You are on page 1of 12

SOCIEDADE PORTUGUESA DE GINECOLOGIA

CONSENSO
SOBRE
HEMORRAGIAS
UTERINAS
ANORMAIS
REUNIÃO
CONSENSO SOBRE
HEMORRAGIAS UTERINAS
ANORMAIS
Estoril, 9 e 10, Fevereiro, 2001
Participantes:
Amaral, Isabel; Araujo Xavier; Brito Marcela; Botica, M. João; Caleijo, Lucinda; Delgado, Maria; Fraga, Teresa;
Geraldes, Fernanda; Gonçalves, João; Gonçalves, Elisabete; Inês, Leitão; Lopes, Carlos; Maia, Ana Paula;
Moutinho, Margarida; Mártires, Francisco; Marques, Carlos; Pinho, Ana Maria; Petiz, Almerinda; Pereira, Silva;
Ramalho, Graça; Rocha, Maria José; Solheiro, Helena; Sousa, Filomena; Silvestre, Margarida;
Santos, Paulo Aldinhas; Tavares, Fernanda.

Coordenadores:
Boaventura Alves; Conceição Telhado; Francisco Nogueira Martins; Isabel Torgal; Maria Gil; Martinez de Oliveira

Coordenação Geral:
Daniel Pereira da Silva; João Luis Silva Carvalho; Maria Teresa Osório; Ondina Campos

Organização:
Secção Portuguesa de Ginecologia Oncológica, Sociedade Portuguesa de Ginecologia

INTRODUÇÃO
Estabelecem-se linhas gerais de actuação consensuais para ginecologistas, sobre
hemorragias uterinas anormais de origem corporal.

CONCEITOS
Pode assumir três formas:
MENORRAGIA / HIPERMENORREIA perda sanguínea no período menstrual, excessiva em quantidade e/ou
número de dias (definidos como habituais naquela mulher);
METRORRAGIA perda sanguínea, de origem corporal, fora do período menstrual;
MENOMETRORRAGIA perda sanguínea irregular e prolongada que não é possível classificar como uma das anteriores.

2
Consenso sobre Hemorragias Uterinas Anormais (Fevereiro de 2001)

A. HEMORRAGIAS UTERINAS ANORMAIS DA PUBERDADE

DEFINIÇÃO
Hemorragia uterina que sai do padrão normal em quantidade e em duração (2 a10 / 21 a 45 dias - padrão normal)
e tem lugar dos 10 ± 1 aos 19 ± 1 anos.

A. 1. ESTRATÉGIA DIAGNÓSTICA
São elementos a considerar:

A. 1.1. HISTÓRIA CLÍNICA


• início do desenvolvimento pubertário (telarca e pubarca)
• menarca: espontânea ou induzida
• calendário menstrual
• características do fluxo menstrual (abundância, presença de coágulos, cor e cheiro)
• dismenorreia primária ou secundária
• corrimento (características e sintomas associados)
• algias pélvicas
• actividade sexual
• contracepção
Antecedentes obstétricos
História Pessoal
• Hábitos (alimentares, actividade física, higiénicos, tabágicos, alcoólicos, drogas)
• Antecedentes médicos e cirúrgicos
• Predisposição hemorrágica
• Medicação actual
História Familiar
• Endocrinopatias, discrasias sanguíneas, tuberculose, doenças auto-imunes, patologia maligna, hipertensão.

A. 1.2. EXAME FÍSICO


• Exame geral (fenótipo, peso, altura, IMC, classificação de Tanner, impregnação androgénica, coloração de
pele e mucosas, presença de petéquias e sufusões hemorrágicas)
• Sinais vitais
• Palpação da tiróide
• Exame mamário
• Exame ginecológico

A. 2. MEIOS AUXILIARES DE DIAGNÓSTICO


Os exames devem ser requisitados em função da especificidade de cada caso. Podem ser necessários:

A. 2.1. NA HEMORRAGIA DE URGÊNCIA


• Hemograma e contagem de plaquetas
• Estudo da coagulação
• Teste de gravidez
• Ecografia pélvica (se possível)

3
Consenso sobre Hemorragias Uterinas Anormais (Fevereiro de 2001)

A. 2.2. NO DIAGNÓSTICO ETIOLÓGICO


• Hemograma e contagem de plaquetas
• Estudo da coagulação
• Teste de gravidez
• Bioquímica
• Ecografia pélvica
• Doseamentos hormonais (PRL, FSH, LH, Estradiol, Progesterona T3 L, T4 L, TSH, Testosterona L, Testostero-
na total, A4 Androstenediona, SDHEA, Cortisol, 17-OHP)
• Se PR L > 100 ng/ml - RMN crâneo-encefálica
• Culturas cervicais para N.Gonorreia e Clamydia

