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19/2/2008

O Contexto do DI: a Comunidade/Sociedade internacional. Fases Históricas do


DI. O DI contemporâneo e os desafios presentes. Noção de DI. Critérios em presença e
respectiva crítica. A questão da juridicidade do DI. Os tipos de relações jurídicas
internacionais. DI e figuras afins. Classificações do DI.

Contexto do Dto Internacional

● Comunidade/Sociedade Internacional
→ Complexa
→ Plural
→ Fragmentada
→ Policêntrica
→ Institucionalização débil mas progressiva.

Fases Históricas do Dto Internacional

● Proto-história do DI (do ius gentium romano ao Ius Publicum Europoeum – século


XVII)
DI é:
→ o que a razão natural estabeleceu entre todos os homens (Gaio)
→ o que é usado por todos os povos (Uprano)
→ o dto regulador da comunidade política internacional (Vitoria 1526)
→ o dto que todos os povos e nações devem observar entre si (Suarez 1612)
→ o dto que regula as relações entre as nações (Grocio 1625, em geral considerado o
fundador do DI moderno).

● História do DI
1→ Formação do DI – da Vestefália (1648) a Viena (1815)
É uma fase de guerras constantes na Europa em que os equilíbrios espontâneos
criados por tratados eram frequentemente violados para a formação de novos tratados.
Trata-se de uma fase de formação que corresponde à criação da Europa como hoje a
conhecemos. Os Estados, como soberanos, eram iguais entre si.
2→ Consolidação do DI – de Viena (1815) a S. Francisco (1945)
Corresponde ao concerto europeu. Foi a primeira forma de institucionalização do
dto europeu, a qual pretendeu durar ao longo do tempo. Tratava-se de uma forma de
directório, ou seja, ainda reconhecendo a soberania dos Estados, o equilíbrio das
respectivas relações era decidido pelas grandes potências, ficando os Estados mais
pequenos num segundo plano. Tratava-se, pois, de uma institucionalização precária de
carácter político-diplomático cujo equilíbrio não resistiu aos novos elementos que
surgiram nas relações entre os Estados:
 princípio das nacionalidades;
 princípio da autodeterminação dos povos;
 ideia da nação enquanto representação política dos povos;
 consolidação de princípios como a soberania e independência dos Estados,
institucionalizando-se as suas relações.
Nos finais do século XIX surgem novos elementos que colocam em causa a
concepção do DI básico:
 surgem as primeiras organizações internacionais (OI), de carácter técnico;
 industrialização (o desenvolvimento da realidade económica e social obrigou
os Estados a aprofundar as suas relações internacionais);
 o dto de fazer a guerra é discutido, acabando por ter preterido a favor dos
movimentos pacifistas nas Convenções de Gaia. É criado um Tribunal para se resolver
os conflitos e disputas através de um modo jurídico. Contudo, com a Grande Guerra
de1945, verifica-se um recuo destes avanços.
1928→ Pacto de Interdição da Guerra, o qual não teve efeitos práticos. A primeira
metade do século XX foi uma fase de espera.
3→ O DI contemporâneo – de S. Francisco (1945) a …
Assistimos à criação das Nações Unidas, o que de certo modo retoma a ideia da
sociedade nações e de um quadro de organização das relações internacionais. Apesar de
não ter conseguido evitar a proliferação dos conflitos a nível global, estes são
localizados.
Desde 1945 que o DI tem vindo a abranger uma comunidade internacional cada
vez mais ampla, sendo, portanto uma organização de carácter universal que não deve ser
confundido com o Dto Europeu.
A segurança e paz internacionais são uma competência do Conselho de
Segurança, havendo uma relação de subordinação que ignora o princípio da soberania.

O DI contemporâneo

● Multiplicação dos sujeitos (uma sociedade civil global em construção?)


→ Estados (descolonização; fim dos Estados socialistas europeus);
→ Organizações Internacionais, em especial a UE e a ONU;
→ A questão ONG e TNC como sujeitos do DI;
→ emancipação do indivíduo como sujeito do DI.
Inicialmente o indivíduo não era considerado sujeito do DI, apenas
indirectamente – através do Estado – se relacionava com este.
No século XX a necessidade de o indivíduo participar na formação das regras
que internacionalmente o regulam, assim como a questão da responsabilidade
internacional (a possibilidade de os indivíduos serem directamente responsabilizados
pelos seus actos internacionais) levou os tribunais e o Tribunal Penal Internacional a
permitirem a emancipação do indivíduo como sujeito de DI. Contudo, é algo que se
encontra ainda em formação.
Exemplos práticos da emancipação dos indivíduos como sujeitos de DI: o
reconhecimento das minorias (ex.: povo palestiniano).
Dto humanitário → possibilidade de os indivíduos serem reconhecidos
internacionalmente, sendo os seus dtos tutelados a nível internacional. É um dto difuso,
havendo domínios em que essa tutela é mais profunda e extensa. Ex.: Convenção
Europeia dos Dtos do Homem.
Sociedades transnacionais (multinacionais):
→ natureza comercial;
→ dimensão comparável ou mesmo superior à de alguns Estados, tanto do ponto de
vista humano como comercial;
→ interferem nas relações internacionais e na capacidade dos Estados.

● Os desafios presentes
→ a globalização económico-financeira;
→ as ameaças naturais;
→ os desafios humanos (pobreza, diálogo intercivilizacional, conflitos armados,
terrorismo, proliferação nuclear, etc).
Todas estas questões solicitam o DI – em busca duma governance global.

Noção de DI

● Critérios de definição
→ Sujeito;
→ Objecto;
→ Fontes Normativas.
Definição do DI:
Critério a partir dos sujeitos → conjunto das normas criadas que regulam a relação
internacional dos sujeitos. É a concepção clássica encontrada na jurisprudência do
Tribunal Permanente da Justiça Internacional. O elemento fundamental é a vontade dos
sujeitos, manifesta nas convenções celebradas pelo Estado e no costume internacional.
Teve dois momentos no seu itinerário: num primeiro momento definiu o DI
como o ramo jurídico que disciplinava apenas as relações jurídicas entre os Estados,
contudo, no segundo momento, o DI já foi definido como o sector jurídico regulador
dos sujeitos da sociedade internacional, não os identificando apenas com os Estados.
Embora seja uma definição compreensiva das diversas realidades subjectivas
presentes no DI, actualmente este critério encontra-se ultrapassado. Quais os sujeitos de
DI? Como são determinados? São aqueles que as normas de DI consagram como tal, ou
seja, define-se com aquilo que está a ser definido.
Critério a partir do objecto → conjunto de regras que incidem sobre matéria de
natureza internacional (RTIGO 7º/2 da Carta das Nações Unidas). É um critério que
separa as matérias internacionais e as matérias internas, justificando-se na natureza
trans-estadual do DI. Contudo, tem como desvantagens que o invalidam o facto de
haver matérias não internacionalizáveis e a dificuldade em determinar a separação do
domínio dos Estados e do internacional.
Critério das fontes normativas → é um critério formal. Normas e princípios que
surgem de fontes transnacionais de criação do Dto. De acordo com este critério, o
sentido principal do DI é funcional, atendendo mais ao modo de produção das suas
regras do que ao sujeitos das relações internacionais ou às matérias por aquelas
abrangidas.
Fausto Quadros define o DI com base neste critério: “conjunto de normas
jurídicas criadas pelos processos de produção jurídica próprios da Comunidade
Internacional e que transcendem o âmbito estadual.”
Todavia, reduz o DI a uma dimensão meramente formal, ignorando as
dimensões materiais e subjectivas. Tem igualmente a dificuldade de no DI não haverem
apenas fontes que lhe sejam privativas.

● Definição aberta, multidimensional e dinâmica


→ ordenamento jurídico formado por normas e princípios que regulam as
relações jurídico-públicas próprias da comunidade internacional, enquanto substrato
subjectivo, relacional e material.
Esta definição contem quatro elementos:
▪ elemento formal → o conjunto dos princípios (orientações gerais que indicam
sentidos valorativos e técnicos para a decisão jurídica)e normas (têm estrutura dualista,
discernindo-se entre previsão – recorte de uma situação ou evento – e estatuição –
consequência jurídica que se atribui à verificação do acontecimento referido na
previsão) com conteúdo jurídico.
▪ elemento subjectivo → os membros da sociedade internacional que
mutuamente estabelecem relações de coordenação (resultado da necessidade de
relacionamento internacional com o propósito de cada um defender os seus interesses
numa base egoísta), reciprocidade (há vantagens recíprocas que derivam do
estabelecimento de posições subjectivas individuais numa comum base de igualdade) ou
subordinação (alguns sujeitos aceitam limitações na sua soberania interna e
internacional).
▪ elemento funcional → o estatuto jurídico-público das pessoas jurídicas
envolvidas.
▪ elemento material → as matérias abrangidas pela regulação em causa,
imputadas à órbita das relações internacionais em função da sua internacionalidade.
→ Questão da juricidade do DI. Traços fundamentais: considera que não
estamos perante um ordenamento jurídico, mas antes perante uma manifestação das
relações empíricas dos Estados. Porquê?
Críticas:
◘ O DI não tem legislador (o qual se trata de um paradigma ocidental e recente),
ao contrário do que acontece no dto interno. É um dto que se formou com a autonomia
dos Estados, não sendo um movimento unilateral mas sim plurilateral.
◘ O DI não tem juiz. Apesar de haver juízes internacionais, as jurisdições
internacionais são facultativas. Deste modo:
● os tribunais internacionais só podem ter parte nos processos do Estado;
● a jurisdição é facultativa.
O Dto não pode depender de uma instância de carácter jurisdicional, existem
outros meios para o aplicar. Contudo, temos verificado um aumento de
jurisdicionalização. Ex.: os tratados multilaterais actuais contêm uma cláusula do
Tribunal Internacional de jurisdição obrigatória.
◘ O DI não tem polícia que assegure o seu cumprimento, ficando a sua
efectivação na mão dos sujeitos/Estados.
Não podemos confundir o carácter jurídico de uma norma com sua efectivação,
nem fazer com que ela fique dependente da força. Todavia, as normas internacionais
devem ser, e são, revestidas de sanção.

Características do Dto Internacional

São três os traços que se sobressaem da essência do DI:


● parcela do Dto Público;
● policêntrico nas suas fontes e dos seus sujeitos;
● fragmentário nas matérias abrangidas pela sua regulamentação.
Este fragmentarismo pode ser visto de duas perspectivas:
● um fragmentarismo horizontal, que se determina pela ausência de uma
regulamentação sobre os assuntos conexos com aqueles que, em cada momento, já
obtiveram essa regulamentação;
● um fragmentarismo vertical, que espelha a circunstância de, quanto a certa matéria, o
DI normalmente estabelecer orientações mais gerais, não efectuando o tratamento
normativo exaustivo da problemática sobre que incide.
Relações jurídicas internacionais

● Cooperação
(prossecução de interesses próprios de sentido unívoco)
● Reciprocidade
(prossecução de interesses próprios correlativos – relação sinalagmática)
Os Estados assumem relações com diferentes interesses mas ao mesmo
tempo convergentes (ex.: imunidade diplomática). Tem um carácter bilateral e
horizontal do ponto de vista jurídico/formal.
● Subordinação
Recentes e ainda a excepção. Têm um carácter vertical. Ex.: as
competências do Conselho de Segurança em matéria de manutenção da paz.

26/2/2008
O Fundamento do DI. Teses em presença.

Dto Internacional e figuras afins

● Dto Internacional e Moral Internacional


Trata-se de moral e ética internacional, que se reflecte, por exemplo, na
ajuda humanitária e na luta para que os Estados mais ricos perdoem a dívida que os
Estados mais pobres têm para com eles.
● Dto Internacional e Cortesia Internacional
Determinadas regras de carácter não obrigatório que demonstram uma
relação de cortesia e polidez entre os Estados. Exemplo: não multar automóveis
diplomáticos, cumprimentar o chefe de outro Estado com salvas de canhão.
● Dto Internacional (Público) e Dto Internacional Privado
Do ponto de vista subjectivo é um conjunto de normas que versa sobre as
relações dos sujeitos internacionais privados. Exemplo: quais as normas a aplicar no
casamento entre duas pessoas de diferentes Estados?
Ao contrário do Dto Internacional Público não é um ordenamento
jurídico, mas sim um ramo do dto interno dos Estados.
● Dto Internacional e relações internacionais
Apesar de serem a base empírica do Dto Internacional, trata-se de uma
disciplina autónoma de carácter descritivo.
● Dto Internacional e Dto da U.E.
É entendido como um Dto Internacional mais desenvolvido onde se
procede ao estabelecimento de relações mais extensas e aprofundadas.
Alguns autores defendem uma outra diferença de carácter qualitativo,
não sendo um dto estadual, mas uma espécie de um terceiro tipo cuja definição ainda se
encontra em evolução, impossibilitando, portanto, a sua qualificação. Se assim for, a sua
base jurídica fundamental é internacional (ex.: tratados jurídicos acordados entre os
Estados-membros).

O Fundamento do Dto Internacional: Teses em presença.

● Doutrinas voluntaristas → cujo fundamento deriva da vontade do sujeito, é a vontade


dos Estados que leva à obrigatoriedade das normas. Associam-se com o positivismo
jurídico, o que só admite a produção e a obrigatoriedade de normas jurídicas como
expressão do poder público.
Teoria do Dto Estadual Externo (P. e A. Zorn e Wenzel) → Influenciados por
Hegel e a sua maneira de pensar o Estado, Zorn e Wenzel tornaram-se nos protagonistas
desta doutrina. O Dto Internacional não é visto como um dto autónomo mas sim como
um mero ramo do Dto, sendo entendido como dto interno do Estado que se projecta
para o exterior, derivando, assim, da vontade do Estado.
Crítica: O Dto Internacional não pode nunca ser pensado como uma projecção
da vontade individual de cada Estado
Teoria da Autolimitação do Estado (Jellinek) → O Dto Internacional
fundamenta-se numa auto-limitação por parte dos Estados que tem lugar quando os
Estados se obrigam a uma vinculação voluntária às normas de internacionais.
Crítica: tratando-se de uma autolimitação os Estados podem pôr termo a essa
autodeterminação a qualquer momento, debilitando o ordenamento jurídico
internacional.
Há normas que se formam e se impõem aos Estados independentemente da
vontade destes. Esta crítica vale também para a Teoria do Dto Estadual Externo.
Teoria da vontade comum dos Estados (Triepel) → Pretende ultrapassar os
limites das doutrinas anteriores. O fundamento do Dto Internacional está na vontade
colectiva dos Estados e na respectiva manifestação, não ficando dependente da
individualidade de cada Estado.
Crítica: Confusão entre relevância de vontade para criação de efeito jurídico e
relevância de vontade como fundamento da normatividade.
Crítica comum às três teorias: não são só os Estados os sujeitos do Dto
Internacional.
O fundamento das normas jurídicas transcende a vontade.

● Tese normativa (Kelsen e Anzilotti)


Pretendeu ultrapassar o positivismo.
Kelsen → Teoria da pirâmide normativa → no ordenamento internacional a
regra consuetudinária (o costume) encontrar-se-ia no topo da pirâmide, devendo, no
entanto, serem respeitados os acordos, pactos e tratados.
Kelsen pensou/introduziu no sistema uma norma hipotética que não se consegue
materializar mas que obrigaria a respeitar o dto consuetudinário.

● Teoria sociológica
Afirma a obrigatoriedade do DI pela sua radicação nas relações internacionais,
sendo a vivência internacional geradora da necessidade de leis e normas que conservem
a sua coexistência.
Não são bem aceites pelos juristas por retiraram autonomia ao Dto.
→ A sociabilidade internacional (Scette)
→ O institucionalismo (Santi Romano) ↔ o Dto em geral mais não seria do que a
afirmação de um desejo de ordenação em torno de instituições sociais.
A realidade social institucionalmente organizada e o Dto Internacional como o
dto das instituições internacionais. Crítica: decorreria uma falta de autonomia do Dto
em relação à situação social.
→ A irrelevância do fundamento do Dto Internacional (Ago)
Trata-se de uma preocupação jurídica irrelevante.

● Crítica
→ Artigo 38º do Estatuto do TIJ (os ‘princípios gerais de Direito reconhecidos
pelas nações civilizadas’)
→ Parecer TIJ, caso “Reparação dos prejuízos sofridos ao serviço das NU, 1949
(http://www.icj-cij.org/docket/files/4/1835.pdf), pp. 24-26
→ o ius cojens. Breve referência.
Reconhece-se que existem princípios jurídicos que se podem reconduzir a
determinados factos sociais e que não podem reconduzir-se à vontade unilateral comum
dos cidadãos.
Ius cogens→ conjunto de princípios que não se consideram vinculativos para
sujeitos de Dto Internacional e dos quais estes não se podem desvincular,
independentemente de terem participado ou não na sua formação. Qualquer tratado que
violar o “ius cogens” é nulo.
Problema: embora não seja tudo convencional, não é reconhecida a sua
existência devido à opinião generalizada de que haveria riscos em tal, como a
possibilidade de haver uma utilização unilateral do ius cogens que imponha uma
concepção de dto ao sujeito diferente da visão de Dto.
Principal crítica: determinados princípios têm esse vector jurídico superior.
Alguns autores entendem que são princípios do ius cogens os princípios relativos à
salvaguarda da dignidade da pessoa humana.
Outros princípios apontados como sendo do ius cogens:
 proibição do genocídio;
 proibição da escravatura (continua a existir em alguns lugares);
 proibição da tortura;

● Teses jusnaturalistas
Fazem apoiar a obrigatoriedade do DI no respeito por valores ou princípios de
Dto Natural, sediado acima do poder dos Estados, aos quais estes devem obediência.
Sublinha dignidade da pessoa humana.
→ O jusnaturalismo teológico ontológico (Le Fur)
→ O jusnaturalismo axiológico (Verdross, Afonso Queiró, Silva Cunha,
Gonçalves Pereira)
§ o jusnaturalismo axiológico assente na dignidade humana (Bacelar Gouveia)

Bacelar Gouveia → refere como fundamento axiológico a dignidade humana. O


Dto Internacional encontra a sua validade na indispensabilidade de haver normas com o
objectivo de promover a dignidade humana.

O jusnaturalismo axiológico é uma das variantes do jusnaturalismo que remete


para existência de um jusnaturalismo axiológico fundamento de Dto na natureza
humana e respectivos valores, entre os quais sobressai o valor da dignidade da pessoa
humana.

Afonso Queizó → refere-se à dignidade humana como sendo o fundamento e a


validade do Dto Internacional. A indispensabilidade de haver norma com o objectivo de
promover a dignidade humana.

● Teorias contemporâneas
→ O neo-contratualismo liberal (Rawls e Dworkin)
→ Teses deliberativas e da ética comunicativa (Habermas e Alexy)
Classificação do Dto Internacional

● (âmbito de aplicação) Dto Internacional Comum vs Dto Internacional


particular
DI comum → princípios gerais do Dto comuns. Respeita aos princípios e normas
que têm como vocação ampla de aplicação uma perspectiva subjectiva: a todos, ou pelo
grande parte, dos sujeitos internacionais.
DI particular → reflexo da fragmentação do Dto, cujo espaço de aplicação é
limitado. É atinente aos princípios e normas jurídico-internacionais que apenas
beneficiam de uma aplicação restrita, em razão das particularidades.
● (hierarquia) Dto Internacional fundamental vs Dto Internacional ordinário
O DI ordinário é inferior ao fundamental, tendo de o respeitar. Este último chega
a ser considerado por alguns autores como um dto constitucional.
“Ius cogen” → conjunto de princípios ou normas que se impõem
independentemente da vontade dos sujeitos. Têm inderrogabilidade e encontram-se no
topo da pirâmide normativa.
● (âmbito material) Dto Internacional geral vs Dto Internacional especial
DI especial → conjunto de normal que materialmente têm um domínio mais
restrito. Têm um âmbito material e um âmbito funcional. Ex.: Dto Internacional Penal;
Dto da Guerra (embora actualmente os domínios já sejam vastíssimos).
● (criação) Dto Internacional espontâneo vs Dto Internacional convencional
A relevância das normas jurídicas de criação espontânea (consuetudinária) é
muito maior no domínio internacional que no externo. Tem sido procurada a sua
materialização com o objectivo de facilitar a sua aplicação através da codificação. Ex.:
Convenção de Viena. Contudo, isso não as transforma em normas convencionais, o
carácter consuetudinário permanece.
DI convencional → é acordado pelos sujeitos de Dto Internacional, resultando
duma manifestação de vontades.
● (forma) Dto Internacional não escrito vs Dto Internacional escrito
Não escrito → princípios gerais do Dto, nomeadamente o costume.

Bibliografia:
• Jorge Miranda, Curso de Direito Internacional Público, 3ª ed., pp. 9-32 e 37-39

28/2/2008
(pratica)

“- Comente o seguinte texto:

“These conventional spaces-of-places continue to engage in external economic relations


with one another, which we continue to call trade, foreign investment, and the like, and
which are more or less effectively mediated by the state. In the nonterritorial global
economic region, however, the conventional distinctions between internal and external
once again are exceedingly problematic, and any given state is but one constraint in
corporate global strategic calculations. This is the world in which IBM is Japan’s largest
computer exporter, and Sony is the largest exporter of television sets from the United
States. It is the world in which Brothers Industries, a Japanese concern assembling
typewriters in Bartlett, Tennessee, brings an antidumping case before the U.S.
International Trade Commission against Smith Corona, an American firm that imports
typewriters into the United States from its offshore facilities in Singapore and
Indonesia.”

John Gerard Ruggie, “Territoriality and beyond: problematizing modernity in


international relations”, International Organization 47, 1 Winter 1993, p. 172.”

O Texto 1 insere-se no contexto da realidade internacional actual.


Sociedade versus Comunidade.
Sociedade → global; distinção e autonomia entre os seus elementos, cujo laço é
formado por interesses estratégicos.
Comunidade → restrito; estrutual; uniformal e homogenio; não há um sentido
intencional na coesão entre os membros, cujos laços não se formam pelos interesses; há
solidariedade.
A realidade internacional insere-se na sociedade, contudo, cada vez mais se fala
de uma comunidade internacional.

◘ O que a internacionalização trouxe às comunidades nacionais?


Heterogenidade, resultante da abertura de fronteiras e do grande fluxo de
emigração (e.: diferentes religiões, culturas, etc) e abertura mental.

O texto refere-se à territorialidade, uma das características do Estado. A vontade


e soberania dos Estados estão interligadas a essa territorialização do poder que se
verificou após a Idade Média. Segundo John Ruggie, autor do texto, tem havido uma
desterritorialização do poder, nomeadamente do económico.
Spaces-of-places → espaço não territorial, do qual os Estados não fazem parte.
Alguns autores defendem que os acordos entre empresas internacionais devem
ser regulados pelo Dto Internacional público ao invés do privado, situando-se ao mesmo
nível dos tratados.

Processos de cooperação internacional → visam regular a nova actualidade


internacional dentro de um modelo estadual. Devido à sua novicidade não é ainda um
movimento político.

4/3/2008
As Fontes de Direito internacional.

Fontes de Dto Internacional

● O art. 38º ETIJ e as fontes de Dto Internacional


“1. O Tribunal, cuja função é decidir, de acordo com o Direito Internacional, os
litígios que lhe sejam submetidos, aplicará:
a) as convenções internacionais, gerais ou especiais, que estabeleçam regras
expressamente reconhecidas pelos Estados em litígio;
b) o costume internacional, como prova duma prática geral aceite como de
direito;
c) os princípios gerais reconhecidos pelas Nações civilizadas;
d) sob reserva do disposto no artigo 59º, as decisões judiciais e a doutrina dos
publicistas mais qualificados dos diferentes Estados, como meios auxiliares para a
determinação das regras de direito.
2. Este artigo não prejudicará a faculdade do Tribunal de, se as partes estiverem
de acordo, julgar ex aequo et bono.”
Não visa estabelecer um elenco de fontes, é antes uma base de partida.

● Crítica do 38º ETIJ


→ Crítica por excesso e por defeito do elenco enunciado.
 Por excesso: os PGD não são fonte, são um dos elementos normativos do Dto
Internacional; a decisão ex aequo et bono é uma forma de resolução concreta de
um caso, de acordo com a justiça. Remissão.
 Por defeito: os actos unilaterais dos Estados (caso ‘testes nucleares, NZ e
Austrália vs França, 1974, pp. 267-270) e das OI.
◘ A jurisprudência e a doutrina, não são criadoras, mas são reveladoras de
normas e princípios, a primeira com força vinculativa inter partes, pelo que parece
válido considerá-las como fontes ainda que secundárias.

→ Crítica à formulação utilizada


Não é clara a distinção entre as convenções internacionais gerais e especiais.
A aceitação do costume é voluntária, a vinculação a ele só existe quando é aceite
pelo Dto.
A alínea c) é reveladora de um egocentrismo de carácter ocidental.

