You are on page 1of 26

História da Educação

História da Educação

ÍNDICE

CAPÍTULO I – AS PRINCIPAIS FASES DO DESENVOLVIMENTO


DAS IDÉIAS EDUCACIONAIS ................................................................................02

CAPÍTULO II– OS SISTEMAS NACIONAIS DE EDUCAÇÃO.............................................................18

CAPÍTULO III – A EDUCAÇÃO NA EUROPA E NOS ESTADOS UNIDOS NO SÉCULO


XIX,..................20

Instituto de Formação e Educação Teológica – www.ifete.edu.br


CAPÍTULOIV– EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA..............................................................................25

CAPÍTULOV – EDUCAÇÃO NO BRASIL.........................................................................................27

COMCLUSÃO.............................................................................................................................30

BIBLIOGRAFIA...........................................................................................................................30

1
História da Educação

CAPÍTULO I

AS PRINCIPAIS FASES DO DESENVOLVIMENTO DAS IDÉIAS EDUCACIONAIS

Na Antigüidade Oriental.

Em documentos escritos, que nos chegaram das mais antigas civilizações orientais, temos exemplos
de que a educação Institucionalizada se iniciou com a especialização das funções sociais, no sentido da
profissionalização de atividades. Entre os habitantes da Suméria, entre assírios e babilônios, o aprendizado
artesanal pela iniciação numa determinada profissão, como as de pedreiro, carreiro, ferreiro, etc., chegou a
ser objeto de prescrições legais, ou melhor, de determinações do governo real. Mas, ao mesmo tempo, essa
diferenciação progressiva das funções sociais criava necessidades profissionais de outro tipo, talvez de
aprendizagem mais refinada, mais longa, mais difícil. De um lado, em todas as civilizações orientais, o culto
religioso passou a ter função social das mais importantes, não só de natureza mística ou espiritual, mas ainda

Instituto de Formação e Educação Teológica – www.ifete.edu.br


econômica, política e moral. Daí uma organização da classe sacerdotal, que pressupunha longa e difícil
preparação ou iniciação profissional. Por outro lado, a formação do príncipe e dos nobres, que deviam ter
responsabilidade administrativa, passou também a exigir cuidados diferentes da que pressupunha o simples
adestramento de chefes de bordas guerreiras, Assurbanipal, rei assírio, disse de sua própria formação: "Eu,
Assurbanipal, compreendi a sabedoria de Nabu, adquiri a compreensão de todas as artes da escrita. Aprendi a
atirar com o arco, a guiar cavalos e carros... Marduk, o sábio deus, dotou-me com sabedoria e compreensão...
Enurt e Nergal fizeram-me viril e forte e de incomparável força. Aprendi a arte do sábio Adapa, os ocultos
segredos da arte dos escribas; nos monumentos celestes e terrestres eu li e sobre eles ponderei; às reuniões
dos clérigos estive presente; observei os presságios, interpretei os céus com os sacerdotes, recitei as
complicadas multiplicações e divisões que não são imediatamente aparentes... Montei potros, guiei-os com
prudência, para que não se tornassem violentos; distendi o arco, lancei a seta, o signo do guerreiro.
Arremessei o dardo como lança curta... Empunhei as rédeas como um cocheiro... Dirigi ,a leitura dos escudos
de vime, bem como a dos peitorais, como um artífice. Adquiri o saber que os mestres de todas as classes
possuem, quando chegam ao tempo da maturidade. Ao mesmo tempo, aprendi a mandar, e segui o meu
caminho de rei."
Institucionalizava-se, assim, a educação e as primeiras teorias educacionais teriam que surgir por
certo. Eram regras, conselhos, preceitos que deveriam orientar a ação educativa de pais e mestres. No velho
Egito, cuja educação é caracterizada por vários autores
como profissional; prática e clerical, toda urna série dessas máximas foi registrada em papiros que perdura-
ram até nossos dias. Algumas dessas máximas verberavam a ignorância e exortavam à conquista da
sabedoria, tendo já em vista uma escola de transmissão de conhecimentos (ouvir, ler e escrever), função que
ela deveria ter por muitos séculos. "0 homem Ignorante" - diz um desses papiros, de autoria anônima -"é
como um jumento pesadamente carregado; tem que ser dirigido por um escriba". E outro aconselha: "Põe-te
a trabalhar e torna-te um escriba, porque serás um diretor de homens." Certamente esse conselho se referia à
função que teriam os escribas na escrituração dos negócios privados e públicos, sendo portanto homens de
quem, até certo ponto, reis e ricos comerciantes dependiam.
No que dizia respeito à motivação do ensino, quase todas. as mais antigas civilizações orientais
consagravam a punição física como de resultados certos. "Os ouvidos de um rapaz" - registra ainda certo
papiro egípcio - "estão em suas nádegas; ele ouve quando é espancado".
Em sociedades estruturadas, por classes mais ou menos rígidas, dirigidas por um poder central mais
ou menos despótico, a educação só poderia ser eficiente quando procedesse de cima para baixo. Era uma
força coercitiva de formação e adaptação aos escalões sociais, que se supunham imutáveis.
Na Índia, a educação Institucional era, e foi até há pouco tempo, um privilégio de castas. 0 Ideal
educativo do povo, ou melhor, dos brâmanes - que, no dizer de A. Weber, estavam tão próximos do céu
quanto distantes da vida ordinária, quotidiana" - era "aprender e compreender os Vedas, praticar piedosas
mortificações, adquirir o conhecimento divino da fé e da filosofia, tratar com veneração a seu pai natural e a
seu pai espiritual".

2
História da Educação

Os hebreus, o chamado povo escolhido de Deus, cuja literatura religiosa perdura até nossos dias,
condicionando o comportamento religioso de uma grande parcela do mundo ocidental, só tiveram
instituições escolares depois do cativeiro da Babilônia. Há no Talmude (século II da era cristã) referências
explícitas a escolas, inclusive à elementar, básica e comum a todas as crianças.
Isso não impediu, porém, que o Deuteronômio - que coroa o Pentateuco, série de cinco livros de
Moisés - tenha várias regras e prescrições de educação, a serem seguida pelos pais. Era a educação patriarcal,
no selo da família, sob a responsabilidade do chefe familiar: "Escuta, Israel, estas palavras que te mando hoje
e que estarão em teu coração; nelas instruirás teus filhos e as meditarás em tua casa e andando pelo caminho,
ao ires dormir e ao te levantares".
Já os provérbios exaltam o poder educativo das punições: "Não apartes o castigo de teu filho; se o surrares
com a férula, não morrerá. Sacudirás a vara e o livrarás e à sua alma do inferno". "A vara e a coerção
comunicam a sabedoria..."
Esta concepção do castigo físico, como estímulo de aprendizagem, é comum a todas as organizações
nacionais antigas, de cunho autocrático, cristalizadas e estáveis em sua estrutura social. As mudanças, então,
eram apenas as provocadas pelas guerras, que, entretanto, não alteravam a estrutura básica, mudando apenas
os homens que compunham as castas dominantes e que, geralmente, passavam a provir dos conquistadores.
Os Impérios se sucediam, mas a sociedade, estruturalmente, não sofria grandes alterações.

Instituto de Formação e Educação Teológica – www.ifete.edu.br


Na China - a velha China dos mandarins - que só há um século começou a mudar, nem essa sucessão
de impérios era freqüente. Daí um sistema educacional estável, consagrado por uma ideologia educacional
que se transmitia de geração a geração, através dos sábios textos que consubstanciavam a superestrutura
moral da sociedade chinesa.
"O que o céu tem conferido se chama natureza; a conformidade com ela é caminho do saber; a
direção de tal caminho se chama educação."
"O homem ao nascer é por natureza radicalmente bom. Nisto todos são iguais, mas na prática se
diferenciam grandemente. Se não se educa o caráter natural, ele muda. Criar e não educar é um erro dos pais.
As pedras sem lapidar nada podem formar de útil."
Tradicionalistas e conservadoras, não podiam as civilizações orientais antigas, justamente por falta
daquele agudo conflito de valores que caracteriza as sociedades em mudança de estrutura, a que nos
referimos na primeira parte deste trabalho, dar margem a doutrinas educacionais discrepantes, capazes de
sugerir reorganização e redefinição, dos sistemas vigentes de educação Institucional. Esta era mesmo muito
restrita, de cunho mais clerical e profissional, e adotava meios rígidos e invariáveis, de modo que os escritos
sobre educação, em tom de máximas e recomendações, eram dirigidos, de preferência, aos pais e não às
instituições escolares.

Na Antigüidade Clássica.

Há sempre uma certa distância entre as idéias e as práticas pedagógicas, no sentido de que as
primeiras tendem a indicar o que deveria ser a educação, ao passo que as segundas são propriamente a
educação institucionalizada, como ente real, concreto, numa determinada área e em certo momento histórico.
Nas civilizações orientais, em virtude da própria organização social que as caracterizou, tal distância era
muito menor. Podemos apreciá-la, entretanto, em proporções bem maiores na Grécia, onde as Idéias
educacionais, decorrentes da própria filosofia política e moral dos gregos, convertem-se no meio pelo qual
seriam atingidos os fins que aquela filosofia propunha. Pela primeira vez na história, as idéias educacionais
organizavam-se numa doutrina cujo objetivo não era justificar a prática, mas transformá-la, dando-lhe outro
sentido e outra orientação. Surgia, assim, como que um reformismo filosófico da educação.
Vários fatores foram apontados para explicar este fato novo e próprio da antigüidade clássica. Renê
Hubert declara que a pedagogia nasceu na Grécia ao mesmo tempo que a filosofia, ou melhor ainda, como
um aspecto essencial da filosofia. Entre os pensadores da Grécia pré-socrática, ela teria sido, de fato, ao
mesmo tempo, uma especulação e uma educação ou iniciação, o que se pode interpretar como aprendizagem
prática do pensar e especular filosoficamente. Com Sócrates a educação se constitui em objeto da filosofia.
Estabelecendo, assim, a origem da pedagogia como um sistema de idéias e teorias educacionais, explica-se o
chamado milagre grego da razão especulativa e lógica – em contraposição ao misticismo do pensamento ori-
ental - como uma evolução, em que as Idéias desse mesmo pensamento oriental despojaram-se de seus
aspectos afetivo-religiosos, para se submeterem a um processo crítico-lógico. O nascimento da filosofia
helênica coincide com a grande crise provocada por causas demográficas (colonização e emigração),

3
História da Educação

econômicas (enriquecimento pelo comércio e pela produção artesanal a cargo de escravos), e políticas
(esforço de sistematização lógica das crenças em que se apoiava o poder das grandes famílias, sempre
ameaçadas, em seus supostos direitos de classe dominante, pelas tiranias demagógicas).
A partir desse processo de racionalização de situações sociais definidas, conseguiram os filósofos
gregos ultrapassar a fase oriental das cosmogonias teológicas, para realizar a metafísica sistemática e a ética
dialética. É a situação que encontramos de 500 a 300 anos antes de Cristo, quando alguns pensadores deposi-
taram as maiores esperanças na educação, que consideravam o recurso para resolver problemas morais,
políticos e sociais do mundo helênico, onde os fatos sociais, econômicos e políticos aprofundavam
contradições e exacerbavam conflitos. Propuseram, esses filósofos, com bastante clareza, meios e fins
educacionais, foram compreendidos e admirados por muitos de seus contemporâneos e, se um deles,
Sócrates, foi condenado, outros, como Platão e Aristóteles, foram amados e admirados. Todavia, suas idéias
pedagógicas foram admiradas apenas estritamente, não tiveram qualquer resultado prático, isto é, não foram
postas à, prova em suas conseqüências ativas e concretas. "O conhecimento é a virtude", pregara Sócrates,
que, assim, fazia do sábio um homem necessariamente virtuoso porque conhecer seria saber o que é a
virtude, e esta, uma vez conhecida, resultaria como necessidade certa. Daí a busca do conhecimento como o
grande meio de reforma social e, portanto, como o fim da educação. Devendo ser conseqüência do poder de
pensamento, tal reforma impunha, como tarefa educativa por excelência, a necessidade de aprender a utilizar

