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RESUMO: O trabalho tem como objetivo apresentar, a partir de uma perspectiva histórica, alguns
elementos norteadores que permitem discutir o papel das políticas sociais, trabalhando especialmente a
demanda por moradia digna, no meio rural, em um contexto de mudanças, onde estruturam-se as
relações entre o Estado e a sociedade. Três pontos serão salientados na discussão: a compreensão
de direitos humanos, enquanto construção histórica e social; o segundo refere-se à necessidade de
desenvolvimento social no campo, propulsor para a produção de mudanças capazes de responder as
necessidades da população rural; e em um terceiro momento serão apresentadas as experiências de
implantação do Programa Nacional de Habitação Rural.
PALAVRAS-CHAVE: Direito Humano à moradia; Movimento dos Pequenos Agricultores;
Programa Nacional de Habitação Rural.
INTRODUÇÃO
PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS
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Neste estudo, utilizaram-se diversas fontes: livros, revistas, artigos, teses,
monografias, para uma melhor compreensão do objeto em estudo.
Tendo em vista que evidenciam-se hoje muitas leituras e várias concepções em disputa
na sociedade a cerca da temática Direitos Humanos, considera-se de fundamental importância
esclarecer o entendimento que embasa o presente estudo. Assim, aqui, entende-se que os:
[...] direitos são construção histórica, produtos da vida em sociedade, da luta existente entre
classes e/ou segmentos sociais pela conquista de seus interesses. São resultados de
processos concretos de disputa, não dádiva divina ou premissa estabelecida previamente
para a vida dos indivíduos sociais (RUIZ, 2013, p.78)
“[...] as políticas sociais podem ser entendidas como um instrumento útil, como uma
mediação para transformar as lutas de classe, ou, melhor dizendo, os elementos conflitivos
e manifestos delas, convertendo-as num elemento de pacto entre classe opostas”
(PASTORINI, 1997, p. 91).
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Observa-se que as políticas sociais diferem de acordo com o tempo e o espaço. Com o
surgimento dos Direitos Sociais, trilha-se o caminho, mesmo que longo e moroso, para
o surgimento de práticas diferenciadas das anteriores no âmbito social, que mostravam-se
exclusivamente punitivas e repressivas. Pode-se dizer que a partir daí as políticas sociais
propõem uma nova forma de enfrentamento, constituída em meio a um processo conflituoso,
fruto de uma relação múltipla “[...] que envolve ao menos três sujeitos protagônicos: as
classes hegemônicas. O Estado intermediador e hegemonizado pelas classes dominantes e as
classes trabalhadoras e subalternas como beneficiários das políticas sociais” (PASTORINI,
1997, p. 86). Tendo por base essa perspectiva que envolve diretamente a luta de classes como
alicerce das políticas sociais buscar-se-á entender os camponeses como sujeitos agentes do
processo de construção da política social, e materialização do direito a moradia digna,
implementada por meio do Programa Nacional de Habitação Rural (PNHR).
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Constituição Federal de 1988, que expressou as reivindicações e as necessidades do povo
brasileiro, que vinham sendo pautadas pelos movimentos sociais e pela sociedade civil,
organizados em torno da conquista e ampliação de direitos civis, políticos e sociais, no
contexto da redemocratização do Estado.
Mesmo com a Constituição Federal de 1988 o direito a moradia só foi incorporado
diretamente no texto constitucional como direito social, no ano 2000, doze anos após a
promulgação da Constituição, através da Emenda Constitucional n° 26, o que ocasionou uma
relevante mudança de foco, assim a moradia “[...] deixa de ser apenas fruto da capacidade
econômica ou produtiva das pessoas. [...] o acesso à moradia passa a depender também do
Estado, que se apresenta como o principal responsável pela salvaguarda dos direitos sociais”
(PAGANI, 2009, p. 124).
A moradia digna “[...] não se resume ao simples acesso à unidade habitacional que o
indivíduo reside, vista essa unidade de forma isolada do contexto social que o cerca”
(PAGANI, 2009, p. 119). Assim, o direito à moradia pressupõe condições de habitabilidade
relacionadas basicamente a três fatores: infraestrutura; estrutura social; e mobilidade.
Proporcionando aos sujeitos condições de desenvolvimento.