● Fontes primárias
→ Costume
→ Tratados
→ Actos unilaterais do Estado e OI

● Fontes secundárias
→ Jurisprudência (reguladora de normas e princípios mas não criadora)
→ Doutrina (caso ‘Plataforma continental’ 1969, RFA Din. e Hol., pp. 36-37)
→ Equidade
→ Princípios gerais do Dto

Costume

Não se considera que haja uma hierarquia, é tratado em primeiro lugar por ser a
fonte mais antiga do Dto Internacional.
Elemento material → corpus (prática constante e uniforme). Não há uma
orientação unívoca em termos temporais (cf. caso ‘plataforma continental’ 1969,RFA vs
Dinamarca e Holanda, pp. 41-43) O espaço exterior (instantaneidade do costume a
partir da Declaração da AG-NU em 1963)
Proposta: a prática deve ter ocorrido cada vez que os sujeitos tiveram
oportunidade de a manifestar e deve ter uma carácter uniforme (caso ‘Haia de la Torre’,
1950, p. 277 e ‘Pescarias’ 1951, UK vs Nor, ). Relevância da objecção (‘Haia de la
Torre’, p. 277-278, e ‘Pescarias’ 1951, pp. 138-139) nos costumes locais e tendencial
irrelevância nos comuns (caso ‘plataforma continental’, 1969, RFA vs Dinamarca e
Holanda, pp. 41-42)
Manifestações da prática: actos dos órgãos internos e externos dos sujeitos de
Dto Internacional.
Elemento psicológico animus → opinio iuris vel necessitatis (caso ‘plataforma
continental’ 1969 RFA vs Din e Hol, pp. 44-45).
▪ Carácter objectivo.
▪ O problema da objecção persistente (caso ‘pescarias’ Nor vs UK 1951 e ‘Haia
de la Torre’, cits. ); ‘Plataforma continental’ 1969, RFA vs Din e Hol)
▪ Presunção iuris tantum (caso ‘pescarias, Nor vs UK)?

● Classificação
→ Âmbito: comum (generalidade - prática de em conjunto diversificado e
representativo de sujeitos) e particular (regional – caso ‘Haia de la Torre’-, ou local -
caso ‘direito de passagem’, Pt vs Ind, 1960).
→ Sentido (a questão do costume contra tractum – art. 27º Carta NU).
Ou seja, o Costume pode ser regional, local ou de alcance geral (a objecção de um
ou dois sujeitos é tendencialmente relevante.
→ Para existir o costume necessita da conjugação de dois elementos: o elemento
material (corpus), que se traduz na existência de uma prática reiterada, e o elemento
psicológico (animus), que consiste na convicção de que aquela prática é para ser
cumprida.
→ Elementos que constituem o “corpus” do costume: actos dos órgãos internos
e externos dos sujeitos de Dto Internacional. Prática constante, uniforme.
→ Classificação do Costume:
 Comum; geral; particular (regional ou local) → abrange um conjunto de
sujeitos internacionais);
 contra tratum (contrário ao tratado);
 contra legem;
 infra legem (corresponde ao secundum legem. Complementa, precisa ou
desenvolve uma lei);
 secundum legem

Tratados

● Definição
Art. 2º nº 1, al. a), CVDTE: “um acordo internacional concluído por escrito
entre Estados e regido pelo Direito Internacional, quer esteja consignado num
instrumento único, quer em dois ou mais instrumentos conexos, e qualquer que seja a
sua denominação particular”.

● Proposta
Acordo de vontades entre sujeitos de DI, agindo nessa qualidade, de que
resultam efeitos jurídico-internacionais.

● Distinção de figuras afins


→ Feixes de actos unilaterais;
→ Acordos políticos;
→ Gentlemen’s agreements.
Os acordos entre os Estados e sujeitos de direito privado com acção
transnacional. ‘Quase Tratados’?

● Denominações (inter alia)


→ Convenção
→ Acordo
→ Carta, Constituição ou Estatuto
→ Pacto
→ Concordata
→ Acta final ou geral
→ Compromisso

● Classificações (inter alia) tendo em consideração a incidência sobre o regime


jurídico respectivo
→ Tratados-lei e tratados-contrato, de acordo com o sentido normativo ou
concreto, individual e não duradouro, dos efeitos que sejam estabelecidos no respectivo
articulado;
→ Tratados bilaterais e tratados multilaterais, dependendo do número de sujeitos
celebrantes;
→ Tratados gerais e tratados restritos, sendo estes últimos para um número
reduzidos de sujeitos partes;
→ Tratados abertos e tratados fechados, em função de ser possível a sujeitos que
não assinaram e ratificaram a futura pertença ao seu conteúdo, de tal possibilidade ser
condicionada (tratados semi-fechados) ou mesmo proibida;
→ Tratados solenes e tratados não-solenes, em razão de ser ou não necessário,
autonomamente, o acto de ratificação por parte do Chefe de Estado;
→ Tratados escritos e tratados não escritos, tomando em consideração a adopção
ou não da forma escrita na respectiva celebração.

Actos jurídicos unilaterais

→ Protesto
Corresponde à manifestação de uma discordância, factual ou jurídica,
quanto a um acontecimento ou situação.
→ Promessa (caso ‘testes nucleares’, cit.)
Expressa a vontade do autor do acto na concessão de uma vantagem que
passa a ser juridicamente protegida, independentemente da existência de qualquer
retribuição, apenas dependendo de si própria, numa visão estritamente unilateral.
→ Renúncia
Vontade de um sujeito internacional fazer extinguir um direito que
pertença à sua esfera jurídica.
→ Reconhecimento
Representa a aceitação por parte do respectivo autor quanto à qualidade
de certa entidade como sujeito de Dto Internacional.
→ Notificação
Consiste na comunicação aos respectivos destinatários de uma qualquer
situação ou acontecimento, ao qual se associam efeitos jurídico-internacionais, de cujo
conhecimento depende a produção de tais efeitos na esfera jurídica de um sujeito
internacional.
▪ Os feixes de AJI
→ AJI não autónomos (mas com efeitos jurídico-internacionais) – adesão,
denúncia, etc.

● Regime jurídico:
→ A ausência de requisitos formais, excepto a publicidade (caso ‘testes
nucleares);
→ Vinculativos;
→ Irrevogáveis.

● Os actos das OI
→ Actos de eficácia interna e externa;
Actos que apenas se destinam à organização e ao funcionamento dos respectivos
órgãos e actos que se projectam nas relações jurídicas com outras entidades.
→ Actos normativos e não normativos;
Actos que incorporam normas jurídicas e actos que contêm somente efeitos
individuais e concretos.
→ Actos preceptivos e programáticos (a problemática do soft law);
→ Actos exequíveis e não exequíveis.
Actos que se aplicam por si mesmos e actos que para se tornaram operativos
carecem de um outro acto que lhes confira executoriedade.
(Bacelar Gouveia)
→ Actos vinculativos e consultivos
Actos que produzem efeitos obrigatórios e actos que apenas contêm
recomendações ou pareceres.

▪ Os actos da AG e do CS das NU;


▪ Os actos das instituições da EU.

11/3/2008
Os Princípios Gerais de Direito. O Ius Cojens. A equidade e a decisão ex aequo et bono.

Princípios Gerais de Direito

→ Consagração do ‘Direito Natural’?


● Princípios gerais oriundos dos direitos internos: boa fé (transversal), abuso do
direito, princípios processuais e de prova, estoppel, princípios de direito privado (casos
‘Barcelona Traction’, ‘canal de Corfu’).
● Princípios gerais internacionais: proibição do uso da força, igualdade soberana
dos Estados, resolução pacífica dos conflitos, não ingerência, cooperação, igualdade de
direitos dos povos e autodeterminação (‘Declaração relativa às relações amigáveis e de
cooperação entre os Estados conforme a CNU’, AG 1970), reciprocidade, livre
consentimento, liberdade dos mares, responsabilidade.
→ Princípios gerais comuns e princípios gerais restritos. Admissibilidade?
● Princípios de Dto Privado: celebração de tratados; dto das sociedades.

◘ Todos estes princípios são comuns aos sujeitos de Dto Internacional, mas há
princípios que vinculam apenas alguns desses sujeitos? Nem todos acham que sim, mas
existem, como os princípios relativos ao Estado de Dto e os princípios democráticos.

● Função dos PGD


● Legitimadora
Os princípios permitem questionar a legitimidade material das normas ou de
outros princípios que com eles estejam desconformes, podendo provocar a respectiva
invalidade material.
● Interpretativa
Os princípios permitem determinar preferências, de entre válidas soluções
hermenêuticas, de outro modo todas igualmente possíveis.
● Integradora
Os princípios possibilitam integrar lacunas de regulamentação. Ou seja, permite
ultrapassar o problema da inexistência de normas para determinadas situações.
● Complementadora
Os princípios têm a virtualidade de regulativamente alargar a extensão de
aplicação do Dto Internacional.

Jurisprudência

O valor da jurisprudência na construção do Dto Internacional é limitado, não


vigorando a regra do precedente. Por si só, não possui a qualidade de fonte normativa de
Dto Internacional, embora tal possa ser diferente quando os tribunais sejam
confrontados com a imposição de orientações gerais em duas ocasiões: pela formação
de um costume jurisprudencial ou pela imposição de uma orientação comum admitida
ao nível do estatuto do órgão judicial em causa.
Conquanto, não é a jurisprudência que funciona como fonte de Dto
Internacional: no primeiro caso realça a fonte costumeira e no segundo avulta a
atribuição ao órgão judicial de uma faculdade normativa, em acréscimo à função
judicial.
No âmbito do Dto Internacional, a jurisprudência cobre várias situações que se
repartem por dois grandes grupos:
▪ as decisões arbitrais ↔ São proferidas por tribunais de cunho arbitral, os quais
têm como singularidades o menor formalismo processual, a disposição do Direito
aplicável pelas partes e a intervenção destas na escolha dos juízes que se encarregarão
de decidir o litígio.
▪ as decisões judiciais ↔ incluem as sentenças e os acórdãos dos tribunais
judiciais, os quais se revestem de todas as características atribuídas à judicatura pública.

Doutrina

A expressão “doutrina” pode ter dois sentidos distintos:


▪ como orientação de política externa;
▪ como conjunto de opiniões jurídicas a respeito do Dto Internacional, nas suas
fontes, na sua interpretação e na sua aplicação (é a este sentido que se refere o art. 38º
do ETIJ).
Num primeiro momento, o Dto Internacional esteve muito dependente do
trabalho dos jusinternacionalistas, ou seja, da doutrina, contudo, tal importância tem
vindo a diminuir cada vez mais não só devido há multiplicação daqueles que hoje
cultivam o Dto Internacional, como por o Dto Internacional ter vindo a diversificar-se
dogmaticamente.

Ius Cojens

O grande interesse das normas de ius cogens internacional é o de servir de


critério, numa feição ético-valorativa, para dirimir conflitos entre normas e fontes de
Dto Internacional.
→ Convenção de Viena: ius cojens só são reconhecidos se tiverem alcance geral.
Ius cojens refere-se apenas a dto comum.
→ Dificuldade de determinação. Riscos. Elencos possíveis. Os arts. 53º, 64º e
71º CVDTE.
→ Art.71º: tratados incompatíveis com o ius cojens.
→ A jurisprudência do TIJ. O reconhecimento explícito e qualificação de
normas internacionais como ius cojens (cf. caso ‘Congo vs Ruanda’, 2006, pp. 26-27.
→ A admissibilidade de ius cojens regional.
→ Até 2006 não se verificou qualquer norma institucional com nome de ius
cojens, mas a doutrina defende a sua existência.

● Ius cojens consensual


→ Problema do ius cojens: Quais as normas que são ius cojens?
A construção substantiva do ius cogens só se realiza com recurso a normas e
princípios que sejam portadores dos grandes valores da sociedade internacional, os
quais se impõem involuntariamente à conduta os respectivos membros.
Genericamente reconhecidos, são:
→ Proibição do uso da força (Nicarágua vs EUA, 1986, pp. 100-1) ↔
convenção das Nações Unidas. O pacto de 1928 que estabelece a proibição da guerra
não impediu a Segunda Guerra Mundial.
É um princípio imperativo importante para garantir a igualdade de soberania dos
Estados. Problemas: não pode ser objecto de derrogação, excepto por uma norma de
igual conteúdo; problema de conjugação com o dto à legítima defesa individual e
colectiva. Soluções: a Carta das Nações Unidas admite o uso da força para a
manutenção da paz e segurança internacionais, assim como determina no seu artigo 48º
que todos os Estados devem acatar e cumprir as decisões do Conselho de Segurança.
Há um conjunto de situações em que este princípio é objecto de derrogação mais
ou menos ampla, sendo apenas possível saber a sua amplitude de um modo concreto.
→ Proibição do genocídio (Congo vs Ruanda, 2006, pp. 26-27)
→ A proibição da discriminação racial
→ Crimes contra a humanidade
→ A proibição da escravatura e da pirataria
→ Direito humanitário internacional (convenção de Haia) no ius in bello
(Parecer ‘Armas Nucleares’, 1996, p. 257)
→ Responsabilidade

● Ius cojens (outros)


→ Soberania permanente sobre os recursos naturais
→ Autodeterminação
→ Os direitos humanos. Convenção Europeia dos Dtos do Homem: entre a tese
maximalista (J. Miranda) e a tese minimalista (cf. caso ‘Barcelona Traction’, 1970, pp.
62-64).
→ Consequências da violação do ius cojens:
▪ Convenção de Viena → é nulo qualquer tratado que viole o ius cojens.

Equidade

→ Princípio equitativo: princípios que se conjugam para uma melhor aplicação


do Dto. Nunca será contra ou pretem legem, quanto muito secundum legem.
Comummente entendida como “a justiça do caso concreto”, a equidade significa
a resolução de casos através da aplicação de critérios criados pelo próprio aplicador,
num ajustamento da pauta de decisão às características de cada situação em análise.
→ Decisão ex aequo et bono e equidade. Identidade ou não?
A expressão “ex aequo et bono” implicita que o julgador, perante o caso
concreto, está liberto da aplicação de orientações normativas pré-definidas, devendo
procurar um critério que melhor sirva os interesses contrapostos do caso sub iudice.
→ O TIJ e a aplicação de princípios de equidade, em especial ‘equidade infra
legem’ (caso ‘plat. Cont’ cit, pp. 89-101, e ‘Burkina Faso vs Mali’, 1986, pp. 554 e 631-
3).
→ A aplicação de ‘considerações de humanidade’ (caso ‘canal de Corfu’ 1949,
p. 22, em sentido diverso ‘South West Africa’, 1966, p. 34) e de ‘interesses legítimos’
(caso ‘pescarias’ cit, pp. 133 e 142)
→ Recurso a outros elementos por parte do Tribunal (princípios
complementares): considerações de humanidade; desconsiderações de considerações
de humanidade; interesses legítimos de natureza económica, etc.
→ Limites no recurso à equidade: é necessário um acordo das partes, que tanto
pode ser expresso ad hoc como pode constar de uma prévia convenção, e assim
como é também imprescindível a disponibilidade das normas internacionais
potencialmente aplicáveis, ou seja, que as normas internacionais aplicáveis na
resolução do litígio não sejam normas imperativas.

Hierarquia do DI

● Critérios:
→ Ético-valorativo (em especial o jus cojens)
Coloca em evidência normas de Dto Internacional que correspondem a uma
orientação valorativa, nomeadamente as que consagram dtos humanos. São
inderrogáveis? Ius cojens não, mas outros normas poderão sê-lo através de acordo entre
as partes.
→ Formal (103º CNU)
Qualquer acordo contrário à Carta das Nações Unidas (CNU) não pode
prevalecer sobre esta. Há quem defenda que o ius cojens o é, mas tal é duvidoso.
Convenção de Viena (art. 41º) ↔ condições para que seja possível celebrar um
segundo acordo entre as partes que prevalecerá.
→ Cronológico
A norma posterior derroga a anterior, com excepção no ius cojens.
→ Lógico (lex specialis…)
Lei especial derroga a lei geral.

25/03/2008
Dto dos Tratados. Convenção de Viena Sobre o Dto dos Tratados entre os Estados
(assinada em Viena a 23/05/1969)

● Âmbito de aplicação da CVDT


→ Acordos internacionais concluídos por escrito entre Estados (arts. 1º, 2º, nº 1,
al. a), incluindo os que constituem organizações internacionais (art. 5º CVDT)
→ Acordos internacionais adoptados no âmbito de uma organização
internacional (regra subsidiária – art. 5º CVDT)
→ Parte das regras da CVDT são supletivas.
→ A aplicação dos CVDT está directamente prevista, devendo ser ratificada
pelos Estados signatários, também se admitindo a sua abertura para adesão de outros
Estados.
Para muitos Estados que não emitiram uma vontade de ratificar ou aderir, pode
considerar-se globalmente vinculativa como repositório de costumes internacionais ou
mesmo de princípios gerais de Dto.

Celebração dos Tratados entre Estados

● Fases:
1 – Negociação
2 – Adopção do texto
3 – A vinculação das partes
4 – A entrada em vigor
5 – O registo e a publicação
→ CVDT negociação (2º, nº 1, al. e)

● Negociação
→ Integra todos os actos destinados a aproximar as partes que têm interesse nem
futuro articulado de tratado a celebrar. Nem sempre termina com a passagem à fase
seguinte, podendo deixar de haver vontade, nalgumas ou mesmo todas as partes
envolvidas, para consolidar as negociações.
→ A negociação internacional deve ser distribuída por três momentos distintos:
▪ Pré-negociação – estabelecimento das disposições que guiarão o processo
negocial através da identificação das partes e das matérias;
▪ Negociação geral – calendarização das negociações e definição dos sub-temas
materiais;
▪ Negociação específica – fase da consulta directa, recíproca e pormenorizada
entre os negociadores, efectuando-se a discussão dos vários sub-temas de acordo com o
esquema definido na fase anterior.
→ Pode apenas ser levada a cabo por entidades habilitadas para o efeito, sendo
esta capacidade para a negociação internacional designada de “plenos poderes”, o que
significa a apresentação de uma carta-patente, na qual se indica a pessoa do
representante e os actos para que está autorizado. Trata-se de um documento escrito que
deve ser assinado pelas entidades internamente responsáveis pela manifestação da
vontade de o Estado internacionalmente se representar nessa fase.
◘ Os tratados multilaterais e a negociação em conferência internacional
→ Habilitação negocial – a carta de ‘plenos poderes’ (art. 2º, nº 1, al. c) CVDT)
– pode ser de duas categorias:
▪ Habilitação funcional (art. 7º, nº 2 CVDT)
Autoriza o estabelecimento da negociação por parte daqueles que exercem certos
cargos na estrutura de poder do sujeito interessado.
▪ Habilitação específica (art. 7º, nº 1 CVDT)
Decorre de o sujeito internacional conferir uma carta de plenos poderes a alguém
para, em seu nome, poder negociar a elaboração de um texto de tratado internacional.
◘ A falta de ‘plenos poderes’ e a respectiva sanação (ar. 8º CVDT).

● Adopção do texto
→ Põe termo às negociações
→ Aprovação do texto (todos os participantes ou 2/3 – art. 9º CDVT).
→ Pode, portanto, ser dividida em dois sub-momentos: a aprovação do texto,
acto que expressa o encerramento das negociações, e a autenticação do texto, acto que
lhe atribui um valor de veracidade e de definitividade.
→ Efeitos: aplicação imediata das disposições que regem a autenticação do
texto, a manifestação do consentimento à vinculação, a entrada em vigor, as reservas, o
depósito, bem como outras que se suscitam antes da entrada em vigor – art. 24º, nº 4.
→ Autenticação do texto, que se torna definitivo – art. 10º CVDT
→ Assinatura e assinatura diferida (nos tratados multilaterais abertos para os
Estados que não negociaram ou negociaram e não adoptaram o texto – ex. a CVDT –
81º) ↔ é definitiva.
→ Assinatura ad referendum (está sujeita a aceitação) ↔ provisória
→ Rubrica ↔ provisória, estando a eficácia que lhe é inerente sempre
dependente da confirmação posterior por parte do Estado em causa (o mesmo se passa
com a assinatura ad referendum)
→ Outro processo (al. a) do art. 10º)
→ Efeitos: direito do Estado contratante a vincular-se; obrigação de não privar o
tratado do seu objecto ou do seu fim (boa fé) – art. 18º.
◘ Partes do Tratado:
→ Preâmbulo (razão de ser do tratado, intenções dos Estados que o negociaram)
→ Corpo dispositivo (tem o articulado ou clausulado, conforme seja redigido
por artigos ou por cláusulas)
→ Parte complementar (Anexos, Declarações, etc.)
◘ A questão das línguas e reflexos interpretativos (art. 33º)

● Vinculação internacional
É nesta fase que o sujeito internacional exprime a sua vontade de ficar obrigado
pelas cláusulas que constam do respectivo articulado.
→ Modalidades (art. 11º):
▪ Assinatura – nos acordos em forma simplificada (art. 12º: pode ser a rubrica
nos termos do nº 2, al. a, ou a assinatura ad referendum após confirmação)
▪ Troca dos textos (‘cartas’) – art. 13º
▪ Ratificação (acto livre), praticada no âmbito da vinculação dos Estados pelos
respectivos Chefes de Estado, estando reservada aos tratados solenes.
▪ Aceitação ↔ paralelo da ratificação mas no âmbito das OI
▪ Aprovação – art. 14º ↔ paralelo da ratificação mas no âmbito das OI
▪ Adesão – art. 15º ↔ surge quando está em causa a adesão de um sujeito que
não adoptou o texto, não tendo participado nas negociações, nem tendo feito a
respectiva assinatura diferida.
▪ Outro
→ A problemática das ratificações imperfeitas – art. 46º.
→ A vinculação, em princípio, faz-se em relação a todo o Tratado.
▪ Excepções: art. 17º
▪ A formulação de reservas (arts. 19º a 23º)
→ O Depósito nos tratados multilaterais
▪ Funções do depositário: arts. 76 e 77º.

◘ Reservas
→ A questão da sua formulação em tratados bilaterais
→ Noção – art. 2º, nº 1, al. d). Distinção de outras figuras, nomeadamente as
Declarações
→ Admissibilidade de reservas - art. 19º
▪ Inadmissibilidade total (ex. ERTPI – art. 120º) ou parcial (ex. CNUDM – art.
309º) – art. 19º, al. a) e b)
▪ Incompatibilidade com o objecto e o fim do Tratado – art. 19º, al. c)
▪ Momento da formulação (arts. 19º e 23º, nº 2)
▪ Processo (art. 23º).
▪ Aceitação:
 Reserva expressamente prevista: desnecessidade de aceitação (art. 20º, nº 1),
excepto previsão em contrário.
 Necessidade de aceitação:
• Por todas as partes (art. 20º, nº 2 – nº restrito de Estados e
especial objecto e fim do Tratado…)
• Pelo órgão competente da OI instituída pelo Tratado (art. 20º, nº
3)
• Aceitação tácita (art. 20º, nº 5)
→ Efeitos:
▪ Relatividade – produz os efeitos previstos na reserva nas relações entre o
Estado que a formulou e as outras partes que a aceitaram, não modificando as relações
entre estas últimas (arts. 20º, nº 4 e 21º, nºs 1 e 2)
▪ No caso de objecção à reserva:
• se o Estado objector não se opõe à entrada em vigor do Tratado
entre si e o Estado que formulou a reserva, as disposições sobre
que incide a reserva não se aplicam entre esses Estados na
medida do que foi previsto pela reserva – art. 21º, nº 3;
• Se o Estado objector se opõe expressamente à entrada em vigor
do Tratado entre si e o Estado que formulou a reserva, o Tratado
não entra em vigor nas relações entre esses Estados - art. 20º, nº
4, al. b)
→ Revogação – art. 22º
→ Competência – dos órgãos internos competentes para a vinculação
internacional do Estado.

● Entrada em vigor
→ Caso nada seja determinado pela vontade dos Estados contratantes (prevista
no Tratado ou determinada de outro modo) – art. 24º, nº 1 – entra em vigor no momento
da última manifestação do consentimento a ficar vinculado entre os Estados contratantes
– 24º, nº 2 – ou na data e termos que ficaram combinados nas respectivas disposições
finais ou por qualquer outro forma considerados relevantes.
É frequente adoptar-se um sistema misto.
→ A vigência em relação a um Estado que se vincule após a entrada em vigor
do Tratado dá-se no momento da manifestação da sua vinculação (excepto se o Tratado
dispuser diversamente) – art. 24º, nº 3.
→ A ‘pré-vigência’ – art. 24º, nº 4 (já referida)
Certa normas têm de entrar logo em vigência, sob pena de o tratado não se poder
consumar nos termos estabelecidos. Trata-se de uma vigência que se considera de
natureza parcial e temporária.
→ Aplicação provisória – art. 25º
Surge antes da vinculação e pode ser determinada para a totalidade ou para
apenas uma parte do texto, indo necessariamente além do âmbito de aplicação da pré-
vigência.
● Registo e publicação
→ Visa dotar os tratados internacionais do atributo da publicidade internacional,
a qual se desdobra em dois actos:
▪ registo, o que implica que cada tratado, identificado nas suas características
fundamentais, seja assinalado num registo próprio;
▪ publicação, o que implica a publicitação do conteúdo do tratado nas
publicações oficiais da ONU, assim como a sua disponibilização on-line nos respectivos
sites.
→ Compete ao Secretariado da ONU (art. 102º CNU) – art. 80º CVDT.
→ Efeitos da ausência de registo: inoponibilidade perante os órgãos das NU –
art. 102, nº 2 CNU.
→ A problemática dos Tratados secretos…

Bibliografia:
• J. Miranda, ob. cit., pp. 67-81 e 82-83

1/4/2008
Interpretação, integração e aplicação dos Tratados. Requisitos de validade e regime
das invalidades. Suspensão, cessação da vigência dos Tratados e recesso.

