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O Fundamento da Existência do processo Penal: Instrumentalidade Constitucional

Curso de Processo Penal – Fernando Capez.


Introdução Crítica ao Processo Penal – Aury Lopes Júnior.
Manual de Processo Penal – Vicente Greco Filho.
Processo Penal – Sistemas e Princípios – José Laurindo de Souza Netto.
Teoria do Direito Processual Penal – Rogério Lauria Tucci.

A imposição de uma pena pressupõe a existência de um processo? Se o ius puniendi


corresponde ao Estado, que tem o poder soberano sobre seus súditos, que acusa e também julga por
meio de distintos órgãos, pergunta-se: por que necessita que prove seu direito em um processo? A
resposta passa, necessariamente, por uma leitura constitucional do processo penal. A uma constituição
autoritária vai corresponder um processo penal autoritário, utilitarista. Contudo, a uma Constituição
democrática, necessariamente deve corresponder um processo penal democrático, que respeite o direito
de ambas as partes.

Princípio da Necessidade do Processo em Relação à Pena.


A titularidade exclusiva por parte do Estado do poder de impor uma pena surge no
momento em que é suprida a vingança privada e são implantados os critérios de justiça.
O Estado, como ente jurídico e político, avoca para si o direito (e o dever) de proteger a
comunidade e também o próprio réu, como meio de cumprir sua função de procurar o bem comum, que
se veria afetado pela transgressão da ordem jurídico-penal, por causa de uma conduta delitiva.
Frente à violação de um bem juridicamente protegido, não cabe outra atividade que não a
invocação da devida tutela jurisdicional. Impõe-se a necessária utilização da estrutura preestabelecida
pelo Estado - o processo judicial - em que, mediante a atuação de um terceiro imparcial, cuja designação
não corresponde à vontade das partes e resulta da imposição da estrutura institucional, será apurada a
existência do delito e sancionado o autor. O processo, como instituição estatal, é a única estrutura que
se reconhece como legítima para a imposição da pena.
Existe um monopólio da aplicação da pena por parte dos órgãos jurisdicionais e isso
representa um enorme avanço da humanidade. Assim, fica estabelecido o caráter instrumental do
processo penal com relação ao direito Penal e à pena, pois o processo é o caminho necessário para a
pena.

Instrumentalidade do processo Penal.


Um processo penal que não possa gerar pena alguma é inconcebível. Por vezes, aparecem
processos penais que são apenas geradores de estigmatização e degradação, atuando como pena em si
mesmo.
É fundamental compreender que a instrumentalidade do processo não significa que ele seja
um instrumento a serviço de uma única finalidade, qual seja a satisfação de uma pretensão (acusatória).
Ao lado dela, está a função constitucional do processo, como instrumento a serviço da
realização do projeto democrático e não de defesa social.
Com isso, conclui-se que a instrumentalidade do processo penal é o fundamento de sua
existência, mas com uma especial característica: é um instrumento de proteção dos direitos e garantias
individuais. É uma especial conotação do caráter instrumental e que só se manifesta no processo penal,
pois se trata de instrumentalidade relacionada ao direito Penal e à pena, mas, principalmente, a um
instrumento a serviço da máxima eficácia das garantias constitucionais.

Tipos de Processo Sistemas Acusatório e Inquisitório. Sistema Misto.


Na história do direito se alternaram as mais duras opressões com as mais amplas liberdades.
É natural que nas épocas em que o Estado viu-se seriamente ameaçado pela criminalidade o direito penal
tenha estabelecido penas severas e o processo tivesse que ser também inflexível. Os sistemas processuais
inquisitivo e acusatório são reflexo da resposta do processo penal frente às exigências do Direito Penal
e do Estado da época.
Cronologicamente, em linhas gerais, o sistema acusatório predominou até meados do
século XII, sendo posteriormente substituído, gradativamente, pelo modelo inquisitório que prevaleceu
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com plenitude até o final do século XVIII (em alguns países, até parte do século XIX), momento em
que os movimentos sociais e políticos levaram a uma nova mudança de rumos.

Sistema acusatório.
Surgiu basicamente no direito Grego e Romano, tendo como características:
a) a atuação dos juízes era passiva;
b) as atividades de acusar e julgar estão encarregadas a pessoas distintas;
c) adoção do princípio no procedat iudex ex officio, não se admitindo a denúncia anônima nem processo
sem acusador legítimo e idôneo;
d) previsão do delito de denunciação caluniosa;
e) acusação era por escrito e indicava as provas;
f) havia contraditório e direito de defesa;
g) o procedimento era oral;
h) os julgamentos eram públicos, com os magistrados votando ao final sem deliberar.

