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IDENTIDADE E CULTURA - IC

Zygmunt Bauman
Identidade: entrevista a Benedetto Vecchi
Fonte: file:///C:/Users/PASTOR/Downloads/35757-83051-1-PB%20(2).pdf

Partindo da importância do atual debate público acerca da identidade, Zygmunt


Bauman, concedeu uma entrevista por e-mail ao italiano Benedetto Vecchi,
diferentemente dos meios convencionais. Sem a pressão do tempo e com pausas para
reflexões e esclarecimentos, o conteúdo foi tomando forma e transformou-se em um livro
publicado pela editora Zahar no ano de 2005. A obra é estruturada em formato de
entrevista ping-pong (perguntas e respostas), com característica de diálogo, tem apenas
introdução e um capítulo, totalizando 105 páginas. Sempre procurando estabelecer
conexões com fenômenos sociais ao invés de estabelecer conceitos, Bauman leva o leitor
a refletir sobre o tema intangível da Identidade.
A introdução foi feita pelo entrevistador Vecchi, onde o mesmo ressalta a
importância do trabalho desenvolvido por Baumam e justifica que devido à distância entre
ambos, o e-mail foi o instrumento escolhido para o diálogo. Para Vecchi, é impossível
definir as influências intelectuais ou o alinhamento a determinada escola de pensamento
do sociólogo. De acordo com o entrevistador, a metodologia usada por Baumam para
tratar tal assunto se dá através da análise dos contextos social, cultural e político “em que
um fenômeno particular existe, assim como o próprio fenômeno” (p. 8), buscando mostrar
a imensa conexão entre o objeto de investigação e as demais manifestações da vida na
sociedade humana. De fato, é essencial para o sociólogo colher a “verdade” de todo estilo
de vida e comportamento coletivo.
De origem polonesa, Baumam obteve sua participação no “outubro polonês” em
1956, participando do influente partido reformista que desafiou lideranças de partidos. Tal
experiência marcou o sociólogo e o preparou para confrontos ideológicos futuros. Foi
então, que veio 1968 e o mesmo foi proibido de lecionar na Polônia, por apoiar o
movimento dos estudantes e professores universitários, que lutavam pelo fim do sistema
unipartidário em nome de “liberdade, igualdade e fraternidade”. Desde então, mudou-se,
para Inglaterra e passou a lecionar na Universidade de Leeds. Fato este que fez o
sociólogo questionar sobre sua própria identidade, concentrando sua atenção no
fenômeno da globalização e analisando a identidade não somente do ponto de vista
econômico, mas, sobretudo, a vida cotidiana e os seus efeitos.
Durante esse período, publicou livros que se tornaram um panorama da
globalização, caracterizando uma grande transformação que afetaria as “estruturas
estatais, as condições de trabalho, as relações entre os estados, a subjetividade coletiva,
a produção cultural, a vida cotidiana, e as relações entre o eu e o outro” (p. 11). Alguns
dos livros publicados foram; Globalização: As consequências humanas (1998),
Comunidade (2000), A sociedade individualizada (2001), Modernidade Líquida (2000).
A ideia de identidade nasceu a partir da crise do pertencimento e do esforço que
este provocou. Emergiu como ficção e não como uma experiência humana, contou com
muita coerção para se consolidar e se tornar uma realidade. O Estado moderno,
aproveitando esse esforço, tornou um dever obrigatório a todas as pessoas que se
encontravam no interior de sua soberania territorial. Parafraseando Bauman, o “pertencer-
por-nascimento” significa que um acordo foi estabelecido para que o indivíduo
pertencesse a uma nação que foi imaginada e mediada por conceitos.
Tradicionalmente era atribuída aos indivíduos a definição de identidade a partir da
raça, país de nascimento e família, com o passar dos anos isso foi se destituindo ao
tempo que a construção da identidade foi sendo substituída por novos grupos que hoje
em dia tendem a ser eletronicamente mediados e onde se formaram as premissas sobre
as quais a sociedade moderna foi construída.
Segundo Bauman, a identidade exerce um papel fundamental hoje no mundo. Os
indivíduos passaram a criar a sua própria identidade e não mais a herdar. Não apenas
