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A razão do coração e o coração da razão.


(Blaise Pascal e o Pensamento Complexo)

Humberto Mariotti

Formam-se a mente e o sentimento pelas conversações; corrompem-se a mente


e o pensamento pelas conversações
(Blaise Pascal)

Introdução
A exemplo do que escrevi sobre Espinosa1, o propósito deste ensaio é mostrar a influência do
pensador francês Blaise Pascal sobre as ideias de Edgar Morin, também francês. Hoje, pode-se afirmar
que Morin é o fundador do que proponho denominar de Escola Latina do pensamento complexo.
Trata-se de um vasto painel de ideias, cujas aplicações práticas a vários campos da atividade humana
(à educação e ao universo das empresas, por exemplo) começam a se tornar conhecidas e aceitas.

Minha proposta consiste em analisar alguns aspectos do pensamento pascaliano: sua estratégia de
raciocínio, seu modo de lidar com o diálogo ordem-desordem, a aleatoriedade e a incerteza e, em
especial, com os paradoxos. Ao mesmo tempo, procurarei mostrar como tudo isso foi essencial para a
estruturação do pensamento complexo, tal como concebido e formulado por Morin. Trata-se de uma
influência profunda e importante, o que justifica sua apresentação e discussão.

Port-Royal e o jansenismo
Blaise Pascal nasceu em 1623 em Clermont, hoje Clermont-Ferrand, e morreu em Paris em 1662, aos
39 anos. Portanto, ainda mais jovem do que Espinosa, que faleceu aos 45. Foi um gênio precoce, em
especial em matemática e física. Mesmo depois de ter passado a se interessar por questões religiosas,
em especial pelo cristianismo, não deixou de lado sua inclinação científica.

Não se pode afirmar que ele tenha sido um filósofo no sentido rigoroso da palavra. Não foi, por
exemplo, um pensador metafísico profundo, nesse mesmo sentido. Há mesmo quem veja nele um
negador da metafísica. Mas também não há dúvida de que sua obra comporta uma postura filosófica. E
por isso, até mesmo em homenagem à sua prodigiosa inteligência, vale tratá-lo como um filósofo.

Também nessa ordem de ideias, é possível considerá-lo um provocador, um estimulador de reflexões.

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A seu ver, a filosofia não é capaz de proporcionar conhecimentos que sirvam de base para uma
orientação de vida: só a revelação e a fé podem fazer isso. Portanto, resta à investigação filosófica a
tarefa de aprofundar a dimensão antropológica. Assim, o empenho pascaliano se voltou para o estudo
da condição humana e suas relações com o mundo. Nesse sentido ele é um continuador de Montaigne
que, como Sócrates, Descartes, Kant e Heidegger, acreditava que o ser humano é o ponto central da
especulação filosófica.

Mas o racionalismo, nascido no século 17, desenvolvido no século 18 e consolidado no mecanicismo


científico do século 19, esvaziou a afirmativa de Montaigne e fez com que o homem deixasse de ser o
tema principal da filosofia. O pensamento de Pascal foi uma reação contra o início desse processo. Se
por um lado ele não conseguiu reconduzir o ser humano ao posto que ocupava em relação à filosofia,
de outra parte deixou reflexões fundamentais sobre os limites da razão, que, segundo afirmava, são
também os limites do homem. Mas acontece, infelizmente, que tais limitações quanto mais evidentes
se tornam menos são entendidas (ou sequer percebidas) pela maioria das pessoas.

Dessa forma, num século em que se dava primazia à razão, Pascal caminhou na direção contrária:
“Conhecemos a verdade não apenas pela razão, mas também pelo coração. É desta ultima maneira que
conhecemos os primeiros princípios, e é em vão que o raciocínio, que não toma parte nisso, tenta
combatê-los”.2

Mas ele não nega a razão: apenas faz notar que ela tem limites e que, sobretudo, é de pouca ou
nenhuma valia quando se trata de lidar com questões emocionais e religiosas: “O último passo da
razão é reconhecer que há uma infinidade de coisas que a ultrapassam”.3

A obra de Pascal é vasta. Para os objetivos deste ensaio, porém, sua parte mais interessante está
contida nos Pensamentos.4 Para entender esse filósofo, convém falar um pouco sobre o jansenismo.
Aliás, foi por influência dos jansenistas que ele se tornou um questionador da razão e da própria
filosofia.

O holandês Cornelius Jansen, ou Jansenius (1585-1638), bispo de Ypres, tentou promover uma
reforma do cristianismo. Tratava-se, em essência, de um retorno às ideias de Santo Agostinho — uma
visão rigorosa da natureza humana e da questão da graça divina. Em sua opinião, a teologia deveria
fundamentar-se na autoridade e não na racionalidade. Havia duas correntes jansenistas. Para a mais
estrita, o verdadeiro cristão e o genuíno membro do clero deveriam afastar-se da vida política e social.
O mundo deveria ser evitado. A salvação viria por meio do retiro e do isolamento. A outra tendência
adotava a militância religiosa.

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Em 1640 surgiu a obra Augustinus, da autoria de Jansenius e de publicação póstuma. Esse liivro
provocou uma acirrada polêmica e acabou condenado pelo Vaticano. Naquela época existia em Paris a
abadia de Port-Royal, que havia sido fundada em Porrois, perto da capital francesa. “Port-Royal” é
uma corruptela do nome dessa localidade. Quando a abadia se instalou também em Paris, a instituição
de Porrois passou a chamar-se de Port-Royal des Champs. Uma e outra eram locais de retiro, estudo e
reflexão, e os que lá se recolheram passaram a ser chamados de “os solitários”.

No grupo dos “solitários” destacam-se Antoine Arnauld, falecido em 1694, e Pierre Nicole, morto no
ano seguinte. É da autoria dos dois uma obra muito festejada: La logique ou l’art de penser (A lógica
ou a arte de pensar), que se tornou também conhecida como "lógica de Port-Royal". A orientação
desse livro é no fundo aristotélica e cartesiana. Na opinião de alguns comentadores, apesar de sua
fama, não se pode dizer que ele tenha trazido contribuições de vulto ao conhecimento da lógica.

Embora as ideias de Jansenius e as de Port-Royal não coincidissem totalmente, a abadia ficou


conhecida como um reduto jansenista, ao qual Pascal acabou por se incorporar. As posições
jansenistas incluíam em especial a condenação aos jesuítas, por eles considerados muito lenientes e
concessivos, em especial quando se tratava de fazer proselitismo.