A. 3. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL
• Disfuncional - trata-se de um diagnóstico de exclusão, que representa mais 85% dos casos.
• Patologia Gravídica
• Patologia Orgânica
• Ginecológica
• Infecções
• Pólipos / hiperplasia
• Neoplasias
• Não Ginecológicas
• Discrasias sanguíneas (D. Von Willebrand, PTI, Leucemia...)
• Doenças sistémicas (doenças hepáticas, renal, diabetes, doenças auto-imunes, doenças da tiróide...)
• Iatrogénicas (hormonas, anti-coagulantes, salicilatos, citostáticos, anti-convulsivantes, espironolactona...)
• Patologia psico-social (stress, distúrbios alimentares, exercício físico...)

A. 4. TRATAMENTO

OBJECTIVOS:
• Controlar a hemorragia
• Restabelecer a volémia
• Identificar e tratar o factor causal
• Prevenir a recorrência
• Prevenir sequelas

4.1. TRATAMENTO DE URGÊNCIA


• Em geral o Internamento está recomendado se a doente apresenta hemorragia activa abundante e ou
repercussões hemodinâmicas, e ou hemoglobina <7 gr/dl.
• Transfusão se hemoglobina <7 gr/dl

4
Consenso sobre Hemorragias Uterinas Anormais (Fevereiro de 2001)

A. 4.1.a. Hemorragia Disfuncional

Estrogénios (estradiol 17 ß) 4 mg de 6-6 horas (no máximo 24 horas)*

2 mg de 6-6 horas (2 dias)

2 mg de 8-8 horas (2 dias)

2 mg de 12-12 horas (2 dias)

2 mg /dia +

Progestativo (didrogesterona) 10 mg/dia - 10 dias


* redução em função da resposta terapêutica

A. 4.1.b. Outras Causas


Tratamento etiológico

A. 4.2. TRATAMENTO DE MANUTENÇÃO


• Ferro + Ácido fólico
• Estradiol 17 ß-2 mg/dia - 21 dias + Didrogesterona 10 mg/dia - nos últimos 10 dias (3 meses)
ou
• Estradiol 17 ß - 2 mg -14 dias, Estradiol 17 ß - 2 mg + Didrogesterona 10 mg -14 dias (3 meses)
ou
• Contraceptivos orais (se e enquanto desejar contracepção)
Após 3 meses de terapêutica de manutenção:
• Didrogesterona 10 mg/dia durante 10 dias a partir do 14°-17° dia (6 meses - Reavaliação - manutenção da
terapêutica se necessário)
• Contraceptivos orais (se e enquanto desejar contracepção)

A. 4.2.a. Hemorragia Disfuncional Moderada


(Hemoglobina > 10 gr/dl < 12 gr/dl)
• Ferro + Ácido fólico
• Didrogesterona 10 mg/ dia durante 10 dias (a partir do 17° dia)
ou
• Contracepção oral (se e enquanto desejar contracepção)

A. 4.2.b. Hemorragia Disfuncional Ligeira


(Hemograma normal)
• Esclarecimento da doente e familiares
• Calendário menstrual
• Atitude expectante e reavaliação da situação

5
Consenso sobre Hemorragias Uterinas Anormais (Fevereiro de 2001)

A. 4.2.c. Situações Particulares


Avaliação individual necessária a realizar em centros de referência.
Em geral sugere-se:
• Doentes em quimioterapia
Análogos da GnRH (estradiol pertcutâneo 25 microgramas em terapêuticas superiores a 6 meses) ou contra-
ceptivos orais em contínuo
• Doentes com insuficiência renal crónica
Análogos da GnRH (estradiol percutâneo 25 microgramas em terapêuticas superiores a 6 meses) ou proges-
tativos em contínuo
• Doentes com atraso mental
Tratamento individualizado

B. HEMORRAGIA UTERINA ANÓMALA DA IDADE REPRODUTORA

DEFINIÇÃO
Qualquer perda sanguínea uterina anormal ocorrida durante o período fértil. Delimita¬
se, por razões meramente didácticas, entre a adolescência (±19 anos) e a pré
menopausa (± 45 anos).