partem do zero, mas passam toda uma vida a redefinindo. O estilo de vida que é
considerado bom pela sociedade, os mais variados modelos de vida atrativa, que entram
na “moda”, mudam muitas vezes ao longo dos anos. A existência é divida em episódios
fragilmente conectados em um mundo individualizado.
No mundo de individualizações as identidades são ambíguas e oscilam na maior
parte do tempo. Dentro desse ambiente líquido moderno as identidades são
profundamente sentidas e estão no cerne da atenção dos indivíduos. E como
consequência, a sociedade moderna está atravessando a fase da identidade sólida para
uma identidade líquida e fluída. Entenda-se por fluído, tudo aquilo que é diluído, que
muda à medida que é influenciado por qualquer tipo de força, com estruturas frágeis, o
que é hoje já não é amanhã, um jogo sem regras, baseado na livre e espontânea
liberdade humana. Neste tipo de ambiente, tudo é imprevisível, não se sabe ao certo o
que esperar, se uma seca ou uma enchente. A identidade é composta de pedaços como
se fosse um quebra-cabeça e ela vai se encaixando uns nos outros, e para a grande
maioria não agir dessa forma seria apegar-se as regras, cuidar da coesão, não é uma
atitude muito agradável, a opção mais promissora parece ser, a de flutuar na onda das
oportunidades mutáveis e de curta duração.
Vivemos em uma era líquido-moderna, afirma Bauman, as relações interpessoais e
tudo que as acompanham amor, parecerias, compromissos, têm se transformado em
objetos de atração e apreensão, desejo e medo, tudo é instável, tudo é líquido. Mas nem
tudo sempre foi assim, houve um tempo em que amar significava compartilhar a vida,
fundir duas biografias, cada um com suas experiências e recordações. Mas como
sabemos, no amor não há garantia de satisfação plena, logo, os riscos passam a ser
completamente calculados e reduzidos ao modo consumista com breve tempo de
duração, para trazer satisfação instantânea. As pessoas passaram a tratar o amor como
objeto, algo facilmente substituído na sociedade de consumo. E, apesar desse modo
reduzido de relacionar-se, Bauman conclui, que precisamos de relacionamentos em que
seja possível ser útil, relacionamentos em que seja possível se definir, porque um
relacionamento no ambiente líquido moderno, é carregado de perigo.
Nesse reembaralhamento, onde as formas básicas de relacionamento social estão
passando por uma mutação considera-se a internet um terreno fértil tanto para se
construir uma identidade quanto para assumir qualquer uma que seja do seu agrado, as
identidades são feitas para serem usadas e exibidas, não para ser armazenadas. As
amizades e os engajamentos sociais são feitos muito rapidamente, com a mesma
velocidade que são construídos, são também desfeitos. Andy Hargreaves escreve que,
“estão cada vez mais substituindo as conversas familiares e os relacionamentos sólidos”
(p. 101). A tecnologia proporciona contatos facilitados e por isso, “perde-se a habilidade
de se engajar em interações espontâneas com pessoas reais” (p. 101).
Identidade trata-se de um livro que na verdade é um conjunto de teorias sobre o
mundo a partir da globalização e das transformações que está impôs a sociedade. A visão
de Bauman também é uma construção social, não mais importante ou determinante que
outras construções. São muito pertinentes às colocações do autor sobre o tempo em que
estamos vivendo. Considero importante, ampliar os debates e os efeitos dessa
modernidade líquida, citada pelo sociólogo sobre a sociedade pós-moderna e o seu
conjunto de pensamentos contemporâneos. Bauman afirma diversas vezes, que assim
como a vida, os relacionamentos e tudo que os acompanha são líquidos, instável, e de
pouca duração, com breve momento de satisfação, nada é sólido e continuado. Mas, ao
contrário do que pensa Bauman, nem tudo é líquido, as pessoas são capazes de criar
vínculos sólidos no cotidiano, manter relacionamentos duradouros e até mesmo ser
estáveis. Sem dúvida, a obra convida o leitor para conhecer outras produções do
sociólogo e tentar entender seu ponto de vista sobre o pensamento atual.