A condenação do Vaticano ao jansenismo não deixou de incluir as habituais perseguições. Os


jansenistas foram declarados heréticos. Procurado pela polícia, Arnauld teve de passar à
clandestinidade. Pascal se envolveu nessa controvérsia por meio de suas Cartas provinciais, no início
publicadas sem menção da autoria e por isso objeto de investigação de gráfica em gráfica, com o
intuito de descobrir e punir seu autor. Às Cartas (foram 18) não faltavam qualidades literárias. Há
quem compare o humor de algumas delas ao de Molière e Proust.5 Aliás, hoje existe o consenso de que
Pascal foi o primeiro grande prosador da França. Com ele começou a polêmica de ideias como gênero
literário.

Os Pensamentos
Há quem ache que a leitura dos Pensamentos não permite definir com clareza que tipo de obra o
filósofo na realidade escreveu ou queria escrever. No entanto, muitos dos fragmentos que compõem o
texto, grande parte deles dedicados a questões relativas à fé e à religião, estão inacabados ou são
obscuros, o que revela a intenção de continuidade ou aprofundamento.

A primeira edição dos Pensamentos, a chamada edição de Port-Royal, surgiu em 1658. O livro deveria
ser uma apologia da religião cristã, mas a doença e, por fim, a morte do autor, o impediram de
terminar o projeto. Por outro lado, há quem veja nessa obra outra vertente de ideias. Nesse sentido, os

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aspectos antropológicos e ontológicos de muitos dos fragmentos assumem grande importância, pois
traduzem a visão pascaliana do homem como um ser lançado a um mundo muito difícil de entender.

Tal dificuldade se estende ao próprio homem, em especial o fato de ele ser formado por duas naturezas
opostas, e também o de seu corpo estar ligado a um espírito. Sobre este último obstáculo, Pascal leu
em Santo Agostinho: “A maneira como o espírito está unido ao corpo não pode ser compreendida pelo
homem e, no entanto, isso é o próprio homem”.6 Nos dias atuais, esse tema vem sendo investigado
pela ciência cognitiva.

O todo e as partes
Nos escritos de Edgar Morin há muitas menções explícitas e implícitas a Pascal, a começar pelo que se
refere às relações entre o todo e as partes. Lembremos o conhecido fragmento pascaliano: “Sendo
todas as coisas causadas e causantes, ajudadas e ajudantes, mediatas e imediatas, e todas se mantendo
por um laço natural e insensível que liga as mais afastadas e as mais diferentes, tenho como
impossível conhecer as partes sem conhecer o todo, assim como conhecer o todo sem conhecer
particularmente as partes”.7

Em termos atuais, pode-se dizer que essa frase contém alguns dos conceitos fundamentais do
pensamento complexo ou a ele relacionados. Exemplos: a) a circularidade causa-efeito, isto é, a
retroação do efeito sobre a causa, com sua conseqüente realimentação (feedback); b) o princípio de
Ernst Mach, questionado mas não invalidado por Einstein e outros, que diz que a inércia de um corpo
é determinada por sua relação por todos os corpos do universo.

Pascal sustenta que a natureza ama a unidade, e a procura até mesmo por meio da junção de coisas que
na aparência estão muito distantes umas das outras. O princípio de Mach se refere a isso; c) o mesmo
vale para o princípio hologramático, de Morin e David Bohm, que diz que as partes estão no todo mas
o todo também está em cada uma de suas partes. Aliás, segundo Pascal a humanidade deve ser vista
como um único ser humano, que se mantém ao longo do tempo e aprende sem cessar.

Relacionam-se a todas essas noções algumas ideias hoje muito mencionadas (e não menos
necessárias). Lembremos três delas: a) a tolerância, da qual fala com frequência Jürgen Habermas; b) a
hospitalidade, que segundo Jacques Derrida vai além da tolerância; c) a ética do acolhimento, variante
da ideia de holding environment (ambiente de apoio), introduzida pelo psicanalista inglês Donald
Winnicott. Daí a necessidade do respeito à diversidade biológica, à multiculturalidade e à
multiplicidade dos comportamentos humanos e animais. Nada disso, porém, é incompatível com a
existência de princípios organizadores e com a possibilidade de vários tipos de ordem.

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A razão e o coração
De acordo com o filósofo, a razão isolada, separada da emoção, da intuição e dos sentimentos não
passa de um racionalismo árido. É o que Morin chama de razão estéril e auto-referenciada. Essa
mesma posição se encontra também em Espinosa, contemporâneo de Pascal e como este influenciado
por Descartes, embora isso nem de longe signifique concordância irrestrita.

O que Pascal chama de razão é o método silogístico de Aristóteles, que ele vê como limitado e
limitador. E assim é porque não leva em conta que além da razão (raison) existem também as
emoções, o coração (coeur). É pascaliana a conhecida frase “o coração tem razões que a razão
desconhece”, cuja versão completa requer o acréscimo de mais cinco palavras: “Sabe-se disso em mil
coisas”.8 O coeur é intuitivo; é a percepção instintiva, direta e imediata dos princípios.

É também pascaliana (e espinosana) a ideia de que nossas percepções do mundo começam como
emoções e depois assumem a forma de sentimentos. Foram essas as conclusões a que também chegou
o neurocientista António Damásio, da Universidade de Iowa, EUA. Segundo Damásio, as emoções
estão incluídas entre os mecanismos básicos de regulação da vida. Seus estudos clínicos e
experimentais fizeram-no concluir que elas são fenômenos que acontecem no corpo. Já os sentimentos
ocorrem “no teatro da mente”.9

Desse modo, primeiro as emoções estimulam o corpo; a seguir chegam à consciência, isto é, nós as
sentimos; por fim falamos a seu respeito, conversamos sobre esses sentimentos. Mas esses achados de
clínica e laboratório, como observa Damásio, não nos devem levar à falsa conclusão de que corpo e
mente são separados. Como Espinosa, esse pesquisador sustenta que trata-se de modos diferentes de
apresentação de uma mesma substância.

A essas percepções iniciais (as emoções) Pascal chama de “conhecimento dos primeiros princípios”.
Já vimos que em sua opinião o conhecimento da verdade nos chega não apenas mediante a razão mas
também pelo coeur, isto é, por meio das emoções e dos sentimentos. É pelo coração, não pela mente,
que tomamos conhecimento desses “primeiros princípios” ou “verdades principais”. O conhecimento
proporcionado pelas emoções e sentimentos é mais firme do que o obtido via razão.