Instituto de Formação e Educação Teológica – www.ifete.edu.br


e desenvolver esse poder, sendo o conhecimento a finalidade imediata da educação, por constituir a condição
da virtude que seria o seu fim último. A função mais nobre do pensamento era fundamentar a validade
universal dos valores morais, descobertos e propostos pela razão, enquanto praticados e realizados pelos
indivíduos. O homem justo e sereno, eis o que a educação deveria procurar realizar pelo desenvolvimento do
poder do conhecimento e do próprio conhecimento. Tais Idéias, de meios e fins educacionais, foram aceitas,
ainda nos tempos antigos, anteriores a Cristo, e, mais tarde, renovadas sob diferentes formas. Depois de
Wolff e do "ilustracionismo" alemão, esteve muito tempo em voga o lema de que "a instrução é a luz da
virtude"...
Platão - na República - dando corpo ou conteúdo a esses ideais, pretendeu estabelecer uma rígida
hierarquia de classes sociais, de acordo com um sistema de mérito, baseado em possibilidades (aptidões)
individuais em cujo cume estariam os homens sábios (ou filósofos), Em função dessa estratificação social
idealizada, é que se organizaria todo um sistema educacional, destinado a formar tanto o sábio como os
componentes das demais classes sociais.
Aristóteles, sem fugir àqueles ideais educacionais e éticos já contidos na filosofia socrática, procurou
ser mais realista em suas teorias pedagógicas, reconhecendo que, até certo ponto, a educação está sujeita à
política, de modo que cada espécie de estado ou nação teria seu tipo apropriado de educação. Nesta
distinguiu ele três espécies: (a) educação do corpo, pela ginástica; (b) educação da afetividade, pelas artes e a
prática moral; (e) educação da razão, pelas ciências e a filosofia. Através dessas três formas educacionais é
que surgiria o homem sereno e sábio, ideal inatingido da cultura grega.
O povo romano, nos primeiros tempos de sua história, não apresentou nem instituições escolares,
nem teorias educacionais. Do ano 509 antes de Cristo, quando se Instaurou a República, até o ano 300 a.C., a
educação era quase exclusivamente familiar. Tinha -objetivos práticos que visavam a inculcação das virtudes
domésticas, o conhecimento da lei estatal das Doze Tábuas, a prática das atividades agrárias, da guerra e da
política; e o principal meio de que se utilizava para realizá-los era a aprendizagem por participação. 0 pai e a
mãe eram os mestres, cada um naquelas atividades que lhe competiam em virtude da divisão do trabalho
doméstico.
Povo de agricultores, constituinte de uma aristocracia agrária, organizaram-se os romanos
patriarcalmente, de modo que a autoridade - do pai sobre os filhos, do marido sobre a mulher, do senhor
sobre os escravos - decorrente dessa organização, era consagrada por uma religião doméstica de deuses e ma-
nes cujo grande sacerdote era o chefe da família.
Mas, ou por ato de legítima defesa contra povos vizinhos, ou por necessidade de expansão das
propriedades agrícolas, a aristocrática e austera república teve que se empenhar em guerras sucessivas,
entrando em contacto com outros povos, cuja influência, fossem eles conquistados, ou por situação de
vizinhança, não deixou de se fazer sentir sobre a velha estrutura da sociedade romana. Já pelo ano 300,
Homero era traduzido para o latim e alguns sofistas gregos iam ensinar em Roma.
Foi justamente nessa época - de transição e transformação da sociedade romana - que surgiu Marco
Pórcio Catão, mais conhecido corno Catão, o Antigo, patrício pobretão, dono de pequena e pouco rendosa
propriedade, o que lhe valeu dos próprios historiadores romanos a caracterização de homem de origem

4
História da Educação

plebéia, mas que veio a ocupar os mais altos postos da República. No que diz respeito à educação, chegou a
escrever um livro sobre a das crianças, em que defendia o velho estilo da educação doméstica, e verberava a
modificação dos costumes e a invasão do cosmopolitismo em Roma. Caracterizou-se, assim, como um
tradicionalista, inveterado inimigo da Influência cultural grega e das escolas que se abriam com professores
orientais, que ele considerava fatores de amolecimento do caráter e de desromanização de sua pátria.
Inutilmente o Senado Romano fez passar leis de proteção às tradições e combateu a nova educação
institucional que surgia; as mudanças que se operavam na sociedade romana tinham causas mais profundas e
eficiência mais poderosa do que os ideais conservadores de um pensador e político, mesmo do porte de
Catão, o Antigo.
Já no período de transição da República para o Império, no primeiro século antes de Cristo, Cícero,
que não era apenas um admirador da cultura helênica, mas visitou, ele próprio, as cidades gregas e nelas
estudou, soube perceber muito bem que tal cultura, ao contrário do que supusera Catão, não estava sendo
transplantada para Roma e ali substituindo o que lhe era original. O que estava acontecendo era uma
assimilação do helenismo, em vista das necessidades e problemas da nova sociedade que o Imperialismo de
Roma estava construindo. Eis por que, em vez do ideal socrático da serenidade filosófica, em vez das
sutilezas dialéticas do individualismo sofista, formula-se o ideal da sabedoria política, concretizada no
orador, o homem público por excelência dos últimos tempos republicanos. No De Oratore (livro 1) diz

Instituto de Formação e Educação Teológica – www.ifete.edu.br


Cícero claramente: "toda a arte de falar está ante nós (é por nós praticada) e diz respeito ao uso comum, aos
costumes e à linguagem de todos os homens"...
"Nesta cidade muito nossa, certamente nenhum estudo tem sido realizado com tanto fervor quanto os
que tendem à aquisição da eloqüência"... A arte da eloqüência é algo de maior e provém de mais ciências e
estudos do que o povo imagina. Em conseqüência desse conceito romano de sabedoria, que já não era a
filosofia especulativa dos gregos, nem a sua poesia ou o seu drama, mas o conhecimento mais ou menos
enciclopédico, obtido por informação, explorado convenientemente pelos princípios e as regras da
eloqüência, a serviço da política imperialista e oligarca de Roma, Cícero não teria dúvida em afirmar que o
homem educado (instruído e útil) era o orador. E, de acordo com este ponto de vista, previa, como fim de
toda educação institucional, a formação do orador, o que vale dizer, do homem político, o qual, além de
possuir o conhecimento do filósofo, quer a respeito das coisas, quer da natureza humana, deveria ter também
o poder de dar a esse conhecimento um valor prático, influenciando os outros homens pela palavra falada.
Compreende-se isso perfeitamente, quando se tem em vista que as funções realizadas na sociedade moderna
pelo púlpito, pela imprensa, pelo debate -legislativo, pelo rádio, pelo cinema, pela televisão e outros meios
semelhantes, eram naquele tempo desempenhadas pela oratória.
No século seguinte ao de Cícero, Quintiliano (40-118 d.C.) iria tratar da pedagogia da formação do
orador, no primeiro, no segundo e no décimo segundo livros de sua Instituição Oratória, usando nesse tratado
um estilo ciceroniano que bem atestava sua inspiração. No primeiro dos livros citados, trata da educação do
menino antes dos seus estudos, no segundo, - dos primeiros princípios da retórica, e, no terceiro, dos meios
de formar o orador. Postulou a excelência de se ministrar, publicamente, a grupos, o que antes era ensino
privado, individual ou tutorial; condenou o uso da força física como castigo emulador, realçando a
necessidade de tornar atrativos os estudos; cuidou das relações e das atitudes entre professor e aluno,
divisando com bastante ênfase a existência de diferenças individuais e, portanto, a necessidade de as estudar
e compreender; indicou o problema da seleção de professores, tendo em vista suas qualificações;
preocupou-se em traçar o currículo adequado à formação do orador e expôs os métodos que lhe pareciam
mais apropriados ao cumprimento desse currículo. Tendo sido, ele próprio, professor, sua pedagogia foi, na
opinião de muitos, uma tentativa de melhorar a educação institucional de Roma, sem lhe mudar nada de
substancial, sem lhe provocar qualquer reforma, simplesmente apurando-a levando-a a um máximo de
perfeição.
“O conhecimento de um vasto número de coisas é necessário, sem o que, o prazer das palavras é
vazio e ridículo".

Os pedagogos do Cristianismo medieval.

Por entre os conflitos e contradições que caracterizaram o mundo romano, na época da decadência
dos Césares, surgia, pouco a pouco, como uma esperança, o Cristianismo, religião de plebeus e escravos. Em

5
História da Educação

face do fracasso de um difícil estoicismo de elite que se tentara aclimatar em Roma, facilmente suplantado
pelo epicurismo sensual de quase todos, o ideal cristão de fraternidade humana, da unicidade e
universalidade divinas, de responsabilidade pessoal em face de uma vida futura, extraterrena, de
simplicidade, moralidade, humanitarismo e caridade, não tardaria a conquistar, aos poucos, adeptos em todas
as classes sociais, até que Constantino, percebendo a força moral que as novas idéias religiosas adquiriam
sobre todo o povo, podendo, por isso, contrapor-se eficientemente aos desregramentos das classes
dominantes, oficializou a nova religião que passou, desde logo, a dominar as instituições educacionais do
império. A educação foi, portanto, o meio eficiente de consolidação do cristianismo como reforma ou
transformação social. E tão eficiente foi que, no momento em que os chamados povos bárbaros invadiram e
dominaram o decadente império, o cristianismo foi a única força capaz de os conter, apaziguar e lentamente
trazer para a civilização que os gregos iniciaram, os romanos consolidaram e as contradições do Império
quase levaram à destruição total.
Em face de tudo isso, não é de admirar que os líderes cristãos se tenham preocupado com a educação
do povo, meio de perpetuar a nova ordem de valores espirituais - religiosos e morais - cujo poder social se
mostrava tão operante. As Constituições Apostólicas surgidas logo no quarto século da era cristã, são disso
uma prova, pois eram um manual de ensino e instrução destinado tanto ao clero quanto aos leigos. Santo
Agostinho (354-430), no seu Tratado da Doutrina Cristã, indicou, neste sentido, todo um plano de educação

Instituto de Formação e Educação Teológica – www.ifete.edu.br


religiosa e moral, e prescreveu os meios de compreensão das escrituras sagradas, subordinando a esse
objetivo o estudo das letras e das ciências, entre as quais distingue as que se devem evitar por serem
supersticiosas e idólatras. Nele se reflete ainda a preocupação tipicamente romana da formação do orador,
cumprindo observar que a Igreja nunca dispensaria esse aspecto da preparação dos clérigos, pois a oratória
seria por muito tempo, o melhor meio de pregação e disseminação da fé.
Durante todo o período medieval - aproximadamente mil anos - os padres e monges da Igreja seriam
os únicos educadores da Europa. Escreveram manuais e pequenos tratados destinados às diferentes escolas,
segundo uma pedagogia de meios é fins bem definidos, sem maior variação de conteúdo e de forma. Só no
século XIII, depois da redescoberta, através dos árabes, da filosofia de Aristóteles, e com o surgimento das
universidades, é que a pedagogia passou novamente a constituir objeto de meditação, em virtude dos debates
teológicos e filosóficos que o retorno às fontes gregas de pensamento propiciava. Santo Tomás de Aquino,
na sua extensa obra de racionalização da teologia pela filosofia aristotélica, não podia esquecer a educação
dos jovens. Daí ter-se éle preocupado com a formação dos mestres, no seu pequeno tratado De Magistro, em
que também aborda certas questões fundamentais do ensino, já preludiando certa psicologia educacional,
quanto tenta aplicar a diversos aspectos do ensino a sua teoria da origem e aquisição das idéias. Afirmou que
a educação ou ensino não é simples comunicação ou infusão de idéias e doutrinas, mas, sobretudo,
solicitação, estimulação, orientação, que devem levar o espírito a desenvolver suas potências naturais por
meios normais e gradativos. Reformulou o ideal de "mens sana in corpore sano", porque o vigor do espírito
corresponderia à saúde do corpo e o organismo mais sadio permitiria maior perfeição da mente. Era já uma
espécie de recomendação contrária aos ideais anteriores de desprezo ao corpo como processo de purificação
do espírito, da maneira como o praticavam os anacoretas e ermitães... Era também um prenúncio da
Renascença, ou a sua preparação cultural.

Na Renascença Humanista.

Desde o século XIII, de um lado, por Influência árabe, através da Espanha e pelo contacto de
Constantinopla com o Oriente Próximo, onde se refugiara durante os séculos de obscurantismo medieval, a
remanescência da cultura greco-romana, e de outro lado, por fatores como o desenvolvimento das cidades
européias em que se concentravam o comércio e o artesanato manufatureiro, o desenvolvimento dos estados
nacionais, com o progressivo crescimento do poder central dos reis em detrimento do que detinham os
senhores feudais, as cruzadas e a intensificação das relações entre os povos cristãos e os não-cristãos,
profundas mudanças culturais começaram a operar-se na Europa, colimando, nos séculos XV e XVI, com a
Renascença e o Humanismo, responsáveis, em parte, pelo individualismo filosófico-científico de Bacon e
Descartes e pela Reforma religiosa. Dizemos em parte porque, na realidade, todos esses quatro movimentos e
atitudes culturais, que estão à base do pensamento contemporâneo, tiveram causas bem mais profundas nas
mudanças de estrutura política e econômica, causas que, depois do milênio de relativa estabilidade medieval,

6
História da Educação

se desencadearam em sucessão ininterrupta, pois apesar dos cinco séculos já decorridos a partir do seu início,
ainda não culminaram em qualquer equilíbrio que se mantivesse por mais de 50 anos.
Por tais razões e para melhor podermos compreender os ideais educacionais e as teorias pedagógicas
formulados pela renascença humanista, cabe aqui resumir as principais características da cultura humana no
período renascentista, o que, até certo ponto, equivale a caracterizar o próprio humanismo de então. Em
outro trabalho, com uma longa documentação bibliográfico-histórica, indicamos as seguintes dominantes
dessa cultura:

a) negação da autoridade em matéria de pensamento e expressão do pensamento;


b) desenvolvimento das técnicas humanas de construção, preferentemente a sistemas teóricos de
interpretação e explicação;
c) pesquisa e realização lítero-estéticas, baseadas em situações e valores humanos, e inspiradas nos modelos
da antigüidade clássica, greco-romana;
d) livre Iniciativa na promoção de novos conhecimentos, quer dentro, quer fora das Universidades;
e) pluralismo inicial de idéias é orientação, sobre um fundo comum - o naturalismo - que significava
soluções segundo princípios naturais;
f) recurso à experiência, quer passada, quer atual, com interpretação adaptada às condições da época;

Instituto de Formação e Educação Teológica – www.ifete.edu.br


recurso exclusivo às possibilidades humanas de pesquisa, inteligência e interpretação, para conhecimento
do universo;
h) primeiras proposições da dúvida como método fundamental de pesquisa;
1) fins humanos, terrenos, em vez de fins sobrenaturais, em filosofia moral e política;
J) tendência a interpretação naturalista da moral e das religiões;
1) primeiros postulados de moral individualista.

