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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA

FACULDADE DE DIREITO
CURSO DE TECNOLOGIA EM SEGURANÇA PÚBLICA
DISCIPLINA: CONTROLE SOCIAL E SEGURANÇA PÚBLICA

CARTA DE APRESENTAÇÃO

Queridos leitores,

O controle social e a segurança pública nos traz um convite a desvendar a


realidade do Controle Social em relação à Segurança Pública, nos convida a
investigar a discutir conceito, realização e efetivação do controle social nos
mais diversos espaços da sociedade, principalmente no sistema prisional.

Neste sentido, necessário se faz refletir sobre o processo de desenvolvimento


do pais: centralizador, patrimonialista, excludente e descompromissado com as
demandas sociais. Realidade esta, que contribui durante o período do governo
Vargas (1930) até a Constituição Federal de 1988, para a construção de um
Estado interventor e provedor, em decorrência de uma aliança conservadora,
que atuou por meio de ação politizadora das questões sociais e promoção do
papel de desenvolvimento econômico e social, por meio de uma política social
brasileira que se desenvolveu em um contexto de “cidadania em recesso”, de
forma que não se observa a participação dos beneficiários, o controle público é
inexistente e a burocracia é característica marcante da gestão do programas,
sem diálogo com os interessados (GURGEL & JUSTEN, 2013).

Durante nosso caminhar da disciplina, pretende-se incentivar o leitor a


perceber esta mudança de paradigma conceitual e prático do controle social na
segurança pública.
Portanto, é preciso um olhar que vá além da primeira impressão sobre a
realidade da segurança pública, necessário de faz questionar se ocorreram
avanços e se esses avanços em sendo reais, se tem potencial significativo de
mudança de paradigma de uma controle social antes de depois da Constituição
Federal.

Aqui estamos diante de uma das grandes preocupações da Segurança Pública


na atualidade, sobretudo em decorrência da evolução percebida, pós a
promulgação da Constituição Federal de 1988, no tocante aos conceitos e as
necessidades de melhor controle da sociedade na formulação das políticas e
ações das coisas públicas. (MORENGO & DIEHL, 2011)

Precisamos ser críticos nesta analise, sobretudo em decorrência de uma


Constituição Federal cidadã, que traz novos paradigmas de discussão da
questão da segurança pública e da efetiva participação da sociedade no
controle social.

Grande abraço,

Ana Paula Rocha do Bomfim


SUMÁRIO

Unidade 1 – NOÇÕES INTRODUTÓRIAS ......................................................... 5


1.1. Controle Social e Segurança Pública. Conceitos e inter-relação .......... 5
1.2. Controle social e castigo ....................................................................... 9
1.3. Cultura Prisional e o problema da ordem ............................................ 11
1.4. Síntese do capítulo.............................................................................. 15
1.5. Atividade reflexiva ................................................................................. 16
Unidade 2 – CONTROLE SOCIAL, SEURANÇA PÚBLICA, DIRETOS
HUMANOS E CIDADANIA ............................................................................... 17
2.1. Controle social, segurança pública e a Constituição Cidadã ................. 17
2.2. Controle social, segurança pública e Direitos Humanos ........................ 19
2.3. Controle social democrático................................................................... 22
2.4. Síntese do capítulo ................................................................................ 26
2.5. Atividade reflexiva .................................................................................. 27
Unidade 3 – CONTROLE SOCIAL E SEGURANÇA PÚBLICA NA PRÁTICA
............................................................................ Erro! Indicador não definido.
3.1. Controle social da atividade policial .......... Erro! Indicador não definido.
3.2. Controle social e conselhos municipais .... Erro! Indicador não definido.
3.3. Controle social e responsabilidade social . Erro! Indicador não definido.
3.4. Síntese do capítulo ................................... Erro! Indicador não definido.
3.5. Atividade reflexiva ..................................... Erro! Indicador não definido.
REFERÊNCIAS ................................................................................................ 28
MINI CURRÍCULO DA AUTORA:

ANA PAULA ROCHA DO BOMFIM – Advogada, professora e especialista em


arbitragem empresarial e mediação empresaria e familiar. Doutora em Família
e Sociedade Contemporânea - UCSAL, mestra em Direito das Relações
Internacionais - UNICEUB, especialista em Direito Econômico - UFBA e
graduada em Direito pela Universidade Católica do Salvador. Mediadora
certificada pelo Mediation Foundation Program, COLUMBIA UNIVERSITY
SCHOOL OF LAW. Mediadora Judicial pelo Conselho Nacional de Justiça
(CNJ). Instrutora de Conciliação e Mediação pelo Conselho Nacional de Justiça
(CNJ). Instrutora em Oficinas de Parentalidade e Divórcio do Conselho
Nacional de Justiça (CNJ). Docente desde 1995, atualmente exerce o
magistério como Professora da Faculdade de Direito da Universidade Federal
da Bahia, nos cursos de Direito, de Tecnologia e Segurança Pública e no
Programa de Mestrado em Segurança Pública, Justiça e Cidadania.
Coordenadora do Observatório da Pacificação Social (UFBA) e do Curso de
Tecnologia em Segurança Pública da UFBA. Professora Pesquisadora do
Grupo de Pesquisa Segurança Pública, Justiça e Cidadania. Nos últimos anos
vem atuando como consultora de diversas entidades a exemplo da CACB -
Confederação das Associações Comerciais do Brasil, SEBRAE, Federação das
Industrias do Piauí, SESI, SENAI, dentre outras públicas e privadas, com larga
experiência na área de Políticas Públicas, Pacificação Social e Direitos
Humanos. Recentemente, vem se dedicando às novas metodologias de ensino
e participado de diversos projetos de Ensino a Distância. Autora de diversas
obras (livros e artigos) nas áreas de Direito.