No entanto, o coeur pascaliano nada tem a ver com as paixões: o filósofo as condenava e propunha o
desapego. O coeur não é uma dimensão afetiva: é uma inteligência, um modo de percepção que nos
leva ao conhecimento global, imediato, intuitivo. A razão explica, o coração compreende. Mas uma e
o outro não se excluem. Ao contrário, fertilizam-se mutuamente: o coração constrói a base sobre a

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qual a razão deve se apoiar. A fé pertence a esse âmbito. Entretanto, Julián Marías10 observa que o
coeur de Pascal nada tem a ver com pieguices nem traduz qualquer espécie de sentimentalismo.

A questão do ego
Em relação à neurociência, convém acrescentar algumas palavras sobre a questão do ego, tema para o
qual Pascal abriu uma trilha importante, que acabou por desaguar na moderna ciência cognitiva. Eis a
sua indagação: “Por que alguém amaria a substância da alma de uma pessoa, abstratamente, e algumas
qualidades nela existentes? Isso não é possível e seria injusto. Portanto, nunca se ama ninguém, mas
somente qualidades”.11

Esse fragmento dos Pensamentos começa com outra pergunta, não menos provocadora: “Onde está
então esse eu, se não está no corpo nem na alma? E como amar o corpo ou a alma, senão por essas
qualidades que não são o que fazem o eu, pois que são perecíveis?”12

Em termos de filosofia ocidental, esse talvez tenha sido o primeiro questionamento claro e direto da
existência do ego tal como o imaginamos. Tempos depois, no seu Tratado da natureza humana,
publicado em 1739/1740, o filósofo escocês David Hume (que escreveu essa obra aos 26 anos de
idade) proporia uma resposta: “De minha parte, quando entro mais intimamente no que chamo de mim
mesmo, sempre tropeço em uma ou em outra percepção específica: calor ou frio, luz ou sombra, amor
ou ódio, dor ou prazer. Não consigo, em nenhum momento, apanhar a mim mesmo sem uma
percepção, e jamais consigo observar nada além de percepções”.13

Essa passagem é famosa. Com ela, Hume nega nossa ideia de “eu” (ego, self). Para ele, tudo o que
conseguimos observar são nossas percepções e sensações, jamais o “eu” que, segundo imaginamos,
seria o sujeito delas. Não existe, como pensa nossa cultura ocidental, um ego separado, fixo,
persistente, diante do qual desfilam ideias, sensações e percepções.

Há milênios as tradições orientais, inclusive o budismo, já haviam chegado a essa conclusão. E agora,
milênios depois delas e séculos depois de Pascal e Hume, a ciência cognitiva atual também assim
concluiu. Em meio á extensa literatura sobre o assunto, lembremos alguns autores.

Daniel Dennett14 compara o funcionamento do cérebro humano ao de uma colônia de cupins, cujo
funcionamento organizadíssimo faz supor a existência de um comando central, uma “alma”, quando
na verdade é o resultado da interação de todos os indivíduos da comunidade. Do mesmo modo, a
“alma” ou o ego humano são apenas nomes que designam o funcionamento da rede de neurônios do
tecido cerebral.

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Para Patrícia Churchland,“não existe uma pessoazinha no cérebro que ‘vê’ uma tela interna de
televisão, ‘ouve’ uma voz interior, ‘lê’ mapas topográficos, raciocina, decide como agir e assim por
diante. Há apenas neurônios e suas conexões”.15 Para ela, a inteligência do cérebro não pode ser
explicada pela inteligência de um “eu”, mas sim pelo funcionamento do conjunto dos neurônios.

Dados mais recentes, e na mesma linha, foram apresentados e discutidos por V.S. Ramachandran,
diretor do Centro do Cérebro e Cognição da Universidade da Califórnia em San Diego.16 Em suma, ao
que tudo indica o que existe de fato são os processos do pensamento. O que chamamos de ego é o
conjunto dos resultados desses processos — como disse Pascal.

Os dois diálogos
Pascal influenciou Morin também no que se refere à dialógica. A propósito, convém relembrar aqui a
diferença entre dialógica e dialética, que algumas pessoas têm dificuldade de entender e outras
imaginam inexistente. O escritor francês Paul Valéry, por exemplo, caiu nesse equívoco quando
escreveu que Pascal havia escolhido ser vago a ser exato.17 Na realidade, ele parece ter confundido
pensar com clareza com pensar apenas segundo o raciocínio binário — a lógica do “ou/ou” ou lógica
do terceiro excluído. No mesmo engano incorreram outros comentadores da obra pascaliana. Mas a
diferença existe, sim, e a ideia de dialógica é apresentada com clareza em várias passagens dos
Pensamentos.

Na dialética, como se sabe, o formato é a tríade tese, antítese e síntese. A síntese é a resolução, o
resultado do embate entre a tese e a antítese. Desse modo, pode-se dizer que a contradição se resolve
por meio de uma espécie de negociação que leva a um acordo. O choque entre os opostos é
solucionado pelo surgimento de uma terceira figura. Já na dialógica não é possível chegar a uma
resolução, pois as características dos contrários tornam o confronto inegociável e por isso eles
precisam conviver num diálogo sem fim. Um dos critérios, talvez o mais eficaz, para fazer essa
diferenciação é a duração do diálogo. Na dialética ele é temporário, tem início meio e fim. Na
dialógica, precisa continuar indefinidamente.

Morin assim define a dialógica: “Unidade complexa entre duas lógicas, entidades ou instâncias
complementares, concorrentes e antagonistas, que se nutrem uma da outra, completam-se, mas
também se opõem e se combatem. (...) Na dialógica, os antagonismos persistem e são constitutivos das
entidades ou fenômenos complexos”.18 Trata-se, portanto, de opostos ao mesmo tempo antagônicos e
complementares, como os princípios masculino e feminino, a razão e a emoção.

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Ou, como escreveu Nietzsche em seu primeiro livro19, trata-se da relação entre os princípios apolíneo
e dionisíaco. Para esse filósofo, a cultura da Grécia clássica comportava dois pólos. O apolíneo seria o
controlado, o racional, da ordem, da contenção. O dionisíaco seria o bárbaro, da paixão, do desejo
incontido. Essa interação produz conflitos, mas também gera criatividade: o apolíneo precisa do
dionisíaco e a recíproca é verdadeira. Nas palavras de Pascal: “Nem a contradição é a marca da
falsidade, nem a não-contradição é a marca da verdade”.20

Em suma, a dialógica é um modo de fazer com que os paradoxos não apenas sejam admissíveis, mas
de perceber as ideias novas que muitas vezes deles emergem. É o que diz Gérard Lebrun, para quem o
objetivo da dialógica não é solucionar contradições, mas sim tornar pensáveis os paradoxos: “Pascal é
‘dialético’ somente na aparência e numa primeiríssima aproximação. Certamente, sua estratégia é de
tal ordem que combina proposições que parecem excluir-se”.21

Mas lidar com paradoxos (e não há nada mais paradoxal do que o ser humano e suas sociedades) é
coisa de que não gostamos, porque nos confronta com a inevitabilidade da dúvida, da incerteza, da
dificuldade de controle. Nossa cultura cartesiana e iluminista nos convenceu de que podemos dominar
a natureza, inclusive a nossa própria. E nos forneceu incontáveis instrumentos de auto-engano para
manter-nos convencidos disso, mesmo quando somos (como acontece todos os dias) postos diante de
evidências de que esse domínio está muito longe de ser tão completo quanto desejamos. Com efeito,
não tem sido outra a função da chamada “ideia de progresso” da modernidade.

