You are on page 1of 41

“Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 3

Os motivos
da revolta popular:
um balanço crítico
do governo do PT

NAZARENO GODEIRO
(Organizador)

Autores:
Daniel Romero
Érika Andreassy
Nazareno Godeiro

Colaboradores:
Ana Pagu, Elder Sano “Folha”,
Hertz Dias e Marília Macedo

São Paulo
2014
SUMÁRIO
O ILAESE – Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos – é um instituto de formação
política e teórica a serviço dos movimentos sociais, cujo objetivo é auxiliar a nova geração de ativistas
a se formar no campo do marxismo revolucionário como concepção de luta dos trabalhadores e da
juventude. Queremos contribuir para que os sindicatos e as organizações sociais se convertam em ala-
vancas da transformação social.
Introdução ....................................................................... 7 Capítulo 7 - Lucros .......................................... 42
“Empresários ganharam como nunca no meu go­
Capítulo 1 - Dívida pública ................ 12 verno” / Lucro dos bancos / Faturamento 500 maiores
Mais endividado do que nunca / Evolução e com- empresas / Distribuição faturamento: trabalhador x
Dados internacionais de catalogação elaborados na fonte por:
paração com PIB / Dí­vida por habitante / Pagamentos empresas / Custo Brasil / Produtividade indústria
Iraci Borges – CRB-8 - 2263
Godeiro, Nazareno, org. por go­ver­no / Média de pagamento por governante,
Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT Por Nazareno Godeiro, Daniel Romero e Érika Andreassy. por tempo / O que seria possível com o valor da dívida
São Paulo: ILAESE, 2014. Financeirização da economia brasileira .................. 14
Capítulo 8 - Privatização ...................... 45
80 p. ilust. 15
Endividamento generalizado da população ............. “O modo petista de privatizar” / Privatização no Bra-
Colaboradores: Ana Pagu, Hertz Dias, Elder Sano “Folha” e Marília Macedo sil (1990) / Privatizações com Lula e Dilma / Parcerias
Público-Privadas / Leilão do Petróleo / Ferrovias e ro-
ISBN: 978-8566955-00-2 Capítulo 2 - Desigualdade ................. 16 dovias / Aeroportos / Previdência servidores
Uma das piores distribuições de renda do mundo /
1. Governo – PT. 2. Partido dos Trabalhadores - governo. 3. Governo petista – balanço crítico. 5. ILAESE. I. Título. Romero, Daniel. Distribuição funcional / População por rendimento
II. Andreassy, Érika. domiciliar per capita / Pobres e precarizados / Dema- Capítulo 9 - Opressão .................................. 53
CDD: 320 gogia e “nova classe média” As contradições para as mulheres trabalhadoras
Gastos sociais no Brasil / Orçamento 2012 ............... 21 / Renda mulheres x homens / Bolsa-Família / Rede
Cegonha / Razão da mortalidade materna / Mortali-
dade cor/raça / Política de Creches / Programa Brasil
Capítulo 3 - Trabalho ............................. 24 Carinhoso
“Pleno emprego” ou precarização da mão-de- obra? Violência contra a mulher / Taxa de homícidios 58
/ Taxa desemprego / Emprego precário / Composição de mulheres / Homícidios por cor / Rede de en-
ocupações por vínculo / Taxa de rotatividade (setores) frentamento / Evolução DEAMs / Orçamento
para políticas de combate à violência ....................

O PT e a “inclusão marginal” de negros e negras / 63


Coordenação Nacional do Ilaese: Capítulo 4 - Renda ...................................... 29 A violência contra a juventude negra / Estatuto da
Antônio Fernandes Neto, Arthur O governo petista garante um salário mínimo digno? Igualdade Racial / Política de Cotas / Diferença sala-
Gibson, Bernardo Lima, Cristiano Nota dos editores / Evolução do salário mínimo, desde 1940 e salário rial entre negros e brancos .................................................
Monteiro, Daniel Kraucher, mínimo DIEESE / Salário Mínimo real / Rendimento
Daniel Romero, Eric Gil Dantas, Érika Este texto foi escrito no início de 2013, no aniversário médio Regiões Metropolitanas / Sálarios mínimos Governos do PT e LGBTs: 10 anos de jogo duplo / 65
Andreassy, Fernando Antônio Soares de 10 anos do PT no poder. Portanto, o texto já está com- por tamanho da empresa / Rotatividade por renda “Brasil sem homofobia” e a Conferência LGBT / Em
dos Santos (Nando Poeta), Fred Bruno pletando um ano de vida. Por circunstâncias alheias a nome da governabilidade .....................................................
Tomaz, Guilherme Fonseca, José nossa vontade, o texto não foi publicado em 2013. Vieram
Pereira Sobrinho, Juary Chagas, as manifestações de junho de 2013, que mudaram a situ- Capítulo 5 - Campo ..................................... 32
Luci Praun e Nazareno Godeiro. ação política no País e, mesmo assim, o texto não enve­ Capítulo 10 - conclusão ......................... 68
Governo do PT se uniu ao agronegócio e abandonou
lheceu. Fizemos apenas pequenas mudanças de adaptação a reforma agrária / Famílias assentadas (1995-2012)
Para quem governou o PT? / Financiamento da cam-
Endereço para contato: do calendário, incorporando as manifestações de junho. panha eleitoral de Dilma Rousseff
Praça Padre Manuel da Nóbrega, 16 - Todo o texto se manteve igual e, na verdade, deixa-
4º andar, Sé – São Paulo – SP - mos exatamente como foi redigido no ano passado, pois
Capítulo 6 - Dependência ..................... 36 Capítulo 11 - PROGRAMA ...........................
CEP: 01015-000 já prenunciava e explicava, a partir de muitos dados da 70
O Brasil é um país mais soberano ou mais depen­
E-mail: ilaese@ilaese.org.br realidade brasileira, a revolta popular que explodiria em Um programa dos trabalhadores em ruptura com o
dente? / Investimento Estrangeiro e remessas / Produ-
Site: www.ilaese.org.br seguida. Só por isso, se justificava a publicação deste texto imperialismo para desenvolver o Brasil / Suspensão
tos básicos X manufaturados / Investimentos, ajudas e
que o fazemos, com atraso, em março de 2014. do pagamento da dívida / Estatização das multinacio-
remessas setor automobilístico / Controle estrangeiro
Design e infografia: Gustavo Sixel Esperamos que o texto ajude para a compreensão da nais, do sistema financeiro e do agronegócio / Refor-
situa­ção econômica e política brasileira e na luta para “Ele é o cara” ........................................................................... 41 ma agrária / Elevação do salário mínimo ..........................
O Ilaese disponibiliza qualquer parte trans­­formar o país, na ruptura com o capitalismo e o im-
deste texto para ser reproduzida, perialismo.
desde que citada a fonte.

6 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 7
INTRODUÇÃO

O Brasil, de fato, mudou?


Nestes 10 anos, os empresários levaram muito mais que a classe trabalhadora
e não houve mudança estrutural nas causas da desigualdade social no país.

nazareno godeiro

Em 2012, completamos 10 anos de go­verno petis- trabalhos precarizados e informais.


ta no Brasil. A cartilha comemo­rativa do PT afirma Somos favoráveis a toda assistência social que
que o governo inverteu as prioridades do neolibera­ possa minimizar o sofrimento dos mais pobres. Para
lismo e fez duas transformações no Brasil: milhões de brasileiros, pode signi­ ficar um prato
de comida para seus filhos. Porém, opinamos que a
1. O Brasil está entre as seis maiores eco­ redução da jornada de trabalho para 36 horas sema-
nomias do mundo, com crescimento susten­ nais e a reforma agrária garantiriam emprego para
tável, liderando um projeto de desenvolvi­ mi­lhões de usuários (as) do Programa Bolsa Família,
mento mundial; tornando-o desnecessário.
2. Tal desenvolvimento teve como mola Também acreditamos que a chegada de um ope­
propulsora a distribuição de renda, com ple­ rário, pobre e migrante nordestino, no poder revela
no emprego e pobreza diminuta, em vias de a força da classe trabalhadora brasileira. A esquerda
acabar; marxista defende um governo dos trabalhadores, es-
pecialmente dos setores mais explorados e oprimidos
É verdade que teve crescimento econômico nos pelo capitalismo, como migrantes nordestinos, ne-
últimos 10 anos, mas não houve uma repartição gros e mulheres.
igualitária do bolo. Os empresários leva­ram muito Não acreditamos, porém, que se possa mudar o
mais que a classe trabalhadora e não houve nenhu- Brasil de braços dados com os ricos, com os países im-
ma mudança estrutural nas causas da desigualdade perialistas, com as multinacionais e o capital inter-
social no país. nacional.
Produzimos muita riqueza: apenas os traba­ Lula falou que era “barato e fácil cuidar dos po-
lhadores de seis países produziram mais riqueza que bres”: estendeu o alcance da Bolsa Família, ampliou
os trabalhadores brasileiros. Porém, na distribuição o crédito e aumentou o salário míni­mo. Isto, somado
desta riqueza, estamos na rabeira: 84 países estão na com um forte crescimento econômico mundial entre
frente do Brasil. 2002 e 2008, deu uma sensação de desenvolvimento
Essa disparidade foi a motivação de fundo que econômico e inclusão social.
originou as manifestações de massas da juventude Esta sensação de bem-estar está se eva­p o­­rando
Arte sobre fotos Agência Brasil

brasileira, expressando a insatisfação geral de toda a aos primeiros sinais de que a crise econômica inter-
população. nacional está se aproximando do Brasil.
Toda a propaganda oficial de que estamos prestes Ao optar para governar em harmonia com os
a acabar com a pobreza e criar um país de classe mé- ricos, teve que entregar muito mais para eles, im-
dia foi por água abaixo. Existem dois “Brasis”: o Bra- pedindo uma verdadeira distribuição de renda no
sil dos ricos, classe composta por menos de 1% da país.
população, que vivem como reis, e o Brasil dos traba­ Vejam, na página seguinte, dados econômicos
lhadores, que produzem muito e ganham pouco, em em perspectiva histórica de 40 anos.

8 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” INTRODUÇÃO 9
INTRODUÇÃO
Em 40 anos, população e riqueza mais do que dobraram
Em milhões
QUANTIDADE DE
HABITANTES 190,8 192,4 Orçamento: A prova dos nove
169,8
144,8 Um termômetro para saber quais interesses são atendidos pelo governo é a distribuição dos
119,0
93,1 gastos do Orçamento público federal. Os gastos do governo petista não deixam dúvidas.

X
1970 1980 1990 2000 2010 2011

PIB PER CAPITA


A produção de riqueza por
Riqueza do País dividida por habitante em um ano, em dólares
DÍVIDA PÚBLICA BOLSA-FAMÍLIA
habitante cresceu desde 12.632 12.688 Gasto com juros e amortizações Gasto com o programa
1970, após ligeira queda no
9.857
governo Collor. Números
demonstram que os 9.373 9.004 753
trabalhadores estão bilhões
produzindo muita riqueza:
5.238
708
12,7 mil dólares por bilhões
habitante em 2011.
Veja a injustiça:
1970 1980 1990 2000 2010 2011
Em 2012, o governo Dilma
gastou R$ 753 bilhões para
pagar juros e pagamentos
Mas o País continua um dos mais desiguais do mundo da dívida pública.
Enquanto isso gastou
SALÁRIO MÍNIMO Salário mínimo real. Em R$, de maio de 2012. R$ 18 bilhões no Bolsa-
Família, que beneficia
Há recuperação do salário 615 571 cerca de 50 milhões de
mínimo nos 10 anos de 542 539
governo do PT, voltando aos
pessoas. Não foi para isso
níveis da década de 1980, que toda uma geração da
quando já era arrochado. classe trabalhadora
Com toda a recuperação do 337 brasileira doou sua vida.
mínimo, ainda representa 281
48% do que era em 1940,
quando foi criado.

1970 1980 1990 2000 2010 2011

ÍNDICE GINI Quanto mais próximo de 0, mais igualitário é o país Entre 187 países,
só 12 revelam
O Índice mede desigualdade mais desigualdade
na renda entre os assalaria- do que o Brasil.
dos melhor e pior remunera- 0,614
dos. Quanto mais a renda é 0,582 0,589 0,595
igualitária, mais o índice se
aproxima de 0. Apenas 0,543 0,543
países muito desiguais
passam de 0,5.

1970 1980 1990 2000 2010 2011 17 18


bilhões bilhões

2011 2012 2011 2012


IDH Índice de Desenvolvimento Humano. 0,715 0,718
Também houve uma melhora Quanto mais próximo de 1, melhores
as condições de vida da população 0,665
dos índices sob o governo
Lula, porém temos 84 países
Alcance do pagamento da dívida Alcance do programa Bolsa-família
em melhor situação que o
Brasil, como Peru, Panamá,
0,600 10-15 mil 50 mil pessoas, 13,9 milhões 50 milhões de pessoas,
Venezuela, Costa Rica, 0,549 famílias( 1 ) no máximo de famílias aproximadamente
México e Cuba, apesar de
economias mais débeis. Não disponível
Fonte: Governo Federal sobre PBF (http://www.portaltransparencia.gov.br) e Auditoria Cidadã da Dívida. Elaboração: ILAESE.
1970 1980 1990 2000 2010 2011
( 1 ) ANDERSON, Perry. O Brasil de Lula. Novos Estudos, no. 91, 2011, p. 17.
Fonte: Anuário Estatístico 2012 - Sinopse 2012 - Ministério das Minas e Energia baseado em dados do IBGE, Banco Mundial e ONU.

10 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” INTRODUÇÃO 11
INTRODUÇÃO INTRODUÇÃO

O programa de luta de uma geração


Entre 1978 e 1990, uma geração inteira conquistou o país: milhões de grevistas, ocupações de Lula sintetizou assim os pontos do programa:
latifúndio, mobilizações por terra, trabalho e liberdade. Esse foi o alicerce que formou, duas
das maiores organizações de trabalhadores do mundo: a CUT e o PT. Foi nessa força que Lula Você sabe qual é a dificuldade que estamos
se apoiou para chegar ao poder. Não foi somente sua habilidade pessoal ou sua capacidade vivendo no Brasil hoje? É de cumprir isto
política individual que o permitiu chegar à Presidência. O PT se tornou um grande partido, aqui [Constituição Brasileira de 1988]. Veja
lutando por reformas estruturais no Brasil, expresso em sete transformações: que outro dia pensei em me transformar no homem do
livrinho. Andar com a Constituição em baixo do braço e
dizendo: estão me chamando de revolucionário e que eu
Acabar com a especulação financeira em torno da dívida públi-
1. ca (externa e interna) que sugava toda a riqueza da nação, que quero luta armada, pois aqui está minha arma. Eu quero
ia para os cofres dos grandes bancos. que seja cumprido o salário mínimo que está contido
aqui. Eu quero que seja cumprida a seguridade social que
2. Reorientar este dinheiro para investimentos no setor produ-
tivo e gerar um desenvolvimento sustentado da economia e da Discurso de Lula na está contida aqui. Eu quero que se pague aos aposenta­
indústria. campanha de 1989, dos o que está contido aqui. Eu quero que se pague aos
durante debate da TV pensionistas o que está contido aqui. Eu quero que haja o
3. Utilizar o dinheiro economizado do pagamento de juros da
dívida para garantir educação, saúde e moradia, como reza respeito à democracia que está contido aqui. (...)
a Constituição Federal de 1988. Eu quero uma sociedade aonde todos tenham casa, onde
todos tenham o direito de ter uma boa escola, uma boa
Garantir uma reforma agrária, em ruptura com o latifúndio,
4. para assentar o homem na terra, garantir a soberania alimen- saúde. É por isso que eu defendo uma saúde na mão do
tar do povo brasileiro e diminuir o êxodo rural, que formava Estado e não é que eu vou fechar as privadas não, aque­
bolsões de miséria nas favelas. las que são da iniciativa privada, nós vamos enquanto
Garantir o salário mínimo que determinou a Constituição, que Estado dar uma saúde de tal qualidade que o povo não
5. permitia o trabalhador ter alimentação adequada, casa, comi- vai precisar procurar a saúde paga. E nós já dissemos
da, saúde, educação, Previdência e lazer. claramente que a reforma agrária está para nós assim
Garantir emprego de qualidade para todos, reduzindo como o oxigênio está para a humanidade. A suspensão
6. a jornada para 40 horas semanais, sem redução salarial. do pagamento da dívida externa está para nós
como uma questão política e não somente
7. Para isso, os ricos (grandes empresários, banqueiros e
latifundiários) teriam que perder para que se ganhasse na
econômica e financeira.
outra ponta, distribuindo renda na forma de salário.

Um programa abandonado
Em todos estes pontos programáticos fun- foi se adaptando às exigências dos ricos para
damentais, o governo do PT não levou seu pro- alcançar e permanecer no poder. Nas páginas
grama à prática. Deixou de ser um partido de seguintes, iremos analisar, uma a uma, as refor-
traba­lhadores para ser mais um partido que de- mas estruturais que o PT pretendia fazer no
fende a ordem capitalista. No meio do caminho Brasil quando chegasse ao poder. Boa leitura.

12 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” INTRODUÇÃO 13
1 DÍVIDA PÚBLICA
DÍVIDA PÚBLICA

criança que nasceu já herdou uma dívida de cerca país tem com a classe trabalhadora.
de R$ 2 mil. Quando saiu, em 2002, cada brasileiro já Com o PT no governo, esperava-se que esta san-

Mais endividado do que nunca devia cerca de R$ 5 mil!


Cada centavo pago desta dívida é dinheiro reti-
gria ia diminuir. Ledo engano. Quando Lula saiu do
governo, em 2010, cada recém-nascido já devia quase
rado da educação, saúde, moradia, reforma agrária, R$ 15 mil. Com Dilma, na metade do seu mandato, a
Um dos principais pontos programáticos do PT na década de 1980 era acabar com a especu­ isto é, deixa-se de pagar a enorme dívida social que o dívida per capita já chegava a R$ 18.500!
lação financeira em torno da dívida pública. Observemos as palavras de Lula no horário R$ 18.500
eleitoral, na campanha de 1989: “Primeiro, suspensão do pagamento da dívida externa; Dívida por habitante, em R$ R$ 14.578
segundo, acabar com a especulação financeira no País baixando as taxas de juros”. No en­ R$ 4.356
tanto, chegando ao governo, Lula fez o oposto e, no final de 2012, com 10 anos de governo R$ 1.610 R$ 1.679
R$ 114 R$ 1.059
petista, a dívida pública (interna e externa) era a maior da história, com R$ 3,72 trilhões.
Total da dívida, em R$
1970 1980 1987 1990 2000 2010 2012 Fonte: Banco Central e IBGE. Elaboração: ILAESE.

3,72
trilhões Dívida já foi paga 45 vezes e não para de crescer
Se esta dívida fosse legítima, até poderia se argu- capital. A qualquer momento ele pode ir embora,
2,77 mentar a necessidade de honrar um compromisso, provocando a quebra do Brasil.
trilhões
porém, esta dívida é ilegítima. Já tivemos, em junho de 2013, uma saída de R$
Entre 1994 e 2012, já pagamos R$ 13,5 trilhões e a 5 bilhões da Bolsa de Valores. Se persistir a fuga de
745,8 dívida não para de cres­cer. Assim, tanto FHC, quanto capitais do Brasil, precipitará a crise econômica e
bilhões Lula e Dilma, pagaram religiosamente a “dívida”. trará recessão.
128,4 228,2 246,0
10,8 bilhões bilhões bilhões Esta aberração é resultado de um modelo capita­
Dívida em 2012
bilhões lista que privilegia os banqueiros. Os juros mais altos RESUMO
do mundo servem para atrair o capital internacional, R$ 3,7
trilhões Em 1994, a dívida
que pega grana barata no Primeiro Mundo e investe Dívida em 2010 brasileira era de”
Tamanho da dívida em comparação com o Produto Interno Bruto (PIB)
aqui na produção e na especulação financeira. R$ 2,7 R$ 0,3
Em 1970, a dívida representava 11% de toda a riqueza produzida pelos brasileiros. Em 2012, atingiu 84%
O Brasil está muito vulnerável ao depender deste trilhões trilhão
Dívida em 2002
De 1994 até 2012,
R$ 1,2
governos pagaram:

Dívida em 1994
trilhão R$ 13,5
trilhões
11% 26% 40% Sem 60% 75% 84% R$ 0,3
informações
trilhão
Fonte: Banco Central e IBGE. Elaboração: ILAESE.
Mesmo assim, a
dívida pulou para:
Quem não se lembra de Lula falando que o Bra- Em dezembro de 2012, a dívida interna chegou
FERNANDO HENRIQUE LULA DILMA
R$ 3,7
sil não tinha mais dívida externa? Pois em dezembro a R$ 2,823 trilhões, conforme Tabela do Banco Cen-
pagou pagou pagou
trilhões
de 2012, conforme Tabela do Banco Central2, a dívida tral3. Portanto, somando as dívidas, no final de 2012, Quanto
externa alcançou a cifra de 441,7 bilhões de dólares, chegou a R$ 3,7 trilhões. foi pago R$ 6,1 trilhões + R$ 5,7 trilhões + R$ 1,46 trilhão

que correspondia a R$ 902 bilhões. Notem que, entre 2000 e 2012, que engloba os 10 Fonte: SIAFI - STN/CCONT/GEINC. Banco Central e SIGA BRASIL - Senado Federal 4 - Elaboração ILAESE
A Auditoria Cidadã, cuja elaboração utiliza- anos de governo petista, a dívida pública total (inter-
mos no tocante à dívida pública, esclarece que: “a na e externa) saiu de 60% para 84% do PIB! (4) Observações: A - Os valores dos pagamentos da dívida pública desde 1995 foram corrigidos pelo IGP-DI. B - O estoque da dívida pública de 1994,
definição clássica de dívida interna já não pode ser O PT utiliza um artifício estatístico para dizer que 2002, 2010 e 2012 inclui juros, amortizações e refinanciamento. C - Para ser incluída na dívida pública total, a dívida externa foi convertida para
aplicada à rea­lidade atual, tendo em vista que grande a dívida está no patamar de 35% do PIB. Usa dados da Real a taxa de câmbio de 21/03/2013, ou seja, de um dólar equivalente a R$ 1,99.
Fonte do pagamento da dívida nos governos FHC e Lula: SIAFI - STN/CCONT/GEINC. Fonte do Estoque da Dívida Pública em 1994, 2002, 2010 e
parte da dí­v ida interna é de fato externa, pois os títu­ dívida líquida, coisa que só se faz no Brasil. Interna­ 2012: Banco Central (Nota para a Imprensa - Política Fiscal – Quadros 35 e 51), Ministério da Fazenda. SIAFI. Gerência de Informações e Estatísticas
los emitidos pelo Tesouro Nacional têm sido adquiridos cionalmente se utiliza os valores da dívida bruta. da Dívida Pública /CODIV e Banco Central (Quadro 36 da Tabela em excel), disponível em < http://www.bcb.gov.br/ftp/NotaEcon/NI201204pfp.
zip >. Fonte do pagamento da dívida pública no governo Dilma: Sistema SIGA BRASIL - Senado Federal. O dado se refere ao pagamento da dívida
principalmente por bancos estrangeiros”. Quando FHC assumiu o governo, em 1995, cada
federal, externa e interna. Elaboração: ILAESE a partir de sistematização dos dados por parte da Auditoria Cidadã da Dívida.

14 (2) Banco Central. Quadros 51 e 51-A (3) Banco Central. Quadro 36 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” DÍVIDA 15
Capítulo 1 DÍVIDA PÚBLICA

O que é possível fazer com o dinheiro da dívida?


A Olímpiada O governo está gastando em um mês com pagamento de juros da

da dívida dívida o que gasta em um ano com a Saúde.