http://lattes.cnpq.br/6883456984468850
Unidade 1 – NOÇÕES INTRODUTÓRIAS

Introdução da Unidade:

Na presente Unidade, estudaremos questões introdutórias ligadas ao Controle


Social e Segurança Pública, partindo do entendimento do castigo e das
instituições penais no Brasil. Nesse sentido, iremos tratar dar inicio à
construção de raciocínio crítico sobre o controle social na Segurança Pública,
de forma a alcançar nos próximos capítulos, o controle social a partir da
Constituição cidadã, o controle social da atividade policial, o papel dos
conselhos comunitários no controle da segurança públicas, dentre outros.

Objetivo(s):

O objetivo, neste primeiro momento, é familiarizar o aluno com o tema, para


que ele compreenda o que o Controle Social como instrumento de política
pública que propicia

1.1. Controle Social e Segurança Pública. Conceitos e inter-relação

Com o vulgar e impreciso conceito de controle social – conceito


sociológico neutro, descritivo, se faz referencia a certos processos
sociais que atingem a conformidade do indivíduo, submetendo-o às
pautas, modelos, e processos sociais que atingem a conformidade do
indivíduo, submetendo-o às pautas, modelos e requerimentos de
grupo; coesão, disciplina, integração são, pois, termos que
descrevem o objetivo final que persegue o grupo, a sociedade, para
assegurar sua continuidade frente ao comportamento individual
irregular ou desiado. (GARCIA-PABLOS, 199, P. 77)

Controle Social há de ser compreendido como um o conjunto de instituições,


estratégias e sanções (legais e/ou sociais), cuja função é promover e garantir a
submissão do indivíduo aos modelos, composto por:
(a) numerosos sistemas normativos (a ética, o Direito civil, o Direito trabalhista
etc.);
(b) diversos órgãos ou agentes (a família, a igreja, os partidos políticos, os
sindicatos, a Justiça etc.);
(c) variadas estratégias de atuação ou respostas (repressão, prevenção,
ressocialização, etc.);
(d) diferentes modalidades de consequências (positivas, como ascensões,
distinções, boa reputação etc. Ou negativas – que são as sanções: reparação
do dano, sanção pecuniária, privação de liberdade, restrição de direitos etc.);
(e) particulares destinatários (estratos sociais desfavorecidos, estratos sociais
privilegiados, criminoso potencial, vítima potencial etc.).

O controle social pode ser formal ou informal. Eles diferem entre si por conta
do modus operandi e das sanções por eles preconizadas.

Para pensarmos Controle Social a partir do que se denomina Política Criminal,


precisamos compreendê-lo para além da sua vinculação específica ao Direito
Penal e à Criminologia. O caminhar destas disciplinas deveria ser realizado a
partir de um modelo integrado de referência, imposto pela necessidade de um
saber interdisciplinar.

Assim sendo, o substrato analítico do fenômeno criminal (análise do


crime/criminoso) aos operadores sistema penal (polícias, ministério público,
juízes, agentes e técnicos penitenciários) teria suas origens na Criminologia, ao
tempo em que a Política criminal teria por responsabilidade transformar as
análises e orientações criminológicas em opções e estratégias concretas de
controle da criminalidade; e por fim, o direito penal encarregar-se-ia de
converter em proposições jurídicas, gerais e obrigatórias, o saber criminológico
aplicado pela política criminal. (Andrade,1997; Roxin,1972; Barata,1997 ;
Pavarini,1996)

O controle social encontra-se diretamente vinculado ao estudo política criminal,


da criminologia, uma vez que, esta ultima observa de maneira ampla o crime
em si, bem como a interação entre o criminoso, a vítima, o controle social e a
forma que esses fatores interferirem no exame do fenômeno criminoso.
Neste sentido, podemos ainda, entender Controle Social como meio formal e
informal utilizado pela sociedade para lidar com o crime e com os atos
desviantes." (SHECAIRA, 2012, p. 35). Sendo assim, o ato infracional e suas
conseqüências podem ser objeto de diversas formas de controle social,
simultaneamente ou não, de natureza punitiva ou não.

Neste sentido, a Política criminal poderia ser a efetiva demonstração de duas


correntes que defendem modelos distintos de sistema penal, um baseado na
tecnologia punitiva e o outro baseado no sistema de garantias do individuo
contra o poder punitivo do Estado.

Autor Vítima

Controle Ato infracional Controle

Controle Controle

Figura 1- Fluxograma controle social X ato infracional

O controle social se materializa por meio de um conjunto de mecanismos, e


sanções sociais que tem por objeto submeter o indivíduo aos modelos e
normas comunitárias, seja por meio da ação do Estado ou da Sociedade civil
organizada, por meio de instrumentos de controle social informais e formais.
Figura 2- Fluxograma do controle social

O primeiro modelo tem modelo baseado no poder punitivo do Estado, das


instituições penais, baseado na teoria do castigo como forma de solução à
prática de um ato infracional. O segundo modelo trata-se de uma opção ético-
político do “garantismo penal”, que tem por objeto um sistema penal baseado
no máximo grau de tutela dos direitos e na fiabilidade do juízo e da legislação,
de forma a limitar o poder punitivo e garantir segurança contra qualquer tipo de
violência arbitrária, pública ou privada, estabelecendo critérios de racionalidade
e civilidade para a intervenção penal, deslegitimando meios de controle social
maniqueísta que coloque a defesa social em plano superior aos dos direitos e
garantias individuais” (Carvalho, 2001, p. 17-19).

