You are on page 1of 18

MANUTENÇÃO PREDITIVA DE INFRESTRUTURA

FERROVIÁRIA EM UM TRECHO DA MALHA DE SP.

William Rubbioli Cordeiro, MSc.


Instituto Militar de Engenharia (IME)
Antonio Carlos Rodrigues Guimarães, DSc.
Instituto Militar de Engenharia (IME)
Maria Esther Marques, DSc.
Instituto Militar de Engenharia (IME)

RESUMO

O presente trabalho buscou avaliar a influência da infraestrutura ferroviária na manutenção da integridade


estrutural de uma via férrea, e a maneira segundo a qual seu estado de conservação impacta a vida útil da
superestrutura. A caracterização de aspectos particulares da via permanente pode contribuir na
manutenção preditiva da infraestrutura. Um trecho da malha de São Paulo, administrado pela MRS
Logística foi estudado, descrevendo a interferência que uma obra de barragem visinha à linha férrea traz
sinais de percolação de água e interferindo, por consequência, na capacidade de suporte do pavimento
ferroviário. No presente estudo, a análise do segmento da via incluiu a verificação da capacidade de
suporte das camadas do subleito através de ensaios de “in situ” realizados com DCP (Dynamic Cone
Penetration) para a caracterização mecânica dos materiais empregados no pavimento de um trecho da
ferrovia. Por fim, é apresentada uma sugestão de solução ao problema de infiltração da barragem como
também de serviços de engenharia de manutenção preditiva do corpo da barragem.

ABSTRACT
This study aimed to evaluate the influence of railway infrastructure in maintaining the structural integrity
of a railway, and the manner in which their conservation status impacts the life of the superstructure. The
characterization of particular aspects of the permanent way can contribute to predictive maintenance of
the infrastructure. An excerpt from the mesh São Paulo, administered by MRS Logística has been studied,
describing the interference that a work of visinha dam to railway brings water percolation signals and
interfering therefore the carrying capacity of the railway pavement. In this study, the analysis of the track
segment includes verifying the carrying capacity of the subgrade layers through the trials of "in situ"
performed with DCP (Dynamic Cone Penetration) for the mechanical characterization of the materials
used on the pavement of a stretch of railroad. Finally, a suggestion solution to dam seepage problem as
well as predictive maintenance engineering services dam body is shown

1. INTRODUÇÃO

A operação de uma ferrovia é dependente da integração de vários sistemas distintos,


mas que podem ser agrupados, didaticamente, em via permanente e material rodante. A
via permanente é composta por subsistemas de infraestrutura e superestrutura férrea, os
quais servem de suporte para ao trânsito dos trens. O estreito relacionamento de todos
estes aparelhos contribui para um transporte ferroviário de qualidade e seguro. A figura
nr 1 exemplifica a estruturação da via permanente separada em infraestrutura e
superestrutura.

1
Fig. 1 – Via permanente é constituída pela superestrutura, localizada acima do subleito,
e pela infraestrutura ferroviária.

Utiliza-se neste trabalho o termo pavimento ferroviário, ou simplesmente pavimento,


como sinônimos para a superestrutura, uma vez que recebe os impactos das cargas do
tráfego, distribui convenientemente os esforços ao subleito e está sujeito às ações das
intempéries.

A infraestrutura ferroviária é a parte da via permanente constituída da terraplenagem e


todas as demais obras situadas abaixo do greide. É um conjunto de “aparelhos”
destinados a formar a plataforma da ferrovia e suportar a superestrutura da via
permanente. É constituída do corpo estradal abaixo do pavimento, das estruturas de
drenagem, de pontes e viadutos, de túneis que proporcionam o suporte à via férrea.
Alguns autores ainda incluem estruturas de comunicação, de edificações de pátios e
outras obras.

Da pesquisa bibliográfica realizada, pode-se constatar que existe uma grande


preocupação na manutenção da superestrutura (lastro, dormentes, aparelhos de fixação,
trilhos) avaliando diversos parâmetros que interferem na operação ferroviária. No
entanto, no Brasil, poucos são os trabalhos referentes à manutenção preditiva da
infraestrutura ferroviária, em particular aquela manutenção pertinente ao apoio à via
permanente e aos dispositivos de drenagem.