Considerando que temos uma taxa de desemprego de 10,4% no
Brasil em fevereiro de 2013, segundo o DIEESE, e uma força de trabalho
Quanto, em média,
por volta de 100 milhões de trabalhadores, temos, portanto, cerca de
cada governante 10 milhões de desempregados no país. Com o dinheiro que se paga aos
762 bilhões
gastou com pagamento R$
R$ 63,5 bilhões banqueiros poderia se empregar todos os desempregados do Brasil pa-
da dívida federal R$ 2,11 bilhões gando R$ 5.000,00 por mês. Poderia se entregar, também, R$ 5.057,00
R$ 176 milhõ es R$ 730 bilhões
(externa e interna) R$ 2,93 milhõ es R$ 60,8 bilhões por mês para cada uma das 13,9 milhões de famílias cadastradas no
R$ 48 mil R$ 2 bilhões
R$ 712 bilhões
R$ 59,3 bilhões
Bolsa Família. Ou pagar o salário mínimo do DIEESE (R$ 2.329,35 em
R$ 166 milhões
R$ 2,76 milhões
R$ 1,97 bilhão valores de 2011) para todos os 39 milhões de trabalhadores brasileiros
R$ 164 milhões que ganham até 1 salário mínimo.
Fontes: pagamento da dívida nos governos FHC e Lula: SIAFI - STN/CCONT/GEINC. Pagamento R$ 46 mil
R$ 2,73 milhões
da dívida pública no governo Dilma: Sistema SIGA BRASIL - Senado Federal. Elaboração: ILAESE.
R$ 45 mil

A financeirização da economia brasileira: O governo Dilma continua se apoiando no en-


dividamento generalizado da população: em 2012,
nos prejudicar.
Quanto mais tempo permitirmos que o Sistema
banqueiros fazem a festa o PIB cresceu 0,9% enquanto o crédito à população
cresceu 16%!
Financeiro e especuladores parasitem nosso corpo
econômico, maior será a profundidade da crise e
O neoliberalismo produziu uma mudança na economia brasileira: os ativos totais (todas as riquezas de Esta febre de consumo via endividamento gene­ maiores as dificuldades para sair dela.
posse dos banqueiros, suas e de terceiros) tiveram um crescimento espetacular, provocando uma financei- ralizado é um sintoma que está se formando uma
rização da economia brasileira. O patrimônio dos bancos cresceu a uma média anual de 40%, nos mandatos bolha de crédito que vai desmoronar, como ocorreu BIS alerta para descompasso
de FHC e de Lula, enquanto o PIB cresceu somente 3,5% ao ano. O hiato entre o crescimento da produção de nos Estados Unidos em 2008. entre crédito e PIB no Brasil
riqueza do Brasil e o crescimento da riqueza dos bancos é de mais de 10 vezes. É impossível prever quando a crise desembar- O Banco Central dos bancos centrais do mundo, o
Nota-se que o salto maior se deu sob o governo Lula. Justo no meio da crise, onde uma das saídas do go­ cará no Brasil e por qual meio. O problema sequer BIS 5, em seu relatório anual de 2012, alertou sobre o
verno foi incentivar o endividamento da população, a riqueza em poder dos bancos ultrapassou a produção se resume em saber a data exata. O problema funda- descompasso entre o alto crescimento do crédito e a
de riqueza da sociedade (PIB): mental é que perdemos a soberania sobre a econo- baixa expansão da economia real: “Isso cria riscos de
mia do Brasil e estamos à mercê das decisões estra- desequilíbrios financeiros similares aos vistos nas eco­
tégicas de outros países ricos, que, com certeza, vão nomias avançadas nos anos que precederam a crise”.
Riqueza do Brasil x riqueza nas mãos dos bancos
Participação dos Ativos dos Bancos no PIB nos governos de FHC e de Lula, em R$
Endividamento generalizado da população:
PIB do Brasil (riqueza produzida durante o ano)
4,385
bomba relógio já acionada
Ativos do sistema financeiro (riquezas em posses dos bancos, suas e de terceiros)
trilhões A pesquisa da Confederação Nacional do Comér- crédito generalizado (combinado com longo período
3,674 cio de abril de 2013 indica que temos 118 milhões de de crescimento econômico) gera uma sensação de
trilhões 119%
brasileiros endividados, sendo que 37 milhões estão que a vida está melhorando e as pessoas podem com-
2,689 2,720 com contas atrasadas. Destes, 12 milhões não podem prar bens e serviços.
2,341 trilhões trilhões pagar suas dívidas. Estamos, porém, pagando um alto pedágio aos
trilhões Em 2012, segundo Reinaldo Gonçalves, tivemos banqueiros por possuir um dos juros mais altos do
8,5 milhões de pessoas inadimplentes, que deixaram mundo. A tão propalada queda dos juros foi tímida,
1,252 1,331 de pagar R$ 33,8 bilhões. A isto se soma um valor de restrita aos bancos estatais e já retomou o cresci-
trilhão trilhão
R$ 41,2 bilhões em dívidas não pagas por parte de mento. Os grandes bancos privados se burlaram da
0,598 47% 49% pessoas jurídicas. Ainda são índices de inadimplên- medida. A redução de juros ocorreu de abril a outu-
trilhão
cia “baixos”, mas a bomba-relógio já foi acionada. bro de 2013. Daí em diante já se iniciou um ciclo de
26% O mecanismo de endividamento é usado como alta dos juros, desmentindo o governo, que não fala
1995 2000 2003 2010
uma arma política pelo governo petista. Através do mais no assunto.
Fonte: PIB IBGE – Ativos dos Bancos - Banco Central (BC) – elaboração ILAESE (5) Banco de Compensações Internacionais (Bank for International Settlements), com sede em Basiléia, Suíça. < http://www.bis.org >

16 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” DÍVIDA 17
2 DESIGUALDADE
DESIGUALDADE

Uma das piores distribuições O Brasil, infelizmente, continua pobre e injusto


de renda do mundo A cartilha do PT, na página 6, afirma:
“O avanço da mobilidade social, fundada na ge­
para Otaviano Canuto, vice-presidente da Rede de
Redução da Pobreza e Gerenciamento Econômico
ração de empregos formais e nas políticas públicas de do Banco Mundial, “o Bolsa Família é bastante efi-
“Para o conjunto da classe trabalhadora começar a ganhar um pouco mais, é preciso que aqueles proteção social torna a pobreza diminuta com cadente ciente e tem um custo relativamente baixo (0,5% do
que ganharam muito durante os últimos 30 anos, deixem de ganhar o que estão ganhando para desigualdade na repartição da renda nacional jamais PIB nacional)” 6
distribuir em forma de salário.” (Lula, em debate na TV, durante a campanha eleitoral de 1989). vista na História nacional.” O próprio Programa de Governo do PT em 1989,
O governo também informa que retirou 22 mi­ que trata da questão urbana (página 7) diz:
Apesar de haver uma pequena melhora no lhões de brasileiros da extrema pobreza e agora só “Percentagem de famílias cuja renda por pessoa
Distribuição Funcional da Renda
rendimento do trabalho, a parte dos trabalhadores restam 2 milhões em todo o país. atinge 1⁄4 e 1⁄2 de salário mínimo e sua distribuição
Participação na remuneração total dos fatores
na renda nacional vem caindo desde 1970. A peque- Nós não acreditamos nisto. A pobreza não aca- pelas regiões metropolitanas. Todas elas estão num
na recuperação que teve durante o governo Lula bou nem acabará sob o sistema capitalista. Este nível de pobreza absoluta...”
Renda dos trabalhadores não retornou aos índices que tínhamos em 1990. O ufanismo petista se apoia em um artifício estatístico Esquecendo a visão que tinha outrora, a linha
Renda dos empresários gráfico ao lado é ilustrativo da distribuição de renda onde pobreza extrema é a família que recebe até R$ demarcatória da pobreza que o PT usa hoje é rebai­
entre trabalhadores e patrões durante os governos 70 por pessoa ao mês e pobre é quem recebe mais de xada de propósito para inflar as conquistas do go­

49,2% 49,9% de FHC e Lula, entre 1995 e 2008. R$ 70 até R$ 140 ao mês. verno. A própria burguesia incentiva este ufan-
A renda dos trabalhadores arrancou de 49,2% do Este é o critério do Banco Mundial: quem tem ismo, pois fortalece sua dominação, reforçando a
Renda dos trabalhadores total da renda nacional no primeiro governo de FHC renda menor que US$ 1,25 por dia é miserável e o visão que o sistema capitalista pode distribuir renda
e teve uma pequena melhora de 0,7% durante os gov- que ganha até US$ 2,50 por dia é pobre. Por isso, de forma igualitária.
Renda dos empresários
39,6% ernos petistas, mantendo praticamente inalterado a
49,9% parte da renda nacional que cabe aos trabalhadores.
49,2% 36% Por sua vez, a renda dos patrões arrancou de
Gastos mensais de uma família com quatro pessoas Em 2013, Fortaleza (CE)
36% no início do governo de FHC e chegou a 2008 Vamos imaginar as contas na vida de uma família, que está no limite para sair da “pobreza”, segundo o
em quase 40%, ganhando mais do que ganhavam em governo, recebendo R$ 140 por mês multiplicado por quatro pessoas. Vamos supor que a família more em
1995, no auge do Plano Real. Fortaleza no início de 2013, com renda de R$ 560 ao mês, abaixo do salário mínimo, na época R$ 678.
39,6% É preciso salientar que esses 40% da renda na-
36% cional estão indo para um punhado de empresá­rios Alimentação R$ 774,96 Saúde R$ 26,15
(menos de 1% da população), enquanto a outra parte Habitação R$ 231,99 Educação R$ 12,12
está indo para 99% da população (os traba­lhadores e
pessoas que trabalham por conta própria).
Vestuário R$ 40,61 Recreação R$ 11,01
Assim se comprova que os empresários seguem Transporte R$ 79,85 Diversas R$ 111,52
ganhando muito no país e estão cada vez mais ricos.
Por que então há uma diferença entre estes da-
dos da distribuição de renda com as informações do Total:
governo? O governo trabalha com o índice de “dis-
tribuição pessoal da renda”, que mede as mudanças R$ 1.288,21
1995 2008 no interior da classe trabalhadora, mostrando que Portanto, esta família teria que
houve uma melhora na base da pirâmide (de quem ter uma renda de dois salários
ganha até 1 salário mínimo) e uma piora nos setores mínimos para poder sobreviver e
melhor remunerados da classe trabalhadora. dispor de direitos sociais mínimos
Na última década, reduziu-se a distância de ren­ em educação, saúde, moradia, etc.
dimentos entre o trabalhador informal e o ope­rário
1995 2008
especializado. Mas o fosso que separa os tra­ba­lha­do­
Fonte: IBGE – elaboração de Estêvão Kopschitz Xavier Bastos – res dos patrões não só permaneceu como aumentou:
Publicações do IPEA texto para discussão 1702 – janeiro de 2012 não houve redistribuição de renda, mas expansão.
FONTE: Alimentação: DIEESE 06/02/2013; Demais itens: POF do IBGE de
18 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 2008, com valores atualizados pelo IPCA até 2013, para famílias mais pobres 19
Capítulo 2 DESIGUALDADE

No exemplo que vimos, seria necessário mul-


tiplicar a linha de pobreza oficial por dois para ga­
por pessoa para sair da pobreza absoluta é indig-
nante: em Fortaleza a passagem de ônibus custa R$ Trabalhadores pobres e
rantir uma condição mínima de sobrevivência.
Dizemos mínima porque apesar de se dizer que
2,20. Se o vivente usar dois ônibus (para ir e voltar)
gastaria R$ 105,60 por mês. Não daria nem para o
precarizados no Brasil real
há uma inflação baixa no Brasil, os preços dos ali- transporte.
Segundo Márcio Pochmann, esse segmento so- nas nestes setores sociais, possui 31,4 milhões de
mentos estão subindo. Por exemplo, em Fortaleza, Em todas as capitais monitoradas pelo DIEESE,
cial que ganha até 1,5 salário mínimo, deve ser con- trabalhadores pobres, sendo 88% de mulheres e 68%
o preço do feijão subiu 32%, a farinha 124%, a ba- esse valor não permite nem comprar 1⁄4 da cesta
siderado working poor (trabalhador pobre). de negros e negras.
nana 53% e tomate 44%. Enquanto isso, o governo básica alimentar para um adulto. Em São Paulo ou
A tabela abaixo estima o número de trabalha­ Portanto, no Brasil moderno, pobreza tem gêne-
diminui os impostos da cesta básica cobrados aos em muitas outras capitais, o valor de R$ 560,00 não
dores pobres em três categorias fundamentais: tra- ro e cor.
empresários, que retribuem aumentando os preços. cobre sequer o pagamento do aluguel de um modes-
balho doméstico, agricultura e autônomos. Também se demonstra a precarização do empre-
Dizemos mínimos porque este critério de R$ 70 to apartamento.
Este universo trabalhado por Pochmann, ape­ go, pois a maioria não tem carteira assinada.

Distribuição da população por rendimento domiciliar per capita


TRABALHO AGRICULTURA AUTÔNOMOS
A renda per capita (ou por cabeça, Para o governo, de acordo com o gráfico ao lado, DOMÉSTICO
em latim) é calculada dividindo a 36,8% nós teríamos 6,3% de extrema pobreza e 15,7% de po-
soma dos rendimentos pelo total ROTATIVIDADE 40% ROTATIVIDADE 90% ROTATIVIDADE -
de membros da família. breza, portanto, em “vias de acabar”.
Se utilizarmos o critério que em algum momento
utilizou o DIEESE6, baseado em salários mínimos, te- 23 milhões 15,6 milhões 22,9 milhões
15,7% ríamos em 2010, 15,7% de pobreza extrema e 36,8% de trabalhadores (as) de trabalhadores (as) de trabalhadores (as)
de pobreza. Os índices dobra­riam, confirmando o
6,3% exem­plo da família de Fortaleza.
Até R$ 70 Até R$ 127,50 Até R$ 255 Não estamos falando nem do critério do salário
(1/4 salário mínimo) (1/2 salário mínimo) mínimo garantir condições dignas de vida, de acor-
Fonte: Censo IBGE 2010. Elaboração: Ilaese do com a Constituição de 1988, que estabelece que o
mínimo deva ser suficiente para suprir as despesas
de um trabalhador e sua família com alimentação,
Critérios diferentes para a pobreza
moradia, saúde, educação, vestuário, higiene, trans-
16 milhões 13,6 milhões 1,8 milhões
Quanto é a renda per capita da pessoa e como é classificada são pobres são pobres são pobres
porte, lazer e Previdência. (recebem até (recebem até (recebem até
RENDA PER CAPITA NA FÓRMULA DO GOVERNO FÓRMULA ANTERIOR* Segundo o DIEESE, em março de 2013, este sa- 1,5 salário mínimo) 1,5 salário mínimo) 1,5 salário mínimo)
Até R$ 70 Extrema pobreza Miserável lário deveria ser de R$ 2.824,92, portanto, quatro
vezes o salário-mínimo de então. DESTES DESTES DESTES
Até R$ 127,50 Pobreza Extrema pobreza Em números absolutos, segundo o governo, te- 14,4 milhões 4,8 milhões 8,6 milhões
(1/4 salário mínimo)
ríamos, pelo Censo de 2010, 30 milhões de pobres, são mulheres são mulheres são mulheres
Até R$ 255 Fora da pobreza Pobreza enquanto que, pelo critério anterior do DIEESE, seria
10,5 milhões 9,7 milhões 12,6 milhões
(1/2 salário mínimo) 70 milhões, quase a metade no Nordeste. são negros (as) são negros (as) são negros (as)
A pobreza não pode ser um simples dado es-
tatístico de quanto se recebe por dia. Ela deve ser
Total de pessoas na pobreza nos cálculos do governo entendida como “privação de capacidades básicas”,
30 milhões portanto, considera o atraso educacional, acesso aos
serviços de saúde, acesso ao transporte, situa­ção da
Quantas seriam se fosse usada a fórmula anterior moradia; acesso a serviços básicos; acesso à alimen-
70 milhões tação e à seguridade social. Dos 31,4 milhões de trabalhadores
Por este critério tivemos em 2011, 62 milhões sem pobres destes três setores
6 O DIEESE utilizou, em determinado momento, uma classificação por acesso a serviços básicos, 113 milhões com carências
88% são mulheres
salários mínimos: Até 1 Salário Mínimo (miserável); De 1 a 2 Salários sociais e 58 milhões com carências de rendimentos.
Mínimos (baixa, pobre); De 3 a 5 Salários Mínimos (média baixa); De 6 a 10
Estes números confirmam que a pobreza se­gue em 68% são negros (as)
Salários Mínimos (média); De 11 a 19 Salários Mínimos (média alta); 20 ou
mais Salários Mínimos (alta). http://pt.wikipedia.org/wiki/Classe_social todo o país, apesar da propaganda governamental. Fonte: POCHMANN, Márcio. Nova Classe Média? O trabalho na base da pirâmide social brasileira. Boitempo, 2012. Elaboração ILAESE

20 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 21
Capítulo 2 DESIGUALDADE

Demagogia eleitoral e a “nova classe média” Comparativo gastos Gastos sociais no Brasil:
do governo federal,
“Boa parte dessa aclamação se baseia em um artifício estatístico, segundo o qual qualquer pessoa entre 1995 e 2012 Mentira tem pernas curtas
com uma renda de no máximo 7 mil dólares por ano — paupérrimo em qualquer lugar — é classificada (em % do Orçamento)
como pertencendo à “classe média”. A tão incensada nova classe média seria apenas uma classe de Em sua cartilha, o PT se contrapõe ao neolibe­ralismo e argumenta
“trabalhadores pobres”. (Perry Anderson, no artigo O Brasil de Lula) Previdência que inverteu prioridades, apos­tando no desenvolvimento e nos gastos
Social sociais. Essa afirmação, também, é falsa.
Os dez anos de governo petista seguiram o receituário neoliberal,
como mostra o gráfico ao lado. Caíram os gastos sociais enquanto os gas-
tos com dívida subiram vertiginosamente. Aqui se comprova que a dé-
35% cada petista foi tão neoliberal quanto os oito anos de FHC.
30% Ao priorizar corte de gastos com edu­cação e saúde para pagar dívida
com banqueiros, o governo deu com uma mão e tirou com a outra.
18% Esta orientação neoliberal do governo petista coloca em risco seus
próprios propósitos de distribuição de renda. O motivo é simples: não se
distribui renda por meio do mercado.
Exceto o Bolsa Família, todas as outras políticas sociais tiveram como
1995 2005 2012 matriz o mercado: crédito consignado, modelo de reajuste do salário mí­
nimo (atrelado ao PIB); Minha Casa, Minha Vida; incentivo à Agricultura
Familiar, PROUNI e PROIFES.
Saúde, educação, Enquanto houver crescimento econômico, estas medidas cumprirão
transporte e outros os propósitos do governo. Quando vier a crise, serão todos cortados, como
está ocorrendo agora na Europa.
47%

Segundo Marcelo Neri, em estudo sobre a “Nova mo classe média é questionável e tem um forte apelo Orçamento Geral da União 2012 por Função
Classe Média brasileira”, tivemos ”A adição de 40 mi­ demagógico. Um valor de R$ 291 per capita somaria Executado até 31/12/2012
lhões de pessoas entre 2003 e 2011 na classe média bra­ R$ 1.164 como rendimento familiar para ingressar na 26% 25%
sileira”, deixando a condição de pobres para trás. In- classe média. Esse valor não paga nem o aluguel ou a 10%
tegraria a classe média quem dispuser de renda per prestação de um apartamento desta família, imagine Transferências
aos Estados e
44%
capita entre R$ 291 e R$ 1.019 mensais. plano de saúde, alimento, veículos, lazer, roupas, etc. Juros e
Municípios amortizações
Márcio Pochmann, intelectual petista, faz uma A verdadeira classe média (profissionais liberais e da dívida
crítica a esta visão afirmando que Neri usa um “cri­ setores melhor remunerados da classe trabalhadora) 4% Saúde
tério errado de definir classe média pela renda e con­ está sendo asfixiada, como demonstra a cobrança do
1995 2005 2012 Total:
sumo, negando a estrutura de classe do sistema capita­ Imposto de Renda de Pessoa Física: em 1996, quem re-
3% Assistência R$ 1,712
lista.” De acordo com o autor, esta visão de estrutura cebia até nove salários mínimos não pagava imposto 3% Educação trilhão
Amortizações e
de classes no Brasil é de interesse do Banco Mundial de renda. Pela tabela recente, paga IR quem recebe até juros da dívida
1% Transporte
em difundir os êxitos da globalização neoliberal. 2,5 salários mínimos. Enquanto isso, os empresários
O governo adorou esta nova “teoria” das clas­ são isentos de pagar IR sobre lucros recebidos.7
47% 22%
ses no Brasil. Agora, segundo o governo, o Brasil se Ao invés de nova classe média, estamos vivendo 42% 26% Previdência
Outros Social
tornou um País de classe média, classe que contaria um processo complexo de ampliação da classe traba­
com mais de 95 milhões de pessoas, correspondendo lhadora. Uma ampliação sob o signo da precariedade Elaboração: Auditoria Cidadã da Dívida.
a pouco mais de 50% da população. e do sobretrabalho. Nisso se resumiu o projeto de Fontes: http://www8a.senado.gov.br/dwweb/abreDoc.html?docId=2620216
Gastos por Função http://www8a.senado.gov.br/dwweb/abreDoc.html?docId=1007801
É evidente que, com uma renda tão baixa, o ter- transformação social do PT.
18 %
Gastos com a Dívida http://www8a.senado.gov.br/dwweb/abreDoc.html?docId=1007782
Transferências a Estados e Municípios (Programa “Operações Especiais – Transferências Constitucion-
ais e as Decorrentes de Legislação Específica”)
Nota 1: As despesas com a dívida e as transferências a estados e municípios se incluem dentro da fun-
7 - Cartilha “10 ideias para uma tributação mais justa” do Sindifisco Nacional e do DIEESE (pg. 10 e 11, 2013).
ção “Encargos Especiais”.
Disponível em http://www.dieese.org.br/cartilha/2013/10ideias_completo.pdf Nota 2: O gráfico não considera os restos a pagar de 2012, executados em 2013.
Nota 3: Observado o princípio da unicidade orçamentária.
22 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) motivos da revolta2005
“Os 1995 2012crítico do governo do PT”
popular: um balanço 23
FONTE: Auditoria Cidadã e Unafisco-SP
Capítulo 2 DESIGUALDADE

A precária situação da educação, da saúde, Transportes


No Brasil se realizam 150 milhões de via-
Lula criticava
da moradia e dos transportes gens por dia. Desse total, 59% são motoriza- assistencialismo de
das e somente 3% são de metrô e trem. O sur-
preendente é que 38% das viagens são feitas a
Fernando Henrique
No gráfico da página anterior, pode-se apreciar as prioridades do governo Dilma, na for-
pé, pelo preço alto das passagens. Elas sobem
ma como distribui o orçamento geral da União em 2012. Enquanto destinou 44% do Orça- Como conclusão, podemos dizer que o PT está
muito acima da inflação.
oferecendo pequenas melhoras para os ex-
mento para pagamento de juros e amortização da dívida pública, investiu apenas 4,2% na Um morador da cidade de São Paulo le­vou,
tratos mais pobres do povo brasileiro, através
Saúde, 3,3% na Educação e 0,7% nos transportes. Por isso, os serviços sociais são tão ruins. em 2012, 2 horas e 23 minutos por dia para se
da assistência social, porém, retirando ver-
A redução dos gastos sociais do governo leva à piora dos serviços sociais no Brasil: deslocar ao trabalho. A matriz rodoviária é
bas dos gastos sociais. Está se demonstrando
res­p onsável por 42 mil mortes ao ano no Bra-
que o Programa Bolsa Família rende mais vo-
sil, vítimas de acidente de trânsito, segundo a
tos que um sistema eficaz de Saúde, Educação
Educação ANTT. O Brasil já possui uma frota de 30 mi­
lhões de veículos, um veículo para cada seis
e Transporte público e gratuito. Hoje o PT é
Temos no Brasil 14 milhões de analfabetos defensor férreo da orientação de privilegiar
(IBGE, 2009) e 30 milhões de analfabetos funcion- habi­tantes do Brasil, em números de 2010.
estes programas, mas houve um tempo em
ais. Na soma total de matriculados, tínhamos em A proposta do governo Dilma para o setor
que o PT criticava o excessivo peso do assis­
2009, 41,5 milhões de crianças e jovens entre 0 e de transporte é a mesma dos tucanos: privati-
tencialismo, quando era usado por FHC.
24 anos fora da escola, ou seja, mais da metade dos zação através de PPPs (Parcerias Público-Priva-
jovens não frequenta a escola, negando todas as leis das), expresso na privatização do metrô de BH,
constitucionais que apontou em 1988 para a garan- na privatização dos aeroportos e na estaduali- “Lamentavelmente, no Bra­­­­sil,
zação da CBTU (abusando da terceirização).
tia de uma educação pública, gratuita e universal. o voto não é ideo­lógico. Lamen­
A crítica situação dos transportes, com os
aumentos abusivos das tarifas, motivou as
tavelmente as pessoas não votam
Moradia grandes mobilizações da juventude no início partidariamente. E lamentavelmente
Segundo estatísticas8, de cada 10 famílias no de junho de 2013, que modificaram o panorama você tem uma parte da sociedade que
Brasil, 1 família não tem onde morar ou mora em político do Brasil, abrindo uma crise no gover- pelo alto grau de empobrecimento, ela
condições precárias. São quase 6 milhões de famí­ no Dilma e colocando os patrões na defensiva. é conduzida a pensar pelo estômago
lias sem-teto no Brasil. Considerando que cada
e não pela cabeça. É por isso que se
família está composta por 4 pessoas em média, isto
significa que temos 24 milhões de pessoas sem-teto
distribui tanta cesta básica, é por isso
ou morando em barracos no Brasil. Saúde que se distribui tanto tíquete de leite,
Deve-se acrescentar a este déficit a quantidade O Brasil está dividido em dois pólos: de um lado, porque isso na verdade é pe­ça de troca
de famílias que pagam aluguel acima da sua capaci- abundância e riqueza, com tratamento personali- em época de eleição e assim você
dade financeira: são quase 2 milhões de famílias no zado em hospitais privados, a preço de ouro, e de
absolutiza o processo eleito­ral, você
Brasil. outro, a pobreza e o desprezo com a população tra-
balhadora que usa o SUS (Sistema Único de Saúde),
trata o povo mais pobre da mesma
Pelas necessidades da população brasileira, a
cada ano, deve-se entregar cerca de 2 milhões de atendimento precário, longa espera por atendi- forma que Cabral tratou os índios
casas e o governo só oferece cerca de 500 mil por mento, falta de leitos, pacientes jogados em enfer- quando chegou no Brasil, entregando
ano, via o Programa Minha Casa Minha Vida. marias improvisadas em corredores, com muitas bijuterias e es­­pelhos para ganhar os
mortes que poderiam ser evitadas. índios, eles distribuem de novo, você
Isto é assim porque o SUS se transformou em
tem co­mo lógica manter a política de
um sistema para atender “pobres” que não podem
pagar pela Saúde. O sistema foi sucateado para fa-
dominação.”
vorecer a saúde privada, “complementar” ao SUS e
Lula em 2000, em programa de TV do PT
agora já representa 65% de toda a rede hospitalar
do Brasil.