Entre ser sempre fortes ou sempre fracos, optamos pela primeira hipótese: queremos ser sempre fortes,
controladores, racionais e “exatos”. Mesmo quando tudo à nossa volta nos mostra que somos fortes e
fracos — não uma coisa ou outra —, e que há momentos e circunstâncias em que é preciso aceitar o
erro, a aleatoriedade e a ambiguidade. Aceitá-los e reconhecer que eles são meios de
autoconhecimento, que nos ensinam a tolerância (não confundir com permissividade), a moderação
(não confundir com auto-repressão) o senso de ridículo (não confundir com timidez) a firmeza de
posições (não confundir com narcisismo). Buscar, enfim, a sabedoria de viver, que inclui tudo isso
mas a nada disso pode ser reduzida.

Eis uma das grandes descobertas de Pascal: ele mostra que os opostos ao mesmo tempo antagonistas e
complementares são parte inalienável da condição humana. Vê em nossa condição a coexistência de
grandeza e miséria e entende que a natureza humana corrupta é inseparável da grandeza humana. São
condições opostas e complementares. Essa é a tese pascaliana fundamental: a grandeza do homem é
sua faculdade de pensar, sua fragilidade é sua miséria: “O homem não é senão um caniço, o mais fraco
da natureza, mas é um caniço pensante”.22

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A ideia da ambiguidade do ser humano fez de Pascal um precursor do pensamento existencial e


influenciou, por exemplo, Albert Camus e sua filosofia do absurdo. Por outro lado, a ideia pascaliana
de que o homem é um ser lançado ao mundo sem saber por que razão, na certa deve ter inspirado o
conceito de “ser-aí”, de Heidegger. Na condição de caniço, de junco (um roseau pensant), o ser
humano torna-se grande quando reconhece a sua miséria, o que deveria impedi-lo de se mostrar
arrogante, prepotente e predatório pela supervalorização dessa mesma grandeza.

A compreensão da ambiguidade da condição humana exige que aprendamos a lidar com essa e muitas
outras contradições não solucionáveis pela dialética. Já vimos que quando o diálogo de duração
limitada não soluciona uma contradição, é preciso levá-lo adiante, não desistir dele, perpetuá-lo enfim.
Essa é uma forma de lidar com a incerteza e a aleatoriedade, e de aceitar diferenças. Nesse sentido,
pode-se dizer que Pascal é também um precursor de uma das bases daquilo que hoje se conhece como
o método do diálogo, desenvolvido em especial pelo físico americano David Bohm.

A estratégia pascaliana consiste em ir até onde for possível com o pensamento lógico-seqüencial e, por
fim, questionar os pressupostos que orientam esse raciocínio. Questionar não os argumentos, mas o
modelo mental em que eles se baseiam.23 Em outras palavras: questionar o passo-a-passo do
pensamento para mostrar que o equívoco está nos pressupostos, nos juízos prévios. Estes, como
propunha Montaigne, deveriam ser suspensos ao menos momentaneamente para que algo de novo
pudesse surgir e ser percebido e aprendido.

Se com a metáfora do junco pensante Pascal reconhece a coexistência em nós da grandeza e da


miséria, por outro lado ele afirma que é mediante a revelação divina que esses contrários podem ser
harmonizados, isto é, mantidos em constante diálogo. Para tanto, a seu ver a antropologia deve se
transformar em uma teologia. O ser humano não pode ser só grandeza, como queria Epicteto (um
estóico dogmático), ou apenas miséria, como afirmava Montaigne (um cético que, como acabamos de
ver, propunha como meio de conhecimento a suspensão dos juízos sobre todas as coisas).

Entre os opostos Epicteto e Montaigne, Pascal ficava com o paradoxo: o homem não é grande ou
miserável; ele comporta ao mesmo tempo grandeza e miséria: “O homem conhece-se na pessoa de
Cristo, o homem-deus, imagem do acordo dos contrários que o constitui”.24

Assim, ao contrário de Espinosa, Pascal vê na religião — no caso, o cristianismo — um instrumento


para a compreensão da complexidade. Em sua opinião, para pô-lo em prática é preciso que
acreditemos nas verdades reveladas, na transcendência, no sobrenatural. Nessa linha de raciocínio, o
exemplo pascaliano de uma situação que inclui opostos a um só tempo antagonistas e complementares
é, como acabamos de ver, a figura de Cristo, o homem-deus. Nele conviveram o humano e o divino,

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dois opostos que se contradisseram mas também se alimentaram mutuamente.

No entender de Pascal, a essência de Cristo está “na sutura de discursos que se excluem, no campo que
os mantém juntos sem os articular logicamente nem os compor dialeticamente”.25 Desse modo, no ser
humano a oposição entre grandeza e miséria não é dialética, pois não há como resolvê-la. Ela é
dialógica e ajuda a compreender a ambiguidade inerente à nossa condição. Trata-se, como escreve
Denis Huisman, de “verdades que parecem incompatíveis mas que não deixam de invocar-se
mutuamente”.26 Para esse autor, a dialógica pascaliana põe no lugar da seqüência racional uma rede,
na qual se entrecruzam diferentes linhas de interpretação.

Da linearidade às redes, portanto: estamos em pleno âmago do pensamento complexo, como o


concebeu e formulou Morin, que no entanto abstrai de seu pensamento a religiosidade de Pascal.
Segue-o e se deixa influenciar por ele, mas só no tocante à dialógica contida em sua antropologia
filosófica. A dialógica é tão importante que Morin fez dela um dos instrumentos de conhecimento do
pensamento complexo, a que deu o nome de “operador dialógico”.