As técnicas de engenharia distinguem alguns tipos de manutenção em razão de suas


naturezas e finalidades específicas, nas macroatividades assim discriminadas na NBR
5462:
 Manutenção de Corretiva: É a manutenção efetuada após a ocorrência de uma
falha, destinada a recolocar um item em condições de executar uma função
requerida;
 Manutenção Preventiva: Manutenção efetuada em intervalos predeterminados,
ou de acordo com critérios prescritos, destinada a reduzir a probabilidade de
falha ou a degradação do funcionamento de um item;
 Manutenção Preditiva: Manutenção que permite garantir uma qualidade de
serviço desejada, com base na aplicação sistemática de técnicas de análise,
utilizando-se de meios de supervisão centralizados ou de amostragem, para
reduzir ao mínimo a manutenção preventiva e diminuir a manutenção corretiva.

2
A fim de colaborar com o desenvolvimento técnico na área de transportes, o presente
trabalho discorre sobre a manutenção preditiva da infraestrutura ferroviária. Em última
análise, elenca tópicos que possam contribuir para a prevenção de acidentes de trens e a
formulação de um sistema de gerência de via permanente.

Alguns acidentes ferroviários têm por causa raiz as características da via como as
condições da geometria de linha. O levantamento e medição de parâmetros da geometria
da linha por meio de equipamentos específicos (exemplo TrackStar) podem identificar
defeitos como o desnivelamento transversal ou longitudinal, torção ou empeno. Estes
defeitos podem ter origem no próprio pavimento ferroviário ou mesmo ser uma
composição de defeitos na qual a infraestrutura da via interfira no desempenho do
pavimento. Entretanto, uma vez que as camadas que compõem a via interagem
diretamente entre si, demanda-se uma abordagem conjunta para a real determinação da
causa raiz destas ocorrências.

Em aula expositiva, no curso de especialização de transporte ferroviário de cargas do


Instituto Militar de Engenharia (IME), em 16/07/2015; o Sr Walter Vidon apresentou
casos reais de acidentes ferroviários que possuíam como causa raiz defeitos na
infraestrutura a via, em particular, defeitos da plataforma de terraplenagem (subleito).
Também foi apresentada a importância da manutenção de sistemas de drenagem que
possam interferir no desempenho do pavimento ferroviário. As figuras 2A e 2B
exemplificam casos em que a deficiência de drenagem deteriorou o pavimento
ferroviário.

Fig 2A – Problemas de drenagem na via Fig 2B – “Gap” entre o dormente e lastro

Sendo a caracterização da via permanente um passo importante de um sistema de


gerência de via, este trabalho tem por objetivo discutir a necessidade de programar
serviços técnicos de manutenção preditiva da infraestrutura para o trecho ferroviário do
km 227 a 232 da malha de São Paulo administrada pela MRS Logística, próximo à
cidade de Queluz/SP. Assim, descreve, de maneira primordial, as condições locais da
infraestrutura ferroviária que podem influenciar na manutenção da integridade estrutural
do pavimento. Em seguida, propõe, resumidamente, um sistema de gerência da
infraestrutura da via permanente para o caso apresentado.

3
2. DESENVOLVIMENTO

2.1 - CONCEITOS

Ao estudar a influência da manutenção preditiva na integridade estrutural da via


permanente, verifica-se que o estado de conservação dos dispositivos de drenagem
impacta significativamente na vida útil da superestrutura férrea. Segundo Suzuki (2013),
o bom desempenho de uma ferrovia depende, dentre outras, das condições de drenagem
da plataforma, uma vez que a água livre acumulada na seção pode causar recalques
progressivos na linha. A água na plataforma ferroviária pode se originar de algumas
fontes, a saber: precipitação pluviométrica, fluxo superficial proveniente de áreas
adjacentes e fluxo de água subterrânea. A figura 3 ilustra as fontes de água no
pavimento.

