito e abdômen, seus dedos roçando as ondas e vales dos meus músculos.
Se fosse possível, eu me sentia mais nu, mais vulnerável do que já me senti
com uma mulher, mesmo que não estivesse nu. O fato de que não podia me
ver me fez mais consciente da atenção que ela dava a cada detalhe. Ela
deslizou suas mãos sob minha camisa, e sorri em seu cabelo. Eu estava ao
mesmo tempo com cócegas e excitado.
— Mas as coisas que não puder tocar, você vai ter que descrever.
— OK.
— Verdes.
Página
— Como a grama?
The Song of David/ Amy Harmon
— E o seu cabelo?
Senti a maciez de seu cabelo quando ela o empurrou para atrás das
orelhas:
— Você tem orelhas bonitas. - Eu disse. E elas eram. Entre meus dedos
pareciam pequenas espirais delicadas e detalhadas, de pele suave na forma
de um ponto de interrogação, sempre à espera de respostas.
***
226
surpresa para ela. Nós vivemos em uma cidade que se vangloriava de ter um
The Song of David/ Amy Harmon
dos coros mais famosos do mundo, e nós iríamos ouvi-los cantar. Torci
alguns braços e fiz algumas chamadas e obtive permissão para assistir um
ensaio. Não queria compartilhar a experiência com uma multidão, e Millie
ficaria completamente surpresa se eu apenas a levasse direto para a frente
do altar e me sentasse com ela. Ela estaria esperando uma multidão. Não
haveria nenhuma multidão e a surpresa seria completa.
Ela estava animada, com as bochechas cor de rosa e seu sorriso largo,
e segurou-me, apertando o meu braço como uma criança ansiosa;
— Mais ou menos.
— Mais ou menos.
— Isso é o que o céu parece. Você não acha? - Millie respirava, mas eu
permaneci em silêncio, não querendo estragar o momento com minhas
próprias opiniões sobre o que o céu parecia. Na minha limitada experiência,
o céu era o silêncio, um silêncio tão penetrante e completo que tinha massa.
Ele tinha peso. E no silêncio não havia tristeza e culpa, arrependimento e
remorso e perda. Perda quanto ao que poderia ter sido, a perda do que
nunca seria, perda de amor, perda de vida, perda de escolha. Senti todas
essas coisas quando tinha engolido aquela garrafa de aspirina e cortado os
pulsos. Eu perdi a consciência só para tornar-me mais consciente, mais
alerta.
E o silêncio foi ensurdecedor. Não era escuridão. Ele foi luminoso. Tão
leve que você não tinha escolha, só podia ver a si mesmo, você inteiro. Eu
não tinha gostado. Embora eu gemesse e protestasse sendo arrancado de
volta para o chão, arrancado do céu ou do inferno, qualquer que fosse, senti-
228
Moses e o céu se tornou algo diferente. Moses viu as pessoas, as pessoas que
The Song of David/ Amy Harmon
tinham morrido e ido embora. O céu não ficou em silêncio por Moses. Ele
era cheio de memórias e momentos, cheio de cor. Ele trouxe os mortos de
volta à vida. Pintou-os. Moses não queria ver nada disso, mas ele não tinha
escolha. Teve que entrar em acordo com ele. E eu fui junto com ele,
persistente em minha devoção, porque Moses viu a irmã que eu nunca veria
outra vez, e ele trouxe respostas que mais ninguém trouxe. Mesmo aquelas
respostas que às vezes fazem a morte mais sedutora. Pelo menos a morte
não foi o fim. Disso, eu tinha certeza.
Talvez para Millie o céu era um lugar que soava como coros angélicos
e órgãos de tubos, porque era onde ela se sentia viva. Era tudo sobre o som
para Millie, não a visão. Nem cores, como era para Moses. Mas para mim, o
céu seria algo mais. Soaria como o sino no início de um round, seria o gosto
de adrenalina, queimaria como suor nos meus olhos e fogo na minha
barriga. Pareceria com o grito de multidões e um adversário que queria o
meu sangue. Para mim, o céu era o octógono.
— Você sabe que a minha luta contra Santos é terça à noite, certo? -
Falando sobre isso agora, enquanto ainda estava sentado no templo, não era
provavelmente, a melhor hora. Os cabelos no meu braço tinha se arrepiado
na última meia hora enquanto nós escutávamos uma música após a outra. O
coro cantava "Beautiful Savior," e eu estava olhando para o rosto de Millie,
pensando que bela salvadora ela acabou sendo. Se o céu era o octógono, em
seguida, Millie era o meu anjo no centro de tudo. A menina com o poder para
me derrubar e me levantar de novo.
229
— Não vou ser capaz de me concentrar no que tenho que fazer. Vou
estar preocupado com você.
Ela riu, mas eu poderia dizer que não queria rir. O silêncio se
estabeleceu entre nós, e começamos a caminhar, serpenteando na direção
de onde eu tinha estacionado. A região ao redor do templo estava
perfeitamente cuidada e ideal para caminhadas, mesmo que Millie não
pudesse desfrutar da paisagem.
— Eu sei.
— Talvez. - Admiti, acenando para mim mesmo. — Mas você não pode
ver. E ter você lá fora, no meio da multidão, sendo batida e empurrada,
ouvindo a luta indo para baixo, e não sabendo se vou ganhar ou perder,
parece desnecessariamente cruel. E não quero isso. Você vai ter medo por
mim, e eu vou ter medo por você, e se eu estiver preocupado com você,
minha mente não está onde ela precisa estar.
irritada comigo.
Página
— Não quero que você se sinta sozinho. Parece errado não estar lá. -
Ela protestou.
— Toda a gente luta sozinho, Millie. Isso não é algo que você pode me
ajudar a fazer.
232
— Você vai vir aqui na terça à noite, não importa que horas sejam? -
Perguntou, sua mão na maçaneta da porta, sua bengala pronta.
Moses
233
MILLIE não tinha ido à luta. Percebi agora. Na época, estava muito
empolgado com a energia da multidão e a promoção do grande evento para
Página
notar uma falta do sexo feminino, especialmente quando ela não era minha
The Song of David/ Amy Harmon
mulher. Georgia não tinha ido. Ela beijou-me e disse-me que bebês e brigas
não se misturavam, então eu deveria ir sem ela. Ela disse que ela e Kathleen
ficariam em casa e fariam coisas de meninas. Eu sabia que "coisas de
meninas” basicamente significava que Georgia iria alimentar e dar banho em
Kathleen, balançá-la para dormir, e ir para a cama cedo com ela mesma, mas
eu a deixei me convencer a isso. Então, estava sozinho, sentado no Front
Row com alguns membros da equipe de Tag, quando Tag desfilou na arena
com uma música de Waylon Jennings sobre cowboys serem difíceis de amar
e mais difíceis de segurar. A multidão aplaudiu e se juntou em no refrão, e
Tag os encorajou. Isso me fez rir. Eu estava tão nervoso que estava
praticamente vendo em dobro, e ele estava agindo como um gorila grande,
macaqueando para a casa lotada, seu sorriso largo, seus músculos
protuberantes. Ele não parecia nervoso em tudo, e quando ele me chamou a
atenção, ele sorriu e bateu seu peito.
Bruno Santos, por outro lado, entrou na arena envolta em uma túnica
branca com uma capa tão profunda que a única coisa visível era a ponta de
seu queixo. Sua canção escolhida foi algo tão grave e pesado que eu não
conseguia distinguir as letras, embora peguei as palavras "destruição" e
"aniquilação." Ele estava pulando em círculos, encolhendo os ombros e
lançando seu pescoço, e de repente desejei ter ficado em casa com Georgia.
Preocupar-me com as pessoas era um dor na minha bunda. Assistindo a luta
de Tag luta foi uma dor maior na minha bunda. Meu estômago virou, e olhei
para o meu amigo, desejando que ele me colocasse para fora da minha
234
Claro que ele não fez. Mas ele lutou. Ele lutou duro e feio, tomando
tantos golpes quando os que distribuiu, e como de costume, ele parecia lutar
melhor depois de ter tomado um par de socos no rosto. Como a canção
disse, ele era difícil de segurar. Mas ele definitivamente não era difícil de
amar. A multidão estava solidamente ao seu lado, e quando ele voltou na
quarta rodada, escapando arm-bar21 que tinha feito o meu estômago torcer
e meu olhos encherem de água, a multidão estava em um frenesi.
21
Página
CAPITULO QUATORZE
TAG
Eles devem ter me visto, pois Henry disparou pela porta da frente,
zumbindo em torno de mim antes mesmo de eu fazer todo o caminho para
fora da caminhonete. Millie tinha sua bengala e estava na varanda,
esperando por mim, assim como havia prometido.
— Amelie gritou durante toda a luta. Quando eu disse a ela então que
seu nariz estava sangrando, ela tapou as orelhas.
236
24
TKO quer dizer nocaute técnico, ou seja, quando o juiz encerra a luta para impedir golpes desnecessários,
Página
— O juiz parou a luta! Ele parou a luta porque você ia matar Santos?
Ficou com raiva quando ele fez seu nariz sangrar? - A sombra de Henry
boxeava pelo vestíbulo.
— Todo mundo gritava Tag Team! Daí comecei a gritar também! Toda
a multidão usava camisetas Tag Team! - Henry estava tão animado que
praticamente levitava. Me lembrei da camisa que ainda estava apertada na
minha mão direita.
— Isso me lembrou disso! Aqui, tenho uma para você. - Joguei para
Henry e ele a pegou e colocou em cima da camiseta de Kobe Bryant que já
estava vestindo. A camisa o silenciou momentaneamente, e ficou se
admirando no espelho pendurado do lado da escadaria.
— Será que ela diz “Meu namorado lutou com Santos, mas tudo que
consegui foi uma camiseta feia?” - Disse secamente, com um sorriso
brincando em torno de seus lábios.
237
Página
The Song of David/ Amy Harmon
— Vai casar com Millie e ser meu irmão? - Repetiu, com uma
expressão completamente séria. Ele não estava brincando. — Nós queremos
fazer parte do Tag Team.
Dei uma risada e olhei para Millie. Seu rosto estava congelado. Suas
costas tinham ficado rígidas assim que as palavras saíram da boca de Henry,
e se libertou dos meus braços. Pegou a bengala que tinha posto de lado,
como se precisasse de algo, sem ser eu, para se agarrar.
Acho que sempre pensei que iria me casar um dia. Com oitentas anos.
Mas Henry estava me propondo, e isso não me alarmou nem um pouco. De
fato, a idéia de casar com Millie fez meu pulso acelerar. Fez a palma das
minhas mãos formigarem. Fez meu coração dar um sorriso tão grande que
eu poderia sentir as bordas desse sorriso cutucando minha costela. Isso ou
239
Henry fez um sinal com o polegar para cima e se sentou num degrau
para esperar o veredito.
Corri para longe da porta e fui até a rua, olhando para a direita e para
esquerda na calçada, esperando que Millie não tenha ido muito longe para
eu facilmente encontrá-la. A vejo a meio quarteirão de distância.
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26
Página
Pittsburgh Steelers é um time de futebol americano da cidade de Pittsburgh, Pensilvânia, que disputa a NFL
desde 1933. Steelers significa, em português, "metalúrgicos", aludindo a uma das indústrias mais fortes da cidade.
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Philadelphia Eagles é um time de futebol americano da cidade de Filadélfia, Pensilvânia que disputa a NFL.
The Song of David/ Amy Harmon
— Yeah? - Caí de volta nela, nem sendo capaz de me ajudar. Ela tinha
gosto de água fria e quentes desejos, eu estava me afogando e me
aquecendo, com minha luta já esquecida, o inchaço na minha bochecha e a
brandura nas minhas costelas completamente inexistentes.
Puta merda.
— Orgulhosamente. - Respondeu.