8 Sinduscon de SP, apoiado na PNAD do IBGE de 2009

24 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 25
3 TRABALHO
TRABALHO

“Pleno emprego” ou Crescimento vertiginoso do emprego precário


pleno subemprego?
O que o governo federal esconde a sete chaves é Segundo Márcio Pochmann9, a maioria dos pos-
que a maioria destes 18,5 milhões de postos de tra- tos de trabalho gerados concentraram-se na base da
balho novos, gerados no decênio petista, são em- pirâmide social, uma vez que 95% das vagas aber­tas
pregos precarizados, que substituíram empregos de tinham remuneração mensal de até 1,5 salário mí­
As estatísticas ufanistas do governo federal falam em “pleno emprego”. Para isso,
melhor qualidade e maior remuneração. nimo. Isto significou um saldo líquido de 2 mi­lhões
não levam em conta milhões de trabalhadores precários, além do desemprego oculto. Entre 2000 e 2010, foram criados 20 milhões de de ocupações abertas ao ano, em média para os tra-
Um dos grandes méritos do governo, segundo o PT, foi a geração de 18,5 milhões de postos de traba­lho du- postos de trabalho formais com salários de até 1,5 balhadores de baixa remuneração. Perdeu-se cerca
rante dez anos contra apenas 5 milhões de empregos gerados nos dois mandatos de FHC. O governo fala em salário mínimo e, no mesmo período, foram perdi- de 400 mil postos de trabalho com rendimento aci-
“pleno emprego” e o IBGE, mais cauteloso, fala em “quase pleno emprego”. dos mais de 4 milhões de empregos que recebiam ma de 3 salários mínimos por ano durante governo
De acordo com o IBGE, a taxa de desemprego em fevereiro de 2013 era de 5,6%, uma das mais baixas da acima de 5 salários mínimos. petista, como se observa no gráfico abaixo:
história. Porém, os índices de desemprego do IBGE são incompletos, pois não capturam o subemprego, o desalen-
to e chega ao ponto de colocar a pessoa que realizou um trabalho de 1 hora/mês como “ocupado”. Evolução do saldo das ocupações segundo faixa de remuneração
Pelo DIEESE, que inclui o desemprego ocul­to na sua metodologia, o índice de desemprego nas 7 regiões 20000
metropolitanas em fevereiro de 2013 foi de 10,4%, quase o dobro do índice do IBGE. Considerando que a situa­
ção é pior nos municípios do interior, de uma população economicamente ativa de 100 mi­lhões de pessoas Sem remuneração

(IBGE 2011), temos 10,4 milhões de desempregados no Brasil. 15000


É um índice superior ao dos Estados Unidos e a de boa parte dos países europeus, que estão em crise econômi-
ca. Em algumas cidades brasileiras, como Salvador, por exemplo, as mulheres negras têm índice de 19% de de-
semprego, próximo ao da Espanha, que vive uma das maiores crises da sua história. 10000
Até 1,5 SM

Taxa de desemprego por cor e sexo (2011, em %)


5000

Negro (a) Não negro (a)

BELO HORIZONTE DF FORTALEZA PORTO ALEGRE RECIFE SALVADOR SÃO PAULO


18,1 19,2 0

15,6 14,6
13,9 13,1 13,6 14,3
12,7
11 11,4 10
10,6 9,9 11,4 De 1,5 a 3 SM
8,0 9,3
-5000
8,9 8,1 8,2 9,0
7,4 7,1 7,9
5,8 EMPREGOS Anos 1970 Anos 1980 Anos 1990 Anos 2000
6,0 4,7
_
Sem remuneração -62.448 125.884 5.905.273 -1.079.993
Mulher Homem Mulher Homem Mulher Homem Mulher Homem Mulher Homem Mulher Homem Mulher Homem
De 3 a 5 SM
Fonte: DIEESE Até 1,5 salário 5.892.306 4.586.479 -295.159 19.940.642
mínimo (SM)
A pesquisa do IBGE não captura as pessoas que A gera­ção “nem-nem” é pobre e representa 46% do
não procuram mais emprego, portanto não reflete a setor de extrema pobreza no Brasil. De 1,5 a 3 SM 5.437.383 4.084.193 4.001.697 6.122.158 Mais de 5 SM
realidade do desemprego e subemprego. Por exem- As estatísticas ufanistas do governo Dilma de
plo, segundo um estudo da UFRJ, coordenado pelo “pleno emprego” não levam em conta estas pessoas. De 3 a 5 SM 3.100.303 3.337.057 482.421 310.676
professor Adalberto Cardoso, temos 5,3 milhões de No máximo, aparecem como números para receber
jovens entre 18 e 25 anos que fazem parte da geração o benefício da Bolsa Família. Se esses 5,3 milhões de Mais de 5 SM 2.855.786 5.979.872 952.531 -4.279.340
“Nem-Nem”, nem trabalham, nem estudam, nem jovens fossem incorporados nos índices de desem-
procuram emprego. São principalmente mulhe­res prego, nós teríamos um desemprego de 10 a 15% da Total de empregos
gerados 17.223.330 18.153.445 11.046.763 21.014.143
(3,5 milhões frente a 1,8 milhões de homens), jovens, mão-de-obra, índice altíssimo, ainda considerando
negras, mães solteiras que não têm com quem dei­ que o carregamos antes da crise chegar ao Brasil. Fonte: IBGE. Censo Demográfico e PNAD.
9 Nova Classe Média? O trabalho na base da pirâmide social brasileira. Boitempo, 2012.
xar os filhos ou cuidam da casa ou ambas as coisas. Mas isto nem é o pior.

26 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 27
Capítulo 3 TRABALHO

Durante a década de 1970 e 1980, cresceram os No caso dos trabalhadores com remuneração
empregos de todas as faixas de renda, inclusive os de até 1,5 salário mínimo mensal, registra-se que as Evolução da composição das ocupações
mais altos, acima de três salários mínimos. De 1970 profissões que tiveram maior expansão na década de
para trabalhadores de salário base (em %)
até o ano 2000, havia a trajetória de redução de em- 2000 foram as de serviços (1,6 milhão de novos pos-
pregos com remuneração de até 1,5 salários míni- tos de trabalho, 31% da ocupação total). Na sequência,
mos, que passou de 77% para 49% de todos os postos vieram os trabalhadores do comércio (2,1 milhões),
em 2000. Durante a primeira década de 2000 (auge da construção civil (2 milhões), de escriturários (1,6
de crescimento mundial), a parcela de ocupados milhão), da indústria têxtil e de vestuário (1,3 milhão)
com até 1,5 salário mínimo voltou a crescer, che- e do atendimento público (1,3 milhão).
gando a 59% do total. Estas seis profissões foram responsáveis por 14
Dos 21 milhões de novos empregos gerados entre milhões de empregos ou 72% de todos os empregos
2000 e 2010 (a maior parte sob os dois mandatos de de até 1,5 salários mínimos.
Lula), 20 milhões se deram no esquema de precari- Também, 60% destes postos de trabalho foram
zação neoliberal. Neste ocupados por mulheres, que ganham menos que os
A classe trabalhadora aspecto, também se EMPREGOS 1979 1989 1999 2009
homens, e 80% das vagas ocupadas por trabalha­
ganhou em número apli­cou a linha neolibe­ dores não brancos, mostrando que a precarização do
Com carteira 39,0 40,2 37,1 43,9
e perdeu em renda, ral imposta pelo imperi- emprego tem gênero e raça.

segurança, emprego e alismo, que rebaixou o Há também desigualdade de rendimentos entre


Sem carteira 33,7 34,5 34,0 31,4
salário mundial a partir homens e mulheres, já que elas recebem menos que
qualidade de vida. da restauração capita­ os homens (em média, 73,3% do rendimento deles).
lista da URSS, Leste Eu- Os trabalhadores de cor negra ganhavam 60% do que Conta própria 25,8 23,9 27,5 23,5
ropeu e da China e seu consequente controle pelas ganhava um trabalhador da cor branca.10
multinacionais. Segundo Pochmann11, com base em dados do Empregador 1,5 1,4 1,4 1,2
Desse ponto de vista, ao contrário da propaganda IBGE, que contempla o intervalo entre 1995 e 2005,
oficial, aumentou o tamanho da classe trabalhadora “33,8% dos postos de trabalho gerados pelo setor pri­ Fonte: IBGE, PNAD 2009. Elaboração ILAESE

(especialmente dos setores que ganham menos) e di- vado formal foram de responsabilidade da terceiri­
minuiu o peso de trabalhadores de “classe média”, zação no Brasil”. Pode-se perceber pelo gráfico acima que houve “Como ponto de partida, o Governo Lula-Bisol não
que ganhavam mais de 5 salários mínimos mensais. A precarização dos novos postos de trabalho é re- uma pequena expansão do trabalho formal sob o será conivente com o desrespeito generalizado à lei, que
A classe trabalhadora ganhou em número e sultado da aplicação do neoliberalismo no Brasil, com governo Lula, ainda mantendo-se a maior parte começa pelo fato de apenas 40% dos assalariados pos­
perdeu em renda, segurança, emprego e qualidade FHC, Lula e Dilma. Informalidade e terceirização, so- dos ocupados na base da pirâmide so- suírem carteira de trabalho assinada.”
de vida. Porém, é este crescimento avassalador de mados à rotatividade da mão-de-obra, foram as cha- cial excluída da proteção social e traba­ 40,8 milhões Em 2010, nos dados do Censo do
empregos precarizados que dá a sensação de dis- gas que derrubaram o salário e as condições de tra- lhista, ao somar os trabalhadores sem IBGE, ainda tí­nhamos 40,8 milhões de
tribuição de renda a favor dos pobres. balho.
de trabalha­
carteira e os trabalhadores por conta trabalhadores na informalidade, signifi-
própria.
dores estavam cando 47% dos trabalhadores ocupados.
Temos, portanto, mais da metade na informali­ Essa é uma forma eficaz de pre-
dos ocupados no Brasil, sem direitos so- dade em 2010 carizar as relações de trabalho, pois a
ciais como aposentadoria, férias, 13o sa- renda média de um trabalhador com
lário, FGTS, seguro-desemprego, etc. carteira assinada em 2010 foi de R$
O PT hoje comemora estes números, quando no 1.255,00, enquanto a média dos trabalhadores sem
Programa de Governo da campanha de 198912, para carteira assinada foi de R$ 658,00, quase a metade
presidente, na página 4, dizia o seguinte: do salário do trabalhador formal.

10 - Ambos dados são da PNAD IBGE 2011.


11 - Nova Classe Média? 2012, p. 109, Boitempo.
12 - Disponível em http://www.fpabramo.org.br/uploads/sociedade.pdf

28 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 29
Capítulo 3
4 RENDA

Alta rotatividade: arma do patrão para O governo petista garante


diminuir o salário e dificultar a luta
Em 2009, de cada três trabalhadores, dois foram demitidos antes de completar um ano
um salário mínimo digno? Salário mínimo
necessário,
“Sem que alguém perca não é possível alguém ganhar em política salarial. Os banqueiros, pelo DIEESE,
No mesmo programa do PT de 1989, na parte sobre a em 2010
latifundiários, especuladores terão que parar de especular, terão que investir na produção e
questão urbana, consta o seguinte: “Todos sabem que a rotati­ R$ 2.227,53
terão que diminuir suas gordas contas bancárias e pagar melhores salários aos trabalhadores
vidade da mão-de-obra é um dos mecanismos usados para man­
se quiser distribuir renda neste país”
ter baixos os salários dos trabalhadores”.
Lula, em debate na TV, durante a campanha de 1989
Nem por isso, a rotatividade diminuiu no país sob o decênio
petista.
A partir da visão acima, o programa de governo do PT em 1989 propunha: “dobrar o valor real do
Estudo do DIEESE13 indica que são demitidos dois terços
salário mínimo, de forma gradativa, ao longo do primeiro ano de governo. (....) Até o fim do governo,
dos trabalhadores antes de completar um ano de trabalho,
queremos atingir o nível de salário mínimo proposto pelo Dieese.”
em dados de 2009. Os desliga­mentos são sem justa causa, pela
A tabela abaixo, do DIEESE, mostra que Lula, no primeiro ano de mandato, não dobrou o salário
vontade do empregador, que revela a flexibilização do traba­
mínimo. O crescimento real foi de 1,4%. Nem em oito anos de governo, Lula dobrou o salário mínimo
lho durante o decênio petista. O salário do novo admitido re­
e muito menos chegou perto de pagar o salário do DIEESE. Em 2010, o salário mínimo era R$ 510,00 e
presentava 89% do que era o salário anterior.
o salário mínimo do DIEESE era R$ 2.227,53. Representava apenas 22,9% do salário do DIEESE.

Taxa de rotatividade no mercado formal brasileiro


Salário Mínimo Real – Brasil 1940-2010 (médias anuais)
TAXA TOTAL: POR SETOR DE ATIVIDADE ECONÔMICA: 2007 2008 2009 1940
Extrativa Mineral 19,3% 22% 20% R$ 1.191,33
37,5% 36% (98% *) 1960
34,3% Indústria de transformação 34,5% 38,6% 36,8%
R$ 1.219,01
Houve recuperação
Serviços indústria de utilidade pública 13,3% 14,4% 17,2% (100,3%) do salário mínimo du-
Construção civil 83,4% 92,2% 86,2% rante o governo Lula.
40,3% 42,5% 41,6% Porém, recuperou aos
Comércio
níveis da década de
Serviços 37,6% 39,8% 37,7%
1980 e representa
Administração pública direta 8,4% 11,4% 10,6% 1980
só 48% do que era em
Agricultura, silvicultura, extrativismo 79,9% 78,6% 74,4% R$ 750,84
2007 2008 2009 julho de 1940, quando
(61,8%)
Fonte: RAIS, MTE. Excluídas transferências, aposentadorias, falecimentos, desligamentos voluntários. Elaboração: DIEESE. Publicação: Min. do Trab. e Emprego foi criado por
2010
Getúlio Vargas.
R$ 583,43
Essa flexibilização das condições de trabalho é Por fim, na década de 2000, podemos observar (48%)

a característica fundamental do neoliberalismo e um aumento vigoroso do nível de emprego, com sal-


2003
a forma principal de extrair mais-valia dos traba­ do total de 21 milhões de postos de trabalho. No en-
R$ 373,17
lhadores nos últimos 20 anos, além da introdução tanto, a maior parte foi de baixa remuneração. 1995 (30,7%)
de novas máquinas no processo produtivo. Ao mesmo tempo, ficaram estagnados ou – e isso R$ 298,12
(24,5%)
O governo petista permitiu que os empresários é original na nossa história – foram destruídos os em- 1950
implantassem a flexibilização da mão-de-obra, tanto pregos com faixas salariais mais elevadas. R$ 484,23
(39,8%)
nas condições de trabalho quanto na remuneração. No total das regiões metropolitanas, o salário
Os anos 1990 foram de barbárie no mercado de médio teve aumento real de apenas 7% entre 2002 e
trabalho, com estagnação dos empregos, exceto a cria­ 2010, segundo o IBGE.
ção de quase seis milhões de “postos de trabalho” sem Com isso, a estagnação do salário médio per-
remuneração, fruto de desindustrialização, privati- mitiu ao capital mobilizar mais trabalho com o mes-
1940
1950
1960
1970
1975
1980
1989

1990
1991

1992

1993

1994

1995
1996

1997

1998

1999

2000
2001

2002

2003

2004

2005
2006

2007

2008

2009

2010

DIEESE
zações e desregulamentação do mercado de trabalho. mo custo, portanto, aumentando seu lucro.

13 DIEESE. Movimentação Contratual no Mercado de Trabalho Formal e Rotatividade No Brasil, 2010.


Fonte: DIEESE. Valores de março de 2011, referentes à capital paulista. (*) Em 1940, o salário médio corresponde ao segundo semestre.

30 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 31
Capítulo 4 RENDA

Salário Mínimo Real – [Índice)

R$ % No Brasil, temos apenas duas faixas salariais para o Em termos de salários mínimos, também houve do menos: a rotatividade cresceu de 33,5% ao ano na
em relação ao salário capital: de trabalhadores sem rendimento até os que re- uma queda, como atesta a tabela abaixo: década de 1990 para 36,9% no final do segundo man-
mínimo de julho 1940
cebem um 1 salário mínimo, faixa que concentra quase dato de Lula (2009) com dados do Ministério do Tra-
1940 1.191,33 98,0* 40% dos trabalhadores, e de 1 até 2 salários mínimos, onde Maior a empresa, maior a perda balho/RAIS. Isto significa que a cada ano quase 4 de
se concentram 33% dos trabalhadores. Este é o limite de re- cada 10 trabalhadores são demitidos e readmite-se
1950 484,23 39,8 Evolução do emprego formal e renda média
muneração aceito pelo capital no Brasil, o mesmo que não um novato, ganhando menos.
por estabelecimento (em salário mínimo real)
1960 1.219,01 100,3 para de falar que o custo do trabalho no país é elevado. Alta rotatividade e baixos salários são irmãos
Por outro lado, o governo petista diz que houve cresci- SALÁRIOS MÍNIMOS PAGOS sia­meses: nos setores que pagam entre 0,5 e 1 salário
1970 837,78 68,9
mento do rendimento real médio dos trabalhadores. Isso só mínimo mensal, a taxa de rotatividade foi de 85,3%
Tamanho EM 1989 EM 2009 Diferença
1975 691,63 56,9 seria verdade se esquecêssemos do passado, pois o rendi- em 2009 frente à taxa de 60% em 1999.
da empresa
mento médio dos traba­lhadores agora sequer atinge os Quase 9 de cada 10 trabalhadores pobres são
1980 750,84 61,8 Micro 1,9 1,7 -0,2
níveis do final dos anos 1990, como mostra o gráfico abaixo. demitidos a cada ano e se contrata novo empregado,
1989 489,26 40,3 Houve queda do rendimento médio real em São Pau- Pequena 3,4 2,3 -1,0 como forma de perpetuar o baixo salário. Traba­lhador
lo, Salvador, Recife, Porto Alegre e no Distrito Federal. Das que fica mais de um ano no serviço, ganha mais.
1990 352,89 29,0
grandes regiões metropolitanas, Belo Horizonte foi a única
Média 4,0 2,8 -1,3 As palavras de Márcio Pochmann, em livro já
1991 364,84 30,0 na qual houve crescimento do rendimento médio real. Grande 5,2 4,0 -1,3 ci­tado, constatam a precarização geral do emprego:
“Nos dias de hoje, o trabalho terceirizado responde
1992 316,87 26,1 TOTAL 4,4 3,2 -1,3 cada vez mais por uma parcela maior do total das ocu­
Rendimento médio real Fonte: Ministério do Trabalho e Emprego/RAIS
pações geradas no Brasil e por serem postos de traba­
1993 354,66 29,2
dos assalariados (1998 – 2012) lho com menor remuneração, absorvem mão-de-obra
1994 301,29 24,8
Em R$, valores de janeiro de 2012 Pela informação do Ministério do Trabalho, com de salário base. As ocupações terceirizadas tendem a
1995 298,12 24,5 dados da RAIS, em 1989 os trabalhadores recebiam se concentrar na base da pirâmide social brasileira.
uma média de 4,4 salários mínimos e caiu em 2009 Mais da metade do total de postos terceirizados são
1996 302,91 24,9 para 3,2 salários mínimos. Portanto, entre 1989 e ocupados por trabalhadoras e 40% tem a cor negra.”
RECIFE
1997 307,68 25,3 2009 houve uma queda do rendimento médio real (idem, p. 110).
DISTRITO 1.205 1.160
dos ocupados com carteira assinada. Veja gráfico com a rotatividade no trabalho por
1998 322,63 26,5 FEDERAL
Essa queda se deve à rotatividade da mão de obra, níveis de renda, com dados do Ministério do Traba­
2.370 2.352
1999 323,95 26,6 que substitui o antigo empregado por outro ganhan- lho e Emprego.
1998 2010
2000 333,36 27,4
PE
Rotatividade nos empregos com menor renda
2001 360,63 29,6
SALVADOR Rotatividade no emprego formal por faixa de rendimento (em %)
2002 367,99 30,2 1998 2010
BA
1.265 1.139 Até 0,5 De 0,5 até 1 De 1 até 1,5 De 1,5 até 2 De 4 até 5
2003 373,17 30,7 DF salário mínimo salário mínimo salário mínimo salários mínimos salários mínimos
SÃO PAULO
2004 387,10 31,8 Rotatividade subiu Rotatividade subiu Rotatividade subiu Rotatividade caiu Rotatividade caiu
2.085 MG 1998 2010
2005 416,92 34,3 1.614 85%
SP
2006 481,82 39,6 BELO
HORIZONTE 58% 60% 59%
2007 507,40 41,7 49% 51%
1998 2010 1.327 1.462 37%
2008 519,05 42,7 PORTO ALEGRE
1.466 1.429 17% 20%
2009 559,67 46,0
RS
13%
1998 2010
2010 583,43 48,0
1999 2009 1999 2009 1999 2009 1999 2009 1999 2009
Fonte: DIEESE. Fonte: DIEESE nas
Valores de março de 2011, referentes à capital paulista. Regiões Metropolitanas 1998 2010
Fonte: Ministério do Trabalho e Emprego (MTE)/RAIS
* Em 1940, o salário médio corresponde ao segundo semestre.

32 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 33
5 CAMPO
CAMPO

A mudança no discurso Governo do PT se uniu ao


1982 “Uma reforma
agrária, controlada agronegócio e abandonou
pelos próprios trabalhadores
do campo. Em resumo, pre­ a reforma agrária
cisamos de um governo que
se coloque firmemente ao A proposta de reforma agrária sempre esteve dívidas com a União. Chegando ao governo, Lula mu-
presente nos diversos programas do PT. Em 1980, de- dou de opinião e chamou estes mesmos usineiros de
lado dos que trabalham a
fendia a “luta pela nacionalização da terra”. Em 1982, heróis nacionais..
terra, não este governo com­ lutava por “Uma reforma agrária, controlada pelos Na cartilha comemorativa dos 10 anos de go­
prometido com as multina­ próprios trabalhadores do campo.” verno petista sequer consta o termo reforma agrária.
cionais, os latifundiários, os No programa de 1989, defendia a punição aos Não é um lapso. Neste aspecto, o balanço do governo
grileiros e atravessadores”.14 crimes do latifúndio e um novo modelo de agricultu- é negativíssimo. Esperava-se uma reforma agrária,
ra cuja prioridade “será a produção voltada para o veio uma contrarreforma agrária.
mercado interno. Alimentar adequadamente toda a Havia muita esperança do povo brasileiro de que
1989 “Nenhuma tolerância haverá população”. E exigia “o controle dos atuais oligopólios o PT no governo garantiria justiça no campo, dis-
com o atual quadro de violên­ no setor agroindustrial.” tribuindo terra e dando condições para plantar, co­
Em 2002, a promessa de campanha era realizar lher e comercializar.
cia que domina regiões intei­
um milhão de assentamentos até o final do mandato. Porém, Lula e Dilma continuaram a obra de FHC,
ras do país. Todos os crimes do Ou seja, 250 mil assentamentos por ano. privilegiando o agronegócio moderno, latifundiário e
latifúndio serão apurados” 15 O próprio Lula havia declarado na campanha de multinacional em detrimento dos milhões de traba­
1998 que iria desapropriar as terras dos usineiros com lhadores rurais sem–terra.

1998 “Vou levantar as dívidas dos


usineiros no Banco do Brasil Famílias assentadas, em milhares 117,6
e vou desapropriar as terras
108,3
deles para fazer assentamen­ 101,9
tos.” 16
81,9 82,2

2002 Vamos realizar um milhão 65,4


de assentamentos até o final
62 60,5 63,5 62,7
56,7
51,8
do mandato. 42,9
37,5
33,5
30
2007 “Os usineiros de cana, que 21,9
há dez anos eram tidos como 10,8
Lula candidato em São Paulo, em 1982 se fossem os bandidos do
agronegócio neste país, es­ 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012*

tão virando heróis nacionais FHC LULA DILMA


14 http://www.fpabramo.org.br/uploads/plataformaeleitoral.pdf
e mundiais” 17 528,4 mil 530 mil 32,7 mil
15 http://www.fpabramo.org.br/uploads/questaoagraria.pdf Média/ano: 66,05 Média/ano: 66,25 Média/ano: 17,21
16 Jornal Gazeta Mercantil de 1o de Setembro de 1998, p. A10. mil famílias mil famílias mil famílias
17 http://www1.folha.uol.com.br/folha/brasil/ult96u90477.shtml
Fonte: INCRA. *2012: dados até 16 de novembro. Elaboração ILAESE

34 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 35
Capítulo 5 CAMPO

O governo Dilma conseguiu ser pior que FHC mais dinâmico da economia e representou 33% do Durante os dois
no que se trata de reforma agrária. Se faltasse terra PIB do Brasil, gerou 37% dos empregos e foi respon- mandatos de Lula,
no Brasil, poderia se justificar, porém o censo agro- sável por 42% das exportações. Garantiu sozinho o su-
pecuário desmente a falta de terras: dos 850 milhões perávit da balança comercial brasileira com o exterior.
através do BNDES,
de hectares de terras no Brasil, apenas a metade (437 Este agronegócio é resultado da união dos se entregou
milhões de hectares) está cadastrada. Some-se a isto grandes fazendeiros brasileiros, com os banqueiros e uma média de
241 milhões de hectares de conservação ambiental, as grandes corporações transnacionais. É a perfeita R$ 18 bilhões
área indígena e terras públicas. Sobra, portanto, 179 simbiose entre modernização da agricultura capita­
ao ano para o
milhões de hectares de terras sem cadastro, devolu- lista e o latifúndio. Cerca de 30 empresas dominam
tas, que estão nas mãos de grileiros. Além disso, 120 todo o complexo agroindustrial brasileiro e mais de
agronegócio.
milhões de hectares foram declarados improdutivos 70% destas empresas são multinacionais.
pelos próprios “donos”. O domínio do agronegócio foi produto da onda
Por isso, não é de estranhar a continuidade dos neoliberal que varreu o mundo e está especializan- Toda esta “modernização” foi patrocinada pe- do das sementes transgênicas.
conflitos no campo: relatório Conflitos no Campo do o Brasil como fornecedor de matérias primas, ali- los governos Collor, FHC, Lula e Dilma, através do O agronegócio emprega cerca de 16 milhões de
2010, da Comissão Pastoral da Terra (CPT), revelou mentos e energia para o desenvolvimento capitalista BNDES, que bancou todo o financiamento do grande trabalhadores rurais. Porém, o neoliberalismo no
que 34 trabalhadores rurais foram assassinados no mundial. agronegócio. Além disso, deu incentivos fiscais, des- cam­po, representado pelo agronegócio multinacio­
país em 2010, isto é, um morto a cada 10 dias no últi- A política neoliberal aplicada no campo gerou onerações e o tradicional perdão das dívidas antigas. nal, destruiu quase sete milhões de postos de traba­lho
mo ano do governo Lula. uma modernização da produção capitalista na área Durante os dois mandatos do governo Lula, através no campo brasileiro entre 1990 e 2006. O domínio do
Assim, é unânime na esquerda em geral, a rural, com altos índices de produtividade, que quin- do BNDES, se entregou uma média de R$ 18 bilhões agronegócio gera pouco emprego, por sua alta meca­
seguinte análise do campo brasileiro nos últimos tuplicou a produção enquanto diminuiu o número de ao ano para o agronegócio. A dívida antiga dos usi- nização, ao mesmo tempo em que está gerando uma
10 anos, feita por João Pedro Stédile: “Nos últimos trabalhadores rurais. neiros com o Proálcool chegou a 30 bilhões de dólares nova classe, a dos operários agrícolas, assalariados ru-
dez anos, não houve avanços em termos de reforma Está retornando o velho modelo colonial de mo­ entre 1970 e 2000. A dívida destes usineiros somente rais. Esta classe é superexplorada, com empresas utili-
agrária. Nos últimos dez anos, se ampliou a concen­ no­culturas para exportação, onde a produção de com- durante o governo Lula alcançou a cifra de R$ 28 bi­ zando tercerização de mão-de-obra, sem respeitar os
tração da propriedade da terra. E pior, concentrou in­ modities subjuga e expulsa as culturas tradicionais lhões. Por aí se vê que a “modernidade” e a “eficiên- direitos trabalhistas e pagando salários miseráveis em
clusive nas mãos de empresas de fora da agricultura do nosso povo em detrimento da soberania alimen- cia” do agronegócio repousam em uma montanha de condições de trabalho semiescravo.
e do capital estrangeiro. O governo tar. Dois terços das terras dedicadas à di­nheiro público. Toda esta mudança no campo brasileiro só foi
Dilma não conseguiu nem resolver Cerca de 30 empresas lavoura no Brasil estão ocupadas por Esta “modernização” levou a destruição do saber possível porque o PT abandonou o projeto de uma
o problema social das 150 mil famíl­ soja, cana-de-açúcar e milho. do campo e da riqueza nacional pelas multinacionais, Reforma Agrária no Brasil, que assentaria o cam-
dominam todo o que impõem a cultura do dinheiro e do “vale tudo” ponês na terra e garantiria fartura de alimentos,
ias que estão acampadas, algumas Com o agronegócio, perdemos a
há mais de cinco anos, ao longo de complexo agroindustrial soberania sobre a produção agroin- para enriquecer. bons e baratos, para acabar com a fome no país. Por-
estradas brasileiras. Por tanto, o go­ brasileiro e mais de dustrial do País. Somos os maiores A “modernização” subjugou uma parte dos pe­que­­ tanto, foi abandonado o projeto do movimento social
verno Dilma abandonou a reforma 70% destas empresas ex­portadores de carne do mundo e nos camponeses e está expulsando do campo, gra­da­ brasileiro de soberania nacional e alimentar.
agrária, iludido com o sucesso do não conseguimos comprar carne. Es­ tivamente, a maior parte da classe de camponeses po- No governo do PT piorou a concentração de ter-
são multinacionais.
agronegócio, que produz, ganha din­ ta­
mos importando feijão preto da bres. Entre 1970 e 2006 se perderam 200 mil pequenas ras, inclusive pelo capital estrangeiro. Se o PT optasse
heiro, mas concentra a riqueza e a Chi­na, banana da Tailândia, maçã do propriedades, que foram ocupadas pelo gran­­de agro­ por honrar sua promessa de campanha, direcionaria
terra e aumenta a pobreza no campo.” 18 Chile, cebolas da Espanha e limão do Uruguai. Além ne­gócio. Como bem disse a Federação dos Emprega- os R$ 136,8 bilhões que o BNDES entregou ao agro­
O Brasil tem a segunda pior concentração de ter- disso, os preços dos alimentos são determinados pelo dos Rurais Assalariados do Estado de São Paulo (FER- negócio durante os dois mandatos de Lula para re-
ras do mundo, onde o grande produtor rural domina mercado mundial em dólar. O preço da la­ranja subiu AESP): “Com esta política, há uma dinâmica irreversível alizar uma reforma agrária no país. Este valor seria
mais de 70% da terra. Por isso, mais da metade da sua mais de 100% em 2012, enquanto milhões de tonela- da subordinação da pequena propriedade e assentamen­ suficiente para assentar 1 milhão e 700 mil famílias
população rural, que conta com 30 milhões de pes- das de laranjas apodreceram no interior de São Paulo. tos ao agronegócio e seus valores monetários”. 19 sem-terra, considerando o valor de R$ 80 mil para as-
soas, é composta de pobres e miseráveis. Houve uma mudança importante na proprie- Esta modernização é destrutiva da natureza, pois sentar uma família em 2012, segundo o INCRA.
O agronegócio domina todo o complexo agroin- dade rural, na qual o capital nacional e familiar pas- a monocultura vai ocupando a totalidade do terri- Esta opção econômica e política do governo petis-
dustrial brasileiro, desde os insumos e maquinário, sou o comando para as grandes corporações multi- tório e depois de destruir boa parte do cerrado, agora ta deixou o movimento social em crise e sem projeto,
da produção agropecuaria e a agroindústria até as nacionais, que formaram oligopólios nos diversos investe contra a Amazônia. O Brasil já é o maior con- enquanto os ricos avançam na exploração do campo
grandes redes de supermercado. Em 2012, foi o setor setores da cadeia agropecuária. sumidor de agrotóxicos do mundo e segundo merca- a serviço do lucro privado.