Interessante observar que quando fala-se em controle social formal, analisando


mais especificamente a política criminal moderna, poderemos observar traços
muito distintos, decorrentes coexistência de traços minimalistas 1 e de medidas
baseadas no encarceramento 2.

1
Medidas de traços minimalistas materializam-se por meio da previsão das penas restritivas de direitos e
substitutivas à prisão; a transação penal e suspensão condicional do processo (Lei 9.099), a mediação
penal e a justiça restaurativa (Sistema Multiportas)
2
A política de encarceramento se perfaz por meio da ampliação da previsão da duração da pena de
reclusão, largo uso do direito penal simbólico; utilização de situações excepcionais para legitimar medidas
policialescas, dentre outros.
1.2. Controle social e castigo

No decorrer da história da humanidade, a relação entre Delito e Castigo pode


ser percebida como uma reação necessária. As mais diversas teorias
coexistiam com a idéia que o castigo/punição fosse algo necessário e
inevitável.

A vingança privada foi primeira forma de punição a um delito. O


castigo/punição era realizado por aquele que se sentia ofendido ou/ou por sua
famlíia.
a) Não havia proporcionalidade entre a conduta criminosa e a
retorsão desencadeada. Assim, uma bofetada poderia ter como
revide um homicídio, ou a morte de um filho representar a morte do
chefe da família do agressor, que nada teve a ver com a conduta
criminosa anterior;

b) legitimidade se fazia na razão direta da própria reação. Quer dizer,


qualquer pessoa que se julgasse ofendida por outrem podia
providenciar a “vendeta”, como meio próprio e admissível daquela
fase do Direito Penal. Não se conhecia, como já foi dito, a tutela do
Estado; o jus puniendi era particular;

a) A ação retorsiva ultrapassava a pessoa do criminoso. Assim,


qualquer membro da família do ofendido podia mover a justiça, bem
como esta poderia recair sobre qualquer membro da família do

criminoso. (....)10. (FALCONI, 1997, p. 23-24)

A vingança privada passa a ter caráter religioso, tendo em vista o


fortalecimento e consolidação das religiões, a exemplo do surgimento e
consolidação da religião judaico cristã, pois a concepção acerca do delito
passa a ser associação ao pecado. Um outro exemplo é o Código de Manu
(Mânara Dharma Sutra), em decorrência do qual a pena possuia por
fundamento a purificação da alma do criminoso.

A posteriori, a vingança passa a ter caráter público, uma vez que¸ objetivo
principal dessa forma de punição era garantir a autoridade de príncipes e de
soberanos. A exemplo da Lei de Talião (olho por olho, dente por dente, pé por
pé), que além de fundamento religioso e possuía como conseqüência penas
desumanas e demasiadamente cruéis.

A compositio – sistema de composição – consiste em outra fora de punição


privada, cuja sansão imposta ao autor do delito consiste em uma compensação
monetária que deveria pagar pelo cometimento do crime.

Na Idade Média, o direito penal caracterizava-se pela aplicação de penas


cruéis, dentre elas a fogueira, a roda, o arrancamento de vísceras, o
esquartejamento, dentre outros

Em decorrência da Estado Absolutista, por sua vez, a punição se concentra na


negativa da liberdade e os direitos individuais com fins à conservação e
segurança desse Estado, controle este manifesto no poder para justificar a sua
soberania.

As penas aplicáveis no território brasileiro, no período do Brasil colônia e do


Brasil Império eram cruéis e degradantes e a repressão penal tinha por objeto
a proteção dos bens estatais, em detrimento a proteção dos direitos daqueles
que por aqui viviam.

Em oposição a este pensamento, Beccaria (1974) questiona funcionamento


anterior do Direito Penal do Antigo Regime, e de forma sistemática, racional,
concede ao estudo do delito validade objetiva, acima das concepções dos
governantes e dos legisladores. Assim, resta proposto um programa político
criminal liberal da atividade punitiva do Estado democrático, originando o que
hoje se entende como Direito Penal Mínimo.

A concepção Iluminista preconiza que o indivíduo é portador de direitos


inerentes à pessoa humana e onde o poder de punir do Estado deverá pautar-
se sob o prisma da legalidade, de forma que, a partir dessa concepção
humanista, emergem várias garantias aos indivíduos: princípio da legalidade
penal, humanização geral das penas, abolição da tortura, igualdade de todos
perante a lei, prevenção dos delitos por meio de intervenção penal com fins
sociais e proporcionalidade entre o delito e a pena.

A idéia de prevenção do delito se contrapõe a mera punição, primórdios do que


denominamos Política Criminal.

A idéia de Política Criminal começa a ser delineada a partir do respeito às


garantias penais e processuais com fins preventivos da pena, a imposição da
sanção penal como fator de eficácia da prevenção, a proporcionalidade da
pena como critério de justiça e a relação entre a estrutura social e o delito, uma
vez que o delito deixa de ser visto como um fenômeno natural e passa a ser
percebido como problema social.