Interpretação

● Arts. 31º e 32º


– Boa fé (corolários: efeito útil, proibição do absurdo, efeitos implícitos) –
31º, nº 1
– Elementos da interpretação: gramatical (“sentido comum atribuível aos
termos do tratado”) – 31º, nº 1; racional/teleológico (“à luz dos
respectivos objecto e fim”) – 31º, nº 1 e 33º, nº 4; sistemático – 31º, nº 2
e 3; histórico (complementar – art. 32º)
– Fins da interpretação (em princípio objectiva, embora seja possível
atender à intenção das partes no sentido a atribuir a um termo, de acordo
com o nº 4, ou por ex. no art. 56º, nº 1, al. a); e actualista – a relevância
dos acordos e práticas ulteriores - 31º, nº 3)
– Resultados da interpretação: os limites à interpretação extensiva.

§ a interpretação dos Tratados e os direitos humanos (cf. Ac. TIJ de 27/6/2001, RFA
vs USA, LaGrand; Ac. TIJ 31/3/2004, México vs USA)

A interpretação dos tratados internacionais, regulada pela CVDTE, é uma tarefa


que visa alcançar o sentido normativo que se contém nas fontes normativas
analisadas com os seguintes tópicos fundamentais:
→ o objectivo da interpretação;
→ o sujeito da interpretação;
→ os elementos da interpretação;
→ os resultados da interpretação

● O objectivo da interpretação consiste na descoberta das normas jurídico-


internacionais que se objectivam nas fontes convencionais de acordo com uma
orientação simultaneamente objectivista, porque se pretende a mens legis e não a
mens legislatoris, e actualista, porque se pretende surpreender as normas no seu
contexto actual.
Diz a CVDTE que “Um tratado deve ser interpretado de boa fé, de acordo com o
sentido comum a atribuir aos termos do tratado”.
É também sublinhada a importância de se considerar acordos e práticas
posteriores à celebração dos tratados e só por excepção se pode dar valor à vontade
subjectiva das partes outorgantes se esse entendimento tiver sido admitido.
● O sujeito da interpretação é todo aquele a quem sejam dirigidas as fontes,
relativamente às quais deve conformar o seu comportamento, carecendo por isso de
previamente lhes extrair um sentido normativo.
Há certas entidades que desempenham um papel especial, conferindo à
interpretação que realizam um valor acrescentado superior:
→ interpretação autêntica, feita pelos autores do tratado;
→ interpretação jurisprudencial, feita pelos órgãos judiciais a quem incube a
aplicação do tratado.
São ainda possíveis:
→ interpretação feita pelos Estados partes, distinguindo-se entre a feita a título
unilateral e a feita a título colectivo;
→ interpretação feita por outros sujeitos internacionais, incluindo-se as OI;
→ interpretação feita pelos órgãos internos dos sujeitos partes;
→ interpretação feita pelos restantes operadores jurídicos, avultando a doutrina.
● Os elementos da interpretação são os meios de que o interprete se serve para
atingir o objecto da interpretação (a mens legis), sendo que muitas vezes o resultado não
é o da coincidência entre a letra e o espírito da fonte normativa em questão.
Os elementos de interpretação tanto podem ser literais, consistindo nos preceitos
que se incluem no articulado do contrato, e extra-literais, os instrumentos que permitem
chegar ao objecto da interpretação, sendo que se sub-distinguem em três tipos, sendo os
dois primeiro superiores em relação ao terceiro:
→ Elemento sistemático, onde se incluem o texto, preâmbulo e anexos do tratado,
assim como outros acordos celebrados e que com o mesmo possuem uma relação
específica.
→ Elemento teleológico, uma vez que a interpretação deve procurar o sentido
normativo do tratado à luz dos respectivos objecto e fim.
→ Elemento histórico, ou seja, os trabalhos preparatórios e as circunstâncias em que
foi concluído o tratado.
● Na articulação entre os elementos literais e os elementos extra-literais, atinge-se o
resultado da interpretação, que pode ter cinco categorias:
→ a interpretação declarativa, com exacta correspondência entre a letra e o espírito
do tratado;
→ a interpretação restritiva, em que há necessidade de limitar o alcance da letra
porque o espírito é mais limitado;
→ a interpretação extensiva, em que se justifica alargar o alcance da letra, havendo
um sentido espiritual mais lato;
→ a interpretação enunciativa, que se verifica na extracção de um sentido
hermenêutico não constante da letra mas que resulta da aplicação de argumentos lógico-
formais, como o do contrario sensu;
→ a interpretação abrogante, total ou parcial, em que a letra do tratado não faz
sentido, por incongruência lógica interna ou porque deve ser eliminada em favor de
outro sentido normativo tido como prevalecente.
Coloca-se ainda o problema da interpretação de textos que tenham sido redigidos
em diversas línguas. A solução para tal implica saber se estes tratados correspondem ou
não a textos autenticados em todas essas línguas:
→ se os dois ou mais textos não são todos autênticos, a orientação geral é a de fazer
prevalecer o sentido do texto que tenha sido redigido na versão autêntica;
→ se os dois ou mais textos são autênticos, presume-se que o respectivo valor é
autêntico, só podendo a divergência ser ultrapassada adoptando-se o sentido que melhor
concilie esses textos, tendo em conta o objecto e o fim do tratado.

Integração de lacunas

◘ A analogia (Parecer do TIJ, de 11/4/1949) relativo aos prejuízos sofridos ao


serviço das NU)
◘ A importância dos PGD

Na integração de lacunas internacionais é preciso ter em conta dois pontos


fundamentais:
→ o conceito de lacuna internacional tido por relevante
→ os critérios que possibilitam o seu preenchimento.
As lacunas internacionais representam a ausência de um sentido ordenador em
vista de um caso que dele absolutamente carece, para ser resolvido ao nível do
Direito aplicável.
A acepção da lacuna de Direito Internacional só pode ser vista amplamente, ao
considerar todas as fontes normativas possíveis e não se limitar a ser uma lacuna
apenas de certas fontes. Só ocorre uma verdadeira lacuna quando são percorridos
todos os níveis normativos e fontes do Direito Internacional. Mais, a incompleição
não pode ser pretendida pelo Direito Internacional.
Distingue-se ainda entre a lacuna jurídico-internacional, atinente a todas as suas
fontes, e a situação extra-jurídica, que não tem de ser regulada pelo Direito
Internacional.
A dificultar ainda mais a admissibilidade das lacunas está o fragmentarismo do
Direito Internacional e a ideia geral de que o que não é objecto de regulação
internacional automaticamente fica a pertencer à esfera dos Estados.
Quanto ao processo de preenchimento de lacunas, na falta de indicações
particulares normativas, não se vê razão para o afastamento de esquemas que são
válidos no âmbito da Teoria Geral do Direito, no qual pontificam dois grandes
critérios:
→ a analogia legis, em que se apela à aplicação de normas que regulam casos
dotados de analogia com o caso que carece de tratamento
→ a analogia iuris, hipótese em que directamente se recorre a princípios gerais,
de acordo com as diversas possibilidades que se organizam.

A aplicação dos Tratados

→ o princípio pacta sunt servanda – arts. 26º e 27º. O problema das ratificações
imperfeitas – art. 46º

São quatro os aspectos fundamentais na problemática geral da aplicação dos


tratados internacionais:
→ aplicação temporal
→ aplicação territorial
→ aplicação subjectiva
→ aplicação interna.

◘ Aplicação temporal
– Aplicação provisória antes da vigência (art. 25º)
– Não retroactividade (art. 28º)
– Sucessão de tratados no tempo (arts. 30º, 41º e 60º)
Abrange simultaneamente três questões distintas:
→ início da vigência temporal, aquando do estudo do procedimento de feitura
dos tratados internacionais, ocorre depois do último sujeito que assinou o texto ao
mesmo manifestar a vontade de lhe ficar obrigado;
→ fim da vigência temporal, ocorre nos diversos momentos de caducidade,
revogação e desvalor jurídico;
→ sucessão de tratados internacionais, podendo diferenciar-se entre regime
formal, que remete para uma das regulações em causa, a antiga ou a nova, e regime
material, que elabora uma solução própria, com normas específicas.
Os tratados internacionais não são retroactivos, “as disposições de um tratado
não vinculam uma Parte no que se refere a um acto ou facto anterior ou a qualquer
situação que tenha deixado de existir à data da entrada em vigor do tratado
relativamente a essa Parte”. Trata-se de uma orientação geral que aceita
derrogações, podendo haver efeitos retroactivos se essa for a vontade das partes,
expressa ou tacitamente produzida.
◘ Aplicação territorial (art. 29º - regra supletiva)
Encontra-se estritamente associada aos sujeitos que à mesma se vinculam.
A orientação prevalecente é a que for determinada pelas disposições finais de
cada texto convencional, podendo aí estabelecer-se regras de delimitação a respeito
do espaço geográfico a que o mesmo se aplica, de que são exemplos a cláusula
colonial e a cláusula federal.
Na falta de tais disposições é de supor que os tratados internacionais se aplicam
à totalidade dos territórios dos sujeitos que aos mesmos se obrigam.
◘ Aplicação subjectiva (arts. 34º a 38º)
– Pr. da relatividade (arts. 34º)
– A criação de obrigações para 3ºs (art. 35º) ↔ revogação art.37º
– A previsão de direitos para 3ºs (art. 36º) ↔ revogação art.37º
Refere-se ao círculo de entidade jurídico-internacionais a quem os respectivos
efeitos são concernentes.
Aplicando-se o princípio da relatividade, os efeitos decorrentes do tratado
atingem quem nos mesmos autorizou, “Um tratado não cria obrigações nem direitos
para um terceiro Estado sem consentimento deste”. Caso isto aconteça, são duas as
respostas dadas pelo CVDTE aos Estados que se encontrem nestas circunstâncias:
→ se se tratar de direitos, estes integram a esfera jurídica dos Estados terceiros
se estes nada disserem, valendo o seu silêncio como consentimento e vigorando uma
presunção iuris tantum;
→ se se tratar de obrigações, estas só integram a esfera jurídica dos Estados
terceiros se nisso expressamente tiverem consentido, não havendo lugar a qualquer
presunção.
◘ O art. 38º
◘ A oponibilidade erga omnes, nomeadamente dos tratados que criam situações
objectivas (fixação de fronteiras, neutralização, etc.)
Revisão e modificação dos Tratados

● Revisão – alteração das cláusulas do Tratado, envolvendo a participação dos


Estados que outorgaram no tratado internacional.
▪ Processo
→ De acordo com as regras do tratado – art. 39º
→ Por acordo entre as partes (art. 39º), nos termos previstos para a conclusão e
entrada em vigor dos tratados (parte II CVDT)
→ Nos tratados multilaterais prevê-se regras específicas (art. 40º) que se
traduzem na celebração de um novo acordo. Aplica-se o art. 30º, nºs 1 a 3 caso haja
coincidência de partes. Caso as partes envolvidas no tratado original e no tratado de
revisão não coincidam há uma situação de sucessão de tratados que é regulada pelo art.
30º, nº 4. No caso de adesão posterior de um Estado rege o art. 40º, nº 5
● Modificação – alteração das disposições do Tratado somente a respeito das
relações entre algumas partes, ou seja, é uma alteração subjectivamente parcial do
tratado internacional, apenas sendo atinente a certas partes e não ao universo global dos
que nela participaram.
– Admissibilidade – art. 41º, nº 1
– Processo – art. 39º e obrigação de notificação da intenção às restantes
partes e das modificações operadas (art. 41º, nº 2)
§ Há limites materiais à revisão? No caso dos tratados normativos a questão pode
ser respondida favoravelmente (cf. CNUDM – art. 155º, nº 2); no que toca ao ius
cojens; alguns tratados constitutivos de OI(UE e ONU).

Requisitos de validade dos Tratados

● Subjectivos – o consentimento livre, consciente e correctamente formado e


manifestado. Dizem respeito à qualidade e à capacidade dos sujeitos internacionais
outorgantes, bem como à manifestação da respectiva vontade, seja no plano
funcional dos órgãos que para tanto estão habilitados, seja no plano psicológico,
relativamente à exigências de expressão de uma vontade que seja livre e esclarecida.
– Vícios funcionais: a irrelevância do desrespeito pelo direito interno (art.
27º), com a excepção da ratificação imperfeita, nos termos do art. 46º); o excesso de
representação (art. 47º)
– Vícios materiais da vontade: o erro (art. 48º); o dolo (art. 49º); corrupção
do representante (art. 50º); coacção sobre o representante (art. 51º) e coacção sobre o
Estado (art. 52º); § a questão da ‘coacção económica’.
● Objectivos ou materiais
– Dizem respeito ao conteúdo e ao objecto do tratado internacional, na
medida em que é internacionalmente relevante, para além de dever ser inteligível e
coerente nos efeitos que contem.
– O respeito do ius cojens (arts. 53º e 64º)
– O art. 103º da CNU
– A subordinação a outro tratado (art. 30º, nº 2). A questão dos tratados
normativos
● Formais
– O respeito pelas regras relativas à conclusão dos tratados que vinculem
as partes. Dizem respeito às exigências formais e procedimentais, na extrinsecação do
tratado, bem como no iter procedimental que importa respeitar para se afirmar
completo.
– O respeito pelas disposições relativas à conclusão de Tratados da CVDT
que não sejam supletivas (ex. art. 42º), ou que, sendo supletivas, sejam aplicáveis

Regime das invalidades

● Regime imperativo

◘ Nulidade. Questão controvertida.


São dois os factores que permitem distinguir entre a nulidade absoluta e a
nulidade relativa: o critério da sanabilidade do correspondente vício, critério em que
a alegação da nulidade nem sempre pode acontecer, já que essa invocação não
produz efeitos se entretanto tiver acontecido a sua aceitação expressa ou tácita, e o
critério da divisibilidade dos tratados viciados, sendo necessário referir que nem
todas as causas de nulidade permitem que se possa invocar a sua operatividade por
referência a uma parte do tratado, nalguns casos isso só aocntecendo para a
totalidade do tratatdo.
→ Absoluta (afecta a totalidade do Tratado e é insusceptível de
convalidação) – arts. 51º (coação e incompatibilidade originária com ius cojens – art.
53º). A questão do ius cojens superveniente (art. 64º - se a nulidade absoluta é a regra
geral das invalidades - art. 44º, nº 2, então deve considerar-se como absoluta. Neste
sentido também pode invocar-se o art. 71º, nº 2)
A nulidade absoluta inclui as causas que são mais graves na violação dos
princípios e normas de Direito Internacional, sendo alguns exemplos a coacção sobre o
representante de um Estado, a coacção sobre um Estado pela ameaça ou pelo emprego
da força e a violação da norma internacional de ius cogens.
→ Relativa (pode incidir apenas sobre parte do tratado, nas condições do nº
3 do art. 44º, e pode ser sanada, nos termos do art. 45º)
A nulidade relativa é menos grave, fazendo parte das suas causas a
irregularidade na conclusão interna do tratado, a restrição especial ao poder de
manifestar o consentimento, o erro, o dolo e a corrupção de um representante de um
Estado.
◘ Efeitos
→ As disposições afectadas pela nulidade não têm força jurídica e deve ser
reconstituído o statu quo ante - arts. 69º, nº 1 e 69º, nº 2, al a). Assim,
- os vícios subjectivos que incidam sobre a totalidade do Tratado implicam a
nulidade dos tratados bilaterais;
- os vícios subjectivos relativos ao consentimento de uma das partes que incidam
sobre a totalidade de um Tratado multilateral implicam a possibilidade de desvinculação
dessa parte (arts. 45º e 69º, nº 4)
- os vícios objectivos e formais que incidam sobre a totalidade do tratado
implicam a nulidade do tratado multilateral ou bilateral
- os vícios subjectivos e objectivos que incidam sobre algumas disposições e em
que se aplique o art. 44º, nº 3 (exclui a coação e o ius cojens) implicam a nulidade
dessas cláusulas nas relações entre o Estado sujo consentimento foi viciado e o(s)
outro(s) Estado(s).
A verificação da nulidade determina o apagamento dos efeitos do tratado
internacional, quase como se o mesmo nunca tivesse existido.
→ Consideram-se válidos os actos praticados antes da invocação da nulidade
que tenham sido praticados de boa fé - art. 69º, nº 2, al. b)
→ excepção prevista nos termos do nº 3 para a parte que provocou o vício de
consentimento
→ Quando se trate de violação de ius cojens há que distinguir os efeitos já
produzidos no 53º (devem eliminar-se sem salvaguarda da boa fé) e no 64º (são válidos)
– art. 71º
◘ Processo – arts. 65º a 68º
→ Notificação fundamentada e por escrito da intenção à(s) outra(s) parte(s) –
art. 65º, nº 1 e 5
→ Não havendo objecção (no prazo do 65º, nº 2), consignar-se-á num
instrumento comunicado à(s) outra(s) parte(s) a invalidade e respectivas consequências
(art. 67º, nº 2). Competência – art. 67º, nº 2
→ Podem ser revogados estes actos até ao momento em que produzam efeitos
(art. 69º)
→ Em caso de objecção:
 Resolução do diferendo nos termos previamente convencionados pelas partes
– art. 65º, nº 4
 Recurso aos meios do art. 33º CNU – art. 65º, nº 3
 Caso o recurso aos meios do art. 33º CNU tenha sido infrutífero, no caso de o
diferendo incidir sobre a violação de ius cojens, é possível o recurso por acordo a
arbitragem, ou o recurso ao TIJ – art. 66º, al. a); quando o diferendo incida sobre outro
fundamento, qualquer parte pode solicitar o recurso ao processo de conciliação anexo à
CVDT – art. 66º, al. b)

Suspensão da aplicação

Determina a interrupção da produção de efeitos do tratado, tratando-se, contudo,


de uma paralisação temporária, não suprimindo a fonte de onde emanam esses efeitos.
Pode ser determinada ou indeterminada e surge associada a acontecimentos
temporários.
◘ Causas:
– Impossibilidade temporária de execução – art. 61º, nº 1
– Alteração fundamental das circunstâncias – art. 62º, nº 3. Não pode ser
invocada se se verificarem algumas das situações previstas no art. 45º
(estoppel).
– Conclusão entre todas as partes de um Tratado posterior sobre a mesma
matéria nos termos do art. 59º, nº 2
– Previsão no Tratado ou por consentimento de todas as partes – art. 57º
– Por acordo entre certas partes, nos termos do art. 58º
– Violação substancial – art. 60º, nºs 1 e 2, als. a), b) e c). Não pode ser
invocada se se verificarem algumas das situações previstas no art. 45º
(estoppel).

▪ Quer a suspensão, quer a cessação da vigência podem ter lugar apenas


relativamente a algumas disposições, tal como a nulidade, nos termos do art. 44º, nº 3.

Cessação da vigência

Implica uma extinção definitiva do tratado internacional.


◘ As causas podem ser:
→ Relativas às partes
– Desaparecimento da(s) parte(s). O problema da sucessão de Estados.
– Por consentimento de todas as partes (abrogação)– art. 54º, al. b)
Caso a cessação da vigência do tratado seja por vontade colectiva (com o
consentimento de todas as partes) a causa de cessação toma o nome abrogação,que se
traduz na feitura de uma “anti-convenção”, pondo termo ao tratado existente com duas
sub-hipóteses: de essa revogação ser retroactiva, atingindo os efeitos já produzidos, ou
de essa revogação ser apenas prospectiva, só valendo para o futuro.
– Denúncia nos tratados bilaterais – art. 56º.
– Conclusão de um tratado subsequente sobre a mesma matéria, nos termos
do art. 59º, nº 1.
– Violação substancial (exceptio non adimpleti contractus) – art. 60º. Não
pode ser invocada se se verificarem algumas das situações previstas no art. 45º
(estoppel).
Perante o fim da vigência dos tratados, a CVDTE prevê um procedimento
aplicável que se desenvolve por duas fases:
→ uma fase amigável, através da qual uma das partes notifica a outra de que
pretende a cessação do tratado, invocando uma ajustada justificação que pode ser aceite;
→ uma fase litigiosa, no caso de aquela vontade extinta não ter sido aceite,
criando-se um diferendo, podendo este ser resolvido de duas maneiras: por recurso à via
geral da arbitragem ou do tribunal, ou por recurso à via especial da reconciliação,
especialmente regulada no anexo à CVDTE.
→ Alheias às partes
– Cessação da vigência por previsão no Tratado (art. 54º, al a)
– Cessação da vigência do tratado multilateral quando o nº de partes se
torne inferior ao nº necessário nos termo do art. 55º (previsão do Tratado)
– Execução do Tratado (contrato)
Verifica-se uma impossibilidade de cumprimento, que consiste na incapacidade
de se cumprir os efeitos estabelecidos no articulado do contrato, motivo pelo qual se
entende que o mesmo não pode continuar a vigorar (correspondência correcta entre a
prof. e Bacelar Gouveia?).
– Impossibilidade superveniente de execução relevante nos termos do art.
61º, nº 1
- Alteração fundamental das circunstâncias relevante nos termos do art. 62º
(rebus sic standibus) – cf. Ac. TIJ, de 25/7/1974, UK e RFA vs Islândia, Pescarias. Não
pode ser invocada se se verificarem algumas das situações previstas no art. 45º
(estoppel).
A alteração das circunstâncias implica que, perante um contexto distinto
daquele em que se formou o contrato, pode ocorrer a cessação de vigência, devendo
aquela ser radical.
A operacionalidade da alteração das circunstâncias está dependente da
verificação de dois possíveis resultados não previsíveis:
→ a alteração de circunstâncias modificar a base essencial do consentimento
dos Estados a vincular-se ao tratado;
→ a alteração de circunstâncias desembocar numa transformação radical da
natureza das obrigações assumidas no tratado.
Nunca a alteração de circunstâncias é aplicável estando em causa um tratado
de fixação de fronteiras ou a se a alteração se ficar a dever a comportamento antijurídico
de quem a invoca.
- Costume contra tractum?
▪ A (ir)relevância da ruptura ou ausência de relações diplomáticas – arts. 63º e
74º. A guerra nos tratados bilaterais causa de cessação ou/e suspensão? – art. 73º
Até ao novo regime do ius ad bellum a guerra era considerada como uma causa
de perturbação da vigência nos tratados celebrados entre os Estados beligerantes,
ficando essas disposições suspensas, mas mantendo-se relativamente a outros Estados,
considerados alheios ao conflito.
Com a proscrição geral do uso da força, a guerra não foi considerada do âmbito
da CVDTE, apenas sendo referida, indirectamente e até certo ponto, por intermédio da
ruptura das relações diplomáticas, que não tem efeitos cessatórios da vigência de
tratados celebrados entre os Estados em conflito.
Dada a provisoriedade da guerra, parte-se da crença de que está em causa uma
suspensão, havendo três resultados possíveis:
→ nos casos em que a guerra seja um acontecimento incompatível com a
manutenção dos efeitos convencionais, opera-se essas suspensão;
→ casos em que alguns dos efeitos sejam exactamente activos em função da
deflagração de um conflito armado;
→ e casos em que o estalar de um conflito entre entidades beligerantes se mostre
irrelevante não havendo nada a alterar na respectiva configuração jurídica.
Deste modo, há casos em que a guerra não leva à cessação de vigência de um
tratado:
→ quando o tratado preveja essa vigência expressamente em condições de
conflito;
→ quando o tratado faça realmente sentido no caso da eclosão de um conflito
armado;
→ quando um tratado crie situações objectivas, imunes aos efeitos da guerra.

Denúncia e recesso

Caso a vontade de cessação de um tratado seja de apenas um dos sujeitos que o


integram, distingue-se entre denúncia e recesso.
→ A denúncia acarreta a cessação da vigência dos tratados bilaterais.
→ Nos tratados multilaterais a desvinculação de um parte assume a forma de
recesso e só implica a desvinculação dessa parte e a consequente modificação das
relações jurídicas entre si e as restantes partes, mantendo-se em vigor o tratado para as
restantes, excepto na situação do art. 55º
→ Caso o tratado não preveja a denúncia ou o recesso, estes só poderão ter lugar
com verificação de uma das condições previstas no nº 1 do art. 56º, contudo, se foram
aceites pelas partes ou se deduzam das natureza do tratado, estabelece-se um prazo de
12 meses para que os efeitos cessatórios de vigência que inerem a cada um destes actos
possa começar a produzir-se.
→ Não é admissível o recesso nas convenções de codificação e nas que
constituem situações objectivas.

Processo relativo à suspensão, cessação da vigência, denúncia ou recesso

→ De acordo com as disposições do Tratado – arts. 54º, al. a), 57º, al. a) e 58º,
nº 1, al. a) e nº 2
→ No caso de denúncia ou recesso ao abrigo do art. 56º, nº 1, a intenção deve
ser comunicada com 12 meses de antecedência – art. 56º, nº 2
→ O processo segue um regime idêntico ao referido para as invalidades (arts.
65º a 68º)

Consequências da extinção de um tratado ou do recesso num tratado multilateral

→ Determinadas pelas disposições do Tratado ou resultantes de convenção entre


as partes – art. 70º, nº 1
→ Supletivamente aplica-se o art. 70º, nº 1,als. a) e b)

Bibliografia:
• J. Miranda, ob cit., pp. 81-93

8/4/2008

DIREITO DOS TRATADOS


NORMAS PORTUGUESAS RELATIVAS À CONCLUSÃO DOS TRATADOS

Conceitos Fundamentais

Tratado (solene)
Aprovação: Competência da Assembleia da República (AR)
Vinculação: é a ratificação que manifesta a vontade do Estado Português se vincular aos
tratados solenes.
Fiscalização preventiva da constitucionalidade: confirmação – art. 279º, nº 4 CRP.
Admite-se que possa haver confirmação no caso de inconstitucionalidade.