18 Entrevista com João Pedro Stédile concedida ao jornal ABCD MAIOR em 13 de dezembro de 2012. 19 http://feraesp.org.br/Pagina/Default.aspx?IDPagina=321

36 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 37
6 DEPENDÊNCIA
DEPENDÊNCIA ECONÔMICA

O Brasil é um país mais Investimento Estrangeiro Direto (IED) e remessas de lucros (1953-2012)
Em milhões de dólares

soberano ou mais dependente? Investimento Estrangeiro Direto

1953-1962 1963-1972
Remessa de lucros

1973-1982 1983-1992 1993-2002 2003-2012

Privatização neoliberal atual, cria do PT, é o Eike Batista: com o mapa geológi-
547,6
rimou com desnacionalização co do Brasil cedido pelo pai, Eliezer Batista (ex-presi­
Na cartilha do PT, logo no início, caracteriza o dente da Vale e da Petrobrás), e forte apoio estatal,
período entre 1990 e 2000 como o período de “deca­ montou várias empresas, arrecadou bilhões de dóla­
dência induzida pela rota da neocolonização neolibe­ res vendendo ações a grandes bancos interna­cionais
ral”, que “condenou o país à condição de subordinado e agora, em crise total, vai dar calote no go­verno fe­
e dependente da globalização”. deral e vai vender boa parte do subsolo brasileiro
De fato, a privatização das estatais entregou a para as transnacionais.
siderurgia, mineração, água e luz, telefônicas e ban- Assim, sobrou para a classe trabalhadora con- 214,0 199,4
cos para as transnacionais. Foi forjada uma recessão tinuar a luta pela soberania nacional. Por isso, o PT,
para destruir milhões de empregos, rebaixar os sa- no início da década de 1980, levantou bem alto esta
lários e precarizar a mão-de-obra. bandeira, expresso em “Fora daqui o FMI”.
Temos acordo com o PT quando afirma que o neo- O que não temos acordo com o PT é que seus 47,1
liberalismo significou a perda da soberania nacional. quase 14 anos de governo tenham rompido com a 1,2 2,3 20,2 1,2 19,3 5,5
0,3 0,82
A burguesia nacional mostrou-se incapaz de garantir condição de subor­dinado e dependente da globali-
a independência. zação. Ao contrário, nestes anos, a dependência e a Remessas de lucros crescem em relação ao investimento
Um típico representante da burguesia brasileira subordinação do Brasil ao imperialismo aumentaram.
0,3% 3,5% 6,3% 28,7% 22,0% 36,4%

Conta financeira – investimentos diretos – estrangeiros no país – ingressos – US$ (milhões) - Banco Central do Brasil, Boletim, Seção Balanço
de Pagamentos (BCB Boletim/BP) – BPN_FINIDEREC – Elaboração: ILAESE

O Brasil depende de capital internacional


Nos 10 anos de governo petista, dobrou a entrada de capital
estrangeiro e quadruplicou a remessa de lucros para o exterior

O gráfico acima mostra a entrada de capital es- em 1995, a alíquota era de 15%”. Ao liberar as remessas
trangeiro no Brasil e a remessa de lucros desde 1950. de lucros ao exterior do pagamento do Imposto de
O governo Lula, ao invés de limitar as remessas Renda, os governos petistas abrem mão de controlar
de lucros ao exterior, como fez Getúlio Vargas em e taxar o capital especulativo que vem ao Bra­sil, fa-
1952, que limitou o envio a 10% do capital que entrou vorecendo-o em detrimento do desenvolvimento do
no país, isentou as remessas de lucros de pagar im- Brasil.
posto de renda, pela Lei nº 9.249 (2005). Em 2012, o governo brasileiro teve um déficit de
Nos 10 anos de governo petista, dobrou a entrada todas as contas, que inclui a conta comercial, de 54
de capital estrangeiro e quadruplicou a remessa de bilhões de dólares. Conseguiu atrair 65 bilhões de
lucros para o exterior. dólares para bater as contas. Sem a vinda deste capi-
Segundo estudo da Unafisco/DIEESE (2013), “No tal, a crise que atinge o mundo inevi­tavelmente che-
Dilma Rousseff critica espionagem norte-americana em reunião da ONU. Dependência econômica impede soberania do País passado, a taxação sobre as remessas chegou a 25% e, garia ao Brasil.

38 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 39
Capítulo 6 DEPENDÊNCIA ECONÔMICA

Já estamos tendo problemas. No primeiro bimes- econômico está tão arraigado que o governo Dilma Com a crise instalada no mundo, os países ricos, para os países ricos e para a China. São as multina-
tre de 2013, o déficit chegou a US$ 18 bilhões e o in- começou a baixar os juros no Brasil, mas já desistiu: através das multinacionais, começaram a desovar cionais instaladas no Brasil que estão importando
gresso de capitais a apenas US$ 7,5 bilhões. o movimento de alta dos juros já retomou. Não tem a os estoques de produtos que não conseguem vender em massa.
Estamos totalmente dependentes da vinda ver com luta contra a “inflação alta” e sim com o com- por lá. Os países ricos começaram a exportar mais,
deste capital, formado na maior parte por capital es- promisso de remunerar bem os banqueiros. O Brasil tinha um superávit comercial com os para minimizar sua crise, por isso, aumentaram as
peculativo. Neste aspecto, o PT no governo deu continui- países ricos de US$ 12 bilhões em 2008. Em 2012, importações do Brasil, principalmente através de
O Brasil tem um dos juros mais altos do plane­ dade e aprofundou a dependência do Brasil com o teve déficit de US$ 15 bilhões. Por isso, a indústria multinacionais. Veja a seguir o exemplo do setor
ta como forma de atrair este capital. Este modelo capital estrangeiro. brasileira está tendo um déficit anual de US$ 94 bi­ mais importante da indústria brasileira e que goza
lhões. Estamos transferindo empregos industriais de todas as prioridades governamentais.

Dependência excessiva de produtos primários Investimentos, desembolsos do BNDES,


remessas de lucro e saldo comercial do A tabela ao lado compro­
O neoliberalismo impôs ao mundo uma nova di- mos trilhos de trem a preço sete vezes mais caro. va que os governos petistas
visão internacional do trabalho: usou a restauração O governo Lula assegurou que tínhamos autos- setor automobilístico brasileiro (2003-2012) favoreceram o domínio das
capitalista na URSS e China para rebaixar o salário suficiência de petróleo. Porém, em 2012, exportamos Veículos, comerciais leves, caminhões e ônibus transnacionais na economia
mundial. Com suas transnacionais, dominou e trans- óleo cru barato e importamos derivados de petróleo brasileira. Durante o decênio
formou a China na fábrica do mundo. Ao mesmo caro. Tivemos um déficit de 35 bilhões de dólares na petista, as montadoras inves­
Investimentos Desembolsos Remessas Saldo comercial
tempo direcionou o Brasil (e a América do Sul) para balança comercial de combustíveis em 2012. montadoras do BNDES de lucros de veículos tiram 24 bilhões de dólares,
ser grande produtor de alimentos, matérias primas e Exportamos o grão de café a preços baixos para (US$ bilhões) (US$ bilhões) (US$ bilhões) (US$ bilhões) foram financiadas pelo go­
energia. a Alemanha que industrializa o café e é grande ex- verno através do BNDES com
Estamos dependentes das exportações de miné- portador mundial sem ter um pé de café no país. Ex- US$ 25 bilhões e remeteram
rio de ferro, soja e alimentos para a China. portamos celulose e importamos bíblias em portu- 2003 0,67 2,65 0,43 1,25
quase 27 bilhões de dólares
Produzimos muito minério de ferro e importa- guês da China. 2004 0,73 2,57 0,27 3,00 para suas matrizes nos países
ricos.
2005 1,05 2,02 0,49 4,13
Produtos básicos X manufaturados na exportação brasileira (1993-2012) Na última coluna (sal­
Em % 2006 1,45 2,38 1,34 4,12 do comercial de veículos) se
demonstra que as montadoras
Em 2008, 2007 1,96 1,60 2,70 2,19
Produtos básicos Produtos manufaturados sempre exportaram mais que
justamente no
2008 2,91 2,49 5,60 -2,79 importaram veículos, porém,
governo petista,
as exportações de a partir de 2008, com o início
70 2009 2,51 3,16 3,80 -4,22
produtos primários da crise nos países ricos, as
65 superaram as de 2010 3,65 3,28 4,10 -5,33 montadoras começaram a im­
62
61% manufaturados. 60% portar veículos (para aprovei­
58
59 59 2011 4,97 2,48 5,58 -7,68
60 57 57 57 tar a produção encalhada
55 55 55 55 55 55
55
54 54 54 2012 4,00 2,27 2,44 -8,82 nas matrizes) e diminuíram a
52 51 produção no Brasil.
50 TOTAL 23,93 24,93 26,76 -14,14 Este quadro sintetiza a
46
44 44
orien­tação do governo em
45 43 43 43 43 43 43 43
41 41 41 41 47 incentivar, proteger e finan­
39 ciar as grandes transnacio­
40
36 nais. Nisto, não se diferenciou
35 38% 38 37% em nada do neoliberalismo.
Ao contrário, foi agente direto
30
da subordinação da economia
1993 1994 1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 Fonte: **BNDES, Banco Central e Anuário da Indústria Automobilística Brasileira – 2012 – ANFAVEA
Itamar FHC FHC Lula Lula Dilma – Elaboração ILAESE. Faturamento da auto indústria é estimativa em base ao crescimento das vendas
brasileira às transnacionais.
do setor em 4,6% em 2012. Investimentos da indústria automobilística em 2012 é estimativa da AN-
Fonte: Ministério do Desenvolvimento – SECEX. Elaboração ILAESE
FAVEA. Dados do saldo comercial: ANFAVEA/SECEX.

40 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 41
Capítulo 6 DEPENDÊNCIA ECONÔMICA

Transnacionais dominam economia brasileira “Ele é o cara”


Pesquisadores suíços estudaram o movimento de tas contas não consta as participações “minoritárias” Elogios tanto de Bush quanto de
43 mil transnacionais no mundo e concluíram que do capital internacional nas empresas “brasileiras”.
Obama refletem o papel dos go­
147 companhias controlavam 40% da riqueza mun- Só para citar um exemplo, a Petrobrás: 55% do
dial. O grosso destas empresas eram bancos (Bar- capital total da empresa já são de propriedade pri-
vernos petistas na América Lati­
clays, J.P. Morgan, Goldman Sachs, BlackRock, etc.). vada, a maioria nas mãos de estrangeiros. Alguns na, como aliados do imperia­lismo
Estas grandes corporações transnacionais tam- dos grandes acionistas estrangeiros da Petrobrás e à frente da ocupação no Haiti
bém dominam a economia brasileira: o BlackRock, em 2012 são The Bank of New York, BNY Mellon,
maior fundo de investimento do mundo, é grande BNP Paribas, Opportunity, Gap e Credit Suisse, Citi-
acionista da Vale, Petrobrás, Embraer, Gerdau, Am- bank, HSBC, Schroder, Asset Management, JP Mor- Complementando o papel subordinado da eco- tador Assad, que promove um banho de sangue na
Bev, das maiores construtoras como a PDG, Cyrela, gan S.A, Santander, BlackRock (que se associou com nomia brasileira no mundo, o governo petista, espe- Síria. Inclusive, o governo brasileiro reali­ zou um
Gafisa e MRV. Na agroindústria é acionista da BR- o Barclays20). cialmente o de Lula, atuou em defesa das multinacio­ acordo comercial com a indústria militar de Israel.
Foods (Perdigão e Sadia). Também é importante Através destes bancos, as duas famí­lias mais nais petroleiras na crise da Bolívia, negou-se a apoiar Era possível com o povo brasileiro mobilizado,
acionista do Grupo Pão de Açúcar. ricas do mundo, Rockfeller e Rothschild, são donas a moratória ultra tímida de Kirchner na Argentina, como mostrou as mobilizações de 2013 e a trajetória
No sistema financeiro é acionista do Itaú, Bra­ de boa parte da Petrobrás. colocou o Sivam (defesa aérea da Amazônia) para blo- de luta da classe trabalhadora brasileira, lutar por
desco e Banco do Brasil (governo Lula vendeu 30% O setor bancário brasileiro ainda tem maioria quear as fronteiras brasileiras às FARC’s, pressionou uma verdadeira soberania nacional ao invés da su­
das ações do BB para estrangeiros em 2009). de capitais nacionais, porém os bancos estrangeiros Chávez para um acordo com o imperialismo. Teve bordinação e dependência a que estamos submetidos.
As transnacionais dominam a economia bra- detêm participação de 30% nos bancos brasileiros. papel de bombeiro diante do golpe na Venezuela, na A história poderia ter sido diferente se o PT hou-
sileira, como mostra a tabela abaixo. No agronegócio, Trocando em miúdos, os anos de governo do PT crise na Bolívia, se colocou à frente da intervenção vesse optado por ficar ao lado da classe trabalhadora
30 empresas dominam o complexo agroindustrial e aprofundaram o domínio das multinacionais sobre imperialista do Haiti (uma vergonha para a história mundial ao invés de unir-se aos poderosos. Era pos-
mais de 70% destas empresas são multinacionais. a economia brasileira e, inclusive, esta desnaciona­ brasileira), e aplicou à risca a orientação do Banco sível o Brasil encabeçar uma frente de países pobres
Porém, a desnacionalização do parque produtivo lização contou com a ajuda do governo, através do Mundial de garantir um “desenvolvimento capitalis- na luta contra a exploração colonial que os países
brasileiro é superior ao indicado acima, porque nes- BNDES. ta com ações sociais compensatórias”. Não é à toa que ricos submetem o mundo. Porém, necessitava vonta-
George Bush disse “apesar de Lula ser de esquerda, eu de do PT de romper com o sistema capitalista. E isso,
gosto dele” e Obama disse que ele “é o cara!”. a direção do PT nunca esteve disposta.
CONTROLE ESTRANGEIRO Poderia ser diferente, com o PT se colocando na

Petrobras/Divulgação
vanguarda dos movimentos sociais no continente, Governos petistas como
Setor % em uma frente para suspender o pagamento da dí­ agentes da recolonização
Montadoras 100% vida externa. Aliás, este era o sentimento dos traba­ O Brasil hoje é um país mais dependente e
lhadores de todo o continente que, cansados das subor­dinado, que joga um papel auxiliar na domi-
Setor eletroeletrônico 92%
orien­tações neoliberais, derrubaram todos os go­ nação imperialista do planeta. O PT no governo foi
Autopeças 75% vernos neoliberais, sustentados pelos EUA. agente direto da recolonização do país.
Porém, o que se passou foi o oposto. Os gover- A luta pela soberania nacional segue como
Telecomunicações 74%
nos de “esquerda” continuaram a aplicar os planos uma tarefa central no Brasil de hoje. A classe tra-
Setor farmacêutico 68% neoliberais. Fizeram o que a direita já não conseguia balhadora brasileira saberá extrair as lições desta
Indústria digital 60% fazer. Ocorreu também um freio da luta de classes capitulação do PT ao imperialismo e aprenderá na
pela ação desses governos. Hoje a América Latina própria carne, através da longa crise mundial, que
Setor de bens de capital 57% está mais dependente da dominação imperialista. o impe­rialismo vai atacar os países pobres e a classe
Petrobrás* 55% O governo do PT não se colocou ao lado das mo- traba­lhadora mundial para salvar os lucros de um
bilizações dos trabalhadores europeus, porque estas pu­nhado de multibilionários.
Setor de bens de consumo 55% questionam também governos da social-democracia As mobilizações de junho de 2013 prenun­ciam
Siderurgia e metalurgia 50% europeia, com a qual o PT sempre teve identidade. grandes lutas da classe trabalhadora brasileira,
Em outro grande pólo de mobilizações revolu- se juntando aos traba­lhadores e jovens europeus,
Petroquímica 47%
cionárias, as revoluções árabes e a luta de libertação árabes e asiáticos.
* Sobre o capital total da empresa
da Palestina, os governos petistas estiveram ao lado Somente a classe trabalhadora pode garantir a
de Khadafi na Líbia (derrubado em 2011) ou do di- segunda e definitiva independência do Brasil.
20 Relatório de Sustentabilidade 2012 e Ata das assembleias gerais ordinárias e extraordinárias da Petrobrás, realizadas em 19 de março de 2012

42 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 43
7 LUCROS
LUCROS

Distribuição do faturamento total


“Empresários ganharam como
Durante 11 anos de governo petista, estas
empresas faturaram R$ 15,4 trilhões. Em 2011, Em 2011
as vendas destas empresas representaram 48%

nunca no meu governo”


Trabalhadores
do PIB brasileiro. Este montante foi produzido
9%
e comerciali­zado, em 2011, por 2.886.937 traba­
lhadores. Em média, cada trabalhador rendeu Empresas
A realidade desmentiu a visão de que os ricos perderam para que os pobres pudessem ganhar. para sua empresa R$ 687.926,33. Governo e bancos

Deste ponto de vista, não houve distribuição de renda. Os ricos – uma minoria de 165 mil bra­
O grosso desta riqueza produzida pelos tra- 19% 72%
balhadores vai para os banqueiros e patrões: 72%
sileiros em 2011, 0,08% da população21 – continuaram ganhando muito. dessa riqueza foram para os grandes empresá­rios
Até o próprio Lula afirmou: “Estou satisfeito porque a minha relação com o empresa­riado e banqueiros, 19% foi para o governo (onde boa
brasileiro é boa. Da minha parte, não existe preconceito. Tenho consciência de que estão ga­ parte volta para banqueiros e empresários), res­
Fonte: Maiores e Melhores da Exame – 2012 – Em base a 290 maiores
nhando dinheiro no meu governo como nunca.”22 A afirmação de Lula de que as empresas tando ape­nas 9% para os trabalhadores:
empresas que forneceram dados de salários e encargos. Elaboração ILAESE
nunca ganharam tanto dinheiro como no decênio petista deve ser levada a sério.

Banqueiros fazem a festa Lucro dos bancos Favorecimento via desonerações e benefícios fiscais
Segundo dados do Banco Central, o lucro do (Era FHC X Era Lula)
A orientação do governo tem favorecido os foram beneficiadas com a desoneração da folha
sistema financeiro brasileiro nos dois mandatos R$ 428 bi patrões com a desoneração da folha de pagamento, teriam que pagar R$ 21,5 bilhões ao INSS em 2013.
de FHC (1995-2002) foi R$ 95 bilhões. Este mes- a isenção de impostos e várias outras medidas com Com a mudança, pagarão apenas R$ 8,7 bilhões so-
mo lucro nos dois mandatos de Lula (2003-2010) intuito de evitar a “crise”. bre o faturamento. Prejuízo para a Previdência So-
chegou a R$ 428 bilhões. Ou seja, no governo do As desonerações atingiram o valor de R$ 44 cial de R$ 12,8 bilhões.
PT os bancos lucraram cinco vezes mais que com o bilhões em 2011, R$ 72 bilhões em 2012 e deve Por isso, o governo já planeja uma nova reforma
neoliberal FHC. R$ 95 bi
chegar a R$ 91 bilhões em 2013. da Previdência, para aumentar os anos para que um
Não é a toa que a rentabilidade dos bancos Segundo o próprio governo, as indústrias que trabalhador possa se aposentar.
brasileiros em 2012 atingiu 16,8%, enquanto a dos 1995-2002 2003-2010
maiores bancos dos Estados Unidos foi de 9,9%. Fonte: Banco Central

O “custo Brasil”
O faturamento das 500 maiores empresas no Brasil O governo está agradando os patrões que reclamam do “Custo Brasil”, se referindo a salários e encargos
Confirmando a frase de Lula, o faturamento e os lucros das 500 maiores empresas instaladas no país nun- sociais, que seriam muito altos aqui. É até uma piada.
ca foram tão grandes. Veja no gráfico abaixo, com informações da Maiores e Melhores 2012, da revista Exame. Vejam abaixo um comparativo dos salários pagos na indústria por país:

Vendas líquidas, em R$ trilhão 2,0 Salário pago por hora na indústria


1,9 RESUMO Em dólares por hora - dezembro 2012
1,8 1,8
1,7 1,7 Nestes 11 anos de 25,80
1,6 governo do PT,
23,32
1,5 21,06
as 500 maiores 18,32
1,4 empresas
faturaram
8,68
R$ 15,4 5,41
trilhões 1,41
2003 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 Alemanha EUA França Japão Argentina Brasil Filipinas
Elaboração: ILAESE
21 Levantamento da Consultoria canadense RBC Wealth Management e Capgemini Fonte: Organização Internacional do Trabalho (OIT)
22 Jornal Folha de S. Paulo - domingo, 14 de outubro de 2007

44 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 45
Capítulo 7
8 PRIVATIZAÇÕES

Esta informação da OIT des- Produtividade na indústria de transformação


monta o argumento patronal da
produtividade baixa do traba­ Produção Emprego Produtividade O modo petista de privatizar
lhador brasileiro. As estatísticas
380 Em 2006, durante a campanha eleitoral para presidente, uma propaganda da campanha de Lula chamou
da produtividade do trabalhador
muita atenção. Depois de mostrar as diversas empresas privatizadas por FHC e por Alckmin, como governador
brasileiro podem ser atestadas 330
de SP, a propaganda prometia que votar em Lula seria proteger a Petrobrás e outras estatais e terminava com o
pela CNI e IBGE entre 1970 e
280
seguinte slogan: “É Lula de novo para eles não privatizarem mais nenhuma empresa do povo”.
2010, como demonstra o gráfico A propaganda chamava atenção porque, ao mesmo tempo em que criticava claramente a política de pri-
ao lado. Em 40 anos, a produção 230 vatizações do PSDB e se apoiava em pesquisas de opinião que mostravam que setores amplos da base eleitoral
de riquezas cresceu quase qua- de Lula não viam com bons olhos as privatizações, na prática seguia exatamente a mesma política, aquela que
180
tro vezes, a produtividade cres- é a espinha dorsal dos governos neoliberais em todo mundo.
ceu quase três vezes enquanto o 130 No entanto, ao falarmos que seguia a mesma política, não quer dizer que o PT fazia da mesma forma. Como
emprego praticamente se man- quase tudo nos governos de Lula e Dilma, as bases da política neoliberal assumiram formas muito particulares.
80
teve estagnado. Em geral, associamos inicialmente a privatização à venda de empresas estatais. De fato, esta foi a forma mais
No setor automobilístico a 1970 1980 1990 2000 2010
comum de privatização nos governos Collor, Itamar e FHC, com a venda das estatais por meio de leilões em bol-
produtividade é altíssima como Produtividade do Trabalho na indústria brasileira -Elaboração: Renato da Fonseca (Salvador, sas de valores. À exceção dos leilões de campos de petróleo, essa forma “tradicional” de privatização – que, em
pode se ver na tabela abaixo: 03/05/2013), com base em dados do IBGE e da CNI.
geral, produz mais desgaste político – praticamente não foi utilizada nos governos petistas da esfera federal.
Em seu lugar, ocupou um papel central as concessões via Parcerias Público-Privadas (PPP’s), os incentivos
fiscais e as terceirizações, marcando o jeito petista de privatizar. Junto com os leilões, estas quatro modalidades
Produção Trabalhadores Veículo por Faturamento Faturamento por
ANO se constituíram como o eixo do processo de privatização no país.
(Unidades) trabalhador líquido (dólar) trabalhador (dólar)

1980 1.048.692 133.683 7,8 28.438.000.000 R$ 212.727,12

1990 847.838 117.396 7,2 23.787.000.000 R$ 202.621,90


O processo de privatização no Brasil
A política de privatizações no Brasil, como algo
2000 1.596.882 89.134 17,9 43.503.000.000 R$ 488.062,92 sistemático e centralizado pelo governo federal,
2010 3.408.633 119.392 28,5 83.586.000.000 R$ 700.097,16 começa em 1990 com o governo Collor, continua nos
governos Itamar e FHC e se mantém nos governos
Variação 225% -11% 265% 194% 229% Lula e Dilma. Estamos completando, portanto, mais
de 20 anos de um processo que atingiu praticamente
Fonte: Anuário Estatístico da ANFAVEA 2011 – Elaboração ILAESE
todas as áreas: infraestrutura, setores estratégicos,
sistema financeiro e serviços sociais.
Em 1980, 133 mil metalúrgicos produziam 1 mi­ de graça para os donos da multinacional.
lhão de veículos por ano. 30 anos depois, em 2010, A patronal está em plena campanha para redu­
Collor e Itamar: Os primeiros leilões
120 mil metalúrgicos produziram 3 milhões de veícu- zir os salários dos trabalhadores brasileiros, que se­
Os leilões de grandes empresas inauguraram o
los! Cada trabalhador passou de produzir 7 veículos gundo eles estão “ganhando muito” e arruinando a
Programa Nacional de Desestatização (PND), inicia­
por ano para 28 veículos em 2010. Diminuíram os indústria. As propostas da patronal são basicamente
do em 1990.
trabalhadores no setor, mas o faturamento quase tri­ duas: diminuir o custo da mão de obra (aumentan-
No breve governo Collor, 18 empresas foram ven-
plicou. Isto significa que aumentou a produtividade do a exploração da classe trabalhadora, demitindo o
didas, dentro de 68 previstas. Entre estas, a Usiminas
e a exploração do operário pela patronal. Produziu ‘excedente’) e a diminuição dos impostos.
foi a primeira e uma das mais relevantes, pois era
quatro vezes mais com menos trabalhadores! O governo prontamente está desonerando os
uma das estatais mais lucrativas.
Por isso, o trabalhador brasileiro é altamente custos da produção, sem colocar nenhuma contra-
Em seguida, no governo Itamar, foi concluíuda
produtivo: por exemplo, cada operário da General partida: a patronal recebe o “incentivo” e aumenta
a privatização do setor siderúrgico, com a venda da
Motors no Brasil rendeu, em 2011, mais de R$ 1 mi­ os preços, como fez com a cesta básica alimentar
CSN. Empresas de ponta, com liderança em desen-
lhão, enquanto custou para a empresa R$ 100 mil, Nenhuma das duas medidas resolve a crise da
volvimento tecnológico, foram incluídas, como a Em-
contando com salários, encargos e tudo o mais. Isto indústria brasileira (que está sendo lesada pelas im-
braer. Ao todo, mais 15 empresas foram privatizadas.
significa que em dois dias de trabalho o operário da portações das multinacionais) e sua desnacionali-
Anúncio do governo em 1990 comparava estatais a um elefante
GM pagou seu salário mensal e 18 dias ele trabalha zação.