The Song of David/ Amy Harmon
Conheci Millie há dois meses, mais eu estava mais seguro disso do que
qualquer coisa na minha vida. Eu estava no meio do caminho do altar e
apenas estava esperando ela me alcançar.
***
mim, com sua guitarra embalada bem no meio das pernas. O jogo
The Song of David/ Amy Harmon
Assisti Millie escolher seu caminho por um par de canções, sua cabeça
inclinada para a guitarra como se gostasse da maneira como as cordas
rangiam. Segurou a guitarra em pé, pescoço quase na vertical, e escutei, sem
comentar, deixando ela ainda pensar que eu estava dormindo. Ela sempre
me surpreendia. Eu sabia que ela tocava, mas não que era tão malditamente
boa.
— Por que nunca tocou para mim antes? - Perguntei baixinho, com
minha voz sonolenta e satisfeita.
Ela me ignorou, com seus dedos encontrando seu caminho através das
cordas.
— Oh, aqui tem uma boa, mas triste. - Disse, dedilhando suavemente.
— Sim. Porque você é um homem sexy. E nós vamos querer algo com
um pouco mais de sotaque nele.
— Sexy, com sotaque, doce e violento. Isso pode ser mais difícil que
pensei. - Disse, ainda rindo.
— E isso é David.
— Fico feliz que sabe disso, mas eu meio que desejava que você não
soubesse tanto sobre as mulheres. Faz-me perguntar como você ganhou
todo esse conhecimento. E fico um pouco ciumenta.
— Porque isso me soa tão sugestivo? - Ela disse sorrindo, mas havia
algo de melancólico em sua voz.
— E é isso. Amo essa música. Minha mãe tinha olhos azuis, assim
como o meu e de Henry. E ela não passava muito tempo chorando, graças a
Deus. Ela gastou seu tempo sendo amorosa. Mas havia ânsia nela também.
Ela queria nos proteger da dor. Queria de volta todas as coisas que tinham
sido tomadas de nós ou negadas. Ela ansiava por isso. E ela não podia
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28
Página
Música do cantor country Willie Nelson, o nome da canção traduzida é “Olhos Azuis Chorando na Chuva”, fala
sobre um amor impossível e a promessa de um reencontro numa terra que não conheça despedidas.
The Song of David/ Amy Harmon
conseguir isso. Não importando o quanto nos amasse, ela não podia
conseguir.
— E então ela disse, ‘eu queria salvar você e Henry do sofrimento, mas
só agora percebi que o sofrimento torna as pessoas melhores’. Ela estava
morrendo, e estava nos mostrando os termos com o fato que nós iriamos
perde-la.
— Tenho. Minha mãe pode não ter sido capaz de manter longe o
sofrimento, e eu certamente não podia manter ela longe, ou Henry, de
qualquer maneira. Mas nós amamos uns aos outros, e isso fez o sofrimento
suportável.
— Me deixe ser seu animal de carga, minhas costas são largas para
aliviar sua dor29. - Cantei, beijando o lóbulo de sua orelha. Eu ia amá-la e
mantê-la segura, e juro por mim mesmo, que eu faria o impossível. Não
haveria mais sofrimento para Amelie Anderson. Eu ia ser o único a assumir
toda a merda.
A ponte para a música que ela citou deu cambalhotas na minha mente
e balancei a cabeça, espantado. Eu tinha esquecido a parte sobre ser muito
cego.
29
A música que ele fala é “Beast Of Burder”, Rolling Stones.
The Song of David/ Amy Harmon
— Então você vai dar tudo de si para mim, garotão? O bom, o mau, e o
feio? Porque eu quero tudo isso. - Sorri com sua séria entrega, sua
declaração sincera, e tentei não rir da insinuação sexual. Ela não tinha idéia.
Então eu não iria me rachar de rir.
Ela se virou para meus braços e achei seu rosto com minhas mãos
antes dela deixar seus lábios tocarem os meus. A beijei como Mick Jagger
cantava a estrofe sobre abrir as cortinas e fazer amor gostoso em algum
lugar no fundo da minha mente.
Moses
quando o conheci em Montlake, talvez com vinte e seis ou vinte sete anos de
idade, mas tinha uma coisa sobre ele que faz sentir como sua alma tivesse
Página
— Doutor Andelin, sei que você viu que Tag tem uma base
razoavelmente regular desde que voltamos de Utah. E sei que você não pode
me dizer o que conversaram. Eu entendo. Sigilo médico-paciente e todas
essas coisas. Não quero saber o que Tag disse ou o que você disse para ele.
Mas ele se foi, Doutor. Apenas partiu de repente. Ele se apaixonou por uma
ótima garota que o ama de volta, mas continuo vendo sua irmã, Doutor, e
não preciso te dizer que isso me assusta até a morte.
— Como você não sabe se ele está apenas... fazendo uma pausa? -
Terminou de modo vazio, como se estivesse tentando chegar a uma
alternativa viável.
— Ele nos deixou algumas fitas cassetes. A garota que ele está vendo é
cega. Então ele gravou a si mesmo, conversando com ela, basicamente.
— Será que ele te deu alguma razão para acreditar que há alguma
coisa que você pode fazer? - Dr. Andelin perguntou calmamente.
— Quanto tempo desde que alguém viu ele? - Sua voz era
insuportavelmente gentil.
CAPITULO QUINZE
TAG
A música tocava alta, era alguma coisa que soava gutural e mundana, e
Amelie estava no octógono, girando e balançando em torno do pole, com um
determinado sorriso preso em seu rosto. Mas ao contrário da primeira vez
que a vi dançando, e de cada vez que a assisti depois, seus olhos estavam
abertos e os movimentos pareciam rígidos. Ela claramente não estava se
divertindo.
— Não estou gostando do que eu vejo! - Uma voz rugiu. — Você está
gostando do que está vendo, princesa? - Ria. — Traga Daniele de volta!
insultos, mas Morgan estava fazendo seu melhor para ser ouvido, e a
Página
atmosfera carregada não tinha nada a ver com a tensão sexual ou com
The Song of David/ Amy Harmon
Lady Gaga cantava sobre fazer uma poker face30 e Amelia estava
tomando seu conselho, dançando como uma boneca de dar corda, incapaz
de ver o drama que se desenrolava na sua frente. E eu estava extremamente
grato por isso. Lisa gritou e Morgan rugiu assim que o arrastei pela mesa,
quebrando garrafas vazias e derrubando mais outras duas cadeiras,
felizmente a mesa estava desocupada.
30
Página
Poker Face significa “cara de poker”, e designa a expressão que os jogadores de poker devem ter para poderem
blefar no jogo. A poker face é uma expressão vazia, que não demonstra nenhum sentimento, dificultando assim
para os adversários entenderem o que o indivíduo está prestes a fazer.
The Song of David/ Amy Harmon
— Você vai me dizer do que isso se trata, Morg? Por que decidiu
voltar?
ficar num touro por oito segundos, um touro chamado Ginger, que me
Página
Além disso, eu estava me sentindo bem, e queria ver Amelie. Ela devia
estar se perguntando aonde eu ando. Leo correu comigo para o hospital, e
Vince tinha voltado para dentro, enquanto o cara novo, Chuck, se certificou
que Morgan foi para casa. Todos tinham sido firmemente instruídos a
manter a boca fechada. Millie não precisava se preocupar comigo tendo a
cabeça golpeada. Para todo caso, ela teve um desordeiro e ele tinha sido
removido. Foi o que contei para os empregados. Eu contaria para ela uma
versão abreviada dos eventos e deixaria o nome de Morgan fora. Mas seu
turno acabou horas atrás, e eu não tinha a levado para casa pela primeira
vez desde que nos conhecemos. Mandei uma mensagem e disse que viria
quando pudesse, ela tinha um aplicativo em seu celular que anunciava as
mensagens e lia em voz alta quando tocava na tela. E eu propositalmente
fazia os textos ridículos, pois era muito engraçado ouvir a voz mecânica
transmitir minhas mensagens. Ela respondeu com uma letra de música
sobre tê-la acordado, e respondi pedindo para ela dormir.
— Deixo você ir para casa assim que fizermos o exame. Isso vai nos
dar mais uma hora de observação. Por favor, Tag. Em sua linha de trabalho,
dia após dia de treino, você não pode brincar com um ferimento na cabeça.
Leo tinha caído no sono na sala de espera, e eu não ia exigir mais dele
do que já tinha. Além do mais, Millie foi a única interessada em passar a
noite comigo, mesmo restando poucas horas na madrugada. Leo me deixou
em casa e tomei um banho, lavei cuidadosamente o sangue do cabelo, e fui
para Millie lá pelas quatro horas da manhã. Talvez eu não devesse ter ido
dirigindo, mas me sentia bem e não queria ficar longe por mais tempo. Eu
sabia que a chave reserva da porta da frente ficava escondida, a chave que
Henry me mostrou com toda seriedade de um homem com um segredo
altamente importante. Ele mantinha escondida dentro da treliça do
arabesco31, bem na frente da porta, e a achei na escuridão, encontrando
facilmente e mentalmente agradeci a Henry por me confiar as chaves da
casa.
31
The Song of David/ Amy Harmon
quarto, o que era uma vantagem clara de amar com garota cega, e a
encontrei esparramada na cama, celular na cabeça, e braços em torno do
travesseiro como se não quisesse ficar sozinha. Apaguei a luz de volta, tirei
os sapatos, e fui para o seu lado na escuridão. Me deitei, puxei o travesseiro
extra de seus braços e larguei minha cabeça nele, e trouxe ela para mim,
colocando meu peito para compensar o roubo do travesseiro.
Eu não respondi.
259
— Mas... mas... eu sou sua garota, certo? Então esse é meu trabalho.
Isso é o que as pessoas fazem quando se preocupam uma com as outras. Elas
se preocupam! - Sua voz se elevou, e a silenciei, alisando seu cabelo. Já
tivemos essa discussão antes.
— Estou brava.
— Você não deve estar muito brava. Escovou os dentes mesmo não
precisando. O que significa que quer me beijar. O que significa que está
planejando me perdoar.
— David? - Sussurrou.
— Yeah?
— Millie, Millie. Você é tão boba32. Estou feliz do seu nome não ser
Willy. - Cantei no meu melhor sotaque country. — Me deixe reformular.
Millie, Millie, você é tão boba, eu tenho certeza que você não tem um Willy33.
— Okay. Que tal isso? Amo suas pernas. Amo seu peito, mas este ponto
aqui, amo mais34. - Eu fazia cócegas em sua barriga lisa e ela se contorcia
contra mim.
— Eu amo seu queixo e seu sorriso35 engraçado, amo seu cabelo e esse
ponto aqui. - Fiz cócegas na sua costela e ela agarrou meus dedos rindo.
— Amo o jeito como você balança seu bunda, amo o jeito como você
cheira tão frutado36. Amo o jeito como me chama de David, e... lá, lá, lá, nada
rima com David.
262
32
Em inglês era silly, pois o personagem escolheu essa palavra para rimar com Millie e Willy, como numa canção.
33
Gíria para pênis.
34
Página
Em inglês “pernas” rimava com “peito”, que rimava com “mais”, ou seja, legs, chest, best.
35
No original sorriso rima com a palavra queixo, no caso, grin com chin.
36
Em inglês bunda rima com frutado, no caso, booty com fruity.
The Song of David/ Amy Harmon
— Nada rima com David? - Sua voz era incrédula, e ficou em silêncio
por alguns segundos, como se estivesse tentando achar uma palavra que
rimava, provando que eu estava errado. Então, acariciou meu rosto, seus
dedos traçando meu queixo, e quando falou, sua voz era tão séria quando
seu toque.
— Então é por isso que sempre quer que eu cante? Pensei que era pelo
meu tom meloso. - Brinquei, mas minha garganta bruscamente se apertou,
muito apertada para cantar.
