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Editor
Edson Manoel de Oliveira Filho
Gerente Ediorial
Sonnini Ruiz
Preparação de texto e Revisão técnica
Carlos Nougué
Revisão
Aline Naomi Sassaki
Capa e projeto gráfico / diagramação
Mauricio Nisi Gonçalves / André Cavalcante Gimenez
Pré-impressão e impressão
Edições Loyola
PHILIBERT
SECRETAN (org.)
tradução
Luiz Paulo Rouanet
A vida
Xavier Zubiri Apaltegui nasceu em 4 de dezembro de 1898,
em San Sebastian. Estudou Filosofia em Madri e Louvain, onde
obteve a licenciatura sob a orientação de Léon Noël, com um tra-
balho sobre “O problema da objetividade em E. Husserl: a lógica
pura”. Após um doutorado em Teologia obtido em Roma, obteve,
no mesmo ano, o grau de Doutor em Filosofia em Madri, com uma
tese intitulada: “Ensaio de uma teoria fenomenológica do direito”.
Em dezembro de 1926, foi nomeado para a cátedra de História da
Filosofia na Universidade de Madri. Sua docência foi interrompi-
da em 1928 para uma viagem de estudos à Alemanha. De 1928 a
1930, residiu em Freiburg im Breisgau, onde frequentou os cursos
de Husserl e de Heidegger. Depois, foi a Berlim (em 1930-1931),
onde participou dos seminários de Nicolai Hartmann, Einstein,
Schrödinger, Köhler, Goldstein e Mangold. Após seu retorno à
Espanha, lecionou novamente em Madri, até sua partida para
Roma, em 1936. Foi aí que o surpreendeu o início da Guerra da
Espanha. Viveu inicialmente em Roma, depois em Paris, onde fre-
quentou seminários de Física (com de Broglie) e de línguas orien-
tais (com Labat, Benveniste, Delorme e Delaporte). Após o final
A obra
A obra filosófica de Zubiri se estende de 1921 até sua morte,
em 1983. O autor mesmo distingue três fases em sua trajetória de
pensamento. Nós as denominaremos fase fenomenológica, fase
ontológica e fase metafísica.
a) A fase fenomenológica. Os trabalhos de Zubiri entre 1921 e
1928 trazem a marca de uma forte influência de Husserl. No pre-
fácio à edição inglesa de Natureza, História, Deus, Zubiri descreve
essa fase da seguinte maneira:
[Nessa época] a filosofia achava-se determinada antes dessas datas
pelo lema da fenomenologia de Husserl: zu den Sachen selbst, “às
coisas mesmas”. Certamente essa filosofia não era dominante até
então. A filosofia vinha sendo uma mistura de positivismo, histori-
cismo e pragmatismo apoiada em última instância na ciência psi-
cológica, um apoio que se expressou como teoria do conhecimento.
Partindo desta situação, Husserl criou, com uma crítica severa, a
fenomenologia. É uma volta do psíquico às coisas mesmas. A fe-
nomenologia foi o movimento mais importante a abrir um campo
próprio ao filosofar enquanto tal. Foi uma filosofia das coisas e não
só uma teoria do conhecimento. Esta foi a remota inspiração co-
mum da etapa 1932-1944: a filosofia das coisas. A fenomenologia
teve assim uma dupla função. Uma, a de apreender o conteúdo das
coisas. Outra, a de abrir o livre espaço do filosofar diante de toda
servidão psicológica ou científica. E esta última função foi para
1
“Prólogo à tradução inglesa”. In: Natureza, História, Deus. Trad. Carlos Nougué.
São Paulo, É Realizações, 2010, p. 27.
2
Op. cit., p. 14.
O pensamento
A filosofia de Xavier Zubiri parte sempre da análise da apre-
ensão (aprehensión) da realidade pelo homem. Certamente, a
filosofia poderia examinar as coisas fora dessa apreensão e in-
dependentemente dela, ou deveria fazê-lo; mas semelhante exa-
me careceria de profundidade se ela se privasse da referência ao
que possui de originário e insuperável no que se dá à apreensão.
A imagem da consciência pura, segundo Husserl, a aprehensión,
segundo Zubiri, portanto, possui prioridade absoluta e se aproxi-
ma do domínio da “filosofia primeira”.
No ato de apreensão, distinguem-se dois aspectos: a intelecção
da coisa mesma, e as coisas enquanto apreendidas pelo intelecto.
Zubiri os considera como dois momentos igualmente originários,
pois nenhum deles é anterior ao outro. O realismo antigo concede
à coisa prioridade sobre o conhecimento; já o idealismo situa o
conhecimento antes da realidade. O primeiro funda a metafísica
no sentido clássico – e algo pejorativo. O outro funda a teoria do
conhecimento (crítica, epistemologia). Ambos constituem erros
perigosos. Pois, se pusermos a questão filosófica de maneira radi-
cal, veremos que o saber e a realidade são igualmente originários
e, desse modo, inseparáveis.
Isto significa que sem a realidade não há saber; mas, igualmen-
te, sem o saber não há realidade; a realidade – como Zubiri gosta
de afirmar – é o caráter formal sob o qual a coisa se efetiva para
o homem na apreensão. “Realidade é o caráter formal – a forma-
lidade – segundo o qual o apreendido é algo ‘em próprio’, algo de
seu. E saber é apreender algo segundo essa formalidade.”4
O saber elementar, primário e originário, portanto, não é co-
nhecimento no sentido de uma epistemologia, mas apreensão de
3
Ver a esse respeito a contribuição de A. Ferraz Fayos, p. 65-76 do presente livro.
4
Xavier Zubiri, Inteligência e Realidade. Trad. Carlos Nougué. São Paulo,
É Realizações, 2011, p. XL.
A intelecção
O momento noético da apreensão cognitiva
Em Inteligência Senciente, Zubiri submeteu a intelecção hu-
mana a uma análise detalhada. Desde as primeiras páginas, ele
explica que só visa a “descrever” o ato de apreensão das coisas tal
5
Idem, p. LV-LVI.
A realidade
O momento noemático da apreensão cognitiva
Na apreensão, nós atualizamos o que nos deixa uma
“impressão”. É, portanto, alguma coisa “outra” que se atualiza.
A “religação”
O momento noergético da apreensão cognitiva
A realidade não se apresenta a nós somente na intelecção (no
momento da alteridade), mas ela nos submete à sua força de atra-
ção própria. Mais do que possuir a verdade da coisa, o homem se
encontra submetido a ela. A força de atração que domina o ho-
mem é o terceiro momento da apreensão. Essa força emana das
coisas e se exerce sobre o homem em situação de apreensão. Ela
6
Xavier Zubiri, El hombre y Dios. Alianza Editorial, Madrid, 1984, p. 92 ss.