46 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 47
Capítulo 8 PRIVATIZAÇÕES

As privatizações As PPPs (Parcerias Público-Privadas)


nos governos Em contratos sem risco, o lucro da empresa “vencedora” é garantido pelo Estado
Lula e Dilma Como se vê, praticamente todas as formas pos- em nível federal, principalmente em obras de in-
síveis têm sido usadas pelos governos do PT no pro- fraestrutura. Esta é a maneira que tem ocorrido a pri-
Não faltou criatividade para cesso de privatização. De todos estes mecanismos, as vatização de portos, estradas, ferrovias e aeroportos.
o PT na hora de privatizar, tanto PPPs foram constituídas inicialmente no governo do Em 2010, as PPPs somavam recursos superiores
em termos de setores atingidos PT e tem sido a forma mais comum de tocar as obras a R$ 100 bilhões. Os maiores investimentos iniciados
quanto em relação a modalidades, dos PACs (Programas de Aceleração do Crescimento). e planejados são as Hidrelétricas de Santo Antônio
seguindo experiências de outros A experiência das PPPs foi trazida da Inglaterra, e de Jirau (orçamento, respectivamente, R$ 13,5 bi­
países, como Chile e Inglaterra. país pioneiro no processo de privatização. São medidas lhões e R$ 9,3 bilhões), a Hidrelétrica de Belo Monte
Numa lista inicial, podemos iden- ainda mais vantajosas para o grande capital, porque se (R$ 19 bilhões), Trem Bala (R$ 34 bilhões), Plataformas
FHC: grandes leilões e início das concessões tificar os setores mais atingidos: constituem em um capitalismo sem riscos, ou seja, o de Petróleo (R$ 12,6 bilhões), Usina Nuclear Angra 3
No governo FHC, a política de privatizações ganha agressividade lucro da empresa “vencedora” é garantido pelo Estado (R$ 8,5 bilhões), Ferrovia Norte-Sul, BR-101 (trechos
muito maior: pela abrangência, por incluir concessões de serviços e • Leilão de poços de petróleo; em contrato. Nor­deste e Sul), Porto de Santos (R$ 6,5 bilhões), Gaso­
por tratar com muita truculência os protestos contra as privatizações. • Construção de obras de infraes- Nas PPPs, o governo “encomenda” dutos, Ferrovia Nova Transnordesti-
É no governo de FHC que são privatizadas a Vale do Rio Doce, trutura por meio de PPPs, princi- para uma empresa a construção de Em 2010, as na, Ferrovia Leste-Oeste, Transposição
a RFFSA (transporte ferroviário), o setor elétrico, o de telecomuni- palmente portos e hidrelétricas. uma obra e/ou concede sua gestão por PPPs somavam do São Francisco e o Complexo Petro-
um período de 5 a 35 anos. A empresa
cações e diversas outras empresas, superando a marca de 70 compa­ • Concessão de cerca de 20.000 recursos superiores químico da Petrobrás do Rio de Janei-
nhias. Com apoio do governo federal, empresas estaduais também construtora ou gestora receberá uma ro (R$ 19,2 bilhões), além da privati-
km de estradas federais;
compensação do governo por dois mei-
a R$ 100 bilhões. zação dos aeroportos.
são privatizadas, inclusive bancos e caixas.
• Renovação das concessões os: através de valor fixo pago ao longo Todas estas obras estão sendo fei­
Também no governo FHC, tem início uma nova modalidade de pri-
do setor elétrico; de um determinado período e, além disso, quando for tas por meio de PPPs. O mais absurdo desta lógica é
vatização: as concessões. Todo o sistema elétrico, de telecomunicações
e transporte ferroviário se deu por esta modalidade. Em tese, as empre- • Novas concessões na área de possível, a empresa também recebe o direito de ex- que, nos contratos, está estimada determinada de-
sas seriam fiscalizadas por agências reguladoras, para verificar o cum- telecomunicações, principal- ploração do espaço com cobrança de tarifas. manda e, consequentemente, um determinado fatu-
primento de metas definidas em contrato. Na prática, as agências pra­ mente de telefonia móvel; No primeiro caso, simplesmente é evidente o ab- ramento anual da empresa com o direito da concessão.
ticamente se tornaram porta-vozes das próprias empresas, com ações • Manutenção das concessões no surdo desta forma, uma vez que o custo da obra é ex- Se a demanda não for atingida, o Estado é obrigado a
midiáticas que não tem pressionado efetivamente para melhoria dos transporte ferroviário e política clusivamente assumido pelo Estado. Em âmbito es- cobrir a diferença, garantindo faturamento pratica-
serviços e redução das tarifas. de “descentralização” da CBTU. tadual, diversos hospitais estão sendo construídos mente integral, mesmo sem uso do serviço ou obra.
Os leilões da Vale do Rio Doce e do sistema Telebrás foram motivo • Privatização de Aeroportos; seguindo esta modalidade. Como se não bastasse, o governo do PT criou um
para diversas manifestações de rua, nas quais ocorreram literalmente No segundo caso, a compensação se dá também Fundo Garantidor, para que o grande capital não te­
• Transferência da gestão da
batalhas campais em frente à Bolsa de Valores do Rio de Janeiro, fruto mediante cobrança de tarifa e tem sido mais usado nha dúvida de que tais pagamentos serão efetivados.
saúde para empresas privadas
da resistência dos movimentos sociais e de partidos políticos. O PT era por meio das OSCIPs (Organi-

Divulgação
então um dos principais partidos contrários às privatizações. zações da Sociedade Civil de
O que caracterizou as privatizações no Brasil é que, devido ao por- Interesse Público);
te das empresas leiloadas, elas se tornaram um novo espaço de inves-
• Criação de previdência comple-
timento para o grande capital, principalmente instituições financeiras
mentar para o serviço público;
internacionais que se associaram a bancos ou grupos nacionais, crian­
do monopólios privados. • Financiamento de instituições
Atualmente, a maior parte das empresas privatizadas é controlada privadas de ensino superior por
por grandes grupos financeiros internacionais com participação inclu- meio de crédito educativo ou
sive de fundos de pensão nacionais, como o do Previ, do Banco do Brasil. isenção fiscal (FIES e PROUNI);
No âmbito sindical, vale lembrar que as privatizações também • Venda de participação
dividiram as centrais sindicais em dois grandes campos, tendo a CUT em bancos estaduais;
como pivô das lutas contra as privatizações e a Força Sindical no lado • Projeto de transformar os
oposto. Correios em sociedade anônima.
Construção do Complexo Petroquímico do Rio de Janeiro (Comperj), em Itaboraí. Operários da obra recebem baixos salários e comida estragada.

48 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 49
Capítulo 8 PRIVATIZAÇÕES

Leilão de Poços de Petróleo Governo Lula continuou com privatização


das ferrovias e rodovias iniciada por FHC
Dos 5,4 bilhões que serão gastos com a ferrovia Transnordestina, apenas 13% será investido
pela concessionária, a CSN. Maior parte do dinheiro virá do BNDES.

As concessionárias ferroviárias privadas desres­ A CPI propôs também que o Governo Federal re-
peitam os termos das concessões e o governo não assume o transporte ferroviário no Estado, em parce-
retoma o controle das ferrovias. Já é um verdadeiro ria com o governo estadual.
escândalo, no qual até a Polícia Federal instaurou um Segundo a CPI, a ALL descumpre cláusulas do
inquérito policial por venda de sucata da RFFSA pela contrato de concessão ao desativar ramais, erradicar
ALL, maior operadora privada das ferrovias privati- pátios, fechamento de oficinas e venda de locomoti-
zadas. vas da RFFSA.25
Segundo o Ministério Público Federal, dos 28 mil Apesar destas irregularidades da concessão rea­
quilômetros de estradas de ferro entregues pelo Es- li­zadas por esta empresa, em abril de 2009 o BNDES
tado à iniciativa privada, cerca de 16 mil quilômetros financiou R$ 2,15 bi para a ALL tocar seu plano de
foram abandonados unilateralmente pelas conces- investimento no período compreendido entre 2009
sionárias, em ofensa à legislação e aos contratos de e 2012.
Consórcio comemora concessão do Campo de Libra. Na foto: Petrobrás (Brasil), Shell (Inglaterra), Total Elf (França) e empresas CNPC/CNOOC (China)
concessão. Apesar das ferrovias brasileiras serem um negó-
“O prejuízo ao Erário é estimado em mais de R$ 40 cio privado hoje, o grosso do financiamento e das
Após o fim do monopólio do Petróleo pela Petro- Nas 11 rodadas de leilões de 1997 a 2013, tivemos
bilhões. O quadro é de genuína captura, em que o inte­ obras é realizado pelo governo federal, favorecendo
brás no governo FHC, começaram os leilões dos blo- 411 mil km2 concedidos. Equivale a área dos Estados
resse privado predomina sobre o interes­ os negócios privados com dinheiro
cos de petróleo. Esperava-se que no governo Lula os de Alagoas, Ceará, Espirito Santo, Pernambuco, Rio
se público”.24 Dos 28 mil público.
leilões fossem interrompidos e que a Petrobrás, a em- de Janeiro, Rio Grande do Norte e Sergipe.
presa que mais entende de exploração de óleo e gás Ademais, em 22 de outubro de 2013, o governo
Nesta ação, o MPF denuncia que, quilômetros de O exemplo mais claro é o financia-
apesar da ANTT divulgar estatísti-
no Brasil, pudesse retomar um papel de destaque. Dilma realizou o leilão do Campo de Libra, localizado estradas de ferro en­ mento da ferrovia Transnordestina,
cas de produtividade e de redução do que é realizado quase que totalmente
No entanto, os leilões continuaram e no governo no pré-sal, o maior campo de petróleo já descoberto
número de acidentes que superam as
tregues pelo Estado à pelo governo e é de propriedade da
Lula se completou a 10ª rodada, com ampla partici- no Brasil. iniciativa
metas estabelecidas, a realidade é to- CSN, da família Steinbruch, uma das
pação de empresas estrangeiras. Apesar disso, ainda Com reservas recuperáveis de 8 a 12 bilhões de
talmente diversa. privada, cerca de mais ricas do país. Os recursos inves-
nenhuma empresa estrangeira construiu ao menos barris (quantidade igual a de todas as reservas de
uma plataforma, navio ou sonda no Brasil, demons­ petróleo brasileiro nos dias de hoje), em 10 anos será
“Atualmente, o serviço público de 16 mil quilômetros tidos pela Transnordestina Logística
transporte de cargas está sob controle
trando o total desinteresse dos o maior campo produtor do Brasil. foram abandonados (Maranhão, Piauí, Ceará, Rio Grande
grandes conglomerados inter­nacio­ “Através destes Tem valor estimado em R$ 1,5 trilhão.
único e exclusivo da iniciativa privada. do Norte, Paraíba, Pernambuco e
unilateralmente pelas Alagoas) são de fontes nacionais. Do
O modal ferroviário passou a ser um
nais em nacionalizar a produção. leilões, metade das Foi leiloado pelo valor irrisório de ­R$ concessionárias
negócio que funciona exclusivamente total de financiamentos, R$ 2,6 bi­
Em maio de 2013 realizou-se o áreas com potencial 15 bilhões (1% do valor).
para atender interesses econômicos de lhões são oriundos do Fundo de De-
11º  leilão da Agência Nacional de petrolífero, incluindo Com este bolo envenenado, o go­
grandes corporações econômicas, isto senvolvimento do Nordeste (FDNE),
Petróleo,  Gás Natural e Biocom- verno Dilma Rousseff comemorou os
o pré-sal, está em é, para atender o escoamento de seus produtos”, diz a outros R$ 225 milhões do BNDES e R$ 180 milhões,
bustível – ANP. Foram arremata- 60 anos da Petrobras, em 03 de outu-
dos 140 blocos. As estimativas in- mãos particulares bro de 2013.
representação do Ministério Público Federal. do BNB. Houve ainda R$ 823 milhões do Fundo de
Outro abuso de concessionária privada foi iden- Investimentos do Nordeste (Finor) e de R$ 164 mi­
dicam a produção de 10 bilhões – em sua maioria, Os leilões se tornaram um meio
tificada por uma CPI da Assembleia Legislativa de lhões, oriundos da empresa pública Valec. A Compa­
de barris nesta área. A Petrobras multinacionais do de favorecer setores burgueses com
SP, em janeiro de 2011, que sugeriu que o contrato de nhia Siderúrgica Nacional (CSN) aportou R$ 1,35 bi­
arrematou 34 áreas, apenas 7,7% petróleo.” forte vínculo com o governo petista
concessão com a ALL seja extinto, ou seja, que se dê o lhão. Desse total, R$ 675 milhões foram emprestados
do total dos blocos vendidos. As (caso Eike Batista), tornando a ANP
Emanuel Cancella, na apresentação rompimento imediato do contrato de concessão com do BNDES. Isto significa que, de uma obra orçada em
grandes vencedoras foram as mul- muito mais um balcão de negócios do
do livro Uma proposta classista para a ALL sobre a Malha Paulista, sob a figura jurídica da R$ 5,4 bilhões, a CSN entrará com apenas R$ 700 mi­
tinacionais. a reestatização da Petrobras23 que um órgão regulador.
caducidade contratual. lhões (ou 13% do total).

23 Uma proposta classista para a reestatização da Petrobrás. Vários autores. Editora Sundermann. São Paulo. ISBN: 978-85-99156-50-6 24 Nota do Ministério Público Federal, distribuída em 10 de junho de 2011.
25 Fonte: Procuradoria da República no Estado de São Paulo Publicada em:: 25/05/2011

50 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 51
Capítulo 8 PRIVATIZAÇÕES

O governo reconhece que as concessões ao setor das facilitará sua transferência para o setor priva- Privatização e corrupção
privado são cada vez mais lucrativas e mesmo assim do.” Definitivamente, privatização rima com corrup-
propõe repassar verbas públicas para estes setores “A aceleração dos investimentos para permitir ção. O escândalo no Ministério dos Transportes du-
privados. Um documento oficial do governo fe­deral26 que o governo central transfira a operação de proje­ rante o governo Dilma revela que a privatização das
deixa claro sua orientação privatizadora: tos concluídos se aplica a outros setores além das ro­ ferrovias e rodovias não passa de uma grande mara-
dovias. Por exemplo, a aceleração dos cronogramas cutaia onde se repassa dinheiro público para a “inici-
“O setor ferroviário foi privatizado no fim da dé­ de gastos pode facilitar a conclusão de determina- ativa privada” (grandes corporações e construtoras) e
cada de 1990 e, com o boom das exportações, tornou- dos projetos de transporte em massa urbano em al- estas corrompem os funcionários do governo em to-
se cada vez mais lucrativo.” gumas cidades, reduzindo os custos de financiamento dos os escalões.
“O investimento público inicial pode ser um ponto associados aos empréstimos do BID, do BIRD ou dos Curiosamente, um dos argumentos para a pri-
de partida para a maior participação do setor privado bancos de desenvolvimento e garantindo a implemen­ vatização era que nas empresas públicas dominava a
nos projetos de infra-estrutura.” tação do modelo de plena responsabilidade local por corrupção, que encarecia os serviços. Porém, os indí-
“Esse mecanismo, que é uma espécie de PPP, trans­ esses serviços, com o apoio das instituições citadas.” cios de superfaturamento na construção da Ferrovia quilômetros (média de 9%, bem superior à média
fere para o setor privado a decisão quanto à melhor  “O processo de preparação desses projetos para Norte-Sul foram encontrados pelo Tribunal de Con- mundial de 2% das estradas privatizadas).
alocação de recursos. No início, todas as obras serão a transferência de sua operação para o setor privado tas da União (TCU) no pátio da Valec em Araguaí- Nas concessionárias rodoviárias se passa o mes-
custeadas pelo governo, mas a expectativa é que o pode torná-los produtivos e gerar oportunidades ex- na, no Lote 5. A análise do contrato do trecho entre mo que nas ferroviárias: a maior concessionária
setor privado arque com os custos de recuperação das pressivas de emprego em áreas deprimidas.” Babaçulândia e Córrego Galvão, no valor de R$ 295 (Nova Dutra) investiu R$ 730 milhões desde 1996 e
estradas. Além disso, algumas das principais estradas milhões, tocado pela SPA Engenharia, apontou um somente em 2009 faturou R$ 804 milhões e paga so-
já modernizadas (duplicadas) também serão disponi­ Basicamente é o mesmo projeto aplicado pelo sobrepreço de 28,7% no orçamento-base elaborado mente R$ 15 milhões anuais pela concessão.27
bilizadas para concessão.” governo tucano de São Paulo, cujo objetivo é socia­ pela Valec, estatal responsável pela obra. Já se vê que é um negócio muito lucrativo!
“A conclusão oportuna das obras nessas estra- lizar os investimentos e privatizar o lucro. Há um indício generalizado de superfaturamen-
to de obras e favorecimento de grandes empresas pri- A privatização dos aeroportos
vadas (grandes construtoras). Comprovando que este Outro escândalo anunciado: a privatização dos
26 PROJETO PILOTO RELATÓRIO DE PROGRESSO No 1 - Casa Civil da Presidência da República - Ministério da Fazenda -Ministério do Planejamento,
Orçamento e Gestão - Brasília, DF, Brasil - Março de 2005 propinoduto é generalizado, toda a cúpula do Minis- aeroportos do Brasil. O governo Dilma já privatizou
tério dos Transportes caiu. alguns aeroportos, como o de Brasília e de Guaru­

Foto: Matheus Birkuit


lhos/São Paulo, justamente os mais lucrativos. Por
A privatização das rodovias que Dilma privatizará os aeroportos, se a experiência
O governo Lula deu continuidade à privatização da privatização da ferrovia é um desastre? Por que
das rodovias brasileiras via Parcerias Público-Priva- Dilma privatizará os aeroportos se mais de 80% dos
das (PPPs). As rodovias brasileiras têm uma exten- aeroportos no mundo são públicos?
são de 1,6 milhões de quilômetros. Destes, cerca de Por exemplo, nos Estados Unidos, os aeroportos
200 mil são de estradas pavimentadas, dos quais a são 100% públicos. Por que privatizar aeroportos que
iniciativa privada administra pouco mais de 14 mil dão lucro para o governo?

Mais fichas no cassino: privatização da previdência dos servidores federais


Em 2012, o governo Dilma aprovou a criação do FUNPRESP, a previdência complementar dos servi-
dores públicos. Com o FUNPRESP, se estabeleceu para os servidores públicos um limite de aposentadoria
no mesmo nível dos trabalhadores da iniciativa privada.
Após este valor, o governo deixa de recolher os 22% que é sua obrigação legal e passaria a contribuir
com o mesmo valor do trabalhador até a taxa limite de 8,5% do salário.
O FUNPRESP vai funcionar com contas indivi­duais para cada segurado e, quando ele se aposentar,
receberá em parcelas o valor acumulado. Como a contribuição do governo é muito pequena, a tendência é
que a aposentadoria se afaste ainda mais dos valores integrais.
Simulações realizadas pelo próprio governo estimam que um servidor em fim de carreira com ga­nhos
de R$ 8.000 se aposentará com R$ 4.560, apenas 57% do valor da ativa.

27 Dados do Relatório Anual da ANTT de 2009.

52 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 53
Capítulo 8

Privatização da previdência dos servidores federais (continuação)


9 OPRESSÃO * Colaboraram Ana Pagu, Elder Sano “Folha”, Hertz Dias e Marília Macedo.

Fim da aposentadoria especial sentado como autossustentável?


para mulheres e professores
Atualmente, as mulheres têm direito a um
A “solução” será uma redução brutal nas aposen-
tadorias, sem afastar risco de quebra do fundo de
Na gestão petista, aumentou
redutor de 5 anos em relação aos homens, podendo
se aposentar com 30 anos de contribuição e 55 anos
pensão, como ocorreu no Chile e na Argentina, onde
tiveram que ser assumidos pelos governos. a opressão sobre mulheres,
negros e homossexuais
de idade. O mesmo vale para professores do ensi-
no médio e fundamental. Assim, no caso das pro- Exposição aos riscos do mercado
fessoras, estes redutores se somam e elas podem se A gestão do fundo seria feita por uma entidade
aposentar com 25 anos de contribuição e 50 anos privada do setor financeiro (banco ou seguradora),
de idade. Com a aposentaria privada, tudo isso sim- escolhida por meio de leilão.
A empresa vencedora irá cobrar taxas de admi­
As contradições para as mulheres trabalhadoras
plesmente acaba.
nistração (não há limi­te definido para as mesmas O PT foi o catalisador das esperanças de toda uma geração de trabalhadoras que apostaram na possibilidade
de mudar a sociedade. Nas lutas da década de 1980, que culminaram com a derrubada da ditadura, foi num par-
Fim do auxílio-doença no projeto, a Previ, do Banco do Brasil, cobra cer-
tido de trabalhadores que essas mulheres encontraram uma ferramenta para lutar contra o machismo e a ex-
e salário maternidade ca de 4%). Além disso, poderá investir no mercado
financeiro até 40% de todos os recursos do fundo. ploração. Desde seu surgimento, o PT passou por inúmeras transformações e chegou ao governo em 2003 com
Os benefícios sociais, que fazem parte de qual­
No caso de perdas nos investimentos, o se­gurado um perfil bastante distinto. As esperanças que apostavam na mudança aos poucos foram sendo substituídas pela
quer previdência baseada em seguridade social, não
é quem assume o ônus sozinho, não cabendo ao ideia de que Lula e Dilma fizeram o que “era possível”. Em relação às bandeiras para as mulheres não foi diferente.
estão previstos no Projeto de Lei que institui o FUN-
gestor nenhuma penalidade, responsabilização Apesar do grande diferencial do PT em relação aos governos anteriores é ter políticas específicas para
PRESP. Assim, no caso de uma licença por saúde ou
ou coparticipação. Como a aposentadoria privada as mulheres, é preciso dizer que o “governo do possível” não tem colocado as trabalhadoras num patamar de
por maternidade, até agora os servidores só têm ga-
é por Contribuição Definida e não por Benefício igualdade com os homens. Como vimos no capítulo 2, entre os trabalhadores pobres de categorias altamente
rantidos os benefícios dentro do teto pagos pela Pre-
Definido, qualquer oscilação do mercado ao longo precarizadas (agricultura, trabalho doméstico e autônomos), 88% são mulheres e 68% negros(as), atestando
vidência pública. Não considera as aposentadorias
de 30 anos (!) irá reduzir diretamente os ativos do que a pobreza segue sendo de raça negra e com cara de mulher. Essas características mantêm os mesmos
não programadas. O projeto afirma que a aposen-
fundo de pensão. níveis observados nos governos anteriores, do PSDB.
tadoria privada deverá arcar com as pensões por
morte ou aposentadorias por invalidez, mas não
estabelece a fonte de financiamento. Seguramente, Fim da aposentadoria vitalícia Emprego e renda
sairá dos segurados, a partir de taxas adicionais. Como a aposentadoria privada é uma conta Ao contrário do que afirma o PT, a desigualdade Rendimento das assalariadas
O projeto do PT de previdência privada reduz individual, uma vez tendo acabado o dinheiro, de gênero não só não diminuiu como em alguns as- em relação aos homens
as aposentadorias, acaba com a aposentadoria es- acabou a aposentadoria. pectos inclusive aumentou durante seus anos de Regiões metropolitanas e Distrito Federal, em %
pecial para mulheres e professores, acaba com o Em uma simulação da ANFIP, um servidor que governo. Um dos exemplos é a diferença salarial en- 2000 2010
auxílio-doença e salário maternidade e não consi­ recebe um salário de R$ 10.000 e desconta 11% aci- tre homens e mulheres. Belo Horizonte 95,8% 90,5%
dera as aposentadorias não programadas. ma do teto para a previdência privada (mais 7,5% Segundo o DIEESE, entre 2000 e 2010, justamente Distrito Federal 91,1% 92,4%
O governo alega que a previdência pública do do governo) durante 27 anos, só conseguiria uma no período em que o Brasil retomou o crescimento
Porto Alegre 92,3% 87%
servidor é deficitária, mesmo recolhendo 11% do aposentadoria integral durante os 11 primeiros econômico e, supostamente, passou a ter políticas de
Recife 102,3% 103%
trabalhador e 22% da União. anos. Se se aposentar aos 65 anos, a partir dos 77 inclusão para as mulheres, a diferença salarial entre
anos sua renda cairá 63%, pois a aposentaria pública Salvador 97,7% 96%
Como um regime que cobra 33% é acusado de homens e mulheres assalariados aumentou na maio-
deficitário e outro, que cobrará cerca de 17%, é apre- será a única fonte de rendimento até o fim da vida. ria das regiões metropolitanas pesquisadas, con- São Paulo 90% 87,3%
forme tabela ao lado. Fonte: DIEESE Anuário das Mulheres Brasileiras 2011, p. 104
Além disso, as mulheres continuam tendo uma
Um balanço das privatizações taxa de desemprego muito superior aos homens, de mais de 12 meses: 63,2% e 60,6%, respectivamente.
Para justificar as privatizações das estatais, argumentava-se que o Estado não deveria se preocupar em pro- 25 a 40% a depender da região do país, segundo esse Em 1999, quando a taxa de desemprego pela ins­
duzir aço, quando não conseguia sequer acabar com o analfabetismo. Que as empresas estatais eram cabides de mesmo estudo do DIEESE. tituição era perto de 20%, negros e mulheres eram
emprego, por terem monopólio do setor eram pouco eficientes e que a sua venda iria reduzir os gastos públicos. Em 2013 o DIEESE publicou um novo estudo que cerca de metade dos trabalhadores sem emprego há
Por fim, que os recursos arrecadados serviriam para reduzir a dívida pública. revela que o desemprego estrutural afeta particular- mais de um ano. Em 2012, quando a taxa de desocu-
Passados mais de 20 anos, continuamos sendo o país com o maior índice de analfabetismo na América do Sul, mente mulheres e negros. Entre os trabalhadores que pação foi de 10,5%, superavam 60% dos desempre-
o monopólio público foi substituído pelo monopólio privado, houve expansão nos governos do PT de cargos para procuram emprego há menos de um ano, 53,9% são gados de longo prazo.
mulheres e 53,3% negros(as), mas a proporção sobe Isto é, a redução nos índices de desemprego tor-
abrigar indicações políticas (inclusive dentro das Agências Reguladoras), a corrupção é marca tanto do processo
ainda mais entre os que estão desempregados há na ainda mais clara a desigualdade de raça e gênero.
de privatização quanto das concessões e, como vimos, a dívida pública aumentou.

