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22/10/2018 Lei 13.

260/2016 "Antiterrorismo" - A tipificação de atos preparatórios

jusbrasil.com.br
22 de Outubro de 2018

Lei 13.260/2016 "Antiterrorismo" - A tipificação de atos


preparatórios

1. Tipi cação da Conduta de


Terrorismo
A Lei n. 13.260, de 16 de março de 2016, inovou no ordenamento
jurídico penal pátrio, ao tipificar a conduta de terrorismo, tendo
definido quais são os atos que servem para a sua configuração, assim
como aqueles que, expressamente, restam afastados da subsunção
tipifica, não podendo ser considerados como atos de terrorismo. Além
de disciplinar acerca de outras questões pertinentes ao tema.

Sem olvidar de doutrina contrária, a qual entende que o crime de


terrorismo já se encontrava tipificado no ordenamento jurídico pátrio
por força do artigo 20, da Lei 7.170/1983, nos parece que referida
previsão não possuía o condão de criminalizar a conduta, haja vista a
sua extrema vagueza[1].

A Constituição Federal de 1988, em seu artigo 5º, inciso XLIII, ao


dispor acerca dos crimes hediondos e equiparados a hediondos, inseriu
um mandado mínimo de criminalização, pelo que haveria o legislador
pátrio de definir, em lei própria, o que viria a ser considerado como
conduta de terrorismo, criminalizando a conduta, com previsão de
sanções penais pertinentes.

Passados quase 28 (vinte e oito) anos da promulgação da Constituição,


somente agora veio o legislador a regulamentar a tipificação penal do
crime de terrorismo, por certo motivado pela realização dos Jogos
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Olímpicos de 2016 na cidade do Rio de Janeiro, assim como por
decorrência dos constantes, e cada vez mais costumeiros, ataques
terroristas ocorridos em diversos países, tais como os ocorridos na
cidade de Paris em Novembro/2015.

Em seu artigo 2º, a Lei 13.260 define o que vem a ser considerado
como terrorismo para fins de tipificação penal, dispondo:

Art. 2o O terrorismo consiste na prática por um ou mais indivíduos


dos atos previstos neste artigo, por razões de xenofobia,
discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia e religião, quando
cometidos com a finalidade de provocar terror social ou
generalizado, expondo a perigo pessoa, patrimônio, a paz pública
ou a incolumidade pública.

Já há quem critique a utilização por parte do legislador de termos


considerados como vagos, a exemplo do “terror social”, haja vista que
não haveria uma clareza necessária ao princípio da legalidade, na
utilização de referido termo[2].

Não se busca neste momento analisar críticas como as acima


mencionada, mas sim demonstrar a preocupação que o legislador teve
com a prática de atos terroristas, de modo que previu tipo penal
tipificando, inclusive, atos preparatórios das condutas descritas no
artigo 2º, § 1º da estudada lei.

Dispõe o seu artigo 5º que será considerado como crime, inclusive, a


prática pelo agente de atos preparatórios ao terrorismo, quando
demonstrada a sua intenção de consumação do delito, sendo que a
pena, nestes casos, será diminuída de um quarto até a metade.

Art. 5o Realizar atos preparatórios de terrorismo com o propósito


inequívoco de consumar tal delito:

Pena - a correspondente ao delito consumado, diminuída de um


quarto até a metade.
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Trata-se de inequívoca demonstração da preocupação do legislador
pátrio com mecanismos para evitar a ocorrência efetiva de condutas
terroristas, antecipando-se à consumação do delito e, inclusive, ao
início de sua execução (em termos penais), punindo-o mesmo não
tendo transcorrido todo o iter criminis.

2. Iter criminis – criminalização dos


atos preparatórios
O iter criminis corresponde ao caminho que o agente perfaz para a
prática do delito. Traduz-se em diversas etapas, as quais podem ser
citadas a cogitação, atos preparatórios, atos executórios e a
consumação. Ordinariamente, não se mostra relevante para fins de
tipificação penal a fase de atos preparatórios, sendo que a subsunção
típica inicia-se, em regra, a partir dos atos de execução (no qual pode
ser configurada a tentativa, ou mesmo ensejar, por si só, em crime
autônomo, sendo a eventual lesão ao bem jurídico exaurimento do
delito).