— É mais do que isso. Você não pode ver uma canção. Você sente a
música, ouve a música, se move com ela. Assim como não posso te ver, mas
sinto você, e me movo na sua direção. Quando você está comigo, eu sinto um
vislumbre de David que ninguém sabe que existe. É a “Canção de David”, e
ninguém mais pode ouvir fora eu.
— Nah. Isso não sou eu. É a ode, Millie. Sinto isso também, cada vez
que você está perto de mim.
263
MOSES
— Eu não sei mais o que pensar. Não sei mais o que fazer! Nós ficamos
264
acreditava duas a semanas atrás. Mas ele se foi. E estou tão... envergonhada.
The Song of David/ Amy Harmon
Chamou vocês, interrompi suas vidas, e fiz uma confusão sobre o fato dele
ter ido. Mas ele obviamente optou por sair! - Millie tomou várias respirações
irregulares, e abaixou a cabeça, e a raiva pareceu deixa-la tão rapidamente
como tinha chegado.
— A pior parte é que... na verdade espero que seja apenas porque não
soube como me contar que mudou de idéia. Espero que ele tenha acordado e
percebeu que não estava mais apaixonado por mim depois de tudo. Espero
que seja isso. Porque não consigo pensar em uma alternativa que não seja
mil vezes pior. E prefiro perdê-lo do que perdê-lo para sempre.
37
O MGM Grand Hotel & Casino é um hotel 5 estrelas, de luxo, em Las Vegas.
The Song of David/ Amy Harmon
Mikey xingou, e assenti comigo mesmo. Isso não ia dar certo. Se Tag
não queria sua equipe lá, não iam chegar nem perto.
— Sim, todo mundo fora Paulo. Mas o resto está aqui, Moses.
Liguei para dentro da casa, deixando Georgia saber que sairia por um
minuto. Eu não estava pronto para contar para Millie o que tinha acabado de
saber. Eu precisava de mais. E julgando pela sua tentativa de esmagar o
gravador, ela tinha atingido seu pico emocional. Mesmo assim, o gravador
estava de volta, claramente nada pior além de seu desgaste. Eu podia ouvir
266
novo.
The Song of David/ Amy Harmon
Assisti Tag sem seu sorriso habitual. Seu rosto estava duro e sério.
Sem suas covinhas aparecendo, sem bater no peito, ou agindo insolente. Ele
pisou na balança com nada além de um boné Tag Team e shorts de nylon
com Tag Team estampado em amarelo atrás. Ficou parado quando seu peso
era anunciado e depois flexionou seus braços para as fotos. Parecia magro e
seu cabelo curto, embora isso podia ser de cortar seu peso e bater os 93 kg
requeridos.
— Ele pesa facilmente 100 e está com 92. O que ele está pensando
lutando só com um quilo extra!
— Tag não esteve no ginásio por três semanas, é por isso! - Cory
exclamou.
— Ele vai lutar com o fodido Terry Shaw. Isso pode ser um banho de
sangue. - Mikey gemeu enquanto assistimos Shotgun Terry Shaw pisar na
balança e dar um olhar rude e azedo e arrogante como o inferno. Atirou para
Tag em olhar de desdém. Tag apenas o ignorou completamente.
— Não, não posso fazer isso. Tenho que dizer para ela que o
encontramos.
Axel mexeu a cabeça com firmeza, como se não pudesse acreditar em
nada disso, e o resto dos caras mantinha o olhar treinado no chão.
Meu celular tocou, indicando uma mensagem, e olhei para ele.
Georgia: Me ligue.
— Me deem uns minutos caras. - Disse, saindo.
Georgia atendeu no primeiro toque.
— Moses? - A voz de Georgia soou apertada.
— Yeah?
— Acho que sabemos porque ele foi embora. Volte. Você precisa ouvir
268
CAPITULO DEZESSEIS
TAG
meio-dia. Millie tinha um dia cheio também, e nos separamos em sua porta
The Song of David/ Amy Harmon
da frente, Millie indo para um lado e eu para o outro. Ela não queria que eu
levasse para o centro de cegos. Ela queria caminhar. Surpresa, surpresa.
Então, eu a observei indo embora, apreciando a vista enormemente.
— Sim, grandão?
38
Seria algo como “Nada rima com David”
The Song of David/ Amy Harmon
— Eu amo o seu cheiro doce, eu amo o jeito que você mexe seu
traseiro.39
O médico não riu. Esta deveria ter sido a minha primeira pista. Isso e o
fato de que eu tinha deixado o hospital a menos de oito horas e ele estava
me ligando ele mesmo. Mas, naquele momento, o momento antes que a
notícia deixasse os lábios do médico e meus olhos deixassem Millie, eu
estava completamente, perfeitamente feliz. A vida não é perfeita, as pessoas
não são perfeitas, mas há momentos que são. E esse foi um deles. Aquele
momento foi um balão vermelho vibrante, cheio de expectativas do que a
vida traria, de Millie e eu e um milhão de amanhãs. E depois que terminou.
Isto estourou com um estalo alto e o restos de borracha do meu momento
perfeito caíram aos meus pés.
271
Página
39
Aqui é um versinho rimado que ele canta, não teria como manter a rima depois de traduzir. O verso original é: “I
love the way you smell so fruity, I love the way you shake your booty!”
The Song of David/ Amy Harmon
***
Isso foi o que Millie tinha me dito. Eu tentei seguir o seu conselho,
fechando os olhos e permitindo que a enorme escuridão me ajudasse a
respirar. Eu tinha que ficar bem, porque se eu não ficasse, Millie ia se
machucar. E eu tinha tentado tanto ir devagar, para não a apressar, para não
nos apressar. Estar absolutamente certo que eu sabia o que eu estava
fazendo. Eu tinha tido o cuidado pela primeira vez na minha vida. Eu tinha
sido tão cuidadoso. Tão cauteloso. E eu ainda estava indo machucá-la. Eu
senti o pânico crescer no meu peito e ouviu uma voz me dizendo para
respirar, para me acalmar.
— Você está indo muito bem, senhor Taggert. Você está quase lá. Você
está quase acabando, senhor Taggert.
assim o tempo todo. Era a minha educação. Conversando com Deus senti um
Página
sempre acreditei que Deus criou meu eu interior, de modo que falar com ele
era um pouco como ter um coração para coração comigo mesmo. Não, eu
não tenho um Deus complexo. Eu só acho que a maioria das pessoas fazem
um negócio muito grande a respeito de Deus, guerras para defendê-lo ou
protestos para negá-lo. Ele apenas parece ser um cara legal para mim. Gosto
de falar com ele.
***
274
O médico não fez rodeios. Ele apenas apontou para as fotos do meu
cérebro e falou, com muita naturalidade. Eu podia ver a massa negra que ele
estava descrevendo claro como o dia. Ele se virou para olhar para mim.
— Você não teve problemas com a sua escrita, problemas com a fala...
talvez fraqueza em seu lado direito. Está do lado esquerdo do seu cérebro,
que irá sempre afetar o lado oposto do corpo. Você não teve qualquer
sintoma?
— Acho que sim. - Seus lábios se curvaram, e eu estava feliz que ele
275
— Nós temos que chegar lá, ver o que a massa é, e retirar tanto quanto
pudermos. - Ele não chamou de tumor. Ele chamou de massa. Mas eu não
era estúpido.
— Chegar lá?
Eu não sei o que fazer. Eu não sei o que fazer. Eu não sei o que fazer.
276
Eu não sei o que fazer eu não sei o que fazer. As palavras tornaram-se
Página
cérebro. O médico me pediu para agir rapidamente. Ele disse que o tempo
era "de extrema importância”. Ele disse que é necessário agir... E tudo que
eu podia fazer era balançar minha cabeça.
— Qual a chance?
— De ser câncer?
— Sim.
benigno.
Página
— Tag?
— Por favor. Por favor, não demore demais, Senhor Taggert. Você tem
meu número.
Balancei minha cabeça no que era para ser um aceno e segui para fora
do escritório dele para um corredor longo, estéril.
— E aí, cara? - falei de volta e estremeci mais uma vez, desta vez,
porque eu estava parecendo uma farsa.
— Você está bem? - Foi uma pergunta do tipo “eu preciso saber” e não
uma “como você está”, e isso me balançou. Isso me deixou na defensiva
também. Como diabos ele sabia que eu não estava bem?
— O quê?
— Sim... certo. Deve ser isso. Rachei uma garrafa de cerveja entre os
olhos na noite passada. - Foi ontem à noite? — Um cara abriu minha cabeça.
Eu tenho alguns pontos. Estou impressionado, Mo. Então agora você é um
psíquico também?
— Bem, isso não é surpreendente. Você tem a cabeça mais dura que
qualquer um que eu conheço. O que aconteceu?
— Millie? – perguntou.
280
— Millie. – respondi.
Página
The Song of David/ Amy Harmon
— Onde?
— Você ainda está lá? - Disse ele de novo, mais alto, mais lento, tão
malditamente agressivo.
— Sim. Eu estou lá. Eu a amo. Isso é o que você quer que eu diga? -
Minhas mãos começaram a tremer, e de repente eu não podia ver a estrada.
Uma buzina soou atrás de mim, e eu percebi que eu tinha ido para fora da
minha faixa.
— Eu não me importo o que você diz. Eu já sabia. Estou feliz por você,
cara. Ela é um tipo de milagre.
procurando.
Página
The Song of David/ Amy Harmon
— Você acha que eu conseguiria mais de um? – Isso era tudo que
podia falar com palavras.
282
Página
The Song of David/ Amy Harmon
CAPITULO DEZESSETE
MOSES
Disse a mim mesmo que ver Molly foi nada mais que coincidência,
que eu tinha simplesmente me aberto demais e atrai um velho fantasma que
soube escorregar em torno de minhas paredes. Ela tinha inundado minha
mente com a cor, traços de medo vermelho e tiros de desespero azul com
arroxeada paixão e pesar verde, todos lavados em branco e mergulhados em
preto. Antes que eu percebesse, estava pintando algo completamente
irracional, completamente em desacordo com a garota que tínhamos
colocado para descansar anos antes.
Como Geórgia pediu, vim para casa direto do ginásio, entrei e sem
284
dizer uma palavra, minha esposa tinha recomeçado a fita cassete. Então,
Página
ouvi minha conversa com meu amigo, escutei todas as coisas que ele não
The Song of David/ Amy Harmon
tinha me dito. Agora, o medo era uma torção no meu intestino, e eu estava
inquieto.
TAG
Continuei dirigindo. O clima era claro, o sol brilhando, o céu azul, o ar
285
fresco e legal, então dirigi e pensei. Dirigi-me para a casa de Moses e entrei
Página
sobre as colinas a oeste da cidade que parei por um minuto enquanto descia
da minha caminhonete e deixei a vista se estabelecer em mim. Mas a beleza
só me fez doer. O que eu vou fazer? O que eu vou fazer? O que eu vou fazer? O
coro começou a subir na minha cabeça novamente.
normalmente fazia, ela iria sentir meu tumulto, e ela saberia que algo estava
acontecendo. Então, apertei-a com força e deixei-a ir, e coloquei um sorriso
nos lábios, sentindo-me como uma mentira e chamado minha habilidade
dada por Deus para besteira. Era um talento que tinha me servido bem na
minha vida.
— Olá, baby. Onde está Mo? - Yep. Eu ainda tinha esse talento. Minha
voz era suave e minhas mãos estavam firmes quando eu puxei-lhe o chapéu
da cabeça e pousei na minha. Sempre flertando, mesmo sendo a esposa do
meu melhor amigo, mesmo quando eu estava pendurado por um fio
emocional. Era apenas o meu jeito. E a Geórgia sabia disso. Agarrou o
chapéu para trás e passou por baixo da cerca para se juntar a mim no outro
lado. O cavalo relinchou por que perdeu a atenção dela e Georgia olhou para
trás e riu.