Acordo
Aprovação: Competência da AR (quando as respectivas matérias se incluem na esfera
da sua reserva de competência legislativa ou quando, sendo o Governo o órgão a quem
compete, entenda que deva cometer AR) ou Governo
Vinculação: a vontade de vinculação do Estado Português é logo manifestada com a
aprovação, parlamentar ou governamental.
Fiscalização preventiva da constitucionalidade: não confirmação? Numa interpretação
de teor literal, não há confirmação.

Ambos:
• Inadmissibilidade de vinculação a acordos por troca de notas sem posterior
aprovação ou ratificação, uma vez que tal dispensaria a intervenção do Chefe de
Estado, arredando aquele órgão fundamental do nosso sistema político de uma
intervenção no respectivo procedimento – art. 8º, nº 2
• Reserva material de Tratado? a essencialidade – arts. 161º, al i), 197º, nº 1, al. c),
8º, nº 2 e outras considerações em relação a “opções políticas primárias” (Jorge
Miranda). Mesmo de matéria análoga a DL de desenvolvimento deve ser
submetida à aprovação da AR, seja por Tratado ou acordo. O 277º, nº 2 atenua
os efeitos perversos no plano internacional.
A maioria da doutrina portuguesa tem-se inclinado para a existência de uma reserva
material de tratado, a qual implica que, havendo contratação internacional sobre certas
matérias, não possa haver a manipulação da escolha do procedimento, a ser
necessariamente o tratado solene, entendimento que deve ser genericamente seguido.
Isso sucederia sempre que o Estado Português se preparasse para estabelecer
convenções internacionais em matéria constitucionalmente incluída no “tratado”,
procedimento que constituiria um conceito normativo e não fáctico: a AR seria
competente não por ser um tratado mas porque deve ser um tratado.
Os argumentos fundam-se na defesa da preeminência da função parlamentar em
detrimento da função governamental, com a estranheza que a manipulação do poder
governamental sobre as matérias mais relevantes da contratação internacional causaria.
Minoritariamente, a doutrina também defende a não existência da reserva material
do tratado, pois este não é uma imposição constitucional, é algo que fica definido nas
negociações internacionais prévias. Argumentos:
- O facto de a escolha ser feita em plano internacional, interessando a todos os
Estados e podendo limitar a liberdade de negociação do Estado Português;
- Se houvesse essa reserva material, o texto constitucional falaria de tratado nas
mais sensíveis matérias, quando na verdade podem até corresponder a meras
convenções;
- As matérias em relação às quais a AR tem o poder de aprovar os tratados também
estão acolhidas na competência que se lhe defere na aprovação dos acordos que lhe
possam materialmente corresponder, sendo essa competência definida primariamente
pelo âmbito material e não pelo tipo de procedimento.
- O Presidente da República (PR) dispõe exactamente do mesmo poder, não
havendo o perigo de se excluir a sua intervenção.

Procedimento relativo à negociação e vinculação

◘ Negociação e ajuste (adopção do texto)


→ Competência política do governo – art. 197º, nº 1, al. b) da CRP
Condução das negociações – Ministério NE – DL 48/94
Ajuste (as rubrica e assinatura aprovadas pelo Conselho de Ministros, tacitamente
delegadas no PM) – Res. Cons. Min. 17/88
Atendendo à CRP, as fases de negociação e ajuste (a.k.a. adopção do texto) estão
atribuídas ao Governo no âmbito do exercício da sua função política, mas não esclarece
de que forma o Governo intervém nessas duas fases de elaboração das convenções
internacionais, o que se torna particularmente necessário dada a complexidade do órgão
em questão.
O DL nº48/94de 24 de Fevereiro defere ao Ministério dos Negócios Estrangeiros
a condução das negociações, sendo assim no respectivo âmbito que as mesmas se
iniciam e desenvolvem. A Res. Do Conselho de Ministros nº17/88, no que refere ao
ajuste, veio dizer que a rubrica e a assinatura dependem da aprovação do Conselho de
Ministros, estando tacitamente delegadas no Primeiro-Ministro.

§ Desconformidade com a CVDT


No plano da CVDTE a negociação e a adopção do texto nem sempre surgem
directamente legitimadas pelo Governo, como nos casos de habilitação funcional, em
que pode haver a intervenção de entidades que ou não são o Governo ou, sendo do
Governo, não se inscrevem no condicionalismo acima descrito.
A validade das convenções internacionais fica sempre dependente das
orientações internas, não podendo prevalecer as regras internacionais.
Tendo essa anomalia sido registada, o Governo tem a possibilidade, ao abrigo da
própria CVDTE, de concordar com tais actos, sanando assim a irregularidade
verificada.
Informação ao PR – art. 201º, nº 1, al. c); aos partidos – art. 114º, nº 3; grupos
parlamentares – art. 180º, nº 2, al. j)
→ Participação das Regiões Autónomas (governo regional) – 227º, nº 1, al. t) (voltam
a intervir consultivamente na aprovação – art. 198º, nº 3 RAR)
Do ponto de vista constitucional, estas entidades jurídico-públicas menores (as
Regiões Autónomas) têm o direito de participar na base das negociações para assunto
que aluda o seu interesse regional, sendo necessário considerar os seguintes pontos:
- qual a posição procedimental em que se dá a participação;
- sobre que convenções essa participação faz sentido;
- que órgão regional tem o poder de intervir.
O momento procedimentalmente adequado explicita-se no próprio conceito de
negociação internacional a que este poder de intervenção regional se agrega, numa
podendo a intervenção redundar-se na atribuição ao poder regional de uma capacidade
de determinação do sentido das futuras convenções internacionais, contudo, não deve
ser desdenhada, pois pode trazer à negociação a importância dos interesses regionais,
que são assim directamente ponderados.
De acordo com a CRP o âmbito do poder regional de participar nas negociações
internacionais do Estado Português acontece apenas em relação aos “tratados e acordos
internacionais que directamente lhes digam respeito”, é, contudo, uma fórmula que
levanta algumas hesitações.
É necessário encontrar um conceito intermédio entre o interesse nacional e o
interesse regional stricto sensu, assim, “para que as regiões autónomas possam
reivindicar este direito, não é preciso ser apenas um interesse específico regional, mas
também não pode ser um interesse nacional qualquer, sob pena de as regiões autónomas
poderem intervir em tudo o que respeita à negociação internacional do Estado
Português, o que seria sempre excessivo”.
A instância de poder regional que participa nas negociações é o Governo
Regional, pois dispõe da função política. Não lhe sendo possível participar directamente
por se tratar de um órgão colegial, essa participação dá-se através de mandato expresso
conferido a um membro do Governo ou a outro representante.
Quanto à aprovação parlamentar, o RAR estabelece ainda que “quando o tratado
ou acordo diga respeito à Regiões Autónomas, nos termos da alínea t) do número 1 do
artigo 227º da Constituição, o texto é remetido aos respectivos órgãos de governo
próprio, a fim de sobre eles se pronunciarem”.

→ Participação das organizações de trabalhadores na OIT.

◘ Aprovação (legitimação político-democrática)


→ Tratados – Resolução da AR – art. 161º, al. i)
→ Acordos
 Resolução da AR (obrigatória – os indicados no elenco do 161º, al. i) e os matéria de
competência reservada – arts. 164º e 165º; facultativa – que o governos entenda
submeter) – art. 161º, al. i).
 Decreto do Governo (os que não versem sobre matéria da competência reservada) –
arts. 197º, nº 1, al. c) e 200º, nº 1, al. d)
§ os Acordos têm de ser assinados pelo PR – arts. 134º, al b) e 137º. É obrigatória
também a referenda governamental – art. 140º, nº 1
§ A desconformidade do regime interno português de vinculação nos Acordos com o
regime internacional – a necessidade de recorrer à assinatura ad referendum (sob
reserva da aprovação interna).
• Ratificação dos Tratados – PR – art. 135º, al. b). Exige referenda governamental
(obrigatória)– art. 140º, nº 1.
– a não previsão de prazo.

§ A adesão. Aplicação analógica das disposições relativas à aprovação e ratificação.


• Publicação no DR (I Série) – condição de vigência interna – art. 8º, nº 2 e 119º,
nº 1, al. b) –, mas não suficiente (exige-se a vinculação internacional do Estado).

A fase da aprovação equivale ao momento de legitimação político-democrática


quanto ao conteúdo das convenções internacionais em causa. Apesar de normalmente
não ter efeitos internacionais não pode ser negligenciada pelas suas implicações no
alargamento da legitimidade popular dos tratados internacionais.
Diz a CRP que “compete à Assembleia da República aprovar os tratados,
designadamente os tratados de participação de Portugal em organizações internacionais,
os tratados de amizade, de paz, de defesa, de rectificação de fronteiras e os respeitantes
a assuntos militares, bem como os acordos internacionais que versam matérias da sua
competência reservada ou que o Governo entenda submeter à sua apreciação” enquanto
que “compete ao Governo, no exercício das suas funções políticas, aprovar os acordos
internacionais cuja aprovação não seja da competência da Assembleia da República ou
que a esta não tenham sido submetidos”.
O procedimento da aprovação dos tratados internacionais solenes é composto por
vários momentos:
- a iniciativa, que cabe ao Governo;
- a instrução, que compete à comissão parlamentar especializada, dispondo-se do
prazo de 30 dias, podendo ser excepcionalmente encurtado;
- a deliberação, que compreende a discussão e a vontade, de acordo com as regras
gerais do procedimento administrativo, na generalidade, na especialidade e como
votação final global.
Quanto à forma dos actos finais em cada um destes procedimentos de aprovação dos
tratados e dos acordos internacionais:
- no caso dos tratados solenes trata-se de resolução da AR, resultado que se alcança
por exclusão de partes;
- no caso dos acordos aprovados pela AR é a resolução da AR, assinada pelo
Presidente da República, sendo essa assinatura um seu elemento de existência;
- no caso dos acordos aprovados pelo Governo trata-se de um decreto assinado pelo
Presidente da República, sendo a assinatura deste um seu elemento de existência
jurídica.

◘ Fiscalização preventiva da constitucionalidade


→ Iniciativa – PR – art. 277º, nº 1 Prazo – 8 dias
→ Declaração de inconstitucionalidade de “acordo internacional, deverá o diploma ser
vetado pelo PR (…) e devolvido ao órgão que o tiver aprovado” – art. 279º, nº 1.
 Confirmação nos termos do nº 4 (tratado aprovado pela AR). § e os acordos? O ac.
494/99 chega a entender que não seria possível a fiscalização preventiva dos acordos
aprovados por resolução da AR. Solução idêntica para estes.
 aprovação com modificação a nível de reservas (reformulação – art, 279º, nº 3 e art.
204º RAR)
Trata-se de um fase eventual directamente descrita no texto constitucional nos
artigos 278º/1, 279º/1 e 279º/4 da CRP.
Este controlo de constitucionalidade exerce-se em dois momentos precisos:
→ depois de produzida a resolução da aprovação parlamentar e antes do Presidente da
República se decidir a ratificar no caso dos tratados solenes;
→ dentro da fase da aprovação, no caso dos acordos, entre a votação da resolução
parlamentar ou do decreto governamental e respectiva assinatura presidencial.
A apreciação do Tribunal Constitucional pode ter três resultados:
→ a não decisão, com preclusão do seu poder, quando o Tribunal Constitucional, no
prazo assinalado, nada declare, ou no caso de haver uma decisão que não seja proferida
dentro do prazo, precludindo-se o respectivo poder jurisdicional;
→ a pronúncia pela inconstitucionalidade quando se considera a existência de cláusulas
viciadas de inconstitucionalidade;
→ a não pronúncia pela inconstitucionalidade.
No caso da pronúncia pela inconstitucionalidade o PR deve vetar juridicamente
o diploma e devolve-lo ao órgão que o tiver promanado. A CRP admite ainda nestes
casos três tipos de resposta:
→ a não decisão: sempre que o órgão promanante do diploma em causa entende não ser
de prosseguir com o assunto, não podendo haver juridicamente qualquer acto jurídico-
público que seja constitutivo do mesmo;
→ o expurgo, sempre que o órgão promanante extrai do diploma as normas ou os
segmentos de normas consideradas inconstitucionais pelo Tribunal Constitucional;
→ a confirmação, sempre que o diploma em causa seja confirmado pela maioria da dois
terços dos Deputados presentes, desde que superior à maioria absoluta dos Deputados
em efectividade de funções.

◘ O referendo – art. 115º, nºs 1, 5 e 11 (excepto tratados de paz e rectificação de


fronteiras)
→ O resultado do referendo vincula os órgãos competentes a aprovarem ou ratificarem
no caso afirmativo e a não aprovarem ou ratificarem em caso negativo – arts. 241º, 242º
e 243º LORR
→ No caso de “tratado que vise a construção e aprofundamento da união europeia”, é a
aprovação do próprio tratado que pode ser submetida a referendo (art. 295º) e não as
questões sobre que incida o tratado internacional (art. 115º, nº 3)
→ Fiscalização preventiva obrigatória – art. 115º, nº 8.

Objecto do referendo: as questões internacionais que podem ser referendadas:


Inserção procedimental da decisão referendária: a colocação da convocação do
referendo no procedimento de conclusão das convenções internacionais, podendo ser o
próprio texto do tratado a ser submetido a referendo.
Valor de decisão referendária: a projecção do resultado do referendo na
vinculação convencional do Estado Português.
Do ponto de vista das matérias, o uso do referendo nacional é limitado à
auscultação da vontade dos cidadãos apenas em relação às questões de relevante
interesse nacional que devam ser decididas por acto jurídico-público, sendo um desses
actos a convenção internacional, da qual se excluem as convenções internacionais sobre
paz e rectificação de fronteiras.
No que respeita à decisão do referendo deve pôr-se a opção de saber se o
resultado é ou não vinculativo. O modelo que a CRP adoptou é do referendo vinculativo
e é tratado no artigo 115º/1 e 115º/11.
Caso a decisão se torne vinculativa, esta projecta-se sobre a intervenção dos
órgãos de soberania na conclusão da convenção internacional em causa, impondo-lhes
determinados deveres:
→ a obrigação da aprovação do tratado ou do acordo internacional em causa por
parte do órgão competente;
→ a obrigação de ratificação o de assinatura do acto de aprovação por parte do
PR;
→ a obrigação de não aprovar convenções internacionais contrariando o sentido
do resultado referendário, obrigação de não agir que se impõe à AR e ao Governo.
A contratação internacional não está só dependente de Portugal deve articular-se,
no contexto plurilateral que o domina, com a produção de outras vontades alheias à
intervenção de Portugal.

Procedimento para a desvinculação ou suspensão da aplicação

Não está regulada, mas deve ter um procedimento substancialmente idêntico ao da


vinculação, nomeadamente assegurando a aprovação pelo órgão competente e a
intervenção do PR.

Relação entre o DI e o direito interno

◘ Relação entre o DI e os direitos nacionais – dualismo ou monismo (associação com o


fundamento)
 Monismo com primado do direito interno
 Monismo com primado do DI
§ posição adoptada: monismo com primado do DI mitigado (a questão não é tão-
só de invalidade) e diferenciado (tendo em consideração as diferentes categorias de DI e
a especial importância do direito constitucional num quadro de Estados soberanos) à luz
de uma orientação pluralista do direito
De um ponto de vista político-doutrinário, que se destina a avaliar o tipo de
relações que são susceptíveis de ser praticadas entre o DI e o dto interno, destacam-se
duas teorias: a teoria dualista e a teoria monista.
O dualismo afirma que o Dto Internacional e o Dto Estadual são duas ordens
jurídicas radicalmente distintas baseando-se nos seguintes argumentos:
→ na diferença das fontes, que no plano interno é a lei e no internacional é o tratado;
→ na diferença dos sujeitos, que no plano interno é uma multidão de entidades
jurídicas, públicas e privadas, singulares e colectivas e no plano internacional é restrito
a uma dimensão demasiadamente institucional;
→ na diferença dos mecanismos garantísticos que no plano interno funcionam com
eficácia a partir dos tribunais, apoiados depois nas forças policiais e nas forças armadas,
enquanto que no plano internacional a estrutura jurisdicional é frágil.
Por sua vez, o monismo frisa os diversos aspectos que têm aproximado o Dto
Internacional do Dto Estadual, utilizando exactamente os mesmos argumentos:
→ na proximidade das fontes, pois há a nível interno sinais de uma intensa
“contratualização legislativa”, além de que no Dto Internacional são também relevantes
outras fontes como, por exemplo, o costume;
→ na coincidência dos sujeitos, pois não se pode dizer que outros sujeitos, como a
pessoas humana, não sejam directos destinatários das normas de Dto Internacional,
sendo de considerar que o Estado a nível interno é igualmente um destinatário;
→ na diversificação dos mecanismos de garantia.
Dentro do monismo têm sido sugeridas duas orientações:
→ o monismo com primado de Dto Interno: tem a sua raiz num voluntarismo estadual,
que tanto na teoria como na prática conduz à negação do próprio DI, não podendo ter
hoje aceitação;
→ o monismo com primado de DI: orientação que reflecte a posição de se aceita a
prevalência do DI sobre o Dto Interno. Pode ainda apresentar-se sobre duas formas:
 uma radical, que implica a prevalência absoluta da norma internacional sobre
qualquer norma estadual; e
 outra moderna que apenas o admite em certa medida, reconhecendo que o Dto
Interno pode em alguns casos prevalecer ou que nele não deve o DI interferir.

◘ Sistemas de incorporação do DI nas ordens internas


→ Recepção
 Automática (incorporação como tais sem necessidade de qualquer formalidade)
 Condicionada (incorporação como tais com algumas condições)
→ Transformação (para o DI convencional vigora no Reino Unido e na Itália)

→ O caso português – o art. 8º


– Nº 1 – recepção automática do DI comum. § a questão do DI comum
convencional (DUDH e outros Tratados normativos)
• O costume regional ou local não está previsto, mas deve cair no
âmbito do nº 1
– Nº 2 – recepção condicionada do DI convencional regularmente
ratificado ou aprovado, sujeito à condição da sua publicação oficial e à
vigência internacional e à vinculação internacional do Estado
– Nº 3 – recepção automática das normas de OI de que Portugal seja parte,
desde que tal esteja previsto no tratado constitutivo (caso UE). Vide
crítica de Gonçalves Pereira (não há recepção). § a questão das decisões
do CS NU
– Nº 4 – recepção automática ou plena? A questão não é necessariamente
de vigência, mas do alcance dos efeitos. Comparação com o art. 16º. O
regime da sua incorporação é devolvido ao direito da União. Cautelas de
salvaguarda constitucional (o respeito pelos “princípios fundamentais do
Estado de Direito Democrático”). Leitura à luz dos arts. 1º, 2º, 3º, 288º,
etc.
§ outras disposições relevantes – arts. 7º, 16º, 29º, nº 2
– A insuficiência do art. 8º (além do costume particular, não prevê os actos
unilaterais dos Estados)

São dois os modelos de incorporação do DI no Dto Interno: o modelo da


transformação e o modelo da recepção.
O modelo da transformação implica que o DI mude de natureza, ficando as
respectivas orientações do mesmo modo a valer no Dto Interno mas a título de fonte
interna e já não a título de fonte internacional. Assenta nos postulados dualistas porque
não concebe a comunicabilidade directa do DI com o Dto Interno.
O modelo da recepção assenta na ideia de que o DI pode fazer parte do Dto
Interno conservando a sua natureza original, não sendo necessário fazer qualquer
operação no seu título de validade. Pode desdobrar-se em recepção automática (ocorre
quando a integração do DI no Dto Interno não fica dependente de qualquer acto
intercalar interno para a sua vigência se efectivar) e recepção condiciona (acontece
quando a incorporação do DI no Dto Interno carece de um acto de interposição, que não
transforma a sua natureza mas que condiciona a respectiva vigência), podendo-se ainda
falar em recepção material (se for de um conteúdo específico) e recepção formal (se for
da fonte abstractamente considerada).
É de referir a possibilidade de existência de um sistema misto que pode assumir
diferentes variedades, aparecendo sempre que haja a transformação para uma parte do
DI e a recepção para uma outra parte do DI.

◘ O conflito entre normas de DI e normas nacionais


→ DI comum
 Os princípios do art. 7º e a sua consideração como ius cojens –
supraconstitucionalidade (J. Miranda e Gonçalves Pereira); paridade (Bacelar Gouveia)
 O art. 16º – cláusula aberta de recepção formal - valor idêntico
 O art. 29º, nº 2 – valor infraconstitucional (“nos limites da lei”). Dúvida suscitada
pelo art. 7º, nº 7
 Restante DI comum – valor infraconstitucional e supralegal (J. Miranda);
supraconstitucional (Gonçalves Pereira)
→ DI convencional (com excepção do que caiba supra)
 Valor infraconstitucional e supralegal. Argumentos substanciais e procedimentais.

▪ Artigo 8º CRP

§ a questão das normas da UE. As diversas posições em presença. Argumentos.


Artigo 8º/3 CRP → tem o problema de só se referir às normas quando há outros actos
que à luz do Dto da União Europeia também teriam efeito directo, como as decisões.

◘ Regime da inconstitucionalidade das normas de DI


→ Preventivo (supra)
→ Sucessivo – de iure constituto e de iure constituendo ( a distinção entre a fiscalização
abstracta e a concreta – arts. 281º e 282º).
→ Material (do conteúdo)
→ Orgânica e formal (violação das normas internas relativas à conclusão e vinculação)
– o art. 277º, nº 2 (int. extensiva para os acordos – J. Miranda)

 “disposição interna fundamental” (incompetência absoluta; incompetência relativa –


art. 161º, al. i) 1ª parte; referendo negativo, inexistência da deliberação da AR por falta
de quorum ou maioria de aprovação). § o problema à luz do art. 46º CVDT
(“manifesta”)

◘ Desconformidade de actos legislativos com DI


→ Inconstitucionalidade no caso da DUDH – 16º, nº 2 (não outras convenções nos
termos do 16º, nº 1, excepto Bacelar Gouveia)
→ Desconformidade atípica no restante, fiscalizável com base no 204º (controlo difuso)
e art. 70º, nº1, al. i) da LTC (controlo concreto).

◘ Consequência jurídica de qualquer incompatibilidade


Ineficácia.

Bibliografia:
• J. Miranda, ob cit., pp.94-119 e 139-185
Os sujeitos de DI

§ Subjectividade e pertença à comunidade internacional (remissão)

São encarados como sujeitos de DI o conjunto de entidades que protagonizam as


relações internacionais que o DI disciplina.

▪ Subjectividade ou personalidade jurídica – qualidade do ente ao qual são imputáveis


direitos e deveres, que pode ser titular de relações jurídicas (especialmente importante
para os particulares), que é destinatário directo de normas jurídicas, em todos os casos
internacionais.
A personalidade jurídico-internacional é a susceptibilidade para se ser
destinatário de normas e princípios de DI, dos quais directamente recorre a
oportunidade para a titularidade de direitos ou para se ficar adstrito a deveres.
▪ Capacidade jurídica internacional – esfera da titularidade de relações jurídicas
– Genérica – Estados
– Limitada, por ex. de acordo com o pr. da especialidade – outros sujeitos
– Capacidade de gozo
– Capacidade de exercício
A capacidade jurídico-internacional afere-se pelo conjunto dos direitos e deveres
que podem estar inscritos na esfera jurídico-internacional da entidade em causa,
diferenciando-se entre uma dimensão de titularidade e uma dimensão de exercício dos
mesmos.
▪ O Reconhecimento – relevância e tipos (de jure/de facto; definitivo/provisório;
individual/colectivo; expresso/tácito; declarativo/constitutivo; pleno/condicional)

● Classificações
→ De base territorial
(Estado, confederação, união real, beligerante)
→ De fins gerais
(Estados)
→ Permanentes
(Estado, Santa Sé, Cruz Vermelha, Ordem de Malta, indivíduo e OI)
→ De capacidade plena
(Estado soberano)

→ De base não territorial


(OI, particulares, Santa Sé, Cruz Vermelha, Ordem de Malta)
→ De fins especiais
(os restantes)
→ Não permanentes
(beligerantes, OI, particulares colectivos)
→ De capacidade limitada
(os restantes)

● Tipos principais
1. Estados e entidades afins
2. Instituições não estatais
3. OI
4. O indivíduo e outros entes particulares
§ 1. a Humanidade - art. 136º CDMUN – a ‘Área’ (fundos marinhos); art. 1º do
TEUEE; Preâmbulo Estatuto TPI
§ 2. a Comunidade internacional - 53º CVDT (ius cojens); art. 5º Est. TPI (mas refere os
‘crimes contra humanidade’); arts. 33º e 48º do Projecto de Artigos sobre
Responsabilidade do Estado por actos ilícitos
Seja como for, só os Estados ou OI podem exercer esses direitos.
§ 3. os povos (remissão)

Estados e entidades afins


- Estado soberano (elementos: território, povo e poder político) - ius tractum, ius
legationis, direito de reclamação e ius belli (legítima defesa – arts. 2º, nº 4 e 51º CNU)
São elementos fundamentais do Estado:
→ o elemento humano: o povo, como conjunto de pessoas que se lhe ligam por um
vínculo de cidadania;
→ o elemento territorial: o território, que representa o âmbito espacial da de projecção
da sua Ordem Jurídica; e
→ o elemento funcional/poder político: a soberania, que se traduz, na esfera interna, no
poder máximo de auto-organização, e na esfera internacional, na independência e
igualdade frente a outros poderes.
O sentido da subjectividade internacional surge associado a três facetas
fundamentais que desde sempre marcaram a intervenção dos Estados na vida
internacional: o ius tractuum, o ius legationis e o ius belli.
O ius tractuum representa a faculdade de celebrar tratados internacionais. É uma
atribuição confinada aos sujeitos internacionais de tipo clássico e às organizações
internacionais.
O ius legationis corresponde ao estabelecimento de relações diplomáticas e
consulares, activas no mandar e passivas no receber.
O ius belli consiste na possibilidade de se usar a força ao abrigo do DI, que
agora unicamente se concebe numa situação de auto-defesa.