Do ponto de vista das idéias educacionais, o humanismo começou pelas realizações concretas, entre
as quais podemos citar as escolas de Vittorino da Feltre e Guarino de Verona, a primeira em Mântua
(1423-1446) e a segunda em Ferrara (1429-1460). Ambas se destinavam à nobreza e à alta burguesia das
redondezas, desenvolvendo o estudo dos clássicos latinos e da história antiga, a prática das "boas maneiras",
próprias da nobreza, de exercícios físicos, etc., e serviam como escolas preparatórias primeiro esboço das
escolas secundárias para os estudos superiores. Ambas se preocuparam com a didática e desenvolveram
métodos de ensino capazes de despertar maior interesse nos alunos, tornando-lhes as atividades mais amenas
e agradáveis.
Johann Sturm (1507-1589) foi quem organizou, de fato, a primeira escola secundária de tipo
humanista em Estrasburgo (1536-1582), que foi como um modelo para as escolas desse tipo criadas na
Alemanha e que, em suas linhas mestras, perduraram até quase nossos dias. Com 10 graus ou anos de
estudos, destinava-se a escola, primordialmente, ao ensino das letras, principalmente das letras clássicas e,
segundo afirmara Sturni, tinha por fim desenvolver "a piedade, o conhecimento e a arte de falar".
"Conhecimento, pureza e ornamento da linguagem, tais são os elementos da educação científica." Era, corno
diria Monroe, (1) a realização do humanismo em seu sentido mais estreito, o qual atendia apenas a um dos
aspectos do movimento humanista que caracterizou a Renascença em todos os setores da atividade humana.
Dizem alguns escritores católicos C) que Sturm representa a transição do catolicismo ao protestantismo, tal a
maneira por que graduou o ensino e pretendeu fazer a Interpretação dos clássicos e das escrituras sagradas,
de forma semelhante por que Pestalozzi representaria a transição do protestantismo ao racionalismo
pedagógico.
Justamente reagindo contra a realização desse humanismo estreito nas escolas, espécie de novo
escolasticismo de natureza literária, que procurava estudar, em si, as obras clássicas dos romanos e dos
gregos, imitá-las e segui-las, quais modelos únicos e eternos, fugindo, portanto, ao verdadeiro espírito do
renascentismo humanista, todo ele embebido da realidade e das conquistas do tempo, vários pensadores e
escritores do século XVI tiveram que se voltar para as questões educacionais, a fim de reformulá-las em
termos de sua época. Entre estes, o primeiro digno de nota foi, sem dúvida, Erasmo de Rotterdam
(1467-1536) autor celebrado do Elogio da Loucura, saborosa e decisiva sátira contra a filosofia escolástica,
dos Colóquios, que constituem urna descrição e uma apreciação irônica das práticas e costumes da vida
monástica, do Método nos Estudos e da Primeira Educação Liberal dos Meninos. O humanismo de Erasmo
era realista e partia do princípio de que se devia procurar nos clássicos romanos e gregos o espírito e o
sentido de sua obra, menos ou mais do que perder-se nos estudos de formas, em si despidas de valor, pois

7
História da Educação

eram apenas o veículo, o meio de realização mental e artística. O valor contemporâneo dos antigos estaria em
que eles souberam observar e apreender o seu mundo dele extraindo toda a literatura de que foram capazes. 0
mesmo dever-se-ia fazer no momento em que para eles se retornava. Para isso, todo um processo
educacional seria preciso, sem violências e sem árduas tarefas, "Assim como o corpo é nutrido, em pequenas
doses, distribuídas por intervalos, também o espírito da criança deve ser nutrido com conhecimentos
apropriados à sua debilidade e apresentados aos poucos." Preocupou-se com os mestres e deles exigiu cultura
e educação de nível superior, além das qualidades naturais para o trato com crianças e adolescentes. 0
humanismo postulava, pois, tôda uma nova concepção de meios e fins educacionais, sendo que os estudos
clássicos seriam apenas um meio, um processo, aliado a outros, na verdadeira formação humanística das
crianças e dos jovens. A Natureza, a História, a vida contemporânea seriam outros tantos meios indispen-
sáveis.
François Rabelais (1483-1553), que, como Erasmo, fora monge, também se pronunciou por um
humanismo realista em suas obras Vida de Gargântua e Feitos Heróicos de Pantagruel, partindo do ponto de
vista de que se pode obter dos clássicos reais valores de vida. Ridicularizou o medievalismo, o formalismo
pseudo-humanista e o ensino como era ministrado em seu tempo, advogando uma educação física, moral,
social, religiosa e intelectual que se baseasse na compreensão do espírito dos melhores escritores e mestres
do renascimento. Em virtude do tom caricaturesco com que escreveu e a que não faltam premeditados

Instituto de Formação e Educação Teológica – www.ifete.edu.br


exageros, sofreu todas as críticas do seu tempo, sem que, porém, deixasse de ser apreciado e de exercer certa
influência.
Com Michel de Monteigne (1533-1592), da nobreza francesa, dá-se mais um passo no sentido de
mais ampla compreensão social dos problemas educacionais e da fundamentação psicológica dos processos
de ensino, naturalmente de acordo com as limitadas possibilidades de seu tempo, mas com admirável bom
senso que faz com que grande parte dos Ensaios tenham ainda sabor atual. Monroe recusa-se a ver em
Montaigne um realista humanista, por serem os humanistas pessoas que davam importância primordial às
letras, ao passo que Montaigne se voltava para os costumes e as coisas. Preferiu, por Isso, chamá-lo de
realista social, o que nos parece, em termos modernos, um pouco exagerado. Se aceitarmos o humanismo
como algo mais do que a simples renascença das letras clássicas, como tudo o que caracterizou a revolução
cultural da Europa que, nos séculos XV e XVI, se originou em profundas mudanças econômicas, sociais e
políticas, Montaigne foi, sem dúvida, um humanista. penetrado de profundo realismo moral, de que estão
imbuídos os seus ensaios sôbre educação, ou sejam Do Pedantismo, Da Educação das Crianças e Do Amor
dos Pais para com seus Filhos, embora, nesses ensaios, não se detenha muito no que poderíamos chamar de
educação social, pois está implícito, em tudo o que disse sobre a educação, ser esta, sobretudo, formação so-
cial, donde se explica sua hostilidade à pedagogia escolástica e à pedagogia renascentista, principalmente no
que diz respeito à afetação literária e ao abuso da erudição. o objetivo da educação é ensinar às crianças e aos
jovens o que deverão fazer como adultos. Trata-se, pois, de uma educação prática, não de cunho técnico, mas
sobretudo social e ético. O homem Ideal de Montaigne é o gentil-homem, o homem da corte. Quanto aos
métodos da educação, recomenda, menos os livros do que a participação, a companhia dos outros, a
observação das coisas, para se obter "essa sabedoria mediana que usa todos os métodos sem abusar de
nenhum"...

A Reforma Protestante e as Idéias Educacionais.

Os mesmos fatores que, de modo geral e impreciso, invocamos para explicar o humanismo
renascentista, servem também para explicar a reforma religiosa, mais conhecida sob o nome de
protestantismo, porque, sob certos aspectos, ela foi, também, uma renascença. Desde Wycliffe e John Huss,
nos séculos XIII e XIV, vinha-se tentando um retorno à pureza do cristianismo primitivo, que, dizia-se, fora
deturpado durante a Idade Média. Esse retorno, em última análise, era uma liberação que significava muito
mais do que a simples revolta contra determinada autoridade religiosa, e do que a conquista cultural de certa
autonomia da consciência individual. Era o coroamento de toda uma nova ordem política, social e econômica
que se estabelecia na Europa. Já mesmo nos séculos áureos da cultura medieval (XIII e XIV) se fizera sentir,
de forma nítida, o conflito entre o poder crescente dos reis e príncipes - motivado pela decadência do
feudalismo e pela progressiva urbanização burguesa - e o poder-temporal da Igreja romana. Uma reforma
religiosa, de independência e quebra da unidade dessa Igreja, quando tal conflito se tornara mais intenso,
seria um fator a ser aproveitado pelos Estados mais ansiosos de se libertarem, do domínio eclesiástico e da
interferência destes negócios civis, interferência essa quê era acompanhada de cobrança de dízimos e outras

8
História da Educação

taxações em favor da Igreja. Estavam neste caso os príncipes alemães, cujos Estados carreavam para Roma
grande parte de suas rendas e meios financeiros. Além disso, por influência e força da mesma Igreja,
sentiam-se ainda presos a um império que, até certo ponto, lhes dificultava o próprio desenvolvimento
nacional. Nessas condições, a liberdade de consciência religiosa seria um grande instrumento de mais ampla
e fundamental liberação econômica e política. Para ela, do ponto de vista cultural, contribuía todo o espírito
humanista da Renascença.
Daí, o recurso à Bíblia e aos primeiros escritos dos antigos padres, tão praticado nas escolas
protestantes de teologia. E, em vez da superficialidade formal do humanismo restrito, era para o reformismo
protestante que se encaminhava tudo o que de mais profundamente humano se escrevera nos albores da Re-
nascença. Tanto os primeiros escritos de Lutero, quanto os de Calvino e os de Zwinglio estavam
impregnados de humanismo, pois o que se tentava, em última análise, pelo livre exame, era a humanização
da religião.
Lutero, logo depois de sua excomunhão, em 1520, declarava que “tudo quanto fosse contrário à
razão, seria certamente, em maior grau, contrário a Deus” porque a razão seria “a principal de todas
as coisas, a melhor, algo divino”. Em conexão com estas idéias que se ligavam, por sua vez, à teoria do
livre exame dos textos religiosos, formou-se outra que dizia respeito à criação de sistemas universais de
educação, sob a responsabilidade do Estado, cujo bem-estar estaria diretamente ligado à educação dos

Instituto de Formação e Educação Teológica – www.ifete.edu.br


seus cidadãos. Por educação universal devemos entender aquela que se, destina a todas as classes
sociais e a ambos os sexos, devendo ser compulsória e gratuita, controlada e mantida pelo governo.
Teria por base as escolas primárias vernáculas que ensinariam a ler, a escrever, a religião, os deveres
domésticos, a prática comercial, os exercícios físicos, o canto. A elas se seguiriam as escolas secundárias
latinas, que teriam função preparatória para o clero, ensinando latim, grego, hebraico, retórica, dialética,
história, ciência, matemática, música e ginástica. Finalmente, coroando todo o sistema educacional, teríamos
as Universidades que formariam pessoas para os mais elevados serviços da Igreja e do Estado.
Lutero apenas descreveu, em termos gerais, o que deveria ser um sistema educacional. Alguns de
seus seguidores trataram de o realizar em minúcias, como Melanchton na Alemanha do Sul e do Centro, e
Bugenhagen na Alemanha do Norte e na Dinamarca, ambos, porém, dando maior ênfase ao ensino secun-
dário.
Os calvinistas é que, efetivamente, iriam desenvolver em grande escala o ensino primário e dar ao
ensino universitário o sentido da pesquisa e da investigação científicas, tendo exercido grande influência
sobre vários países e, principalmente, sobre as colônias da América do Norte.

A contra-reforma católica

A história tem sido, até nossos dias, uma atestante inevitável de que as mudanças e reformas sociais
não se operam sem lutas, sem contra-reações que, até certo ponto, atenuam os efeitos revolucionários ou
reformantes, embora não os anulem. No final, as próprias forças agentes da contra-reação ajustam-se às
novas situações, adquirindo sentido novo, isto é, transformando-se a si próprias.
Não era de admirar, pois, que a reforma religiosa, desencadeada no Centro e no Norte da Europa,
pelos motivos já expostos, provocasse também uma contra-reação que, de início, por causas políticas e
econômicas que se lhe associaram, tomou a forma de uma encarniçada e impiedosa luta guerreira que afetou
toda a Europa. Assumindo inicialmente o aspecto de luta político-religiosa entre estados católicos e estados
protestantes, já no final de seu longo período perdia o aspecto religioso, para se limitar ao político, tendo-se
então visto, entre outras coisas, por exemplo, a França católica aliar-se a alguns países protestantes.
Nestas condições, os líderes católicos, mais esclarecidos pelo que lhes revelavam os próprios fatos,
retornaram sobre o próprio sentido das doutrinas católico-cristãs, já agora com o objetivo de lhes manter os
valores morais e religiosos, livres - tanto quanto possível - de seus compromissos temporais, para só
conservar o poder moral e espiritual da fé e da organização religiosa da Igreja. E, então, a contra-reforma
assumiu o aspecto de luta pacífica, reivindicatória da pureza e da originalidade cristã das doutrinas católicas
romanas. Para tal fim, foram utilizados muitos dos próprios meios protestantes, entre os quais a educação,
Quem melhor consubstanciou esse aspecto da contra-reforma foram os padres jesuítas. Inácio de
Loiola, nos meados do século XVI, ao fundar sua ordem religiosa, soube compreender que os fatores de
mudança que levaram à contra-reforma protestante, não contradiziam fundamentalmente o princípio de
autoridade e disciplina religiosas, se tal princípio se limitasse ao campo espiritual da fé e da moral, porque
Isso, até certo ponto, poderia ser um meio de ordem e organização das nações, que, nascidas no período de