— Oh, agora você me quer por perto, Sis? Você estava fugindo de mim
um minuto atrás!
como eu aos onze. Eu tinha sido mais redondo, mais macio. E eu tinha sido
Página
The Song of David/ Amy Harmon
Davi era eu. E Golias era eu. Ambos tinham a minha cara. Eu era o
menino, e eu era o gigante. Dei um passo para trás, distanciando-me
rapidamente da imagem perturbadora.
— Uau, caramba!40 - Ela ficou surpresa. Mas viu também. Não era
apenas eu.
40 No original: Well I’ll be damned. Literalmente “Bem, eu vou ser condenada”, expressão idiomática significando surpresa.
The Song of David/ Amy Harmon
— Talvez isso signifique que você é o seu próprio pior inimigo. - Disse
alegremente Georgia e piscou para mim. Engoli em seco e olhou para a
imagem.
Empurrei-me para o círculo, meu tamanho tornando mais fácil do que teria
Página
The Song of David/ Amy Harmon
Cameron ficou encolhido como o bezerro ferido que ele sempre foi.
— Você vai me falar sobre Millie? Moses parece pensar que ela é
especial. Ela é?
292
— Ela é especial.
Página
The Song of David/ Amy Harmon
— Tudo certo. Bem, então acho que a pergunta deveria ser, você é
especial o suficiente para deixar uma garota cega quebrá-lo?
— Não seja um estranho, Tag. Sentimos sua falta. - Georgia disse atrás
Página
***
Talvez fosse o fato de Moses ter falado sobre Molly, mas encontrei-me
dirigindo-me para fora da autoestrada quinze minutos depois que deixei
Levan, parei em Nephi, perto do local onde eles encontraram os restos
mortais de minha irmã. Os cães encontraram o corpo de minha irmã. Os cães
encontraram-na quando eu não pude. Eu aguardei. Aguardei tão duramente
que era tão desesperadamente que quase me convenci que ela não poderia
ser encontrada.
Se ela não pudesse ser encontrada, então não tinha falhado. Não
exatamente. Seu túmulo era apenas um buraco na terra, marcado por uma
planta e rodeada de Artemísia. Depois de quase dois anos que tínhamos nos
encontrado e ela estava esperando num campo coberto de lixo, perto de um
obscuro viaduto fora de uma pequena cidade com nome impronunciável.
Uma cidade que não significava nada para a menina que foi forçada a torná-
lo seu lugar de descanso final. Nephi. Nee Figh. Quando ouvi pela primeira
vez a pronúncia do que eu pensava ser o gigante de João e o Pé de Feijão, ele
gritava em seu castelo no céu, “Fe, Fi, Fo, Fum, eu cheiro o sangue de um
inglês." Fe Fi rima com Nephi.
junto com ela, rotulando-a como uma viciada, merecedora de seu destino.
De repente, ela não estava ausente. E de repente sumiu. E há anos que não
sabia quem a levou.
Ne Phi Fo Fum, pronto ou não, aqui vou eu. E vi que ele tinha. Eu ia
colocar uma bala na cabeça do homem, vingando o sangue dos
desaparecidos, de todos os ausentes.
Ne Phi Fo Fum, puxaria o gatilho. Oh, Deus! Eu não queria fazer isso.
Sentei em minha caminhonete e pensei em Molly, olhando para o campo
onde eles encontraram seu corpo. E falei com ela por um tempo. Perguntei-
lhe o que diabos eu deveria fazer. E me perguntava se ela veio por meio de
Moses, porque o meu tempo acabou, se ela estava de repente em volta,
porque ela estava esperando por mim. Se o meu tempo acabou, eu poderia
lidar com isso.
296
Página
The Song of David/ Amy Harmon
CAPÍTULO DEZOITO
de sua carne, e a promessa que vinha com ela. Eu queria pegar. Eu queria me
Página
precisava dela. Ela combinava com meu ímpeto como se entendesse. Ela não
entendia. Ela não podia. Mas ela não me abrandou ou implorar-me para
reafirmar.
— David, David, David. – Parecia como uma canção quando ela disse
isso. E ela beijou meus lábios suavemente.
— David, David, David. – Ela entoou meu nome, como se não pudesse
acreditar que era verdade, como ela gostava do jeito que isso parecia em sua
boca.
um tempo. É na ponta dos pés para longe e o amor tomou o seu lugar, amor
Página
e pertencer, e o tempo que não pode ser roubado. Millie disse que ela tinha
The Song of David/ Amy Harmon
que sentir para ver, e ela viu tudo de mim. Seus dedos traçaram os
contornos de minhas costas como se ela estivesse lendo um mapa, na
sequência de um rio para o mar através de uma longa extensão, ao longo dos
vales e colinas. Ela era meticulosa e atenta, lábios e bochechas seguindo seus
dedos, sua língua testando a textura que necessitava mais atenção. Quando
Millie faz amor, ela na verdade faz amor. Ela criava, desenhava, seduzia para
ser. Eu sempre odiei esse termo e preferia uma pequena básica descrição,
talvez porque isso parecia mais honesto. Mas com Millie, nada mais digno. E
ela não apenas faz amor, ela me ama. Ela me faz ouvir. Ela me faz sentir. Ela
me faz prestar atenção. Eu não tenho pressa ou levo. Eu não corro ou
empurro. Fecho meus olhos e amo do mesmo jeito que ela faz, com as
pontas dos meus dedos e as palmas das minhas mãos, e eu a vi tão
claramente que os meus olhos ardiam atrás de minhas pálpebras fechadas.
Ela estava confiante de uma maneira que não deveria ter sido,
confiante de uma forma como nascer sabendo que você é amado, e eu me
alegrava com isso. Ela não era a garota em lingerie sexy, perguntando-se se
deveria representar seu corpo desta ou daquela maneira. Ela era uma
mulher profundamente apaixonada e completamente perdida na
experiência. Ela não me perguntou o que eu gostava ou o que eu queria. Ela
não hesitou ou segurou. Ela não invocou por palavras bonitas ou conforto.
Millie beijou meu peito, mas não falou. Contei até sessenta lentamente
e, em seguida eu continuei sussurrando tão baixinho e assim sem, e tive a
300
***
301
vê-lo, apenas no caso. Apenas no caso de a notícia ser ruim e eu não voltar.
The Song of David/ Amy Harmon
— Sim. Eu sei.
— Não mais?
às vezes.
Página
41 André René Roussimoff, mais conhecido pelo seu nome no ringue André the Giant, foi pugilista
(wrestler) profissional e ator francês.
The Song of David/ Amy Harmon
alívio, uma pequena tábua de salvação. Gostaria de usar as fitas para deixar
Página
***
Moses
tarde.
Página
The Song of David/ Amy Harmon
Não havia um toca-fitas no meu caminhão. Eles não fazem mais isto
desta forma. Mas Millie trouxe um toca-fitas e a caixa de fitas, e ela se sentou
com eles no colo como se ela não pudesse suportar ficar sem eles. Eles eram
uma tábua de salvação. Uma Tagline. Uma vez que no dia anterior, quando
Tag revelou os resultados de sua MRI, Millie não tinha compartilhado o
conteúdo das fitas restantes comigo ou Georgia, e eu não havia pedido para
ouvir. Eu não queria ouvir. A conversa veio a ser muito pessoal, a história de
amor muito perfeita, os sentimentos muito crus, e a história era para Millie
ouvir sozinha. Eu não tinha certeza se ela tinha continuado a ouvir depois
que nos separamos, mas eu estava adivinhando que ela tinha, ela tinha
escutado um pouco mais.
Por volta do meio caminho em nossa viagem, ela puxou uma fita e
colocou fones de ouvido. Fiquei impressionado que o toca-fitas funcionar
mesmo com fones de ouvido. Ela se afastou um pouco, puxando os joelhos
contra o peito, e perder-se na voz de Tag.
Não foi até meia hora depois que ela começou a chorar. Ela tinha sido
tão complacente. Então composta. Mas agora, agora ela não era. Algo na fita
abateu-a. Lágrimas escorriam pelo seu rosto, e suas pálpebras estavam bem
fechadas, claramente numa tentativa de mantê-las dentro.
— Rookie of the Year, Gold Glove, Silver Slugger, e péssimo pai – disse
Millie seguramente. — Eu não estou chorando pelo papai, Henry.
Eu queria rir. Eu queria chorar. Eu fiz nenhum dos dois. Mas minha
garganta doía pelo esforço de não fazer nada. Millie riu, mas uma rápida
olhada no meu retrovisor confirmou que as lágrimas escorriam por suas
bochechas mais uma vez. Era tragicamente engraçado.
— Não, Henry. Não é o mesmo. Não é o mesmo em tudo. Tag não nos
deixou. Isto não é sobre nós, Henry. Isto é sobre Tag.
42 Rookie of the Year é o prêmio ao melhor jogador da liga NFL, através de uma lista dos escolhidos é
Página
CAPITULO DEZENOVE
MOSES
45
The Song of David/ Amy Harmon
Ele ainda não atendia seu celular. De fato, ligar para seu número só
resultou em uma mensagem para a caixa postal que já estava cheia. Nós
tínhamos o rastreado fazendo o melhor que podíamos, e agora só restava
esperar.
de assunto.
Página
The Song of David/ Amy Harmon
— Tag! Tag! - Henry estava gritando e pulando para cima e para baixo,
tentando chamar sua atenção, e Millie estava tremendo tanto que cerrei
meus dentes para ajudá-la a parar. Tag viu Henry, me viu, e depois viu Millie.
Sua mandíbula apertou, seus olhos arregalaram, e diminuiu a velocidade,
quase parando, antes de se lembrar da onde estava. Na verdade, ele deu um
passo na nossa direção e Henry berrou seu nome mais uma vez e acenou
311
— Odeio que não posso vê-lo. - Seu rosto estava branco e sua boca
tremia.
— Ele viu você, Millie. Sabe que você está aqui. Ele sabe que estamos
aqui.
312
— Parece estar pronto. - Essa era a única coisa que eu podia dizer.
— Por que ele está fazendo isso? - A pergunta foi quase um soluço, e
peguei sua mão novamente. Eu não tinha uma resposta.
46
O apelido do lutador traduzido é espingarda.
The Song of David/ Amy Harmon
— É isso mesmo Joe. Na luta recente contra Bruno Santos, houve alguns
momentos que todos pensavam que ele ia para baixo. Bruno conseguiu alguns
golpes brutais, e Taggert apenas continuou vindo. Ele meio que deixou Bruno
cansado, o no final pegou Santos com uma direita e o mandou para a lona,
absolutamente aturdindo o mundo da luta. Santos claramente era o favorito,
assim como Shotgun é o favorito hoje. Mas não subestimem Tag Taggert. Não
o subestimem, porque ele pode surpreender vocês.
Meu coração saltou como uma bola no peito e o suor escorria pelas
minhas costas. Tag tentou um movimento para baixo e ganhou uma
enxurrada de punhos no lugar.
Mas ele não estava doente, e não agiu como um doente, e senti uma
lasca de alívio que Tag não estava tentando morrer. Ainda não. O punho de
Shotgun raspou a testa de Tag no final do primeiro round e por um minuto,
as pernas de Tag endureceram. Shotgun viu que Tag ficou temporariamente
abalado e partiu para ele, punho voando, só para ter sua confiança e
dinâmica usada contra ele. Tag lançou um double leg perfeito, envolvendo
os braços ao redor dos joelhos de Shotgun, e o derrubou de forma limpa
pelas costas.
— Ouviu ele, Millie? - Gritei para ela, com meus olhos nunca deixando
Tag e os dele plantado no rosto de Millie. Ela assentiu vigorosamente. — Ele
quer que você saiba que ele está okay.
