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16/08/2018 - 05:00

O que te mobiliza, o interesse, o medo ou um ideal?


Por Betania Tanure

Um olhar um pouco mais atento para o comportamento das pessoas nos faz perceber que o interesse, assim como o medo,
as une mais fácil e rapidamente do que um ideal. Já refletiu sobre isso? É incrível a diferença.

Pense nas suas relações sociais, familiares, profissionais e, por que não dizer, de cidadão ou cidadã que têm um papel
indispensável na construção de seu país. Ideais se relacionam a valores, às melhores e mais altas aspirações e são, muitas
vezes, considerados abstratos - como justiça, liberdade, igualdade social. Os interesses representam desejos e necessidades
mais tangíveis - como ter muito dinheiro, ser promovido, aumentar a produtividade - e o medo pode vir do risco, suposto
ou iminente, de ser percebido como resistente em um processo de mudança, de não atingir o status desejado, de perder o
emprego ou até mesmo a liberdade.

O ideal, que se relaciona a um futuro utópico, raramente nos move com uma urgência maior, enquanto o interesse é
ousado e o medo (quando não desmobiliza) tem pressa.

O interesse, e em alguns casos o medo, se organiza rápido, com estratégia, com precisão, com tempo investido. Afinal, o
alvo é claro, o benefício é percebido de modo mais fácil e rápido e paga-se um preço alto, comumente no curto prazo, se a
"operação" não for realizada. Neste ponto vale destacar que interesses que favorecem indivíduos em detrimento da
maioria ou da sociedade tendem a agregar mais facilmente as pessoas do que aspirações de caráter coletivo ou social, ou
seja, ideais. As razões disso mereceriam uma reflexão...

Voltando à mobilização por um ideal, pensemos no Brasil da última e já longínqua Copa do Mundo. Torceu-se muito por
conquistá-la. A torcida tem seu lugar, mas é preciso ir além dela para melhorar a performance do time e atingir o grande
objetivo: ter o melhor desempenho. É preciso torcer, querer, mas aprender a agir para mudar o que pode ser mudado. Seja
no futebol - que, perceba, deixou o Brasil unido na frustração -, seja no próximo round das eleições, seja nas estruturas de
poder da República, nos seus diversos âmbitos.

A propósito das eleições, nota-se que a mobilização individual é baixa e é grande o número de pessoas não engajadas ou
que nem sequer escolheram seu candidato. Quanto às estruturas de poder, o senso de equipe parece quase inexistente. Em
ambas as situações, o ideal se enfraquece perante uma realidade em que predominam a vaidade e os interesses individuais
ou de grupos.

De modo análogo, pensemos nas empresas: não basta torcer por ela para mudá-la, mudar seu desempenho, sua cultura, a
performance das equipes. Para mudar é necessário ter poder; para que este seja legítimo é preciso ter propósito; para ter
propósito é importante unir-se em torno de valores; para ter valores é preciso praticá-los; e, enfim, para praticá-los é
preciso abrir mão da vaidade.

A vaidade é inimiga do trabalho em equipe. De forma semelhante, a falta de confiança, no caso de quem age movido por
interesse ou medo, é incompatível com a força do coletivo. Em uma equipe, são fundamentais o reconhecimento do papel
de cada um e a força do compromisso e da colaboração. Em um processo de mudança, por sua vez, cada um precisa
exercer com delicadeza, embora com firmeza, a sua autoridade - que não deve ser confundida com autoritarismo, do
mesmo modo que delicadeza e leveza não significam falta de assertividade.

Quando uma organização inicia um processo de mudança - e analogamente quando um país tão dividido como o Brasil de
hoje o faz, às vésperas das eleições -, é natural ter aquele desejo de que surja um "salvador da pátria". Se isso vale para um
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time de futebol (não sou expert nisso), também vale (e como!) para as equipes nas empresas. Esse desejo serve para que
grande parte das pessoas adore, mesmo que critique à boca pequena, ter como chefe um super-homem ou uma mulher-
maravilha. É aquele tipo de chefe que puxa para si todas as soluções (e que, aviso aos navegantes, fracassa no médio prazo,
ainda que seja bem-sucedido no curto prazo). Fracassa porque perde a inteligência coletiva, fracassa porque cria pessoas e
organizações imaturas e dependentes.

Melhor, portanto, que o ideal nos mova. Seja nas empresas, seja nos poderes da República, seja na família, seja entre
amigos e até no futebol, quando as pessoas se lançam a um objetivo por interesse ou vaidade o resultado já está escrito:
não vai dar certo.

Vale lembrar sempre que, não raramente, as pessoas se lançam de forma consertada e que o interesse e o medo podem ser
mais rápidos e ousados do que o ideal. Fique alerta!

Betania Tanure é doutora, professora e consultora da BTA

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