Fig. 3 – Fontes de água no pavimento

Conforme orientações do Manual de Drenagem do DNIT e da Instrução Técnica de


Serviços de Infraestrutura da CBTU há sempre a necessidade de se manter o nível do
lençol freático a profundidades de 1,50 a 2,00 metros abaixo do subleito das vias. Tal
orientação considera a ascensão capilar a partir dos lençóis d'água. A perda de
resistência de camadas de solo da via permanente produzida pela "franja capilar" deve
ser eliminada, ou reduzida por meio de dispositivos de drenagem profunda.

Os principais problemas da drenagem inadequada referem-se ao acúmulo de água no


subleito. Em condições de umidade elevada, com o lastro contaminado e sem uma
drenagem eficiente, o processo de migração de lama e de finos é contínuo, afetando o
desempenho da via em vista da perda de elasticidade do material granular, ocorrência de
recalques diferenciais, deformações permanentes no subleito e consequentes alterações
na geometria da linha. A Figura 4 mostra a forma progressiva de ruptura por
cisalhamento do subleito pela saturação do material e de formação de bolsões de lama
pelo fenômeno de bombeamento.

4
Fig. 4 - Forma progressiva de ruptura por cisalhamento do subleito

2.2 - PROPOSTA DE ADEQUAÇÃO DA MANUTENÇÃO PREDITIVA


DA INFRAESTRUTURA PARA O TRECHO FERROVIÁRIO EM ESTUDO

A premissa da manutenção preditiva da infraestrutura é o monitoramento contínuo de


indicadores da condição operativa da via permanente, sendo os dados coletados por
equipamentos específicos, e comparados à parâmetros de desempenho. Passa por uma
filosofia em que o objetivo é tomar uma decisão de intervenção quando o sistema de
monitoramento apresentar um grau de degradação próximo ao limite estabelecido. Este
tipo de acompanhamento possibilita a preparação prévia de serviços de engenharia,
dentre outras decisões, selecionando as alternativas mais viáveis técnico-econômicas
que possam dar continuidade à operação ferroviária. (PINTO; XAVIER, 2001) Nestas
considerações os trabalhos de Silva (2002) e Alves (2012) são exemplos para a
formulação de procedimentos de manutenção preditiva da via permanente.

Mas, além do monitoramento sistemático, uma manutenção preditiva também deve


possuir como finalidade a rotina de registros. A formação de um banco de dados em
uma sequencia evolutiva das características avaliadas contribui para o embasamento
técnico de futuras intervenções de engenharia. Arquivos de caracterização da área,
aspectos genéricos, desempenhos da operação ferroviária, relatos históricos e
principalmente fotográficos, mapas de solos, descrição geomorfológica, cartas
topográficas, clima, registros de nível d’água, e outros são exemplos de informações
importantes a serem elencadas no banco de dados. Mais recentemente inclui-se a
possibilidade da utilização de imagens obtidas por veículos aéreos não tripulados
(VANT) que podem auxiliar em decisões técnicas.

A motivação para a pesquisa teve origem nos anos de 2009 e 2010, quando este autor
teve a oportunidade de visitar a construção das usinas hidrelétricas de Queluz e de
Lavrinhas, no estado de São Paulo. Estas possuem capacidade instalada de 30
megawatts cada uma e altura máxima da barragem principal de 18,5 e 16,5 metros
respectivamente. Naquela oportunidade (2009/ 2010), durante a visita, foi verificado
que a faixa de domínio da linha férrea administrada pela MRS fazia divisa com os dois
empreendimentos. Ficou a questão, na época, se as obras das usinas poderiam interferir

5
na operação ferroviária. Para elucidar esta questão, discorre-se a seguir as características
técnicas que compõem o estudo em pauta.

2.2.1 – CARACTERIZAÇÃO DO LOCAL

O projeto da obra previa o aproveitamento hidrelétrico do rio Paraíba do Sul, na região


de Queluz e Lavrinhas /SP, por meio da construção de pequenas centrais hidrelétricas
(PCHs), formando 2 lagos de inundação dentro da calha do próprio rio, a fim de
minimizar os impactos ambientais. O lago de inundação é ladeado pela rodovia
Presidente Dutra, na margem esquerda do rio Paraíba do Sul, como também pela via
férrea da MRS na margem direita, conforme mencionado anteriormente. As figuras
abaixo detalham a localização do empreendimento e aspectos gerais.

