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O DESENVOLVIMENTO HUMANO

O desenvolvimento humano refere-se ao desenvolvimento mental e ao crescimento orgânico. O


desenvolvimento mental é uma construção contínua, que se caracteriza pelo aparecimento
gradativo de estruturas mentais. Estas são formas de organização da atividade mental que se vão
aperfeiçoando e solidificando até o momento em que todas elas, estando plenamente
desenvolvidas, caracterizarão um estado de equilíbrio superior quanto aos aspectos da
inteligência, vida afetiva e relações sociais. Algumas dessas estruturas mentais permanecem ao
longo de toda a vida. Por exemplo, a motivação está sempre presente como desencadeadora da
ação, seja por necessidades fisiológicas, seja por necessidades afetivas ou intelectuais. Essas
estruturas mentais que permanecem garantem a continuidade do desenvolvimento. Outras
estruturas são substituídas a cada nova fase da vida do indivíduo. Por exemplo, a moral da
obediência da criança pequena é substituída pela autonomia moral do adolescente ou, outro
exemplo, a noção de que o objeto existe só quando a criança o vê (antes dos dois anos) é
substituída, posteriormente, pela capacidade de atribuir ao objeto sua conservação, mesmo
quando ele não está presente no seu campo visual.

OS FATORES QUE INFLUENCIAM O DESENVOLVIMENTO HUMANO

Vários fatores indissociados e em permanente interação afetam todos os aspectos do


desenvolvimento. São eles:

• Hereditariedade — a carga genética estabelece o potencial do indivíduo, que pode ou não


desenvolver-se. Existem pesquisas que comprovam os aspectos genéticos da inteligência. No
entanto, a inteligência pode desenvolver-se aquém ou além do seu potencial, dependendo das
condições do meio que encontra.

• Crescimento orgânico — refere-se ao aspecto físico. O aumento de altura e a estabilização do


esqueleto permitem ao indivíduo comportamentos e um domínio do mundo que antes não
existiam. Pense nas possibilidades de descobertas de uma criança, quando começa a engatinhar
e depois a andar, em relação a quando esta criança estava no berço com alguns dias de vida.

• Maturação neurofisiológica — é o que torna possível determinado padrão de


comportamento. A alfabetização das crianças, por exemplo, depende dessa maturação. Para
segurar o lápis e manejá-lo como nós, é necessário um desenvolvimento neurológico que a
criança de 2, 3 anos não tem. Observe como ela segura o lápis.

• Meio — o conjunto de influências e estimulações ambientais altera os padrões de


comportamento do indivíduo. Por exemplo, se a estimulação verbal for muito intensa, uma
criança de três anos pode ter um repertório verbal muito maior do que a média das crianças de
sua idade, mas, ao mesmo tempo, pode não subir e descer com facilidade uma escada, porque
esta situação pode não ter feito parte de sua experiência de vida. [pg. 99]

ASPECTOS DO DESENVOLVIMENTO HUMANO

O desenvolvimento humano deve ser entendido como uma globalidade, mas, para efeito de
estudo, tem sido abordado a partir de quatro aspectos básicos: • Aspecto físico-motor — refere-
se ao crescimento orgânico, à maturação neurofisiológica, à capacidade de manipulação de
objetos e de exercício do próprio corpo. Exemplo: a criança leva a Chupeta à boca ou consegue
tomar a mamadeira sozinha, por volta dos 7 meses, porque já coordena os movimentos das
mãos.
• Aspecto intelectual — é a capacidade de pensamento, raciocínio. Por exemplo, a criança de 2
anos que usa um cabo de vassoura para puxar um brinquedo que está embaixo de um móvel ou
o jovem que planeja seus gastos a partir de sua mesada ou salário.
• Aspecto afetivo-emocional — é o modo particular de o indivíduo integrar as suas experiências.
É o sentir. A sexualidade faz parte desse aspecto. Exemplos: a vergonha que sentimos em
algumas situações, o medo em outras, a alegria de rever um amigo querido.
• Aspecto social — é a maneira como o indivíduo reage diante das situações que envolvem
outras pessoas. Por exemplo, em um grupo de crianças, no parque, é possível observar algumas
que espontaneamente buscam outras para brincar, e algumas que permanecem sozinhas.