Apesar destes ideais, que deveriam permear a Política criminal e determinar


reflexos positivo no Controle Social, o controle social pode se expressar como
uma parte do aparato coercitivo do Estado ou parte oculta de uma política
social, ocasião em que os mecanismos de controle social buscam a
acomodação das ações para a manutenção e reprodução de uma determinada
ordem social. (DORNELES, 2003, p. 20)

Neste esteio, necessário de faz compreender a relação entre castigo e controle


social, sobretudo porque o controle social formal é motivado pelo castigo,
independente da coexistência da cultura do encarceramento e de uma cultura
recente permeada pelas penas alternativas, justiça restaurativa e pela
mediação penal, dentre outros.

1.3. Cultura Prisional e o problema da ordem

Em suma, a arte de punir, no regime do poder disciplinar, não visa


nem a expiação, nem mesmo exatamente a repressão. Põe em
funcionamento cinco operações bem distintas: relacionar os atos, os
desempenhos, os comportamentos singulares a um conjunto, que é
ao mesmo tempo campo de comparação, espaço de diferenciação e
princípio de uma regra a seguir. Diferenciar os indivíduos em relação
uns aos outros e em função dessa regra de conjunto — que se deve
fazer funcionar como base mínima, como média a respeitar ou como
o ótimo de que se deve chegar perto. Medir em termos quantitativos e
hierarquizar em termos de valor as capacidades, o nível, a “natureza”
dos indivíduos. Fazer funcionar, através dessa medida “valorizadora”,
a coação de uma conformidade a realizar. Enfim traçar o limite que
definirá a diferença em relação a todas as diferenças, a fronteira
externa do anormal (a “classe vergonhosa” da Escola Militar). A
penalidade perpétua que atravessa todos os pontos e controla todos
os instantes das instituições disciplinares compara, diferencia,
hierarquiza, homogeniza, exclui. Em uma palavra, ela normaliza.
(FOUCAULT, 2009, p. 175-6)

O fortalecimento e a consolidação da cultura prisional decorre da instituição do


poder disciplinar, a partir de meados do século XVIII, com o objetivo de exercer
função central no controle social, tendo em vista a transformação da conduta
dos indivíduos.

O momento histórico das disciplinas é o momento em que nasce uma


arte do corpo humano, que visa não unicamente o aumento de suas
habilidades, nem tampouco aprofundar sua sujeição, mas a formação
de uma relação que no mesmo mecanismo o torna tanto mais
obediente quanto é mais útil, e inversamente. Forma-se então uma
política das coerções que são um trabalho sobre o corpo, uma
manipulação calculada de seus elementos, de seus gestos, de seus
comportamentos. O corpo humano entra numa maquinaria de poder
que o esquadrinha, o desarticula e o recompõe. (FOUCAULT, 2009,
p. 133).

Neste contexto, a vigilância “torna-se um operador econômico decisivo, na


medida em que é ao mesmo tempo uma peça interna no aparelho de produção
e uma engrenagem específica do poder disciplinar” (FOUCAULT, 2009, p.
169).

Neste sentido, atendendo aos anseios da burguesia, a partir de uma nova


ordem econômica capitalista, emerge uma nova ordem política, jurídica, e
social. Em contrapartida, fez-se necessário um novo formato de Controle Social
face às novas formas de manifesta desobediência às normas vigentes.
Restando evidente a necessidade de coexistência desta nova classe social e
os demais indivíduos
En los origenes de la sociedade capitalista el corazón de la política de
control social se encuentra precisamente em esto: en la emergencia
de un proyecto político capaz de conciliar la autonomía de los
particulares en su relación respecto de la autoridad – como libertad
de acumular riquezas – con el sometimiento de las masas
disciplinadas a las exigencias de la producción – como necesidad
dictada por las condiciones de la sociedade capitalista. (PAVARINI,
1983, p. 33)

Estes preceitos se constituirão na base para uma política criminal permeada


pelos ideais de defesa social e repressão, fundada no interesse de uma classe
dominante em detrimento de uma massa criminalizada e excluída. Neste
sentido, resta estruturado o Sistema Penal foulcaniano, baseado na repressão
e a contenção da criminalidade crescente (objetivos ideológicos); repressão
seletiva da criminalidade (objetivos reais), na busca da salvaguarda dos
interesses das classes dominantes (FOUCAULT, 2009).

O Estado neoliberal segue no mesmo sentido de valorização de um controle


social baseado na supremacia do Estado penal, de sorte que o Controle Social
estaria vinculado a premissas de não comprometimento com políticas públicas
para o desenvolvimento socioeconômico da população em geral e
encarceramento das classes marginalizadas, em decorrência de um modelo
baseado na pena e criminalização de determinadas condutas e indivíduos, de
forma a realizar a “administração penal dos rejeitos humanos” (WACQUANT,
2001, p. 7).