Fig. 5.A – Via e Rodovia ladeando barragem Fig. 5.B – Via e Rodovia ladeando barragem

Fig. 5.C – Via e Rodovia ladeando barragem Fig. 5.D – Via e Rodovia ladeando barragem

A cota de inundação da barragem prevista situava-se por volta de 15 metros acima do


leito natural do rio. Para a rodovia, esta era uma cota limite. No entanto, para a ferrovia,
em determinados trechos, esta cota ultrapassava a cota do leito da linha férrea em
valores variáveis de 5 a 7 metros de altura. A solução encontrada foi construção de
barragens secundárias de terra ao longo da linha férrea para compatibilizar esta questão.

6
O foco deste trabalho não é a barragem transversal à calha do rio, a qual pode ser
elencada como a barragem principal dos empreendimentos. Mas sim barragens (diques)
secundárias, necessárias à elevação da cota de nível d’água e que tem a função de
garantir a segurança de outros “aparelhos” públicos ou particulares pré-existentes. Os
esquemas abaixo e as fotos exemplificam a questão.

Fig. 6.A – Via e Rodovia ladeando – foto 2008 Fig. 6.B – Via e Rodovia ladeando – foto 2015

Fig. 6.C – Detalhes da via férrea e da barragem Fig. 6.D - Vista do lago de inundação pela
de Lavrinhas. Diferença de cotas de 5 metros rodovia. Ao fundo o dique que protege a
em média ferrovia, a qual está em uma cota abaixo do
lago, e, portanto, atrás deste dique.

7
Fig. 6.E – Esquema da seção mista da via, antes da obra da barragem (ano de 2008)

Fig. 6.F – Esquema da seção mista da via, após da obra da barragem (ano de 2012)

Quando foi construída a via em estudos no meados do século passado, o eixo


geométrico da superestrutura foi balizado pelo vale do rio Paraíba do Sul e as encostas
das elevações circunvizinhas. Assim, o trecho compreendido entre os km 227 a 232
possui, em sua maioria, a plataforma original de terraplenagem em seção mista.

Já nos anos de 2008 a 2010, a construção das barragens de Queluz e Lavrinhas mudou
não somente a topografia da área, mas, principalmente, também as características hidro
geológicas dos lençóis freáticos das encostas e calha do rio. Com o levante do nível
d’água, os fluxos naturais e profundidades dos lençóis freáticos foram alterados.

Nesta pesquisa, os projetos das barragens em pauta, que compõem o empreendimento


do complexo das usinas, não foram disponibilizados para a consulta. Mas, por meio de
conversas com funcionários do empreendimento e/ou o resgate de fotos da fase
construtiva da obra, podem-se inferir algumas características dos diques que ladeiam a
ferrovia.

São barragens de terra, que, segundo informes, possui um núcleo impermeável. Sua
altura pode variar de 10 a 15 metros, dependendo da topografia local. Sua crista fica em
média 6 metros acima da cota do leito da via férrea. Em determinados trechos possui um
dreno de pé. Em outros, também possui drenos horizontais com 1,5 m de comprimentos

8
para dentro do corpo no talude de jusante. Não foram coletadas informações sobre a
fundação das barragens secundárias, mas observando fotos do arquivo da obra, acredita-
se que esta se assentou em terreno natural. A sequência de imagens detalha as
informações da barragem em pauta.

Fig. 7.A – Esquema da seção da obra da barragem

Fig. 7.B – Fotos da época da construção da barragem secundária

9
2.2.2. DESCRIÇÃO DAS SOLUÇÕES TÉCNICAS PARA A
COMPATIBILIZAÇÃO DO NÍVEL DÁGUA DA BARRAGEM E A
COTA DA FERROVIA, E SOLUÇÃO DA DRENAGEM.

