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Resenhas

EccoS Rev. Cient., UNINOVE, São Paulo: (1): 81-102

MAINGUENEAU, Dominique. Novas tendências em Análise do Discurso. 3. ed.


Campinas, SP, Pontes/Ed. Unicamp, 1997.
*Mestranda em Lingüística Apli- Alice Yoko Horikawa*
cada pelo LAEL, Pontifícia Uni-
versidade Católica de São Paulo, e
professora de Língua Portuguesa
e Literatura Brasileira.
Com o intuito de justificar suas há em todos os textos um sentido oculto
escolhas na organização da obra No- que não poderia ser captado pela análise
vas tendências em Análise do Discurso, das formas da língua. Haveria então
Maingueneau expõe na Introdução que se buscar técnicas mais adequadas
algumas problemáticas que envolvem o à apreensão dos sentidos. Imbuída dessa
estudo da Análise do Discurso em face tarefa, a Análise do Discurso rejeita o
da grande amplitude que a disciplina autoritarismo da interpretação única e
alcançou. verdadeira e propõe, conforme Pêcheux
Inicialmente, o autor remonta às (citado por Maingueneau)
origens da Análise do Discurso de linha
francesa, definindo-a como o “encontro construir procedimentos que expo-
E de uma conjuntura intelectual e de uma nham o olhar-leitor a níveis opacos
C à ação estratégica de um sujeito (...).
C
prática escolar”. Dada a forte tradição
O da prática escolar francesa em voltar-se O desafio crucial é o de construir
S à explicação dos textos, a Análise do interpretações, sem jamais neutrali-
Discurso encontrou na França um solo zá-las, seja através de uma minúcia
R qualquer de um discurso sobre o
E fecundo. Num contexto de hegemonia discurso, seja no espaço lógico es-
V. do estruturalismo, no final dos anos ses- tabilizado com pretensão universal.
senta, observa-se um movimento inte-
C
I lectual que, ao refletir sobre a escritura, Como vimos, a Análise do Dis-
E a lingüística, o marxismo e a psicanálise, curso já nasce imersa na multiplicidade.
N desenha um novo campo do saber. Para Maingueneau, a teoria deve hoje
T.
Abrigando lingüistas, historiadores e dispensar uma atenção especial às
n. 1 psicólogos, o movimento se dedicaria à repercussões que essa multiplicidade
v. 1 construção de uma abordagem discursi- determinou, numa tentativa de dissi-
va dos processos ideológicos, opondo-se par as “confusões”. A pluralidade de
dez. à rigidez hierárquica no estudo da língua concepções acerca do termo discurso
1999 proposto pelo estruturalismo. A Análise na literatura lingüística levou a Análise
do Discurso nascia da convicção de que

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do Discurso a uma circulação incontro- constituir num objeto da Análise do


lável. Embora não seja o caso de lutar Discurso, Maingueneau nos apresenta
contra os desvios, impõe-se uma tarefa uma tendência fortemente marcada
urgente de compreendê-los para evitar neste campo: os estudos da Análise do
que a Análise do Discurso perca-se neles Discurso relacionam-se com textos pro-
e se torne uma expressão desprovida de duzidos em instituições que restringem
qualquer sentido. É nessa perspectiva a enunciação e nos quais se cristalizam
que Maingueneau empreende o esfor- conflitos históricos e sociais, objetivan-
ço de buscar convergências em meio à do analisar aquilo que Foucault, citado
multiplicidade de acepções. por Maingueneau, chama de formações
Para Maingueneau, o conflito discursivas:
a ser enfrentado decorre da afirma-
um conjunto de regras anônimas,
ção da Análise do Discurso quanto
históricas, sempre determinadas ao
à dualidade radical da linguagem: tempo e ao espaço que definiram em
“integralmente formal e integralmente uma época dada, e para uma área
atravessada pelos embates subjetivos social, econômica, geográfica ou lin-
e sociais”. A questão é que a fronteira güística das condições de exercício E
não foi claramente demarcada. Em da função enunciativa. C
vista disso, a Análise do Discurso pode C
transitar por várias áreas, apoiando-se Maingueneau admite a oposição O
contra esse tipo de restrição, observada S
em disciplinas vizinhas. A cada opção
feita, cresce a diversidade, pois a acep- em estudos que se interessam pelas R
ção de discurso modifica-se conforme propriedades do discurso comum e E
o campo em que se apóia. Além disso, não aceitam os limites impostos pela V.

cada campo pode remeter a Análise do observação de objetos institucionali- C


Discurso a diferentes perspectivas. zados. Para o autor, o debate acerca I
Diante dessa amplitude, o autor dessas divergências deve se voltar para E
N
coloca a necessidade urgente de se de- a compreensão dessas novas tendências T.
finir mais claramente os critérios para no sentido de se verificar se elas não
analisar as experiências que a Análise do conduzem à definição de uma prática n. 1
Discurso realiza. distinta da Análise do Discurso. Na v. 1
Buscando restringir um pouco o verdade, o que deve ser colocado em
campo de análise, afirmando inclusive questão são os conceitos e os métodos dez.
que uma conversa de bar não pode se da Análise do Discurso para se analisar 1999

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em que medida eles apreendem conve- lingüística. Embora, nos primórdios, a


nientemente o objeto de análise. Mes- lingüística tenha servido à Análise do
mo que se resolva a questão, o domínio Discurso como uma “ciência piloto”,
da Análise do Discurso permanecerá da qual se retiravam apenas os concei-
ilimitado, visto que os cruzamentos tos e métodos lingüísticos apropriados
possíveis entre as várias tipologias são a um uso específico, Maingueneau
muitos. Além disso, o objeto discurso aponta para a importância de um apro-
permite recortes em muitos campos de fundamento nos conhecimentos sobre
investigação. os funcionamentos da linguagem para
Avançando em sua reflexão, que se tenha clareza das opções feitas
Maingueneau propõe uma discussão e se evite cair no vazio dos estudos
acerca da inserção da Análise do Dis- desinteressantes.
curso no campo da lingüística. Para Considerando toda a amplitude
o autor, a inserção não pode ser vista do campo da Análise do Discurso, Main-
como algo natural porque a análise de gueneau assume a impossibilidade de
textos por ela promovida utiliza-se dos se atingir a exaustividade. Por isso, se
conteúdos da lingüística, mas deve ser propõe a delimitar a sua obra com a
E
C assumida como opção epistemológica, exposição das tendências mais recen-
C fundamentada na convicção de que os tes, orientado pela coerência que ele
O processos discursivos podem ser melhor evidencia nos movimentos essenciais da
S
apreendidos com a apropriação dos Análise do Discurso, a saber: a depen-
R conhecimentos da lingüística. Todavia, dência comum em relação às questões
E Maingueneau alerta para a necessidade da enunciação e da pragmática. Nota-se
V.
de se pensar a relação entre a Análise do que as correntes da Análise do Discurso
C Discurso e a lingüística, pois, embora encontram convergências na recusa em
I exista na discursividade uma ordem conceber a linguagem como um mero
E que se materializa na língua, há, por suporte para transmissão de informa-
N
T.
outro lado, uma outra ordem que se ções e na adoção de uma concepção de
realiza por vias diversas. A questão linguagem que a considera como um
n. 1 traz uma tarefa para a Análise do Dis- instrumento que permite a construção
v. 1 curso: o aprofundamento no campo e a transformação das relações entre
da lingüística por parte daqueles que interlocutores, seus enunciados e seus
dez. se inserem na Análise do Discurso, referentes.
1999 mas não pertencem especificamente à

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