A fase de cogitação consiste naquela em que o agente cria (ou tem


criada) em sua mente a idéia do cometimento do delito. Trata-se de
uma fase interna, cogita a prática do delito e o aceita, no entanto não
há qualquer exteriorização deste pensamento para o mundo real, pelo
que tal fase mostra-se impunível penalmente.

Em seguida, ocorre a primeira fase externa do iter criminis, consistente


na fase dos atos preparatórios, na qual o agente, sem adentrar na
execução das condutas inseridas no preceito primário do tipo penal,
inicia a preparação para a realização destas. Em regra, não se trata de
fase punível no sistema pena brasileiro.

Ensina o professor Cleber Masson: “Preparação ou atos


preparatórios: Corresponde aos atos indispensáveis à prática da
infração penal, municiando-se o agente dos elementos necessários
para a concretização da sua conduta ilícita. Precisa ir além do
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simples projeto interno (mínimo), sem que se deva, contudo, iniciar a
imediata realização tipicamente relevante da vontade delitiva
(máximo). Os atos preparatórios, geralmente, não são puníveis, nem
na forma tentada, uma vez que não se iniciou a realização do núcleo
do tipo penal. De fato, o art. 14, II, do CP vinculou a tentativa à
prática de atos executórios. Em casos excepcionais, é possível a
punição de atos preparatórios nas hipóteses em que a lei optou por
incriminá-los de forma autônoma. São os chamados crimes
obstáculo.”.

Como demonstrado, há exceções à regra de que os atos preparatórios


não são puníveis no sistema jurídico penal pátrio, verificado naqueles
casos em que o legislador opta por tipificar, desde logo, a conduta
preparatória como crime autônomo. Na Lei 13.260/2016, vê-se dois
exemplos dessa criminalização, segundo se passa a expor.

Integração da Organização Terrorista

Uma primeira punição de atos que não necessitam de resultado


material (crimes formais) reveste de técnica legislativa já conhecida no
sistema penal brasileiro, em que se pune o fato de o agente integrar a
organização que tenha como finalidade a prática de crime (s). A
exemplo desta forma de tipificação, tem-se a inserida no artigo 288 do
Código Penal, correspondente à associação criminosa, assim como a
prevista na Lei 12.850/2013, consistente em integrar organização
criminosa.

Mesmo que a referida organização e o agente não venham a praticar


delitos (finalidade precípua da organização/associação), o simples fato
de integrar esta já configura delito punível em nosso ordenamento,
haja vista o perigo representado por esta forma de agrupamento. O
simples animus associandi já corresponde à lesão a bem jurídico
tutelado, por isso, merecedor de tipificação autônoma.

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“Os atos preparatórios, em regra, são impuníveis.
Excepcionalmente, todavia, merecem punição, configurando delito
autônomo. É o que ocorre, por exemplo, com o crime de associação
criminosa (art. 288 do CP, antigo delito de quadrilha ou bando).
Aquele que se reúne com três ou mais pessoas para planejar a
prática de crimes está em plena fase de preparação (dos crimes
futuros), mas já executando a formação de um grupo criminoso,
comportamento esse que o legislador entendeu grave o suficiente
para justificar tipificação autônoma e independente dos delitos
visados pela associação. (...)”[3]

Na mesma sistemática, a Lei 13.260/2016 prevê a punição ao agente


que integre organização destinada a prática de atos terroristas,
conforme artigo abaixo transcrito.

Art. 3o Promover, constituir, integrar ou prestar auxílio,


pessoalmente ou por interposta pessoa, a organização terrorista:

Pena - reclusão, de cinco a oito anos, e multa.

A exemplo, suponha que um indivíduo brasileiro venha a integrar a


organização terrorista do Estado Islâmico, com grande atuação no
cenário mundial atualmente. Mesmo que referido indivíduo não
chegue a praticar nenhum ato terrorista em prol desta organização, o
simples fato de estar a ela integrado já ensejará em sua punição na
forma do artigo acima descrito.