- os Estados divididos - Coreia e, em especial a China (RPC e RC – Res 2758(XXVI)


AG NU, de 1971, mas é membro de OI, como a OMC)

§ o reconhecimento do Estado (a teoria declarativa e a teoria constitutiva – doutrina


Stimson). Posição adoptada – declarativa. O dever de não reconhecimento de situações
resultado de actos contrários ao DI
§ o reconhecimento do governo - a doutrina da efectividade (Estrada); – a doutrina da
legitimidade (Tobar ou de Wilson). Reconhecimento é constitutivo (Gonçalves Pereira)
ou declarativo (J. Miranda e Bacelar Gouveia). O Governo no exílio.

● Estados de soberania restrita (capacidade limitada)


- (históricos) Estados protegidos (exercem direitos através de outros, os
protectores), vassalos (o exercício de direitos fica sujeito a aceitação do suserano) –
capacidade de exercício limitada
- Estados exíguos – capacidade de gozo afectada pela sua exiguidade territorial
(Mónaco, S. Marino, Liechtenstein ou Andorra). Afecta essencialmente o ius belli.
Distinção dos micro-Estados. § a cidade do Vaticano
- Estados neutralizados (inadequação da autonomização, a não ser a ausência de
direito à intervir em legítima defesa colectiva em favor de outro Estado)
§ a Bósnia Herzegovina e o papel desempenhado pelo Alto Representante da
Comunidade Internacional para a BiH (aproxima-a de um território sob tutela ou de um
Estado ocupado). O mesmo se pode entender, porventura, da actual situação do Kosovo
(declarou-se independente e soberano, mas continua sujeito a uma administração
internacional)
- Estado confederado

- Estados não soberanos (Estados federados e os Estados membros de uma


União Real – podem possuir ius tractum e ser membros de OI – Ucrânia e Bielorrússia
na ONU antes de 1993)

Tratam-se de Estados limitados na sua capacidade, podendo ser várias as causas


dessa limitação, ao mesmo tempo que atinge diversos aspectos da soberania
internacional. Podem ser:
→ Estados confederados: vêem a sua soberania internacional limitado nos
assuntos que ficam delegados na estrutura confederativa. Não se trata de uma limitação
total.
→ Estados vassalos: reflectem a existência de um vínculo feudal, através do qual
o suserano, em troca do exercício de poderes internacionais, confere protecção e
segurança ao Estado vassalo. Não existe actualmente.
→ Estados protegidos: colocam-se numa posição de menoridade relativamente
ao Estado protector, a quem conferem um mandato para o exercício de certos poderes
internacionais, em troca de protecção e ajuda. Não existe actualmente.
→ Estados exíguos: devido à sua pequenez territorial não são aceites à plenitude
da capacidade jurídico-internacional, embora possam exercer alguns dos seus poderes
que se lhes reconhecem.
→ Estados neutralizados: Estados que, por acto unilateral interno ou por tratado
internacional, ficaram decepados do seu poder de intervir em assuntos de natureza
militar no plano internacional.
→ Estados federados: por força da sua inclusão numa federação perdem parte da
respectiva capacidade internacional, nos termos previstos no texto institutivo da
respectiva estrutura federativa

● Entidades pró-estatais
- Beligerantes – reconhecimento constitutivo. Aplicação do DI da guerra; neutralidade
de terceiros que reconhecem; irresponsabilidade do Estado quando o governo reconhece
- Movimentos de libertação nacional – os povos como sujeitos de DI? O pr. da
autodeterminação (arts. 1º, 73º e 76º CNU; Res. 1514-XV, de 1960, e 2625- XXV, da
AG NU). Requisitos representação e ‘controlo político’ do povo. O direito de petição do
Protocolo Facultativo anexo ao PIDCP (art. 7º).
§ os insurrectos (não são sujeitos de DI, mas caso venham a constituir governo ou a
criar um novo Estado os seus actos constituem actos ‘estaduais’ para efeitos de
responsabilidade). O seu reconhecimento visa colocá-los sob a tutela do DI humanitário
- A Autoridade Palestiniana e os respectivos territórios – entidade pré-estatal?
A situação da Palestina oferece contornos internacionais, indefinidos mas
aproximando-se de uma região internacionalizada, não sendo ainda um Estado.

Os beligerantes correspondem a grupos de rebeldes armados que desenvolvem


uma actividade bélica em prol da mudança do sistema político do Estado em que se
integram, ocupando uma parte do território estadual e tendo como principal
característica a prossecução da luta armada. Situam-se dentro do contexto estadual, não
extravasando para outros Estados, não tendo, normalmente, uma implicação
internacional.
Na prática internacional tem-se vindo a dar prevalência à efectividade no tocante
ao conteúdo (atende-se mais ao domínio do território do que ao respeito pelo princípio
democrático) e à não intervenção dos assuntos internos.
Os insurrectos são grupo de rebeldes que levam por diante uma luta armada
com o objectivo de derrubar o sistema político vigente, mudando depois a ordem
constitucional estabelecida. Não ocupam nenhuma parcela do território estadual,
executando as suas actividades de guerrilha em diversas zonas desse território, sem
qualquer controlo político-administrativo.
Podem existir implicações internacionais das actividades de beligerantes e
insurrectos a nível da importação do armamento que utilizam, da desestabilização
económica que provocam na região e da desprotecção e emigração das respectivas
populações

● Entidades infra-estatais
- Mandatos e territórios sob tutela (regime caducado)
- Colónias autónomas (Bermudas, Ilhas Caimão)
- Territórios infra-estatais com capacidade internacional
- histórico – algumas cidades, incluindo Macau sob administração portuguesa
- Hong Kong e Macau – regiões administrativas especiais do Estado chinês (por
ex. são membros da OMC e têm ius tractum)
- o caso do Kosovo, nos termos da Res. 1244 do CS NU, de 1999 (território
nacional de um Estado com administração internacional)
- o território de Timor-Leste entre 1999 e 2002 (administração pela UNTAET)

§ a capacidade internacional de algumas regiões de Estados.


As regiões infra-estaduais corporizam espaços territoriais, dotados de autonomia
jurídico-pública e com poderes (limitados) na vida internacional. Inserem-se aqui as
regiões autónomas, que podem participar em organizações internacionais e celebrar
tratados internacionais especialmente atinentes ao seu território e interesses, as “regiões
administrativas especiais” de que são exemplo Hong Kong e Macau em relação à China
(no plano interno as suas atribuições são também de foro legislativo e jurisdicional,
podendo fazer leis e ter tribunais próprios, enquanto que no plano internacional é-lhes
reconhecida competência para a celebração de alguns tratados internacionais e para a
pertença a algumas organizações internacionais) e as cidades internacionalizadas, que
correspondem a porções territoriais que por força de circunstâncias histórico-
geográficas especiais não dão origem à criação de um Estado, sendo-lhe contudo
atribuída uma capacidade para agir no seio da comunidade internacional e
reconhecendo-se-lhes uma autonomia interna administrativa. Exemplos: Cracóvia e
Jerusalém.

● Entidades supra-estatais
- As confederações (histórico; a única recente foi a Senegâmbia)
São associações de Estados que se fundam num tratado internacional, em cujos
termos são vertidas as atribuições que lhe são transmitidas e os órgãos que ficam
incumbidos da respectiva prossecução.
- A união real (histórico – Áustria-Hungria)
Mantêm a sua soberania interna, ainda que limitada. Fusão entre o poder
estadual superior com os poderes estaduais subjacentes.
As uniões reais são verdadeiros Estados compostos, criados a partir de um
tratado internacional que integram vários Estados e que, do mesmo passo, absorvem
numa lógica de fusão, alguns dos órgãos dos Estados simples participantes.
- As associações de Estados (Commonwealth, CEI, eventualmente CPLP) – não têm
personalidade jurídica internacional
As associações de Estados fundam-se em pactos constitutivos que reflectem
aspectos da estrutura estadual dos que dela passam a fazer parte. O seu carácter sui
generis pode resultar de diversos aspectos que se deve ponderar:
- o facto de ostentarem esse nome, embora a realidade seja diversa;
- o facto de as atribuições concedidas não serem suficientes para justificar a existência
formal autónoma da estrutura compósito em relação aos Estados que dela fazem parte;
- o facto de o substrato em causa não se revestir de um elemento territorial.
§ a UE (remissão para o estudo do DC)

Instituições não estatais


▪ Santa Sé (órgãos dirigentes da Igreja Católica) ou Igreja Católica. Fins espirituais.
Tem capacidade limitada (ausência de ius belli e ‘neutralização’ nos conflitos
temporais)
É o mais antigo dos sujeitos internacionais não estaduais, caracterizando-se pela
peculiaridade devido à limitação dos seus meios materiais, aos seus fins espirituais e ao
exemplo de vivência inter-geracional.
São três as principais atribuições da Igreja Católica:
- o múnus de ensinar, que se desdobra na pregação da palavra, na actividade missionária
e na educação religiosa;
- o múnus de santificar, que se traduz na administração dos sacramentos e outros actos
de culto divino; e
- o múnus de governar, que se reflecte na emissão de leis e providências para melhor
governar a sociedade eclesial.
No seu âmbito de acção ao abrigo do DI, limita-se ao ius legationis, que exercita
através do estabelecimento de relações diplomáticas com a esmagadora maioria dos
Estados do Mundo, bem como com várias organizações internacionais, e ao ius
tractuum, que executa através da celebração de tratados internacionais com os Estados,
que tomam o nome tradicional de “concordatas”, firmando compromissos de parte a
parte nas matérias da educação e casamento religioso, bem como da liberdade de culto.
▪ Soberana Ordem de Malta (estatuto ambíguo). Fins espirituais e assistenciais
Trata-se de uma instituição cujas raízes históricas se encontram no tempo das
Cruzadas. O seu primeiro propósito foi o hospitalar, contudo, as vicissitudes de luta
religiosa rapidamente a extravasaram para objectivos militares e religiosos, na defesa e
expansão da Cristandade.
A actividade desta instituição tem sido desenvolvida sobretudo no plano
assistencial, realizando nos diversos Estados actividades como transporte de doentes,
ajuda à terceira idade e acções humanitárias internacionais.
▪ Cruz Vermelha Internacional e Crescente Vermelho. Fins humanitários
Encontra-se intimamente ligada com o Dto Internacional Humanitário e apoia-se
em três tipos de estruturas distintas:
- o Comité Internacional da Cruz Vermelha;
- a Federação Internacional das Sociedades da Cruz Vermelha e do Crescente
Vermelho; e
- as Sociedades Nacionais da Cruz Vermelha e do Crescente Vermelho.
A entidade fundadora é o Comité Internacional da Cruz Vermelho, o qual se
submete a sete princípios: humanidade, imparcialidade, neutralidade, independência,
voluntariado, unidade e universalidade. Dirige e coordena toda a acção internacional
humanitária que lhe seja atribuída.
Actualmente, a Cruz Vermelha Portuguesa é uma “pessoa colectiva de Direito
Privado e de utilidade pública administrativa” (art.3º/2 do DL 281/2007), estruturando-
se como “uma instituição humanitária não governamental, de carácter voluntário e de
interesse público, que desenvolve a sua actividade devidamente apoiada pelo Estado, no
respeito pelo Direito Internacional Humanitário, pelos Estatutos do Movimento
Internacional e pela Constituição da Federação da Cruz Vermelha e do Crescente
Vermelho” (art.3º/1 do DL 281/2007).

Organizações internacionais
Associação de sujeitos de DI, constituída mediante tratado segundo o DI, permanente
(não necessariamente sem termo), com vista a prosseguir fins comuns dos seus
membros, previstos no Tratado, dotada de órgãos e de direito próprios. Não tem base
territorial.
§ personalidade jurídica autónoma e capacidade de gozo limitada pelo princípio da
especialidade. O reconhecimento (nas OI universais – declarativo – cf. Parecer TIJ
“Reparações dos Prejuízos”, de 1949; nas restantes a doutrina divide-se).

As organizações internacionais estribam-se numa vontade comum que pretende


instigar a cooperação internacional entre os Estados, mas em que não está presente uma
dimensão territorial que seja determinante na definição do exercício do poder que lhe
foi atribuído, ao mesmo tempo que se diferencia das organizações internacionais não
governamentais, que não ostentam qualquer elemento político.
Quando fundadas pelos Estados, são novas entidades jurídico-internacionais que
desenvolvem atribuições que aqueles lhes transmitiram, por órgãos próprios, com base
num substrato próprio, cada um deles interpretando um interesse distinto dos interesses
estaduais presentes.
São dois os seus elementos fundamentais: um elemento organizacional e um
elemento internacional.
O elemento organizacional atende à formação de uma nova pessoas colectiva, de
substrato associativo e com carácter de permanência, dotada de órgãos próprios que lhe
imputam uma vontade funcional em nome de interesses privados, diversos dos sujeitos
que a promovem.
O elemento internacional chama a atenção para o facto de esta nova entidade ser
regulada pelo DI.
As organizações internacionais são instituídas por um tratado internacional em
que são vertidas as opções fundamentais do novo sujeito internacional.
Não é possível às organizações internacionais viver sem recursos humanos,
sendo estes formados pelo conjunto dos respectivos funcionários internacionais, pessoas
físicas que nelas trabalham e que se diferenciam daqueles que preenchem os respectivos
órgãos, em representação dos respectivos Estados participantes. É-lhes reservado um
estatuto especial, aproximado do estatuto diplomático, nomeadamente em matéria fiscal,
civil e penal.

● Classificações de OI
- Fins – gerais ou especiais (políticos, económicos, militares, etc...)
- Estrutura – intergovernamentais e supranacionais
- Acesso – abertas ou restritas (critérios: geográfico, político, económico, etc…)
- Âmbito geográfico – universais ou para-universais e regionais
- Duração – sem termo e com termo

O indivíduo e outros entes particulares

● O indivíduo.
- a titularidade de direitos com tutela internacional - direito de queixa (Protocolo
Facultativo ao PIDCP; Convenção Americana dos Direitos do Homem) e de acção
jurisdicional (TEDH). O problema, com excepção da CEDH, é o duvidoso efeito directo
(carácter self-executing) das disposições convencionais que consagram direitos
humanos. Em várias instituições internacionais consagra-se o direito de petição.
- a responsabilidade por crimes internacionais – dos Tribunais de Nuremberga e
Tóquio (não internacionais) ao TPI
§ 1. a personalidade internacional é sempre limitada, pois não é um sujeito
activo, criador de DI, mas apenas passivo (titular de direitos e obrigações de DI criado
por outros sujeitos). Não há lugar a reconhecimento.
§ 2. a cidadania da UE. Breve referência com remissão para o DC

Foi a seguir à II Grande Guerra que apareceu a protecção internacional dos


direitos do homem, alçando-se ao plano de DI a defesa das posições jurídicas
subjectivas de cada pessoas humana, contra o Estado e contra todas as outras
manifestações de poder.

● As Organizações Não Governamentais (pessoas colectivas sem fins lucrativos)


- A sua personalidade em rigor é de Direito Privado Interno
- Participam no funcionamento de OI com funções consultivas (art. 71º CNU), como
observadoras, e reconhece-se o direito de apresentação de petições ou de queixa
(CEDH).
Caracterizam-se por uma genuína preocupação de defesa de interesses e valores
claramente desconsiderados ao nível das relações inter-estaduais, não tendo qualquer
finalidade lucrativa.

● As sociedades transnacionais
- A progressiva internacionalização do regime jurídico das suas acções (a acção do
CIRDI e a arbitragem internacional na resolução de conflitos com os Estados)
- Em rigor, continuam a ser sujeitos de direito interno.
Tem uma finalidade lucrativa específica e assumida, fundando-se num substrato
patrimonial, internacionalmente defendendo os seus interesses e pontos de vista.

Tanto as ONG como as sociedades transnacionais usufruem, na esfera internacional, de


direitos de vários tipos:
- direitos de participação em reuniões como observadores;
- direitos de audição, devendo ser consultadas na elaboração de alguma regulamentação
internacional;
- direitos de queixa internacional, no caso de violação dos direitos humanos.

Direitos e deveres fundamentais dos Estados


A soberania internacional dos Estados acarreta consigo um feixe de situações
jurídicas que importa enumerar:
- direitos: a não sujeição orgânica dos Estados e outros sujeitos; a presunção de
regularidade dos respectivos actos; a sua autonomia constitucional na respectiva
organização política;
- deveres: o respeito pelo DI; a proibição de ingerência em assuntos internos; a
proibição do uso da força, excepto em legítima defesa; o dever de cooperação
internacional.

▪ Direitos políticos (art. 2º CNU)


- Igualdade jurídica;
- Independência política
- Integridade territorial

▪ Direitos não políticos (Carta dos Direitos e Deveres Económicos dos Estados)
- Soberania plena e permanente sobre os recursos
- Participar no comércio internacional
- Direito de associação económica
- Direito de beneficiar do aproveitamento dos fundos marinhos (CNUDM)

▪ Deveres políticos (art. 2º CNU)


- Boa fé nas rel. Int.
- Solução pacífica de conflitos
- Abstenção do uso da força
- Dever de assistência às NU
- Dever de não ingerência – o domínio reservado (art. 2º, nº 7)

▪ Deveres não políticos


- dever de cooperação
§ a questão do dever de ingerência humanitária

Bibliografia:
• J. Miranda, ob. cit., pp. 187-230 e 235-247

Sujeitos de DI

Vicissitudes do Estado

§ irrelevância das vicissitudes políticas internas – pr. da continuidade do Estado


• Vicissitudes territoriais (aquisitivas, modificativas ou extintivas)
– Em algumas destas situações coloca-se um problema de sucessão de
Estados.
As vicissitudes podem ser de duas dimensões: políticas e territoriais.
As vicissitudes territoriais corporizam mutações no sistema político dos Estados,
com implicações em cada sistema constitucional. Têm apenas uma projecção sobre o
sistema constitucional dos Estados, mas pode acontecer que essas alterações políticas se
projectem na fisionomia internacional dos Estados, determinando alterações importantes
na sua aparência, podendo diminuir ou aumentar a sua capacidade internacional.
As vicissitudes territoriais designam alterações no elemento territorial que se
modifica total ou parcialmente, interferindo directamente com o respectivo
posicionamento. Divide-se em três categorias:
- vicissitudes aquisitivas;
- vicissitudes modificativas; e
- vicissitudes extintivas.
As vicissitudes aquisitivas apontam para o momento do nascimento do Estado, o
que pode acontecer pelas seguintes vias:
- o nascimento a partir de um processo de secessão, com manutenção do Estado
anterior, surgindo um novo Estado através de um acto de separação territorial;
- o nascimento a partir de um processo de descolonização política, com fundamento
no movimento da descolonização internacional;
- o nascimento por fusão num novo Estado de territórios que pertenciam a outros
Estados, que ao mesmo tempo se dissolvem.
As vicissitudes modificativas modificam territorialmente, podendo concretizar-se
por:
- aquisição de parcelas territoriais, seja por fenómenos naturais ou por actos
jurídicos;
- perda de parte do seu território por cataclismos naturais;
- cessação parcial voluntária.
Nas vicissitudes extintivas dá-se o desaparecimento do Estado, podendo ser por:
- desaparecimento do seu território, como foi o caso da Atlântida;
- secessão extintiva, quando o Estado se desagrega;
- usucapião, quando a posse sobre território alheio, sem que seja contestada, se
convola em direito de soberania territorial;
- decisão unilateral de um governo de facto ou de uma organização internacional.

• A sucessão de Estados – substituição de um Estado por outro na


responsabilidade das relações internacionais de um território - art. 2º da CV
sobre a sucessão de Estados em matéria de Tratados (CVSET), de 1978; art. 2º
da CV sobre a sucessão de Estados em relação à propriedade pública, aos
arquivos e à dívida, de 1983 (não vigente)
– Formas:
• fusão (RFA e RDA);
• desmembramento com criação de novos Estados
(Checoslováquia);
• desmembramento do território e a sua inclusão no território de
outros Estados já existentes;
• secessão de partes do território que formam novos Estados
(Jugoslávia , com a independência da Eslovénia e Croácia;
Kosovo actual com a declaração da independência);

• Em relação a Tratados:
– que regulam situações objectivas territoriais (fronteiras, etc.) – pr. da
continuidade (art. 11º CVSET)
– Tratados que prevêem a sucessão – faculdade ou aceitação do Estado
sucessor (art. 10º CVSET)

• Distinções relevantes (princípios gerais)


– Integração de um território na esfera territorial de um Estado (RDA
na RFA) – aplicação imediata dos Tratados que vinculam o Estado
sucessor (art. 15º CVSET)
– Estados de recente independência (Estados fruto da descolonização) –
faculdade de sucessão nos Tratados multilaterais, excepto se forem
‘intuito personae’ (arts. 16º e 17º CVSET); nos tratados bilaterais tem de
haver acordo recíproco expresso ou tácito e deixa de ser parte o Estado
predecessor (arts. 24º e 25º CVSET). § há diversas especialidades
relativas à aplicação provisória, a reservas, etc.
– Unificação de Estados – todos os tratados em vigor em relação a
qualquer deles continuarão em vigor (art. 31º CVSET), excepto se forem
‘intuito personae’. § há diversas especialidades na extensão territorial, a
reservas, etc.
– Separação de territórios para formar novos Estados – pr. da
continuidade, excepto por acordo dos interessados ou tratado ‘intuito
personae’ (art. 34º CVSET). No caso do Estado predecessor continuar a
existir continua a ser parte nos Tratados, excepto por acordo dos
interessados, quando o tratado só dissesse respeito ao território que se
separa ou no caso de tratado ‘intuito personae’. § há especialidades
diversas (reservas, etc)

• Sucessão de propriedade pública, arquivos e dívidas:


– Direitos, incluindo a propriedade – transmissão do predecessor para o
sucessor na data da sucessão sem compensação (arts. 9º, 10º e 11º
CVPAD)
• Dever ser regulada a transmissão por acordo. Na ausência deste,
os imóveis transmitem-se e os móveis relacionados como a
actividade de governação do território também (art. 14º CVPAD)
• Há especialidades para os Estados sucessores fruto de
descolonização (art. 15º CVPAD), em especial tendo em conta o
princípio da soberania permanente sobre os recursos
• Há especialidades também quando o Estado predecessor se
extingue para dar lugar a vários (é relevante o local e a afectação
dos bens e pode haver uma compensação equitativa entre os
Estados sucessores – art. 18º CVPAD)

– Arquivos – a transmissão não dá lugar a compensação (art. 23º CVPAD)


Princípios gerais:
• Aplicação supletiva afastada por acordo das partes (art. 27º, nº 1)
• Salvaguarda-se o respeito pela integralidade das partes dos
arquivos (art. 25º CVPAD)
• Distingue-se entre as partes relativas à administração normal do
território do Estado sucessor e os que digam respeito exclusiva ou
principalmente a esse território – transferem-se (art. 27º, nº 2, als.
a) e b)
• Os títulos e outros elementos probatórios relativos ao território ou
às fronteiras devem ser disponibilizados pelo Estado predecessor
ao sucessor (art 27º, nº 3)
• Cópias relativas a arquivos relacionados com interesse do
território separado devem ser disponibilizadas pelo Estado
predecessor (art. 27º, nº 4)

§ Há disposições especiais para as várias formas de sucessão de Estados (arts. 28º, 29º,
30º, 31º).

- Dívidas para com outros Estados, OI ou outros sujeitos de DI


- Pr. gerais – não afectação dos direitos e obrigações dos credores
(art. 36º); a questão deve ser solucionada por acordo entre Estado
predecessor e sucessor (art. 37º, nº 1); na falta de acordo a dívida
transmite-se numa proporção equitativa, tendo em consideração a
propriedade, os direitos e interesses transmitidos (art. 37º, nº 2)
- Há disposições especiais relativas aos Estados fruto de
descolonização, que sujeita a transmissão a um acordo e
salvaguardando especificamente o equilíbrio económico
fundamental (art. 38º)
- Na unificação de Estados a sucessão é plena (art. 39º)
- Na separação de partes do território, caso não haja acordo, há
uma transmissão equitativa, tendo em conta o ‘activo’ transmitido
(art. 40º). O mesmo ocorre na dissolução (art. 41º)

- Efeitos pessoais da sucessão dos Estados – a questão da nacionalidade


- Prs. fundamentais – toda a pessoa tem direito a uma nacionalidade (art.
15º, nº 1 DUDH); no caso a uma das nacionalidades em causa (art. 1º da
Res. 55/153 AG NU); deve considerar-se a vontade da pessoa (arts. 11º e
23º); há uma presunção fundada na residência (arts. 5º e 22º)
§ para prevenir a apatridia em virtude da sucessão de Estados há uma convenção do
Conselho da Europa na matéria, de 2006. Ainda não entrou em vigor.