54 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 55
Capítulo 9 OPRESSÃO

Os programas do governo para as mulheres Programa Rede Cegonha

Desde sua posse, Dilma Rousseff foi mudando a configuração de gênero nos ministérios. Outro programa do PT que contribui para refor- prio Ministério da Saúde em sua Norma Técnica de
çar o papel tradicional da mulher na sociedade, des- Atenção Humanizada ao Abortamento (2010) estima
Atualmente, entre as dez secretarias nacionais, quatro são chefiadas por mu­lheres e entre
sa vez como mãe é o Rede Cegonha. Essa política vai em mais de um milhão ao ano o número de abortos
os 25 ministérios, quatro estão sob direção feminina, entre eles o do Planejamento. Essas de encontro a uma proposta de assistência integral à induzidos, dos quais cerca de 200 mil resultam em
mudanças contribuem para a identificação das trabalhadoras com o governo. Dilma aparece saúde da mulher que desde 1984 norteia os progra- internação devido a complicações no procedimento,
como uma figura forte, uma mulher que rompe com o machismo naturalizado na sociedade, mas executados por governos anteriores e incorpo- é a terceira causa de ocupação de leitos nas materni-
tornando-se a maior autoridade institucional do país. Mas se por um lado essa ofensiva raram os novos conceitos de saúde formulados pelo dades brasileiras. Fechar os olhos para esses números
ideológica vem combinada com um conjunto de políticas direcionadas à disputa da con­ movimento feminista durante a década de 1980. é criminoso e qualquer política séria de saúde para as
Um exemplo é o Programa de Assistência Integral mulheres teria de levar isso em consideração, sobretu-
sciência das trabalhadoras, por outro isso não tem nenhuma relação direta com o avanço na
à Saúde da Mulher (PAISM, 1984), elaborado a par- do quando já existem estudos que comprovam queda
luta pelos direitos democráticos das mulheres, ao contrário, a maior parte dos programas do tir das reivindicações dos movimentos de mulheres desses índices em países “onde o aborto já é seguro e
governo para as mulheres reforça o papel tradicional da mulher na sociedade, que englobavam aspectos como direito à sexualidade des­c riminalizado”, segundo mesma Norma Técnica.
responsável pelo cuidado da casa e dos filhos. Vejamos alguns exemplos: e a saúde, à procriação e ao planejamento familiar, A legalização do aborto, que era parte do pro-
descriminalização e legalização do aborto, demo­ grama do PT na década de 1980 e motivo de luta das
cratização da educação para saúde e outras medidas mulheres, foi definitivamente esquecido, aliás, sis-
Programa Bolsa-Família entendidas como parte da esfera da saúde pública, o tematicamente negado. Durante o governo Lula, 10
PAISM significou um avanço sem precedentes em mil mulheres foram indiciadas criminalmente por
Um dos carros-chefes do governo do PT nos últi- relação a programas anteriores focados exclusiva- prática de aborto clandestino.
mos 10 anos, o programa bolsa-família, repassa a mente na saúde materno-infantil e Quanto a presidente Dilma, até o
famílias de baixa renda um valor mensal médio de O PT abandona a
no ciclo gravidez-parto-puerpério. momento nenhuma medida foi toma-
R$ 70,00 por cada filho matriculado na escola. A Passados quase 30 anos da propos-
formulação de uma da para avançar na legalização do abor-
quase totalidade (92%) dos titulares dos cartões do ta que pôs o Brasil na vanguarda em Política Nacional de do durante seu mandato, ao contrário,
programa são mulheres, pois há um incentivo para termos de atenção à saúde da mulher, Assistência Integral o posicionamento que mantém desde a
que elas sejam as beneficiárias.
Não negamos a importância das mulheres as-
o PT retrocede no tempo e abandona à Saúde da Mulher campanha eleitoral, expresso na Carta
a formulação de uma Política Nacio­ ao Povo de Deus, vai justamente no sen-
sumirem o papel de receber e controlar a renda, para dar lugar a um
nal de Assistência Integral à Saúde tido contrário. Até agora, por exemplo,
muito pelo contrário. O problema é que o argumento da Mulher para dar lugar a um pro- programa voltado Dilma não se manifestou em relação
principal do governo para isso se apoia na ideologia grama voltado exclusivamente para a exclusivamente para ao Estatuto do Nascituro, cujo Proje-
dominante de que as mulheres têm maiores respon- saúde materna. a saúde materna to de Lei tramita na Câmara e acaba
sabilidades em relação à família do que os homens O Programa Rede Cegonha foi com qualquer possibilidade da mulher
e reforça a obrigação de cuidar dos filhos, garantir uma das principais bandeiras de campanha da presi­ poder recorrer ao aborto legalizado no país, mesmo
a frequência escolar e que estejam em condições de dente Dilma. Lançado em março de 2011, tem por ob- em casos de gravidez fruto de violência sexual, cuja
saúde para ir às aulas, reafirmando o machismo natu­ jetivo reduzir a mortalidade materna no país, cujos conquista foi obtida ainda na década de 1940.
ralizado na sociedade, colocando sobre seus ombros a índices são de 64 para cada 100 mil parturientes, mui- Além disso, o Rede Cegonha é um claro retro­
responsabilidade pelo cuidado da casa e dos filhos, e to superiores ao preconizado pela Organização Mun- cesso à Política Nacional de Assistência Integral à
ainda por cima, com um valor mensal muito aquém mais de 40 vezes mais.
dial de Saúde que é de 35 para cada 100 mil e 5 vezes Saúde da Mulher (PNAISM, 2004), atualização PA-
das necessidades de qualquer criança. Além disso, em 2012, somente com a redução do
mais alto do que o dos países ricos. As mulheres são ISM, cujos conceitos de saúde se baseiam nos princí-
Por outro lado, os próprios gastos do governo com IPI de carros e eletrodomésticos da linha branca o
hoje, 75% dos usuários do SUS e a mortalidade mater- pios do direito à saúde, equidade de gênero e da
o bolsa-família são irrisórios. Basta comparar o que o governo Dilma renunciou a R$ 7,1 bilhões. Para se
na é uma das maiores razões de morte entre elas. integralidade da assistência garantido através da
governo investiu no programa com os gastos no pa­ ter uma ideia do quanto isso representa em relação
Entretanto nem a portaria nº 1.459, que forma­ aten­ção qualificada em todas as fases, ciclos e situa­
gamento de juros e serviços da dívida pública para ao bolsa-família, a ampliação do programa anun­
lizou a Rede Cegonha, nem a MP 557/11, que tornava ções de vida da mulher.
ver que o bolsa-família não passa de uma política ciado em fevereiro trará um custo anual adicional
obrigatório o cadastro das gestantes no Sisprenatal e O próprio argumento do governo para implemen-
“para inglês ver”. de R$ 928,4 milhões aos cofre públicos.
que caiu após inúmeras manifestações contrárias por tar o programa é questionável, há inúmeras evidências
Entre 2011 e 2012, por exemplo, enquanto o go­ Isto é, o que o governo deixou de arrecadar em
parte dos movimentos feministas, contém referên- de que as condições de vida prévias ao período gesta-
verno destinou R$ 35 bilhões para o bolsa-família, os 2012 daria pra ampliar em mais de sete vezes os gas-
cia à questão do aborto, considerada a quarta princi- cional interferem no curso dessa e na sua conclusão,
gastos com a dívida foram de R$ 1,461 trilhão, ou seja, tos com o bolsa-família.
pal causa de morte entre gestantes no Brasil. O pró­ incluindo aí recorrer ou não à prática do aborto.

56 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 57
Capítulo 9 OPRESSÃO

Razão da mortalidade materna (RMN) Política de creches


De 1990 à 2011, mortes a cada 100 mil mulheres No quesito educação as políticas do PT tampou- aumentando sua promessa de campanha. Vale lem-
co avançaram no sentido de garantir condições me­ brar que o modelo inicialmente criado para acelerar
160
143 46,8% lhores para as mães trabalhadoras. Ao manter o veto as obras da copa foi questionado no Supremo Tribu-
foi a redução
140 de 1990 a 2001 sobre o aumento do percentual do PIB investidos na nal Federal, por dificultar a fiscalização do dinheiro
educação, o PT comprometeu diretamente a oferta público. Uma das polêmicas do RDC é o sigilo de or-
120 15,9% de vagas na educação infantil. A ausência de política çamento, que só pode ser divulgado no final da li­
foi a redução
100 de 2001 a 2011 para construção de creches impede que 8 em cada 10 citação e por isso não teria transparência, segundo a
76 crianças no Brasil tenham acesso à Educação Infan- Procuradoria Geral da República que critica ainda a
80
35 mortes por 100 mil
* 63,9
til e uma parte significativa das mulheres não podem transferência da responsabilidade sobre os projetos
60
é a taxa preconizada
pela OMS trabalhar porque não tem onde deixar os filhos. básicos das obras ao setor privado, quando no regime
40 A situação é tão alarmante que o DIEESE, em 2010, comum são os governos que elaboram as linhas ge­
avaliou que a ausência de local para as mães deixa­ rais da obra. Mas mesmo isso não foi implementado,
20
rem seus filhos era o principal motivo para que uma de concreto mesmo só o que o governo liberou para
0 mulher não conseguisse trabalho ou permanecesse o financiamento da construção das creches. Dilma
1990

1991

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

2011
em um emprego. Há 10 anos, a meta do governo era firmou o compromisso de investir R$ 7,6 bilhões do
construir 12 mil unidades, mas essa foi abandonada e PAC para construir as 6 mil creches prometidas, no
FONTE: Ministério da Saúde. (*) Alta em 2009 foi provocada pelo H1N1.
reduzida para 6 mil no início do governo Dilma. Lula entanto, dados do SIAFI apontam que até julho de
Razão da mortalidade materna (RMN) prometeu construir 4.035 creches até o final de seu 2013 foram liberados apenas R$ 1,48 bilhão, ou seja,
De 1990
Poràoutro
2011,lado,
mortes a cada
as taxas 100 mil mulheres
de mortalidade materna Brasil é verificada nas regiões mais carentes, entre as segundo mandato, mas entregou apenas 221. apenas 30% dos R$ 4,75 bilhão que o governo deveria
Mortalidade materna por cor/raça Quanto ao compromisso assumido pela presi- ter executado para de fato cumprir sua meta.
vêm decrescendo nos últimos 20 anos a uma média mulheres pobres e de baixa escolaridade, sendo que
160
143
de 4% ao ano, sendo que as maiores 46,8%quedas foram na as principais vítimas são as mulheres negras. O caso dente Dilma de entregar 1.500 creches ao ano, em ou- Durante a marcha de prefeitos realizada no dia
foi a redução 2000 2007que entre 2000 e 2007, a mortalidade tubro de 2013, quase 3 anos depois do início de seu 10 de julho de 2013, em Brasília, a presidente Dilma
140 década de 1990. Aliás, o ritmo de
de 1990 a 2001redução na mor- é tão gritante
talidade materna foi medíocre durante o governo do materna entre as negras aumentou 30,4% em mais de 30%,
foi o AUMENTO
mandato, pode-se dizer que somente algumas poucas mais uma vez prometeu, dessa vez para cerca de qua-
120
PT. Para se ter uma ideia, entre 1990 e 2000, o Brasilheres n egras uma diminuição
contra 939 15,9%
de 19%da mortalidade
entre materna
as brancas. centenas saíram do papel (612, segundo a própria Dil- tro mil prefeitos presentes, investir R$ 3,2 bilhões na
re­gistrou redução de 46,8% nessas taxas, entretanto Mu l Os dois grandes problemas
entre as mulheres negras
foi a redução
que hoje o Brasil en- ma em seu programa Café com a Presidenta). Não foi construção de 2 mil creches, não deixando claro, en-
100 de 2001 a 2011
720 por falta de recursos, e sim de prioridades, ao longo tretanto, se tratava-se ou não de um acréscimo às 6
esse avanço foi contido entre 2001 e 2011. Sendo que, 76 para a redução da mortalidade materna são a
frenta
80
nos últimos anos, apor redução 647 10%.
100 mil não alcançou 19,0% 63,9 desses 10 anos o PT seguiu gastando metade do orça- mil creches prometidas durante sua campanha.
35 mortes
Mulheres baixa qualidade do atendimento, incluindo
foi aaí o setor
REDUÇÃO
60
é a taxa preconizada
Com isso o Brasil ocupa a 79º posição no ranking b r a n 524 da mortalidade
cas e a condição clandestina do abortamento
privado, materna mento nacional com o pagamento da dívida pública. Não foi a primeira vez que isso ocorreu, em maio
pela OMS entre as mulheres brancas
da mortalidade materna e deixará de cumprir uma que expõe ao risco a vida das mulheres. Nesse sen- Em abril de 2013 o governo federal anunciou que de 2012 durante o lançamento do Programa Bra­sil
40
das chamadas “metas do milênio” paraDIEESE
a saúde públi- tidoBrasileiras
a consolidação do SUS comoIlaese
um sistema único de poderia recorrer à modalidade de Regime Diferen­ Carinhoso, versão requentada do programa Bolsa
FONTE: Anuário das Mulheres 2011 (p. 217). Elaboração:
20 ca, porque o PT não foi capaz nem de aplicar de forma saúde, público, gratuito e de qualidade, é fundamen- ciado de Contratação (RDC) para acelerar a con- Família, a presidente prometeu construir 1.500 no-
consequente uma política de saúde para as mulheres. tal para a redução da mortalidade materna e que mais strução de creches e assim garantir a entrega de 8.685 vas creches, sem tampouco esclarecer se isso signifi-
0
E como a falta de políticas públicas afeta de for- do que nunca a discussão de aborto seguro, o que in- unidades até o fim de 2014, cumprindo e inclusive caria uma efetiva ampliação nos investimentos.
1990

1991

1992

1993

1994

1995

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

2004

2005

2006

2007

2008

2009

2010

ma mais cruel as mulheres pobres e negras, é evi- clui a descriminalização e legalização do aborto, além 2011

dente
FONTE: que da
Ministério a maior incidência
Saúde. (*) Alta em 2009defoi mortes
provocadamaternas
pelo H1N1. no da sua garantia pelo SUS, está na pauta do dia.
Novo custo-aluno é menor do que o estabelecido pelo Fundeb
Em 31 de dezembro de 2010, o Tipo de Valor estabelecido Valor estabelecido variação
unidade pelo Fundeb para novas unidades
Mortalidade materna por cor/raça governo federal estabeleceu o novo
custo mínimo por aluno para financiar Creche em
R$ 2.066,46 R$ 1.682,97 -18,5%
tempo integral
cada etapa da edu­cação brasileira.
2000 2007 Creche em
Mas o valor que o MEC destinou às R$ 1.377,64 R$ 1.223,98 -11,1%
s 30,4% foi o AUMENTO novas creches, inauguradas depois
tempo parcial

eres negra 939 da mortalidade materna


Pré-escola em
do envio de dados do censo escolar,
Mu l h entre as mulheres negras
tempo integral
R$ 2.238,66 R$1.1912,46 -14,6%
em 2011, foi menor que a quantia que
720
o próprio governo estabeleceu como Pré-escola em
647 R$ 1.722,05 R$ 1.529,97 -11,1%
Mulheres 19,0% foi a REDUÇÃO mínimo, conforme a tabela ao lado: tempo parcial
b ra n c a s 524 da mortalidade materna
entre as mulheres brancas
58 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 59
FONTE: DIEESE Anuário das Mulheres Brasileiras 2011 (p. 217). Elaboração: Ilaese
Capítulo 9 OPRESSÃO

Brasil Carinhoso A violência contra a mulher Um estupro a cada 10 segundos


O Programa Brasil Carinho- Os casos de estupro também aumentaram, se­ vel, um enorme número de casos de violência nunca
Por fim, quanto às políticas de enfrentamento à violência
so trata-se de um complemento gundo o 7º Anuário do Fórum Nacional de Segurança chega à luz pública.
contra a mulher tampouco foi priorizado durante os anos de
finan­ceiro para famílias com pelo Pública, em 2012 foram registrados 50,6 mil estupros, Aliás, conhecer a situação da violência contra a
governo do PT, mas ao contrário de acordo com o relatório Mapa
menos um fi­lho de até 15 anos que um aumento de mais de 230% em relação a 2006 mulher no Brasil é uma tarefa difícil, pois esbarra na
da Violência 2012 divulgado pelo Instituto Sangari28, das 91 mil
mesmo recebendo o Bolsa-famí­ quando o número de registros foi de 15,3 mil. falta de dados estatísticos. Não existe um sistema na-
mulheres assassinadas no país entre 1980 e 2010, quase metade
lia viviam com renda mensal infe­ É um estupro a cada 10 segundos no Brasil. cional de informações e, como as delegacias são vin-
(43,5 mil) ocorreram na última década. O número de mortes ao
rior a R$ 70 por pessoa, isto é, na Além disso, o Sistema de Infor- culadas às secretarias estaduais de
ano aumentou 217,6% em 30 anos, conforme mostra o gráfico.
extrema-pobreza. Além disso, pre­ mação de Agravos de Notificação segurança, cada uma coleta e sis-
vê o reforço de políticas ligadas à Evolução da taxa de homícidios femininos (SINAN) do Ministério da Saúde Um estupro a tematiza as informações com me-
saúde e educação. A cada 100 mil mulheres 4,6 regis­
trou em 2012, 103.794 notifi- cada 10 segundos todologias e periodicidades difer-
Na área da saúde envolve a dis- 5,0 (1996) 4,4 cações de atendimentos a mulheres Aumento dos casos entes, impossibilitando assim, por
(2010*)
tribuição de doses de vitamina A por violência. Isso equivale a 65,9% exemplo, mapear nas pesquisas
para crianças de 6 meses a 5 anos de todas as notificações envolvendo dados como raça, cor, idade ou ori-
50,6 mil
de idade nas Unidades Básicas de Violência Doméstica, Sexual e/ou entação sexual das vítimas, que na
Saúde e aumento da oferta de sulfa- outras Violências em instituições de maioria dos casos não são coletados.
to ferroso pela rede de atenção bási- saúde. Entretanto há que se consi­ O próprio governo admite essa
3,5
3,9
ca; distribuição gratuita de medica- (2007) derar que os dados registrados pelo 15,3 mil lacuna. Segundo a ministra-chefe
mentos para asma nas unidades do 2,3 SINAN representam apenas a ponta da Secretaria de Políticas para as
“Aqui tem Farmácia Popu­lar” e re- (1980) do iceberg já que se referem somente Mulheres, Eleonora Menicucci,
forço das campanhas de vacinação. as que demandam atendimento do 2006 2012 o Ligue 180 é a única fonte de da-
Na área de educação prevê o es- 2,0
SUS e que declaram abertamente o Fonte: 7º Anuário do Fórum Nacional dos que o governo possui, embora o
tímulo financeiro para municípios e 1980 1985 1990 1995 2000 2005 2010 agressor. Por baixo dessa ponta visí­ de Segurança Pública. serviço ainda seja precário.
o DF com o objetivo de incentivar a Fonte: SIM / SVS / MS * Dados preliminares de 2010

oferta de vagas na Educação Infan-


til para crianças de 0 a 4 anos, espe- E, assim como no caso da mortalidade materna, também há o A rede de enfrentamento à violência contra a Mulher em todo o País
cialmente para beneficiárias do Bol- componente racial na violência contra as mulheres. Desde 2003,
sa-família. Como se pode ver, é mais o número de homicídios de mulheres brancas vem caindo en- Em 2006, após muita luta Tipo de Instituição quantidade
do mesmo. quanto que o de negras aumentou. Em 2008 a taxa de homicídios dos movimentos de mulheres, foi
Centros de Referência/Núcleos Integrados de Atendimento 226
Vale destacar que apesar de entre as mulheres negras foi 45% maior do que entre as brancas, promulgada no Brasil a Lei Ma-
à Mulher: atenção social, psicológica e orientação jurídica
uma das principais diretrizes políti- sugerindo que a aplicação de políticas públicas para acabar com a ria da Penha. Entretanto, devido
Serviço de Saúde Especializado para o Atendimento 249
cas do Brasil Carinhoso ser a cria­ violência se dá de forma diferente segundo a cor/raça da mulher. a inúmeras falhas em sua imple-
dos Casos de Violência contra a Mulher
ção de vagas em creches, dos cem mentação, a lei tem se mostrado
municípios brasileiros onde mais de
Total de homícidios de mulheres por raça limitada para combater a violên- Casas Abrigo/ Outros Serviços de Abrigamento 77
Mulheres negras Mulheres brancas
70% das famílias dependem do pro- 2.253 Variação cia contra as mulheres. Um dos Delegacias Especializadas/Postos/ Núcleo/Seções 497
homicídios
grandes problemas é a falta de es- de Atendimento à Mulher em Delegacias Comuns
grama, 56 não têm creche pública 2.130 entre negras
2.046 100
para atender crianças de 0 a 3 anos. 1.978 +20.86% trutura. Para se ter uma ideia, se­ Juizados Especializados e Varas adaptadas
Ou seja, 56 municípios que hoje 1.864 1.847 gundo dados da própria Secretaria Defensorias Especializadas 43
tem o Brasil Carinhoso não pos- de Política para as Mulheres, ape-
Variação
Promotorias/Núcleos de Gênero no Ministério Público 53
suem creche. A resultante disso é 1.544 sar de possuir mais de 5.500 mu-
1.747 homicídios
Serviços de Responsabilização e Educação do Agressor 15
1.684 entre brancas nicípios, o Brasil possui apenas a
que menos de 15% das crianças até 1.615 1.610
-11.61%
3 anos atendidas pelo Bolsa-família 1.486 estrutura ao lado: Fonte: Secretaria de Política para as Mulheres (SPM). Elaboração: ILAESE. Acesso em 10/01/2014
estão matriculadas na Educação In-
fantil, índices inferiores à própria
Ou seja, menos de 10% dos municípios brasileiros possui delegacias especializadas (DEAM) e pouco mais
média nacional. 2003 2004 2005 2006 2007 2008
de 1% conta com casas abrigo. Mas mesmo estes números são imprecisos, pois como não existe um sistema
Fonte: SIM / SVS / MS Elaboração: Julio Jacobo Waiselfisz e CFEMEA
nacional de informações sobre a violência contra mulheres alimentado periodicamente com informações dos
28 WAISELFISZ, Julio Jacobo. Mapa da Violência 2012. Os novos padrões da violência homicida no Brasil. Caderno Complementar 1: Homicídios de estados e municípios, afirmar com certeza o número exato dos serviços da rede é praticamente impossível.
Mulheres no Brasil. São Paulo, Instituto Sangari, 2012.
60 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 61
Capítulo 9 OPRESSÃO