Foucault não se furta ao encargo de delimitar as funcionalidades do sistema


penal, este entendido como o conjunto de instituições que tem por objetivo a
efetivação do Direito Penal: policial, judiciária e penitenciária.
A lei penal é definida como instrumento de classe, produzida por uma
classe para aplicação às classes inferiores; a justiça penal seria
mecanismo de dominação de classe, caracterizado pela gestão
diferencial das ilegalidades; a prisão seria o centro de uma estratégia
de dissociação política da criminalidade, marcada pela repressão da
criminalidade das classes inferiores, que constitui a delinquência
convencional como ilegalidade fechada, separada e útil, e o
delinquente comum como sujeito patologizado, por um lado, e pela
imunização da criminalidade das elites de poder econômico e político,
por outro lado. (SANTOS, 2005, p. 6).

Uma reflexão se faz muito importante a cerca deste delineamento do sistema


penal como forma de controle social formal. Para tal iremos partir d premissa
que sistema penal não possui o aparato necessário para realizar o trabalho
para o qual encontra-se destinado: prender, processar e julgar todos os
indivíduos que cometem ilícitos penais, de sorte que, haverá de fazer a opção
entre a inatividade e a seleção. A inatividade certamente levaria ao
desaparecimento do próprio sistema penal, de sorte que, resta como solução a
seleção dos que ingressam no sistema carcerário, seleção que tem como alvo,
em geral aqueles oriundos de camadas sociais marginalizadas. (MALAGUTI,
2003).

Em 2015, foi realizada uma pesquisa sobre o excesso de prisão provisória no


Brasil, na qual resta retratado, que a conversão da prisão em flagrante em
prisão provisória é automática, sem que haja um controle judicial motivado. O
referido relatório, quando analisa o cárcere, conclui sobre o caráter de controle
social de indesejáveis, quando firma que
(...) as implicações são preocupantes: ao considerar que existem
grupos humanos biologicamente inferiores, naturalmente violentos e
que não podem ser tratados com igualdade em relação à maioria
“sadia”, a criminologia causal — ou da “defesa social” — desemboca
necessariamente em práticas racistas, colonialistas e de extermínio
(Cf. ZAFFARONI, 1988, p. 241). Para uma situação de “caos”, a
“resposta” do Estado policial é a instauração, no dizer de Agamben,
de uma guerra civil legal. Esta “guerra” juridicamente respaldada
permite a neutralização “não só de adversários políticos, mas de
categorias inteiras de cidadãos que, por qualquer razão, resultaram
não integráveis no sistema político”. (IPEA, 2015, p. 92-93)
O conceito de (des)ordem encontra-se vinculado a julgamentos ideológicos e
sujeita a estereótipos e preconceitos sobre a condução (in)desejada de
determinados indivíduos não pode se compreendida a partir de uma
percepção neutra, uma vez que reflete estruturas políticas e ideológicas
dominantes. (ZAVERUCHA, 2010).

Em assim sendo, presenciamos a estruturação de uma cultura prisional que


tem por premissa básica a manutenção da ordem, uma ordem vinculada aos
interesses de uma classe dominante, apesar do movimento de democratização
e de valorização do movimento garantista, como veremos no próximo capitulo.

1.4. Síntese do capítulo

Após a Leitura desta unidade, algumas informações precisam ficar registradas:

 O controle social há de ser compreendido como um o conjunto de


instituições, estratégias e sanções (legais e/ou sociais);
 O controle social formal é exercido pelo Estado e o Informal pela sociedade
civil organizada;
 O sistema penal pode ser entendido como forma de controle social na
medida em que opera de forma seletiva e bastante restrita;
 A cultura prisional decorre do poder disciplinar, com o objetivo de exercer
função central no controle social;
 Foucault delimitou as funcionalidades do sistema penal, a partir de um
conjunto de instituições: policial, judiciária e penitenciária;
 A lei penal é um instrumento de controle social para aplicação às classes
inferiores;
 A justiça penal é mecanismo de dominação de classe, caracterizado pela
gestão diferencial das ilegalidades;
 A prisão é o centro de uma estratégia de dissociação política da
criminalidade e de repressão da criminalidade das classes inferiores.
 O controle social de indesejáveis realizado pela Política Prisional
desemboca necessariamente em práticas racistas, colonialistas e de
extermínio.
Atividade reflexiva

A presente atividade reflexiva possui natureza complementar a sua formação e


não faz parte da composição da avaliação desta disciplina.

Pretendemos com ela colaborar com o seu crescimento no processo de


aprendizagem e capacidade crítica.

Após a leitura deste capítulo, aproveite para ler dois textos de leitura
complementar a sua escolha que tem como objeto o controle social e o a prisão
como sistema punitiva e reflita sobre as formas do Controle social na
atualidade.

Bom trabalho!!!
Unidade 2 – CONTROLE SOCIAL, SEGURANÇA PÚBLICA, DIRETOS
HUMANOS E CIDADANIA

Introdução da Unidade:

Na presente Unidade, estudaremos o Controle Social á luz da constituição


cidadã e dos direitos humanos, a partir da ótica da Segurança Pública. Nesse
sentido, de forma a dar continuidade à construção de raciocínio crítico sobre o
Controle Social, se espera alcançar no próximos capítulo a percepção da
materialização do controle sócias a partir de suas diversas formas de
efetivação.

Objetivo(s):

O objetivo do presente capítulo é fomentar a reflexão sobre a mudança de


paradigma do controle social estritamente punitivo para um modelo de controle
social democrático.