O Enigma de Kaspar Hauser

Kaspar Hauser, um personagem real e enigmático que, quando encontrado em Nuremberg, em


1928, com supostamente 15 anos, quase não sabia falar, nem andar e não se comportava como
humano, pois desde a mais tenra idade, foi privado do convívio social. Sua trajetória de vida é o
triste resultado de sua carência de cultura e do
não desenvolvimento da linguagem. O total isolamento na caverna por tanto tempo, impactou
fortemente sua formação como indivíduo.

Muito tempo após sua reintegração na sociedade, já com a linguagem mais desenvolvida,
percebe-se ainda a dificuldade de Kaspar Hauser em entender às pessoas e suas reações.
Enquanto privado do convívio social, o silêncio era sua única companhia. Não somente a
ausência de vozes externas, mas o silêncio interno, da mente vazia. Kaspar Hauser não poderia
conhecer a si mesmo sem ter alguma relação interpessoal, sem referências. Não havia a
linguagem para que ele pudesse definir as coisas que via e experimentava no cativeiro.

Sinopse

O filme apresenta Kaspar Hauser em diversos momentos de sua vida e como se dá o


desenvolvimento mental após o cativeiro.

No cativeiro, Kaspar Hauser aparece acorrentado, vítima de um homem com capuz, cujo rosto
não pode ser visto, que lhe alimenta com pão e água e lhe ensina algumas palavras. Kaspar
Hauser viveu nessa situação até o dia que esse homem, única figura humana com quem tinha
contato, decide tirá-lo do cativeiro e ele então começa a aprender a andar. Esse mesmo homem o
abandona em uma praça de Nuremberg, Alemanha. Kaspar Hauser fica atônito até ser
encontrado por outro homem que lhe faz uma série de perguntas que ele não consegue
compreender.

Logo a notícia da presença estranha daquele rapaz se espalha e Kaspar Hauser se torna alvo da
curiosidade dos habitantes da cidade. Como as autoridades não conseguiram decifrar o enigma,
Kaspar Hauser passa a viver em um estábulo sob a contínua observação das autoridades que só
tinham as informações que o rapaz portava ao ser encontrado: um rosário, umas orações
católicas manuscritas e uma carta que mencionava seu nome, a data de seu nascimento e a
indicação de que ele deveria se tornar um cavaleiro tal como seu pai, cuja identidade não é
revelada.

Em outro momento do filme, inicia o contato de Kaspar Hauser com a sociedade. As


autoridades perceberam que ele só se alimentava de pão e água e que seus pés estavam feridos.
Descobriram também que ele era capaz de reproduzir seu nome (um rudimento de escrita).
Diagnosticaram seu caso como uma mente confusa que não poderia ser submetida a um
inquérito policial e decidiram mandá-lo para a prisão junto com outros vagabundos.
Seu primeiro contato em um ambiente social é com a família do guarda do presídio e se dá
através do filho do guarda, que o ensina a pronunciar as palavras com auxílio de um espelho. É
com essa família que Kaspar Hauser toma seu primeiro banho e aprende a usar os talheres. A
filha do casal tenta ensinar música para Kaspar Hauser e, apesar da dificuldade com a letra da
melodia, ele se identifica com os sons. Kaspar Hauser tinha mais afinidades com animais e
crianças.
As autoridades continuaram a investigação para saber mais sobre Kaspar Hauser, mas os gastos
para mantê-lo longe da sociedade estavam altos e, então, decidiram enviá-lo para um circo.

Nesse novo momento, o filme apresenta as agruras e humilhações pelas quais passou Kaspar
Hauser durante o tempo que esteve no circo. Ele é apresentado em espetáculos como uma
aberração junto com outros indivíduos que também são especiais, cada um de uma forma
diferente. Todos conseguem fugir do circo, correndo das pessoas que querem caçá-los. Kaspar
Hauser se esconde em uma cabana e é encontrado por um professor.