Outro problema é a Unidades


Unidades
da Federação
da Federação Unidades
Unidades
da Federação
da Federação Evolução da rede de enfrentamento à violência
distribuição desigual dos queque
possuem
possuem
Centros
Centros
de de queque
mantêm
mantêm
casas-
casas- Tipo de serviço Em Em variação média tempo necessário para
serviços e a concentração Referência
Referência
à mulher
à mulher abrigo
abrigo
parapara
as mulheres
as mulheres especializado 2008 2013 2008-2013 /ano atingir 100% das cidades*
em algumas regiões ou
Com centros
Com centros
de referência
de referência UFs que
UFsmantêm
que mantêm
casas-abrigo
casas-abrigo
centros urbanos. Segundo Sem centros
Sem centros
de referência
de referência UFs que
UFsnão
quemantêm casas-abrigo
não mantêm casas-abrigo Centros de Referência 112 226 + 114 + 19 281 anos
levantamento do IBGE,
somente 12 estados e o
Casas Abrigo 66 77 + 11 +2 2.746 anos
Distrito Federal possuem DEAMs/PAMs 404 497 + 93 + 15 338 anos
centros de referência ao Juizados Especiais/Varas adaptadas 70 100 + 30 +5 1.094 anos
aten­dimento exclusivo a
mulheres em si­tuação de Defensorias Especializadas/Promotorias/ 15** 96 + 81 + 13 422 anos
Núcleos de gênero do MP
violência e apenas 15 in-
formaram a existência de 13 13 14 14 15 15 12 12 Fontes: II PNPM (pg. 99) e Portal SPM. Elaboração: ILAESE
* Considerou-se um serviço por município e o ritmo de crescimento dos últimos 6 anos. ** Refere-se apenas ao número de Defensorias Especializadas
casas-abrigo mantida uni-
camente pelo estado para 48,14%
48,14% 55,55%
55,55% Além de insuficiente, o atendimento e acolhi­ peito a episódios de mau atendimento ou falta de es-
atendimento exclusivo às mento oferecido em muitos casos são também pre­ trutura para o atendimento especializado à mulher.
mulheres em situação de cários. Especialistas sustentam que como o sistema Por outro lado, somente no Rio Grande do Sul
Acre,Acre,
Amazonas,
Amazonas,
Pará,Pará,
Amapá,
Amapá, Acre,Acre,
Amapá,
Amapá,
Roraima,
Roraima,
Amazonas,
Amazonas,
vio­lência. A maior parte Tocantins,
Tocantins,
Piauí,Piauí,
Ceará,Ceará,
Espírito
Espírito Pará,Pará,
Tocantins,
Tocantins,
Piauí,Piauí,
Ceará,Ceará, não foi institucionalizado, a qualidade do atendi- 20% das mulheres assassinadas possuiam alguma
está concentrada na região Santo,
Santo,
Rio deRio
Janeiro,
de Janeiro,
Paraná,
Paraná,
Rio Rio Espírito
Espírito
Santo,
Santo,
Paraíba,
Paraíba,
Pernam-
Pernam- mento depende das convicções do funcionário que medida judicial de proteção. A falta de estrutura para
Norte do país. Por outro Grande
Grande
do Sul,
doMato
Sul, Mato
Grosso
Grosso
do Sul
do Sul buco,buco,
Bahia,
Bahia,
Rio deRioJaneiro,
de Janeiro,
MatoMato acolhe a vítima, há inclusive denúncias de casos em garantir as medidas protetivas têm resultado na sua
lado, ne­nhum estado da e Distrito
e Distrito
Federal.
Federal. Grosso
Grosso
do Sul
doe Sul
Distrito
e Distrito
Federal.
Federal.
que policiais assediam mulheres que buscam aju- completa ineficácia.
região Sul informou possuir da. Tanto que nove em cada 10 reclamações feitas à O grande problema para a implementação de
Fonte: IBGE, Pesquisa de Informações Básicas Estaduais – Estadic, Perfil dos Estados Brasileiros 2012 RJ, 2013.
este serviço. Ouvidoria da Secretaria de Políticas Públicas para políticas públicas de enfrentamento à violência tem
as Mulheres da Presidência da República (SPM/PR) sido a falta de recursos. Apesar de todo o discurso, o
Ao contrário do que possa parecer em face da Lei Maria da Penha, a maior proliferação de DEAMs se deu são queixas contra o atendimento da Polícia Militar governo não tem demonstrado vontade política em
de 1992 a 2001, antes do governo do PT, sendo que de 2008 a 2014, isto é, após a elaboração do II Plano Nacio­nal (190), a assistência prestada em Delegacias de Polícia priorizar investimentos nesse sentido. Observe, por
de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, a média de abertura de DEAMs ficou em 15 unidades/ano. tradicionais e Delegacias Especializadas no combate exemplo, o quadro abaixo, retirado do relatório final
à vio­lência contra a mulher. Em geral, dizendo res- da CPMI da violência contra mulheres:
Evolução da quantidade de DEAMs Orçamento eegastos
gastoscom
Orçamento
Orçamento ações
e gastos
com de
deenfrentamento
açõescom ààviolência
ações de enfrentamento
enfrentamento contra
contraaamulher
à violência
violência contra a mulher
mulher
Total de unidades e média de crescimento anual sobre o período anterior Programa
Programa0156 ––Enfrentamento
Programa
0156 da
daViolência
0156 – Enfrentamento
Enfrentamento Violência contra
da as
asMulheres,
Violência
contra contra asentre
Mulheres, 2004
2004eentre
Mulheres,
entre e2011
20112004 e 2011
15 DEAMs 2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011
a mais por ano
13 DEAMs 497 Dotação
a mais por ano 10.760.000 10.135.098 10.116.111 23.309.007 28.833.500 40.909.000 40.270.000 36.916.122
404
20 DEAMs Autorizado 10.527.853 10.135.098 14.115.837 23.545.281 28.833.500 40.909.000 41.250.000 36.916.122
a mais por ano 307 Empenhado 6.069.533 8.914.191 8.331.237 17.702.226 25.378.902 39.150.233 35.293.644 36.807.301
18 DEAMs Liquidado 6.069.533 8.914.191 8.331.237 17.452.419 25.378.902 39.150.233 35.293.644 36.807.301
a mais por ano
125 Pago 5.690.757 7.894.480 6.483.968 12.279.585 16.909.884 8.778.222 22.284.524 12.698.283

1
Orçamento Orçamento
Orçamento
Percentual Percentual pago
49,8% 49,8%
49,8%
1985 1992 2001 2008 2014 Percentualpago
pago ééquanto, emé quanto, e
quanto,em
média, é média, é p
pago
média, é pago
do valor do do valor d
do valor do
338 anos é o tempo para que todas as cidades tenham ao menos uma Delegacia Especializada no Atendi-
mento à Mulher, caso o ritmo de crescimento da rede continue igual ao dos últimos cinco anos. 54,0%
54,0% 54,0%
77,8%
77,8% 77,8%
45,9%
45,9% 45,9%
52,1%
52,1% 52,1%
58,6%
58,6% 58,6%
21,4%
21,4% 21,4%
54,0%
54,0% 54,0%
34,4%
34,4%
Orçamento
Orçamento
34,4%
original
original
Orçament
original
Fontes: IIPNPM/ CFEMEA/Secretaria de Política para as Mulheres (SPM). Elaboração: ILAESE 2004 2004
2005 2005
2006 2006
2007 2007
2008 2008
2009 2009
2010 2010
2011 2011
2004 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011
Fonte: SIAFI/SIGA Brasil
62 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 63
Capítulo 9 OPRESSÃO

Gasto com combate à violência não passou de R$ 0,26 por mulher O PT e a “inclusão marginal” de negros e negras
Conforme é possível perceber, a média anual do Entretanto, se entre 2004 e 2011 foram destina-
orçamento destinado para as ações do Programa 0156 dos no total cerca de R$ 200 milhões para o Progra-
– Prevenção e Enfrentamento da Violên- ma 0156, não obstante somente no
cia contra as Mulheres, entre 2004 e 2011 Em 2012, o ano de 2012 o governo federal de-
representou modestos R$ 25 milhões/ano. pagamento de sembolsou R$ 753 bilhões para o
Adotando como indicadores o núme- serviços da dívida foi pagamento de juros, amortizações
ro de municípios a serem atendidos e a mais de 3.700 vezes e gestão da dívida pública.
po­pulação-alvo, os valores previstos no Isto é, o que o governo gastou
o Orçamento para
Programa 0156 representaram, respecti- somente no ano de 2012 com pa-
vamente, R$ 4.637,00/município/ano, ou enfrentar a violência gamentos de serviços da dívida foi
ainda irrisórios R$ 0,26 por mulher. contra as mulheres mais de 3.700 vezes o orçamento do
Tomando-se por base não o valor au- em oito anos. Programa 0156 - Prevenção e En-
torizado, mas o que foi realmente pago, o frentamento da Violência contra as
financiamento das ações mostra-se ainda mais limi- Mu­lheres nos oito anos anteriores.
tado, com valor anual médio por município equiva- Isso demonstra clara­mente quais são as priori-
lente a R$ 2.100,00. dades do governo federal. No início dos anos 1980, quando o PT surgiu, a Como se sabe, ao invés de garantir as cotas e am-
imen­sa maioria dos ativistas do movimento negro viu pliar as vagas na educação pública (como havia pro-
o partido como a possibilidade de construção de um metido durante a campanha), Lula criou um progra-
Programa “Mulher, Viver sem Violência” “novo quilombo”; um espaço e um instrumento para ma que, além de jogar a população negra em escolas
Em março de 2013 o governo federal lançou o Com relação à Casa da Mulher Brasileira, não ne- fazer avançar o processo de reorganização da luta privadas de baixa qualidade, ajudou a encher ainda
programa Mulher: Viver sem Violência. Para sua im- gamos sua relevância, muito pelo contrário, é uma anti-racista que, na esteira da derrubada da ditadura, mais os cofres dos tubarões do ensino através da des-
plementação o compromisso da presidente Dilma foi iniciativa importante, pois a dispersão dos serviços havia dado importantes passos, particularmente com tinação de milhões de reais em isenções fiscais e do
de investir R$ 265 milhões em dois anos, sendo R$ é muitas vezes um limitador para que as mulheres a fundação, em julho de 1978, do Movimento Negro pagamento de mensalidades.
137,8 milhões em 2013 e R$ 127,2 milhões em 2014. vítimas de violência busquem ajuda. Contudo, se a Unificado Contra a Discriminação Racial (MNUCDR). Se essa foi a marca do primeiro mandato, o resto
Destes, R$ 115,7 milhões na construção, equipagem concentração numa mesma infraestrutura facilita, Passados 10 anos desde que o da década não foi nada diferente. En-
partido chegou ao poder, apesar das O Estatudo da Igual­ quanto realizava conferências, cujas
e manutenção de 27 prédios da Casa da Mu­lher Bra- não podemos nos esquecer de que um dos principais
sileira; R$ 25 milhões na ampliação da Central de problemas na questão do acesso é justamente que a enormes expectativas ainda hoje ali- dade Racial foi muti­ resoluções e promessas, nunca saíram
Atendimento à Mulher – Ligue 180; R$ 13,1 milhões rede está disponível a um número muito limitado de mentadas pela maioria da população lado, retirando direi­ do papel, o governo petista – primeiro
em humanização da atenção à saúde pública; R$ cidades. Há o risco de que essa política reduza ainda negra, esta perspectiva foi completa- tos dos quilombolas com Lula e, depois, de forma ainda mais
6,9 milhões na humanização da perícia para aper- mais o atendimento às mulheres nos pequenos e mé- mente soterrada pelas marcas regis- intensa, com Dilma – foi abandonando
e citação aos termos
feiçoamento e coleta de provas de crimes sexuais e dios municípios. tradas do “modo petista de governar”, ou distorcendo, uma a uma, as princi-
R$ 4,3 milhões em serviços de fronteira. Deveria ser Assim mesmo, no balanço da implementação do a começar pelas alianças com setores raça e escravidão pais bandeiras do movimento negro.
destinado ainda um aporte de R$ 100 milhões para Programa, conside­rando que metade de seu orça- mais conservadores (e racistas) da so- Os exemplos dariam para preencher
o desenvolvimento de cinco campa­ mento foi previsto para ser executa- ciedade e pela submissão de toda e qualquer política à várias páginas desta publicação, mas dois deles bas-
nhas educativas de cons­cientização.
Um ano após o do em 2013, podemos ver que pouco lógica do mercado neoliberal. tam para ilustrar o que estamos falando. Em 2003,
Com custo médio de R$ 4,3 mi­lhões anúncio do programa, saiu do papel. Até o início do ano, ne­ uma reivindicação histórica do movimento, o ensino
cada, o carro-chefe do programa é a nenhuma Casa da nhuma Casa da Mulher Brasileira foi A inclusão marginal da população negra de história e cultura afro-brasileiras (Lei 10.639/03),
Casa da Mulher Brasileira, espaço que Mulher Brasileira entregue e no Orçamento de 2014 está Ainda no primeiro mandato de Lula, a única me- foi aprovada com um único veto do presidente: o cor-
deverá reunir os seguintes serviços: dida concretamente voltada para a população negra te do artigo que previa a destinação de verbas para a
havia sido entregue. prevista a liberação de verbas para a
delegacias especializadas, juizados e construção de apenas sete. Nenhum é um dos exemplos mais lamentáveis desta história: o formação de professores. Um “detalhe” que, na práti-
varas, defensorias e promotorias, equipe psicossocial centavo foi empregado na ampliação do Ligue 180 Programa Universidade para Todos (ProUni). ca, faz com que, até hoje, a lei só saia do papel através
e de orientação para emprego e renda, brinquedoteca em 2013 e como para 2014 estão previstos apenas 11 Em um momento em que nem 2% da população do esforço e dedicação dos próprios educadores.
e espaço de convivência, além de fornecer transporte milhões, isso significa que a promessa já está compro- negra estava nas universidades, o governo petista Mais escandaloso ainda foi uma das últimas me-
gratuito para os serviços de saúde (IMLs, hospitais de metida. Sobre a melhoria da infraestrutura da rede criou um projeto de “inclusão” que, na prática, apos- didas sancionadas por Lula, em 2010: o Estatuto da
referência e unidades básicas) e de abrigamento. A e das campanhas educativas de cons­cientização, não tava na perpetuação da marginalização dos negros e Igualdade Racial, cujo texto original construído pelo
previsão é atender cerca de 200 pessoas/dia. foi possível encontrar avanços. negras. movimento negro, foi completamente mutilado em

64 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 65
Capítulo 9 OPRESSÃO

função de um acordo espúrio entre o senador Paulo Cotas: 30 anos de luta e uma vitória parcial Para além da violência física, a cumplicidade dos
Paim (PT-RS), a Secretaria Especial de Políticas de Pro- Apesar de tudo isto, a população negra e, parti­ Diferença salarial: brancos e negros governos petistas com a manutenção do abismo racial
moção da Igualdade Racial (Seppir), criada no inicio cu­larmente a enorme maioria do movimento negro, Média salarial, em 2010 se revela particularmente nas condições de vida da
do governo Lula, sem verbas e funções definidas. O ainda vê no governo um aliado no combate ao racis­ população negra. Segundo o IPEA, em 2010, 63% dos
acordo também incluía os representantes do agro­ mo, em parte por causa da aprovação das cotas raciais

Marcos Santos/USP Imagens


negros e negras viviam abaixo da linha de pobreza,
negócio, representados pelo corrupto Demóstenes nas universidades. Arrancado depois de décadas de uma situação explicada pelo fato de que, ao optar por
Torres (DEM-GO). lutas e anos de engavetamento nos gabinetes do go­ governar com a burguesia, os governos petistas man-
O resultado foi um texto absurdo, do qual foram verno, o projeto, contudo, está longe do que era reivin- tiveram a essência do racismo: a combinação entre
retiradas bandeiras históricas como as cotas, a regu­ dicado. Primeiro porque parte de uma subrepresen- opressão racial e exploração capitalista.
lamentação das terras quilombolas e até mesmo tação da população negra; segundo porque não prevê Uma realidade que pode ser constatada com um
qualquer menção aos termos raça, escravidão e medidas que garantam a permanência (como bolsas único dado: em 2010, enquanto a média salarial dos
identidade negra. de alimentação, moradia e transporte). brancos chegava a R$ 1.538,00, a de um negro não pas-
sava de R$ 834,00 e a de uma mulher negra era pouco
maior que a metade disto.
Crescimento desigual e manutenção do abismo racial
R$ 1.538 Precisamos de um Quilombo de Raça e Classe
Contudo, não são ape- Essa combinação perversa repercute em todos os
nas as manobras nem as pí- outros aspectos da vida da população negra. Ainda
fias concessões do petismo em 2010, o analfabetismo, por exemplo, entre brancos
que revelam seu verdadeiro com mais de 15 anos era de 5,9%, entre negros chegou

Latuff
caráter no que se refere ao R$ 834 a 14,4%. Dados todos eles ainda mais graves se consi­
combate ao racismo. Mais deramos a situação das mulheres negras, ainda mais
importante é entender que, expostas à violência, à precarização e às piores con-
assim como acontece em dições de vida.
relação à endividada “nova Uma situação que, com Dilma, só tende a piorar
classe média”, a ilusão de “as- como ficou claro todo episódio em torno do deputado
censão social” e conquista Marco Feliciano. É por todos esses motivos que o movi-
de direitos não resiste a uma Homens Homens mento negro deve retomar a luta independente e sem
análise mais profunda da re- brancos negros patrões contra a opressão e a exploração.
alidade.
Exemplo disto pode ser
visto pelos dados do Índice de
Desenvolvimento Humano
(IDH). Um ano antes do PT
chegar ao poder, enquanto o “Brasil branco” ocupa-
va a 47a posição entre as nações mais desenvolvidas,
A cada 25 minutos um Os governos do PT e os LGBTs: 10 anos de jogo duplo
jovem negro, de 15 a 24 anos,
o “Brasil negro” estava na 107a posição do ranking. Desde que o movimento LGBT brasileiro surgiu, reconhe­cimento da união estável e de uniões civis
Dez anos depois, esse abismo continua praticamente
morre de forma violenta na década de 1980, o PT foi uma referência para esse em diversos Estados. Esses avanços foram fruto das
o mesmo, como revelou a pesquisa feita em 2009: as movimento. Durante os anos 1980 e parte dos anos mobilizações, mas se deram pelo poder Judiciário, o
condições de moradia, saúde, educação e saneamento 1990, o PT era o único partido no país que dava es- que é resultado da inércia do Congresso Nacional e do
básico da população branca a colocaram no 40o lugar O número é absurdo por si só, mas a cumplici- paço para a discussão acerca da homossexualidade e governo federal.
no ranking, enquanto os negros permaneceram na dade dos governos petistas em relação a este genocí- da homofobia. Era o partido no qual se organizava a É compreensível que os LGBTs, cujos direitos civis
104a posição. dio é ainda mais grave. Em 2002, morriam 45,8% maior parte das lideranças do movimento LGBT. Por são negados e cujas vidas são brutalmente retiradas
Outros índices que demonstram o descaso e mais negros que brancos nesta faixa etária. Em 2010, isso, a eleição de Lula em 2002 gerou grandes expec- todos os dias, tenham sentido na eleição de Lula e na
ineficácia das políticas raciais do petismo são ainda a proporção já havia saltado para 139%. Praticamente tativas no movimento. de Dilma a esperança das tão sonhadas conquistas.
mais trágicos. Segundo dados do Seppir, vivemos em no mesmo período (entre 2002 e 2008), enquanto o Nesses últimos anos, a visibilidade LGBT au- Mas agora já se passaram quase 14 anos de governo e
um país onde a cada 25 minutos um jovem negro, de número de vítimas brancas caiu em 22,3%, entre ne- mentou consideravelmente, e foi conquistado o precisamos fazer um balanço.
15 a 24 anos, morre de forma violenta. gros o índice subiu em 20,2%.

66 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 67
Capítulo 9 OPRESSÃO

Esse descontentamento com o governo, somado a ferência não surtiu em nenhuma medida concreta.
uma onda de violência homofóbica no País que segue No início de 2013, o PT resolver se retirar da Co-
até hoje, provocou, logo no início do governo Dilma, missão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara
em 2011, diversos levantes, onde se exigia a criminali­ dos Deputados (CDHM), deixando o espaço livre para
zação da homofobia, através da imediata aprovação os setores mais reacionários ocuparem a comissão.
do PLC-122/06. A eleição do pastor Marco Feliciano (PSC/SP) para a
Diante da pressão do movimento, Dilma convo- presidência gerou profunda indignação nos movi-
cou a II Conferência LGBT. O clima da II Conferência mentos sociais organizados e uma verdadeira onda
foi bem diferente da primeira. Dilma não compare- de protestos em todo o país, com repercussão inter-
ceu à conferência, já sabendo o que iria enfrentar: a II nacional.
Conferência refletiu o sentimento de diversos setores O setor LGBT foi o principal alvo das atrocidades
do movimento LGBT com relação ao governo federal, de Feliciano, e isso ficou claro com as declarações que
e palavras de ordem contra o governo foram gritadas ele e outros homofóbicos do Congresso têm dado so-
à exaustão. Assim como na primeira, a segunda con- bre esse assunto.

Jogo duplo em nome da “governabilidade”


Por um lado, o governo federal apresenta um dis-
curso bonito e atraente, junto com propostas políticas,
mas que não têm desdobramentos reais. Por outro,
quando a bancada homofóbica pressiona, o governo
recua para não perder sua base aliada no Congresso
Nacional, porque ela garante sua governabilidade.
A maioria dos homofóbicos do Congresso é da
base aliada. Dilma precisa desses setores para im-
plantar suas medidas econômicas, e em nome da “go­
ver­nabilidade”, utiliza os oprimidos como moeda de
Governo Lula, o “Brasil sem homofobia” e Dilma, a “Carta ao Povo de Deus” e troca. É por isso que o kit anti-homofobia foi vetado.
a Conferência Nacional LGBT a inércia e o silêncio de um governo É por isso que o PT tentou transformar o PLC-122 em
letra morta. É por isso que Dilma indicou o conhecido
Logo nos primeiros anos do governo Lula, foi cria­ O segundo turno das eleições de 2010 foi mar-
pastor homofóbico Marcelo Crivella como ministro.
do o programa “Brasil sem homofobia”. Esse projeto, cado pelo retrocesso nas bandeiras de combate às
E é por isso que Dilma nunca se pronunciou a favor
amplamente comemorado no movimento, nunca opressões por parte do PT. Diante de acusações da di-
dos LGBTs ou contra seu aliado Marco Feliciano.
foi capaz de cumprir com seus objetivos, mas serviu reita e de veículos de imprensa, Dilma não somente
No atual cenário, Dilma precisa mais do que nun-
muito bem para absorver lideranças do movimento se posicionou contrária ao aborto, como publicou
ca desses aliados. O governo planeja duros ataques
para apoiar incondicionalmente o governo. Serviu uma carta, intitulada “Carta ao Povo de Deus”, onde
aos trabalhadores, como o ACE e a reforma da Previ-
também para propagandear o governo Lula interna­ se comprometia a não colocar em discussão, durante
dência, e sabe que não conseguirá aprovar essas me-
cionalmente, dando a ideia de que, no Brasil, a homo- o seu governo, questões que batessem de frente com
didas sem ampla maioria no Congresso.
fobia é combatida com políticas públicas. Mas pouco setores evangélicos e católicos, como a legalização
Para que seja possível um avanço nos direitos
serviu para avançar nos direitos. do aborto ou o casamento entre homossexuais. Essa
LGBTs, o movimento não pode cair no jogo duplo do
Em 2008, o governo convocou a I Conferência carta gerou um descontentamento generalizado nos
governo, que só criou ilusões, prejudicou e desmorali­
Nacional LGBT, que tinha por finalidade a formulação movimentos feminista e LGBT, chegando a atingir até
zou o movimento nesses últimos 10 anos. É preciso
de políticas públicas para LGBTs. Foram diversos dias mesmo figuras no PT no interior desses movimentos.
romper com esse governo que nunca fez nada para
de discussão, começando pelas conferências munici- O kit “Escola sem Homofobia” (que seria a única
combater a homofobia. É preciso romper com o PT e
pais e estaduais. Foram discutidas políticas públicas medida da I Conferência a sair do papel), foi vetado
arrancar, nas ruas, os direitos do movimento LGBT!
em diversos campos, como educação, saúde, seguran- antes do lançamento pela presidente Dilma diante
Seria uma incoerência lutar contra o capitalismo
ça pública, habitação, trabalho e emprego, assistência de uma ameaça dos homofóbicos do Congresso em luta contra a exploração capitalista. Isto é um princí-
sem lutar contra a opressão, que agudiza e intensifica
social. Da Conferência Nacional, saiu uma “carta de chamar o então ministro Palocci para depor em uma pio. E princípios não se negociam nem se trocam. “Pra
a exploração. Deve-se combater a homofobia cotidia­
recomendação”. Das medidas propostas nessa carta, CPI caso o kit fosse lançado. Palocci caiu alguns dias combater a homofobia, a luta é todo dia”!
namente, em todos os espaços, combinando com a
nenhuma política pública concreta saiu do papel. depois, mas o veto ao kit foi mantido.
68 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 69
10 CONCLUSÃO
CONCLUSÕES

Para quem governou o PT?


governos neoliberais em todo o mundo) essa orien- aumentando cada vez mais a dependência do país
tação neoliberal do governo petista aparece com de alguns produtos primários para exportação.
uma cara “desenvolvimentista”. O PT abandonou A classe trabalhadora, que estava mobilizada
toda perspectiva socialista e se rendeu ao sistema contra em FHC no final dos anos 2000, foi desmobili-
capitalista mundial, que utiliza o neoliberalismo zada e engoliu o projeto petista de governar “para to-
Banqueiros e
empresários em para os trabalhadores e o keynesianismo para os dos”, até a insatisfação acumulada de 10 anos explodir
reunião com grandes empresários. nas ruas em manifestações multitudinárias que se
Dilma Rousseff, Esta é a explicação última da rendição do PT ao comparam com as manifestações pelas Diretas Já, na
em maio de 2012 neoliberalismo e sua oscilação década de 1980. O Dia Nacional
aparente entre uma orientação A combinação das políticas de Luta e Paralisações em 11 de
neoliberal e keynesiana. Foi sociais compensató­rias com julho de 2013 foi muito forte e se
uma opção do PT ao se compro- equi­parou às paralisações reali-
crescimento neoliberal foi
meter com a manutenção do zadas na década de 1980.
modelo capitalista brasileiro.
uma formulação original Pelos serviços prestados, a
Pode-se inclusive afirmar do Banco Mundial e hoje é burguesia financiou regiamente
que o PT no governo aper- aplicado em boa parte da o PT e as campanhas eleitorais.
feiçoou a dominação da burgue- América Latina por governos Em 2010, na campanha de Dil-
sia e do capital internacio­nal na ma, de um total de R$ 262 mi­
de “direita” e de “esquerda”.
economia e na política no Brasil. lhões “doados” à campanha de
A combinação das políticas Dilma e ao Diretório Nacional
sociais compensató­rias com crescimento neolibe­ do PT, o setor do agronegócio, os bancos, a mineração
ral foi uma formulação original do Banco Mundial e e a construção civil juntos “doaram” mais de 80% dos
hoje é aplicado em boa parte da América Latina por recursos da campanha (gráfico abaixo). Os maiores
governos de “direita” e de “esquerda”. Os governos doadores individuais foram a Vale (cerca de R$ 18
A corrente majoritária do partido reciclou a velha orientação de colaboração entre as classes petistas prosseguiram com o processo de privati- milhões), a construtora Andrade Gutierrez (cerca de
e utiliza neoliberalismo para os trabalhadores e keynesianismo para os grandes empresários. zações, ainda que de forma encoberta e dissimulada. R$ 15 milhões), o JBS Friboi e a Camargo Correa (R$
Por tudo isso, a pequena quantia destinada a di- 13 milhões cada) e o Bra­desco (R$ 12 milhões).
minuir a pobreza no Brasil não pode esconder a ver- Está longe o dia em que o programa do PT dizia
dadeira natureza do governo petista: ele governou (em 1989): “Nós não prometemos mudanças. Nós lu­
O programa do PT para as eleições de 1989 dizia: na década de 1980, em função de dois projetos em dis-
para os grandes empresários, particularmente para tamos por elas há muito tempo e as reafirmamos em
“Dentro do sistema capitalista, estamos condena­ puta. Um deles era sintetizado pela proposta de um
o capital multinacional, que foi o maior ganhador cada momento de nossa prática. Não é possível imagi­
dos a ser uma nação periférica e marginal, fornecedora “Governo dos Trabalhadores sem patrões”, enquanto
no governo petista. nar que se constituam governos renovadores a par­
de matérias-primas, de mão-de-obra barata, de mer­ a corrente majoritária do PT, liderada por Lula, de-
Foi aperfeiçoada a exploração e a precarização tir de campanhas conservadoras, baseadas em cabos
cado às multinacionais, de juros aos banqueiros inter­ fendia um “Governo democrático e popular”, onde ca-
do emprego, com aumento dos lucros das grandes elei­torais remunerados, financiamentos milionários,
nacionais. Em resumo: uma nação explorada.” (...) “Se beria um setor “progressista” da burguesia. Assim, a
empresas e desnacionalização do parque produtivo, conchavos de bastidores e perfumaria populista.”
não há saída no sistema capitalista para a classe tra­ corrente majoritária reciclou a velha orientação de
balhadora, o socialismo é a alternativa histórica nesta colaboração entre as classes.
etapa da evolução da humanidade. Só através do so­ A proposta majoritária chegou ao poder no Bra­ Quem financiou a campanha presidencial do PT
cialismo haverá condições de deter a sangria de recur­ sil. No governo central, o PT optou por governar jun-
Agronegócio Bancos
sos humanos e materiais, imposta ao Brasil pelos países to com a burguesia nacional. Por tabela, terminou R$ 45 mi R$ 38 mi
ricos, devolvendo ao povo as riquezas geradas por seu capitulando às multinacionais que controlam a eco-
trabalho. As mudanças precisam e podem começar já. nomia brasileira e subordina a burguesia nacional, Construção Civil Mineração
Vamos mudar a cara do Brasil!” sócia menor do negócio. R$ 107 mi R$ 22 mi
O PT modificou este programa com a “Carta ao Por isso, no governo, o PT concordou em seguir
17% 15%
povo brasileiro”, de 2002 onde afirmou que: “A pre­ aplicando o neoliberalismo, de acordo com o impe- Em 2010, mais de 80% das doações para a
9%
Outros
missa dessa transição será naturalmente o respeito aos rialismo, que controla o mercado mundial. Como o campanha de Dilma e ao Diretório Nacional R$ 50 mi
contratos e obrigações do país.” neoliberalismo já estava “queimado” com a classe do PT vieram de quatro setores da economia 40% Total doações 19%
R$ 262 mi
No interior do PT, houve uma grande polêmica trabalhadora mundial (e por isso, foram derrubados
Fonte: TSE: http://www.tse.jus.br/

70 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 71
11 PROGRAMA
PROGRAMA

Um programa dos trabalhadores


Seria possível investir 2% do PIB para garantir gadura, poderia se empregar todos os 10 milhões de
metrô e trens estatais nas 37 maiores cidades bra- desempregados do país e garantir empregos de quali­
sileiras com mais de 500 mil habitantes, triplicando dade para os 30 milhões de trabalhadores que têm

em ruptura com o imperialismo a linha metroferroviária no país. Com isso, evitaría-


mos o desperdício de tempo com o trânsito e a morte
empregos precarizados.
Com uma só medida, o não pagamento das dívi-

para desenvolver o Brasil


de 40 mil pessoas por ano, em acidentes de carro e das aos banqueiros, poderíamos mudar a situação so-
permitiria a estatização dos transportes públicos e cial do país, tendo saúde, educação, transporte públi-
Tarifa Zero para tod@s. co e de qualidade, acabando com o desemprego e a

de forma soberana Com um Plano de Obras Públicas desta enver- falta de moradias populares.