47
Jargão de luta, também usado no Brasil, que nada mais é do que uma tática que consiste em derrubar e bater no
adversário quando ele ainda está no chão, conseguindo um nocaute.
The Song of David/ Amy Harmon
Shotgun desmoronou.
Mas Millie só ficou parada, balançando, olhos secos, palmas das mãos
encharcadas. Ou talvez foi da minha mão. Agarramos um ao outro, e Henry
se pendurou também, os três de nós capturados no pico e na ondulação que
se espalhou ao nosso entorno. A multidão gritava, batendo palmas, pulando
para cima e para baixo, empurrando, batendo nas nossas costas, nos
felicitando. Todo mundo assistiu como Tag se focou em Millie durante a luta,
e eles se focaram só nela agora.
levantadas acima da cabeça. Mas assim que ele encontrou Millie mais uma
Página
***
estamos agora ouvindo relatos que logo após a luta de abril, onde Tag
Página
derrotou Santos, ele teve um confronto em seu bar na cidade de Salt Lake com
The Song of David/ Amy Harmon
De acordo com o doutor que veio e conversou com nós cerca de três
horas depois que chegamos no hospital, o cérebro de Tag já tinha começado
a sangrar e inchar, provavelmente durante a luta. Pensei no golpe que ele
levou na testa no final do primeiro round, quando suas pernas cambalearam
e todos pensaram que ele vinha a baixo. E lutou por mais três rounds antes
de tomar outro golpe no mesmo ponto antes do combate terminar. O
inchaço criou uma pressão que só então causou a convulsão, que por sua vez
os ajudou a achar o sangramento. Aparentemente, pessoas que passam por
uma craniotômia e tem tumores removidos de seus cérebros não devem
entrar num octógono com menos de três semanas após a cirurgia.
320
Eu não pude ir na ambulância com Tag. Tive que ficar com Millie e
Página
Henry. Nós lutamos nosso caminho em meio à multidão o mais rápido que
The Song of David/ Amy Harmon
podíamos, o que não tinha sido fácil, para depois corrermos para o hospital,
chegando a uns bons vinte minutos após Tag ter sido levado as pressas
através das portas da emergência. Contei para a enfermeira na recepção
tudo o que eu sabia, tudo sobre o que Tag havia confessado nas fitas, e pedi
a ela que por favor repassasse para aqueles que estavam tratando do meu
amigo. Ela me deu aquele olhar como se eu fosse altamente perigoso, me
olhando por cima de uns pequenos óculos, pressionado seu gordo queixo no
peito em confusão. Ela me ouviu e em seguida se levantou, entrando pelas
portas que Millie e Henry e eu não éramos permitidos seguir.
mão, acariciou seus cabelos e falou sobre alguma trivialidade fútil, como se
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Sigla para Magnetic Resonance Imaging, ou seja, Imagem por Ressonância Magnética (IRM).
The Song of David/ Amy Harmon
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The Song of David/ Amy Harmon
CAPITULO VINTE
MOSES
Tag acordou assim como o médico previu, mas não nos deixaram vê-lo
até o mover para fora da UTI, o que não aconteceu até depois vinte quatro
horas após ele ter recuperado a consciência. Ficamos saindo e voltando do
hospital para um hotel nas proximidades, correndo contra o terror e
dormindo pouco, e dois dias após nossa vigília, ao voltarmos para o hotel
para tomar banho e nos trocarmos, Henry subiu na cama e se recusou a
voltar. Millie nunca ia deixar Henry sozinho no hotel horas a fio, então ela
ficou para trás e eu voltei para o hospital.
ajudar a raspar tudo de uma vez. Vamos ficar gêmeos, Mo. - Disse, se
referindo ao fato de que meu cabelo nunca foi grande.
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The Song of David/ Amy Harmon
— Acho que Millie vai adorar uma cabeça lisa. - Ele parou
abruptamente e esfregou o queixo, claramente agitado. — Ela está aqui, Mo?
Com você?
— Ela está num hotel com Henry. Ele ficou exausto, e ela nunca o
deixaria sozinho.
Depois ela o ajudou a tirar vestido do hospital, tomando cuidado com os IV49
e vários outros monitores, para colocar um novo. Captei a atenção de Tag
quando ela cuidadosamente amarrava os cordões nas suas costas. Levantei
uma sobrancelha e ele me deu um sorrisinho que me deixou saber que ele
não mudou tanto assim.
— Assim como você, Mo. - Atirou de volta, sem nem abrir os olhos.
— A culpa é sua.
— Eu sei.
— Você não deveria ter partido assim. Colocou todos nós num inferno.
- E acho que estávamos indo para lá, depois de tudo.
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Sigla para Via Intravenosa, que consiste na introdução de injeção de agulha ou cateter para administração
diretamente na corrente sanguínea.
The Song of David/ Amy Harmon
— Às vezes sinto que a morte é a única coisa que ainda não fiz. - Ele
disse eventualmente. — Inferno. Até já tentei algumas vezes. O problema
com a morte é que ela é exclusiva, como o sexo e o parto. Uma vez que você
tenha feito isso, não tem como voltar atrás.
— Esse é o ponto, Mo. Eu estou okay com isso. Se tem uma coisa que
aprendi de ser seu melhor amigo, de assistir você comungar com os mortos,
é que a morte não é algo que preciso temer. Não sou um homem perfeito.
Mas acho que sou um homem bom. Eu tenho vivido um inferno de uma vida,
mesmo com todo o sofrimento. Millie me disse uma vez que a capacidade de
devastar é o que faz uma música bela. Talvez é isso que faz a vida mais bela
também. A habilidade de devastar. Talvez só assim para saber se estamos
vivendo. Se verdadeiramente amamos.
— Amo tanto ela, Mo. Amo pra caralho. Essa coisa me suga muito. Eu
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sou capaz de lidar com o câncer. Sou capaz de lidar com a morte. Mas vou
sentir falta de Millie. Já sinto falta. - Ele engoliu em seco, com sua garganta
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The Song of David/ Amy Harmon
trabalhando horas extras contra a emoção sufocou nós dois. — Vou sentir
falta de você também, Mo, mas você pode ver pessoas mortas, então posso
voltar e te assombrar.
— Estou okay com a morte, Mo, estou bem com isso. - Disse devagar.
— Mas morrer... morrer é diferente. Tenho medo de morrer. Tenho medo de
não ser forte o suficiente para as pessoas que me amam. Tenho medo do
sofrimento que isso vai causar. Tenho medo do desamparo que vou sentir
quando eu não puder fazer meu melhor. Não quero sentar na cama do
hospital, dia após dia, morrendo. Não quero Millie tentando cuidar de mim.
Não quero Henry me assistindo desaparecer do gigante a sombra. Você pode
entender isso, Mo?
era para mim. Disse para meu médico “muito obrigado, mas vou ir agora”.
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— Não. - Tag balançou a cabeça, com seus olhos nos meus. — Não.
Ele tinha razão. Ele estava confuso sobre todo o resto. Mas tinha razão.
— A luta.
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The Song of David/ Amy Harmon
— E depois da luta?
— Eu ia fazer uma viagem para Dallas, ver minha mãe, minhas irmãs e
pagar meu pai de volta. Não os vejo faz um tempo. Depois... dar uma
caminhada para as colinas acima do viaduto de Nephi.
longe?
The Song of David/ Amy Harmon
— Eu amo você, Mo. Você sabe disso, não sabe? - Disse gentilmente. E
eu sabia que ele me amava. Não tinha nenhuma dúvida. Mas ele tinha um
inferno de uma maneira de mostrar isso.
— Vai se foder, Tag! - Silvei. — Eu sei o que quer de mim. Sei que você
quer que eu diga que apoio sua decisão. Mas não sou tão altruísta. Não sou
aquele amigo. Eu não quero que você sofra. Realmente não quero. Gostaria
de compartilhar esse fardo se pudesse. Eu substituiria seus piores dias se eu
pudesse, porque sei que você faria o mesmo por mim num piscar de olhos.
Mas prefiro vê-lo sofrer que dizer adeus. Sinto muito. Se isso faz de mim um
idiota, então mudo meu nome. Basta só colocar num crachá e vou usar. Não
dou a mínima. Quando começasse a ter medo de um pouco de dor?
— Mentira! - Rugi. — Você deve isso para as pessoas que amam você
lutando. Você nos deve!
— Onde está a sua raiva? Onde está o monstro de olhos verdes que
queria me matar só por respirar o nome de sua irmã? Onde está o cara que
pegou o touro pelos chifres na Espanha só para ver se conseguia? Onde está
o cara que atirou num homem para me proteger, que me tirou da linha de
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fogo? Deixa eu ver se entendi, Tag. Você morreria para salvar minha vida,
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— Tire essa capa50, irmão. Tire agora! Ou vou bater o inferno pra fora
de você, colocar uma camisa de força e começar a bombear um monte de
quimio eu mesmo. Só observe.
— Te amo, Mo.
— Te amo, Mo.
Tag
Levei vários dias para fazer as fitas. Eu comecei isso como uma
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Expressão americana que quer dizer deixar de bancar o herói.
The Song of David/ Amy Harmon
história, percebi o milagre que era. Moses estava certo. Eu tinha um milagre.
E com cada palavra, cada fita, fiquei mais convencido disso. O problema foi
que eu não sabia como parar. Não queria que as fitas acabassem. E eu não
queria dizer adeus.
tecido do meu cérebro. Eles conseguiram remover noventa e cinco por cento
The Song of David/ Amy Harmon
do tumor, o que foi uma ótima notícia. Também voltaram com o resultado
da biópsia muito mais cedo que o previsto. Pensavam que levaria seis dias
depois da cirurgia para obter os resultados. Eu tive sorte. Só levou quatro.
Sorte, sorte minha.
E foi isso que fiz. Chamei um táxi para vir me pegar depois da
craniotômia. A enfermeira insistiu em ligar para alguém, e eu insistir que
poderia cuida de mim mesmo. Me sentia ótimo. Minha cabeça doía, o que
fazia sentido. Mas fora isso, me sentia bem. E eu ficava dizendo isso porque
era a verdade. Meu corpo se sentia bem. Era meu coração que doía.
Meu coração parecia uma merda. Mas eu estava bem. Fui para casa e
dormir por uns dois dias, acordei para beber água, ir para o banheiro e
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voltava a dormir. Depois que tinha certeza que meus resultados chegaram,
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The Song of David/ Amy Harmon
dirigi para o hospital para descobrir que eu tinha de seis meses a um ano de
vida.
Ainda não chamei Moses, ainda não chamei Millie. Não liguei para Axel
ou incomodei Mikey. Em vez disso, deixei todo mundo acreditar que eu
tinha ido a Dallas para ver minha família, e liguei para o meu advogado.
Então comecei a colocar as coisas em movimento. Durante esse tempo,
ignorei as ligações. Não li minhas mensagens.
Ele tinha uma luta para mim. Sábado à noite em Vegas, seis dias de
distância, contra Terry Shaw. Cinquenta mil dólares se eu ganhasse e dez
mil apenas pela presença. Eu disse a ele que só faria isso pelos cinquenta
mil, independente se ganhasse ou não, mas o prometi que iria ganhar. Ele
concordou me disse que se vencesse Tag Team ia ficar com mais vinte mil
dólares, e me disse para estar em Vegas dentro de quarenta e oito horas.
Pensei que seria forte. Pensei que seria ótimo para a equipe. Pensei
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que ia embora num momento de glória. Lutar a morrer. Ser forte. Mas eles
The Song of David/ Amy Harmon
Lutei mais duro do que qualquer luta antes. Tudo doía, minha energia
estava manchada, minhas duas semanas fora da academia mais o fator
cirurgia. Corri três milhas no dia que Cordova ligou. Corri mais cinco no
próximo. E um dia antes da luta treinei na academia Vegas Gold e trabalhei
meu suor chutando como inferno um saco de pancadas, anestesiando minha
pele, e lembrando que não tinha nada a perder. Nem fiquei nervoso. Isso foi
bizarro.
novo. E então ganhei. Seu rosto cansado tinha o mais lindo sorriso, e Henry
estava gritando meu nome. Moses ainda parecia furioso.