2.1. Controle social, segurança pública e a Constituição Cidadã

O controle social sempre existiu na história da humanidade, sobretudo, pois


seria muito difícil a existência de uma sociedade que não adotasse qualquer
dispositivo de segurança, visando à contenção das condutas que ameaçam a
sua própria ordem. (FERREIRA, 1995, p.430)

Antes da Constituição Federal de 1988, o controle social no Brasil era exercido


por meio do “uso da força física, política ou militar, ou ainda, de políticas
compensatórias, associadas a uma cultura paternalista, foram quase que
exclusivamente a forma de controle social praticada”. (SILVA, 2008).

Após a promulgação da Constituição Federal, alguns princípios mais amplos e


de conteúdo mais geral parecem constituir o objeto consensual da vida cultural
dessa sociedade, a exemplo dos princípios de democracia, de cidadania, de
individualismo e da universalidade (COSTA, 1995, p.60)

A segurança pública é um conjunto de medidas adotadas pelos Estados, cuja


função precípua é a prevenção e repressão da criminalidade e da violência.
Pode ser conceituada como um serviço público universal destinado à
população, por meio de políticas públicas, para a proteção da vida e dos
direitos e liberdades individuais e coletivos, assegurados pela Constituição
Federal de 1988, por meio de políticas públicas votadas à tutela da vida e dos
demais direitos e liberdades individuais: direito à vida, liberdade, à igualdade, à
segurança e à propriedade.

Além de um dever constitucional do Estado brasileiro, a segurança pública é


um direito do cidadão e o controle social há de ser compreendido como um
conjunto de mecanismos vinculados à efetividades dos direitos fundamentais
elencados no art. 5º. da Carta Magna.

A Segurança pública como instrumento de pacificação social, encontra-se


vinculada à idéia de Cidadania e Controle Social. Assim, a Constituição
Federal, no art. 144, define Segurança Pública como dever do Estado, direito e
responsabilidade de todos, de forma a caber ao Poder Público em cada esfera
de governo – União, Estados, município, atuar conjuntamente com a
participação da sociedade civil em prol de uma segurança pública de
qualidade, participativa e inclusiva

A cidadania trata-se de um dos pilares do Estado democrático, ao lado da


soberania estatal e da dignidade da pessoa humana, dos valores sociais do
trabalho, na ordem constitucional de 1988.

De acordo com a qual os direitos civis e políticos não asseguram a democracia


sem os direitos sociais, aqueles que garantem a participação do indivíduo na
vida e sociedade, uma vez que os avanços da cidadania encontrem-se
relacionados com a riqueza do país e sua divisão. (PINSKY, 2006, p. 09 -13)
A participação social nos espaços de decisão, concorre para efetivação da
Segurança Pública e do Controle Social, vez que, este último consiste em um
meio de participação da sociedade “participação direta do cidadão” na vida
política da sociedade.

Importante demonstrar que a Constituição Federal de 1988 consiste num


marco do controle social no Brasil, tendo em vista o “uso da força física, política
ou militar, ou ainda, de políticas compensatórias, associadas a uma cultura
paternalista, foram quase que exclusivamente a forma de controle social
praticada”. (SILVA, 2008).

A efetividade do Segurança Pública é materializada por meio de políticas


públicas de segurança, que tem por objeto o interesse público, o interesse
coletivo e ao exercício de cidadania e do controle social, uma vez que a
relevância desses instrumentos para a se entrelaçam e derivam de uma
natureza social.

O rompimento do paradigma do uso da força, como exercício de cidadania e de


controle social. Neste sentido, compre-nos indagar se a população tem
consciência do seu papel no Controle Social da violência, ou ainda se o Estado
tem propiciado à população condições de para atuarem de forma mais
presente?

1.5. 2.2. Controle social, segurança pública e Direitos Humanos

A segurança pública é considerada um direito humano fundamental, no Estado


Democrático de Direito, independentemente de condição social, econômica,
todo ser humano tem direito à segurança.

Inicialmente, a Segurança Pública era entendida enquanto Direito Humano de


primeira geração, sendo que na atualidade, apresenta-se no rol dos Direitos
Humanos de terceira geração, denominados de direitos de fraternidade, os
quais contemplam o “princípio da solidariedade”, na busca da tutela de direitos
difusos e coletivos, dentre os quais, encontra-se o direito a paz.
Pra o desalento da sociedade, ainda não se pode falar da efetividade de uma
segurança cidadã, ao revés, a realidade encontra-se pautada por uma
segurança pública violadores de Direitos

A dificuldade estatal de garantia da Segurança Pública é incontestável, de sorte


que, o Estado há de conviver com a crescente desigualdade social, que tem
reflexos no exercício pleno dos direitos.

Apesar dos avanços inerentes à Política Pública de Segurança, tendo em vista


o viés social que ela representa, necessário compreender, que não se trata
apenas de política de governo, mas de um trabalho conjunto, interdisciplinar e,
principalmente, de uma política conduzida de maneira mais democrática e
participativa.

Ao lado do velho e repressivo paradigma-punitivo, que tem como foco


combater o crime e o criminoso, emerge no campo um novo paradigma, cujo
foco é a proteção do cidadão e a promoção comunitárias. As políticas
preventivas da violência fundamentam-se na idéia de que é importante atuar,
antes do cometimento do delito, (GONÇALVES, 2009, p. 23)

O rompimento com o paradigma punitivo exige a compreensão de que as ações


relativas à segurança pública devem ser pensadas como exercício de cidadania
e de controle social, ou seja, a segurança pública é um serviço público,
essencial à manutenção da vida em sociedade, cuja garantia e obrigatoriedade
de prestação cabe ao Estado, por meio de política pública que contemple a
proteção necessária à sociedade “assegurando-lhe a paz e a defesa comum”.
(HOBBES, 2003, p. 615).