9
História da Educação

for. mação renascentista, sofriam o impacto de um individualismo sem pelas, resultante da quebra da ordem
e dos valores antigos. O próprio protestantismo veio a compreender isso e, já no fim de sua vida, Lutero
clamava por autoridade e disciplina religiosas nos Estados protestantes.
Como objetivo supremo dos jesuítas, aparecia, em primeiro plano, o combate às heresias
protestantes, não mais pelos meios materiais da luta armada e inquisitorial, mas pela pregação e o debate
dos valores espirituais da Igreja. Em segundo plano surgia a conversão dos pagãos existentes nos novos
mundos descobertos por espanhóis e portugueses, que, se catolizados, reforçariam o poder espiritual do
Papado.
Mas a pregação e o debate supunham a preparação de líderes e, daí, a importância da educação. Para
este fim, na Constituição da Companhia de Jesus, dividida em dez partes, a quarta - Ratio Studiorum (sistema
de estudos) - dedicava-se ao problema educacional. Por tal sistema verifica-se que os jesuítas não tinham em
vista apenas a formação de líderes de batina, mas também e sobretudo de líderes leigos. Não pretendiam uma
simples educação religiosa, mas a mais avançada educação secular do seu tempo, a serviço da fé. Tiveram,
por isso, pouco interesse pelo ensino primário e o das massas populares. O ensino secundário, propedêutico,
e o ensino superior foram o seu campo de ação. Numa época em que o feudalismo ruíra e os privilégios da
nobreza tendiam a reduzir-se, em que uma nova classe social - a dos burgueses -começava a afirmar-se cada
vez mais poderosamente pela detenção crescente das fontes e meios de produção, os jesuítas não procuraram

Instituto de Formação e Educação Teológica – www.ifete.edu.br


criar escolas para a nobreza ou para determinada classe social, mas as organizaram com base no princípio do
mérito e da aptidão, não se chocando frontalmente com o individualismo da época.
Com esses princípios e levando para o currículo escolar toda a ciência e as letras do tempo, com base
num humanismo mais vivo do que o do comum das escolas, conseguiram criar os melhores colégios dos
séculos XVII e XVIII. Tais foram o sucesso e a adequação dos processos postos em prática que, ainda hoje,
quer o padre jesuíta, quer o homem educado pelos jesuítas, são considerados pessoas de extraordinário
autodomínio, disciplinados e capazes de atingir os fins mais difíceis.
Mas o catolicismo não se satisfez apenas com o tipo de educação que a contra-reforma ditou aos
jesuítas. No século XVII, o abade La Salle assumiu a tarefa de organizar a escola elementar para todos,
fundando, em 1684, em Ruão (França), o Instituto dos Irmãos das Escolas Cristãs, tendo primeiramente o
objetivo especifico de dar instrução elementar e religiosa, em língua vernácula, às crianças das classes
trabalhadoras. Em seguida, procurou La Salle realizar pela escola primária o que os jesuítas tinham feito pela
escola secundária, organizando um currículo graduado em classes, com métodos adequados e utilizando
processos brandos de disciplina, baseados na regulação gradativa das punições. Em face da dificuldade de
conseguir professores capazes de realizar -seu plano de trabalho para tais escolas, foi ainda La Salle quem
primeiro organizou em Reims, na Europa, no ano de 1685, um instituto especial para a formação de
professores.

O realismo pedagógico.

Ainda como conseqüência do humanismo, que significava, sobretudo, um recurso às possibilidades


humanas para solução dos problemas do homem e uma fuga ou recusa a procurar essa solução no milagre,
isto é, fora da natureza, a indução experimental iria afirmar-se como o grande recurso do homem para,
através da compreensão e do entendimento das relações das coisas e das forças naturais, tentar dirigir a na-
tureza em seu próprio benefício. A Física e a Química ensaiam seus primeiros passos, desabrochando das
tentativas mágicas da alquimia; a Mecânica Celeste, com Galileu, Copérnico e outros, torna-se mais
Inteligível e mais próxima dos próprios fenômenos; a Medicina, retomando velhos caminhos da Antigüidade
grega e dos árabes, encaminha-se para o experimentalismo controlado, e a própria Matemática, sob a
Influência das novas revelações da experiência, liberta-se pouco a pouco do simples espaço geográfico, da
velha Geometria cultivada pelos medievais, recuperando o que fizeram os gregos depois de Euclides e
ultrapassando-os, graças a um novo instrumento que lhe trouxeram os árabes, de outras fontes do Oriente - a
Álgebra,
Se Montaigne, cético dos homens de sua classe, vira nesse progresso, nessa transposição dos limites
da experiência empírica, nos saltos da indução e no arrojo das novas generalizações matemáticas, algo que se
adicionava ao seu ceticismo moral e individualista, Francis Bacon (1561-1626) dispôs-se a considerar todo o
referido processo com entusiasmo realista, vendo nele um meio de resolver o homem os problemas do
homem.

10
História da Educação

Talvez tenha sido otimista demais, mas soube tomar consciência do pensamento de sua época e,
interpretando-o, lançar as bases de um grande e profundo movimento de Idéias e práticas que seriam
amplamente utilizadas nos séculos seguintes, Imprimindo uma orientação menos formalística e mais concreta
e humana ao pensamento pedagógico e aos processos de instrução escolar. Não foi o criador do método
científico, mas soube formulá-lo e divulgá-lo. Deu ênfase ao estudo da natureza como base de todo o
progresso científico, Iniciando esse estudo a partir da observação e da experiência, pois o estudo dos fatos se-
ria o começo do processo de pensar. Reafirmou o espírito renascentista. no domínio da ciência, recusando
toda autoridade em favor da pesquisa livre. Em conseqüência, ao tratar do progresso dos estudos e da
aprendizagem, teve de repudiar os defeitos escolares do seu tempo, Inclusive a aprendizagem formal e verbal
do humanismo estreito, recomendando a Inclusão do conhecimento científico nos programas escolares,
acompanhado de facilidades de pesquisa e prática.
Diante disso não tardaria Wolfgang Ratke (1571-1635), a tentar a primeira formulação do que, em
história da educação, seria chamado de "realismo sensorial" e que se caracterizaria, sobretudo, pelo
postulado de que o conhecimento das coisas concretas deveria preceder o estudo de palavras a respeito das
coisas.
Como complemento das regras de ensino, mais os seguintes princípios foram formulados por
Wolfgang Ratke: a procura da ordem natural para segui-la; o ensino de uma só coisa de cada vez e de

Instituto de Formação e Educação Teológica – www.ifete.edu.br


maneira cabal; repetição até se garantir o domínio do ensinado; uso da língua materna para todo o ensino,
inclusive para as explicações no ensino de línguas estrangeiras; disciplina sem violência; nada de
memorização e muitas perguntas e compreensão; uniformidade didática e de material de ensino; substituição
da autoridade pela experiência e a pesquisa individuais.
Todos esses princípios seriam reformulados de modo sistemático, servindo como germe de quase
toda a teoria educacional dos séculos XVIII e XIX, por Johann Amos Komenski - ou Comênio, segundo a
tradução latina do seu sobrenome - autor da Didactáca Magna; seriam universais em sua validade e suas
conseqüências, conforme o próprio Comênio pretendia. Além do reforçamento e da exploração mais extensa
e profunda dos preceitos que Ratke formulara, coube a Comênio a proposta de uma graduação do ensino em
níveis e graus, finalmente adotada por quase todo o mundo ocidental, em virtude de corresponder às
principais e grandes etapas do desenvolvimento biopsíquico do indivíduo humano e à própria complexidade
e amplitude crescentes do que deveria ser ensinado e transmitido pelas escolas. Os diferentes níveis de
ensino propostos e ainda hoje prevalecentes seriam os seguintes: escola maternal, até os seis anos de Idade;
escola vernácula (primária), dos seis aos doze anos de idade; escola latina (secundária), dos doze aos dezoito
anos de Idade; universidade (ensino superior), dos dezoito aos vinte e quatro anos de idade. Tendo nascido
em 1592 e falecido em 1670, Comênio foi o preparador de todo o movimento de novas idéias pedagógicas
que se ia desenvolver nos séculos seguintes e que, numa sucessão gradativa, iria desfechar no que, em
princípios de nosso século, ficou sendo conhecido sob o nome genérico de "escola ativa".
Se a Influência de Comênio iria ser decisiva para toda a pedagogia posterior, não nos devemos
esquecer de que para isso contribuíram fatores convergentes que lhe reforçaram a posição, dando-lhe
progressivamente bases experimentais e racionais mais sólidas. Assim, por exemplo, a filosofia de John
Locke (1632-1704), geralmente caracterizado como "sensista empírico", Iria dar bases mais próximas da ver-
dadeira ciência experimental - tal qual já começara a ser praticada, - ao realismo sensorial da pedagogia de
Ratiçe e Comênio. Preocupando-se com a realidade concreta do mundo exterior, fora ele levado ao estudo da
Química, da Física e da Medicina. Daí, sem fugir ao critério realista, partiu para o estudo objetivo da política,
escrevendo sua célebre Carta Sobre a Tolerância, prelúdio do movimento liberal democrático que Iria
desfechar na Revolução Americana e na Revolução Francesa, e dois tratados sobre O Govêrno Civil, como
expressão jurídica das Idéias democráticas. Em 1690 é que surgiria sua obra capital, resultante de todos os
estudos anteriores, aos quais se liga como uma conseqüência inevitável; é o Ensaio Sobre a Direção do
Entendimento Humano. Neste tratado, Locke pretende determinar os limites da inteligência e demonstrar as
questões diante das quais. ela tem que parar. Refuta as. teses relativas às Idéias Inatas - de origem platônica -
revividas no Renascimento, pois davam margem ao arbitrário da Inspiração pessoal. Depois estuda os
materiais de nosso conhecimento, os quais são as idéias de sensações, qualidades percebidas pelos sentidos, e
as idéias de reflexão, ou idéias elaboradas pelas faculdades de nossa inteligência. De tal análise conclui que
não podemos ter nenhuma Idéia das substâncias ou essências das coisas, contradizendo toda a ontologia
anterior,
O estudo de Locke foi básico no que diz respeito aos posteriores progressos da psicologia da
inteligência e do conhecimento. De sua conclusão de que o conhecimento consiste sobretudo em estabelecer

11
História da Educação

relações entre percepções, estabeleceu uma base para as doutrinas do sensorialismo realista. Compreendendo
o processo de formação dos hábitos, viu que a educação, menos ou mais (to que o armazenamento de
Informações e conhecimentos, seria a aquisição de um equipamento de hábitos, conforme a seguinte escala
de valores: saúde, virtude, sabedoria, serenidade e, aprendizagem mental, sendo que esta consistiria apenas
em aprender a pensar e a usar a razão e não em informação de conhecimentos ditados ou já adquiridos.
Sem esta contribuição de Locke, a Didaffica Magna de Comênio talvez não tivesse tido a
repercussão que alcançou, porque a obra de Locke, embora não diretamente relacionada com a pedagogia
comeniana, que repousava na graduação do ensino, de acordo com a natureza da criança, completou-a e
tornou-a viável.

O naturalismo pedagógico.

Depois das Cruzadas, começara na Europa a constituição dos Estados nacionais e o fortalecimento
progressivo do poder central dos reis, que tiveram como seus aliados, capazes de lhes financiar os exércitos,
os comerciantes e banqueiros burgueses das cidades, para os quais os desregramentos absolutistas e

Instituto de Formação e Educação Teológica – www.ifete.edu.br


aventureiros dos senhores feudais foram uma constante ameaça à regularidade dos negócios. Constituídas,
porém, as cortes reais, os barões e príncipes que perderam a suserania das cidades e o direito de impor
tributos, procuraram apoiar-se no poder real, a fim de sobreviver. Cabia, pois, aos comerciantes e banqueiros
e a todos os responsáveis pela produção de bens, sustentar não só o poder real, mas também a corte. A longa,
indecisa e desastrosa Guerra dos Cem Anos causara à economia francesa, por exemplo, os maiores prejuízos.
As guerras religiosas, sustentadas, durante trinta anos, com o dinheiro dessas mesmas classes produtoras e
comerciantes, não só ocasionaram prejuízos econômicos, como ainda devastaram, num rio de sangue e
destruição, grande porção da Europa. Todos esses fatos levavam à reflexão e repercutiam necessariamente
nas ideologias da época. De um lado, seguindo uma linha tradicional de pensamento que remonta a Platão,
na Antigüidade grega, tentou-se o recurso à razão em si, como capaz de, encontrando o racional e o imutável,
levar os homens à ordem social e política. Se Descartes tentou realizar racionalmente um modelo claro e
definido de um mundo físico, puramente lógico, tomando por paradigma as Matemáticas, Espinosa foi além,
procurando reunir tanto os fatos físicos como os mentais em um todo racional perfeito, em que a ordem e a
conexão das idéias provariam ser, realmente, à ordem e a conexão dos fatos.
Até certo ponto esta posição era também uma reação ao empirismo sensorial, segundo o qual, se se
impusessem os fatos naturais, a ordem do mundo, à consciência e à inteligência, através dos sentidos, o
homem teria poucas possibilidades de intervir nessa ordem para a modificar e adaptar a si, reconstruindo-a.
Era o conformismo humano ao fatalismo empírico. Mas o idealismo racionalista, tentando urna ordem
natural a golpes de razão, poderia justificar plenamente a ordem política monárquica, absolutista, e a ordem
econômica como dependentes daquela. Leibniz chegaria a justificar todas as suas contradições, como
contrastes compreensíveis no melhor dos mundos possíveis. Era a conformação da natureza exterior ao
homem, como se este criasse aquela.
Daí uma terceira atitude que iria repercutir nos séculos seguintes e condicionar todo o pensamento
pedagógico posterior. Era admitir o realismo da natureza e da ordem natural, sem dela excluir o homem.
Já Thomas Hobbes (1588-1679) adotara esse ponto de vista e considerara o homem como um
corpo, um objeto natural. Cada corpo não teria senão uma tendência - a autoconservação. O homem
seria, em conseqüência, essencialmente egoísta. Mas o estado de egoísmo absoluto o impediria de
satisfazer ao próprio egoísmo, donde a necessidade de uma forma de convivência social que, com o
mínimo sacrifício individual, proporcionasse a máxima liberdade de fomentar o egoísmo.
Logo, em uma sociedade - concluiriam os naturalistas franceses do século XVIII – o egoísmo de
um homem é limitado pelo egoísmo de outras pessoas. Por isso, o homem tem que lutar não só por sua
própria felicidade, mas também pela felicidade dos outros. Para conseguir a felicidade geral são necessárias
boas instituições sociais. Era necessário, pois, substituir por outra a ordem social existente; importava mudar
a estrutura da própria sociedade existente. Desta forma, o naturalismo filosófico evitava o conformismo a
que levavam tanto o idealismo racionalista, com sua ordem racional a que se conformaria o mundo, como o
empirismo sensorial, com sua ordem mecanicamente concreta, a que se conformariam a inteligência e o
entendimento humanos. 0 naturalismo positivava a existência de relações naturais dos fatos, entre os quais
os humanos, que, conhecidos, permitiam o refluxo sobre essas mesmas relações, dando-lhes novo sentido e