— Tag! Pode me ouvir? Porra. Acho que ele está tendo uma convulsão!
Era Moses falando comigo, mas soou esquisito, longe. Como se sua voz
viesse do outro lado do campo onde Molly estava enterrada. Do outro lado
do campo depois da parada de caminhões que fazia uma negligente vigília
por uma garota morta. O rugido dos caminhões continuou, um depois do
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Talvez eu tenha voltado para a praia com Molly, o céu azul sem fim,
interrompido apenas por um avião voando baixo puxando uma serpentina
sobre seguro de carros atrás. Mas o zumbido e a luz não vinham de céu
brilhante ao longo do trecho de praia, e minha garganta não estava cheia de
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— Sr. Taggert?
— Estou orgulhoso de você, David. - Meu pai nunca me disse isso. Onze
anos de idade, e ele nunca tinha me dito que estava orgulhoso. Mas estava
orgulhoso agora.
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The Song of David/ Amy Harmon
— Yeah. Às vezes temos que ser maus na vida para conseguir algum
respeito. Não tem nada de errado em se defender. Não é uma coisa muito
popular nos dias de hoje. As pessoas acham que é iluminador ser fraco. Não é.
Existem momentos de palavras e momentos de ação.
— Muito tempo.
— Pensei isso.
— Acho que quebrei seu nariz. - Tentei não soar tão satisfeito como me
sentia.
— Yeah. Provavelmente quebrou. Mas agora ele sabe que você pode, e
não vai começar uma briga com você tão rápido, agora ele vai?
— Yeah, filho?
— Quero uma revanche. Pensei que tinha ganhado. Pensei que tinha
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batido naquele cara. A buzina tocou. - Tentei formar as palavras, mas saíram
arrastadas e malfeitas e não tinha certeza se alguém entendeu. Deve ser a
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The Song of David/ Amy Harmon
areia na minha boca. A areia e minha língua ferida. Porra, como minha boca
doía.
Eu não sei o que fazer, Eu não sei o que fazer, o antigo refrão estava de
volta na minha cabeça, um som que grudou na mente e se recusou a se
transformar numa solução. Então fui falar com o gravador. De novo.
Eu não tinha ficado sozinho com Millie. Nenhuma vez. Ela ficava
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parada perto, sua mão no meu braço, sempre me tocando, mas não tivemos
nenhum tempo só para nós. Não queria a repetição de cena com Moses, e
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The Song of David/ Amy Harmon
não tinha idéia do que dizer para ela. A convulsão tinha me deixado exausto
e o sono era um alívio. Quando eu estava acordado e ela estava por perto, eu
só podia olha-la, pegar sua mão, e tentar imaginar o que estava pensando. O
que estava sentindo. Acho que eu sabia, e sua agonia só me fazia querer
dormir novamente. Tentei uma vez lhe dizer como sentia muito, e ela só
balançou a cabeça e disse:
Moses não voltou. Moses nunca tinha sido capaz de fingir. Só trouxe
Millie e Henry e foi os pegar de novo quando Henry ficou agitado e precisava
voltar para o hotel. Eu podia dizer que queria que Millie ficasse. Mas o dever
chamava, e ela partia sem protesto, um aperto de mão, um abraço em Henry,
e nenhuma das coisas que precisavam ser ditas foram discutidas.
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contratos que meu advogado os tinha enviado, dizendo que ginásio era meu
e eles não iriam assinar nada. Foram embora, mas eu tinha certeza que
alguém ficou para trás para ficar sentado do lado de fora da porta do meu
quarto no hospital.
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The Song of David/ Amy Harmon
CAPITULO VINTE E UM
TAG
— No telefone, no corredor.
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— E Moses?
The Song of David/ Amy Harmon
— O que você fez com o seu cabelo, Henry? - Perguntei quando ele se
recusou a chegar mais perto do pé da minha cama.
Olhei para ele, intrigado. Eu tinha que pensar sobre isso por um
minuto. Então, eu entendi.
— Sim. Ele era. - Ele era. E Brian Piccolo morreu de câncer aos vinte
e seis anos de idade. Mesma idade que eu. Eu tinha feito Moses assistir
"Brian's Song" comigo, chorei durante toda a maldita coisa, mesmo eu já
tendo visto isso uma dúzia de vezes antes, e em seguida, chamei-o
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de Billy Dee por um mês depois. Era mais divertido do que o chamando
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de Gale, depois de Gale Sayers, o melhor amigo do Piccolo. Moses não gostou
The Song of David/ Amy Harmon
puxei a mão dele e ele sentou ao meu lado, a cabeça baixa, olhos no chão.
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The Song of David/ Amy Harmon
— Amo.
— É a mesma coisa.
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The Song of David/ Amy Harmon
— Você é um lutador!
— Henry...
— Henry luta? - Desta vez foi mais uma pergunta do que uma
declaração.
Eu não sei como eu alguma vez já pensei que Henry não era um bom
comunicador.
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Xxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxxx
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The Song of David/ Amy Harmon
Abri a porta, sai, dei alguns passos e vomitei no pneu traseiro direito
de Mo. Ele ia ficar tão satisfeito. Eu deveria saber melhor. Pílulas para dor
sempre me deixam enjoado. Agora eu estava tremendo, apoiado contra a
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Personagem do filme.
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É um filme, no Brasil o título é “Férias Frustradas”.
The Song of David/ Amy Harmon
— Sim.
Percebi que tinha dito as últimas palavras em voz alta e me virei para
olhar para Millie, cujo rosto virado de repente estava perto o suficiente para
beijar. Nós não tínhamos estado tão perto desde a noite antes da minha
craniotômia, a noite quando fizemos amor. Eu era um imbecil. Eu tinha feito
amor com Millie e então eu corri. Culpa cortou através de mim. Culpa,
remorso e desejo, e a náusea voltou.
subimos de volta no banco de trás, Henry teve sua vez fora do caminhão, e
nós retomamos o nosso caminho.
***
Moses
sair para Vegas. Além disso, ele não deve estar sozinho. Ele não estava bem,
e eu não confiava nele para não fazer algo ridículo. Mais uma vez. Eu poderia
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The Song of David/ Amy Harmon
levar Millie e Henry para casa em Salt Lake e insistir que Tag viesse comigo
para casa em Levan, mas eu sabia que Millie não iria querer isso. Eu não
acho que ela e Tag tenham tido a chance de arejar as coisas. E eles
precisavam. Tag precisava consertar as coisas, se isso fosse mesmo possível.
Eu observei-os pelo espelho retrovisor, Tag finalmente cedeu e deixou Millie
segurá-lo no último trecho da viagem. Ela iria perdoá-lo, se ela já não
tivesse, mas eu não sabia se ele iria deixa-la. A coisa toda estava seriamente
bagunçada. Tudo, e eu senti a angústia ferver em mim novamente. Eu não
tinha idéia do que fazer.
Tag tinha uma consulta com o seu oncologista em Salt Lake em uma
semana. Eu tinha feito ele ligar para o Dr. Shumway na minha frente, e ele
colocou o médico no viva voz. Dr. Shumway havia sido atualizado pela
equipe médica em Vegas na luta de Tag, da hemorragia e edema que tinha
causado a convulsão, e da condição atual de Tag, que era
surpreendentemente boa, considerando tudo. Aparentemente, depois de
uma craniotômia, é típico esperar pelo menos um mês para deixar o
paciente curar antes de embarcar em um tratamento, em outras palavras,
radiação e quimioterapia. Passaram-se três semanas, então o tratamento do
Tag não tinha sido adiado por sua decisão de fugir, mas Dr. Shumway tinha
informado a Tag que era improvável, com a lesão que ele tinha “sofrido”. Dr.
Shumway foi notavelmente diplomático, que o tratamento para o câncer
começasse na próxima semana.
— Você está voltando para casa comigo. Pelo menos pelos próximos
dias. - Insisti, chegando a única solução que eu poderia pensar. Estávamos
nos aproximando da saída Levan /Mills, uma saída onde tinha alguns
veículos abandonados, várias vacas abandonadas e um reservatório
artificial que não tinha muito para se olhar. A rodovia atravessava Levan
completamente, e a única saída, a várias milhas da cidade, era a única
maneira de acessá-la sem retornar de Néfi. Engraçado, Levan era apenas um
pontinho no mapa, um pontinho, mas Geórgia e Kathleen estavam lá, e de
repente eu estava incrivelmente com saudades da cidade que um dia eu
odiava.
— Vocês estão todos voltando para casa comigo. - Repeti com firmeza.
Ele quebrou o contato visual e se virou para Millie, mas ela já estava
balançando a cabeça.
corrida pesa em média 540 quilos e pode ser forçado a correr a 64km/h.
The Song of David/ Amy Harmon
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The Song of David/ Amy Harmon
Moses tinha pisoteado nesta manhã com a pintura que ele fez de Davi
e Golias e colocou-a para baixo em uma armação de frente para minha cama.
Então ele desabou uma enorme bíblia, apenas jogou-a na minha frente, e
abriu-a em uma seção que ele tinha destacado em lápis vermelho.
avó de Moses, sua filha recebeu o nome de sua avó. Desde a aparência dela,
sua Bíblia tinha sido uma amiga de confiança. Surpreendeu-me que Moses a
leu, mas ele obviamente tinha, pelo menos o suficiente para encontrar a
passagem da escritura que ele queria que eu lesse. Voltei atrás na página
aberta e li as seções destacadas.
falar era sua coisa favorita e não algo com que ele lutava.
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The Song of David/ Amy Harmon
Mas Millie estava esperando por mim quando eu saí. Ela sentou-se
empertigada na cama, as mãos cruzadas no colo, apenas esperando.
— Você cheira bem, David, – ela disse com um sorriso, e eu senti uma
pontada que essas palavras invocavam na memória. Ela estendeu a mão
para mim, como se tivesse feito na noite em que nos conhecemos, como se
esperando por mim para agitá-la.
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— Agora que nós nos apresentamos outra vez, talvez você vá falar
comigo, – ela sugeriu suavemente.
Ela levantou-se lentamente, e ela estava tão perto que seu corpo
escovava o meu. Eu senti sua respiração em minha garganta, um pouco de
vibração da melodia que eu não podia tirar da minha cabeça, fora do meu
coração. Eu trouxe uma mão para o rosto dela e inclinei seu queixo para
cima, até que seus lábios estavam diretamente sob o meu. E então eu a
beijei. Tão levemente. Tão suavemente. Tentando desesperadamente para
não transformar a música em uma sinfonia, o canto em uma um evento de
orquestra.
doçura molhada de sua boca, era tudo que eu podia fazer para não gemer na
derrota. E, depois, estávamos caindo de costas na cama, seus quadris em
minhas mãos, a minha camisa apertada em seus punhos, e o beijo rugiu para
um inevitável, de repente crescente.
— Nós não temos que conversar. Mas você não pode me beijar e, em
seguida, ir embora de novo. Você não pode fazer isso comigo, David. – Havia
aço em sua voz, apesar de ter sido envolvido em veludo, e eu sabia que ela
quis dizer isso.
— Isso não é o que quero dizer, grandalhão. E você sabe disso. – Ela
sentou-se e cruzou as pernas debaixo dela. Ela manteve a mão no meu braço
a maneira como ela sempre fazia quando nós estávamos próximos, o contato
era importante para ela. Sim. Eu sabia o que ela queria dizer. Eu tinha me
levado embora. Me afastado. E ela estava me perguntando se eu estava indo
para fazê-lo mais uma vez.