Contudo, o Estado não tem cumprido com as suas responsabilidades no


tocante à garantia da segurança necessária à população, de sorte que, os
indivíduos encontram-se à mercê da violência e da criminalidade.
Necessário se faz assegurar a efetivação de uma segurança formatada para o
atendimento da parcela excluída da sociedade. Nesse sentido, é defeso, no
que tange a competência do Estado, que se cumpra com seu papel de
garantidor da vida e da segurança, estabelecido no pacto social. Se espera que
direitos humanos não sejam violados, uma vez que as políticas de segurança são
voltada apenas ao do combate ao crime e a violência no seu estágio mais
primitivo, principalmente a institucionalizada.

No século XXI, multiplicaram-se as iniciativas voltadas para prevenir as


violências e redução da criminalidade violenta, na perspectiva de novas
alternativas de políticas públicas de segurança que possam garantir o direito de
segurança dos cidadãos e cidadãs nas sociedades do século XXI.

Tendo em vista o processo de internacionalização, a questão dos direitos


humanos, desde a II Conferência Internacional de Direitos Humanos, reunida
em Viena, em 1995.

A construção de uma cidadania transnacional ou mundial, marcada pela


criação institucional e pela difusão e comunicação de práticas sociais, jurídicas
e simbólicas, inovadoras e globais, no âmbito da sociedade civil torna-se
possível, percebida como um novo espaço de manifestação social, no qual
indivíduos e coletividades, classes e grupos, de sorte a envolver movimentos
de integração e fragmentação, acomodação e contradição, reforma e
revolução.

Por um lado, a reinvenção das formas de solidariedade; por outro, a redefinição


do trabalho, em múltiplas relações sociais, tanto no espaço rural como no
espaço urbano; enfim, a prevenção e erradicação das formas de violência
social; e a construção de outro tipo de trabalho policial.

Estamos no limiar de um processo político no qual a questão da segurança


retoma as origens da polis e da politéia, como conjunto das instituições
necessárias ao funcionamento e à conservação da cidade, incluindo-se o
direito coletivo da segurança dos cidadãos e cidadãs.
1.6. 2.3. Controle social democrático

A democracia nasceu com a perspectiva de eliminar o poder invisível.


As ações do governo deveriam ser públicas, transparentes, sem
máscaras. De acordo com Kant, ‘todas as ações relativas ao direito
de outros homens cuja máxima não é possível de se tornar públicas
são injustas’. Então, ‘porque a publicidade é uma forma de controle,
um expediente que permite distinguir o que é lícito do que não é’, o
controle público é ainda mais necessário nessa época em que
vivemos. Se não conseguir encontrar uma resposta adequada à
questão do controle democrático, ‘a democracia, como advento do
governo visível, está perdida”. (BOBBIO, 1986, p. 30)

O controle social democrático surge do anseio da sociedade civil organizada e


das lutas sociais contra a violência e na construção social da cidadania,
marcadas pela busca frenética em prol de uma reconstrução das relações de
sociabilidade, tendo como princípio a solidariedade social.

A sociedade civil organizada vem há muito tempo atuando no controle social


democrático. Na década de 80, em decorrência da ação articulada dos
movimentos populares com setores progressistas da Igreja Católica vinculadoà
a Teologia da Libertação e às Comunidades Eclesiais de Base (CEBs),
aconteceu uma significativa de mobilização popular em prol da
redemocratização do país, que teve como uma de suas expressões o
Movimento “Diretas Já” (1983), a Assembléia Nacional Constituinte (1985) e a
conquista da Constituição Federal de 1988.

A partir dessa Constituição, direitos civis, políticos e sociais são firmados de


forma conjunta e articulada, enquanto partes constitutivas de um mesmo
estatuto legal, o que dá a essa Constituição o status de Constituição Cidadã ou
Magna Carta, a qual é imprescindível para a consolidação de um Estado
Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e
individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a
igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna,
pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na
ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias
(BRASIL, 2001)

Diversas foram as campanhas articuladas e realizadas pela sociedade civil


organizada, senão vejamos algumas desta ações:
 Anos 70 - a campanha de Hélio Bicudo contra os "grupos de extermínio"
em São Paulo;
 1975 a 1979 - Campanha pela Anistia, de 1975 a 1979;
 Anos 80:
o Movimento "Tortura Nunca Mais";
o Campanha Nacional contra a Violência, promovida pela OAB;
o Campanha de combate à Violência contra a Criança -
Confederação Nacional dos Bispos do Brasil — CNBB, Igreja
Evangélica de Confissão Luterana do Brasil — IECLB e
Comissão Pastoral da Terra — CPT.
 Anos 90:
o Campanhas contra a violência no campo - Comissão Pastoral da
Terra, da CNBB, Confederação dos Trabalhadores na Agricultura
- Contag e Instituto Brasileiro de Análise Sociais e Econômicas -
Ibase,
 Desde 1985
o campanhas contra a violência à mulher; os movimentos de
homossexuais denunciando a violência contra gays, lésbicas e
travestis; as lutas do movimento negro, e tantas outras -
Comissões de Direitos Humanos; as ONG, como o Movimento
Viva Rio;