12
História da Educação

nova direção. Nestas condições, era possível modificar, transformar o próprio homem. E daí, a importância
da educação e a necessidade de a organizar de modo a permitir sua transformação numa força de mudança
da estrutura da sociedade injusta e cruel daqueles tempos. O idealismo racionalista deu margem à
"Ilustração" e à política dos déspotas esclarecidos (Pombal, Haranda, Frederico I1 da Prússia, Catarina II,
etc.); o naturalismo racional foi a ideologia dos enciclopedistas é da Revolução Francesa, bem como da
nova pedagogia dos séculos XVIII e XIX.
Jean Jacques Rousseau (1712-1778) foi quem deu expressão mais viva ao naturalismo pedagógico e
quem, em França, mareou o fim da "ilustração", com sua filosofia natural do afeto. Viu que a erudição
meramente racionalista em nada contribuíra para melhorar a humanidade e acrescentou, ao materialismo
sensualista já prevalente entre os enciclopedistas, algo de mais humano,- a natureza do afeto, da
personalidade e do cultivo da vida interna e individual. Daí, no Emílio, seu grande romance educacional, a
tese de que a educação começa a partir da natureza da criança, e que, portanto, a vida moral deve ser um
prolongamento da vida biológica, não podendo o ideal ético ser mais do que a expressão das necessidades e
dos instintos e tendências que constituem a vontade de viver. Sua teoria de que os homens nascem
naturalmente bons e de que a sociedade os corrompe repousa justamente no fato de pensar Rousseau que o
intelectualismo, a política e a moral convencionais contrariam, deturpam e se opõem às condições
biológico-naturais do comportamento humano, onde as tendências e os instintos, isto é, a afetividade, têm

Instituto de Formação e Educação Teológica – www.ifete.edu.br


função primordial.
Por essas razões, ele foi o inspirador da psicologia moderna, porque seu naturalismo
afetivo-biológico levou-o a sublinhar as diferenças individuais, a ponto de preconizar a educação individual,
a psicologia do crescimento com a correspondente adequação dos processos educacionais que deveriam
partir dos interesses espontâneos e naturais da criança.
De acordo com esses princípios chegou a tentar uma seriação da aprendizagem ou, melhor falando, a
graduação do currículo, em que dispõe, em suposta ordem psicológica, o ensino das diferentes matérias
escolares e abre espaço para a aprendizagem e a prática estéticas, para o ensino profissional, para a educação
moral de cunho prático (pelo exemplo e pelas conseqüências dos atos praticados) e para a educação política
(democrática, em consonância com a trilogia: igualdade, liberdade e fraternidade).
Como se pode perfeitamente ver pela teoria do Contrato Social, a concepção rousseauniana da
sociedade era associacionista, isto é, construía-se à base dos indivíduos que se associavam. Logo, em vez de
uma adaptação do indivíduo à sociedade, o que ele tinha em vista, na educação, era formar o indivíduo
humanamente perfeito para que este construísse a sociedade perfeita. Neste sentido, o Emílio, se é um libelo
contra a sociedade do seu tempo, pretende ser também a demonstração dos meios de reconstruir a sociedade
pela educação.
Menos político, menos filósofo e teórico do que Rousseau, mas dentro do mesmo pensamento
naturalista, Johann Heinrich Pestalozzi (1746-1827) voltou-se para o problema do ensino elementar como
educação fundamental, destinada a todos os homens, tentando teorizá-la à base de prática e experimentação
afetivas. É a primeira tentativa de pedagogia experimental que a história registra. Suas experiências, algumas
das quais chegaram a ser dramáticas, foram: a de Neuhof (1774-1776) onde estabeleceu, com objetivos
filantrópicos ' uma escola-lar para crianças desamparadas; as de Stanz, Burgdorf, Münchenbuchsee, Hofwyl,
ora com propósitos filantrópicos, ora experimentais, chegando mesmo a tentar uma escola de professores; e,
finalmente, a de Yverdon, já em 1804, que durou cerca de vinte anos e em que procurou dar forma às suas
idéias, chegando à definição da educação como um desenvolvimento natural, simétrico e harmonioso de
todas as faculdades da criança. Chamou a atenção para o fato de que não basta dar um conteúdo elementar à
escola primária, isto é, de primeiras noções ou de iniciação nesta ou naquela técnica básica da atividade
intelectual, neste ou naquele ramo de conhecimento ou na atividade cívica, moral e religiosa. O que para o
adulto é elementar ou primário, pode não o ser para a criança. Tal atitude de Pestalozzi não resultava, porém,
de um conhecimento objetivo e sistemático da criança; era ainda uma conseqüência dos seus sentimentos
filantrópicos e da filosofia naturalista, fato este bem patente nas suas reflexões sobre o curso da natureza na
evolução do gênero humano. Além disso, pelo que se deduz das suas memórias, tomara-se de horror pelos
métodos e os bárbaros processos punitivos da escola que conhecera em sua infância, a ponto de preferir
vagar pelos campos a submeter-se aos suplícios de tal escola. Procurou, por isso, um método mais humano
de ensinar e educar e formulou seu célebre conceito de instrução com base na intuição. Esta não se refere à
percepção mediante os sentidos e, portanto, sua relação ao empirismo de Locke só pode ser Indireta e, talvez
mesmo, não tenha sido percebida por Pestalozzi. A intuição, para êle, visaria mais a construção e a expressão
das idéias. A chamada intuição sensível seria apenas uma realização concreta que pode permitir a

13
História da Educação

compreensão de uma Idéia já latente no educando. Mas, na formulação dos métodos didáticos, Pestalozzi é
elementarista, o que, em suma, é uma posição indutivista resultante do empiricismo. Daí, prescrever ele que
se deve ensinar o aluno a considerar cada objeto uma unidade em si, independentemente dos demais objetos
que lhe parecem associados, pelo conhecimento da forma, isto é, de suas proporções e dimensões.
Finalmente, decompõe a própria intuição em elementos que constituem o seu conteúdo, por agrupamento
associativo. Tais elementos seriam os sons, as formas e a quantidade. Em função de tal decomposição do
conteúdo da intuição, ficava quase determinado o programa da escola elementar, que seria, justamente,
desenvolver o agrupamento associativo de tais elementos exercitados, respectivamente, pelos sons falados e
cantados, pela geometria, a caligrafia e o desenho, e pelo, número na contagem e no cálculo.
O que mais importa, nesta ligeira notícia de Pestalozzi, é assinalar que ele tentava partir da criança
para o ensino e não vice-versa, isto é, da predeterminação do conteúdo do ensino para a criança.
Em Friedrich Froebel (1782-1852) vamos encontrar uma tentativa de dar ao naturalismo pedagógico,
tal qual o encontramos em Rousseau e Pestalozzi, um timbre religioso, para isso contribuindo, em parte, a
teologia protestante e, em parte, o pan-espiritualismo para o qual descambara certo ramo da filosofia Idea-
lista depois de Leibniz e Espinosa. Daí seus postulados filosófico-pedagógicos: unidade fundamental da
existência da natureza e do homem no absoluto que é o espírito autoconsciente; o propósito de toda a
existência é revelar Deus; a natureza revela Deus à criança; os dotes naturais, tanto quanto os símbolos,

Instituto de Formação e Educação Teológica – www.ifete.edu.br


também revelam a verdade fundamental, porque a natureza interior da criança espera apenas ser despertada
pelo meio ambiente, para realizar-se; a mente é atividade, quer reveladora das verdades fundamentais, quer
criadora de meios e possibilidades de ação.
Mas, a partir desse ecletismo de princípios, Froebel constrói toda uma teoria educacional que, em
muitos dos seus aspectos, lembra as idéias educacionais de Dewey. Do princípio de que a mente é atividade e
de que a natureza interior da criança espera pelas solicitações do meio para realizar-se, chega à conclusão de
que aprender é fazer, e de que a educação não é uma preparação para a vida, mas participação na vida do
ambiente em que se encontra a criança. Para isso a escola deveria ser uma sociedade em miniatura.
Considerou ainda os jogos e brinquedos uma atividade espontânea da criança, de valor altamente educativo.
Por outro lado, na linguagem, no gesto, no canto, na escrita e no desenho, ao contrário de um conteúdo
precípuo e dominante da educação, constituído em um fim, viu apenas meios de expressão, sendo esta o que
se deveria ter em vista, no chamado ensino das matérias escolares.
Além dessa contribuição, é ainda considerado o pai da iniciativa de educação pré-primária,
fazendo, portanto, com que a ação da escola se fizesse sentir já numa idade em que se julgava dever
estar a criança sob a responsabilidade exclusiva dos pais. Numa sociedade complexa, em
desenvolvimento acelerado, com problemas da maior gravidade, como a sociedade européia de após
Napolcão Bonaparte, a família nem sempre conseguia ser uma Instituição educacional capaz e
eficiente. Daí os chamados Jardins da Infância que teriam por fim ou objetivo principal conseguir
dirigir a auto-atividade da criança de menos de seis anos para fins morais, sociais e educativos. Seria
conseguir um desenvolvimento individual, mediante atividades espontâneas em que figurariam em
primeiro plano a expressão motora (jogos, brinquedos, dança, música) e o agrupamento cooperativo.
As idéias de Froebel foram muito bem recebidas na Inglaterra e nos Estados Unidos, onde os jardins
da infância tiveram grande desenvolvimento. Os comentadores de Dewey, (embora Kilpatrick declarasse que
ele nunca lera Froebel, ao relatarem sua experiência de Chicago, não podem deixar de reconhecer a
similaridade de muitas de suas idéias e práticas com as de Froebel) o que é fácil de compreender, tendo em
vista que, já em 1855, a Sra. Schurz; estabelecera no Wisconsin uma escola froebeliana, o mesmo fazendo
Elizabeth Peabody em Boston, em 1860, de modo que, ao tempo de Dewey, as idéias froebelianas já se
achavam mais ou menos Incorporadas ao pensamento pedagógico norte-americano, sem que disso se tivesse
consciência muito nítida.

CAPÍTULO II

OS SISTEMAS NACIONAIS DE EDUCAÇAO

Primeiras organizações sistemáticas da educação pública.

14
História da Educação

Foi durante o século XVIII que a Alemanha deu os primeiros passos para a organização de um
sistema nacional de educação, capaz de atender às necessidades e exigências coletivas de escolas. Por essa
época, duas tendências se revelavam e se realizavam no sistema escolar alemão. Uma, representada pelo
Gymnasium, era o resultado direto do humanismo clássico em sentido restrito; a outra, representada pela
Realschule, correspondia a um resultado da reforma protestante. De acordo com essas tendências, isto é,
satisfazendo a ambas, o Estado foi gradualmente assumindo o controle da educação. Frederico Guilherme 1
(1713-1740) lançou os fundamentos da organização escolar oficial, apoiando as idéias de Francke, criador
das primeiras Volkschulen para as classes populares, das escolas latinas para os que podiam pagar, e das
escolas para a nobreza, além de um Seminarium Praeceptorium para a preparação de professores. Em 1713,
Frederico Guilherme sanciona um código regulador do ensino, onde se recomenda a freqüência escolar geral.
Em 1737, são baixados os Princípios Reguladores, lei escolar básica da Prússia Oriental, em que se
prescreviam normas para a construção de prédios escolares, para o pagamento de professores, taxação,
pagamento de anuidades e auxílio governamental.
Frederico, o Grande (1740-1786), pelos Regulamentos Gerais das Escolas, datados de 1763, foi
quem realmente fundou o sistema prussiano de ensino elementar, estabelecendo a freqüência obrigatória às
escolas para crianças de cinco a treze anos. Além disso, a lei -regulava a formação dos professores e sua
remuneração. E, mais ainda, estabelecia métodos, textos, regime disciplinar, etc. Proclamando a tolerância