Criminalização de atos preparatórios puros

Lado outro, o artigo 5º da Lei 13.260 antecipa o momento de punição


do agente não em relação à integração de organização terrorista, mas
sim da preparação para a realização das condutas previstas no artigo
2º, § 1º da referida lei.

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Veja que o legislador quis evitar que fosse passível de punição o agente
tão somente a partir do início da execução de atos materiais destinados
à realização do ilícito. Ao contrário, antecipou-se na configuração do
delito, punindo o ato preparatório ao terrorismo, mesmo antes do
início de qualquer ato executório, desde que demonstrada a finalidade.
Não é fácil de determinar o momento em que se separa a preparação da
execução, no entanto, pensamos possível o exemplo abaixo.

Pela redação do artigo 5º, mostra-se possível a punição do agente que


faz aquisição de produtos químicos destinados à fabricação de artefato
químico capaz de ensejar em destruição em massa. Não há a
necessidade de que haja a efetiva montagem deste artefato e a sua
instalação no local de explosão desejado ou, ao menos, o
encaminhamento do agente ao local. A simples aquisição dos produtos,
demonstrada inequivocamente que o animus do agente dirige-se à
prática do delito, torna possível a sua punição do agente com base no
artigo 5º da Lei anti-terrorismo.

Não se trata de tentativa do delito, haja vista não ser necessária a


conjugação do artigo 14, II do Código Penal com o artigo 2º, § 1º da Lei
13.260/2016. Trata-se, evidentemente, de tipo penal autônomo,
punível por si só.

Veja que para a configuração de crime tentado, faz-se necessário que o


agente tenha iniciado a prática de atos executórios mas, por
circunstancia alheia à sua vontade, não logrou êxito na consumação do
delito. No entanto, em tal situação, o agente já ultrapassou a fase
preparatória, tendo dado inicio aos atos de execução, com a realização
material das elementares descritas no tipo penal.

Diferentemente, no artigo 5º da Lei anti-terrorismo, o agente não inicia


a efetiva execução do delito, pelo que não há que se falar em tentativa
do cometimento das condutas elencadas naquele art. 2º, § 1º. Pune-se
desde logo os atos preparatórios, na forma como já exposta.

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Certamente surgirão correntes doutrinárias criticando a criminalização
dos atos preparatórios aqui expostos, sob a alegação de que estaria
sendo violado o princípio da ofensividade, inerente ao direito penal,
assim como poderia se estar priorizando o Direito Penal do autor em
face ao Direito Penal do fato. Sem discordar da possibilidade de
opiniões contrárias, parece que a tipificação de atos preparatórios de
terrorismo mostra-se adequada e proporcional, tendo em vista a
necessidade de um direito penal, ao menos, de terceira velocidade em
contraponto a tais condutas que, não raras vezes, assolam toda a
humanidade. Ainda mais em momento de proximidade de evento
mundial a ser recebido pelo Brasil.

Não se quer dizer que o Direito Penal deve trazer consigo uma
simbologia para dar ao cidadão um sentimento de tranquilidade, com
punições severas, entre outros mecanismos propagados pela mídia
como salvadores da segurança social. Mas não há como negar que há
determinadas condutas que merecem atenção especial e mecanismos
para que sejam, ao máximo evitadas, como, ao que parece, a de
terrorismo.

Do mesmo modo que o sistema penal clássico mostra-se insuficiente


para o combate à crimes de maior complexidade - como os crimes de
colarinho branco, por exemplo - deve-se ter em consideração que o
combate ao terrorismo deve escapar aos sistemas clássicos de punição,
encontrando mecanismos efetivos de controle destes atos.
Evidentemente, deve-se manter a dignidade da pessoa humana e todas
as garantias constitucionais, penais e processuais penais ao sujeito
incriminado, haja vista que o contrário é rechaçado por nosso
ordenamento constitucional.