Identidade –
Entrevista a Benedetto Vecchi(Zygmunt Bauman)

O autor é sociólogo de formação e polonês. Iniciou sua carreira na Universidade de


Varsóvia, onde teve artigos e livros censurados e em 1968 foi afastado da universidade.
Logo em seguida emigrou da Polônia, reconstruindo sua carreira no Canadá, Estados
Unidos e Austrália, até chegar à Grã-Bretanha, onde em 1971 se tornou professor titular
da Universidade de Leeds, cargo que ocupou por vinte anos. Responsável por uma
prodigiosa produção intelectual, recebeu os prêmios Amalfi (em 1989, por sua obra
Modernidade e Holocausto) e Adorno (em 1998, pelo conjunto de sua obra). Atualmente é
professor emérito de sociologia das universidades de Leeds e Varsóvia.
Ninguém melhor que um exilado para, através de um olhar crítico e perspicaz tecer
suas considerações sobre identidade, ainda que traga consigo certo rancor e
ressentimento pelo exílio.
Bauman inicia o conceito de comunidades atuais como modelos de totalidades virtuais,
onde é fácil entrar e ser abandonado. Essa práxis se observa nas pessoas falando em
seus celulares com fone de ouvidos, como se fechadas numa redoma ou bolha de vidro,
cegas e indiferentes ao seu entorno.
Nesse contexto o autor ainda destaca o que chama de “comunidades guarda
roupa” onde ocorre a identificação de grupos através de eventos espetaculares ou
escandalosos – efêmeros por natureza – com precariedade de compromisso necessário
para ingresso. Pode-se relacionar a este tipo de vínculo a imensa quantidade de
comunidades virtuais que temos atualmente nos sites de relacionamento (orkut....).
A metaidentidade caí em detrimento de ressentimentos sociais órfãos, onde cada
categoria em desvantagem fica por sua própria conta, abandonados aos próprios recursos
e engenhosidade.
Merece destaque o conceito de sub-classes, pessoas a quem é negado o direito de
reivindicar uma identidade distinta da classificação atribuída e imposta.
Interessante como, através da argumentação, o autor cria o pano de fundo para
falar sobre o fenômeno do fundamentalismo. Ligado a este fenômeno encontra-se o
fenômeno atual do capitalismo: produção de pessoas rejeitadas “lixo humano”, mudando
a situação de um sistema de exploração para um sistema de exclusão, caracterizando um
novo tipo de polarização social.
Para o capitalismo atual o poder de coerção já não é tão valorizado, a sociedade deseja
apenas que você continue no jogo e tenha fichas para permanecer jogando.
Quando questionado por seu entrevistador se a formação da identidade se
assemelha a um jogo de quebra cabeça o autor discorda da afirmação, se utilizando de
um conceito expresso nas pinturas do pintor americano Jackson Pollock.
Na discussão sobre modernidade a argúcia do autor se mostra mais uma vez
afiada ao caracterizar o “deixar de ser moderno”: modernizar-se, parar de, “baixar as
mãos” e parar de remendar o que você é e que é o mundo em sua volta.
O autor ainda discute questões como a volatilidade das relações amorosas e
termina sua obra nos alertando para o perigo de tentarmos construir uma identidade com
base nos estereótipos e modelos de atitude e comportamento que nos são colocados
permanentemente pela mídia de massa e especializada.

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