Instituto de Formação e Educação Teológica – www.ifete.edu.br


religiosa, suprimia o controle da educação pela Igreja. Não obstante Isso, em 1765, regulava-se o
funcionamento das escolas católicas da Silésia, até que o Código Civil de 1794 estabeleceu que todas as
instituições escolares pertenciam ao Estado, ficando, portanto, todas as escolas e professores sob o controle e
supervisão do Estado, ao mesmo tempo em que se punha realmente em prática a tolerância religiosa.
Na França, o interesse pela educação pública data da expulsão dos Jesuítas em 1764, e decorre dos
esforços do Duque de Cholseul, ministro de Luís XV, para reerguer o país que, em conseqüência da
desastrada Guerra dos Sete Anos, perdera o Canadá e as índias, além de ficar em situação de bancarrota. Daí
o recurso à educação do povo, numa tentativa de lhe dar melhores meios culturais para a recuperação
nacional. Entretanto, o que o governo fez em nada se assemelhava a um sistema nacional de educação.
Limitou-se a estimular as iniciativas religiosas, como a dos Salesianos, e parece que obteve êxito, não,
porém, no sentido desejado, segundo alguns autores como L. Riboulet e outros. Relata Allain que ainda ao
tempo de Luís XV dizia-se que "se nos queixamos de que os campos carecem de braços, de que o número de
artífices diminui, de que a classe dos vagabundos aumenta, é que nossas povoações e nossas aldeias
formigam de escolas. Não há lugarejo que não tenha o seu gramático". La Chalotais escrevia em 1763, no
seu Ensaio Sobre a Educação Nacional, que "nunca houve tantos estudantes. O próprio povo quer estudar;
operários, artífices enviam os filhos aos colégios das pequenas cidades onde pouco custa viver e, depois de
fazerem maus estudos que lhes não ensinaram senão a desdenhar a profissão dos pais, atiram-se aos
claustros, ao estado eclesiástico, tomam empregos na justiça". Se esses testemunhos são verdadeiros, como
parecem, o sistema escolar fomentado pelo Rei e pelas municipalidades francesas, em virtude de seu cunho
Intelectualista, serviu para influir ideologicamente no processo de desorganização social já existente na
época e levar uma grande parte da população a participar ativamente da Revolução que fecharia o século. E
isso apesar de serem as escolas católicas, isto é, dirigidas pela Igreja que, talvez sem o querer, criava o
instrumento cultural que determinaria, em parte, a queda do regime absolutista na França e o próprio poder
temporal do clero.
Luís XV levou, porém, mais adiante o programa de educação, chegando a dar escola secundária
gratuita, mediante bolsas e subvenções, a cerca de 40 000 jovens. Com a criação da Universidade de Dijon,
elevou para 20 o número das universidades francesas. Criou ainda a Escola de Professores (1762), que foi a
origem da Escola Normal Militar e o Pritaneau, espécie de escola preparatória de cadetes. Pode-se, pois,
dizer que Luis XV, se não criou um sistema nacional de educação, deu base material, pelo intenso fomento
da educação gratuita e a conseqüente criação de escolas subvencionadas, para que a Revolução discutisse e
tentasse uni primeiro planejamento de tal sistema, que só veio a ser concretizado efetivamente por Napoleão,
no principio do século seguinte.
Como se verifica, o século XVIII presenciou as primeiras medidas prussianas no sentido de uma
organização estatal da educação publica. No fim do século, a Revolução Francesa iria ocasionar o debate
relativo às primeiras tentativas de realizar obra semelhante em França. Na verdade, porém, tal movimento só
foi efetivamente concretizado no século XIX, pela França e pela Alemanha, tendo repercussão em todo o
mundo ocidental, como se verá a seguir.

15
História da Educação

CAPÍTULO III

A EDUCAÇÃO NA EUROPA E NOS ESTADOS UNIDOS NO SÉCULO XIX

Na segunda metade do século XVIII, às vésperas da Revolução, os filósofos que se filiavam ao


grande movimento enciclopedista não pareciam defender o princípio de educação para todos. De um ponto
de vista racionalista tinham chegado à conclusão de que, para garantir os direitos do homem através da
organização liberal do Estado, era necessário preparar uma elite dirigente e formar uma classe média
executante. Nas obras póstumas de D'Alembert, encontramos a seguinte afirmação:. "Não posso deixar de
fazer sentir os inconvenientes da educação gratuita e estou certo de ter ao meu lado todos os mais célebres e,
esclarecidos professores; se tal instituição tem feito algum bem aos discípulos, tem feito mal ainda maior aos
professores..." Voltalre, descrevendo a razão de proscrever os estudos entre os lavradores: "Eu, que cultivo a
terra, vos apresento um requerimento para ter jornaleiros e não secretários"... E, numa carta a Damilaville,

Instituto de Formação e Educação Teológica – www.ifete.edu.br


dizia claramente que seria conveniente que o povo fosse guiado e não instruído, pois não era digno disso.
Ainda numa carta dirigida a Tobareu, em fevereiro de 1769, acrescentava sarcasticamente: "O povo será
sempre bárbaro e bobo. São bois que precisam de chicote e feno". 0 próprio Rousseau não pensara em fazer
do Emílio um tratado de educação popular, pois em sua correspondência também achou que "o pobre não
tem necessidade de instrução" ... Se Danton dizia, mais tarde, à Convenção, que era tempo de se estabelecer
o grande princípio de que, as crianças pertencem à República antes de pertencerem aos pais, tinha em vista
tão só as crianças das classes politicamente representativas. As massas camponesas não eram levadas em
consideração. Assim, quando, em 1792 e 1793, a Convenção resolveu organizar um sistema de escolas pri-
márias, prescreveu sua criação em todas as localidades de 400 a 1500 habitantes, deixando inteiramente de
lado os camponeses não aldeados. Mas a Revolução sempre cuidou de criar um sistema popular de
instituições escolares. Chegou mesmo a decretar a freqüência obrigatória, punindo os pais que transgredis-
sem a lei.
Em face do exposto, não é de admirar que, em 1802, quando Napoleão encarregou Fourcroy de
organizar a legislação básica do ensino em França, nenhum interesse demonstrasse pela educação elementar,
que deixou a cargo de sociedades religiosas e monitoriais, sem qualquer auxílio do Estado. A Lei de
Fourcroy dava organização sistemática ao ensino secundário, que dividiu em duas categorias; os liceus e os
colégios. Os primeiros, de ensino eminentemente clássico, destinados à elite, eram mantidos pelas taxas
pagas pelos alunos e por auxílios do Estado. Os colégios eram comunais, de currículo mais restrito, e
mantidos pelas municipalidades e as taxas pagas por alunos. Os programas e a regulamentação dessas es-
colas eram rigidamente uniformes para todo o país.
Napoleão criou, ainda, um sistema de escolas superiores, especializadas, com mais de vinte institutos
técnicos e profissionais. Finalmente, em 1808, criou a Universidade de França, não como uma corporação
exclusivamente de escolas superiores, mas, sobretudo, como organização geral do ensino em seus três níveis,
responsável pela administração, fiscalização e orientação das escolas, bem como por seu financiamento, Para
esse fim, dispunha de um Grão-Mestre, de 26 conselheiros e de um corpo de inspetores gerais. Não se podia
abrir qualquer estabelecimento de ensino fora da Universidade, sem a autorização do Grão-Mestre. Foi esse o
meio, reconhece Taine, que Napoleão encontrou para laicizar a educação institucional, arrebatando-a ao
controle eclesiástico e às influências sectárias, para a transformar em um dever e um direito do Estado.
No reinado de Luís Filipe, Guizot retomaria a tese do ensino elementar, com a intenção de o tornar
universal, isto é, para todos. A lei de 1833, baseada em um relatório de Victor Cousin sobre as escolas
prussianas, estabelecia a criação de uma escola em. cada comunidade. à qual competia fornecer o prédio
mobiliado e pagar o professor. O Estado fixava o salário do professor e se reservava o direito de lhe aprovar
a nomeação. Esta lei de 1833, até certo ponto, quebrava o centralismo rígido da Universidade, no que diz
respeito ao ensino primário. Uma lei de 1850 faria o mesmo em relação ao ensino secundário, e outra, de
1875, em relação ao ensino superior.
Mas, a partir de 1890, a França retoma a linha centralizadora e estatal de Napoleão, atribuindo ao
Estado o direito e o dever de dar educação escolar ao povo, "por ser este o principal meio de que pode dispor

16
História da Educação

a República para formar o cidadão e realizar a democracia". Daí a volta ao laicismo, a gratuidade do ensino
primário e sua compulsoriedade a partir de 1882.
Como vimos, Frederico, o Grande, na segunda metade do século XVIII, dera os primeiros passos
decisivos para a criação de um sistema nacional de educação na Prússia. Quando este pais foi derrotado em
Viena, por Napoleão, no ano de 1806, Fichte viu na educação a força regeneradora e capaz de arrebatar a
nação ao estado de prostração a que fôra reduzida.
Já em 1808 era criado um Departamento de Instrução Pública, sob a direção de Von Humboldt, com
a cooperação de Fichte e outros, os quais revolucionaram o sistema prussiano de escolas elementares, não só
em extensão, mas também em profundidade, introduzindo-lhes os métodos pestalozzianos. Em 1817, esse
Departamento foi elevado à categoria de Ministério. Estava, já então, praticamente organizado o ensino
elementar que se ia desenvolver na Alemanha: a "Volkschule", com oito anos de curso, divididos em dois
períodos de 5 e 3 anos, respectivamente, sendo que os últimos podiam ser substituídos pela "Preparan-
denanstalt", espécie de escola preparatória para as escolas do ensino normal, das quais se sala para o
"Lehrerseminar", escolas de três anos, destinadas à formação de professores primários. Isto quer dizer que já
no primeiro quartel do século XIX julgava-se necessário um mínimo de cinco anos primários, mais três de
preparatórios, e ainda três de estudos profissionais, isto é, onze anos de escolaridade, para formar um
professor primário.

Instituto de Formação e Educação Teológica – www.ifete.edu.br


Em 1834, as escolas de ensino secundário foram unificadas e organizadas
com uma finalidade própria, deixando de ser simplesmente preparatórias para o ensino superior. Esta-
beleceram-se, por isso, exames finais que, sem propriamente reprovar, destinavam-se a habilitar os que
podiam ser admitidos no serviço civil, e os que podiam prosseguir os estudos numa universidade. No
decorrer do século, o ensino secundário era ministrado pelas seguintes escolas: a "Vorseliule", preparatória,
com três anos de curso, que substituía os três últimos anos da escola elementar ou que, para as classes
superiores, constituía os primeiros anos de escolarização posteriores ao ensino ministrado em casa por
preceptores especiais, tendendo, assim, a ser uma instituição de casta; seguiam-se, então, ou escolas de nove
anos completos ou escolas de seis anos, estas para os privilegiados que tivessem passado pela escola
preparatória. As escolas de nove anos eram a "Bürgerschule" - chamada "Oberrealschule" depois de 1882 -
em que não se ensinava nem latim, nem grego, e que foi uma escola típica da classe média; o "Gymnasium",
com latim e grego; e o "Realgymnasiurn", sem grego, e com mais ênfase sobre o ensino de matemática e
ciências. As escolas de seis anos eram as mesmas: "Bürgerschule", com alguma ênfase no estudo das línguas
modernas; "Pro gymnasium", sem grego. Além dessas, surgiu depois, atendendo ao problema de especializa-
ção e preparação técnica e científica, a "Reaischule", também de seis anos.
A primeira universidade moderna, alemã, data de 1694, e foi estabelecida em Halle com o objetivo
de reformar o ensino de teologia, direito, medicina e filosofia. No século XIX, o fato de maior importância
ocorrido neste setor foi a fundação, em 1810, da Universidade de Berlim, dedicada ao progresso do conheci-
mento e que, na formação das elites intelectuais germânicas, tem exercido função primordial.
Na Inglaterra, a evolução de uma concepção popular da educação foi muito lenta, por diversas
razões. Antes de mais nada, a criação da Igreja Anglicana, independente da Roma, não permitiu que a
reforma protestante tivesse a mesma importância liberadora e o mesmo caráter revolucionário, para o poder
real e a burguesia, que teve nos países continentais da Europa. Em segundo lugar, era muito enraizada entre
os ingleses a idéia de que a educação não era negócio público (isto é, atribuição do Estado), mas sim da fa-
mília. Em terceiro lugar, as classes dominantes, inclusive os burgueses que passaram a manejar as finanças
nacionais, tinham oportunidade de educação gratuita, satisfatória e capaz de mantê-los na posição de
liderança e dominância social.
Entretanto, a Revolução Francesa que, como a Americana, encontrara na Inglaterra sua maior
inimiga, por motivos econômicos e outros conseqüentes de política internacional, não deixou de influir sobre
a vida inglesa, liberando ideológica e efetivamente forças que lhe iriam modificar muitos aspectos da vida
política e social. O fim do reinado de Jorge III (1760-1820) foi marcado por uma crise financeira originada
pelas guerras mantidas contra a França e por uma crise industrial e operária que levou à formação de um
partido radical. As idéias liberais encontraram defensores na classe dos produtores industriais, cujos
interesses eram lesados por um regime aduaneiro proibitivo, acrescendo ainda que o regime eleitoral vigente
na época favorecia grandemente aos proprietários de imóveis, o que impedia os industriais de fazer ouvir sua
voz. Os chamados proprietários eram, via de regra, a aristocracia nobre, ao passo que os industriais
representavam a burguesia rica e produtiva. Esta conseguiu desencadear uma crise constitucional que
terminou pela Reform Bill de 1832, a qual ampliou grandemente o direito do sufrágio. De 1832 a 1867

17
História da Educação

continuaram as mesmas lutas, já agora visando ao ideal do sufrágio universal e de um regime plenamente
democrático-liberal; ao mesmo tempo, o socialismo fazia sua primeira aparição na Inglaterra como força
político-social, através da organização das trade-unions, forma que assumiu o sindicalismo inglês.
Naturalmente, todos esses fatos políticos, sociais e econômicos não podiam deixar de repercutir
sobre as idéias e o sistema educacional Inglês. A extensão do direito do sufrágio, por exemplo, e o ideal do
sufrágio universal, ditados pela necessidade de representação política das forças econômicas burguesas, não
se poderiam realizar-se o povo não adquirisse a capacidade de votar. À falta de uma teoria estatal e uma
teoria filosófica que levassem a uma organização sistemática de escolas públicas, surgiu o
movimento filantrópico, de 1800 a 1883. Esse movimento repousava sobre o princípio de uma rígida
estratificação social, que sempre foi uma característica inglesa, mas, de acordo com as tendências da época,
reconhecia que as classes tinham, todas, direitos inegáveis, inclusive à educação e à representação política.
Assim, a pobreza era considerada uma condição permanente, embora com certos direitos. Para assegurá-los,
formaram-se várias sociedades destinadas a garantir os fundos necessários à concessão desse mínimo às
classes inferiores. O sistema de escolas monitoriais, de Bell-Lancaster, tem, assim, uma explicação, pois,
permitindo atribuir a um só professor grande número de alunos (os alunos mais adiantados e aplicados eram
aproveitados como monitores, Isto é, como aprendizes-professores, em relação aos mais jovens e mais
atrasados, tornava possível quase realizar a educação universal sem despesas excessivamente grandes.