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fazem, – eu sussurrei.
The Song of David/ Amy Harmon
— Ah, mas eu não vou. Vantagens de ser uma garota cega, – ela atirou
de volta, e não havia raiva em sua voz. — Eu não vou ter que ver você sofrer
em tudo, vou?
— Quando é que você vai começar acreditar que você é digno de ser
amado? – Sua voz soou atrás de mim, limpa e controlada, mas havia uma
fúria mal contida que fez as palavras oscilarem.
Fiz uma pausa e olhei para ela mais uma vez. Ela estava tentando me
seguir, e eu não tinha dúvida que, se eu saísse da casa, ela iria pegar sua
bengala, e eu seria forçado a jogar um jogo de Marco Polo pelas ruas de
Levan então ela não me perderia. Eu precisava que ela me deixasse ir e ela
obviamente não iria fazer isso.
— Millie
— Não! – ela gritou. — Você não acha que você é digno de amor, se
você não é Tag, se você não é o 'homem sexy!' – Millie fez aspas no ar e me
ridicularizou, imitando a conversa que tivemos quando ela jogou meus
acordes. — Você não acha que você é digno de amor, se você está doente.
Você não acha que você é digno de amor, se você não pode ser forte todo o
maldito tempo! Se você não pode cuidar de mim 24/7, você não deve ser
digno de amor.
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— Isso é isso, caramba! – Ela gritou, batendo o pé. Ela deu um passo
em direção a penteadeira decorativa onde ela cuidadosamente colocou as
coisas e, com um rara demonstração de temperamento, empurrou tudo ao
chão. Artigos de higiene pessoal, um secador de cabelo, um pilha da
lavanderia dobrada – tudo isso caiu fora das bordas, e Millie continuou
empurrando, assim como ela estava me empurrando.
torturado com isso agora. Mas Millie não estava esperando por mim para
contribuir para a conversa. Ela estava tremendo de raiva, e eu fiquei em
silêncio.
— Não. Ainda não, – ela me disse com firmeza, não que ela estivesse
gritando. — Eu entendo a culpa, David, eu entendo. Mas o amor não pode
ser unilateral. Uma pessoa não pode sempre dar e a outra pessoa não pode
sempre tomar. Se você realmente me ama, você tem que confiar em mim.
— Não. Você não. Você não confia em mim. E você não acha que você é
digno de amar.
— Você não acha que você é digno de meu amor se você não pode ser
forte todo o tempo, – ela repetiu com firmeza. — E você não acha que eu sou
forte o suficiente para estar lá para você quando você não está. Você não
confia em mim.
— Isto não tem nada a ver com a minha fé em você. Eu sei quem você
é, Millie. – Eu tropecei em minha resposta, tentando me expressar, tentando
dizer o que eu quis dizer e dizer o que disse. — Eu sei que você iria me ver.
Você diz para dar uma chance ao milagre, mas eu sinto como se eu já tivesse
o meu. Você é meu milagre! O fato de que eu e você estamos juntos, que nos
conhecemos, que eu encontrei o amor da minha vida. Isso é um milagre,
Millie! Sou tão grato por isso. Muitas pessoas não conseguem isso. Nós
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Seu rosto amassado e ela avançou para mim. Por fim, ela estendeu a
mão para mim. Pedindo-me. Fui até ela imediatamente, mas ela pressionou
ambas as mãos contra o meu peito, emoldurando meu coração, me
impedindo de puxá-la para mim. Em seguida, ela passou a mãos pelos meus
braços e encontrou minhas mãos. Ela embalou uma das minhas mãos entre
as suas e trouxe minha mão para seus lábios. Ela a beijou suavemente,
docemente, pressionando os lábios para o centro como se ela pudesse
aliviar a minha dor e a sua própria beijando tudo para longe. Em seguida, ela
mudou minha palma de seus lábios para deixa-la em sua bochecha. Ela se
inclinou para ela brevemente, segurando-a lá, como se ela tirasse suas
forças de mim, apesar do que ela havia dito. Então ela deslizou minha mão
pelo seu pescoço, além se sua clavícula, e pressionou a palma da minha mão
contra o peito, cobrindo-o completamente.
cada polegada íntima sua, quando fizemos isso prometemos com nossos
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The Song of David/ Amy Harmon
corpos e nossos lábios, eu pensei que seria a coisa mais íntima que eu jamais
faria.
— Millie? – Eu sussurrei. Eu não sabia onde ela estava indo com isso,
mas havia uma tristeza em suas palavras, e finalmente, como se tivesse
chegado a uma conclusão sobre mim, sobre nós.
— Mas não é. O sexo não é a coisa mais íntima que dois amantes
podem fazer. Até quando o sexo é bonito. Mesmo quando é perfeito. – Millie
respirou fundo, como se ela se lembrasse de como perfeito isto tinha sido.
— A coisa mais íntima que podemos fazer é permitir que as pessoas que
mais amamos nos ver em nosso pior. No nosso menor. No nosso mais fraco.
A verdadeira intimidade acontece quando nada é perfeito. E eu não acho
que esteja pronto para ser íntimo comigo, David.
deixa abrigar você. Você deixa eu te amar. Tudo de você. Câncer. Medo.
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Doença. Saúde. Melhor. Pior. Tudo de você. E você vai ter tudo de mim.
The Song of David/ Amy Harmon
— Você não tem que vencê-lo, David. Você não tem que vencê-lo. Você
apenas tem que nos deixar lutar com você.
— Amelie significa trabalho. – Eu não sei por que isso que veio à
minha mente, mas veio. Quando ela me segurou, eu pensei de sua força.
— Isso é certo. – Ela sorriu cintilando. — Então, você está indo para
trabalhar para mim ou não?
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The Song of David/ Amy Harmon
MOSES
— Henry, espere!
— Não vá lá. Millie está com Tag. E precisamos deixá-los sozinhos por
um tempo.
Henry olhou para a porta fechada e de volta para mim. Ele acenou com
a cabeça devagar. Eu peguei duas latas de Coca-Cola geladas da geladeira e
entreguei uma para ele, coloquei meu braço em volta de seus ombros e
levei-o de volta para fora da casa. Nós sentamos no deck, colocando nossos
pés em cima da balaustrada para que pudéssemos ver o trabalho Georgia
enquanto bebíamos as nossas bebidas. Eu amava assistir Georgia trabalhar.
Era a minha vez de acenar com a cabeça. Tag reuniu um grupo incrível
de caras. E a coisa mais legal sobre eles era como todos eles tratavam Henry.
— Não.
The Song of David/ Amy Harmon
Eu ri, um latido alto de alívio que lhe inclinou a cabeça para mim em
curiosidade. — Você estava indo tão bem, garoto. Eu pensei que você estava
370
— Sim. E eu não sei disso. Eu, eu, eu. Todo o tempo, – eu disse,
puxando a mão de Georgia trazendo-a para próximo de mim. Ela colocou os
braços em volta do meu pescoço e beijou meus lábios suavemente.
— Amém, – eu concordei.
***
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The Song of David/ Amy Harmon
Escuridão caiu afora, e as estrelas saíram. Millie não podia vê-las, mas
eu disse-lhe que elas estavam lá, grandes e brilhantes no céu fora da janela
de sacada do quarto de hóspedes. Eu disse a ela como eu deitava sob essas
estrelas quando um menino, dormindo na cama elástica no meu quintal em
Dallas. Eu disse a ela como, dez anos depois, Moses e eu tínhamos nos
esticado no convés do barco descendo o Rio Nilo, na África. Eu olhei para a
vastidão que nunca termina, e eu reconheci aquele velho sentimento. O
mesmo sentimento que tive quando era criança. Eu não me senti
insignificante sob as estrelas. Eu me senti grande, como se o céu girasse em
torno de mim. Eu era maior do que as estrelas. Eu era maior e mais
brilhante, e o mundo era meu. Eu era tão grande que eu poderia suportar
com meu polegar e completamente esquecer, minha mão acima segurando e
373
***
EU NÃO SEI que horas eram quando finalmente voltamos a falar. Nós
dormimos por horas e acordamos com a barriga roncando e a garganta seca,
mas colamos nossos rostos por baixo da torneira do banheiro e engolimos
água para aliviar a nossa sede, apenas para não ter que sair do quarto. Então
a boca de Millie encontrou a minha, os lábios molhados e frios, a água
agarrado em seu queixo e deslizando para baixo de seus seios, e começamos
mais uma vez. Algum tempo antes do amanhecer, eu tentei deslizar para
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— Nojento.
Eu mandei para baixo três sanduíches pelo tempo que levou ela comer
um e abrir uma lata de refrigerante, ouvir as bolhas por apenas um segundo
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— Sim.
— E agora? – Perguntei.
Eu esperei.
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— Mas porque eu sou cega, eu o quis dar-lhe muito tempo para saber
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— Sim. Eu queria.
— Não, – eu sussurrei. Porque isso não era. Não quando ela colocava
dessa forma.
boca. Ele parecia cansado. Mas parecia bem. O suficiente, mas parecia bem.
Satisfeito. E eu ainda não tinha me acostumado com seu novo cabelo.
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The Song of David/ Amy Harmon
Pareceu um pouco raspado demais para meu gosto, mas em Tag funcionava.
Ele tinha uma boa mandíbula para fazer isso acontecer, irritante como era.
— Você parece uma merda, Tag. - Menti, apenas porque era nosso
costume de brincar um com o outro.
— O quê? - Engasguei.
— Naquele tempo que você queria me matar? - Tentei rir, mas não
consegui reunir alegria suficiente. Minha risada soou como se tivesse levado
um soco no estômago, o que era extremamente justo, pois Tag tinha feito
exatamente isso. Eu perguntei a ele sobre Molly, e ele me deu um soco no
estômago, um tapa na cara, e me derrubou no chão. E eu tinha dado boas-
vindas e lutado de volta.
— Como você sabia? - Disse Tag, seus olhos nos meus. A algazarra ao
redor de nós acalmou um pouco. — Como sabia sobre minha irmã? - Os
ajudantes nos puxaram do chão e nos colocaram nas cadeiras, mas Dr, Andelin
me pressionou para responder.
— Moses, você vai ter que explicar para Tag o que quis dizer quando
perguntou se alguém conhecia uma garota chamada Molly.
— Eu não sabia que era a irmã dele. Não o conheço. Mas eu tenho visto
uma garota chamada Molly por quase cinco meses. - Eu disse.
Todos me encararam.
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— Vê-la? Você quer dizer que teve um relacionamento com Molly? - Dr.
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Andelin perguntou.
The Song of David/ Amy Harmon
— Eu quis dizer, ela está morta, e sei que está morta porque nós últimos
cinco meses tenho sido capaz de vê-la. - Eu disse pacientemente.
— Ver ela como? - A voz do Dr. Andelin era plana e seus olhos frios.
— Da mesma maneira que posso ver sua esposa morta, Doutor. Ela
continua me mostrando a viseira de um carro e neve e umas pedrinhas num
fundo de um rio. Eu não sei por quê. Mas provavelmente você pode me dizer.
— Ela te segue toda parte. Você sente muita falta dela. E ela se
preocupa com você. Ela está bem... mas você não. E sei que é sua esposa
porque ela fica te mostrando esperando no altar. Seu dia de casamento. Seu
smoking estava um pouco curto demais nas mangas.
abrandou e suavizou minha voz. Eu não poderia manter minha atitude contra
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The Song of David/ Amy Harmon
Em algum momento entre essa trágica história, Tag perdeu sua fúria.
Ele olhou de mim para Dr. Andelin em confusão e compaixão. Mas Cora
Andelin não se foi, era como se ela sabia que eu tinha a atenção do médico e
não quisesse perder qualquer momento.