Convém insistir nesse ponto: ao utilizar a dialógica aprendida com Pascal, Morin busca antes de mais
nada estabelecer a alimentação mútua entre contrários inconciliáveis pela dialética. Na
impossibilidade de uma síntese superadora da contradição, a tensão entre os opostos se mantém e dela
surgem fenômenos novos — as propriedades emergentes.

A compreensão da dialógica fez de Pascal um “filósofo do paradoxo”, um pensador que afirma que a
verdade é sempre a junção de opostos e que o ser humano é paradoxal, ao mesmo tempo grande e
pequeno, forte e fraco.27 A confusão entre a existência de opostos ao mesmo tempo antagônicos e
complementares e o irracionalismo (ou a confusão entre paradoxo e absurdo) é uma das principais
dificuldades que algumas pessoas têm para a compreensão do pensamento complexo. Não é fácil
aceitar a ideia de que nem sempre aquilo que ultrapassa a razão é irracional. Por outro lado, é também
difícil entender que a pretensão de racionalizar tudo é uma manifestação de irrealismo e
irracionalismo.

Nesse sentido, a iniciativa de denominar Pascal de filósofo do paradoxo faz justiça à sua perspicácia,
pois em boa parte de seus Pensamentos ele recusa o raciocínio binário sem cair na racionalização nem
na irracionalidade. Em questões religiosas, porém, às vezes cai na lógica binária, aliás típica dos
monoteísmos. Nessas ocasiões a lógica do “ou/ou” surge em seus textos, nos quais há passagens como
a que afirma que a religião cristã “é a única a ter razão”.28 Afora exceções como essa, a fragmentação
típica do binarismo não faz parte dos Pensamentos, obra em que mais de um comentador vê uma
unidade, uma ordem implícita, na desordem aparente.

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Ao fim destas considerações sobre a dialógica, convém não esquecer que Pascal talvez tenha sido o
primeiro a escrever sobre a diferença entre a discussão/debate e o diálogo, no sentido que o já
mencionado David Bohm dá a essa palavra. Nos escritos pascalianos, a discussão e o debate
correspondem à “arte de convencer” e visam a explicar, a ensinar. Já o diálogo, que o filósofo
considerava mais útil e mais sutil, é a “arte de persuadir” e busca a compreensão.29

Pascal e Espinosa
Espinosa, com sua imanência, e Pascal, com sua transcendência, muito contribuíram para o
pensamento complexo. Espinosa usa a racionalidade para justificar a imanência. Pascal mostra, a seu
modo, a “racionalidade” da transcendência. Como já sabemos, em sua opinião as relações entre a
mente (a razão) e as emoções (o coração) são mutuamente alimentadoras, embora em cada caso
específico o ponto de partida sejam as emoções. Isto é, aquilo que ocorre no corpo, que é o lugar onde
primeiro acontecem nossos contatos e interações com o mundo.

A expressão “sabedoria convencional”, criada pelo economista John Kenneth Galbraith30, designa as
crenças estabelecidas de nossa cultura atual. São as “certezas” do pensamento linear-cartesiano. Com
base nelas, tem-se como certo que mentes e corações são coisas separadas. Sintomaticamente, porém,
no linguajar cotidiano falamos em mentes e corações, não em mentes ou corações. O que mostra que
no fundo não estamos convencidos da realidade dessa separação.

Mas ilude-se quem imaginar que tal percepção seja clara para todos, a ponto de poder ser posta em
prática com facilidade. No dia-a-dia, a orientação dessa “sabedoria” hegemônica é manter as mentes o
mais longe possível dos corações. A isso chamamos de “atitude racional”. Dela nos valemos para
justificar, por exemplo, nossa insensibilidade diante de condições como a miséria, a exclusão social e
outras barbaridades. Ainda assim, cumpre ressalvar que essa observação não justifica as pieguices, os
populismos e as atitudes paternalistas e demagógicas, que surgem sempre que se salta para o pólo
oposto e se dá primazia às emoções.

“Se submetermos tudo à razão, a nossa religião não terá nada de misterioso e sobrenatural”, escreveu
Pascal.31 Por sua vez, disse Espinosa: “Se violentarmos a razão, a nossa religião será absurda e
ridícula”.32 Para Espinosa, chega-se a Deus por meio da razão. Para Pascal a razão é inadequada para
tal finalidade, mas sem o coração ela é inútil. Ao contrário de Espinosa, Pascal não acreditava que a
razão pudesse abranger os âmbitos da moral e da religião: a seu ver, é na ciência que a razão encontra
seu domínio apropriado, embora mesmo aí não seja infalível.

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Geometria e finesse: as duas inteligências


Houve uma fase da vida de Pascal, após a morte de seu pai, em 1651, em que ele se dedicou muito a
atividades sociais, mundanas. Por essa época surgiu o livro Discours sur les passions de l’amour
(Discurso sobre as paixões do amor), que lhe foi atribuído. À luz da globalidade do seu pensamento
essa atribuição foi de certa forma justificável, pois nessa obra figuram algumas ideias bem
pascalianas, a começar pela diferença entre o esprit géométrique, “espírito geométrico” e o esprit de
finesse, “espírito de finura”.

Além disso, Pascal também escreveu um pequeno tratado, que não chegou a terminar, cujo título é De
l’esprit géométrique, no qual afirmou que a geometria é a mais perfeita das ciências . Com isso ele
manifestou um lado racionalista-cartesiano exclusivo que mais tarde haveria de superar. Nesse livro,
ele se esqueceu (mas Descartes, em sua obra, não) de dizer que se retrocedermos o suficiente em
qualquer seqüência lógica, acabaremos por chegar ao início de tudo — a intuição.33

Em francês, esprit também significa mente, inteligência. Doravante chamarei esprit de finesse de
inteligência de finura e esprit géométrique de inteligência geométrica, pois são denominações mais
adequadas ao que o filósofo quis expressar nesse contexto. A inteligência geométrica se refere ao rigor
e à exatidão do pensamento. A inteligência de finura se relaciona à agilidade, à abrangência, à
intuição, ao insight. A de finesse percebe as coisas de um só golpe, e não por meio de uma seqüência
de raciocínio como faz a inteligência geométrica. A primeira é analítica e a outra sintética.

Nos dias atuais, pode-se dizer que, por analogia, a inteligência geométrica está próxima do
pensamento linear-cartesiano e a inteligência de finura está ligada ao pensamento sistêmico. A esse
respeito, lembremos que Henri Bergson dizia que não existe aquilo que chamamos de desordem. O
que há são duas espécies de ordem, a geométrica e a da vida.34 Essa formulação é superponível aos
dois tipos de inteligência propostos por Pascal. Na inteligência geométrica ele identifica a exatidão, a
mensuração; na de finura, vê a estimativa, a avaliação. Sofia Rovighi35 acredita que é possível
identificar a inteligência geométrica com a mente abstrata, teórica, e a de finura com a mente concreta,
experiencial.

