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G1 - Criminologia - Prof.

Breno Melaragno

Alunos
Júlia Cardoso
Rodrigo Abreu Pinto

O sistema penal das sociedades ocidentais somente seriam aperfeiçoados tecnicamente e


assumidos integralmente pelo Estado em meados do século XIII. Até então, os conflitos inter-
individuais não eram arbitrados por uma autoridade pública, mas por um árbitro privado (iudex).
Através da redefinição das funções do Estado durante o Antigo Regime, à luz de novos
procedimentos burocráticos e administrativos, o Estado se tornaria o responsável em estabelecer o
processo inquisitório, assentando o poder centralizado já que o sistema penal permitiria a
substituição dos exercícios de justiça dos poderes locais. Os objetivos centrais do processo
inquisitória consistiam em determinar a verdade do crime e definir a respectiva pena.

A partir deste momento, o soberano (ou seja, o próprio Estado) passa a ser considerado o
verdadeiro lesado pelos crimes cometidos. Logo, posto que o dano é causado principalmente ao
soberano, surge a figura do procurador do rei como o danificado, substituído a vítima ao tomar o
autor do crime do objeto da indagação. Essa característica do Estado possuidor do monopólio da
resolução dos conflitos inter-individuais perdura até hoje, incluindo a figura do procurador. Alterou-
se, no entanto, a perspectiva de publicização da investigação: naquela altura, o inquirimento corria
em segredo do público e até mesmo do acusado. Esse ocultamento seria denominada por Foucault
de “produção da verdade na ausência do acusado”, evidenciando como ao acusado não lhe era
permitido o ônus da prova em sua defesa - ao contrário do que ocorre atualmente em que o ônus
da prova concerne tanto a acusado. De modo geral, as garantias ao acusado eram realmente
exíguas, pois esse era visto como alguém perigoso desde o momento da denúncia, permanecendo
preso e sem comunicação com o exterior (inexistia a figura do advogado). No interior da prisão, o
acusado poderia ser submetido a tortura física para que a “verdade” fosse enfim confessada, a qual
deveria em seguida ser pronunciada aos juízes pelo próprio acusado como “confissão espontânea”.
Se é certo que o sistema penal contemporâneo não prescreve legalmente tal prática, não é menos
certo que ela é recorrente em delegacias e presídios, sem falar nos inúmeros casos de “prova
plantada” contra o acusado.

Essas “excessões” cometidas atualmente recaem principalmente às populações pobres. No sistema


punitivo do Antigo Regime, em razão da característica religiosa do Estado absolutista (em que a
ordenação do Estado era proporcional aos mandamentos divinos), o delito era também visto como
um pecado. Destarte, assim como o crime correspondia a um comportamento anti-natural, a
personalidade dos criminosos também era compreendida como contrária aos desígnios da
natureza. Alastrariam-se assim estigmas sobre frações da população contra as quais recaía a
qualificação aberrante para que a criminalização fosse legitimada, tornando-se esse o método de
atuação contra populações internas indesejadas. O desenvolvimento desse método estaria em
consonância com as necessidades outorgadas pelas mudanças econômicas da sociedade. Os
“vagabundos” e estrangeiros, por exemplo, seriam compelidos pela legislação penal para que tais
sujeitos se resignassem à disciplina do trabalho exigida pelas indústrias nascentes e ávidas por
mão-de-obra. Se aquele sistema penal reforçava tanto a monarquia absoluta quanto a ordem do
mercado, o sistema atual serve aos mesmos propósitos de fortalecimento do Estado e, sobretudo,
de “correção” dos desequilíbrios mas em sentido inverso: não se trata mais de congregar novos
braços aos regimes de trabalho, mas de estocar a massa humana para a qual já não existem postos
de trabalho suficientes.

Em relação ao seu propósito de consolidar a supremacia do soberano, o sistema penal antigo


contava com o momento final do suplício, onde as maiorias das penas eram consumadas. O suplício
era considerado o momento crucial do rito punitivo por duas razões principais, ambas relacionadas
à função preventiva que o sistema penal exercia. Em primeiro lugar, o suplício era o momento
“revelador da verdade”, não somente porque era onde o inquérito enfim terminava, mas porque o
criminoso confessava seu crime e proclamava sua culpa diante de todos os espectadores,
legitimando e associando a violência corporal consequente (consumação da pena) com o ato
criminoso que o antecede, de modo a urdi-los e servir de exemplo para quem pense em cometer o
crime novamente. Em segundo lugar, o suplício agia como “agente do poder”, pois consistia na
cerimônia em que o poder do soberano era reafirmado em todo o seu brilho. Enquanto cerimônia
onde triunfa o soberano, o suplício seria semelhante a outras situações reais a sobrevalorizavam o
rei (a entrada do soberano na cidade conquistada, o gesto de coroação, etc).

Em seguida, a partir dos reformadores dos séculos XVIII e XIX, surgem as teorias penas
interessadas na requalificação dos criminosos como sujeitos de direito, exortando a função corretiva
da pena, capaz de reabilitar o sujeito como alguém novamente apto ao pacto social. Como bem
afirma Foucault, “não se pune para apagar um crime, mas para transformar um culpado (atual ou
virtual): o castigo deve levar em si uma certa técnica corretiva”. Para cumprir tais objetivos, a prisão
é enfatizada como lugar adequado para a transformação dos criminosos, pois seria o espaço onde
se aplicaria nos presos a técnica corretiva já que neutralizaria “virtualidade de perigos contida num
indivíduo e que se manifesta no comportamento observado cotidianamente”. A partir de então,
ocorre a centralização das penas na prisão, de modo pena de prisão é tornada a mais recorrente e
absoluta até hoje.

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