Ao mesmo passo que a experiência democrática avança, no tocante ao


controle social informal, com ela avança a consciência social da necessidade
de participação.
[...] como se de repente houvesse a percepção de que a autoridade
sozinha não resolve o problema da violência. E mais: a própria
sociedade, antes ausente, começa a se ver como parte do problema.
Entende agora que combater a violência é responsabilidade pública,
antes de ser apenas responsabilidade governamental. (FALCÃO,
1998, p.9-12)

Neste sentido, a partir da premissa que interesse público é mais amplo do que
o interesse governamental, não é possível ignorar que o interesse público é
mais amplo que o interesse governamental. Assim, numa democracia
participativa, participar não é apenas criticar, reclamar e protestar, embora isso
seja necessário, ainda que insuficiente.

O exercício da cidadania plena significa propor, inventar e apoiar, bem como,


ser contra e também ser a favor, inclusive do governo e assumir
responsabilidades - a principal característica da maturidade democrática, de
forma que a solução está em reformar e reinventar as instituições do governo e
da sociedade, encarregadas do combate à violência. (FALCÃO, 1998)

O controle social democrático pode ser manifesto em diversos formatos, seja


por meio de campanhas ou movimentos sociais, ou da atuação dos conselhos
comunitários, ou da presença de representantes da sociedade civil nos
sistemas de ouvidorias, ou ainda por meio do acesso a instancias
internacionais, uma vez que todos estes sob a perspectiva democrática, além
de se tratar da expressão da vontade do povo, contribuem diretamente para a
transformação social no exercício do controle social informal.
Controle social

Transformação social

Figura 3 - Ilustração referente ao processo de transformação social por ação do controle social
O controle social democrático constitui-se em uma das facetas da efetividade
do controle social exercido pela sociedade, podendo ele ter reflexos não
somente no plano interno, mas também no plano internacional. Clara
demonstração disto é a atuação de diversas entidades não governamentais
quando exercem o controle social junto à Corte Interamericana de Direitos
Humanos.

As denúncias apresentadas à Comissão Interamericana de Direitos Humanos,


que tem por objeto possíveis violações diversas aos Direitos Humanos no
território de qualquer território submetido a esta Corte, dentre eles o Brasil,
tendo em vista, previsão legal internacional, cuja postulação pode ser efetuada
por entidades não governamentais que representam os direitos do daquele que
foi alvejado por estas violações, seja ela cidadão nacional ou estrangeiro que
esteja naquele país.

Após a primeira fase de processamento, não havendo êxito no processo


preliminar de negociação com o Estado, pode ser a denuncia aceita e
encaminhada para julgamento a ser realizado pela Corte Interamericana de
Direitos Humanos. As denúncias apresentadas3 pela sociedade civil
organizada à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, a exemplo do
caso do Presídio de Pedrinhas (MA) ou mais recentemente o Caso Favela
Nova Brasília, vem resultando em reflexos positivos do controle social informal.

Podemos concluir, de forma a sustentar que a necessidade de uma Segurança


Pública baseada na cidadania cidadã encontra-se intimamente relacionada à
construção de controle social democrático, de sorte que, as instituições de
socialização (família, escola, associações de bairro, meios de comunicação,
etc) e as organizações do controle social formal (polícias, sistema judiciário,
instituições prisionais) — reconstruam uma política social emancipatória,
inclusiva, norteadora das trajetórias sociais e dos anseios de sociedade justa,

3
Os casos que se encontram na Corte Interamericana de Direito Humanos podem ser consultado no sítio
eletrônico da referida instituição, no endereço http://www.oas.org/pt/cidh/decisiones/demandas.asp
objeto das lutas sociais mundiais em prol da construção de uma sociedade
democrática, com novas formas de controle social fundadas nos direitos do
homem e do cidadão.

1.7. 2.4. Síntese do capítulo

Após a Leitura desta unidade, algumas informações precisam ficar registradas:

 A Constituição Federal de 1988 consiste num marco do controle social


no Brasil;
 O controle social visa a contenção das condutas que ameaçam a sua
própria ordem. (FERREIRA, 1995, p.430)
 Controle social e segurança pública encontram-se intimamente
relacionados à efetivação dos Direitos Humanos.
 A Segurança pública como instrumento de pacificação social, encontra-
se vinculada à idéia de Cidadania e de Controle Social.
 A Constituição Federal de 1988 tem como uma das suas premissas a
garantia dos direitos fundamentais e a segurança pública além de dever
do Estado.
 O controle social democrático surge do anseio da sociedade civil
organizada e das lutas sociais contra a violência e na construção social
da cidadania,
 O controle social democrático pode ser manifesto em diversos formatos,
seja por meio de campanhas ou movimentos sociais, dentre outros.
 O controle social democrático é exercido pela sociedade, podendo ele
ter reflexos no plano nacional e internacional.
Atividade reflexiva

A presente atividade reflexiva possui natureza complementar a sua formação e


não faz parte da composição da avaliação desta disciplina.

Pretendemos com ela colaborar com o seu crescimento no processo de


aprendizagem e capacidade crítica.

Após a leitura deste capítulo e dos textos de leitura complementar, identifique


a partir da observância dos movimentos sociais identifique episódios de
exercício desta modalidade de controle social no últimos anos.

Bom trabalho!!!
REFERÊNCIAS

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