Assim, quem está acostumado a tratar quase que só com conceitos, abstrações e fragmentos pode
perder a experiência global e sintética do concreto. Para lidar com a concretude das coisas e situações
é necessário que a mente seja abrangente, sintética, e que a compreensão seja rápida, quase imediata.
A bem dizer, o que Pascal queria destacar é que é importante que as duas inteligências se
complementem quando necessário.

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Essa é também a proposta do pensamento complexo: ligar a razão do coração ao coração da razão. A
própria vida de Pascal é um exemplo de como a inteligência de finura e a geométrica se combinaram
para estruturar uma mente privilegiada. No entanto, as pessoas que pensam linearmente têm
dificuldade de aceitar que a racionalidade e a não-racionalidade (que não deve ser confundida com
irracionalidade) possam coexistir (e com resultados tão brilhantes) numa só pessoa.

A oposição das duas inteligências também pode ser vista como um antagonismo entre o conhecimento
explicativo (o modo explicativo, das ciências ditas exatas ou “duras”) e o conhecimento compreensivo
(o modo compreensivo, das chamadas ciências humanas). Porém, é preciso não esquecer que a
importância de explicar não é maior nem menor do que a de compreender. O que não pode ser
explicado pode e deve ser compreendido. É inadmissível pretender reduzir o que deve ser
compreendido ao que precisa ser explicado, na tentativa de ficar do “lado racional”.

Pascal assegura que os conceitos oriundos da inteligência geométrica nem sempre são fáceis de
perceber e entender. Já na inteligência de finura os princípios são evidentes, mas muitas vezes
escapam à mente geométrica, pois falta-lhe a abrangência necessária para intuir suas múltiplas facetas
e sua diversidade. Na inteligência de finura a intuição e o sentimento predominam sobre a objetividade
e a lógica, mas é difícil tornar isso claro para pessoas nas quais predomina a inteligência geométrica.
Sobretudo, é difícil fazê-las entender que a obra de Pascal, como a de muitos outros pensadores,
comporta, como mostraram Morin e outros, várias leituras além da religiosa. É a mesma dificuldade,
com sinal trocado, que se tem para convencer as pessoas cuja inteligência é mais de finura, de que há
situações na vida em que a mensuração e a exatidão são não apenas necessárias como indispensáveis.

Nicola Abbagnano36 observa que o ser humano não pode conhecer a si próprio como um objeto
geométrico. E, portanto, as comunicações entre as pessoas não podem realizar-se apenas por meio de
raciocínios lineares. Não é por outra razão que Pascal, dotado das duas espécies de inteligência em
raro equilíbrio, foi definido como um poeta dos números e não como um simples matemático
profissional. Com efeito, ele descobriu que a aleatoriedade e o azar podem combinar-se com o rigor do
método matemático, o que denominou de “geometria do azar” (aleae geometrica). Por isso, pode-se
dizer que também devemos a ele a descrição das estruturas paradoxais da realidade.37

Pascal dedicou-se à investigação da condição humana porque sentiu necessidade de comunicar-se não
apenas com as outras pessoas, mas também com ele próprio. Percebeu que para que essa comunicação
seja integral de pouco valem os rigores de inteligência geométrica quando utilizados de maneira
isolada. Caracterizou a instabilidade e a incerteza como inerentes ao homem, que por isso mesmo está
sempre entre o ser e o nada. Portanto, aprender a lidar com a incerteza (e não imaginar que é possível
eliminá-la) é uma tarefa humana fundamental.

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Alienação
A visão pascaliana da alienação é semelhante à de Espinosa, em especial à ideia de “mente distraída”
do filósofo holandês. Pascal usa o termo divertissement, que no caso significa distrairmo-nos com
exterioridades para não ter de pensar, refletir, procurar compreender nossa natureza contraditória.
Costumamos recorrer à inteligência geométrica, ou pensamento linear, para explicar quase todas as
coisas e situações, mesmo as que não são explicáveis mas sim compreensíveis. Tentamos racionalizar
tudo. Quando o modo linear se revela inadequado ou ineficaz, em vez de recorrer ao pensamento
abrangente, à inteligência de finura, preferimos fugir do problema, isto é, alienar-nos.

Ao contrário de Espinosa, vimos que o modo pascaliano de sair da alienação não é se tornar racional,
mas sim buscar a fé religiosa. Entretanto, seja qual for o caminho que se trilhe para lidar com ela, é
preciso ter em mente que a alienação não é um fim: é um meio de fugir a responsabilidades e
conseqüências. A busca incessante da diversão, tanto quanto a obsessão pelo trabalho, são
instrumentos dessa procura. Como se sabe, a busca infindável é também uma evasão infinita, pois seu
eventual término conduziria a um imenso vazio. Daí nossa necessidade de reiniciá-la a cada instante,
para ficar o mais longe possível daquilo que mais tememos: pensar em nós mesmos. Fugir é o
princípio, o meio e o fim da alienação — um fim que sempre volta ao seu começo.

Pascal e a complexidade
O que hoje chamamos de pensamento complexo tem a ver com o que Pascal denominava de
“inteligência penetrante” ou “espírito penetrante”. É um modo de pensar que permite que
compreendamos os paradoxos, a complexidade dos fenômenos do mundo e a nossa própria.

O filósofo assinala que estamos presos à imaginação e aos hábitos, o que faz com que os confundamos
com nossa natureza e por isso tenhamos muita dificuldade de modificá-los. Em termos atuais,
diríamos que estamos atrelados aos nossos condicionamentos, entre os quais o principal é o raciocínio
binário. Esse condicionamento é particularmente resistente quando se trata de crenças, em especial as
religiosas. Já vimos que o próprio Pascal não escapou a essa armadilha. Além do exemplo dado há
pouco, acrescentemos mais um: “Só há duas espécies de pessoas a quem se possa chamar de
razoáveis: ou os que servem a Deus de todo coração, porque o conhecem, ou os que o buscam de todo
o coração porque não o conhecem”.38

Sabemos que o raciocínio binário é fragmentado e fragmentador. No caso de Pascal, porém, a


fragmentação é mais exceção do que regra. A aparente desordem dos Pensamentos contém uma ordem
implícita. Como ele próprio disse, “escreverei aqui os meus pensamentos sem ordem e não talvez

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numa confusão sem objetivo. É a verdadeira ordem que caracterizará sempre o meu objeto pela
desordem mesma”.39 Não por acaso, esse é um dos princípios básicos do pensamento complexo:
ordem, desordem e organização. A desordem está implícita na ordem e vice-versa.