Importante destacar soluções criativas e particularidades que o projeto em discussão


exigia. A compatibilização do futuro nível d’água com as vias de transportes já
existentes nas proximidades do lago de inundação era um desafio a ser contornado na
construção das duas usinas. Assim, parte técnica interessante do empreendimento das
duas barragens foi a solução encontrada para a drenagem da ferrovia que ladeava a obra.
Conforme mencionado anteriormente, na época da implantação da via férrea, o eixo
geométrico da superestrutura estava limitado pelas elevações topográficas e pela calha
do vale do rio Paraíba do Sul. Assim, o projeto das barragens procurou conduzir as
águas de precipitação que interferiam na ferrovia para um ponto baixo, acumulá-la em
um reservatório, bombeá-la para um reservatório superior, do qual, por canal
comunicante, ligava-se ao reservatório da barragem. A figura 8 exemplifica um
reservatório de acúmulo de água e o reservatório principal da barragem de Lavrinhas,
próximo ao km 232 da via. Por meio de um sistema de tubos, aproveitando a rede de
bueiros antigos da ferrovia (drenagem de transposição de talvegue), os reservatórios se
conectam pela teoria de canais comunicantes, equilibrando as pressões hidráulicas dos
respectivos reservatórios.

Fig. 8 - Montagem de duas imagens ladeadas, fotografadas em sequência. (km 232)

Próximo ao km 228, a figura abaixo apresenta a casa de bombas de outro ponto de


coleta de água da ferrovia e o correspondente recalque para um reservatório superior, do
qual, por canal comunicante, se interliga ao reservatório principal da barragem de
Queluz.

10
Fig. 9 – Fotos da casa de bombas de recalque da água de drenagem

O esquema abaixo detalhe a coleta das águas da plataforma ferroviária, e o respectivo


recalque para um reservatório elevado. Este fato ocorre, pois o nível d’água da
barragem está acima da plataforma.

Fig. 10 - Sistema de drenagem profunda abaixo do nível do lençol d’água.


(Fonte:Adaptado de Diogo, 2014)

2.2.3. – PARTICULARIDADES DO TRECHO DO KM 227 AO 232

Para o desenvolvimento deste trabalho foi escolhido o trecho ferroviário do km 227 ao


232 da malha do estado de São Paulo, próximo à cidade de Queluz/SP, administrado
pela MRS Logística. A superestrutura da ferrovia neste trecho possui as seguintes
características: trilho do tipo TR – 57, dormentes de madeira ou aço, bitola larga (1,60
m), lastro de pedra britada com espessura variando de 15 a 80 cm. A composição do
transporte ferroviário é caracterizada por ser de 50% de trens de minério, 30% de
produtos metalúrgicos e de 20% de carga geral. Com uma média de 17 trens por dia e de
peso máximo por eixo dos vagões de 30 toneladas.

Este autor fez uma visita técnica no local em pauta no dia 26/03/2015, tendo por
objetivo caracterizar a área, destacando aspectos da infraestrutura férrea que pudessem

11
interferir na operação de transporte ferroviário. Foi constatado que a plataforma da via
apresentava elevada umidade nas camadas mais próximas ao pavimento. A
profundidade do nível d’água em relação ao lastro era de apenas 70 a 80 cm em média.
Uma valeta havia sido aberta ao lado da superestrutura na qual se verificava o “brotar de
olhos d’água”, mostrando um fluxo ascendente do lençol freático. As figuras abaixo
apresentam a situação.

Fig. 11.A – Fotos do trecho 232 - detalhe da Fig. 11.B – Fotos do trecho 232 – detalhe da
valeta no pé do talude de jusante da barragem valeta e da saída de um dreno. A profundidade
deste dreno é de 60 cm.

Fig. 11.C – Fotos do trecho 232- detalhe da Fig. 11.D – Fotos do trecho 232 - detalhe da
valeta escavada e da profundidade da água na valeta escavada e do “brotar um olho d’água”
plataforma = 60 cm. na plataforma com profundidade de 60 cm.