O programa do PT de 1989 arrancava da defesa do não pagamento da dívida externa e a utili­ Por uma segunda independência do país!
zação do dinheiro para o desenvolvimento do Brasil: 2 Romper com o imperialismo e estatizar as multinacionais!
“Não devemos e não podemos pagar essa dívida ilegítima, continuando a trans­ Estamos atados ao domínio do imperialismo por de produtos que são fabricados no Brasil, como forma
ferir para os países desenvolvidos parte significativa da riqueza que produzi­ três vias, que estão prejudicando o Brasil: a) as mul- de proteger a indústria nacional.
mos aqui. Em 1990, a suspensão dos pagamentos da dívida pode significar uma tinacionais estão asfixiando a economia brasileira Caso as multinacionais recusem estas medidas,
poupança de cerca de 15 bilhões de dólares que, somados aos cerca de 20 bilhões ao privilegiar a remessa de lucros para suas matri­ o governo deveria proceder com a nacionalização e
previstos para o saldo comercial, permitiriam a adoção de um programa interno zes; b) a vinda de capital especulativo, sem nenhum estatização das transnacionais instaladas no país, re-
controle, termina por sugar a riqueza produtiva do construindo um polo industrial, estatal, articulado
de estabilização e retomada do crescimento.”
país, obrigando a manter os juros altos como con- entre mineração, siderurgia, metalurgia, máquinas,
O programa de luta dos trabalhadores hoje deve arrancar do mesmo ponto que arrancava o dição para vir ao Brasil e c) o salto das importações telefonia, energia, infraestrutura, construção pesada
programa do PT em 1989: a defesa do não pagamento da Dívida Pública Interna e Externa aos das multinacionais a partir da crise de 2008, que está e agronegócio, para ordenar a economia do país na
levando a quebra da indústria brasileira e ao déficit construção de casas, escolas, hospitais, saneamento,
grandes bancos. Somente medidas de fundo podem recolocar o Brasil no caminho do desen­
das contas do país. transportes públicos metroferroviários e alimen-
volvimento econômico, interrompido pelas privatizações e desnacionalização da economia. Se o governo petista não estivesse preso às trans- tação para a população trabalhadora.
nacionais, imporia uma taxação pesada ao capital es- Não existe maneira de superar a dominação im-
trangeiro especulativo que está parasitando a eco- perialista sem acabar com seu controle direto da
nomia brasileira. Cobraria um imposto progressivo economia, estatizando e colocando sob controle dos
Suspensão do pagamento da Dívida Pública aos grandes
1
sobre os lucros das multinacionais instaladas no Bra- trabalhadores as multinacionais aqui instaladas. Só
bancos, para investir em saúde e educação pública e garantir sil e imporia a proibição da remessa de lucros e obrig- assim poderemos reinvestir os enormes lucros con-
ação de reinvestir 100% dos lucros no país por 10 seguidos por essas empresas aqui. Só assim os centros
investimentos num plano de obras públicas (realizadas por anos, dentro de um plano nacional de obras públicas. de decisão da economia brasileira estarão aqui e não
um parque industrial estatal) que garantirá hospitais, escolas, Garantiria uma forte taxação sobre as importações nas matrizes dessas empresas.

creches, restaurantes e lavanderias públicas, moradias,


Estatização do Sistema Financeiro, sob controle dos
saneamento e transporte público, baseado em metrôs e trens. 3 trabalhadores! Por um banco estatal único, controlado
Não pagando a dívida aos banqueiros seria pos- Conseguiríamos destinar 10% do PIB para a edu­
sível destinar 10% do PIB para a saúde pública. Con- cação pública já. Poderíamos ter creches para todas
pelos sindicatos e pela população trabalhadora.
seguiríamos ter um serviço de medicina familiar as crianças do país e um ensino básico público e de Na sociedade capitalista e imperialista atual, Quem não se recorda que os grandes bancos leva­
atendendo 100% da população, hospitais públicos qualidade. quem domina os bancos domina também a economia ram o planeta à crise econômica mundial que estamos
de qualidade sem filas e remédios gratuitos para a Seria possível acabar com o déficit de moradias, e o País. Os bancos controlam as finanças, o comércio atravessando? Eles criam inflação, desemprego e cri-
população. destinando 6% do PIB ao ano, por cinco anos, cons­ e a indústria. Falar em controlar a economia e deixá- se. E a classe trabalhadora mundial é que paga a conta.
Poderíamos ter salários decentes e melhores con- truindo seis milhões de moradias de qualidade29 com la nas mãos de bancos privados é piada. Falar em con- Deixar a economia mundial e do Brasil nas mãos dos
dições de trabalho para o funcionalismo da saúde. custo estimado de R$ 48 bilhões ao ano. trolar a inflação, enquanto os bancos especulam com banqueiros é jogar o País e o mundo em novas crises e,
milhões e geram inflação dos preços de commodities... assim, vão nos empurrar em um precipício para salvar
29 Valor unitário por moradia de R$ 80 mil

72 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 73
Capítulo 11 PROGRAMA

um punhado de banqueiros trilionários. Eles parasi- SEM INDENIZAÇÃO, pois essas riquíssimas famílias Por um plano estratégico de Reforma Agrária para o campo brasileiro, com as seguintes bases:
tam todo o planeta, sugando a riqueza gerada pela hu- já estão parasitando nossas riquezas há muito tempo.
a. Nacionalização e estati- da em cooperativas. Começaremos terra, com as seguintes condições:
manidade para um grupo de famí­lias superpoderosas, A nacionalização dos bancos não ofenderá nin-
zação das grandes empresas do resgatando o saber do campo e a ex- - A terra não pode ser alienada
como Rothschild, Rockfeller ou Moreira Salles. guém, não confiscará a poupança dos pequenos inves- agrone­gócio, sob controle dos tra- periência secular do nosso povo; nem arrendada, nem passada de
O Sistema Financeiro de um País tem papel dema- tidores e poupadores. Quem tiver mil reais guardados balhadores, incluindo as grandes c. A nacionalização da terra, herança, pois será um bem público.
siado importante para ficar sob controle de um punha- nos bancos ou investidos manterão seus mesmos mil redes de supermercados, elimi- onde todo o solo do País passa para - As definições das formas do
do de especuladores. Toda a riqueza e a contabilidade reais. Se tiver um milhão, igualmente. nando os atravessadores, estatizan- o Estado, sendo de todos e de nin- usufruto da terra, como o tama­
da nação passam pelos bancos. E a riqueza do País é Só se confiscará a propriedade dos bancos priva- do a co­mer­cialização pelos gover- guém. A terra, assim como a água, o nho dos lotes, serão decididas por
direcionada segundo interesses de agiotas modernos. dos (quatro grandes bancos privados - Itaú, Bradesco, nos federal, estadual e municipal. ar, o mar, não deve ser propriedade congressos de operários agrícolas
O crescimento no Brasil só não é próximo do Santander e HSBC - sendo dois estrangeiros), cujos A agroindústria estatal será parte de ninguém, para que todos possam e camponeses pobres locais, e suas
importante de um plano geral de usufruir. Terra produtiva é a que organizações.
chinês porque os bancos estão parasitando nossa eco- ativos alcançam a soma de R$ 1,8 trilhão ou 41% do
Reforma Agrária, que assentará oferece educação, saúde, trabalho - Os pequenos produtores or-
nomia e desviando para seus cofres recursos que de- PIB brasileiro.
cerca de 6 milhões de famílias, além e soberania. A nacionalização do ganizados em cooperativas e as or-
veriam ser usados na produção de riquezas para o nos- Não se tocaria em nenhuma conta corrente ou de garantir um plano de soberania agronegócio já colocará nas mãos ganizações locais decidirão tudo em
so país e a população pobre, gerando renda e emprego. valor guardado pelos correntistas e pequenos inves­ alimentar do povo brasileiro. do Estado 260 milhões de hectares, assembleias dentro de um plane-
A única saída para acabar pela raiz com este pro­ tidores. Tocar-se-ia somente na propriedade dos gran­ b. A garantia de um plano na- que se juntarão à metade das terras jamento nacional de produção
blema que afundará o Brasil é NACIONALIZANDO des bancos que nos últimos 30 anos levaram R$ 3 tri­ cional de produção de alimentos do país que já é do Estado. A terra agropecuária, tratando de evitar
E ESTATIZANDO TODO O SISTEMA FINANCEIRO. lhões na forma de lucros, grande aspirador de di­nheiro para acabar com a fome, diversifi- mudará de mãos: do latifundiário e a produção patronal, ainda que de
Isto permitiria formar um Banco Estatal Único, que que faltou para o desenvolvimento do país, para edu- cado, sem veneno, a preço de cus- do agronegócio que detêm 80% das pequeno porte.
reuniria toda a riqueza da Nação, direcionando-a para cação, saúde, segurança, para melhorar os serviços to, produzido em comunhão entre terras, para o Estado, única forma - Como parte do plano geral de
grandes agroindústrias estatais, de cumprir a função social. garantir a soberania alimentar do
a produção de alimentos, matérias-primas e produtos públicos, para aumentar os salários.
resultado da estatização do agro­ d. Como parte de um plano de povo brasileiro, só se exportará ali-
necessários para a população trabalhadora a preços É preciso estatizar todo o sistema financeiro para Reforma Agrária, será entregue a mentos após suprir as necessidades
negócio, funcionando sob controle
baixos. Permitiria, também, crédito fácil e barato para garantir que os investimentos sejam destinados às dos operários agrícolas e a peque- terra em usufruto a pequenos cam- internas. O excedente será vendido
os trabalhadores. Esta estatização deve ser realizada reais necessidades do povo brasileiro. na produção camponesa, organiza- poneses que queiram trabalhar na a preço de custo para países pobres.

Reforma agrária já! Estatização do agronegócio, sob controle dos


4 assalariados rurais e urbanos! Redução do preço dos alimentos!
O balanço dos últimos 20 anos de luta pela Refor- pequenos produtores (contrato nacional dos traba­
ma Agrária demonstrou que só rompendo com o sis- lhadores, sem gatas, fichando os trabalhadores, piso
tema capitalista conseguiremos mudar o modelo do nacional, jornada de 40 horas, condições de segu-
agronegócio. Nenhum governo ou empresário pro- rança, atendimento saúde, cuidado com o migrante,
moverá esta mudança radical no campo. A Reforma que não deprede a natureza e que trabalhe em parce-
Agrária e o fim da fome no País só são possíveis como ria com a pequena produção camponesa) sejam con-
resultado da luta que unifique assalariados rurais, dições para qualquer financiamento a empresas rurais
pequenos produtores rurais e trabalhadores urbanos. por parte do Estado e bancos públicos.
O balanço dos últimos 10 anos demonstrou que - Que baixe o preço dos produtos agropecuá­rios,
não conseguiremos romper com o agronegócio sem muito caros porque são determinados pelo mercado
romper com o governo de Frente Popular, que conso- mundial e pela fome de lucro das grandes empresas.
lidou, financiou e protegeu o novo modelo agroindus- - Fim da criminalização da luta pela terra e da
trial no País em oposição à Reforma Agrária. impunidade aos assassinos de trabalhadores rurais.
Por isso, exigimos do governo petista: Prisão de jagunços e mandantes, que devem também
- Que rompa sua união com os usineiros e obrigue ter as propriedades confiscadas para reforma agrária.
o agronegócio a respeitar o operário agrícola, o cam- - Que estatize todas as empresas do agronegócio
ponês pobre, a natureza e a soberania nacional; em regime falimentar, sob controle dos traba­lhadores
- Que não financie nenhum centavo a mais para e das organizações sociais do campo, sem indeni-
o agronegócio multinacional; Que acabe com as isen- zação, e incorpore-as, junto com suas terras, a um
ções e desonerações ao agronegócio. Plano de Reforma Agrária, para produzir alimentos
- Que o respeito aos direitos dos trabalhadores/ sadios, sem agrotóxicos, para a população.

74 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 75
Capítulo 11 PROGRAMA

Parar com as privatizações petistas! Reestatização das Anulação da reforma da Previdência!


5 empresas privatizadas pelo PSDB começando pela Vale, 8 Enterrar o projeto dos Acordos Coletivos Especiais!
Embraer e CSN! Petrobrás 100% estatal! Fim dos leilões! É preciso acabar com os ataques aos direitos dos “novo” projeto previdenciário cujo objetivo é atacar
trabalhadores. Defendemos a anulação da reforma ainda mais os direitos dos aposentados.
As privatizações feitas pelos governos do PSDB grandes lucros em planos de investimentos de acor-
da Previdência imposta no Congresso Nacional com O projeto de “Acordo Coletivo Especial” deve ser
foram verdadeiros assaltos ao patrimônio público. O do aos interesses dos trabalhadores e do povo pobre.
a compra de votos dos parlamentares, com o men- repudiado pelo governo e pelo Congresso, para que
PT não só manteve essas privatizações como esten- Poderíamos ter energia elétrica e telefones muito
salão. deixe de existir essa ameaça a direitos trabalhistas
deu as privatizações para as rodovias, aeroportos, mais baratos que os preços abusivos de hoje.
E o fim do Fator previdenciário e do fator 85/95, básicos, como as férias e o décimo-terceiro salário.
ferrovias e estádios de futebol. A reversão da privatização da Petrobrás per-
A reestatização dessas empresas, sob controle dos mitiria que a autossuficiência na produção de pe­
trabalhadores, traria muitas vantagens para o país. tróleo, com construção de refinarias estatais, per-
Em primeiro lugar, essas empresas deixariam de mitisse uma redução no preço da gasolina a R$ 1 por
estar controladas por fundos de investimentos es- litro, com reflexos imediatos na economia popular.
trangeiros. O fim das privatizações nas rodovias significaria
Em segundo lugar, poderíamos utilizar seus acabar com o roubo escandaloso dos pedágios atuais.

Chega de regalias para os Acabar com a pobreza,


6 grandes empresários! 7 desemprego, com os baixos
Fim dos benefícios fiscais. salários, a precarização e a
Imposto progressivo sobre as terceirização da mão de obra
grandes fortunas! É possível acabar real-
Para garantir o financiamento de ações so- mente com a pobreza no
ciais estruturantes, necessitamos de fontes de País, mas para isso é preciso
financiamento. Para isso, retiraremos do muito atacar os lucros das grandes
que ganharam e ganham os ricos para melhorar empresas, começando pelos
a vida dos trabalhadores: bancos. Propomos duas me- Marcha contra o Acordo Coletivo Especial, em 24 de abril de 2013, em Brasília
a. Fim dos benefícios e isenções fiscais: ar- didas, de enorme impacto
recadar por volta de R$ 137 bilhões com o fim social e econômico:
Em defesa das liberdades, contra a “democracia” dos ricos!
dos benefícios e isenções fiscais que o governo
realiza com os grandes empresários. Este valor
corresponde aos incentivos e isenções fiscais do
a) Plano de Obras Públi-
cas para construir casas,
hospitais, escolas, cre­ ches,
9 Prisão para os corruptos e corruptores! Fora Feliciano e Renan!
governo Dilma em 2011 e representa 3,5% do PIB, saneamento, trans­porte A democracia dos ricos é corrupta. Por isso o PT - Fim do Senado! Por uma Câmara Única, que
segundo o IPEA.30 público, estradas, eletrifi- mudou e se transformou em um partido semelhan- unifique o Senado e a Câmara dos Deputados!
O governo Dilma gastará R$ 91 bilhões com cação, etc. que absorva todos te a todos os outros. A presença de Renan Calheiros - Políticos e altos cargos do governo devem ga­
desonerações da folha de pagamento e renúncias os dez milhões de desempregados, pagando o salário na presidência do Senado e Marcos Feliciano na Co- nhar salário médio de um trabalhador especializado,
fiscais em 2013. mínimo do DIEESE (R$ 2.824 em fevereiro de 2013), a missão de Direitos Humanos é uma demonstração a cargo público não deve ser meio de enriquecimento.
b. Regulamentar um imposto sobre as um custo de R$ 338 bilhões anuais. Isso é muito mais mais de que esse regime serve aos ricos e poderosos. - Os mandatos políticos e parlamentares devem
grandes fortunas brasileiras, atingindo 5 mil efetivo que qualquer programa do tipo Bolsa Família, Para os trabalhadores, não existe democracia ser revogáveis a qualquer momento, caso mintam
famílias com patrimônio total em torno de R$ porque emprega as pessoas. real. Os que se mobilizam sofrem processos, com para a população e não cumpram suas promessas de
700 bilhões. Um imposto de 5%, que nem seria b) A segunda medida é a elevação do salário a criminalização do movimento social. A Justiça campanha.
sentido por estas famílias de milionários, geraria mínimo para o nível indicado pelo DIEESE para to- bene­ficia os banqueiros e os grandes empresários. - Prisão e expropriação dos bens de corruptos e
mais R$ 35 bilhões ao ano para gastos públicos. dos os empregados, afetando os lucros das grandes - Contra a criminalização do movimento social! corruptores!
empresas. Os salários hoje correspondem a menos de - Liberdade de organização nas empresas! - Fora Renans e Felicianos!
30 Informações do IPEA, em matéria publicada no jornal O Estado 10% do faturamento das grandes empresas. Isso seria Delegado Sindical e Comissão de Empresa! - Rotatividade nos cargos dirigentes do País.
de S. Paulo, com dados da Receita Federal, em 19 de outubro de 2011.
possível, reduzindo os lucros da patronal.
76 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 77
Capítulo 11

Contra toda a opressão Retirada imediata


10 a mulheres, negros 11 das tropas do Haiti!
e homossexuais! Todo apoio às lutas dos
A opressão afeta, cotidianamente, a vida de mi­ trabalhadores em todo o mundo!
lhões de pessoas, devido ao fato de serem mulheres,
Abaixo a ditadura de
negros(as), ou homossexuais. Os governos do PT,
apesar dos discursos, não mudaram a realidade da Assad na Síria!
opressão. A violência contra a mulher continua cres­ O Haiti precisa de médicos e de comida, não de
cendo, apesar da Lei Maria da Penha. O racismo, ca- ocupação militar! Não é livre um povo que oprime
muflado ou não, continua presente e a violência ho- outro povo.
mofóbica permanece impune. O governo Dilma deve retirar imediatamente as
- Salário igual, trabalho igual! tropas brasileiras do Haiti!
- Cheches 100% gratuitas e com tempo integral - Todo apoio às mobilizações dos trabalhadores
para os filhos das mulheres trabalhadoras. europeus contra os planos de austeridade!
- Não ao massacre da juventude negra dos bairros - Viva a resistência do heróico povo sírio contra
pobres, realizado pela polícia! a ditadura assassina de Assad!
- Pela criminalização da homofobia! - Fim do Tratado de Livre Comércio com Israel!

Nenhuma ilusão no governo Dilma!


12 Por um governo socialista dos trabalhadores.
Tanto Dilma quanto o PSDB oferecem uma reúnam para deliberar sobre todo o orçamento dos
saída através da falsa “democracia” parlamentar, governos.
dos ricos. Precisamos de uma democracia efetiva, Este seria um governo dos trabalhadores, prati-
onde a população decida diretamente as principais cando a democracia direta da maioria.
questões do país. As manifestações de junho pres- Só a ruptura com o sistema capitalista pode ga-
sionaram os governantes: o prefeito de Jaboatão rantir melhoria das condições de vida do povo
dos Guararapes, próximo de Recife, propôs colocar brasileiro. Não teremos boa saúde, educação de
em toda cidade urnas para ouvir a opinião da popu- qualidade, emprego, salário ou soberania sob o capi-
lação e sugeriu uma “Plenária da cidade” com a par- talismo. Não teremos uma verdadeira independên-
ticipação do povo em um estádio. cia frente aos países ricos e tampouco teremos uma
Evidentemente, o prefeito não levará adiante a verdadeira democracia.
proposta, porém se demonstra que é possível a cons­ Só a classe trabalhadora pode salvar o mundo da
trução de um poder popular (Conselho Popular) a barbárie capitalista, das guerras e das crises, através
partir dos bairros, com eleição direta dos delegados, do socialismo.
numa proporção de 1 delegado para cada mil mo- Só a classe trabalhadora pode garantir terra, tra-
radores, revogáveis a qualquer momento e que se balho e soberania!

78 Instituto Latino-americano de Estudos Socioeconômicos (ILAESE) “Os motivos da revolta popular: um balanço crítico do governo do PT” 79
PT: DEZ ANOS NO PODER
Nando Poeta

Um dia sonhamos juntos Dizendo que todo o mundo Assim se justificou


De termos um instrumento Teria três refeições A sua coligação
Que libertasse o povo Assegurada ao dia, De sair em uma chapa
Do jugo do sofrimento Que a fome de milhões Aliado a um patrão
Brotou o PT das lutas Do solo erradicaria Nisso rasgou o programa
Fruto de muitas disputas Num tempo de alegria E jogou todo na lama
Prometendo ser alento. Para nossas multidões. Em prol da sua eleição.

No Brasil a opressão Que um emprego teria Instalado no poder


De uma árdua ditadura Com um salário decente O PT agora faz
Banhava as ruas de sangue Um teto para morar Muita coisa que se nega
Com a prática da tortura Esse cobertor urgente O que se pensava atrás
Impondo a ferro e fogo Ninguém abriria mão No jogo da aliança
Um discurso demagogo Pois é dever da nação O povo põe na balança
E uma nojenta estrutura. Dar casa pra sua gente. Perguntando se há paz?

Ganhou rua o movimento E a nossa educação O Lula no seu governo


Exigiu-se democracia Seria prioridade Já no primeiro mandato
Greves germinaram lutas Professor remunerado Pegou logo a Previdência
Contra toda tirania Com salário de verdade Depois a jogou no mato
No abaixo a ditadura Uma escola equipada Ficando o servidor
Sem medo de cara dura Sem a sala abarrotada, De FHC sofredor
Trilhou o fim da agonia. Na busca da qualidade. De novo no desacato.

O PT surgiu das lutas A saúde pública iria Também caiu num escândalo
E na primeira eleição Sair do coma profundo Chamado de mensalão
No ano de oitenta e dois Com a injeção de verbas O qual manchou o governo
Fez a grande agitação Garantia a todo o mundo Dentro da corrupção
Dizendo: Vote no três Excelência em hospital De compra de deputado
Que o resto é só burguês Seria coisa normal Para votar ao seu lado
Dê o fim à enganação. Para todo moribundo. Comendo na sua mão.

O Lula nos seus discursos E no discurso petista Agora nos seus dez anos
Era muito taxativo O combate à roubalheira O PT pra quem brilhou?
Dizia que a dívida externa Era o seu carro-chefe Responda-me quem trabalha?
Deixava o país cativo Pra pôr fim na bandalheira Quem nesse país ganhou?
E que o PT no poder Que a ética e a moral Foi empresário, banqueiro
Logo iria suspender Seriam o ponto central Quem mais levou o dinheiro
Esse roubo abusivo. Da nação alvissareira. Do seu suor que gastou.

Falando que a Reforma Montado nessas promessas Esse governo petista


Agrária neste país O PT chega ao poder Diz ter o maior prazer
Numa simples canetada Depois de quatro eleições De ser a sexta potência
Transformaria na raiz Vimos o Lula vencer Na escala do poder
A vida do camponês Com empresário de vice Sendo um líder do mundo
Retirando a do burguês Não faria mais burrice Num crescimento profundo
Deixá-lo-ia feliz. De novamente perder. A frente ele vai vencer.
ILAESE

You might also like