A filosofia na prática: a aposta


Os comentadores não se cansam de destacar que um dos motivos da popularidade de Pascal é sua
capacidade de trazer para a prática os raciocínios mais abstratos e complicados. Para tanto, sem dúvida
auxiliou-o o seu lado científico e matemático. Uma de suas perguntas mais características era: “A
teoria resulta na prática?”40

A ideia pascaliana de aposta (pari) ilustra bem esse aspecto. Ela influenciou de modo importante o
pensamento de Morin, para quem nossas ações são sempre o resultado de uma decisão, uma escolha
entre duas ou mais alternativas. O processo inclui, portanto, a incerteza e a imprevisibilidade e por isso
não deixa de ser uma aposta.41

Em Pascal, o conceito de aposta está ligado à fé religiosa. Quando se trata da existência de Deus, o
filósofo argumenta do seguinte modo: se vivemos como se Deus não existisse, fazemos uma aposta e
corremos o risco de não encontrar a salvação após a morte; se vivemos como se Deus existisse, essa
aposta nos traz ao menos os benefícios e consolos que a fé nos proporciona ao longo da vida. Portanto,
justifica-se apostar na existência divina: “Deus existe ou não existe; mas para que lado penderemos? A
razão nada pode determinar a esse respeito. (...) É preciso apostar. É inevitável, estais embarcados
nessa”.42

A ideia de aposta implica uma recusa à argumentação racional exclusiva. Em Pascal, apesar de ela
estar ligada à fé religiosa, é claro que se trata de um raciocínio ao qual não falta um acentuado grau de
pragmatismo: se não somos capazes de provar a inexistência de Deus, é mais seguro, por via das
dúvidas, que conduzamos nossas vidas com base na hipótese de sua existência.

No fim das contas, trata-se de um raciocínio custo-benefício. Não se pode deixar de apostar, mesmo
porque adotar uma atitude fatalista do tipo “o que tiver de acontecer, acontecerá” é também uma
aposta, embora negativa. Na prática, costumamos fazê-la com frequência: entregamos o futuro ao
acaso e muitas vezes, ironicamente, dizemos “seja o que Deus quiser”, mesmo quando apostamos em
sua inexistência. Em suma, numa situação em que as chances são fifty-fifty, “arriscar o finito para
ganhar o infinito é, evidentemente, uma medida da máxima conveniência”.43

A fé atenua a convivência com o risco. Ela também pode mudar o comportamento de algumas pessoas

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e, assim, torná-las menos indecisas e portanto menos imprevisíveis, o que diminui o risco de conviver
com elas. Por outro lado, a fé aliada à ingenuidade excessiva pode tornar as pessoas muito
manipuláveis.

É claro que a fé não precisa ser só em Deus. No planejamento estratégico de uma empresa, por
exemplo, damos preferência a um ou mais entre vários cenários futuros. Ao assim proceder, “pomos
fé” em nossas estratégias e/ou investimentos. Nesse sentido, adotamos a posição de Edgar Morin: é
preciso que estejamos conscientes de nossas apostas filosóficas e políticas.

Os comentários à ideia pascaliana de aposta proliferam na literatura filosófica. Muitos deles incluem
extensas considerações matemáticas e por isso não têm interesse para os objetivos deste texto. Para
manter a coerência com a abordagem deste ensaio, lembro uma observação de Gilles Deleuze, que
sustenta que em Pascal a ideia de aposta não se refere à existência ou à inexistência de Deus. É uma
postura antropológica, que “recai apenas sobre dois modos de existência do homem, a existência do
homem que diz que Deus existe, e a existência do homem que diz que Deus não existe”.44

Morin propõe que ao falar em aposta não devemos pensar sempre em jogos de azar ou realizações que
implicam perigo. Na realidade, apostar equivale a trazer a incerteza para junto da esperança. Quando
apostamos, introduzimos em nossas vidas e ações o wishful thinking, o desejo e o comprometimento.
Não há estratégia nem enfrentamento de desafios sem disposição de aposta, seja qual for a questão
envolvida. Apostar é um modo de entrar em contato com a aleatoriedade, a incerteza e a
imprevisibilidade. Como estas estão entre as dimensões mais fundamentais da condição humana,
pode-se dizer que toda vida que inclui reflexão inclui também um certo grau de aposta.

No entender de Morin, a aposta nos protege contra o erro.45 Como forma de lidar com a incerteza, ela
constitui a parte mais importante do pensamento de homens como Pascal, Dostoievski, Miguel de
Unamuno, Theodor Adorno e Lucien Goldmann, este último autor de um estudo importante sobre
Pascal. Nessa ordem de ideias, Morin alerta que o conhecimento é limitado por várias evidências de
incerteza:

a) as visões de mundo são sempre individuais, subjetivas;


b) como disse Pascal, nem a contradição é garantia de falsidade, nem a não-contradição assegura a
verdade;
c) a falta de racionalidade (a razão que inclui a emoção) leva à racionalização (a razão “absoluta”);
d) nossa mente não é de todo transparente para nós mesmos, pois existe o inconsciente.46

A aposta se justifica também diante do que Morin chama de “ecologia da ação”, para a qual ele propôs

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dois princípios, aumentados para três por Lise Laférière47:

a) o nível de eficácia ótima de uma ação está em seu começo;


b) uma ação não depende só da intenção ou intenções de seu autor; depende também das condições do
ambiente em que ela se desenvolve;
c) a longo prazo, os efeitos das ações não podem ser previstos.

As políticas da vida, particulares ou públicas, devem ser elaboradas ao mesmo tempo para o aqui-e-
agora e com vistas ao futuro. Tal circunstância produz sempre incertezas e contradições.48 Não há,
portanto, como deixar de apostar. Não há como deixar de ter fé, seja a religiosa, como propunha
Pascal, sejam as de quaisquer outros tipos: na vida, no futuro, em nosso potencial e nos dos que
compartilham conosco a existência e assim por diante. Trata-se, enfim, da esperança de que é possível
idealizar e pôr em prática outros tipos de política além dos comprovadamente inadequados.

Para tanto, porém, é necessário outro modo raciocínio além do habitual: o pensamento complexo.
Quanto maior for a distância a que os políticos atuais estiverem desse novo modo de pensar, mais
intensa deve ser nossa aposta de que ele precisa ser implementado. Pois no fim das contas tais
políticos, seu modo de pensar e suas ações somos nós mesmos ou criações nossas, seja por ação, seja
por omissão. A dimensão política da aposta não se resume a como chegar ao poder e mantê-lo. Implica
concebê-lo, alcançá-lo e exercê-lo pensando de outra maneira, isto é, por meio de modelos mentais
diversos dos costumeiros.