Mesmo a moradia sendo assegurada constitucionalmente e trabalhada como política
pública, na área urbana desde a década de 1930, a demanda habitacional no Brasil ainda é
grande. Além disso, evidencia-se ainda que o meio rural ficou por muito tempo esquecido,
pois somente no final da década 1990, começaram a ser desenvolvidas ações nesta área.
A estratégia governamental de desenvolvimento e modernização agrícola aplicada no
Brasil ampliou políticas públicas de ordem econômica e com o passar do tempo, constatou-se
que estas não eram suficientes para a permanência das famílias nesse meio, sendo que muitas
vezes essas políticas inclusive favoreciam o êxodo rural. A partir daí entende-se que a
permanência das famílias no campo depende também do seu desenvolvimento, inclusão social
e mínimas condições de vida, dentre as quais a moradia digna (BOLTER, 2013).
Esse cenário acirrou-se durante a década de 1990, quando o referencial neoliberal
passou a ser disseminado no Brasil, estabelecendo-se na contramão do proposto pela
Constituição Federal de 1988, visto que nessa concepção os investimentos do Estado voltam-
se para o mercado em detrimento dos gastos com a área social (MONTAÑO, 2009).
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O MPA, constituiu-se neste contexto, “[...] nascido no campo da resistência contra a
expropriação e a exploração” (FERNANDES, 2003, p. 4). No final da década de 1990
ocorreram as mobilizações que impulsionaram o seu surgimento, em decorrência da
necessidade de mais políticas públicas governamentais voltadas aos pequenos produtores
rurais. Essas mobilizações, neste momento em especifico, decorreram de dois fatores, quais
sejam, a demanda de acesso ao crédito para os pequenos agricultores que enfrentavam o
arrojo das políticas neoliberais, além de, encontrarem-se assolados pela seca que atingia o Rio
Grande do Sul e Santa Catarina, em 1996.
A partir dessas reivindicações aconteceu em 1996 o denominado “acampamento da
seca” (MPA, 2013). Esse acampamento tomou proporções maiores que as esperadas, tendo
duração de três semanas, reunindo em seu ápice cerca de trinta mil pequenos agricultores.
Devido a proporção do ato, o governo não pôde ignorar a reivindicação. Assim, os
agricultores obtiveram como conquista, naquele momento, o “cheque seca”, um auxílio de
quatrocentos reais aos pequenos agricultores, o que na época equivalia a 3,5 salários mínimos
(CADONÁ, 2004).
Esse momento foi o grande impulsionador para o nascimento do Movimento dos
Pequenos Agricultores, daí surgiram as primeiras articulações dos pequenos produtores rurais,
consolidando-se como movimento social (CADONÁ, 2004).
Ao longo dos anos evidenciam-se várias conquistas do movimento como:
O Plano Camponês assenta suas bases em dois pilares: condições para produzir e
condições para viver bem no campo. A partir desses pilares centrais apresentam-se como
eixos do Plano Camponês: Produção; Educação/Formação; Qualidade de Vida; Comunidade
Camponesa; e Soberania Alimentar/Energética/Genética/Hídrica (MPA, 2012).
A moradia camponesa2, integrante do eixo Qualidade de Vida apresentou-se como a
primeira pauta nacional do MPA, ainda em 1998, dada a importância estratégica desta para
conter o êxodo rural (MPA, 2013). A moradia ganha destaque, nas reivindicações tendo em
vista que:
As ações, políticas e programas públicos de habitação até então existentes não conseguiam
ser acessados pelos pequenos e médios agricultores, visto que os mesmos não dispunham
das condições exigidas pelos programas habitacionais urbanos. Sendo a habitação um
fator central no processo de desenvolvimento e inclusão social das famílias, necessitava-
se encontrar alternativas viáveis para o problema (BOLTER, 2013, p. 97).
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A moradia camponesa é compreendida como algo muito mais amplo que a unidade habitacional, tendo em
vista que somente essa unidade não garante a permanência das famílias no campo. Assim, trabalha-se a
questão da moradia na perspectiva de um conjunto de fatores que envolvem o cotidiano das famílias
camponesas, contemplando assim necessidades econômicas, ambientais e de qualidade de vida.
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vinculado ao Programa Nacional de Habitação. Durante a sua execução, as organizações
sociais apresentaram a necessidade de algumas alterações, principalmente no que tange ao
enquadramento dos beneficiários do Programa (BOLTER, 2013).