B. 1. ESTRATÉGIA DIAGNÓSTICA
São elementos a considerar:

B. 1.1. HISTÓRIA CLÍNICA


• Identificar a duração, quantidade, tipo de perda e enquadramento no caso clínico (sintomas associados,
gravidez em curso / contracepção utilizada, patologias prévias, alterações do estado geral ...)
• Atenção ao exercício físico, stress, obesidade, alteração brusca de peso, hipertensão, doenças renais, hepa-
topatias, endocrinopatias e doenças hematológicas
• Iatrogenia
• Perda sanguínea não proveniente do útero: aparelho urinário e aparelho digestivo

B. 1.2. EXAME FÍSICO


• Geral
• Ginecológico

B. 2. EXAMES AUXILIARES DE DIAGNÓSTICO


Os exames são requisitados em função da especificidade de cada caso. Pode ser necessário:

B. 2.1. PARA AVALIAÇÃO DAS PERDAS HEMÁTICAS


• Hemograma com contagem de plaquetas

B. 2.2. PARA EXCLUSÃO / DIAGNÓSTICO DE GRAVIDEZ E SUAS COMPLICAÇÕES


• Determinação da HCG urinário
• Doseamento da ß HCG (eventual)

6
Consenso sobre Hemorragias Uterinas Anormais (Fevereiro de 2001)

B. 2.3. ESTUDO DA COAGULAÇÃO

B. 2.4. OUTROS ESTUDOS


• Doseamentos hormonais, estudo da função hepática e função renal, etc

B. 2.5. AVALIAÇÃO ÚTERO-ANEXIAL

Ecografia pélvica (transvaginal


e/ou suprapúbica)

Se dúvidas quanto à normalidade


da cavidade uterina ou manutenção
da sintomatologia

Histeroscopia Diagnóstica - se disponível

Biópsia do Endométrio - se justificada

Nota: Histerossonografia e Histerossalpingografia (não há consenso quanto à sua utilização)

B.3. TRATAMENTO

B. 3.1. TRATAMENTO DE URGÊNCIA:


B. 3.1.a. Internamento Recomendado
• Hemorragia abundante com repercussão hemodinâmica
• Hemorragia prolongada ou recorrente com Hb < 7g /dl
• Situação etiológica impondo tratamento urgente
• Estratégia terapêutica
• Estabilização hemodinâmica (expansores do plasma, sangue...)
• Estabelecer o diagnóstico etiológico (se possível)
• Equacionar necessidade de tratamento "cirúrgico" de urgência:
• Curetagem uterina hemostática
• Sonda de Folley intra-uterina*
• Histerectomia*
• Laqueação das hipogástricas*
• Embolização das artérias uterinas*
* a considerar em casos de emergência
• Tratamento médico (tratamento de segunda linha após reposição das condições hemodinâmicas, pas-
sando, logo que possível, ao tratamento etiológico)
• Estroprogestativos
• Progestativos
• Estrogênios
• "Hemostáticos"
• Ácido mefenamico 500 mg de 8/8 horas per os
• Ácido aminocapróico 3 a 6 gr per os 6/6 horas (não houve consenso sobre a sua utilização em
virtude de não haver estudos que comprovem a sua eficácia)

7
Consenso sobre Hemorragias Uterinas Anormais (Fevereiro de 2001)

B. 3.1.b. Sem Internamento


• Estratégia terapêutica
• Estabelecer um diagnóstico etiológico
• Tratamento médico
• Equacionar necessidade de tratamento cirúrgico

B. 4. TRATAMENTO ETIOLÓGICO
Em função das características de cada caso e da vontade da doente, podem ser considerados:

B. 4.1. PATOLOGIA ENDOCAVITÁRIA


Pólipo
• Polipectomia endoscópica
• Exérese e Curetagem
• Histerectomia

Mioma submucoso
• Miomectomia endoscópica
• Histerectomia

Hiperplasia endometrial sem atípia


• Progestativo cíclico 6 meses - controlo histológico
• Contraceptivo oral estroprogestativo - se desejar
• Dispositivo intra-uterino libertador de progestagénio
• Ressecção do endométrio ou Ablação endometrial
• Histerectomia para casos resistentes aos tratamentos

Hiperplasia endometrial com atípia


• Histerectomia
• Excepções:
• Desejo de preservar a fertilidade: Curetagem uterina e tratamento progestativo 6 meses, seguido de
avaliação histológica e gravidez logo que possível, após consentimento informado. Risco cirúrgico ele-
vado: avaliação caso a caso

Neoplasia maligna do endométrio


(VIDE consenso para esta patologia)

Endometrite - Tratamento específico


Corpos estranhos e Metaplasia óssea - Remoção histeroscópica

B. 4.2. PATOLOGIA MIOMETRIAL


Miomas intersticiais
• Histerectomia
• Miomectomia em casos seleccionados

Adenomiose
• Estroprogestativos
• Dispositivo intra-uterino libertador de progestativo
• Histerectomia

8
Consenso sobre Hemorragias Uterinas Anormais (Fevereiro de 2001)

B. 4.3. PATOLOGIA DISFUNCIONAL


Hemorragia disfuncional (anovulatória/ disovulatória)
• Estroprogestativos
• Progestativos cíclicos
• Dispositivo intra-uterino libertador de progestativo
Se resistentes à terapêutica ponderar tratamento cirúrgico após reavaliação diagnóstica.