Domínios Interno e Internacional

Domínios internos
• Território – superfície terrestre lato sensu, mar territorial e espaço aéreo. Está
sob a soberania do Estado, isto é sob a exclusividade, plenitude e autonomia de
jurisdição do Estado sobre o território e as pessoas que nele se encontram.
Fronteira – limite exterior de um território. Delimitação – processo jurídico de
determinação dos limites do território. Demarcação - processo técnico de
concretização dos limites.
– Superfície terrestre lato sensu – solo, subsolo, águas interiores (rios,
lagos, baías, etc.) situadas aquém da linha de base do mar territorial.
Relevância internacional: tradicionalmente nenhuma (não há direito de
passagem inofensiva, com a excepção do art. 8º, nº 2 CDM); o problema
das baías históricas (art. 10º CDM)
– Mar territorial – extensão até 12 milhas marítimas a partir do ponto
mais baixo da baixa-mar. A soberania abrange o leito e o subsolo. Há
uma restrição à plena soberania do Estado: o direito de passagem
inofensiva (arts. 17º a 32º)
– Espaço aéreo – a coluna de ar situada sobre a superfície terrestre e o mar
territorial. O limite superior é o espaço extra-atmosférico, cujos critérios
não estão perfeitamente determinados. Embora haja uma soberania plena
– art. 1º CCACI (não há direito de passagem inofensiva idêntico ao do
mar territorial – o Estado pode impor a aterragem – art. 5º CCACI, etc.),
é um domínio exaustivamente regulado por convenções internacionais
em matéria de navegação (com diversos direitos: sobrevoo, escala
técnica, etc).

– § salienta-se aqui o pr. da soberania sobre os recursos consagrada na


Carta dos Direitos e Deveres Fundamentais dos Estados (Res.
3281(XXIV) AG NU , 1974).
– Contudo, há deveres resultantes do DI que condicionam e restringem a
plena jurisdição do Estado sobre o seu território (por ex. dever de
proteger e preservar o meio marinho (art. 193º CDM)

• Aplicação extraterritorial do direito estadual – no interior dos edifícios


diplomáticos e consulares e sobre o pessoal a eles afecto; sobre os navios e
aeronaves aí matriculados no Estado

• Domínios de extensão da jurisdição estadual

– Zona contígua – extensão marítima contígua ao mar territorial até 24


milhas da linha de base do mar territorial (em princípio a linha da baixa
mar) – art. 33º CDM. A jurisdição do Estado consiste na possibilidade de
fiscalização com vista a evitar as infracções às normas aduaneiras,
fiscais, de emigração ou sanitárias no seu território ou no seu mar
territorial, ou a reprimir as infracções às normas vigentes no seu
território ou no seu mar territorial

– Plataforma continental – extensão do prolongamento natural do seu


território terrestre até ao bordo exterior da sua margem continental, no
máximo de 350 milhas – art. 76º CDM (i.e. do prolongamento submerso
da massa terrestre do Estado costeiro e é constituída pelo leito e subsolo,
pelo talude e pelas elevações continentais; exclui os grandes fundos e as
cristas oceânicos e o respectivo subsolo), ou até às duzentas milhas da
linha de base do mar territorial. O Estado costeiro tem o direito de
exploração exclusiva dos seus recursos minerais e outros recursos não
vivos do leito do mar e de subsolo, bem como dos organismos vivos
sedentários (art. 77º CDM). Sobre os recursos não vivos explorados além
das 200 milhas o Estado tem de pagar contribuições em espécie à
Autoridade. Não tem qualquer jurisdição exclusiva sobre as águas ou o
espaço aéreo sobreadjacentes (art. 78º CDM), mas pode construir aí ilhas
artificiais e outras estruturas com fins económicos e outros (art. 80º
CDM)

– ZEE – espaço adjacente além do mar territorial até às 200 milhas da


linha de base do mar territorial (art. 57º CDM). Os direitos do Estado
compreendem a exploração e aproveitamento de todos os recursos
naturais, vivos ou não vivos, das águas sobreadjacentes ao leito do mar,
do leito do mar e seu subsolo e a exploração do seus elementos para fins
económicos como a exploração da energia a partir da água, das correntes
e dos ventos. Compreende ainda o direito de colocar e utilizar ilhas e
outras estruturas artificiais e a jurisdição sobre a investigação científica e
a protecção e preservação do meio marinho (arts. 56º e 60ºCDM). Prevê-
se a consideração especial dos interesses dos Estados sem litoral (art. 69º
CDM) e dos Estados geograficamente desfavorecidos (art. 70º CDM).

Domínios internacionais

• Espaço aéreo internacional - coluna de ar situada para além do mar territorial.


O pr. fundamental é a utilização livre, mas há convenções que regulam a
navegação aérea

• O espaço exterior – toda a realidade física que se encontra para além dos
espaços definidos. Aplica-se-lhe o regime do DI. Os prs. fundamentais são:
utilização pacífica, liberdade de utilização; salvaguarda dos interesses de toda a
humanidade.

• Alto mar – definido por exclusão de partes (art. 86º CDM). O pr. fundamental é
o da liberdade de utilização por todos os Estados, para os mais diversos fins
desde que pacíficos (arts. 87º e 88º CDM). § o direito de visita (art. 110º CDM)
e o direito de hot pursuit (art. 111º CDM). Há um dever de cooperação em
diversas matérias, nomeadamente para a conservação e gestão dos recursos
vivos.

• Área – espaço constituído pelo leito do mar e o seu subsolo além dos limites das
jurisdições estaduais. A área e os respectivos recursos são património comum da
humanidade (art. 13º CDM), tendo sido criada uma Autoridade (OI) que exerce
os respectivos direitos (art. 137º). A sua utilização, que só pode ser pacífica,
deve fazer-se tendo em consideração os interesses da humanidade em geral, em
especial dos Estados e povos menos desenvolvidos (arts. 140º e 141º)

• Antárctida – o Tratado de Washington de 1959 determina a sua utilização livre,


consagra a sua desmilitarização e a proibição de deposição de resíduos
radioactivos. O seu estatuto jurídico definitivo não está fixado, havendo alguns
estados vizinhos que têm reivindicações territoriais.

§ estatuto jurídico destes espaços: res nullius, res communis omnium ou


domínio público da comunidade internacional (propendemos para uma das
duas últimas soluções, embora em relação à Área e ao Espaço exterior
considerá-la como património da Humanidade encontre uma base legal,
elevando assim a Humanidade a sujeito de DI. Em relação à Antárctida a
situação não é clara.

ONU

• Fins (art. 1º CNU):


– Manutenção da paz e segurança internacionais, evitando e reprimindo as
violações do DI;
– Promoção de relações amistosas entre as nações, ou seja, cooperação
internacional;
– Promoção da cooperação internacional nos mais diversos domínios
(económico, social, cultural e humanitário), salientando-se os direitos
humanos e as liberdades fundamentais, ou seja, o desenvolvimento
económico e social entre os Estados e os novos sujeitos de DI;
– Codificação do DI.

• Princípios fundamentais (art. 2º CNU):


– Igualdade soberana dos Estados-membros;
– Boa fé no cumprimento das obrigações assumidas;
– Resolução pacífica dos litígios internacionais;
– Interdição do uso da força nas relações internacionais;
– Cooperação na consecução de medidas para garantir a paz e a segurnaça
internacionais;
– Jurisdição erga omnes das NU;
– Respeito do domínio reservado dos Estados;
– Extensão das obrigações da CNU aos Estados que dela não façam parte.

• Membros: só Estados (originários – art. 3; admitidos –art. 4º) – são 192


– Admissão: requisitos (substanciais – art. 4º, nº 1; procedimentais –
deliberação da AG (por 2/3 – art. 18º, nº 2) com base numa
recomendação do CS
– Suspensão (art. 5º): Estado objecto de uma medida preventiva ou
repressiva do CS, por deliberação da AG (2/3), sobre recomendação do
CS. O CS pode pôr termo à suspensão. Prevê-se também a suspensão do
voto na AG quando esteja em falta nas suas contribuições (art. 19º)
– Expulsão (art. 6º): Estado que viole persistentemente os princípios da
Carta, por deliberação da AG (2/3) sobre recomendação do CS.
Os membros da ONU podem ser susceptíveis de duas categorias:
- os Estados membros originários ou fundadores: aqueles que, tendo estado
presentes na Conferência de São Francisco ou tendo previamente assinado a Declaração
das Nações Unidas de 1 de Janeiro de 1942, assinaram a CNU e ratificaram-na (art.3º da
CNU);
- os Estados membros supervenientes ou admitidos: aqueles que integraram
posteriormente a CNU, desde que sejam “amantes da paz” e “aceitem as obrigações
contidas da presente Carta e que, a juízo da Organização, estiverem aptos e dispostos a
cumprir tais obrigações.” (art.4º/1 CNU).
São também incluídas certas limitações à entrada de membros na ONU, seja
por circunstancialismos históricos (os que eram considerados inimigos das Nações
Unidas), seja por via de outras limitações, como é o caso dos Estados exíguos.
A admissão dos Estados membros opera-se por deliberação da Assembleia
Geral (art.4º/2 da CNU).
O vínculo de pertença à ONU pode ser enfraquecido ou sofrer mesmo de
uma ruptura, através de:
- suspensão: um Estado membro pode ser suspenso da Assembleia Geral
(AG) por deliberação desta, sob recomendação do Conselho de Segurança (art.5º da
CNU);
- a expulsão, caso o Estado membro tenha “violado persistentemente os
princípios contidos na presente Carta pela Assembleia Geral, mediante recomendação
do Conselho de Segurança” (art.6º da CNU);
- a retirada, que apesar de não se encontrar directamente prevista, é de crer
que há o direito de os Estados saíram da ONU, desde que para o efeito formulem um
pré-aviso num tempo razoável e tenham saldado todas as suas responsabilidades
financeiras.

• Observadores – há diversas entidades e OI com estatuto de observadores

• Órgãos (art. 7º): AG, CS, CES, TIJ e Secretário-Geral (o Conselho de Tutela já
caducou)
Quanto à estrutura governativa (descrita no Cap. III da CNU), os órgãos da ONu
podem distinguir-se entre órgãos principais, onde se incluem a Assembleia Geral, o
Conselho de Segurança, o Conselho Económico e Social, o Conselho de Tutela, o
Tribunal Internacional de Justiça e o Secretariado (art.7º da CNU), e órgãos
subsidiários, que não são directamente definidos e apenas implicam o exercício de uma
vontade subordinada àquilo que estiver na génese da respectiva criação. São órgãos
subsidiários a CDI, o Alto Comissário para os Refugiados e o Conselho de Direitos do
Homem, junto da Assembleia Geral.
– Assembleia Geral – universalidade – art. 9º, nº 1; igualdade – art. 18º, nº
1
• Atribuições:
– políticas genéricas – arts. 10º e 13º - em relação às quais
pode adoptar recomendações (art. 14º). Em matéria de
manutenção da paz e segurança internacionais a sua
competência (excepto relativa a princípios gerais – art.
11º, nº 1), é subsidiária (art. 11, nº 2), não podendo
mesmo fazer qualquer recomendação quando o CS esteja
a exercer em concreto as suas funções específicas na
matéria (art. 12º)
§ de acordo com a Resolução 377(V) ‘Unidos para a Paz’, de Nov. 1950, a
AG pode ultrapassar a limitação acima referida em caso de ameaça à paz,
violação da paz ou agressão e em que o CS se manifeste incapaz de agir,
devido ao voto negativo de um membro permanente (que pode ir nos dois
últimos casos à recomendação do uso da força)
– controlo político sobre os outros órgãos – art. 15º
– competências específicas – orçamental (art. 17º); eleição
dos membros não permanentes do CS (art. 23º, nº 1);
admissão, suspensão e exclusão de membros (arts. 4º, 5º e
6º); eleição dos membros do CES (art. 61º); aprovação
dos acordos do CES com organizações especializadas (art.
63º); pedir pareceres e autorizar o seu pedido por outros
órgãos (art. 96º); definir o regime dos funcionários (art.
101º, nº 1); aprovar emendas à Carta (art. 108º); eleger em
conjunto com o CS os juízes do TIJ (art. 4º ETIJ)
§ tem desempenhado um importante papel na promoção da codificação do
DI
• Deliberação (se não for pedido o voto registado, só é indicado o
número global dos sentidos de votação)
– Questões importantes (2/3 dos presente e votantes) – art.
18º, nº 2 (inclui um elenco não exaustivo de ‘questões
importantes’)
– Outras questões (maioria dos presentes e votantes); aqui
se inclui a decisão de submeter outras questões a uma
maioria de 2/3 (o que sucedeu em relação à orientação
sobre a reforma do CS – Res. 53/30). Representa uma
minoria das resoluções.
§ há alguns anos que se desenvolve um esforço especial para alcançar
decisões por consenso, sendo a maioria das resoluções adoptadas sem
votação

– AG – reuniões:
• Em plenário ou em comissão
• Em sessões anuais regulares (Setembro a Dezembro) ou especiais
(art. 20º), incluindo de emergência (a pedido do SG, de 7 do CS
ou maioria da AG)
• Órgãos subsidiários (há vários comités, comissões e grupos de
trabalho).

A AG é o órgão representativo de todos os Estados membros, que dela


fazem parte num plano de estrita igualdade (art.9º/1 e 18º/1 da CNU). Funciona em
plenário, que tem lugar uma vez por ano no Outono, desdobrando-se em diversas
comissões especializadas: comissão política, comissão de assuntos económicos,
comissão de assuntos sociais, humanitários e culturais; comissão de assuntos de tutela;
comissão de assuntos administrativos e financeiros; comissão jurídica e comissão de
política especial.
As competências da Assembleia Geral são de diversa índole, cruzando-se o
critério do tipo de vinculação das respectivas deliberações, se meramente
recomendatórias, ou se vinculativas, e o critério quanto à natureza das matérias sobre
que pode incidir para se chegar à seguinte trilogia de competências (arts.10 e ss da
CNU):
- uma competência recomendatória genérica, competindo-lhe discutir todas
as matérias que se inscrevam nas finalidades da ONU, excepto quaisquer reservas
definidas para outros órgãos;
- uma competência decisória específica e reservada nas matérias
consideradas importantes: a admissão de novos membros e respectiva exclusão e
suspensão, alteração da CNU, a aprovação do orçamento ou a eleição de membros de
outros órgãos;
- uma competência decisória substitutiva.
As deliberações da AG, quando não seja adoptado o consenso, são obtidas
por maioria de dois terços presentes e votantes no caso de serem consideradas
importantes, ou por maioria relativa dos membros presentes e votantes, no caso de não o
serem (art.18º da CNU).
São consideradas questões importantes pelo texto da CNU:
- as recomendações sobre a manutenção das paz e segurança internacionais;
- a eleição dos membros não permanentes do Conselho de Segurança;
- a eleição dos membros do Conselho Económico e Social;
- a eleição dos membros do Conselho de Tutela;
- a admissão de novos membros da Organização;
- a suspensão de direitos e privilégios de membros;
- a expulsão de membros;
- as questões atinentes ao funcionamento do regime de tutela;
- as questões orçamentais.

– Conselho de Segurança
• Atribuição principal – manutenção da paz e segurança
internacionais que age em nome dos EM (art. 24º, nº 1), incluindo
envolvendo Estados não membros (arts. 31º, 32º, 33º, nº 2
– Competências:
» Estabelecimento de planos de regulamentação de
armamentos (art. 26º)
» Intervenção, convidando as partes num conflito
que possa vir a constituir uma ameaça à paz e à
segurança internacionais, a resolvê-lo através dos
meios do 33º
» Investigação sobre qualquer situação que possa
constituir uma ameaça à paz e segurança
internacionais (art. 34º)
» Formular recomendações sobre procedimentos ou
métodos de solução, por sua iniciativa (art. 36º),
por iniciativa de qualquer membro das NU (art.
35º), ou após submissão das partes (arts. 37º e
38º), a qual é obrigatória na impossibilidade de
resolução pelos meios do 33º.
» Determinar a existência de qualquer ameaça à paz,
violação da paz ou acto de agressão e formular
recomendações a esse respeito (art. 39º). Pode
ainda convidar as partes a aceitar medidas
provisórias (art. 40º)
» Aplicar sanções não militares (art. 41º)
» Adoptar acções militares (art. 42º)
• Outras Atribuições – eleger, em conjunto com a AG os juízes
do TIJ (art. 4º ETIJ); recomendar a admissão de novos membros,
a suspensão (e levantá-la) e expulsão de membros (arts. 4º e 5º);
recomendar à AG o Secretário-Geral a eleger (art. 97º)
§ 1. As decisões do CS que não sejam recomendações ou ‘convites’ são obrigatórias
para os EM (art. 25º)
§ 2. A execução das decisões do CS em matéria de manutenção da paz e segurança
internacionais cabe a todos ou a alguns membros, de acordo com a deliberação do CS
(art. 48º, nº 1) e será cumprida directamente por estes ou por organismos de que sejam
membros – ex. EU, CE (art. 48º, nº 2). Para levar a cabo medidas de natureza militar, os
EM têm obrigação de lhe prestar assistência e disponibilizar meios (arts. 43º e 45º), o
que poderá passar pela celebração de acordos (art. 43º, nº 3)
• Membros – 15 EM, entre os quais 5 permanentes expressamente
indicados (art. 23º, nº 1); os 10 restantes são eleitos pela AG para
um mandato de 2 anos (art. 23º, nºs 1 e 2)

• Deliberações:
– Cada membro tem um voto (art. 27º, nº 1)
– As ‘questões processuais’ são decididas por uma maioria
de 9 votos favoráveis (art. 27º, nº 2)
– As ‘questões não processuais’ entre os 9 votos têm de se
incluir os votos favoráveis dos membros permanentes
(direito de veto); a parte num conflito deve abster-se – art.
27º, nº 3 (um costume contra tractum consagrou a
orientação de que uma abstenção de um membro
permanente não impede a deliberação)
§ o duplo veto – a determinação do carácter processual ou não processual de uma
questão considera-se uma questão não processual, pelo que fica sujeita ao veto dos
membros permanentes
• Funcionamento:
– Permanente (art. 28º, nº 1)
– Órgãos subsidiários - art. 29º (tem diversos comités)

O Conselho de Segurança é um órgão colegial, restrito e de tipo governativo,


funcionando em permanência de funções, sendo composto por 15 Estados membros,
dentro dos quais há cinco com lugar permanente: China, França, Rússia, Reino Unido
da Grã-Bretanha e Irlanda do Norte e os Estados Unidos da América.
As suas competências centram-se essencialmente nas questões ligadas às
atribuições da ONU na manutenção da paz e segurança internacionais, e na propulsão
procedimental, como sucede em relação à admissão de novos membros, à escolha de
membros dos diversos órgãos e à revisão da CNU.
O procedimento decisório encontra-se distribuído por dois possíveis esquemas:
- questões de natureza procedimental: vigora a regra da maioria agravada de 9
votos afirmativos:
- questões de natureza não procedimental, incluindo a determinação da natureza
procedimental ou não da questão: aplica-se a regra da maioria agravada de 9 votos a
favor, neles necessariamente se incluindo os votos dos membros permanentes.
Os Estados membros da ONU que sejam membros permanentes do Conselho de
Segurança têm uma posição privilegiada, possuindo um “duplo” poder de veto: um
poder de veto na qualificação de certa questão como não sendo procedimental e depois
na decisão de fundo, opondo-se à respectiva aprovação (art.27º/3 da CNU).

– Conselho Económico e Social


• Atribuições (art. 62º): desenvolver iniciativas nos mais diversos
domínios económicos, sociais e técnicos, bem como em matéria
de direitos humanos e liberdades, que podem passar por estudos,
recomendações, preparação de convenções, etc.
– Age em estreita conexão com organizações e agências
especializadas, particularmente aquelas que estão
vinculadas às NU (arts. 57º, 58º e 63º). O seu conjunto
constitui a ‘família das NU’
• Membros: 54 EM eleitos pela AG, com um mandato de 3 anos
(eleição anual de 1/3)
• Deliberação: cada membro tem um voto e as deliberações são por
maioria dos membros presentes e votantes (art. 67º)

O Conselho Económico e Social é um órgão consultivo nos “assuntos


internacionais de carácter económico, social, cultural, educacional, de saúde e conexos,
e poderá fazer recomendações a respeito de tais assuntos à Assembleia Geral, aos
membros das Nações Unidas e às organizações especializadas” (art. 62º/1 da CNU).
É um órgão colegial composto por 54 membros, eleitos pela Assembleia Geral
para um mandato de três anos, todos os anos renovado num terço (art. 61 da CNU).
Quanto ao seu carácter consultivo, pode agir de várias formas:
- fazer recomendações aos órgãos competentes para deliberar;
-preparar projectos de tratados internacionais e organizar conferências
internacionais;
- elaborar estudos e relatórios sobre matérias que o requeiram;
- solicitar as informações que considerar pertinentes a outras instâncias, dentro e
fora da ONU.
O Conselho Económico e Social pode funcionar tanto em plenário como através
de comissões especializadas, duas delas sendo tipificadas na própria CNU: assuntos
económicos e sociais e protecção dos direitos do homem (art.68º da CNU). As suas
deliberações são genericamente tomadas por maioria relativa dos membros presentes e
votantes, dispondo cada Estado de um voto (art.67º da CNU).

– Secretário-Geral – designado pela AG mediante recomendação do CS


(art. 97º)
• Participa em todas as reuniões da AG, do CS e do CES
• Explicitamente tem funções administrativas (art. 97º), mas
desempenha poderes políticos e diplomáticos importantes para
além do alerta ao CS em matéria de manutenção da paz e
segurança internacionais (art. 99º), nomeadamente
desenvolvendo esforços de mediação (‘bons ofícios’ - 103 até
1995), por designação do CS, e como responsável pelas missões
de paz (remissão).
• As suas atribuições são internacionais e independentes (art. 100º)

O Secretariado da ONU é o aparelho burocrático da Organização e é composto


pelo Secretário-Geral e por outro pessoal de onde se destacam os secretários-gerais
adjuntos (art.97º da CNU).
O Secretário-Geral é eleito pelo Assembleia Geral para um mandato de cinco
anos sob recomendação do Conselho de Segurança.
As competências do Secretariado são de natureza administrativa, executando as
deliberações tomadas pelos outros órgãos, podendo ainda exercer competências de
influência e de sugestão.

– TIJ – principal órgão judiciário das NU


• Membros do TIJ – todos os EM das NU são parte no ETIJ anexo
à CNU – art. 93º CNU (outros podem ser parte nos termos da
Res. 91(I) AG, de 1946 – actualmente não se aplica)
• Competências:
– contenciosas em litígios entre Estados (art. 94º CNU e
34º, nº 1 ETIJ). Não tem jurisdição obrigatória (art. 95º
CNU e 36º e 37º ETIJ)
» A competência pode ser obrigatória quando
prevista em Tratados de que os Estados sejam
parte em relação aos litígios relativos a esses
Tratados (36º, nº 1, 2ª parte ETIJ)
» A competência pode resultar da Declaração
prevista na ‘cláusula facultativa de jurisdição
obrigatória’ (art. 36º, nº 2 ETIJ)
» A competência pode ser objecto de um acordo ad
hoc (art. 36º, nº 1, 1ª parte)
– consultivas (art. 96º) a pedido do CS e da AG (em
qualquer questão jurídica (nº 1); a pedido de outras
organizações especializadas, mediante autorização da AG,
em questões jurídicas da sua esfera de actividade (nº 2)

– TIJ
• Funcionamento – em plenário ou em câmara (excepcional) - arts.
25º e 26º ETIJ
• Os acórdãos em litígios são obrigatórios para as partes,
definitivos e inapeláveis (art. 94º, nº 1 CNU e 59º e 60º ETIJ),
podendo o CS ser chamado a intervir em caso de incumprimento
(art. 94º, nº 2 CNU)
• Composição do TIJ – 15 juízes eleitos, para um mandato de 9
anos, pelo CS e AG (arts. 3º e 4º ETIJ) a partir de uma lista
elaborada pelo SG (art. 7º ETIJ). § o juiz ad hoc (art. 31º, nº 2 e 3
ETIJ)

A garantia do DI
A responsabilidade internacional por actos ilícitos

§ a ilicitude internacional: enquadramento dogmático específico que não se pode


reconduzir aos quadros dogmáticos nacionais – ‘responsabilidade pública’ sui generis

• Consequências da ilicitude
– A invalidade do acto jurídico internacional viciado – v.g.- CVDT (parte
V); e/ou
– A responsabilidade do sujeito (Estado, OI, outros. § em especial a
responsabilidade penal e civil dos indivíduos – ERTPI e Convenção
contra a tortura…)

• Responsabilidade internacional do Estado por factos ilícitos internacionais –


Projecto de artigos da CDI de 2001 (em anexo à Res. AG 56/83, de 2001
§ o pr. Lex specialis derogat lex generalis – art. 55º. As lacunas – art. 56º
– Pressupostos:
1. (F)Acto (‘conduta’ voluntária: acção ou omissão juridicamente
relevante – art. 2º)
2. Ilícito (contrária ao DI vigente, qualquer que ele seja – arts. 2º,
b), 3º e 12º. Não releva a sua licitude interna – arts. 13º e 32º). § a
violação ‘grave’ de ius cojens – art. 40º. O art. 41º estabelece
obrigações para todos os Estados.
3. Imputável ao Estado directa ou indirectamente (praticado por
órgão ou agente em qualquer das suas funções, desde que tenha
uma projecção internacional – arts. 2º, a), 4º a 11º). A
irrelevância abstracta da intenção (possível relevância concreta)
e, em geral, da culpa
4. Dano - lesão de direitos ou interesses tutelados de outro sujeito
de DI ou da comunidade internacional – art. 33º. Só relevam os
danos directos e relevam os mediatos (sofridos pelos nacionais do
Estado). – art. 31º
5. Nexo de causalidade (relação causal determinante entre a
conduta e o prejuízo)

- Consequências da ilicitude: continuação da obrigação (art. 29º), obrigação de


cessação da conduta ilícita e garantia de não repetição (art. 30º) e responsabilidade
- Conteúdo da responsabilidade: situação jurídica passiva que consiste
na obrigação de reparação de todos os danos, reconstituindo a situação
hipoteticamente existente – art. 31º. Não tem carácter punitivo.
Formas de reparação (art. 34º):
- Reconstituição natural (restitutio in integrum: limite – 35º).
Pode ser jurídica – anulação ou revogação do acto jurídico.
- Compensação (danos emergentes patrimoniais e não
patrimoniais e lucros cessantes – art. 36)
- Satisfação (só danos morais – a ofensa à honra do Estado: o
reconhecimento da violação, o pedido de desculpas, etc. - art.
37º). Pode ser complementar das outras.
§ em relação às vítimas de violações flagrantes do DI dos Direitos Humanos e de
violações graves do direito humanitário, a AG adoptou a Res. 60/147, de 2006,
consagrando princípios gerais e directrizes na matéria.