Técnicos da residência de via permanente do Vale do Paraíba forneceram alguns dados


do trecho para a formulação deste trabalho. Em particular aqueles relativos ao
desempenho do pavimento ferroviário em período anterior ao enchimento do lago da
barragem próximo ao km 232, e após o seu enchimento. O parâmetro avaliado é o
Track Quality Index (TQI) – Índice de Qualidade da Via, que é definido como sendo
“um número, derivado de fórmula, tido como representativo de dados observados da

12
via, os quais são estabelecidos como capazes de indicar a capacidade da via permanente
de cumprir sua função”(AMERICAN RAILWAY ENGINEERING ASSOCIATION
(1998)). Este parâmetro pode indicar alterações nos alinhamentos em planta e perfil
devido aos recalques diferenciais na via. Tal aspecto pode tornar aquele trecho em
“crítico”, principalmente quando estes recalques ocorrem em espaços relativamente
curtos, causando balanços e falta de apoio em algumas rodas do trem, e a
correspondente possibilidade de descarrilamento das composições. O gráfico abaixo
apresenta a evolução do TQI médio do trecho em análise, confrontado a outro trecho
em prefeitas condições (km 179 - trecho utilizado como parâmetro de comparação).

Fig. 12 – Gráfico de comparação de TQI entre km 179 e km 232

Do gráfico acima, no ano de 2011 foi realizado um trabalho de manutenção de socaria


do lastro na via, incluindo os dois trechos apresentados (km 179 e km 232). Como nos
dois trechos o tráfego é idêntico, esperava-se uma evolução do TQI de forma similar.
No entanto, após o enchimento do lago de inundação (2011 em diante), o gráfico acima
apresenta que o TQI piora sensivelmente no km 232, aumentando a uma taxa de 0,7 ao
ano, enquanto que no km 179 este parâmetro permanece dentro dos limites esperados.

Outro aspecto a ser considerado era a contaminação do lastro ferroviário. Durante as


obras de construção da barragem, a uma primeira vista dos arquivos fotográficos, foi
acrescentada uma camada de solo lateralmente ao lastro, fato este percebido localmente
durante a vista técnica de 26/03/2015. Sabe-se que, quando o lastro se apresenta
contaminado ou, quando as saídas laterais se encontram obstruídas, o material do lastro
e sublastro se tornam saturados, implicando perda de resistência ao cisalhamento, e a
respectiva diminuição na capacidade de suporte e, o correspondente aparecimento de
recalques diferenciais na via. A figura 13.A, analisada do banco de dados da fase
construtiva da obra da barragem, como a figura 13.B exemplificam a questão, induzindo
uma suposta obstrução das saídas laterais do lastro. Se confirmado, tal fato poderia
contribuir para a explicação da evolução negativa do parâmetro TQI, pois, com o

13
sublastro saturado, o pavimento perde resistência e pode levar à recalques diferenciais
na via.

Fig. 13.A – Serviços de engenharia Fig. 13.B – Esquema de drenagem pelo


durante a fase construtiva da barragem lastro da via

A fim de estimar a capacidade de suporte do subleito, foi utilizado um equipamento de


ensaio “in situ” de simples execução. O DCP (Dynamic Cone Penetration) é um
equipamento portátil, de execução simples e resultados imediatos, que fornece o
parâmetro de resistência à penetração de um cone padronizado sujeito à golpes de
energia padronizada.

O ensaio foi realizado na plataforma ferroviária na jusante da declividade da drenagem


da plataforma nos primeiros 90 cm, compreendendo as camadas de sublastro e subleito.
As figuras 14.A a 14.C mostram os ensaios e os resultados de dois ensaios realizados
em dois trechos de análise.

Fig. 14.A – Ensaio DCP no km 179 Fig. 14.B – Ensaio DCP no km 232

A finalidade da execução deste ensaio era a verificação “in situ” das condições de
resistência das camadas da infraestrutura nos trechos em pauta, a fim de inferir o quanto
a presença excessiva da umidade nas camadas da plataforma poderia interferir. Os
trechos escolhidos possuíam características técnicas e tráfego ferroviários similares, a
fim de possibilitar comparações.

14
Fig. 14.C – Resultados com o DCP nos km 179 e 232 da via permanente.

Analisando o gráfico, os resultados mostram que, no km 179, após 15 golpes do


equipamento foi atingida a profundidade de 300 mm, enquanto que, com os mesmos 15
golpes, a profundidade alcançada foi de 670 mm.

