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John Maynard Keynes 0 maior economista do século XX. A importancia e a atualidade de suas idéias nao sao apenas teéricas, mas principalmente praticas. A chamada “revolugao keynesiana” nao se limitou ao campo do pensamento econdmico; ela se fez sentir sobretudo a nivel da politica econémica. Keynes 6 um autor bastante citado no Brasil, mas pouco conhecido de fato. Da sua obra s6 foram traduzidos até agora para 0 portugués 0 livro Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda e alguns fragmentos sobre “Inflacao e Deflacao”. Esta coletanea vem preencher uma la- cuna, ao mostrar, através de uma selegao de textos e de uma introdugdo critica, a génese e a evolucdo do pensamento de Keynes, os pressupostos tedricos sobre os quais se assentam seus trabalhos e a visdo do mundo em que eles se inserem, CIENTISTAS SOCIAIS Textos bisicos de Ciencias Sociais, selecionados || ‘com a supervisao geral do Prof. Florestan Femandes. ‘Abrangendo seis disciplinas fundamentais da ciéncia social - Sociologia, Historia, Economia, Psicologia, Politica e Antropologia - acolecao apresenta 0s autores modemnos e contemporaneos de maior destaque mundial, focalizados através de introducao critica e_ biobibliogr ad por especialistas da universidade brasileira. A essa introducao critica ‘segue-se uma colelanea dos ‘textos mais representativos de cada autor. | ieador Tamas Szmrecsanyi ‘ionador Florestan Fernandes 1. A EUROPA ANTES DA GUERRA (1919) * Antes de 1870, as diversas partes do pequeno continente curopeu tinham-se especializado em produtos de sua lavra; mas, como um todo, a Europa era substancialmente auto-suficiente. E sua populagio esta- va ajustada a esse estado de coisas. desenvolveu-se, om grandes proporgées, uma situa- gto toh recente: oy nev cio anon gts, as condiier coondmices da Taropa toraran-ae Inshves © gama. | qq esto da populagio por ali que jf se equilibrara com a acessibilidade dos suprimentos da América, neira ver se inverteu definitiva- mente na Histéria documer ‘A medida que crescia a populacao, isenata*sckaal realidade em garantir sua alimentagio, | Matores rendimentos, proporcionados por uma crescente escala de producio, tornaram-se a regra tanto na agricultura como mi ia. De um lado, com o crescimento da populacdo curopéia, aumentaram os emigrantes para cultivar 0 solo dos novos pafses e, do outro, a Europa passara a dispor de um maior nimero de operdrios, para fabricar os produtos industriais e os bens de capital, para manter as populagses emigradas em seus novos lares ¢ construir estradas de ferro navios capazes de tornar acessiveis & Europa matérias-primas e alimentos de origem distante. Até aproximadamente 1900, uma unidade de forga de trabalho aplicada a indistria produzia ano apés ano um poder de compra rela- ivo a uma quantidade crescente de alimentos. sImente por volta de 1900, este proceso comecou a se inverter, firmando-se novamente uma producio decrescente da natureza em relacio aos esforgos do © Reproduzide de KEYNES, J. M. “Europe before the War.” In: The Economic Consequences of the Peace — Collected Writings of John Maynard Keynes. Londres, Macmillen, 1971. v. M1, p. $-16, 4a homem. tendéncia altista do custo real dos cereais foi aullbreda por ottes egal o entfo urn das sults novkie des — pela primeira vez, sos da Africa Tropical passaram a ser utilizados inte um grande tréfico de sementes oleaginosas passa a levarhmesaeufopa una nova forma menos dispense de alimentos essenciais humtauidade, A maioria de nossa geragao fol criada nessa utopia econdmica, que os economistas de antigamente considerariam um verdadeiro Eldorado. Aquela idade feliz perdeu de vista a visio do mundo que mer- gulhara os fundadores de nossa Economia Politica numa profunda melancolia, Antes do século XVIII, a humanidade nao alimentava falsas esperangas. Para tirar as ilus6es que se difundiram no final