– Efectivação da responsabilidade:
§ 1. sujeitos lesados – pode ser um Estado (art. 42º), vários Estados (art. 46º) e/ou a
comunidade internacional (art. 48)
• Estado lesado – aquele em relação ao qual a obrigação era
devida, individual ou em conjunto com outros Estados, ou, no
caso de uma obrigação devida à comunidade internacional, a
respectiva obrigação o afecta especialmente ou altera o carácter
da obrigação geral (art. 42º)
• Pluralidade de lesados – art. 46º
• Invocação da responsabilidade por Estados não lesados – art. 48º
(obrigação devida a um grupo de Estados ou à comunidade
internacional – nº 1). Pode solicitar a cessação da conduta
violadora, o cumprimento da reparação aos lesados. Pode ainda
adoptar as medidas ‘legais’ admitidas no 54º.
§ 2. Pluralidade de infractores – art. 47º. Responsabilidade individual de cada Estado
pelo acto. Não há ‘litisconsórcio’ necessário (cf. Ac TIJ, Nauru vs Austrália, ‘Certain
Phosphate lands’), mas a responsabilidade pode ser solidária (nº 2)
§ 3. o pedido de responsabilização tem de ser intencional e específico (não basta um
Protesto). Exige-se uma notificação do Estado (art. 43º, nº 1), apresentando uma
reclamação, referindo a situação que entende ser violadora do DI e requerendo medidas
que lhe ponham termo e reparem os danos . Pode indicar as medidas e a forma de
reparação que entende adequadas (nº 2). Não tem de assumir nenhuma forma especial.
§ 4. Podem existir procedimentos especiais a respeitar – art. 44º. Em especial a
necessidade de exaustão dos recursos internos (v.g. art. 295º CDM).
§ 5. Renúncia à reparação – art. 45º (expressa ou tácita)
§ 6. Meios de resolução do conflito (remissão)

– Causas de exclusão da ilicitude (arts. 20º a 27º)


• Consentimento do lesado – art. 20º (não contra ius cojens)
• Legítima defesa – art. 21º (exclui-se para algumas obrigações –
direito humanitário). Há limites à legítima defesa (cf. Parecer
sobre licitude do uso de armas nucleares) e requisitos. Remissão
• Contra-medidas (distinção da retorsão e das represálias)– art.
22º. Requisitos gerais e limites – art. 50º, proporcionalidade
(51º), carácter temporário e reversibilidade (arts.49º, nº 2 e 3 e
53º). Requisitos procedimentais – art. 52º. § as contra-medidas
nas violações do 48º (direitos colectivos ou da comunidade
internacional) – art. 54º (dúvidas do seu alcance – lawful
measures)
• Força maior – art. 23º (a conduta é involuntária ou não podia ser
outra). A causa tem de ser irresistível, imprevista, tornando
impossível o cumprimento (pode ser natural ou humana).
• ‘Distress’ (‘perigo extremo’) – art. 24º. O autor (indivíduo) do
acto não dispunha de outra alternativa razoável para salvar a sua
vida ou a de pessoas ao seu cuidado.
• Estado de necessidade – art. 25º. Conflito irreconciliável entre
um interesse essencial e a obrigação do Estado; perigo grave e
iminente; o comportamento ilícito é a única alternativa para
proteger o interesse essencial; não violação de um bem maior
§ a exclusão da ilicitude não exclui a obrigação de compensação pelos prejuízos
causados – art. 27º, b)

A responsabilidade internacional do Estado por factos lícitos

• A responsabilidade pelo risco em actividades não proibidas pelo DI


(independente de culpa)
• A Declaração do Rio de 1992 (princípios 13 e 16)
• Projecto de artigos da CDI sobre ‘Prevenção dos Danos
transnacionais causados por Actividades Perigosas’, 2001
• Projecto de artigos da CDI sobre ‘Imputação de prejuízos
resultantes de Danos transnacionais causados por Actividades
Perigosas’, 2006
• Há convenções em domínios específicos (v.g. transporte de
resíduos perigosos)

§ Está em preparação na CDI um projecto de artigos relativo à responsabilidade das OI

Meios de resolução de conflitos entre Estados


• Os conflitos podem ser de natureza:
– Política (em sentido amplo)
– Jurídica – art. 36º, nº 3 ETIJ. Neste caso é proeminente o papel atribuído
ao TIJ como o meio de resolução do conflito (art. 36º, nº 3 CNU)
§ frequentemente têm natureza mista.

• O seu âmbito pode ser:


– Interestadual (tipo mais frequente durante a guerra-fria)
– Intraestadual (tipo mais frequente após a guerra-fria). Estes
frequentemente têm carácter étnico ou religioso e a sua resolução é
especialmente difícil.

• é imperativa a resolução pacífica – art. 2º, nºs 3 e 4 CNU. O art. 38º prevê a
intervenção do CS a pedido das partes.

• Meios de resolução pacífica – art. 33º CNU (elenco não exaustivo):


1. Meios não jurisdicionais (político-diplomáticos):
§ objectivos: limitar a expansão ou a escalada do conflito; rápida resolução do conflito;
minimizar o sofrimento humano associado ao conflito; garantir a prevalência do DI;
promover a melhoria das relações no futuro
– Inquérito – intervenção de terceiros que investigam, objectiva e
imparcialmente, e determinam factos relevantes na situação
litigiosa.
– Negociação – envolve apenas as partes no litígio que discutem a
questão de acordo com a boa-fé.
– Bons-ofícios (não tipificada) – intervenção (com um cunho de
certa informalidade e passividade) de um terceiro (Estado, OI, ou
outro) que procura aproximar as partes (go-between),
transmitindo informações e mensagens. Ocorre normalmente em
conflitos ainda recentes.
– Mediação – intervenção de um terceiro (com um cunho mais
formal e mais activa) que procura aproximar as partes,
apresentando soluções ou directrizes em cuja base as partes
podem chegar a um acordo. Ocorre normalmente quando o
conflito se prolongou.
– Conciliação – intervenção de um terceiro, normalmente de uma
comissão especializada que propõe soluções para a situação (no
quadro da ONU há um sistema de conciliação estabelecido junto
do SG)

2 – Meios jurisdicionais:
• Os tribunais internacionais – o TIJ (remissão) e o TIDM – art.
287º e Anexo VI da CDM (em ambos a jurisdição sobre os
Estados é facultativa)
• Arbitragem – estabelecida ex ante por acordo, especial
(compromisso arbitral) ou geral (convenção geral de arbitragem),
ou prevista num tratado (cláusula arbitral); estabelecida ex post
por acordo especial. Pode decidir de acordo com o direito ou ex
eaquo et bono. A decisão é obrigatória.
§ 1. Quando o conflito possa vir a constituir uma ameaça à paz e à segurança
internacionais as NU podem intervir (a AG – 11º, nºs 2 e 3; o CS – 33º, nº 2, 34º, 35º,
36º).
A sua intervenção é subsidiária – art. 52º, nºs 1, 2 e 3.
Caso as partes não cheguem a uma solução do conflito pelos meios indicados,
devem submetê-lo ao CS (art. 37º, nº 1), que pode formular recomendações (arts. 37º, nº
2)
§ 2. O CS determinará se um conflito constitui uma ameaça à paz, uma violação da paz
ou um acto de agressão, situação em que pode adoptar: recomendações (art. 39º),
medidas provisórias (art. 40º), medidas coercivas (não militares – art. 41º) e militares
(42º) – remissão.

Bacelar Gouveia:
A ideia de ilicitude internacional

Quando ocorre uma desconformidade da actuação dos respectivos sujeitos com


os princípios e as normas internacionais aplicáveis é necessário ter em conta os
seguintes critérios: o parâmetro internacional violado, a entidade que perpetrou a
infracção e as circunstâncias em que ela ocorreu.
Nestes casos, a violação do DI só pode ser considerada com natureza jurídica,
não se confundindo com qualquer outra disputa de interesses, militares ou económicos.
Qualquer violação do DI é merecedora de resposta, que apesar de ainda se
encontrar numa fase de amadurecimento, é viável estabelecer uma contraposição
fundamental que pode operar dentro do Direito Sancionatório: a desvalorização dos
actos jurídico-internacionais praticados e a responsabilização dos autores dos referidos
actos praticados, a qual tem vindo a ganhar uma valorização crescente nos últimos anos.
A desvalorização dos actos jurídico-internacionais praticados determina a
aplicação de consequências que acarretam a respectiva eliminação, o que a CVDTE
explicitou através da aplicação da sanção da nulidade no âmbito do Direito dos
Tratados.
É uma reacção que atinge directamente os actos jurídicos que não estejam
conformes com o Direito Internacional, sendo que este lhes retira a validade, afastando-
os, portanto, do próprio ordenamento jurídico-internacional.
São várias as dogmáticas possíveis em função da gravidade dos vícios que
adulteram as fontes internacionais:
- a inexistência jurídica: é a situação mais grave de todas, não existindo sequer a
aparência de um acto jurídico-internacional;
- a invalidade: é o desvalor geral e toma as formas de nulidade ou de
anulabilidade, numa diferenciação em razão da sua gravidade;
- a irregularidade: apenas atinge o autor do acto, em nome de um vício que se
repercute no acto.
A responsabilidade jurídica reflecte a aplicação de consequências desfavoráveis
que recaem sobre o autor desse mesmo acto, com dois propósitos fundamentais: numa
perspectiva cumulativa, a acrescentar à consequência que já se abateu sobre o acto
ilícito e que determinou a sua desvalorização; e numa perspectiva alternativa, na medida
em que a desvalorização do acto jurídico nem sempre é operativa, sobretudo para
enfrentar actos materiais.
De acordo com os ramos de Direito que com ela têm mais trabalhado, esta
responsabilidade apresenta-se sob várias vestes:
- responsabilidade penal: a aplicação de penas de prisão por ter havido
comportamentos que configuram crimes;
- responsabilidade contra-ordenacional: a aplicação de penas pecuniárias, num
ilícito de natureza administrativa;
- responsabilidade civil: o nascimento de um dever de indemnizar em reparação
de danos que tenham sido cometidos;
- responsabilidade disciplinar: a aplicação de sanções contra as pessoas que
subordinadamente se inscrevam numa relação jurídico-laboral, pertencendo a infracção
cometida a esse âmbito;
- responsabilidade política: a produção dos actos de censura e de substituição
dos titulares de órgãos que sejam politicamente dependentes quanto à sua subsistência.
São várias as hipóteses de conjugação entre a desvalorização dos actos jurídico-
internacionais e a responsabilidade jurídica:
- a lex perfecta: a lei que prevê a sanção de invalidade para o acto que a infrinja;
- a lex minus quam perfecta: a lei que prevê quanto à respectiva violação apenas
sanções para o seu autor, não já contra o acto praticado;
-a lex imperfecta: a lei que não estabelece qualquer sanção que possa reprimir
qualquer violação; e
- a lex maius quam perfecta: a lei que prevê contra a sua violação não somente a
invalidade do respectivo acto como sanções aplicáveis aos seus autores.
A situação normal é aquela em que se aplicam as duas modalidades de sanções:
contra o acto e contra o autor do acto, contudo, não se exclui a possibilidade de
preferência por um desses caminhos.

A via da resolução política

A solução dos conflitos internacionais pode percorrer dois caminhos: uma via
pacífica sem recurso à coerção e uma via bélica, através do recurso à força.
Quanto à via pacífica, a modalidade com maior relevância é a da solução política
dos conflitos internacionais, onde se pressupõe a adopção de esquemas que passam
apenas pelos respectivos sujeitos, sem que se imponha recorrer a estruturas do tipo
jurisdicional. É para esta via que se posiciona a CNU (art.33º/1).
São conhecidos os seguintes mecanismos:
- a negociação;
- os bons ofícios;
- a mediação;
- o inquérito; e
- a conciliação.
A negociação é o esquema mais simples e directo, partindo do pressuposto de
que a resolução do litígio deve aconselhar o entabular de conversações entre as partes
desavindas para se chegar a um entendimento que pode assumir a modalidade de um
sistema de consultas, podendo dela recorrer três resultados: a transacção, a aquiescência
e a desistência
Os bons ofícios integram a intervenção de uma entidade exterior às partes em
conflito que assume o papel relevante de as aproximar e colocar em discussão, ainda
que não participando directamente nesta, não lhe competindo sequer sugerir solução
para o conflito. O entendimento directo das partes na contenda é, portanto, igualmente
essencial.
Também na mediação encontramos a intervenção de uma entidade externa ao
conflito, mas agora com um papel activo, propondo soluções no sentido de virem a ser
aceites pelas partes, intervindo, assim, no procedimento negocial, embora deva contar
com a anuência das partes em dissídio.
O inquérito caracteriza-se pela convicção de que a discórdia entre sujeitos
internacionais assenta muita vezes no desconhecimento dos factos praticados, pelo que
se impõe a respectiva averiguação por parte de alguém que lhes é exterior, formando-se
uma comissão de inquérito.
A conciliação consiste da formação de uma comissão, em número ímpar e
composta por elementos indicados pelas partes em causa e por partes neutras, que possa
analisar a natureza e os pormenores do conflito, incumbindo-lhe propor uma solução,
apresentando-se como um esquema mais formal e complexo relativamente à ideia de
mediação.

A via da resolução jurisdicional

A resolução dos conflitos internacionais pode também operar-se por intermédio


de processos de cunho jurisdicional, em que se pressupõe a intervenção de entidades
independentes que agirão segundo a veste própria da função jurisdicional, mas suas
características de independência e imparcialidade relativamente às partes em conflito, e
aplicando parâmetros jurídicos, com base num processo contraditório.
A solução jurisdicional dos conflitos pode subdividir-se entre a via arbitral e a
via judicial.
A via arbitral consiste na resolução do litígio a partir da formação de um
tribunal arbitral que tem como particularidade a indicação voluntária dos árbitros, bem
como o seu limitado número, para além de poder incluir a respectiva regulamentação,
substantiva e adjectiva.
Os tribunais arbitrais podem apresentar-se sob duas modalidades: como tribunais
arbitrais ad hoc e como tribunais arbitrais permanentes.
Os tribunais arbitrais ad hoc são apenas constituídos para a resolução de um
específico litígio, extinguindo-se depois de encontrada a decisão arbitral.
Os tribunais arbitrais permanentes existem em permanência, estando já
parcialmente pré-definidos, sendo que as partes recorrem aos mesmos para lhes pedir
uma específica intervenção na composição do conflito que entre elas surgiu e querem
ver solucionado.
A estrutura dos tribunais arbitrais é variável, tendo evoluído de um árbitro único
a uma comissão mista, prevalecendo hoje o tribunal colegial, num número ímpar de
membros.
Os tribunais arbitrais decidem em instância única, não havendo recurso para os
tribunais comuns, a não ser em situações de nulidade muito grave, podendo ainda
receber pedidos de aclaração das respectivas decisões, sendo estas obrigatórias e
definitivas mas não dispondo de executoriedade, não estando os tribunais arbitrais
dotados de meios coercivos para aplicar as decisões.
A utilização do tribunal arbitral pode ainda ser titulada por três possíveis fontes,
devendo assentar na vontade das partes que assim decidem resolver o seu litígio. São
elas:
- o compromisso arbitral: sempre que as partes, levantado um litígio, entendam
submeter a respectiva resolução a um tribunal arbitral a constituir;
- a cláusula arbitral: sempre que os litígios resultantes da interpretação ou
aplicação de certo tratado devam ser antecipadamente resolvidos por tribunal arbitral,
por força de uma das suas cláusulas, que assim o prevê;
- a convenção geral de arbitragem: sempre que as respectivas partes assumam a
vontade de resolver os litígios entre si emergentes, relativos a diversos tratados
celebrados, de acordo com o tribunal arbitral naquela previsto.
Actualmente há cada vez mais tribunais arbitrais para questões de índole
económica e tribunais judiciais para questões político-humanitárias.

A crescente judicialização de repressão da ilicitude internacional

Durante o século XX verificou-se no DI a criação de vários tribunais


internacionais, de onde se evidenciam as seguintes categorias:
- os tribunais internacionais institucionais;
- os tribunais internacionais penais;
- os tribunais internacionais económicos;
- os tribunais internacionais de direitos do homem.

Bibliografia:
• Jorge Miranda, ob. cit., pp. 261-265 e 327-333

O uso da força à luz do DI

§ Breve referência histórica – o ius belli, o ius ad bellum (a questão da ‘guerra justa’) e
o ius in bello
• A interdição do uso da força - art. 2º, nº 3 e 4 CNU, 52º CVDT e Res. AG nº
2625(XXV), de 1970.
• A utilização lícita da força:
1. Decretada pelo CS para a manutenção da paz e segurança internacionais
(remissão) – o sistema de segurança colectiva internacional
2. A legítima defesa do art. 51º CNU
3. A resposta a uma ‘agressão’ (Res. AG 3314 (XXIX), de 1974
4. O estado de necessidade ou perigo extremo (referidos)
5. Acções contra antigos inimigos – arts. 53º, nº 1 e 107º (caducados)
6. A autodeterminação dos povos?
7. A assistência humanitária?

2. A legítima defesa (individual ou colectiva) – art. 51º CNU


• ‘direito natural’ (causa de exclusão da ilicitude) dos Estados.
• Pressupostos:
• ‘Ataque armado’ e ‘agressão’ (a Res. 3314 (XXIX) da AG, de
1974).
• Actual (a acontecer – art. 51º CNU) ou iminente (em vias de
acontecer). § a doutrina Webster (“[n]ecessity of that self-defense
is instant, overwhelming, and leaving no choice of means, and no
moment for deliberation”) e o problema do terrorismo
internacional actual e da proliferação de ADM – a acção no
Afeganistão em 2001 (Res. CS 1368 (2001) e 1373 (2001)
• Subsidiariedade: impossibilidade de repelir a agressão através dos
meios lícitos (das NU)
• Apenas contra Estados ou contra outros sujeitos (OI e mesmo
outras entidades - v.g. o 11/9 e a resposta à Al-Qaeda – Res. 1368
CS de 2001)?
• Tipos – preemptiva; interceptiva; antecipatória?; repressiva? (acção
directa?)
• Requisitos: proporcionalidade; imediata comunicação ao CS. A questão
do excesso de legítima defesa e a responsabilidade internacional
• Carácter provisório: cessa logo que o CS adopte medidas

§ a legítima defesa preemptiva e uso da força preventivo – da ‘doutrina Root’ (prevenir


“a condition of affairs in which it would be too late to protect itself” - 1914) à ‘doutrina
Bush’ (“We must adapt the concept of imminent threat to the capabilities and objectives
of today’s adversaries. (…) the greater the threat, the greater the risk – and the more
compelling the case for taking anticipatory action to defend ourselves, even if
uncertainty remains as to the time and place of the enemy’s attack” – National Security
Strategy, 2002) . O dever de prevenir a proliferação de ADM e o combate ao terrorismo.
Exemplos: as acções de Israel em 1967 e em 1981; a acção norte-americana no Sudão
em 1998. As acções de “targeted killing” de Israel e dos EUA
§ A ‘guerra preventiva’ (guerra ou prevenção/repressão criminal internacional por
meios bélicos?). O regresso da ‘guerra justa’ (causa justa; intenção justa; autoridade
legítima; possibilidade razoável de sucesso; último recurso). O papel das NU. ‘Guerra
justa’ e ‘guerra humanitária’ (remissão) – a resposta às ‘emergências globais’.

3. Noção de ‘agressão’. Dificuldades.


Anexo à Res. da AG 3314 (XXIX), de 1974 – estabelece princípios gerais para
a sua definição, ainda que admitindo que “the question of weather an act of aggression
has been commited must be considered in the light of all the circumstances of each
particular case”:

• Princípio geral (art. 1º) – consiste no uso da força contra a soberania, a


integridade territorial ou a independência política de um Estado (ou
grupo de Estados), ou a sua utilização de qualquer outro modo violadora
da Carta.
• Há um presunção iuris tantum de que a primeira utilização de força
constitui um acto de agressão. O CS pode, à luz das circunstâncias
relevantes (entre as quais, o facto de os actos em causa ou as suas
consequências não serem de suficiente gravidade), não o considerar
como tal.
• O art. 3º fornece um elenco não exaustivo (art. 4º):
• A invasão ou o ataque com forças armadas ao território de outro
Estado; a ocupação ou anexação de território resultante de tal
ataque;
• O bombardeamento pelas forças armadas ou o uso de quaisquer
armas contra o território de um Estado;
• O bloqueio dos portos ou da costa de um Estado;
• Um ataque às forças armadas de outro Estado;
• A manutenção de forças armadas no território de um Estado
violando as condições do acordo ou para além da vigência deste;
• A permissão do uso do território nacional a um Estado para
perpetrar uma agressão a outro Estado;
• O envio pelo Estado ou a seu mando de bandidos armados,
grupos, irregulares ou mercenários que levam a cabo acções
armadas contra outro estado de tal gravidade que se possam
equiparar aos actos anteriores, ou o envolvimento substancial nos
actos levados a cabo por ‘rebeldes’ contra o Estado

§ além, de não exaustivo, não fornece uma definição que seja simultaneamente
objectiva e abrangente.
O ‘Draft Code of Offenses against the Peace and Security of Mankind’, adoptado
pela CDI em 1954, ia mais além e considerava um delito contra a paz e a segurança da
humanidade formas de ‘agressão indirecta’ que vão para além de g) e que foram
recuperadas recentemente:
“the undertaking or encouragement by the authorities of a State of activities calculated
to foment civil strife in another state, or the toleration of a State of organizaed activities
calculated to foment civil strife in another State;
the undertaking or encouragement by the authorities of a State of terrorist
activities in another State, or the toleration by the authorities of a State of
organized activivities calculated to carry out terrorist acts in another state;
acts by the authorities of a State in vilolation of its obligations designed to ensure
international peace and security by means of restrictions or limitations of armaments, or
on military training, or on fortifications, or of other restrictions of the same character;
the annexation by the authorities of a State of territory belonging to another State, by
means of acts contrary to international law;
the intervention by the authorities of a State in the internal affairs of another State, by
means of coercive measures of an economic or political character in order to force its
will and thereby obtain advantages of any kind”.

§ De acordo com a resolução há uma tendencial equiparação entre agressão e


ataque armado (“aggression is the most serious and dangerous form of the illegal use
of force”), o que permite defender que é-lhe aplicável a legítima defesa (mesmo quando
não é um ‘ataque armado’ convencional). Porém a decisão do `TIJ no caso ‘Nicarágua
vs EUA’ (§ 194-95 e 201) parece mais restritiva (“if such an operation, because of its
scale and effects, would have been classified as an armed attack rather than as a mere
frontier incident had it been carried out by regular armed forces. But the court does not
believe that the concept of ‘armed attack’ includes not only acts by armed bands where
such acts occur on a significant scale but also assistance to rebels in the form of
provision of weapons or logistical support. Such assistance may be regarded as a threat
of use of force, or amount to intervention in the internal or external affairs of other
states”. De acordo com o § 201 caberiam, porventura, contra-medidas que envolvessem
o uso da força).
- Uma ‘guerra de agressão’ é um crime contra a paz internacional e
acarreta responsabilidade internacional. Acarreta responsabilidade penal
dos seus responsáveis individuais – art. 5º, nº 1, al. d). Porém, nos termos
do ERTPI, não está definido o crime de agressão tendo-se remetido para
a Assembleia do TPI a sua definição, nos termos do 5º, nº 2, o que
confirma a incerteza em torno deste conceito.
- A determinação da sua existência (e, portanto, a sua definição concreta)
cabe ao CS (art. 39º CNU), que não está vinculado pela Res. 3314.