Após esse primeiro encontro com o professor Daumer, passam-se dois anos e Kaspar Hauser
aparece como filho adotivo do professor. A cena mostra o professor e Kaspar Hauser assistindo
a um jovem cego, Florian, tocar piano. Kaspar chora de emoção, pois a música o sensibiliza.
Kaspar Hauser se sente envelhecido e cansado de tentar aprender coisas que para ele são difíceis
e muitas vezes, sem sentido. O professor o consola e tenta reanimá-lo dando como exemplo o
jovem Florian, que apesar de cego e de ter perdido toda a família em um acidente, não
desanimou e toca piano o dia todo.

Após esse episódio, o filme passa a outro momento e Kaspar Hauser aparece tomando chá com
os padres. Os religiosos estão interessados em saber o quanto o rapaz conhece de Deus. Kaspar
Hauser os surpreende dizendo que não consegue imaginar que Deus tivesse criado tudo o que
existe no mundo a partir do nada. Os padres tentam convencê-lo a crer através da fé e mais uma
vez Kaspar Hauser, em sua simplicidade e inocência, esclarece com muito bom senso, que
precisará melhorar sua leitura e sua escrita para, posteriormente, compreender o restante.

Em todos os momentos do filme em que Kaspar Hauser é confrontado por alguém, ele se mostra
muito mais sensato e lógico do que os homens educados.

Quando Kaspar Hauser é convidado para sua primeira festa, mais uma vez se torna uma atração
para os convidados. Kaspar é informado que o lorde que o convidou tem a intenção de adotá-lo
e levá-lo para a Inglaterra. Porém, Kaspar Hauser não consegue causar uma boa impressão ao
lorde e não se sente bem no ambiente festivo.

Em outro momento importante da trama, Kaspar Hauser sofre um atentado. Sua fama começa a
incomodar algumas pessoas. Durante o atentado, Kaspar não se defende e nem pede ajuda.
Machucado, procura um local escuro para se esconder, como se quisesse retornar ao seu tempo
de cativeiro, quando não era atormentado pelos homens. Mais uma vez, Kaspar Hauser é
auxiliado pelo professor Daumer, que o leva para casa e cuida para que ele se recupere. Kaspar
Hauser tem delírios onde se encontra com a morte.

Pouco tempo depois, Kaspar Hauser sofre um segundo atentado. Mesmo machucado, procura
pelo professor Daumer e conta o que se passou. No local do episódio, o professor encontra um
saco com um bilhete que sugeria o motivo pelo qual Kaspar Hauser havia sido atacado e fica
subentendido que o atacante poderia ser seu pai. A verdade sobre a origem de Kaspar Hauser
fica para sempre em segredo.

Kaspar Hauser morre rodeado por aqueles que lhe foram mais próximos durante sua curta
trajetória de vida em sociedade. Após sua morte, ele é levado para autópsia, cujo relatório
aponta uma anormalidade no cerebelo que afetou seu desenvolvimento intelectual, acreditando
as autoridades que haviam encontrado as respostas a todas as questões pendentes em torno desse
homem diferente, Kaspar Hauser.
Jean William Fritz Piaget (1896-1980)

Jean Piaget foi o responsável pela introdução das fases sobre o desenvolvimento mental do
indivíduo. Ele acreditava que o desenvolvimento cognitivo do indivíduo poderia ser subdividido
em uma série de quatros estágios ordenados e descontínuos. Esse teórico supõe que as crianças
progridam através dessas fases.

O primeiro período, sensório-motor (0 a 24 meses), baseia-se em uma inteligência que


trabalha as percepções e as ações através dos deslocamentos do próprio corpo. Neste período a
criança não possui representação mental, ou seja, para eles os objetos só existem se estiverem
em seu campo visual. A conduta social, neste período, é de isolamento e indiferenciação, onde o
mundo se volta inteiramente a própria criança (o mundo é ela) (FERREIRA, 2009).