C. HEMORRAGIAS UTERINAS ANORMAIS DA PERI E PÓS MENOPAUSA


Não é considerada nesta avaliação á mulher a efectuar terapêutica hormonal de substituição, nem as lesões do
colo uterino, devendo estas situações obedecer a normas de conduta específicas.

DEFINIÇÃO
Perimenopausa- período da vida da mulher, que decorre após os 45 anos, até 1 ano após a data da última menstrua-
ção, no qual se perde a regularidade dos ciclos a que se associam frequentemente os sintomas vasomotores.
Menopausa- Última menstruação definida após 1 ano de amenorreia em idade climatérica (clinicamente conside-
ra-se menopaúsica a mulher em idade climatérica que evidencia sinais de carência estrogénica de causa ovárica).

C. 1. ESTRATÉGIA DIAGNÓSTICA

C. 1.1. HISTÓRIA CLÍNICA


Anamenese com exame objectivo e exame ginecológico. Devem ser investigadas causas extra genitais e iatrogé-
nicas e excluir a possibilidade de gravidez.
Perante achados anormais ao exame ginecológico a estratégia diagnóstica deve ser orientada de acordo com os
mesmos.

C. 2. MEIOS AUXILIARES DE DIAGNÓSTICO.


• Avaliação analítica - hemograma com plaquetas (se necessário)
• Ecografia transvaginal
• Histeroscopia.
• Avaliação histológica do endométrio:
• Biópsia selectiva (dirigida ou orientada) por histeroscopia devendo ser esta a forma de avaliação prefe-
rencial - sonda de Novak / microcureta
• Aspiração vabra
• Dilatação e curetagem é hoje considerada um modelo indicado apenas em situações pontuais, como
nas de urgência em que poderá actuar como método simultaneamente terapêutico

C. 3. ESTRATÉGIA DIAGNÓSTICA / TERAPÊUTICA EM SITUAÇÕES DE URGÊNCIA


Na situação aguda, reposição do estado geral e, se acessível de imediato, dilatação e curetagem uterina/aspira-
ção uterina.

9
Consenso sobre Hemorragias Uterinas Anormais (Fevereiro de 2001)

C. 4. ESTRATÉGIA DIAGNÓSTICA E TERAPÊUTICA DA HEMORRAGIA ANORMAL DA PERI-MENOPAUSA

Estratégia Diagnóstica e Terapêutica


da Hemorragia Anormal da Peri-Menopausa

Ecografia transvaginal
Fase proliferativa precoce (ideal - 4° a 6° dia)

Endométrio espessado (1) Achados específicos - tratar


Endométrio de aspecto normal
ou heterogénio de acordo

Hemorragia Uterina
HC e/ou BE (2)
Disfuncional

Normal

S/ necessidade de contracepção (3) (6)


Necessária contracepção (3) - estro-progestativo (4)
- Contraceptivos orais (4) - AINE (5)
- DIU c/ progestativo Progestativo cíclico/contínuo
- DIU c/ progestativo

Melhoria
Sem melhoria
Mantém terapia

HC e/ou BE

Normal - reavaliar, com particular


atenção a causas extragenitais

C/ anemia - tratar S/ anemia


(7) Ablação/histerectomia abordagem individual

(1) Sem consenso em relação ao valor limite da espessura, podendo este oscilar entre 8 a 12mm
(2) Deve ser preferida a histeroscopia como forma de avaliação inicial, desde que disponível.
Em situações pontuais pode optar-se pela biópsia do endométrio, de início
(3) Hierarquização conforme a avaliação individual (4) Na ausência de contra-indicações
(5) Preferencialmente o ácido mefenâmico pelo seu perfil farmacológico na dose de 500 mg / 8 horas
(6) Antifibrinoliticos. Considerada na literatura como a terapêutica mais eficaz. Não existindo entre nós (sugere-se
um trabalho de investigação nesta área) (7) A ablação deve ser efectuada apenas em centros especializados

10
Consenso sobre Hemorragias Uterinas Anormais (Fevereiro de 2001)

C. 5. ESTRATÉGIA DIAGNÓSTICA E TERAPÊUTICA DAS METRORRAGIAS DA PÓS MENOPAUSA

Estratégia Diagnóstica
e Terapêutica das Metrorragias
da Pós Menopausa

Ecografia transvaginal

(1) Endométrio de aspecto normal


Espessura =< 5mm
Endométrio heterógeneo
Ou espessura >5mm

Vigilância Sintomática HC e/ou BE

Se assintomática
Tratar de acordo
Reavaliação com US após 6 meses

• HC histeroscopia
• BE biópsia do endométrio

11

You might also like