Este ensaio permite a correlação com o Índice de Suporte Califórnia (CBR) por meio de
formulações empíricas. A relação do DCP com a resistência do solo (CBR) é definida
pela declividade da curva que associa o número de golpes na abscissa pela profundidade
de penetração (em mm/golpe) nas ordenadas, considerando um determinado segmento
linear. Assim, utilizando-se a formulação de Oliveira/Vertamatti, percebe-se que a
resistência das camadas do subleito do km 179 é maior que no km 232, diante da presença
de umidade elevada, fora das especificações nas camadas da infraestrutura do km 232.

Para a classificação do solo das camadas em análise, foram retiradas amostras deformadas
do km 179 e 232, e analisadas no laboratório do IME pelos critérios da classificação
unificada SUCs e da classificação HRB. A TABELA 01 apresenta os resultados das
classificações e o valor de CBR por meio do ensaio do DCP mencionado acima.

Tabela 01 – Resultados dos ensaios dos trechos do km 179 e 232 em estudo


Classificação Classificação CBR calculado a partir
SUCs HRB dos ensaios do DCP
Solo do km 179 ML A-2-4 13
Solo do km 232 MH A-2-7 6

Da análise de todas as informações descritas, a questão anteriormente exposta, se as


obras de construção das barragens secundárias necessárias à compatibilização do nível
d’água da barragem com a cota do eixo da via férrea poderiam interferir na operação da
ferrovia, apresenta então algum fundamento. Deixa de ser somente uma suposição para
exigir um procedimento de constante monitoramento por meio de critérios técnicos, a
fim de prever medidas de manutenção da via permanente.

15
No entendimento deste autor, acredita-se que esteja ocorrendo uma percolação pela
fundação da barragem secundária que interfere na plataforma ferroviária. A figura 15
apresenta o esquema que exemplifica esta percolação. Pela análise de fotos da época da
obra, não se percebeu qualquer tratamento nas fundações da barragem de terra em
estudo. Assim sendo, as fissuras naturais existentes desde a implantação da via em
meados do século passado, por causa da construção da plataforma em seção mista, ou
aquelas existentes devido às condições naturais, podem estar permitindo a percolação
pela barragem em pauta. Por exemplo, a figura 11.B exposta acima mostra a percolação
pelo dreno de pé do talude de jusante do corpo da barragem.

Fig. 15 – Esquema de percolação de água pela barragem, atingindo as camadas da


infraestrutura ferroviária.

Nesta oportunidade, como uma sugestão para o fato narrado, descreve-se que a
implantação de drenos verticais, do tipo dreno fibroquímico, e colchão drenante, que
venham desaguar na sarjeta que “corre” no pé do talude da barragem (fig 11.A), pode
colaborar na diminuição do problema. O dreno vertical teria a dupla função de servir de
poço de alívio contribuindo na manutenção da estrutura do maciço da barragem, como
também de dreno para as camadas do pavimento ferroviário. O esquema da figura 16
apresenta a solução proposta.

Fig. 16 – Esquema: sugestão de solução que contempla a instalação de drenos verticais


(DV) e de colchão drenante (CD) ao lado da via permanente.

16
2.2.4 – PROPOSTA DE ADEQUAÇÃO DA MANUTENÇÃO PREDITIVA DA
INFRAESTRUTURA DO TRECHO FERROVIÁRIO DO KM 227 AO 232.

Como proposta de manutenção preditiva da infraestrutura, entende-se que qualquer


sistema precisa ser adequado às finalidades da região em análise e às condições de
execução. Assim, uma primeira atitude necessária é a abordagem sistêmica da via,
procurando enxergar a interação entre todos os sistemas. A constante atualização do
banco de dados das instalações da infraestrutura contribui nas decisões de manutenção
preditiva.

No caso em estudo deste trabalho, a segurança estrutural das barragens que ladeiam a
ferrovia ressalta-se de importância, a qual deve ser realizada através de inspeções,
monitoramento por auscultação, análise do comportamento das estruturas e manutenção.
O Manual de Segurança e Inspeção de Barragens do Ministério da Integração Nacional
é uma fonte bibliográfica de referência.