Manutenção da paz e segurança internacionais

§ Situação e conflito (art. 34º, 35º, etc.) – distinção (tendencial irrelevância)


- Com a CNU instituiu-se um sistema de segurança colectiva – art. 24º. Vectores:
1. A regulamentação dos armamentos e a promoção do desarmamento (arts.
26º e 41º) – política preventiva geral
- Há uma Comissão para o desarmamento associada ao CS. Há um
Gabinete para o Desarmamento integrado no Secretariado. São
numerosas as convenções promovidas que limitam os
armamentos.
2. A acção preventiva das NU em conflitos ou situações que possam “vir a
constituir uma ameaça à paz e à segurança internacionais” – cap. VI
(arts. 33º e ss) – acção preventiva concreta com o objectivo de impedir a
escalada da situação ou do conflito. § Res. AG 44/21 de 1989 (exorta os
Estados a proceder a cooperar no quadro das NU). A ‘Agenda para a
Paz’ de Boutros-Ghali e a ‘diplomacia/acção preventiva’.
- Intervenção da AG – arts. 11º, nºs 2 e 3 (limite do 12º):
recomendações aos Estados e/ou CS. § a Res. AG 377(V), de
1950; a Res. AG 37/10, de 1982 (‘Manila Declaration) sublinha a
importância da AG para a resolução de conflitos
- Intervenção do CS: ‘convite’ (art. 33º, nº 2); inquérito (34º);
recomendações (art. 36º, nº 1)
- Intervenção do SG: desenvolvendo ‘bons-ofícios’ ou mediação
(arts. 98º, 99º e 100º) sob o mandato do CS – diplomacia ou
acção preventiva. § Res. AG 43/51 de 1988 sublinha o papel do
SG
3. A acção repressiva quando se verifique uma ameaça à paz, violação da paz ou um
acto de agressão – cap. VII (arts. 39º e ss)
– Determinação da existência de uma ameaça à paz, violação da paz ou
acto de agressão compete ao CS (art. 39º)
§ Pode ser inter-estadual ou intra-estadual.
– Medidas:
• Inquérito (art. 34º)
• Medidas provisórias (art. 40º)
• Recomendações (art. 39º)
• Medidas não militares (art. 41º).
• Realização de acções militares de imposição da paz (art. 42º) –
nunca foi concretizado.
• Operações de Paz - Medidas de peace-making (concretização da
paz), peacekeeping (manutenção da paz), peace-building (ajudar
a criar estrutras de ‘governance’ eficazes). Estas medidas têm
uma latitude muito vasta (desde missões de observação, forças de
interposição, etc.), são multidimensionais e são de difícil
enquadramento entre os caps. VI e VII. Remissão
• Operações de peace-enforcement (arts. 39º e 41º e 42º) – visam
‘musculadamente’ garantir a paz conseguida ou restabelecer a
paz violada. Algumas têm-se traduzido em autorizações aos
Estados para intervirem – assim aconteceu na guerra do Golfo de
1991 – Res. 678 (1990); na interdição aérea sobre a Bósnia em
1993 – Res. 781 (1992) e 816 (1993)

• As operações de paz e o peace-enforcement


– As NU já levaram a efeito mais de 60 operações de paz.
– A competência para a sua aprovação é do CS, ainda que a sua imposição
só possa ter lugar no quadro do cap. VII. A primeira teve lugar no final
do conflito israelo-árabe de 1948 (missão de observação no final do
conflito).
– É difícil o enquadramento das operações de paz – caps. VI, VII e VIII
(o Parecer do TIJ, “Certas despesas das NU”, de 1962, reconheceu a sua
validade). São multidimensionais e o seu âmbito é fixado no mandato do
CS. Só ocorrem após um acordo cessar-fogo ou um acordo de paz.
• Podem ter lugar ainda no quadro do cap. VI (conflitos ou
situações que podem vir a constituir uma ameaça à paz e
segurança internacionais), cabendo numa interpretação extensiva
do art. 37º CNU. Era a interpretação tradicional, embora o CS
nunca tenha feito tal enquadramento. Neste caso, não têm
carácter coercivo e são parte de um quadro mais vasto de
pacificação que activamente envolve as partes de um conflito.
Podem ser missões de peace-keeping (de natureza securitária
preventiva, “policial”) ou puice-building (político-administrativa)
no interior de um Estado após o fim de um conflito e destinadas a
impedir o seu ressurgimento, ou para apoiar a transferência de
autoridade, etc.
• Nos últimos anos, o CS, dada a instabilidade e insegurança vivida
em alguns dos cenários das missões, tem invocado a base do cap.
VII, considerando haver uma ameaça à paz ou segurança
internacionais (legitimando a utilização da força, no que se
qualifica como uma ‘defesa próactiva do mandato’). Em
concreto, pode ser difícil distinguir do ‘peace-enforcement’. O
critério distintivo continua a ser o seu carácter não coercivo,
passando pelo consentimento dos Estados envolvidos.

– Integram-se numa escala gradativa, embora sejam quase sempre


multidimensionais, não se limitando a um tipo:
• Operações de peace-making num conflito em curso. Passam por
uma fase diplomática de aproximação das partes e de negociação
de um acordo – ‘diplomacia preventiva’.
• Operações de peacekeeping, destinadas a manter a paz (antes da
eclosão aberta de um conflito ou após o fim do conflito).
Inicialmente eram missões militares de observação do cessar-
fogo e de interposição, não visavam contribuir para a resolução
do conflito; no presente têm um carácter mais vasto e complexo,
envolvendo simultaneamente dimensões militares, policiais e
civil e visam contribuir para a resolução da situação. Quando
sejam ‘robust peacekeeping operations’ admitem o uso táctico
da força para garantir o cumprimento do mandato. Pressupõem o
consentimento das partes no conflito ou do Estado local.
• Operações de peacebuilding, destinadas a fortalecer as estruturas
de ‘governance’ política, securitária, jurídica e económica (em
menor grau) que permitam uma paz duradoura e o
desenvolvimento. Para a sua efectivação foi criada a
Peacebuilding Commission. Esta vertente de peacebuilding é
fundamental na construção de uma paz a longo-prazo.
§ Operações de peace-enforcement (estas só podem ser baseadas no cap. VII, pois
envolvem a utilização de força militar, incluindo de tipo estratégico, para a
implementação da paz). O consentimento das partes não é necessário (têm sido levadas
a cabo por Estados - caso da interdição aérea na Bósnia).

• Princípios fundamentais das operações de paz:


– consentimento do Estado ou das partem em conflito no quadro de um
processo de paz;
– imparcialidade;
– utilização da força apenas em legítima defesa ou para garantir o
mandato;
– natureza não coerciva;
– temporárias;
– multidimensionais (administrativas/policiais/militares);
– multinacionais, dependendo da vontade de participação dos Estados;
– a sua organização e direcção compete ao SG (o responsável efectivo é o
Sub-Secretário Geral, que é apoiado pelo ‘trio’ Representante
Especial/Coordenador Residente/Coordenador Humanitário
• Não têm funções humanitárias, embora facilitem a acção das organizações que
desenvolvem essa missão

• As operações de paz não são um exclusivo do CS, podendo ter lugar num quadro
regional, misto (v.g. missão no Darfur) ou num outro quadro de cooperação
internacional, normalmente com autorização do CS - cap. VIII (o que se vai
passar no Kosovo, com a passagem da UNMIK para uma missão sob a EU).

4. Os sistemas de segurança regionais – Cap. VIII (arts.52º a 54º CNU)


• São permitidos – art. 52º, nº 1 (exs. UEO, NATO, OEA, etc…)
• A solução pacífica dos conflitos deve ser procurado nesse âmbito antes
de ser submetida ao CS (v.g. caso Equador/Colômbia recente), sem
prejuízo das competências do CS – art. 52º, nº 2
• Podem ser utilizados para levar a cabo as acções repressivas do CS
decididas ao abrigo do 42º - art. 53º, nº 1, 1ª parte.
• Outras acções repressivas dessas organizações devem ser autorizadas
pelo CS (art. 53º, nº 1, 2ª parte)
• Qualquer acção empreendida ou projectada nesse quadro regional deve
ser informada ao CS (art. 54º)
• A Res. do CS 1631 (2005) prevê a cooperação das NU e das
organizações regionais para a manutenção da paz e segurança
internacionais.

Intervenções humanitárias e uso da força

• A primeira situação que despoletou a questão da intervenção humanitária foi a


Guerra do Biafra (1967-1970), que levou à criação dos MSF, em 1971. O
conceito de intervenção humanitária foi desenvolvido por Mario Bettati já nos
anos 80. Ganhou projecção nos anos 90, após a intervenção ocidental para
protecção dos curdos iraquianos.
• Distinguem-se das operações de paz, embora estas não deixem de ter um vector
humanitário, ou, pelo menos, permitem a acção das organizações de assistência
humanitária.
• A intervenção humanitária visa responder a violações massivas de direitos
humanos, sejam genocídio, limpeza étnica ou outros, fruto de uma açção
deliberada do Estado local, da sua negligência ou da sua incapacidade para
impedir o desastre humanitário (caso dos Estados falhados).
• O conceito de ‘intervenção’ é muito amplo, indo os seus instrumentos dos
tradicionais meios político-diplomáticos de pressão, económicos, passando pela
intervenção judiciária (v.g. a criação dos tribunais penais internacionais), até à
acção armada. A partir dos anos 90, ganha terreno a defesa da ‘intervenção
armada humanitária’. Implica a prerrogativa do uso da força contra os Estados.
O CS teria legitimidade para decidir, sendo muito controversa a legitimidade dos
Estados
• Intervenção humanitária – direito ou dever? A intervenção humanitária como
‘R2P’ (‘Responsability to Protect’).
• O direito de ‘intervenção armada humanitária’ esteve presente na política dos
EUA (‘doutrina Clinton’), que nos anos 90 foram particularmente activos nesse
domínio (Somália – 1992; Haiti – 1994, Kosovo, no quadro da NATO – 1999 ),
mas a sua decisão unilateral por Estados é particularmente controversa.
• O conceito de ‘R2P’ foi definido em 2001 pela International Commission on
Intervention and State sovereignty (instituída pelo governo do Canadá) –
estabelece um ‘código de conduta’ para intervenções humanitárias. A ‘R2P’ é
um conceito multidimensional (pode ser preventiva, reactiva ou reparadora). Ao
seu abrigo justificar-se-ia o uso da força contra o Estado que não protege os
cidadãos. A legitimidade caberia, em primeira linha ao CS (caps. VI e VII);
subsidiariamente à AG - Res. 377(V); em última instância aos Estados num
quadro multilateral (cap. VIII).
• O CS já autorizou intervenções armadas humanitárias (vg. Res. 929 (1994) para
o Ruanda), ao abrigo do VII, considerando os desastres humanitários “ameaças à
paz e segurança internacionais”. Na Somália autorizou (Res. 794 (1992) a
intervenção de forças militares dos Estados para instituírem um ambiente que
permitisse a assistência humanitária.
• O primeiro reconhecimento jurídico da legitimidade da intervenção é dado pela
AG. A Res. da AG 43/131, de 1988, sublinha a necessidade da assistência
humanitária, mas salvaguarda a soberania dos Estados. A Res. AG 45/100, de
1990, acolhe a sugestão do SG de implementação de corredores para assistência
alimentar e medicamentosa, com o acordo dos governos dos Estados afectados
pelo desastre. Desde aí o reconhecimento encontra-se em decisões concretas –
Res. 1674 (2006) do CS (‘Protecção dos civis’), Res. 1706 (2006) do CS
(Sudão), mas não há um acolhimento genérico explícito, muito menos da
intervenção armada, embora tenha sido acolhido na Declaração da United
Nations World Summit, de 2005 (§ 138 e 139). O seu enquadramento na Carta
não é consensual (caps. VI, VII e VIII – a intervenção armada só pode ter lugar
no âmbito dos caps. VI e VII)
• Mais do que a sua admissibilidade, várias questões concretas se levantam:
delimitação da causa, a intervenção preventiva, etc.
• Além de controvertida juridicamente, até eticamente tem sido questionada.
Politicamente não tem encontrado grande eco, fora de restritos círculos
ocidentais e africanos (o G-77 condena-a).

• O seu enquadramento entre ‘ingerência humanitária’ e a ‘guerra humanitária’.
Seja enquanto direito ou dever o conflito com a ‘soberania’ ou o ‘domínio
reservado’ é óbvio (art. 2º, nºs 4 e 7 CNU). Seria possível equacioná-la como
causa de exclusão da ilicitude ao abrigo do ‘estado de necessidade’ – art. 25º
PAREFI. Há que reequacionar os conceitos? Entra-se aqui na discussão da
‘guerra justa’ e a condição da ‘autoridade legítima’ é a mais problemática.
• Segundo o R2P, a protecção é um dever da comunidade internacional e dos
Estados (o que já estaria reconhecido em relação ao Genocídio na Convenção de
1949 – cf. Ac. TIJ de 26/2/2007, Bósnia vs Sérvia e Montenegro). A sua
violação poderia acarretar responsabilidade, em especial dos 5P no CS.

Bacelar Gouveia:
A condenação internacional da guerra
A evolução ético-doutrinal clássica

O tema do uso e condenação da força tem sido especialmente analisado sobre a


perspectiva filosófico-jurídica e pela perspectiva jurídico-internacional.
Do ponto de vista filosófico-jurídico o uso da força é uma necessidade de
protecção dos sujeitos internacionais, sobretudo dos Estados, mas sem que se deixe de
questionar em que circunstância o lançar mão da guerra se consideraria admissível.
A relevância jurídica da guerra situou-se, num primeiro momento, ao nível
doutrinal e político, com várias opiniões de autores sobre esta problemática que de
comum tinham o estabelecimento de condições para a sua legitimidade.
O pensamento cristão enquadrou ética-juridicamente a guerra justa: Santo
Agostinho defendia aquela que se exercia em defesa da paz contra a agressão ou para o
seu restabelecimento, enquanto Tomás de Aquino introduziu uma dimensão de
subsidiariedade, dando à guerra três características:
- conduzida pela autoridade soberana (auctoritas principis);
- acompanhada por uma justa causa (causa iusta);
- desde que devidamente animada pelas boas intenções por parte de beligerantes
(recta intentio).
Com a igualização das relações internacionais depois da Paz de Westefália,
“nacionalizou-se” também o conceito de guerra, surgindo intimamente ligado à defesa
das soberanias então emergentes já como um dos direitos dos Estados.
Kant defende a necessidade de abolir a guerra através da adopção de um estado
de paz que implicava uma intenção específica, com a adopção de três condições
fundamentais para se alcançar tal intento:
- a existência de uma Constituição Republicana , com respeito pela liberdade dos
respectivos membros, a consagração de uma legislação comum a todos e a igualdade
entre todos os cidadãos;
-a fundação de uma federação livre dos Estados, que os integrasse na cena
internacional, sem deveres e a todo o tempo revogável; e
- a imposição de regras limitadas às condições de hospitalidade universal, pois
todos os cidadãos deveriam gozar de um direito de visita dos territórios alheios, desde
que não o utilizassem para práticas hostis.
São ainda de recordar dois pontos:
a) proibição da guerra punitiva (bellum punitivum) - pois o castigo
só se impunha havendo uma relação de subordinação – e da
guerra de extermínio (bellum internecinum) ou de subjugação
(bellum suboigatorium) – pois isso significaria a aniquilação de
um Estado ou excederia o antagonismo possível só para defesa
própria;
b) limitação dos meios de fazer a guerra defensivo àqueles que não
impedissem o exercício da cidadania.

A proscrição normativo-internacional

No plano jurídico-internacional, a condenação da guerra só aconteceria no


século XX, assentando o DI, até lá, numa dicotomia fundamental entre ius ad bellum e
ius in bello.
O ius ad bellum representava o sector do DI que estabelecia os termos e
condições para decretar o estado de guerra, definindo o respectivo formalismo e as
partes que o pudessem fazer, consagrando-se um direito dos Estados de recorrer à força
no âmbito das relações internacionais.
O ius in bello atendia às normas que regulavam os conflitos armados, na
convicção de que haveria uma ordem normativa no meio do caos que um conflito bélico
sempre pressupõe.
No século XX estabeleceu-se a afirmação jurídico-internacional da proscrição
do uso da força, distribuída por quatro momentos:
- a proibição do uso da força na cobrança de dívidas contratuais;
- a moratória de guerra no âmbito do Pacto da Sociedade das Nações;
- a renúncia geral ao uso da força no Pacto Briand-Kellog; e
- a proibição geral na Carta das Nações Unidas.
O primeiro momento aconteceu em 1907 na 2ª Conferência de Haia, onde de
estabeleceu a proibição do uso da força através das represálias no caso de entre os
Estados haver dívidas não pagas, no âmbito de uma relação obrigacional.
O segundo momento aconteceria no texto do PSDN, a Parte I do Tratado de
Versalhes, que selaria o fim da I Guerra Mundial. Formou-se a convicção de que a
decisão de fazer a guerra, relevando à comunidade internacional no seu conjunto,
deveria ser filtrada por uma instância internacional, concebendo-se a primeira limitação
geral ao direito de fazer a guerra.
O Pacto Briand-Kellog marcaria o terceiro momento, sendo uma das suas
disposições o facto de os Estados partes aceitarem que o uso da força deixava de
pertencer à respectiva capacidade jurídico-internacional, condenando-se explicitamente
a guerra como instrumento de política internacional, ao ser apenas admitida como
medida de ultima ratio. Assim, o uso da força só se considerava permitido como
legítima defesa ou como medida de coerção para repelir as mais graves violações de DI,
contudo, não foi estabelecido qualquer mecanismo sancionatório para punir o respectivo
incumprimento.
O quarto momento seria alcançado com a aprovação da CNU, sendo as suas
principais finalidades a paz e segurança internacionais. É afirmado o monopólio do uso
da força a cargo da ONU, a deliberar por intermédio do Conselho de Segurança (art2º/4
da CNU).
São também formalmente previstas certas excepções:
- a legítima defesa (art.51º da CNU):
- as medidas adoptadas ou autorizadas pelos órgãos competentes da ONU para manter
ou estabelecer a paz e a segurança internacionais (art.42º da CNU);
- as medidas adoptadas contra anteriores Estados inimigos (arts 107º e 53º/1 da CNU);
- as medidas adoptadas por organizações regionais (art.52º/1 da CNU).
Para além da decretação da força no seio da ONU, a única possibilidade de
autotutela material efectivamente aberta foi a da legítima defesa. As outras hipóteses,
também admitidas, foram-no apenas temporariamente, o tempo e as circunstâncias se
encarregando de decretar a respectiva caducidade (art.107º da CNU).
Actualmente resta muito pouco do ius belli, o que tem por consequências:
- regulativamente, na modificação de muitas das normas do DI da Guerra;
- dogmaticamente, no desinteresse em que caíram estas matérias, rapidamente
substituídas por outras.

As operações de paz

A CNU não refere a possibilidade de a ONU decretar operações de paz, que


implicam a utilização de meios militares para a efectivação da paz, mas que não
exercem directamente a força. Contudo, e apesar de se reconhecer que não se encaixam
em nenhum dos dois, a CNU pode ser interpretada através da conjugação dos capítulos
VI e VII. Assim, a solução encontrada tem sido a interpretação extensiva dos poderes
literalmente previstos, numa fronteira entre as disposições de cada um daqueles
capítulos, mas apoiando-se sempre no preâmbulo da CNU e no seu objectivo primordial
de manutenção da paz e da segurança internacionais (art.1º/1 da CNU).
O Conselho de Segurança das Nações Unidas apresentou os factores da
decretação das operações de paz:
- a existência de uma ameaça à paz e à segurança internacionais;
- a existência de um cessar-fogo;
- a verificação da disponibilidade de entidades regionais para implantarem uma força de
paz;
- a existência de um objectivo político claro susceptível de ser traduzido num mandato;
- um mandato preciso; e
- a existência de razoáveis garantias de segurança para o pessoal da ONU.
A evolução das operações de paz desde a fundação da ONU é marcada por cinco
grandes fases: a 1º de cunho experimental, de 1948 a 1956; a 2º fase de afirmação
internacional, de 1956 a 1967; a 3º fase de estagnação, de 1967 a 1973; a 4º fase de
renascimento, de 1973 a 1988; e a 5º fase de expansão, a partir da guerra fria.
As operações de paz submetem-se a orientações internacionais muito próprias,
as quais podem enquadrar-se nestes três princípios:
- o princípio do consentimento das partes envolvidas;
- o princípio da imparcialidade dos agentes da manutenção da paz;
- o princípio da não utilização da força, excepto em legítima defesa.
Nos finais da década de 80, certas operações de paz passam a ser não só de
manutenção de paz mas de imposição da paz, originando operações de paz de duas
categorias distintas:
- forças restritivas, compostas por um reduzido número de observadores que apenas
pretendem garantir o respeito pelo acordo de paz assinado, mantendo a paz;
- forças amplas, fortemente militarizadas, que implicam a deslocação de forças
militares, com uso de equipamento equiparável ao de um verdadeiro exército regular,
impondo a paz.
Assim, são funções das operações de paz:
- a supervisão de um cessar-fogo;
- a desmobilização de forças e grupos armadas, bem como o seu regresso à vida civil;
- a destruição de armamento;
- a elaboração e aplicação de programas de desminagem;
- o controlo de refugiados e deslocados;
- a prestação de auxílio humanitário;
- a supervisão das estruturas administrativas existentes;
- o estabelecimento de novas forças armadas ou policiais;
- a verificação do respeito pelos direito humanos;
- a elaboração de reformas constitucionais, legislativas e eleitorais;
- a observação, supervisão e organização dos actos eleitorais;
- a coordenação de apoios em vista da reabilitação económica e da reconstrução
nacional.
As operações de paz podem ser sintetizadas em:
- diplomacia preventiva (preventive diplomacy): o conjunto de medidas destinadas a
evitar que diferendos se agravem, aumentando de tensão ou degenerando em conflitos
armados;
- estabelecimento da paz (peace making): o conjunto de medidas destinadas a alcançar
um acordo entre as partes, com o uso dos meios pacíficos;
- manutenção da paz (peace keeping): o conjunto de medidas destinadas a garantir a
presença de forças da ONU através de efeitos militares ou policiais, bem como
elementos civis;
- consolidação da paz (peace building): o conjunto de medidas destinadas a fortalecer as
estruturas do Estado, com o objectivo de evitar o recomeço das hostilidades, e lançando
os caboucos de um futuro Estado;
- imposição da paz (peace enforcement): o conjunto de medidas destinadas a garantir a
presença de efectivos militares e policiais da ONU para impor a pacificação das
relações entre as partes em conflito, prescindindo-se do respectivo consentimento.

A excepção da legítima defesa internacional

A CNU expressa-se sobre a legítima defesa internacional e respectivas


limitações no seu artigo 51º.
Os pressupostos da legítima defesa relacionam-se com a existência de um
“ataque armado”, noção que integra a prática de um acto ilícito contra os bens dos
sujeitos internacionais. É noção de ataque armado tornou-se, contudo, difusa, fugindo
dos conceitos clássicos, podendo corresponder a qualquer operação ou acto com o efeito
de infligir um prejuízo ou dano no Estado e seus elementos fundamentais. Deste modo,
a Assembleia Geral da ONU aprovou uma resolução tipificando diversos casos em que
tal conceito se consideraria verificado, numa listagem exemplificativa:
- a invasão ou ataque por forças armadas de um Estado sobre o território de outro
Estado, incluindo a ocupação militar e a anexação;
- o bombardeamento por forças armadas de um Estado do território de outro Estado,
incluindo o emprego que quaisquer armas;
- o bloqueio dos portos ou das costas de um Estado pelas forças armadas de outro
Estado;
- o ataque por forças armadas de um Estado contra as forças armadas terrestres, navais
ou aéreas de outro Estado, bem como contra a sua frota mercante;
- o uso das forças armadas localizadas no território de outro Estado sem consentimento
deste ou o prolongamento da sua estadia sem esse consentimento;
- a permissão dada por um Estado de utilizar o seu território para empreender uma acção
armada contra um terceiro Estado;
- o envio de grupos ou bandos armados por parte de um Estado ou em seu nome,
praticando actos armados de gravidade equiparada à dos actos anteriormente referidos.
Os efeitos da legítima defesa consistem na aplicação do uso da força com o
objectivo de repelir o ataque armado:
- subjectivamente: a legítima defesa pode ser levada a cabo pelo próprio Estado que seja
destinatário do ataque armado, sendo a legítima defesa própria, ou por Estados terceiros,
realizando a legítima defesa alheia;
- objectivamente: a acção de resposta em legítima defesa está internamente limitada ao
não poder surgir fora do contexto que venha a ser recortado pelo princípio da
proporcionalidade, proibindo-se o excesso de legítima defesa;
- procedimentalmente: o exercício da legítima defesa é sempre provisório, devendo
terminar logo que o Conselho de Segurança tome as medias que considera apropriadas.

Bibliografia:
• Jorge Miranda, ob. cit., pp. 265-281

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