Instituto de Formação e Educação Teológica – www.ifete.edu.br


Ao mesmo tempo que as sociedades filantrópicas realizavam esse esforço, tinha ele repercussão
sobre o Parlamento, onde um sem-número de discussões e lutas políticas se travaram em torno do problema
da educação pública. Em 1833 uma lei dispõe sobre o primeiro auxílio estatal â educação, destinando uma
verba de vinte mil libras a edifícios escolares. Em 1869, o Estado assume o controle do ensino secundário,
reformando a velha grammar school. Em 1870 estabelece-se a primeira organização do sistema público de
educação, dividindo o país em distritos escolares e criando as school boards locais. Onde as instituições
voluntárias eram insuficientes, as school boards tinham o direito de criar ou aumentar as taxas destinadas à
educação, a fim de manter escolas primárias; podiam ainda, receber, por transferência, escolas voluntárias ou
pagar as taxas escolares que as crianças pobres deviam a esses tipos de escolas. Finalmente, em 1899 foi
criado o Central Board of Education que unificava a administração do ensino elementar e do ensino secun-
dário.
A existência de escolas privadas ou escolas voluntárias não permitiu à Inglaterra a experiência da
escola universal, para todos, pois as gratuitas, populares, sustentadas com as taxas pagas pelos Distritos, não
eram freqüentadas pela aristocracia e os burgueses ricos. Como na Alemanha, criou-se um sistema dual de
educação, em que as escolas públicas eram destinadas às classes inferiores da sociedade, ao passo que as
classes superiores sustentavam suas próprias escolas. Mas, graças a esses sistemas, foi possível ao Governo
decretar, em 1880, a escolarização obrigatória de todos os ingleses até os 10 anos, obrigatoriedade essa que,
em 1899, era estendida até os 12 anos, e, em 1900, até os 14.
Nos Estados Unidos a educação desenvolveu-se localmente, com pouca interferência dos Estados e
nenhuma da União, até o fim do século XIX.
As colônias, que, nos séculos XVII e XVIII, compunham a Nova Inglaterra, e tiveram origem nos
povoamentos puritanos (calvinistas) de Massachusetts, Rhode Island, Contiecticut New Haven, Maine e New
Hampshire, foram estabelecidas com o objetivo inicial de se constituírem em estados teocráticos ou "church-
-states", como 'dizem Allan Nevins e Henry S. Commager", e trataram logo de estabelecer a obrigação
coletiva de manter escolas comuns de leitura, escrita, aritmética e religião. Desse modo, cada colono tinha
três obrigações fundamentais: contribuir para a construção da Igreja local, da escola (geralmente anexa à
igreja) e levantar sua própria residência, no que era auxiliado pelos vizinhos. Mas as diversas seitas
protestantes, que ali se estabeleceram, contribuíram para a variação e diversificação das instituições
escolares, podendo-se mesmo dizer que foi nos Estados Unidos que puderam mais facilmente realizar seus
ideais educativos. As escolas paroquiais luteranas ali floresceram, tanto quanto as calvinistas. Da Inglaterra,
os anglicanos transplantaram a "dame school", a "writing school", a "latin grammar school" e a "charity" ou
"pauper school". Além disso, ainda em moldes ingleses, foram fundados diversos aprendizados, espécie de
escolas profissionais, para órfãos e pobres. A responsabilidade da criação e manutenção dessas escolas,
durante todo o período colonial, era absolutamente local, de acordo com as possibilidades e necessidades de
cada localidade, estabelecendo-se, assim, a responsabilidade coletiva pela educação, como coisa de senso
comum.
Depois da Revolução, consolidadas a independência e a União, permaneceram a mesma autonomia e
a mesma responsabilidade local, em matéria de educação. Como anteriormente, as instituições Inglesas

18
História da Educação

continuaram a exercer sua influência, tendo-se transplantado o sistema monitorial de Lancaster, que, no ano
de 1806, esteve, em pessoa, em Nova York. Como na Inglaterra, o sistema lancasteriano teve a virtude de
demonstrar as vantagens e a economia de um sistema de escolas comuns, para todos. As escolas infantis,
segundo o modelo de Robert 0wen, realizado na Escócia em 1799, também foram introduzidas em Boston,
Nova York e outras cidades, podendo ser consideradas como antecessoras dos primeiros graus primários das
escolas com atividade manuais, posteriores.
Pouco a pouco foi surgindo a idéia de sistematizar o aparelhamento escolar existente, sem quebra de
relativa autonomia e responsabilidade locais.
Em 1837, o Estado de Massachusetts, sob a influência de Horace Mann, secretário (o primeiro) do
Conselho de Educação, iniciou o movimento pela criação de um sistema estadual de educação pública. de
modo que lima série de desorganizados e heterogêneos sistemas de escolas de comunidade foi transformada
em uma organização, cujas bases e diretrizes eram fixadas pelo Estado. Connecticut e Rhode Island, de 1838
a 1849, sob a liderança de Henry Barnard, lançaram-se à Mesma obra, sendo, aos poucos, Imitados pelos
demais estados. É Interessante observar que os sistemas estaduais norte-americanos nunca foram
exclusivistas, no sentido administrativo, tendo mesmo consagrado o livre direito de escolha e de organização
da escola, embora determinassem a obrigatoriedade escolar e a obrigatoriedade coletiva de manutenção das
escolas, bem como, de outro lado, uma política de mínimos escolares a serem realizados por todas as escolas,

Instituto de Formação e Educação Teológica – www.ifete.edu.br


públicas ou privadas. Conselhos locais, superintendentes designados pelo Estado ou eleitos pelo povo, uma
política de emulação antes que de inspeção ou fiscalização, através da classificação de escolas e de medidas
que as avaliassem qualitativamente, tudo isso contribuía para a democratização e a melhoria quantitativa,
bem como para a melhoria dos métodos de ensino, da administração escolar, da disciplina e da supervisão.
Foi então, com Horace Mann e Henry Barnard, que a preocupação e a conseqüente realização dos institutos
de preparação de professores adquiriram impulso em todo o pais. São também dessa época a compreensão e
a iniciação das escolas secundárias como escolas de educação comum do povo, tanto quanto as primárias. Só
Horace Mann estabeleceu em Massachusetts cinqüenta escolas secundárias.
Entre as escolas elementares e as secundárias não havia, pois, solução de continuidade de modo que
os dez a doze anos de educação fundamental se realizavam, nos diferentes Estados, em ambas as escolas,
conforme critérios de repartição do curso, que variava grandemente.

CAPÍTULO IV

19
História da Educação

EDUCAÇÃO CONTEMPORÂNEA

No século XX surgiram vários movimentos, experiências e teorias educacionais destinadas a renovar


os métodos da escola tradicional. Assim, a liderança dos conhecimentos pedagógicos do século XIX permitiu
que se chegasse no século XX a um conceito bem mais pragmático da educação.

A nova escola e a escola ativa. A chamada "escola nova" abarcou várias correntes pedagógicas.
Reagindo contra a organização tradicional do ensino em compartimentos estanques, o médico e educador
belga Ovide Decroly criou o método globalizador, que se concentrava no princípio do interesse da criança, já
o francês Célestin Freinet valorizou o ensino baseado em métodos ativos e no trabalho de equipe como meio
de formação do educando, centralizando as atividades escolares em torno do uso da imprensa na escola.
A partir do princípio de que o ensino simultâneo não levava em conta as diversas aptidões e tipos de
inteligência dos alunos, procurou-se estabelecer a "diferenciação pedagógica" em graus e ciclos sucessivos,
da qual já se havia cogitado anteriormente. Nesse sentido, o psicólogo suíço Edouard Claparède, que deu a

Instituto de Formação e Educação Teológica – www.ifete.edu.br


seu método a denominação de "educação funcional", criou o "sistema de grupos móveis". Desse sistema, a
pedagogia passou à individualização do aprendizado, no que sobressaiu o trabalho da italiana Maria Mon-
tessori, baseado no princípio da auto-educação. Na América Latina, Lorenzo Luzuriaga, Lourenço Filho e
Anísio Teixeira foram os grandes pedagogos da escola ativa.

Educação em liberdade. O inglês Alexander S. Neill, em sua escola de Summerhill, pôs em


prática a educação em liberdade. Aboliu a hierarquia professor-aluno e, portanto, a relação de
autoridade na experiência pedagógica, encaminhando a criança à auto-educação, de acordo com seu
ritmo individual de desenvolvimento.
O suíço Jean Piaget destacou-se entre os educadores que preconizaram o respeito à liberdade e à
individualidade da criança, defendendo um sistema educativo menos diretivo, menos autoritário e uniforme.
Piaget procurou. demonstrar que a educação devia ajustar-se às leis e etapas do desenvolvimento psicológico
da criança.

Educação socialista. Só no século XX foi elaborada uma doutrina marxista para a educação. A
maior figura da pedagogia marxista foi o soviético Anton Seinenovitch Makarenko, que criou as "escolas da
comunidade". Outros pensadores de orientação marxista, como o francês Louis Alditisser, analisaram o papel
da escola tradicional que, ao inculcar no educando o sistema de valores das classes sociais dominantes, seria
responsável pela perpetuação das desigualdades sociais.
Na União Soviética, após a morte de Stalin, em 1953, as mudanças na política oficial afetaram dire-
tamente a escola. A idéia central passou a ser o estreitamento dos laços entre a escola e a vida, em todos os
níveis. Reviveu a idéia da educação politécnica, mas no sentido de preparar estudantes secundários para o
trabalho especializado na indústria e na agricultura.
Essa orientação, que vigorou no período do governo de Nikita Khruchev, foi substituída por uma
política de universalização da educação secundária, com ênfase na criação de escolas secundárias técnicas.
No entanto, os ganhos quantitativos dessa política não tiveram correspondência na melhoria da qualidade de
ensino.
Na China, desde a revolução comunista até à morte de Mao Zedong (Mao Tsé-tung), em 1976, a
educação teve como tônica a doutrinação ideológica em todos os campos e níveis, que ocupou, por lei, dez
por cento do currículo escolar. 0 novo governo deslocou a ênfase para a modernização, principal bandeira do
regime pós-Mao. Todo o esforço educacional passou a ser dirigido no sentido das "quatro modernizações"
(indústria, agricultura, defesa nacional e ciência e tecnologia).

Educação liberadora. Para o brasileiro Paulo Freire o objetivo da educação deveria ser a liberação
do oprimido, que lhe daria meios de transformar a realidade social a sua volta mediante a “conscientização”
(conhecimento crítico do mundo). No período 1958/1964 no Brasil e depois de 1964 no Chile, Paulo Freire
pôs em prática, com bons resultados, seu método de alfabetização de adultos. A eficácia e a validade do
método estribam-se no fato de partir da realidade do alfabetizando, do seu universo, do valor pragmático das

20
História da Educação

coisas e fatos de sua vida cotidiana, de suas situações existenciais. Obedece às normas metodológicas e
lingüísticas, mas vai além delas, ao desafiar o homem ou a mulher que se alfabetizam a se apropriarem do
código escrito com vistas a sua politização. O trabalho de Paulo Freire pode ser visto não apenas como um
método de alfabetização, mas como um processo de conscientização, por levar em conta a natureza política
da educação.

Educação e tecnologia. Todas as correntes citadas abordaram, sob ângulos diversos, os problemas
gerados pelo desenvolvimento tecnológico no âmbito da educação. As novas situações criadas pela
sociedade pós-industrial, o avanço contínuo da informática e dos meios de comunicação e a complexidade
crescente dos novos conhecimentos e técnicas acentuaram o conflito entre dois tipos de orientação
educacional: a educação científica e a humanista. Além disso, a desigualdade econômica entre as nações
industrializadas e os países subdesenvolvidos constituiu um obstáculo a um planejamento global da
educação, que sempre foi reflexo das condições socioeconômicas.
Todavia, a educação no século XX procurou assumir um caráter internacional. Em 1919, surgiu o
Bureau International des Écoles Nouvelles (Escritório Internacional das Escolas Novas). Expandiram-se os
centros de estudos de âmbito internacional; sucederam-se os congressos, assembléias e simpósios sobre
educação; lançaram-se várias publicações especializadas na matéria.

Instituto de Formação e Educação Teológica – www.ifete.edu.br


No século XX, entre as organizações internacionais existentes, destacaram-se duas: o Bureau
International d´Éducation (Escritório Internacional de Educação), em Genebra, e a Organização das Nações
Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO), fundada em 1946, voltada para educação,
ciências exatas e naturais, ciências sociais, atividades culturais, assistência técnica, intercâmbio de pessoas e
informação. A Unesco procurou dar ênfase à luta contra o analfabetismo, à educação dos adultos, bem corno
à educação permanente, já que as mudanças se processavam com grande rapidez, exigindo, portanto, uma
constante atualização de métodos e programas educacionais.

CAPÍTULO V

EDUCAÇÃO NO BRASIL

Período colonial.