Em relação a esse aspecto, falemos de um fenômeno sobre cuja existência e aparente inevitabilidade
não há dúvidas: a barbárie humana em todas as suas manifestações — o que inclui a dos países ditos
desenvolvidos. Se a existência e a aparente perenidade da barbárie são indubitáveis, apostar que ela
pode ao menos ser atenuada poderia ser visto como uma perda de tempo. Isso se aplicaria, por
exemplo, a apostar em iniciativas de paz num mundo pesteado por guerras e violência. Esse é o
principal argumento do ceticismo e do cinismo, dois grandes produtores de apostas negativas. Nesse,
como em muitos outros casos, a aposta negativa esconde o conformismo, que por sua vez facilita a
manutenção do status quo.

Para que haja alguma mudança que não se limite à retórica, é indispensável que se aposte também em
uma mudança de modelo mental: na disseminação de um modo de pensar que permita ver as coisas
(inclusive o cinismo e o ceticismo) de outra maneira. Essa é, como já sabemos, a proposta do
pensamento complexo. Por isso, apesar desses e de muitos outros pesares, é preciso apostar, sim, já
que apostar negativamente é reconhecer que estamos ausentes de nossas próprias vidas. E isso é fazer
o jogo da alienação.

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Notas
1. Humberto Mariotti. “O conhecimento do conhecimento: a filosofia de Espinosa e o pensamento complexo”.
www.geocities.com/pluriversu
2. Blaise Pascal, Pensamentos 110 (282). A edição dos Pensamentos que uso neste ensaio é a de Louis Lafuma,
publicada no Brasil pela editora Martins Fontes. Mas existe outra, de Léon Brunschvicg. Os fragmentos desses
textos são numerados. Quando os cito aqui, o primeiro número corresponde aos da edição de Lafuma, e o que
está entre parênteses aos da de Brunschvicg.
3. Id. Ibid., 188 (267).
4. Pascal. Pensamentos. São Paulo: Martins Fontes, 2001.
5. Gerard Lebrun. Pascal: voltas, desvios e reviravoltas. São Paulo: Brasiliense, 1983, p. 57.
6. Santo Agostinho. A cidade de Deus, XXI, 10.
7. Pascal. Pensamentos, 199 (72).
8. Id., ibid., 423 (277).
9. António Damásio. Em busca de Espinosa: prazer e dor na ciência dos sentimentos. São Paulo: Companhia
das Letras, 2004, pp. 35-36.
10. Julián Marías. História da filosofia. São Paulo: Martins Fontes, 2004, p. 248.
11. Pascal. Pensamentos, 688 (323).
12. Id., ibid.
13. David Hume. A treatise of human nature, I. VI, iv.
14. Daniel Dennett. Elbow room: on the varieties of free will worth wanting. Oxford: Clarendon Press, 1983.
15. Patricia Churchland. Neurophilosophy. Cambridge, Massachusetts: Massuchetts Institute of Technology
Press, 1986, pp. 406-407.
16. V. S. Ramachandran e Sandra Blakeslee. Fantasmas no cérebro: uma investigação dos mistérios da mente
humana. Rio de Janeiro: Record, 2002.
17. Albert Béguin. Pascal. México: Fondo de Cultura Económica, 1989, p. 24.
18. Edgar Morin. La méthode. 5. L’humanité de l’humanité. L’identité humaine. Paris: Seuil, 2001, p. 281.
19. Friedrich Nietzsche. O nascimento da tragédia ou helenismo e pessimismo. São Paulo: Companhia das
Letras, 2000.
20. Pascal. Pensamentos, 177 (384).
21. Lebrun. Op. cit., pp. 75, 76.
22. Id., ibid., 200 (347).
23. Alban Krailsheimer. Pascal. Lisboa: Dom Quixote, 1983, pp. 60-61.
24. "Entretien avec M. de Sacy sur Epictète et Montaigne". In Monique Labrune e Laurent Jaffro. A construção
da filosofia ocidental: gradus philosophicus. São Paulo: Mandarim, 1996, pp. 393-394.
25. Denis Huisman. Dicionário dos filósofos. São Paulo: Martins Fontes, 2001, p. 752.
26. Id., ibid., p. 750.
27. Marilena Chauí. “Pascal, Vida e Obra”. In Pascal. Os Pensadores. São Paulo: Nova Cultural, 1999, p. 19.
28. Pascal. Pensamentos, 808 (245).
29. Roger Verneaux. Historia de la filosofia moderna. Barcelona: Herder, 1984, p. 48.

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30. ohn Kenneth Galbraith. A economia das fraudes inocentes: verdades para o nosso tempo. São Paulo:
Companhia das Letras, 2004, p. 9.
31. Pascal. Pensamentos, 173 (273).
32. Id., ibid., 173 (273).
33. Verneaux. Op. cit., p. 48.
34. Jill Krementz. “Piaget”. In The writer’s desk. Nova York: Random House, 1996, p.10.
35. Sofia Rovighi. História da filosofia moderna: da revolução científica a Hegel. São Paulo: Loyola, 1999, p.
154.
36. Nicola Abbagnano. História da filosofia. Lisboa: Presença, s.d., vol. VI, p. 183.
37. Béguin. Op. cit., p. 14.
38. Pascal. Pensamentos, 427 (194).
39. Id., ibid., 532 (373).
40. Krailsheimer. Op. cit., p. 69.
41. Edgar Morin. Introdução ao pensamento complexo. Lisboa: Instituto Piaget, 1995, pp. 115-117.
42. Pascal. Pensamentos, 418 (233).
43. Abbagnano. Op. cit., pág. 192.
44. Lebrun. Op. cit., p. 115.
45. Edgar Morin. La tête bien faite: repensar la réforme, réformer la pensée. Paris: Seuil, 1999,
p. 69.
46. Edgar Morin. Les sept savoirs necessaries à l’éducation du futur. Paris: Seuil, 2000, pp.93-94.
47. Edgar Morin. O método. 2. A vida da vida. Porto Alegre: Sulina, 2001, pp. 100-103.
48. Edgar Morin. Para sair do século XX. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1986, p. 303.

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© Humberto Mariotti, 2005

HUMBERTO MARIOTTI. Médico e psicoterapeuta. Professor, pesquisador e autor em ciências da


complexidade e suas aplicações.
E-mail: homariot@uol.com.br

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