Mas Dr. Andelin se focou, com seus olhos azuis intensos e cheios de suas
próprias memórias, e outra coisa também. Gratidão. Seus olhos estavam
cheios de gratidão.
manga do meu smoking estava curta demais. Ela sempre ria sobre isso. E
The Song of David/ Amy Harmon
como sua coleção de guarda-chuvas estava fora do controle. - Sua voz quebrou
e olhou para as mãos.
Estranho. Eu não tinha pensado sobre Cora Andelin desde que deixei
Montlake. Não a tinha visto mais desde aquele dia, assim como eu havia
previsto. Mas a memória era tão nítida e específica que senti uma sensação
de déjà vu55, como se Tag não fosse o único que tivesse sonhado com ela. O
rosto do Dr. Andelin, quando eu disse que podia ver sua esposa, foi
queimando de volta dentro dos meus olhos. Atirei todos seus precisos
detalhes, detalhes de sua vida, de sua vida juntos, na sua cara, simplesmente
porque eu precisava distrai-lo de seu olhar tão duro no meu. Eu era um
fodido idiota naqueles tempos.
— Se lembra quando você disse que sua esposa estava bem, mas o
Doutor não? - Tag perguntou.
— Ela te segue toda parte. Você sente muita falta dela. E ela se
preocupa com você. Ela está bem... mas você não.
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O termo “déjà vu” vem do francês e quer dizer literalmente “já visto”, significa uma sensação do passado; como
se o que estamos vivendo no presente já tenhamos vivido há muito tempo.
The Song of David/ Amy Harmon
— Esse era o porquê de ela estar por perto. Ela estava preocupada
com ele. - Disse.
— Não posso curar o câncer, Tag. E assim como com certeza não posso
parar as pessoas que amo de me deixar. Não consegui salvar Gi. Eu não
salvei Eli. Mas tenho alguma influência do outro lado. E todos vão ter que
passar por cima de mim se quiserem você.
— Tudo bem. - Sussurrou. — Tudo bem. Mas Mo, se isso não for o
suficiente. Se no final, isso não for o suficiente, eu vou precisar de você para
cuidar de Millie e Henry. Millie não vai querer deixar. Ela é teimosa. Mas se
certifique dela não parar de dançar. Eu odeio, mas ela ama. E isso é a coisa
mais importante. Se certifique dela estar fazendo as coisas que ama. Não a
deixe ficar se lamentando por muito tempo. Não a deixa se lamentar como o
Dr. Andelin fez, fazendo sua esposa morta o seguir por todos os lados
porque ele não a deixa partir. A ajude a me deixar ir, Mo. Diga a ela que
estou feliz. Faça essa merda acontecer.
— Diga a ela que estou lutando com as lendas no céu, que estou
correndo pelos prados de flores, que sou alimentado com uvas... diga isso.
Ela não vai gostar disso. Apenas diga que estou comendo uvas.
— Vou lutar com essa coisa, Mo. Vou lutar tão duro o quanto puder até
a campainha soar. Mas se a campainha tocar mais cedo demais, quero que
me prometa que vai cuidar da minha menina. Temos um acordo?
Ouvi a porta dessa vez e abaixei minha cabeça, não estava pronto para
audiência, mas era apenas Millie, e Millie não podia ver lágrimas. Seu rosto
estava brilhante e rosa, como se tivesse acabado de lavá-lo, e seu escuro
cabelo estava lindo e ao redor dos ombros. Ela tinha um café numa das
mãos, e meu bule definitivamente se foi, e estendeu a outra.
— Estou aqui, baby. - Tag se levantou e pegou sua mão, guiando para
frente e depois em seu colo. Ele pegou seu café e roubou um gole enquanto
ela deu um beijo na sua cabeça. Seu braço esquerdo estava ao redor do
pescoço e notei o anel em seu dedo. Meu coração encheu dentro do peito, e
por um momento estava apenas doce, mesmo se eu não estivesse surpreso.
Me fez lembrar das imagens mostradas no dia anterior.
***
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The Song of David/ Amy Harmon
Millie me ligou. Sua voz estava com medo e pesar, e era tão parecido
com a chamada que ela fez seis semanas antes, procurando por Tag, o que
me levou imediatamente de volta, imediatamente apreendido pelo medo e
pavor. Tinha acabado de vê-los em seu casamento uma semana atrás e
fiquei tão esperançoso. Eu estava tão certo que iam superar as
probabilidades. Não apenas do câncer, mas as probabilidades. Eles eram
loucos um pelo outro, e sua beleza e sua devoção eram tangíveis, um pulso
de tons de rosas que eu ardia em pintar. Estavam se movendo rápido, o que
era o estilo do Tag, mas nada as pressas. Isso era certo. O casamento
improvisado e a festa no bar me fez desejar que eu pudesse casar com
Georgia tudo de novo, e nós conseguimos uma babá e dançamos juntos pelas
primeira vez desde o nosso casamento.
— Moses?
— Estou a caminho.
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uma hora e meia mais tarde, ele estava doente demais para se colocar numa
The Song of David/ Amy Harmon
briga, apesar de piscar para mim e insistir em se sentar atrás com Millie
para que pudesse segurar sua mão. Nem tinham chegado a ter uma lua-de-
mel, embora Millie dissesse que não se importava. Ela estava mais
interessada em ter seu marido. Lua-de-mel podia esperar, a quimioterapia
não. Henry não queria voltar para o hospital de novo. Não podia culpa-lo, eu
não queria voltar, então ficou com Robin, e não estava escondendo seu
medo muito bem. Nenhum de nós estava.
continuaram. Isso era como a convulsão tudo de novo, mas Tag estava
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Ele tinha virado de lado e sua testa pressionada contra o peito dela.
Millie se esforçou para segurá-lo, o rigor dos tremores o sacudindo, fazendo
seus dentes vibrarem com o seu. Mas ela não soltou. Em algum momento ele
pediu algo para morder, depois de sua boca começar a sangrar por ter
mordido a língua. Mas ele continuou com a cabeça pressionada no seu peito
enquanto seu corpo resistia na cama estreita.
queria ver sua irmã morta no seu ombro, seu bisavô esperando
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pacientemente pela passagem. Eu não queria ver nada disso. Não quero
The Song of David/ Amy Harmon
— Você os vê, Mo? Molly está esperando por mim? Se está, então nós
dois sabemos o que isso significa.
— Não. Ela não está esperando, cara. Somos apenas nós, eu, você e
Millie. Somos os únicos aqui. Não é a hora ainda, Tag. - Não era uma mentira.
E me recusei a acreditar em algo mais.
— Te amo, Mo.
Porque você tem uma equipe, e esta equipe está contando com você,
ninguém quer desistir. No MMA, desistir é pior do que perder uma luta. Se
você luta até o fim e você perde a luta, você realmente não perdeu. Mas se
você entra em uma luta e você desiste? Isso é difícil para um lutador. Isso é
difícil para sua equipe. Isso é duro para a moral. Isso significa que você não
leva seriamente seu adversário, você não fez seu dever de casa, você não se
preparou, sua equipe não o ajudou a se preparar, e você foi pego com as
calças no chão. Ou isso significa que você ficou com medo e não confia em
seu treinamento. Você não confia em si mesmo. Você não confia em sua
equipe. Então você desiste. E isso é difícil de voltar atrás.
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Ninguém luta sozinho. Este era o meu lema para a Equipe Tag, mas foi
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o meu lema para todos os outros. Foi o meu lema para meus companheiros
The Song of David/ Amy Harmon
Meu objetivo agora? Não desistir. Ficar por perto. Permanecer aqui.
Lutar. E como eu disse a Moses, quando a campainha toca, ela toca. E até
agora, minha equipe está pegando completamente. Minha equipe inteira.
Henry conduziu Millie abaixo pelo corredor, e ela usava o véu de sua
mãe e um vestido de renda branca que parecia mais adequado para outra
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Tivemos uma recepção no bar que era mais uma pós-festa do que
qualquer coisa, e Millie e eu dançamos até ficarmos sem fôlego, mas
partimos quando ainda estava em pleno andamento. Eu não deveria dirigir,
então Mikey brincou de motorista e nos levou para o nosso hotel,
arrastando luvas de boxe e latas e um par de sapatos tamanho 16 de Axel no
para-choques, gritando – Accidental Babies56 – a pedido de Millie – como
fizemos no banco de trás.
Eu estava feliz que ela não seria capaz para dançar em torno desse
maldito poste por muito mais tempo. Eu não queria mostrar o meu homem
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das cavernas interior, e vamos ser honestos, o meu homem das cavernas
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interior é uma vagina, mas eu não era louco sobre outros homens olhando
para minha esposa dançando em torno de um poste. Sugeri que ela deveria
tocar sua guitarra um par de noites na semana no bar, mas ela parecia
contente em manter a dança no porão e adicionar algumas aulas de pré-
natal de yoga para aptidão no cronograma da Equipe Tag, e realmente
puxado algumas boas novas adesões.
***
partilhar o seu apelido, e quando Moses ouviu a notícia, ele disse que o
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The Song of David/ Amy Harmon
pequeno Mo poderia tê-lo, ele não queria este. Ele odiava quando eu
chamava ele de Mo. Mas eu sabia que ele estava secretamente emocionado.
Pequeno Mo podia ter sido um grande bebê, mas ele ainda era tão
pequeno que o seguramos por três dias seguidos por medo de se nós
deitássemos perderíamos ele no chão. Millie quebrou alguns dias antes de
ele nascer, me dizendo como ela estava com medo que ela não seria capaz
de cuidar dele, mas eu nunca duvidei dela. Ela era natural. O que ela não
sabia, ela descobria, e ela o descobria rápido. Ela se aproximou com a
maternidade mesma atitude se aproximava tudo, e ela tinha sido mãe para
Henry há muito tempo. Ela não era exatamente nova para o emprego.
conhecer.
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The Song of David/ Amy Harmon
Millie declarou seu choro vigoroso um seu som favorito no momento em que
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58 No original ele fala “Mo wants mo’”, em que o segundo é uma contração de “mom”, que é mãe.
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veio ao mundo, gritando como se sua vida tinha acabado, em vez de apenas
começar.
Eu tinha começado a fazer fitas para ele. Eu poderia ter alterado para
um conversor gravador digital. Mas as fitas funcionam para mim. Eu gostava
de como elas eram tangíveis. Millie disse que ela iria pegá-las e então
convertê-las, todas elas, para discos, e eu disse que estava tudo bem. Mas eu
continuei fazendo as fitas, e eu tinha uma grande pilha delas, um diário
verbal do ano passado, os dias da minha vida, os dias de nossa vida em
conjunto. Agora eu estava fazendo-as para o pequeno Mo.
Eu pensei que ela tinha, ela ficou em silêncio por um tempo. Nós dois
estávamos cansados. Exaustos. O ano passado tinha sido o céu e o inferno.
Música e miséria. Não tinha sido uma batalha fácil, e eu ainda não estava
livre do câncer. Mas eu não estava perdendo a batalha também. Eu poderia
perder a guerra. Eventualmente, eu poderia perder. Mas nós não
pensávamos sobre isso.
— Eu amo suas pernas. Eu amo seu peito, mas esse ponto aqui, eu amo
mais, – ela cantarolou.
Eu ri novamente.
— Eu te amo mais a cada dia que passa, eu vou te amar quando você
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evitar o fim todos juntos. Eu descobri que não tinha que ver o que está em
frente de mim para continuar. Millie me ensinou isso.
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EPILOGO
MOSES
coisas que eu deixei. Eu sabia que ele nem sequer queria-as. Deixava porque
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sem ele, e mesmo que minha vida foi preenchida com os entes queridos,
nada preencheu o espaço onde ele devia estar.
A vida não tinha sido fácil na equipe, mas a vida não é fácil para
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ninguém. Poucos anos atrás, a esposa de Mikey perdeu sua luta com o
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