Para a manutenção preditiva da infraestrutura do km 227 ao 232 da malha ferroviária do


estado de São Paulo, administrado pela MRS Logística, sugere-se a implementação das
seguintes atividades básicas de segurança de barragens, sendo estas atividades
acrescentadas à rotina normal de manutenção da infraestrutura do trecho em pauta:

a) Inspeções visuais nas superfícies aparentes das estruturas de terra;


b) Inspeções visuais nas estruturas da casa de bombas do km 228;
c)Monitoramento por auscultação dos instrumentos civis instalados nas
barragens de terra;
d) Levantamento topográfico de deslocamento nas barragens de terra;
e) Monitoramento eco batimétricos a montante a jusante das barragens, para o
controle de erosões e assoreamento;
f) Armazenamento informatizado dos bancos de dados de auscultação das
barragens;
g) Avaliação da segurança estrutural das barragens;
h) Manutenção, conservação e atualização dos instrumentos de auscultação;
i) Monitoramento da drenagem ao é da barragem, avaliando o volume drenado e
a quantidade de finos existentes na água drenada, a fim de constatar o
carreamento de material do corpo da barragem.
Os instrumentos de auscultação podem ser assim elencados: piezômetros, medidores de
níveis d’água e inclinômetros.

Por último, mas não menos importante, este autor relaciona algumas observações que
merecem estudos aprofundados a fim de garantir a segurança dos empreendimentos
envolvidos, a ferrovia e a barragem em questão, que devem ser acrescentados à
manutenção preditiva da infraestrutura.

1) A crista da barragem está dimensionada para qual evento climático? Ainda,


qual o sistema de monitoramento disponível que possa contribuir na previsão
de acidentes e esteja disponível para a MRS Logística?
2) O sistema de bombeamento do km 228 é seguro? Qual a sua capacidade e
planos de contingência?

17
3. CONCLUSÃO

O objetivo do trabalho foi a descrição da necessidade de um plano de manutenção


preditiva para a infraestrutura ferroviária. Em particular a caracterização do trecho do
km 227 ao 232 da malha ferroviária de São Paulo.

Durante os estudos efetuados, percebeu-se que a infraestrutura pode vir a interferir


significativamente no desempenho do pavimento, visto que esta serve de suporte à
superestrutura. Mas também que o método de manutenção preditiva deve ser adequado
à cada trecho, pois deve considerar as peculiaridades locais.

No trecho em pauta, a peculiaridade que ressalta é a existência de uma barragem que


ladeia a via permanente. Esta barragem parece estar interferindo na operação
ferroviária, ao passo que a percolação da água está aumentando a umidade da
plataforma da ferrovia, diminuindo a capacidade de suporte do pavimento.

Ressalta-se o fato, que segundo informes, é plano da MRS aumentar o tráfego na região,
o que poderá acarretar na necessidade de maior manutenção na área. Assim, sugere-se a
implementação de estudos aprofundados na região analisada neste trabalho.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
ALVES, Stefânia M.; Proposta de Monitoramento das Encostas MRS Logística S/A.
Monografia de Fim de Curso de Especialização de Transporte Ferroviário de Carga.
Instituto Militar de Engenharia (IME). Rio de Janeiro/RJ. 2012.

DIOGO, F. Drenagem: especialização em transporte ferroviário de cargas no Instituto


Militar de Engenharia, 06 de set. 2014. Notas de Aula.

Ministério da Integração Regional (2002) Manual de Segurança e Inspeção de


Barragens. Brasília: Ministério da Integração Regional.

(2005) Manual de Preenchimento da Ficha de Cadastro de Barragem.


Ministério da Integração Regional. Molle, F. e Cadier, E. (1992) Manual do Pequeno
Açude. Recife: SUDENE.

PINTO, A. K.; XAVIER, J. A. Manutenção Função Estratégica. Rio de Janeiro:


Qualitymark, 2001.

SILVA, Luiz Francisco Muniz, Pavimentos Ferroviários e Esboço de um Sistema de


Gerência Aplicado à manutenção da Via Permanente. Tese de doutorado.
COPPE/UFRJ, Rio de Janeiro, Brasil. 2002.

SILVEIRA, J. F. A. Instrumentação e Segurança de Barragens de Terra e


Enrroncamento. Oficina de Textos, 2006.

VALLEJO, L. I. et al. Ingeniería Geológica. Madrid: Person Prentice Hall, 2004.

18

You might also like