O estágio pré-operatório vai mais ou menos dos dois anos aos sete anos de idade. O grande
avanço cognitivo nesta fase do desenvolvimento é uma melhor capacidade de representar,
mentalmente, objetos que não estejam fisicamente presentes. Com exceção desta evolução,
Piaget caracteriza o estágio pré-operatório de acordo com aquilo que a criança não consegue
fazer. Por exemplo, ele acreditava que o pensamento pré-operatório das crianças pequenas fosse
marcado pelo egocentrismo, isto é a incapacidade de ver as coisas pela perspectiva de outra
pessoa (GERRIG, 2005).

O terceiro período (7 aos 11/12anos), é o das operações concretas, a criança conhece e


organiza o mundo de forma lógica ou operatória. A conversação torna-se possível (já é uma
linguagem socializada), pois a fala egocêntrica desaparece devido o desejo de trabalhar com os
outros (idade escolar), sem que no entanto possam discutir diferentes pontos de vista para que
cheguem a uma conclusão comum (FERREIRA, 2009).

O estágio operatório formal cobre o período que começa em torno dos 11 anos. Neste
estágio final do desenvolvimento cognitivo, o pensamento se torna abstrato. Os adolescentes
conseguem entender que sua realidade específica é apenas uma entre várias imagináveis, e
começam a questionar temas profundos relacionados a verdade, justiça e existência (GERRIG,
2005).

Lev Semenovitch Vygotsky (1896-1934)