A história da educação tio Brasil iniciou-se com a chegada dos padres jesuítas em 1549. Visando à
propagação da fé, lançaram as bases de um vasto sistema educacional, que se desenvolveu progressivamente
com a expansão territorial da colônia. Agindo com rapidez, estabeleceram-se no litoral e daí penetraram nas
aldeias indígenas, fundando conventos e colégios. por dois séculos, foram os principais educadores do Brasil,
ao lado de outras ordens religiosas que também mantiveram escolas, como a dos franciscanos.
Nas escolas elementares, base do sistema colonial de educação, que funcionavam onde quer que
existisse um convento, os índios aprendiam a ler, escrever, contar e a falar o português. Nelas também eram
instruídos os filhos dos colonos. A cultura dos nativos foi, pouco a pouco, substituída pelas idéias dos
jesuítas. Desse ponto de vista, os missionários atuaram como elementos desintegradores das culturas
não-européias.
Na família patriarcal, a única força que se opunha à ação educadora dos jesuítas era a dos senhores
de engenho, cuja autoridade se exercia não somente sobre os escravos como sobre suas esposas e filhos. Esse

21
História da Educação

estado de submissão facilitava o trabalho dos jesuítas, que também procuravam submetê-los à autoridade da
igreja. A família patriarcal seguia, assim, as tradições portuguesas.
Humanistas por excelência, os Jesuítas procuravam transmitir aos discípulos o gosto pelas atividades
literárias e acadêmicas, (de acordo com a concepção de “ homem culto” vigente em Portugal. A falta de
interesse pelas atividades técnicas e científicas marcou a educação colonial, por sua vez moldada pela da me-
trópole. Principiando pelas escolas de leitura e escrita, não pararam aí os jesuítas, nem mesmo no primeiro
século, pois já havia, então, cursos de humanidades em seus colégios do Rio de Janeiro, Bahia e
Pernambuco. Os colégios que exerceram maior influência foram os de Todos os Santos, na Bahia, no qual
Antônio Vieira foi educado, e o de São Sebastião, no Rio de janeiro. Ambos apresentavam o sistema
educacional jesuíta em sua forma mais completa, desde o curso de humanidades até o de teologia e ciências.
Eram os centros, por excelência, de formação dos líderes religiosos.
No sistema de ensino dos Jesuítas, ao curso de humanidades seguia-se o de artes (filosofia e ciência).
Os cursos que preparavam para as profissões liberais só existiam na Europa, e os estudantes brasileiros
procuravam geralmente a Universidade de Coimbra, famosa pelos cursos de ciências jurídicas e teológicas, e
que teve, por isso, grande importância na formação da elite cultural brasileira.

Instituto de Formação e Educação Teológica – www.ifete.edu.br


Educação ao tempo de Dom João VI.

Desde a expulsão dos jesuítas em 1759 até a transferência da corte portuguesa para o Brasil, a
educação da colônia passou por um período de desagregação e decadência. A chegada do príncipe regente,
D. João, modificou a política educacional que o governo luso adotava em relação ao Brasil. A fundação de
várias instituições culturais deu novo impulso à educação: a Imprensa Régia, a Biblioteca Nacional e um
museu, e, sobretudo, as escolas de ensino superior, a Escola Naval, a Escola Militar, cursos de medicina no
Rio de Janeiro e na Bahia, e nesta última cursos de agricultura, química e desenho técnico. Essas escolas
rompiam com a tradição de ensino excessivamente literário, vigente na época dos jesuítas. Ficaram, porém,
circunscritas quase exclusivamente ao Rio de janeiro e à Bahia. O resto da colônia continuava mergulhado
no mesmo atraso. Esse período foi um dos mais importantes na evolução cultural do Brasil, pois nele foram
lançadas as bases de notáveis instituições culturais.

Império.

Com a proclamação da independência e a fundação do império em 1822, surgiram novas idéias


pedagógicas. Tentou-se organizar um sistema educacional popular e gratuito: uma lei de 1827 estabelecia
que se criassem escolas primárias em todas as cidades, vilas e povoados, e escolas secundárias nas cidades e
nas vilas mais populosas. Essa lei, porém, não foi muito eficiente na prática, sobretudo pela falta de especia-
listas para planejar e executar tal sistema. Quanto à educação superior, cabe destacar, nessa época, a criação
dos cursos de direito, no convento de São Francisco, em São Paulo, e no mosteiro de São Bento, em Olinda,
que exerceram importante papel na vida cultural do país.
A descentralização do ensino básico (ato adicional de 1834), cuja organização passou a ser
responsabilidade das assembléias provinciais, teve como conseqüência o extraordinário desenvolvimento das
escolas secundárias particulares, sobretudo nas capitais das províncias. O Colégio do Caraça, fundado em
Minas Gerais, pelos irmãos lazaristas, tornou-se uma das mais importantes instituições de instrução
secundária. 1.
O Colégio Pedro II, criado pelo governo federal em 1837, foi uma das mais importantes instituições
de cultura geral fundadas durante o império. As primeiras escolas normais para a formação de professores
foram a de Niterói, em 1835, a da Bahia (1836), a do Ceará (1845), a de São Paulo (1846) e a do Rio de
Janeiro (1880).
O imperador Pedro II estimulou sob várias formas as ciências, letras e artes do país. No entanto, a
política educacional de seu governo teve de acomodar-se às condições econômicas e políticas, que
determinavam uma dualidade de sistemas educacionais: para a elite - composta dos filhos dos grandes
proprietários rurais, dos magistrados e políticos e da nascente burguesia comercial, as escolas secundarias e a

22
História da Educação

faculdade; para o povo, a escola primária, os liceus de artes e ofícios e a escola normal. A educação
superior, inaugurada com os cursos jurídicos de Olinda e São Paulo, em 1827, teve corno característica
durante muito tempo o sistema de faculdades isoladas de tipo profissional, que formam bacharéis e doutores
com o fim de conferir privilégios à elite. A evolução do sistema educativo prosseguiu lenta, ressaltando-se a
ação do visconde do Rio Branco, que reorganizou a Escola Central, denominada desde então Escola
Politécnica, fundando três cursos básicos, engenharia, mineralogia e artes e manufaturas. Em 1875, criou,
também, a Escola de Minas, em Ouro Preto.

República Velha.

Com a proclamação da república, a política educacional não se modificou, pelo menos até a primeira
guerra mundial. O tipo de mentalidade formado no período colonial e no império persistiu: o mesmo gosto
pela literatura e retórica, o mesmo formalismo. Excetuando-se a reforma de Benjamin Constant, influenciada
por idéias positivistas, foi esse o espírito que marcou a constituição brasileira de 1891, no tocante à
legislação educacional. A reforma de Benjamim Constant estabelecia a primazia dos estudos científicos
sobre os de letras, com a introdução das ciências físicas e naturais já a partir das classes elementares.
Após a primeira guerra mundial, a “escola nova” penetrou no Brasil: Antônio Sampaio Dória, em

Instituto de Formação e Educação Teológica – www.ifete.edu.br


São Paulo (1920), Lourenço Filho, no Ceará (1923),Anísio Teixeira (1925), na Bahia, Francisco Campos e
Mário Casassanta, em Minas Gerais (1927), Fernando de Azevedo, rio Distrito Federal (1928) e Carneiro
Leão, em Pernambuco (1928), tentaram reorganizar os sistemas educacionais. Surgem publicações de grande
interesse, como a obra de Carneiro Leão sobre a educação no campo e a de Medeiros e Albuquerque a
respeito dos testes.

Era Vargas.

O movimento de reformas educacionais desse período era apenas um aspecto do processo


revolucionário que se desencadeou no país a partir de 1924, eclodindo em 1930. A revolução não adotava
propriamente uma política educacional definida, mas, facilitando a circulação de idéias novas, possibilitou a
formação de uma consciência educacional que exigia a adoção de medidas importantes como a criação do
Ministério da Educação, a reorganização do ensino secundário e da colocação superior com a criação de
universidades. O governo provisório criou o Ministério da Educação e Saúde, nomeando para ministro
Francisco Campos, que empreendeu a reforma da educação superior, tom a elaboração do estatuto das
universidades.
A primeira universidade criada dentro do espírito da reforma Francisco Campos foi a de São
Paulo, em 1934, contando com uma faculdade de filosofia, ciências e letras. Viu sua atuação, essa
universidade dispensou atendimento especial às pesquisas científicas. Em 1935, Anísio Teixeira fundou a
Universidade do Distrito Federal, com cinco escolas: Faculdade de Filosofia e Letras, de Ciências, de Direito
e Economia Política, de Educação, e Instituto de Artes. Essa universidade foi extinta em 1938, e sua
faculdade de Filosofia, incorporada à Universidade do Brasil, passou a constituir a Faculdade Nacional de
Filosofia.
A reforma Francisco Campos intensificou os debates em torno da política educacional do país,
delineando-se então duas grandes correntes: a dos reformadores lutavam por uma crescente democratização
da escola -- a chamada "escola nova" - e a da igreja, que combatia o laicismo das novas teorias pedagógicas.
Essas duas facções permaneceram em oposição até 1937, ano em que o golpe de estado instituiu o regime
ditatorial. A Carta constitucional de 1937 adotou alguns dos principais pontos defendidos pelos refor-
madores, mantendo o caráter gratuito e compulsório do ensino primário e preocupando-se, sobretudo, com a
instrução vocacional e pré-vocacional.

República populista.

De acordo com os dispositivos constitucionais de 1946, foi apresentado à Câmara dos Deputados,
em 1948, o projeto de diretrizes e bases da educação nacional, elaborado por uma comissão de educadores de
diversas tendências ideológicas, entre os quais figuravam o padre Leonel Franca, Alceu Amoroso Lima,
Almeida Júnior e Lourenço Filho. O projeto concedia maior autonomia aos estados na organização de seus

23
História da Educação

sistemas de ensino, dava flexibilidade aos cursos, estabelecia a articulação dos cursos de grau médio e o
currículo mínimo obrigatório, além de uma conceituação objetiva da autonomia universitária.

Período autoritário (1964-1985).

O ensino no Brasil era organizado em níveis: primário, médio e superior. Pela lei 5.692, o ensino de
nível primário fundiu-se ao antigo ginásio e passou a constituir e ensino de 1º grau; o ensino médio
transformou-se em ensino de 2º grau. O sentido básico da reforma residiu na atribuição de capacidade
habilitadora ao ensino médio no campo profissional, e não somente na preparação para o ensino superior.
Considerando a realidade brasileira, a reforma de 1971 visava à formação de quadros profissionais dentro do
processo de ensino geral, sem incompatibilização com a possibilidade de continuação dos estudos em níveis
superiores.
Nas quatro primeiras séries do primeiro grau, as matérias de um "núcleo comum" nacional e obriga-
tório passaram a ser tratadas como atividades (comunicação e expressão, estudos sociais e ciências), in-
cluindo-se ainda uma parte diversificada, variável de acordo com as condições locais. Nas quatro últimas
séries do primeiro grau, as atividades do núcleo comum foram abordadas como "áreas de estudo". Nas três
séries do segundo grau, o currículo se apresentou sob a forma de disciplinas, dosadas em cada caso de acordo

Instituto de Formação e Educação Teológica – www.ifete.edu.br


com a profissionalização e o curso superior pretendidos.
Exigiram-se também, em ambos os graus, educação física, educação artística, educação moral e
cívica, programa de saúde e ensino religioso, este obrigatório, para os estabelecimentos oficiais e facultativo
para os alunos. O ensino supletivo, por sua vez, tinha por finalidade suprir a escolarização regular para
adolescentes e adultos que não a tivessem seguido ou concluído na idade própria. Quanto ao ensino
técnico-profissional, a lei adotou urna orientação flexível, pela qual o aluno pode optar por uma escola
profissionalizante que, ao mesmo tempo, o habilita a ingressar na universidade. Os principais órgãos de
treinamento são o Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (Senai) e o Serviço Nacional de
Aprendizagem Comercial (Senac).
Em 28 de novembro de 1968 foi aprovada a lei nº 5.540, que fixou normas de organização e
funcionamento do ensino superior e sua articulação com a escola média, além de outras providências. Em
seu artigo 39, a lei estabelece que as universidades gozarão de autonomia didático-científica, disciplinar,
administrativa e financeira. E o artigo 26 determina que o Conselho Federal de Educação fixa o currículo
mínimo e a duração mínima dos cursos superiores correspondentes a profissões reguladas em lei e de outros
necessários ao desenvolvimento nacional.

Redemocratização.

A Filosofia educacional foi objeto de intensos debates na Assembléia Nacional Constituinte. Os


defensores da democratização do ensino tentavam garantir proteção constitucional para uma educação leiga,
universal e gratuita, com forte ênfase no ensino público, admitindo o privado sem direito a verbas públicas e
sujeito a controle do poder público. Os privatistas defendiam a ampla liberdade de ação para o ensino
privado e opunham-se à proibição de subsidiá-lo. Os primeiros fizeram aprovar o artigo 205, segundo o qual
a educação é "direito de todos e dever do estado". Os privatistas fizeram acrescentar a esse dispositivo o
inciso III do artigo 206, estabelecendo a "coexistência de instituições públicas e privadas de ensino"; e o
artigo 213, que permite a destinação de recursos públicos a escolas comunitárias, confessionais ou
filantrópicas. O artigo 209, em seu inciso II, estabeleceu que o ensino é livre à iniciativa privada", mas
sujeito à "autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Público".

24
História da Educação

BIBLIOGAFIA

Encliclopédia Delta Larousse

Enciclopédia Barsa

BRANDÃO, Carlos Rodrigues. O que é educação. Abril Cultural/Brasiliense


ROSA, Maria da Glória de. A história da educação através dos textos. Cultrix

Instituto de Formação e Educação Teológica – www.ifete.edu.br

25

You might also like