Na atualidade, a forma acusatória possui as seguintes características:


a) clara distinção entre as atividades de acusar e julgar;
b) iniciativa probatória deve ser das partes;
c) o juiz é um terceiro imparcial;
d) tratamento igualitário das partes;
e) procedimento é em regra oral;
f) plena publicidade de todo o procedimento;
g) contraditório e possibilidade de resistência (defesa);
h) a sentença deve ser proferida pelo livre convencimento motivado do órgão jurisdicional;
i) atendimento a critérios de segurança jurídica da coisa julgada;
j) possibilidade de impugnar as decisões e o duplo grau de jurisdição.

Sistema Inquisitório.
O sistema inquisitório, na sua pureza, é um modelo histórico. Até o século XII,
predominava o sistema acusatório. Essa substituição foi fruto, basicamente, dos defeitos da inatividade
das partes, levando à conclusão de que a persecução criminal não poderia ser deixada nas mãos dos
particulares, pois isso comprometia seriamente a eficácia do combate à delinquência.
Os poderes do magistrado foram posteriormente invadindo cada vez mais a esfera de
atribuições reservadas ao acusador privado, até o extremo de se reunir no mesmo órgão do Estado as
funções que hoje competem ao Ministério Público e o Juiz.
O sistema inquisitório muda a fisionomia do processo de forma radical. O que era um duelo
leal e franco entre acusador e acusado, com igualdade de poderes e oportunidades, se transforma em
uma disputa desigual entre o juiz-inquisidor e o acusado.
Frente a um fato típico, o julgador atua de ofício, sem necessidade de prévia invocação, e
recolhe (também de ofício) o material que vai constituir seu convencimento.
O processado é a melhor fonte de conhecimento e, como se fosse uma testemunha é
chamado a declarar a verdade sob pena de coação.
O juiz atua como parte, investiga, dirige, acusa e julga. Com relação ao procedimento,
era escrito, secreto e não contraditório.
No transcurso do século XIII foi instituído o Tribunal da Inquisição ou Santo Ofício (ano
de 1201 com Inocêncio III, para perseguir hereges na Espanha), para reprimir a heresia e tudo que fosse
contrário ou que pudesse criar dúvidas acerca dos Mandamentos da Igreja Católica.
A lógica inquisitorial está centrada na verdade absoluta e, nessa estrutura, a heresia era o
maior perigo, pois atacava o núcleo fundante do sistema. Fora dele não havia salvação. Isso autoriza o
“combate a qualquer custo” da heresia e do herege, legitimando até mesmo a tortura e a crueldade nela
empregada. O herege, explica Leonardo Boff, não apenas se recusa a aceitar o discurso oficial, senão
que cria novos discursos a partir de novas visões.
Surgiram em determinados lugares, especialmente nas Igrejas, determinados lugares,
gavetas ou caixas, destinadas a receber as denúncias anônimas de heresia. O que se buscava era
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exclusivamente punir o pecado e a heresia, em uma concepção unilateral do processo. Uma vez obtida
a confissão, o inquisidor não necessita de mais nada, pois a confissão é a rainha das provas.
O sistema inquisitório predominou até o final do século XVIII, início do século XIX,
momento em que a Revolução Francesa, os novos postulados de valorização do homem e os movimentos
filosóficos que surgiram com ela repercutiam no processo penal, removendo paulatinamente as novas
características do modelo inquisitivo.
Livros: O Queijo e os Vermes – Carlo Ginzburg – Editora Companhia das Letras; O Nome
da Rosa – Umberto Eco.
Filmes: O Nome da Rosa; Joana D’Arc; Giordano Bruno.

Sistema Misto.
Há uma fase inicial inquisitiva, na qual se procede a uma investigação preliminar e a uma
instrução preparatória, e uma fase final, em que se procede ao julgamento com todas as garantias do
processo acusatório.
Ele é bifásico, sendo que na primeira (preliminar), não há contraditório e é sigilosa; já na
segunda (instrução), caracteriza-se como o sistema acusatório, com contraditório e ampla defesa.
Surgiu com o Code d’Instruction Criminelle (Código de Processo Penal) francês, em 1808.

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