De acordo com o Relatório da Fundação João Pinheiro (2007), o déficit habitacional
no Brasil está em torno de 6.272.645 unidades habitacionais, sendo que destas 1.092.882
situam-se na área rural, dessa forma demonstra-se a necessidade de continuar expandindo o
processo de desenvolvimento rural que valorize a inclusão social e melhores condições de
vida para as famílias camponesas visando a permanência no campo.
Dadas às proporções do déficit habitacional no campo e as experiências ocorridas em
torno das reivindicações camponesas, canalizadas através das organizações sociais, a
habitação camponesa consolidou-se em 2009, como Programa Nacional de Habitação Rural
(PNHR):
[...] que passou a integrar o Programa Minha Casa Minha Vida – PMCMV, junto à CAIXA
e ao Ministério das Cidades. Instituído pela Portaria Interministerial nº 326, de 31 de agosto
de 2009, com diversas alterações das proposições iniciais, o mesmo tem hoje como objetivo
principal financiar a construção, reforma ou ampliação da moradia dos agricultores
familiares (BOLTER, 2013, p. 100).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A partir dos apontamentos deste trabalho que inicialmente procurou traçar reflexões a
cerca dos Direitos Humanos, compreendendo estes como construção histórica, advinda das
lutas sociais. Salienta-se que os Direitos Humanos já existem positivados como normas
jurídicas, o que demonstra um avanço da sociedade, porém é importante dizer que ainda é
necessária muita luta para que esses direitos de fato sejam implementados no cotidiano
popular, tendo em vista, que a ordem vigente atualmente apresenta-se como um grande
obstáculo para que isso de fato aconteça, violando de diversas formas estes direitos e
impedindo a sua materialização e consequentemente a plena realização das potencialidades
humanas.
Evidencia-se também que o Capitalismo além de ser um entrave para a real efetivação
dos Direitos Humanos também contribuiu para o “esquecimento” social do campo, pois ao
apropriar-se da constituição das cidades, direcionando a centralidade econômica para o
meio urbano, que é tido como o centro da produção, consequentemente as políticas
públicas foram direcionadas para esse espaço atendendo as necessidades do capital.
Compactuando com isso, evidencia-se, ao longo da trajetória da política de habitação
no Brasil, que ela cumpre funções importantes para o desenvolvimento e sustentação do
sistema capitalista. Com isso, atende mais as necessidades da iniciativa privada (para quem
destina recursos) e das classes dominantes, capazes de pagar pelo acesso à moradia digna.
Enquanto isso, as necessidades da classe subalterna mostram-se cada vez maiores,
demonstrando a ampliação das desigualdades sociais, que se acirram devido à política
habitacional desenvolvida ao longo dos anos.
Constata-se que, ainda hoje, cerca de 70 anos depois dos primeiros indícios de
intervenção do Estado brasileiro na questão habitacional, o problema está longe de ser
solucionado. Pode-se analisar mais a fundo esta questão, com a tentativa de responder a
seguinte pergunta: Em que contribuiria para a acumulação capitalista a resolução da questão
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habitacional? Realmente parece não ser de interesse da classe hegemônica solucionar esta
questão, visto que esta necessidade rima de forma ampla com lucro, dado que a terra e o
direito de morar encaixam-se perfeitamente no mercado.
Mesmo assim podem-se apontar alguns avanços nesta área principalmente na esfera
institucional, com legislações e órgãos públicos criados para trabalhar com essa demanda.
Com isso, não se pode pensar que os movimentos sociais perderam ou esgotaram seu papel
de participação e tencionamento, nessa perspectiva, coloca-se como tarefa para a
população, continuar lutando por novos marcos jurídicos e também pela concretização real do
que já foi conquistado, visto que, muitas legislações não se materializam na prática, mesmo
após anos de sua regulamentação.
A conquista da PNHR representa um avanço significativo para população camponesa,
diante do seu histórico “esquecimento” social, porém, diante do déficit habitacional brasileiro,
evidencia-se que ainda há muito a ser feito para acabar com a demanda por moradia tanto na
cidade, quanto no campo. Devendo ser levado em consideração que o sistema capitalista
apropria-se das necessidades sociais, inclusive de moradia, acarretando a substituição desta
enquanto direito dos cidadãos, pela concepção de mercadoria. Assim, ocorre a sobreposição
da primazia da desigualdade social sobre a igualdade social. Visto que na sociedade
capitalista o direito à moradia digna é majoritariamente comprado pelo preço estabelecido no
mercado imobiliário.
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