Aproxima-se, em verdade, de um direito penal do inimigo, de Gunter


Jakobs, no que tange à antecipação da punibilidade do agente, eis que
não se espera a realização efetiva do fato material, sendo a sua
preparação já considerada como ilícito penal.

https://pascuetoamaral.jusbrasil.com.br/artigos/317284328/lei-13260-2016-antiterrorismo-a-tipificacao-de-atos-preparatorios 7/10
22/10/2018 Lei 13.260/2016 "Antiterrorismo" - A tipificação de atos preparatórios
“(...) Dito de outro modo, o lugar do dano atual à vigência da
norma é ocupado pelo perigo de danos futuros: uma regulação
própria do Direito penal do inimigo. O que, no caso dos terroristas
– em princípio, adversários – pode ser adequado, isto é, tomar
como ponto de referencia as dimensões do perigo, e não o dano à
vigência da norma, (...)”.[4]

Não se quer aqui defender a toda razão a doutrina do direito penal do


inimigo, na forma como preconizada por Jakobs. No entanto, não há
como se olvidar que a tipificação de delitos de terrorismo,
especialmente a antecipação da configuração do delito, mostra-se, a
princípio, condizente com a gravidade e a complexidade de
mencionado crime.

Evidentemente, há outras críticas e análises a serem feitas sobre a Lei


13.260/2016, tais como a possibilidade dada pela lei de o próprio
magistrado de ofício, ainda em sede de investigações criminais,
decretar medidas assecuratórias, na forma do artigo 12. Não há como
esgotar a rica discussão em poucas páginas e em um único e rápido
estudo.

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3. Referências.
https://pascuetoamaral.jusbrasil.com.br/artigos/317284328/lei-13260-2016-antiterrorismo-a-tipificacao-de-atos-preparatorios 8/10
22/10/2018 Lei 13.260/2016 "Antiterrorismo" - A tipificação de atos preparatórios
JAKOBS, Gunter. Direito penal do inimigo: noções e críticas. 2ª Ed.
Tradução: André Luis Callegari, Nereu José Giacomolli. Editora:
Livraria do Advogado. 2007.

LIMA, Renato Brasileiro de. Legislação criminal especial comentada.


2ª Ed. 2014. Editora Juspodivm

BARBOSA, Ruchester Marreiros. Lei 13.260/2016 é um ato terrorista à


hermenêutica constitucional. Disponível em:
http://www.conjur.com.br/2016-mar-22/academia-policia-lei-
132602016-ato-terrorista-hermeneutica-cons...

MASSON, Cleber. Direito penal esquematizado – parte geral – vol 1.


Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: Método. 2014.

CUNHA, Rogério Sanches. Manual de Direito Penal – parte geral (arts.


1º ao 120). – 3ª Ed. Vol. Único. Editora Juspodivm, 2015.

[1]LIMA, Renato Brasileiro de. Legislação criminal especial


comentada. 2ª Ed. 2014. Editora Juspodivm P. 55

[2] BARBOSA, Ruchester Marreiros. Lei 13.260/2016 é um ato


terrorista à hermenêutica constitucional. Disponível em:
http://www.conjur.com.br/2016-mar-22/academia-policia-lei-
132602016-ato-terrorista-hermeneutica-cons...

[3] CUNHA, Rogério Sanches. Manual de Direito Penal – parte geral


(arts. 1º ao 120). – 3ª Ed. Vol. Único. Editora Juspodivm, 2015.

[4] JAKOBS, Gunter. Direito penal do inimigo: noções e críticas. 2ª Ed.


Tradução: André Luis Callegari, Nereu José Giacomolli. Editora:
Livraria do Advogado. 2007. P. 44

Disponível em: http://pascuetoamaral.jusbrasil.com.br/artigos/317284328/lei-13260-2016-


antiterrorismo-a-tipi cacao-de-atos-preparatorios
https://pascuetoamaral.jusbrasil.com.br/artigos/317284328/lei-13260-2016-antiterrorismo-a-tipificacao-de-atos-preparatorios 9/10
22/10/2018 Lei 13.260/2016 "Antiterrorismo" - A tipificação de atos preparatórios

https://pascuetoamaral.jusbrasil.com.br/artigos/317284328/lei-13260-2016-antiterrorismo-a-tipificacao-de-atos-preparatorios 10/10

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