dessa época, Malthus precisou revelar uma tragédia. Durante meio século, todos os trabathos sérios de Economia conservaram essa tragédia como uma evidente possibilidade. ‘© meio século seguinte, cla foi acortentada e mantida oculta, Agora € possivel que a tenhamos liber- tado n Que episédio “extraordinério do progresso econémico do homem esse perfodo que terminou em agosto de 1914! E verdade que a maior parte da populacio trabalhava muito ¢ vivia num baixo nivel de conforto, embora tivesse toda a aparéncia de estar razoavelmente feliz com a sua sorte, Contudo, todo homem de capacidade ou carter tinha possibili- dade de ascender as classes médias ou superiores, para as quais a vida oferecia, a baixo custo € com pouca perturbagao, oportunidades, conforto ¢ amenidades, fora das possibilidades dos monarcas mais ricos € mais poderosos de outras épocas. Qotabitante de Londres poderia pedir por telefone, enquanto tomava 0 ché da manhé na cama, os diversos produtos de todo 0 mundo, na quantidade que considerasse adequada, © esperar, com certeza, a pronta entrega dos mesmos simultaneamente, € pelos mesmos meios, poderia aventurar sua riqueza em recursos naturais e novas empresas de qualquer ponto do mundo, e participar, sem esforco ou mesmo preocupacao, dos seus provaveis resultados vVantagens; ou entdo poderia resolver combinar a seguranca de sua fortuna com a boa £6 dos cidadios de qualquer municipalidade impor- tante em qualquer continente que The fosse proposto pela fantasia ou pela informaco. Se desejasse, poderia garantir sem demora meios baratos ¢ confortaveis de transporte para qualquer pais ou clima, sem passaporte ou qualquer outra formalidade, poderia mandar seu. criado A agéncia vizinha de um banco para busear a quantidade de metais 45 preciosos que Ihe parecesse adequada e, entio, seguir ao Exterior, para paises estrangeiros, sem conhecimento de sua religido, lingua ou cos- See eae pe eae ante) Beniacinjee tase inet Mas, QHD pean de tudo, ele considerava essa situacdo jal, certa e permanente, a nao sis de nov popes ener uae fon coms eka eer acest Ce ecient de cionopélion, restrigées e privilégios, que deveriam desempenhar o papel da serpente nesse paraiso, eram pouco mais que divertimentos no seu jornal didrio, fe quase nem pareciam exercer qualquer influéncia no curso normal da vida social e econdmica, cuja internacionalizagéo se tornara quase ee oe Se cu clucidar um pouco mais alguns dos principais elementos instaveis da vida econdmica européia, ji presentes quando estourou a Guerra, isso nos ajudaré a avaliar o cardter e as conseqiiéncias da paz ‘que impusemos 20s nossos inimigos. I. Populacio Em 1870, a Alemanha tinha uma populacdo de aproximadamente 40 milhdes de habitantes. Por volta de 1892 este némero subira a 50 milhées, e em meados de junho de 1914, para cerca de 68 milhées. ‘Nos anos imediatamente anteriores & Guerra, o crescimento anual era de cerca de 850 mil, dos quais emigrava uma proporgio insignificante. * Este grande aumento s6 se tomou possfvel por uma ampla transforma- do da estrutura econémica do pais. De agricola e, principalmente, auto-suficiente, 2 Alemanha transformou-se numa imensa ¢ complexa méquina industrial, dependente, para seu funcionamento, do’ equilibrio de muitos fatores externos a0 pafs, bem como de fatores’ internos. Somente fazendo funcionar esta maquina continuamente ¢ a’todo vapor, poderia ela conseguir ocupagio no pais para sua crescente populacio, bem coma os meios necessérios para comprar sua subsisténcia no estrangeiro, A méquina alemé era como um piso que, para manter 0 equilfbrio, deveria progredir cada vez com maior rapidez. No Império Austro-Htingaro, cuja populagio aumentou de apro- ximadamente 40 milh6es em 1890 para pelo menos 50 milhdes quando 7 Em 1913 hove 25.843 emigrantes da Alemanha, dos quais 19.124 foram para (0s Estados Unidos.

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