Construiu sua teoria tendo por base o desenvolvimento do indivíduo como resultado de um
processo sócio-histórico, enfatizando o papel da linguagem e da aprendizagem nesse
desenvolvimento, sendo essa teoria considerada histórico-social. Sua questão central é a
aquisição de conhecimentos pela interação do sujeito com o meio.As concepções de Vygotsky
sobre o processo de formação de conceitos remetem às relações entre pensamento e linguagem,
à questão cultural no processo de construção de significados pelos indivíduos, ao processo de
internalização e ao papel da escola na transmissão de conhecimento, que é de natureza diferente
daqueles aprendidos na vida cotidiana. Propõe uma visão de formação das funções psíquicas
superiores como internalização mediada pela cultura.As concepções de Vygotsky sobre o
funcionamento do cérebro humano, colocam que o cérebro é a base biológica, e suas
peculiaridades definem limites e possibilidades para o desenvolvimento humano. Essas
concepções fundamentam sua idéia de que as funções psicológicas superiores (por ex.
linguagem, memória) são construídas ao longo da história social do homem, em sua relação
com o mundo. Desse modo, as funções psicológicas superiores referem-se a processos
voluntários, ações conscientes, mecanismos intencionais e dependem de processos de
aprendizagem.Mediação: uma idéia central para a compreensão de suas concepções sobre o
desenvolvimento humano como processo sócio-histórico é a idéia de mediação: enquanto
sujeito do conhecimento o homem não tem acesso direto aos objetos, mas acesso mediado,
através de recortes do real, operados pelos sistemas simbólicos de que dispõe, portanto enfatiza
a construção do conhecimento como uma interação mediada por várias relações, ou seja, o
conhecimento não está sendo visto como uma ação do sujeito sobre a realidade, assim como no
construtivismo e sim, pela mediação feita por outros sujeitos. O outro social, pode apresentar-se
por meio de objetos, da organização do ambiente, do mundo cultural que rodeia o indivíduo. A
linguagem, sistema simbólico dos grupos humanos, representa um salto qualitativo na evolução
da espécie. É ela que fornece os conceitos, as formas de organização do real, a mediação entre o
sujeito e o objeto do conhecimento. É por meio dela que as funções mentais superiores são
socialmente formadas e culturalmente transmitidas, portanto, sociedades e culturas diferentes
produzem estruturas diferenciadas. A cultura fornece ao indivíduo os sistemas simbólicos de
representação da realidade, ou seja, o universo de significações que permite construir a
interpretação do mundo real. Ela dá o local de negociações no qual seus membros estão em
constante processo de recriação e reinterpretação de informações, conceitos e significações. O
processo de internalização é fundamental para o desenvolvimento do funcionamento psicológico
humano. A internalização envolve uma atividade externa que deve ser modificada para tornar-se
uma atividade interna, é interpessoal e se torna intrapessoal. Usa o termo função mental para
referir-se aos processos de: pensamento, memória, percepção e atenção. Coloca que o
pensamento tem origem na motivação, interesse, necessidade, impulso, afeto e emoção. A
interação social e o instrumento lingüístico são decisivos para o desenvolvimento. Existem pelo
menos dois níveis de desenvolvimento identificados por Vygotsky: um real, já adquirido ou
formado, que determina o que a criança já é capaz de fazer por si própria, e um potencial, ou
seja, a capacidade de aprender com outra pessoa.A aprendizagem interage com o
desenvolvimento, produzindo abertura nas zonas de desenvolvimento proximal ( distância entre
aquilo que a criança faz sozinha e o que ela é capaz de fazer com a intervenção de um adulto;
potencialidade para aprender, que não é a mesma para todas as pessoas; ou seja, distância entre
o nível de desenvolvimento real e o potencial ) nas quais as interações sociais são centrais,
estando então, ambos os processos, aprendizagem e desenvolvimento, inter-relacionados; assim,
um conceito que se pretenda trabalhar, como por exemplo, em matemática, requer sempre um
grau de experiência anterior para a criança.O desenvolvimento cognitivo é produzido pelo
processo de internalização da interação social com materiais fornecidos pela cultura, sendo que
o processo se constrói de fora para dentro. Para Vygotsky, a atividade do sujeito refere-se ao
domínio dos instrumentos de mediação, inclusive sua transformação por uma atividade
mental.Para ele, o sujeito não é apenas ativo, mas interativo, porque forma conhecimentos e se
constitui a partir de relações intra e interpessoais. É na troca com outros sujeitos e consigo
próprio que se vão internalizando conhecimentos, papéis e funções sociais, o que permite a
formação de conhecimentos e da própria consciência. Trata-se de um processo que caminha do
plano social - relações interpessoais - para o plano individual interno - relações intra-
pessoais.Assim, a escola é o lugar onde a intervenção pedagógica intencional desencadeia o
processo ensino-aprendizagem.O professor tem o papel explícito de interferir no processo,
diferentemente de situações informais nas quais a criança aprende por imersão em um ambiente
cultural. Portanto, é papel do docente provocar avanços nos alunos e isso se torna possível com
sua interferência na zona proximal.Vemos ainda como fator relevante para a educação,
decorrente das interpretações das teorias de Vygotsky, a importância da atuação dos outros
membros do grupo social na mediação entre a cultura e o indivíduo, pois uma intervenção
deliberada desses membros da cultura, nessa perspectiva, é essencial no processo de
desenvolvimento. Isso nos mostra os processos pedagógicos como intencionais, deliberados,
sendo o objeto dessa intervenção : a construção de conceitos.O aluno não é tão somente o
sujeito da aprendizagem, mas, aquele que aprende junto ao outro o que o seu grupo social
produz, tal como: valores, linguagem e o próprio conhecimento.A formação de conceitos
espontâneos ou cotidianos desenvolvidos no decorrer das interações sociais, diferenciam-se dos
conceitos científicos adquiridos pelo ensino, parte de um sistema organizado de conhecimentos.

Burrhus Frederic Skinner (1904-1990)


Há tempos atrás, pensava-se o meio ambiente como simples lugar onde animal e homens viviam
e se comportavam. Poderiam se comportar de maneiras distintas, em lugares diversos, mas não
seria porque os lugares fossem diferentes. O ambiente era cenário imprescindível, que talvez
favorecesse ou dificultasse o comportamento, mas não era o que determinava a sua ocorrência
ou a sua forma. Um papel mais ativo só foi sugerido no século XVII, quando Descartes
antecipou a noção de reflexo, e não foi senão no século XIX que os reflexos foram isolados e
estudados. Nessa época os fisiólogos começaram a denominar de stimulus, termo latino para
“aguilhão”, a ação do meio ambiente. À medida que os reflexos foram sendo descobertos e
estudados, o termo adquiriu outras conotações, e seu uso foi ampliado quando Pavlov
demonstrou de que maneira novos estímulos podiam ser condicionados. A descoberta dos
tropismos veio apoiar, particularmente nos escritos de Jacques Loeb, o ponto de vista de que, de
uma maneira ou de outra, o meio forçava o organismo a se comportar. Tais foram os
antecedentes dos quais nasceu a psicologia do estímulo-resposta. John B. Watson usou o
princípio do reflexo condicionado reunido com a noção anterior de hábito. Sustentava que
animais e homens adquiriam novos comportamentos através do condicionamento e continuavam
a se comportar enquanto os estímulos apropriados estivessem agindo. Esta posição científica foi
desenvolvida sistematicamente por Clark Hull. E. B. Holt sumariou-a assim: “Somos, de fato,
cutucados ou aguilhoados pela a vida fora”. Não era fácil, entretanto, demonstrar que isso se
aplicava a todos os comportamentos. Nem identificar estímulos correspondentes para todas as
respostas. Algumas condições ambientais relevantes, tais como falta de alimento, não agiam
como se fossem estímulos. O conceito original foi sendo substituído por algo muito menos
preciso, chamado de “situação estimuladora global”. De outro lado, igualmente perturbador, era
o fato de que vários estímulos pareciam não ter efeito, embora obviamente atingissem a
superfície do organismo. Inventou-se, então, um novo tipo de estímulo, chamado “pista” ou
“indício”, que tinha a curiosa propriedade de ser eficaz, apenas quando o organismo necessitava
dele. (Os etólogos resolvem um problema similar da mesma forma, quando atribuem o
comportamento não aprendido a mecanismos “gatilho”, estímulos que agem apenas quando o
organismo está carregado ou pronto para responder.). Essa psicologia ficou sendo uma colcha
de retalhos, destinada a salvar a fórmula estímulo-resposta e teve o efeito de levar a
determinação do comportamento de volta para o interior do organismo. Quando não se podiam
encontrar estímulos externos, havia que inventar estímulos internos. Se a falta de alimento, no
ambiente, não pode ser considerado um estímulo, era o caso de imaginar que, ao menos, gerava
um “impulso” que espicaçasse o organismo por dentro. (A descoberta dos espasmos de fome
parecia confirmar esta visão, mas uma estimulação comparável pelas vesículas seminais
dilatadas, que Watson pensou pudesse explicar o comportamento sexual, era menos plausível.)
Variáveis emocionais levaram a criação de outros estímulos internos: o medo, por exemplo,
tornou-se um impulso adquirido. Até mesmo os instintos tornaram-se estímulos, ponto de vista
defendido, por Freud. Também tiveram que ser inventados processos e mecanismos interiores.
Se um estímulo conspícuo parecesse não ter efeito, era porque um porteiro central – uma
espécie de demônio de Maxwell – havia se recusado a deixá-lo entrar. Quando o organismo
parecia comportar-se apropriadamente em relação a estímulos há muito desaparecidos, dizia-se
que respondia a cópias desses estímulos que tinham ficado armazenados em sua memória.
Muitas destas atividades centrais eram versões mal disfarçadas dos processos mentais que a
psicologia de estímulo-resposta tinha prometido exorcizar. De fato, continuaram a ser chamadas
de mentais (ou, em mudando a moda, cognitivas), numa formulação similar, derivada da teoria
de informação. Substituam-se estímulos por entrada e resposta por saída, e certos problemas
dimensionais estarão simplificados. Isto promete, mas não prometeu o suficiente, porque
processos centrais ainda são necessários. As saídas seguem-se às entradas só depois de a entrada
ter sido “selecionada”, “transformada”, “armazenada”, “recuperada” etc.

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